Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1023/16.3BEALM
Secção:CA
Data do Acordão:04/11/2024
Relator:ELIANA CRISTINA DE ALMEIDA PINTO
Sumário:I - A referência ao “posto”, “posição remuneratória” e “tempo de serviço” do militar, para o cálculo da remuneração na reserva, não pode ter outro enquadramento que não o próprio Estatuto dos Militares das Forças Armadas, e respetivo Estatuto Remuneratório acima descrito.
II - Coisa diferente são “cargos” correspondentes a estruturas de, quer no Exército, como na GNR, determinando o artigo 21.º/2 da Lei n.º 63/2007, de 06 de novembro [Lei orgânica da GNR], que uma das estruturas de comando é o 2.º Comandante-geral, assim como se estatuindo, no caso, no artigo 13.º/3 do regime remuneratório dos militares da GNR que a remuneração base do titular de cargo de 2.º comandante-geral da Guarda é fixada por referência ao nível remuneratório 74 da tabela remuneratória única.
III - O 2.º Comandante-geral é um tenente-general, nomeado pelo ministro da tutela, sob proposta do comandante-geral da Guarda e quando o nomeado for oficial general das Forças Armadas, a nomeação é feita com o acordo do membro do Governo responsável pela área da defesa nacional, conforme previsto no artigo 25.º da Lei n.º 63/2007, de 06 de novembro [Lei orgânica da GNR], do EMFAR.
IV - Em matéria de remunerações dos militares das Forças Armadas na reserva, releva o artigo 15.º-A do DL 296/2009, de 14 de outubro, aprovado pelo DL 14/2020, de 7 de abril, entrado em vigor a 8 de abril de 2020, que aprovou uma norma interpretativa do antecedente artigo 15.º.
V - Dispunha o artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 296/2009, de 14 de outubro, na sua redação atual, que aprovou o regime remuneratório aplicável aos Militares dos Quadros Permanentes (QP) e em regime de contrato (RC) e de voluntariado (RV) dos três Ramos das Forças Armadas, que “... 1 - A remuneração dos militares na situação de reserva é igual à 36.ª parte da remuneração base mensal multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a reserva, a qual não pode ser superior a 36. 2 - À remuneração referida no número anterior acresce uma parcela de valor igual à 36.ª parte do suplemento de condição militar e dos suplementos devidos pelo exercício de funções em particulares condições de perigosidade, insalubridade, risco e desgaste percebidos no último posto do ativo, multiplicada pela expressão em anos do número de meses em que foi exercida a atividade que conferiu direito aos suplementos, a qual não pode ser superior a 36. 3 - A remuneração dos militares na reserva na efetividade de serviço é igual à dos militares do ativo do mesmo posto e posição remuneratória...”.
VI - Já o artigo 15.º-A do DL 14/2020, de 7 de abril, que veio interpretar o antecedente artigo 15.º, determinou que “... 1 - Do cálculo referido no artigo anterior não pode resultar para os militares em situação de reserva perceção de remuneração inferior à que resultaria da aplicação do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro. 2 - O número anterior não prejudica o disposto no n.º 4 do artigo 10.º do presente decreto-lei [Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro] ...”.
VII - E determina o artigo 27.º/1 do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro que “... 1 - A remuneração dos militares na situação de reserva é igual à 36.ª parte da remuneração base mensal do respetivo posto e de outras remunerações abrangidas pelo n.º 1 do artigo 47.º do Estatuto da Aposentação, multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a reserva, o qual não pode ser superior a 36. 2 - À remuneração referida no número anterior acrescem, para efeitos de cálculo da remuneração na reserva e nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 47.º do Estatuto da Aposentação, o suplemento de serviço nas forças de segurança, sempre que a passagem à situação de reserva se tenha verificado ou venha a verificar-se em qualquer dos seguintes casos: a) Por limite de idade, estabelecido para o respetivo posto; b) Por declaração do próprio, após completar 36 anos de tempo de serviço; c) Por serem julgados fisicamente incapazes para o serviço ativo por competente junta médica que comprove ser a incapacidade resultante de acidente ocorrido em serviço ou por motivo do mesmo, ou de doença adquirida em serviço ou por motivo do mesmo...”.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais: Subsecção SOCIAL
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
I – RELATÓRIO

L......, devidamente identificado nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, para o Tribunal Central Administrativo do Sul, que, no âmbito da ação administrativa especial, julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo o réu do pedido formulado, ou seja, que fosse decidido o recurso hierárquico interposto pelo Autor em 18/08/2016 no sentido de determinar o cálculo da sua remuneração de reservas, de acordo com a posição remuneratória n.º 74, em cumprimento do disposto nos artigos 119.º do EMFAR e 15.º do RRMFA, conjugado com o disposto no artigo 13.º, n.º 3 do RRMGN, determinando, em consequência, o pagamento ao autor dos diferenciais decorrentes da remuneração atribuída e daquela que deveria ter sido calculada, até decisão final, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos.
***
Formula a aqui Recorrente, nas respetivas alegações de recurso, as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem:
“...
A) Ao proceder ao saneamento dos autos a Mma. Juiz a quo delimitou – e muito bem – a questão a decidir nos seguintes termos: “...A questão presente nos autos é a de saber se a remuneração de reserva do Autor deve, ou não, ser processada de acordo com a posição remuneratória 74...”;
B) Da análise da parte decisória da sentença sob recurso resulta que, por certo involuntariamente, a Mma. Juiz a quo acabou por afastar-se do thema decidendum que havia corretamente identificado, para acabar a debruçar-se sobre questão diversa, a saber “... qual o posto do Autor a atender para efeitos do cálculo da sua remuneração de reserva...”;
C) Ao ocupar-se de questão diversa daquela que lhe havia sido trazida pelo Autor e que, aliás, havia sido corretamente identificada na sentença sob recurso, a Mma. Juiz a quo – raiando a contradição entre os fundamentos e a decisão – acabou por incorrer em fatal erro de julgamento, deixando por apreciar (quase) todos os argumentos invocados pelo Autor, nomeadamente:
i) A circunstância do n.º 1 do artigo 119.º do EMFAR prever claramente que o militar na situação de reserva tem direito a uma remuneração calculada com base no posto, posição remuneratória e tempo de serviço, tal como definido naquele Estatuto;
ii) A circunstância de o artigo 18.º do EMFAR estipular claramente que o militar tem direito a auferir remuneração em função da forma de prestação de serviço, posto, tempo de serviço e cargo que desempenha;
iii) O facto, incontroverso, de a remuneração base auferida pelo Autor no exato momento em que transitou para a situação de reserva ser a remuneração correspondente à posição correspondente à posição remuneratória do cargo de 2º Comandante-Geral da GNR, ou seja, o nível 74 da Tabela Remuneratória Única;
iv) O facto – assente, porque assumido pela Entidade Demandada – de o Autor ter cessado funções no dia 31/05/2016 por motivo da passagem à situação de reserva, tendo nessa mesma data deixado de ocupar as funções de 2.º Comandante-Geral da GNR e regressado ao Exército apenas e só́ para aí ingressar na situação de reserva, sem que houvesse qualquer hiato funcional ou remuneratório entre uma e outra situação, ou seja, transitando diretamente do desempenho do 2o Comandante-Geral da GNR para a situação de reserva;
v) A circunstância de a redução remuneratória a que a Entidade Demandada procedeu administrativamente aquando do cálculo da remuneração de reserva do Autor colidir com o princípio geral da irredutibilidade da retribuição.
vi) Ao decidir como decidiu, a Mma. Juiz a quo desconsiderou por completo o comando normativo constante do número um do citado artigo 119.º do EMFAR, o qual impõe que o militar na situação de reserva tem direito a uma remuneração calculada com base no posto, posição remuneratória e tempo de serviço.
D) Do mesmo modo que desconsiderou por completo o artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 296/2009, de 14/10, que prevê claramente que a remuneração dos militares na situação de reserva é igual à 36.ª parte da remuneração base mensal;
E) Fazendo também tábua rasa do princípio geral ínsito no artigo18.º do EMFAR, segundo o qual o militar tem direito a auferir remuneração em função da forma de prestação de serviço, posto, tempo de serviço e cargo que desempenha, nos termos previstos em diploma próprio;
F) Esquecendo ainda, no plano estritamente factual, que o Autor transitou diretamente do desempenho do cargo de 2.º Comandante-Geral da GNR para a situação de reserva, o que tem como incontornável consequência que a remuneração base auferida pelo Autor no exato momento em que transitou para a situação de reserva era a remuneração correspondente à posição remuneratória do cargo de 2.º Comandante-Geral da GNR: nível 74 da Tabela Remuneratória Única.
G) Pelo que, para além de postergar todos os princípios gerais de Direito já referidos, a Mma. Juiz a quo acabou, também, por contender com o princípio geral da irredutibilidade da retribuição – aplicável à situação do Autor por forca do comando normativo constante do artigo 7.º da Lei n.º 11/89, de 01/06 [Lei das Bases Gerais do Estatuto da Condição Militar] – assim como contendeu, também, com a garantia constitucional do “trabalho igual, salário igual” plasmada no artigo 59.º da Lei Fundamental, ao aceitar como natural que a situação concreta do Autor fosse tratada diferentemente da do contrainteressado General N........
H) Por conseguinte, ao decidir no sentido em que decidiu, a douta sentença sob recurso incorreu em fatal erro de julgamento e violou, pelo menos, as seguintes normas legais e princípios gerais de Direito:
a) Artigo 119.º do EMFAR;

b) Artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 296/2009, de 14/10;

c) Artigo 18.º do EMFAR;

d) Princípio da irredutibilidade da retribuição plasmado no artigo 129.º, n.º 1, alínea d), do Código do Trabalho e também no artigo 72.º, n.º 1, alínea d), da Lei n.º 35/2014, de 20 de Junho, aplicável à situação do Autor por força do artigo 7.º da Lei n.º 11/89, de 01/06;

e) Princípio do “trabalho igual, salário igual” plasmada no artigo 59.º da Lei Fundamental.

Deve ser dado inteiro provimento à presente apelação e, em consequência, ser revogada a douta sentença sob recurso declarando-se procedente o pedido formulado em A) da petição inicial.


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O réu, EXÉRCITO, notificado, não apresentou contra-alegações,
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O contrainteressado, A....... não contra-alegou.
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Notificado o MINISTÉRIO PÚBLICO, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, emitiu parecer, defendendo:
1) Será de ter em consideração as situações idênticas à do Autor, mas que após a exoneração de um cargo regressam ao ativo em vez de passarem à situação de reserva, ou seja, o Autor ao ser exonerado do cargo que exerceu como 2.º Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana, se ainda estivesse em situação de regressar ao ativo passava a vencer de acordo com a posição remuneratório correspondente ao seu posto no Exército, a posição remuneratória 60, da Tabela Remuneratória Única;
2) Aliás, o mesmo se passa com qualquer funcionário que após cessar uma comissão de serviço regressa ao lugar de origem, passando a auferir o salário correspondente às funções que volta a desempenhar;
3) Daí que não se vislumbrem quaisquer razões para que, após a exoneração e passagem à reserva, fique a auferir um vencimento superior àquele que auferem militares de igual patente no ativo;
4) Na conclusão H) das doutas alegações o Autor/Recorrente invoca que a decisão recorrida contendeu com a garantia constitucional de «trabalho igual, salário igual», consagrada no art.º 59.º, da Constituição da República Portuguesa. Ao alegar a referida inconstitucionalidade, o recorrente fê-lo de forma genérica e sem qualquer sustentação, porquanto se limita a referir que a decisão recorrida violou o seu direito a um salário igual por igual trabalho;
5) Devia o recorrente, pretendendo invocar a violação daquele preceito constitucional, em nossa opinião, esclarecer quais as normas de direito infraconstitucional que foram aplicadas em violação do espírito do dispositivo invocado, sendo que se impunha ao Autor/Recorrente demonstrar quais os normativos legais que deviam ter sido observados e não foram, ou que foram interpretados de modo a conflituarem com o princípio constitucional de «trabalho igual, salário igual».
Defendeu que deve ser negado provimento ao presente recurso, mantendo-se na íntegra a sentença recorrida, por a mesma não padecer dos vícios que lhe vêm assacados, nem de qualquer outro que cumpra conhecer.
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Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.
Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas resumem-se em determinar se o Autor tem direito a auferir, na situação de reserva, a remuneração correspondente à posição remuneratória 74.ª da Tabela Remuneratória Única, ou se, pelo contrário, deve ser abonado de acordo com a posição 60.ª da Referida Tabela, correspondente ao valor do salário de um militar no ativo com o mesmo posto do recorrente.
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III – FUNDAMENTOS


III.1. DE FACTO
Na decisão judicial recorrida foi dada por assente, por provada, a seguinte factualidade que não vem impugnada, pelo que se mantém:

“...
A. O Autor é Major-General do Exército Português, atualmente na situação de reserva – [facto não controvertido];
B. Em 07.09.2015, foi publicado em Diário da República, n.º 174, Série II, o “Despacho n.º 10073/2015” da Ministra da Administração Interna, que nomeou o Autor para o cargo de 2.º Comandante Geral da Guarda Nacional Republicana, com efeitos a 06.08.2015 –
[cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial];
C. No exercício do cargo referido na alínea anterior, o Autor auferia pelo nível remuneratório 74, com a indicação de “2º Cmdt. Geral da GNR – nº3 artº 13 do Dec Lei n. 298/09 de 14 OUT”
– [cfr. documento n.º 4 junto com a petição inicial];
D. Em 05.05.2016, o Autor endereçou, ao Chefe de Estado-Maior do Exército, “Requerimento”, através do qual peticionou “(…) transitar para a situação de Reserva em 31/05/2016, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.º 153.º do EMFAR, ao abrigo do regime previsto no n.º 3 do art.º 9.º do Decreto-Lei n.º 90/2015 de 29 de maio, conjugado com as disposições transitórias previstas nos n.º 2 a 4 e 6 do art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 166/2005, de 23 de setembro.”
[cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial];
E. Em 23.05.2016, a Ministra da Administração Interna exarou “Despacho”, através do qual exonerou o Autor dos cargos de 2.º Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana e de Inspetor de Guarda, por motivo de passagem à situação de reserva
– [cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial];
F. Em 06.06.2016, o despacho identificado na alínea que antecede foi publicado em Diário da República, n.º 108, Série II
– [cfr. documento n.º 3 junto com a petição inicial];
G. A partir junho de 2016, o Autor transitou para a situação de reserva, tendo passado a ser abonado pela posição remuneratória 60
– [cfr. documento n.º 5 junto com a petição inicial];
H. Em 21.06.2016, o Autor endereçou, ao Tenente-General AGE Comandante do Pessoal, “Reclamação”, através da qual solicitou a revisão da sua remuneração de reserva, “(…) por referência ao nível remuneratório 74, da tabela remuneratória única, nos termos do artigo 13.º do RRMG, artigo 15º do RRMFA, e 119.º do EMFAR, com efeitos retroativos à data em que iniciou o seu pagamento.”
– [cfr. documento n.º 6 junto com a petição inicial];
I. Em 21.06.2016, o Jurista do Gabinete do Comando do Pessoal do Exército, lavrou “Informação/Parecer n.º 02/2016”, sob o assunto “Reclamação – Cálculo da Remuneração de Reserva do MGEN L......”, de onde se extrai o seguinte:
1. Finalidade:
No âmbito do assunto em epigrafe e por determinação do Tenente-General Comandante do Pessoal, cumpre emitir pronúncia sobre a reclamação apresentada pelo MGEN T…… relativa ao cálculo da remuneração de reserva, ao abrigo do art.º 109.º do EMFAR, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 90/2015, de 29 de maio.
2. Situação:
a) O Oficial General supra identificado desempenhou funções de 2.º Comandante da GNR até 30 de maio de 2016.
b) Auferia, no referido cargo, pelo nível remuneratório 74, de acordo com o n.º 3 do art.º 13.º do Decreto-Lei n.º 289/2009 (a remuneração base do titular do cargo de 2.º Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana -GNR- é fixada por referência ao nível remuneratório 74 da tabela remuneratória única).
c) Em 30 de maio de 2016, o ora reclamante regressou ao Exército, tendo transitado para a situação de reserva a 31 de maio de 2016.
d) Em conformidade com a informação fornecida peia Secção de Pessoal Fora da Efetividade, da Repartição de Abonos (SPFE/RA) da DSP, cumpre esclarecer que, em bom rigor, o processamento de remuneração do mês de junho que vira a ser objeto da presente reclamação, ainda não contemplava o cálculo da remuneração na reserva, devendo-se aquele abono à necessidade de garantir a continuidade dos abonos com a transição da GNR para o Exército.
e) No entanto, em termos práticos, este hiato de datas toma-se irrelevante, na medida em que o cálculo efetivo viria a ser efetuado poucos dias depois, tendo por referência elementos fornecidos pela RPFES/DARH, indicando como aplicável ao militar o nível remuneratório 60 (o mesmo do boletim de vencimento do mês de junho), pelo que se procederá à análise da reclamação e seus fundamentos.
3. Análise
a) O art.º 109 do EMFAR, sob a epígrafe “Reclamação” estabelece que:
1) A reclamação do ato administrativo é individual, escrita, dirigida a apresentada ao autor do ato, no prazo de 15 dias, a contar da notificação.
2) A publicação do ato administrativo na ordem de serviço da unidade de colocação equivale à notificação do militar para efeitos do disposto no número anterior.
3) A reclamação é decidida num prazo de 30 dias.
4) A reclamação de atos suscetíveis de Impugnação judicial suspende o prazo de interposição de recurso hierárquico necessário.
b) Nestes termos, a presente reclamação é legalmente admissível e foi tempestivamente interposta, devendo a mesma ser objeto de decisão por parte da entidade que proferiu o ato administrativo ora reclamado, num prazo de 30 dias.
c) Em suma, o reclamante discorda que o cálculo da remuneração de reserva seja efetuado tendo por referência o posto que detém (Major-General), devendo antes ter como referencial o vencimento que auferia imediatamente antes da passagem à situação de reserva, enquanto investido no cargo de 2.º Comandante-Geral da GNR;
d) Para fundamentar a sua pretensão, o reclamante invoca as disposições constantes do art.º 119.º do EMFAR e 15.º n.º 3 do DL n.º 296/2009, os quais estabelecem o princípio da paridade da remuneração entre o militar na situação de reserva e o militar com o mesmo posto e posição remuneratória na situação de ativo.
e) Ora, os referidos normativos legais visam conferir o mesmo tratamento a militares com o mesmo posto e posição remuneratória, independentemente de se encontrarem na situação de ativo ou reserva, motivo peio qual são insusceptiveis de suportar a pretensão em questão.
f) O que decorre daqueles normativos é a necessidade de garantir a paridade remuneratória entre um major-general, inserido no nível remuneratório 60, na situação de reserva, e a de um major-general no mesmo nível remuneratório, mas na situação do ativo.
g) Analisado o n.º 3 do art° 13.º do regime remuneratório dos militares da GNR, elencado pelo reclamante, constata-se que o nível remuneratório 74 é determinado não em função de um posto, mas antes da titularidade do cargo de 2.º comandante-geral da Guarda, sendo conferida ao seu titular, enquanto durar aquele desempenho.
h) No caso em apreço, sucede, porém, que o mencionado Oficial General cessou as funções de 2.ª Comandante-Geral da GNR em 30 de maio de 2016. Desde modo, não está em causa qualquer tratamento desigual em termos retributivos, entre militares detentores do mesmo posto e nível remuneratório, mas antes indagar se o militar que exerceu cargo de alto comando até à data da passagem à Reserva, deve continuar a ser remunerado peto nível correspondente ao cargo cessante, ou pelo nível correspondente ao posto de Major-General.
i) Na verdade, a situação sub judice reveste-se de uma complexidade jurídica considerável, na medida em que estão em causa a aplicação potencial de diferentes diplomas legais em momentos temporais distintos, nomeadamente o EMFAR, o Estatuto Remuneratório dos Militares das Forças Armadas, o Regime Remuneratório dos Militares da Guarda, o Estatuto da aposentação, podendo surgir situações de transição e fronteira que aparentem desigualdade de tratamento em termos abstratos.
j) O reclamante argumenta que o próprio conceito de reserva, deve ser considerado, de certo modo, como uma pré-reforma, motivo pelo qual deveria existir uma continuidade lógica entre ativo reserva e reforma sendo que a última remuneração no ativo relevaria para o cálculo da remuneração de reserva, e subsequentemente, esta última, serviria de referência para a pensão de reforma.
k) Para reforçar a sua posição, o MGen T....... arrola o exemplo: um militar em circunstâncias similares mas que já reúna as condições para passar diretamente à reforma, irá ver a sua pensão calculada com base na última remuneração no ativo; Por sua vez, um militar que não possua as condições de passagem direta â reforma, terá forçosamente que passar primeiro pela reserva, situação que, em seu entender, comportaria uma dupla penalização na eventualidade de aplicação do critério agora em disputa, primeiro na reserva e mas tarde na pensão de reforma.
l) Pese embora existam semelhanças e alguma continuidade entre a situação de reserva e a reforma, elas não podem equiparar-se para estes efeitos, na medida em que constituem realidades legalmente distintas e com implicações também elas diversas.
m) O que sucede com os militares em situações análogas à do reclamante, mas que reúnam as condições para passar à situação de reforma, é que são abrangidos por normativos concretos do Estatuto da Aposentação que determinam a sua aplicabilidade aquele universo específico que transita da reserva para a aposentação.
n) No intuito de clarificar a vertente situação, foram solicitados contributos á RPFES/DARH, que velo esclarecer o seguinte:
- Em termos administrativos, e uma vez terminado o desempenho do cargo de alto comando, remunerado ao abrigo das correspondentes disposições do regime remuneratório próprio da GNR. O MGen T....... regressou ao Ramo para transitar para a situação de reserva, em conformidade com as disposições legais aplicáveis. É neste contexto que surge novamente na esfera jurídica do Exército o abono da remuneração do mencionado Oficial General que, em cumprimento do previsto no art.º 119.º do EMFAR, em conjugação com o art.º 15.º do DL 296/2009, de 14 de outubro, é calculado tempo como referência o seu posto, posição remuneratória e tempo de serviço.
o) Mais foi esclarecido que a vertente situação é distinta da situação do TGen Ex-Vice CEME, que transitou recentemente para a reserva, na medida em que não está em causa o regresso ao ramo e a inerente mudança de regime remuneratório, motivo pelo qual não é aplicado o mesmo critério.
p) Esta perspetiva conduz-nos a um dos princípios basilares do direito público administrativo: o Princípio da Legalidade. Este princípio estabelece que a Administração se encontra estritamente vinculada na sua atuação à previsão normativa, o que significa que só pode fazer o que a Lei prevê e autoriza.
q) No caso concreto, e por força da inexistência de normativo que permita a manutenção da posição remuneratória após a cessação de funções de comando na GNR, que é inerente à sua atribuição, não pode o Exército reconhecer fundamento à pretensão do reclamante.
3) CONCLUSÃO/PROPOSTA:
A presente reclamação é legal e tempestiva, estando em causa a apreciação da impugnação do cálculo aplicado à remuneração na reserva do TGen T......., competência que se encontra no âmbito do Tenente-General Comandante do Pessoal. Face aos argumentos supra aduzidos, entende-se que o cálculo da remuneração de reserva do ora reclamante se encontra corretamente efetuado, nos termos da legislação vigente. Deste modo e perante a inexistência de uma disposição legal que preveja a manutenção da situação remuneratória anterior à passagem à situação de reserva, e no estrito cumprimento do princípio da legalidade, propõe-se o indeferimento da matéria peticionada.” – [cfr. documento n.º 7 junto com a petição inicial].
J) Em 27.06.2016, sobre a “Informação/Parecer n.º 02/2016” referida na alínea que antecede, incidiu “Despacho” do TGEN AGE, através do qual se determinou que se proceda “(…) conforme proposto, designadamente de acordo com o 2.º parágrafo do n.º 3”
– [cfr. documento n.º 7 junto com a petição inicial];
K) Em 28.06.2016, o Gabinete TGEN AGE do Comando do Pessoal, remeteu ao Autor o ofício n.º GABAGE.RAAD-2016-019164, sob o assunto “Reclamação – Cálculo da Remuneração de Reserva do MGEN L......”, de onde resulta o seguinte: “[r]elativamente ao assunto em epígrafe e em cumprimento do disposto no art.º 114.º do Código do Procedimento Administrativo, encarrega-me o Excelentíssimo Tenente-Geral Comandante do Pessoal de Comunicar o seu despacho de Indeferimento de 27Jul16, exarado na Informação/Parecer n.º 02/RAAD/2016, que se anexa para os devidos efeitos.”
[cfr. documento n.º 7 junto com a petição inicial];
L) Em 30.06.2016, foi emitido pela Direção de Serviços de Pessoal – Repartição de Abonos, detalhe do “Cálculo da Remuneração de Reserva do Autor”, da qual resulta o seguinte:

M) Em 01.07.2016, foi publicado em Diário da República n.º 125, Série II, o “Despacho n.º 8546/2016” do Chefe do Estado-Maior do Exército, que delega no Ajudante-General do Exército a competência para “praticar os atos respeitantes a remunerações, suplementos, subsídios e demais abonos e descontos do pessoal militar, militarizado do Exército, bem como proferir decisão sobre requerimentos e exposições respeitantes às mesmas matérias” – [cfr. site oficial DRE]
N) Em 14.08.2016, o Autor endereçou ao Chefe do Estado-Maior do Exército, “Recurso Hierárquico Necessário”, pelo qual solicitou a revisão da sua remuneração de reserva, “(…) por referência ao nível remuneratório 74, da tabela remuneratória única, nos termos do artigo 13.º do RRMG, artigo 15º do RRMFA, e 119.º do EMFAR, com efeitos retroativos à data em que iniciou o seu pagamento” – [cfr. documento n.º 8 junto com a petição inicial];
O) Em 31.08.2016 o Jurista do Gabinete do Comando do Pessoal do Exército, lavrou “Informação/Parecer n.º 03/2016”, sob o assunto “Recurso Hierárquico – Cálculo da Remuneração de Reserva do MGEN L......”, de onde se extrai o seguinte:
“1. Finalidade:
Emitir pronúncia sobre o recurso hierárquico apresentado pelo MGEN T......., relativo ao cálculo da remuneração de reserva, em cumprimento do disposto no n.º 2 do art.º 195.º do Código do Procedimento Administrativo.
1.SITUAÇÃO:
a. O Oficial General supra identificado desempenhou funções de 2.º Comandante da GNR até 30 de maio de 2016.
b. Auferia, no referido cargo, pelo nível remuneratório 74, de acordo com o n.º 3 do art.º 13.º do Decreto-Lei n.º 289/2009 (a remuneração base do titular do cargo de 2.º Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana -GNR- é fixada por referência ao nível remuneratório 74 da tabela remuneratória única).
c. Em 30 de maio de 2016, o MGEN T....... regressou ao Exército, tendo transitado para a situação de reserva a 31 de maio de 2016.
d. Após tomar conhecimento da remuneração de reserva, através do vencimento processado no mês de junho, o MGEN T....... apresentou a respetiva reclamação em 21 de junho de 2016, por discordar do cálculo efetuado com referência ao posto detido. A referida reclamação foi objeto de apreciação por parte da Repartição de Auditoria de Abonos e Descontos do Comando do Pessoal, vertida na Informação/Parecer n.º 2/RAAD/2016, que viria merecer o despacho de indeferimento de 27Jul2016 do Exmo. TGEN AGE.
3. ANÁLISE:
a) Importa, antes de mais, proceder à verificação das questões preliminares relativas à admissibilidade e tempestividade do recurso em apreço.
b) O art.º 110.º do EMFAR, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 90/2015, de 29 de maio, determina que:
· O recurso hierárquico é necessário e deve ser dirigido ao mais alto superior hierárquico do autor do ato, salvo se a competência para a decisão se encontrar delegada ou subdelegada.
· O requerimento de interposição do recurso é apresentado ao autor do ato ou da omissão, o qual deve pronunciar-se no prazo de 15 dias,
· O recurso hierárquico é interposto no prazo de 30 dias a contar:
a) Da notificação do ato, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo anterior;
b) Da notificação da decisão da reclamação;
c) Do decurso do prazo pra a decisão da reclamação.
c) Por sua vez, o n.º 2 do artigo 195.º do CPA, estabelece que no prazo de 15 dias, ou de 30 dias quando houver contrainteressados, "...deve o autor do ato ou da omissão pronunciar-se sobre o recurso e remetê-lo ao órgão competente para dele conhecer, notificando recorrente da remessa do processo administrativo.”
d) Da conjugação e análise das disposições citadas constata-se que:
- O presente recurso é legalmente admissível tendo sido tempestivamente interposto, nos termos do
art.º 110.º do EMFAR;
- A entidade recorrida deve pronunciar-se quanto ao recurso apresentado e seus fundamentos e
remetê-lo à entidade competente para a decisão, notificando o recorrente da remessa do processo
administrativo.
e) No que concerne à substância do vertente recurso, o MGEN T....... veio, essencialmente, reiterar a perspetiva já defendida em sede de reclamação, discordando dos fundamentos que conduziram ao indeferimento da matéria peticionada.
f) No seu entendimento, o cálculo da remuneração de reserva deveria ter por referência o nível remuneratório 74, da tabela remuneratória única, correspondente à função desempenhada enquanto esteve investido no cargo de 2.º Comandante-Geral da GNR, imediatamente antes da sua passagem à situação de reserva, com fundamento na interpretação conjugada dos artigos 13.º do Regime Remuneratório dos Militares da Guarda (RRMG), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/09, de 14 de outubro; do art.º 15.º do Regime Remuneratório dos Militares das Forças Armadas (RRMFA), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 296/2009, de 14 de outubro, com as alterações introduzidas, pelo Decreto-Lei n.º 142/2015, de 31 de julho e 119.º do EMFAR.
g) Nesta perspetiva, o recorrente advoga que o cálculo da remuneração mensal relevante na reserva prevista no art.º 15.º do RRMFA não pode atender unicamente ao posto detido pelo militar (regra geral), devendo ser efetuado de acordo com as regras especiais previstas no art.º 13 do RRMG.
h) Da análise constante da Informação n.º 02/RAAD/2016, de 21 de julho, concluiu-se, resumidamente, que:
- Os normativos legais invocados visavam conferir um tratamento semelhante a militares com o mesmo posto e posição remuneratória, independentemente de se encontrarem na situação de ativo ou reserva, motivo pelo qual se consideraram insusceptiveis de suportar a pretensão em questão;
- O que decorre daqueles normativos é a necessidade de garantir a paridade remuneratória entre um major-general, inserido no nível remuneratório 60, na situação de reserva, e a de um major-general no mesmo nível remuneratório, mas na situação do ativo.
- Uma leitura mais detalhada do n.º 3 do art.º 13.º do RRMG, elencado pelo ora recorrente, permite verificar que o nível remuneratório 74 é determinado não em função de um posto, mas antes da titularidade do cargo de 2.º comandante-geral da Guarda, sendo conferida ao seu titular, enquanto durar aquele desempenho;
- No caso em apreço, sucede, porém, que o mencionado Oficial General cessou as funções de 2.º Comandante-Geral da GNR em 30 de maio de 2016. Desde modo, não está em causa qualquer tratamento desigual em termos retributivos, entre militares detentores do mesmo posto e nível remuneratório, mas antes indagar se o militar que exerceu cargo de alto comando até à data da passagem á Reserva, deve continuar a ser remunerado pelo nível correspondente ao cargo cessante, ou pelo nível correspondente ao posto de Major-General.
i) No intuito de clarificar a vertente situação, foram solicitados contributos à Repartição de Pessoal Fora da Efetividade de Serviço da Direção de Administração de Recursos Humanos, que veio esclarecer o seguinte:
- Em termos administrativos, e uma vez terminado o desempenho do cargo de alto comando, remunerado ao abrigo das correspondentes disposições do regime remuneratório próprio da GNR, o MGEN T....... regressou ao Ramo para transitar para a situação de reserva, em conformidade com as disposições legais aplicáveis. É neste contexto que surge novamente na esfera jurídica do Exército o abono da remuneração do mencionado Oficial General que, em cumprimento do previsto no art.º 119.º do EMFAR, em conjugação com o art.º 15.º do DL 296/2009, de 14 de outubro, é calculado tempo como referência o seu posto, posição remuneratória e tempo de serviço;
- Mais foi elucidado que a vertente situação não deve ser confundida com outra suscitada pelo ora recorrente, relativa ao TGEN Ex-Vice CEME, que transitou recentemente para a reserva, uma vez que não está em causa o regresso ao ramo e a inerente mudança de regime remuneratório, motivo pelo qual não foi aplicado o mesmo critério.
CONCLUSÃO/PROPOSTA:
a) A presente recurso hierárquico é legal e tempestivo, pelo que o mesmo deve ser remetido Gabinete do Chefe do Estado-Maior do Exército, com vista à apreciação e competente decisão.
b) Face aos argumentos supra aduzidos e perante a inexistência de uma disposição legal que preveja a manutenção da situação remuneratória anterior à passagem à situação de reserva, professamos o entendimento de que o cálculo da remuneração de reserva do ora recorrente se encontra corretamente efetuado, no estrito cumprimento do princípio da legalidade, motivo pelo qual se propõe o indeferimento da matéria peticionada.”
– [cfr. processo administrativo a fls. 81 a 85 do SITAF];
P) Em 01.09.2016, sobre a “Informação/Parecer n.º 03/2016” referida na alínea que antecede, incidiu “Despacho” de concordância do Tenente-General AGE, que determinou o envio do processo ao Gabinete do Chefe do Estado-Maior do Exército – [cfr. processo administrativo a fls. 81 a 85 do SITAF];
Q) Em 16.11.2016, deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada a petição inicial da presente ação administrativa – [cfr. fls. 1 dos autos – numeração SITAF].
...”.
*

III.2. DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do recurso, segundo a sua ordem de precedência.
O thema decidendum do presente recurso, circunscrito pelas suas conclusões, situa-se em saber se a remuneração de reserva do recorrente, autor na ação, deve ser processada pela posição remuneratória 74 da tabela Remuneratória única [TRU], ou seja, de 2.º Comandante-Geral da GNR, apesar do seu posto de origem ser o de Major-General, pedindo que a decisão de 1.ª instância seja revogada, por ter feito uma errada interpretação do direito aplicável.
Apreciando e decidindo.
Defende o recorrente que o Tribunal a quo fez uma errada interpretação do direito aplicável aos factos apuados, entendendo que a Mma. Juiz a quo, afirma como pressuposto da sua decisão o facto de o militar ter regressado ao Exército, e ao posto por si ocupado – o que vai de encontro ao n.º 1 do artigo 119.º do EMFAR e ao artigo 15.º do RRFMA, esquecendo que esta não era a questão controvertida, porquanto o recorrente bem sabe que o seu posto na carreira era o de Major-General. Mais defende que a remuneração que auferia imediatamente antes de passar à condição de reserva era a função de 2.º Comandante-Geral da GNR, cargo para o qual foi nomeado. Conclui, por isso, que a remuneração que auferia no momento em que passou à reserva era a correspondente às funções de 2.º Comandante-Geral, recebendo pela posição remuneratória 74 da TRU e não pela posição 60 a que correspondia a remuneração da sua posição na carreira como Major-General.
Fundamenta que se prevê no artigo 42.º do Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR) que o militar “... enquanto desempenhar cargo de posto superior, tem os direitos inerentes a esse posto, designadamente remuneratórios...”. O Tribunal a quo explicita que “...Assim, após transitar à reserva, e porque deixou de desempenhar as funções pelas quais era remunerado por referência ao nível remuneratório 74, o posto a considerar para efeitos do cálculo da remuneração, não pode deixar de ser o de Major-General e não o de Tenente-General. (evidenciado nosso)...”. E aqui reside, no seu entendimento, o erro nos pressupostos de direito da decisão de 1.ª instância.
Por oposição a este entendimento, o recorrente defende que “... O número um do artigo 119.º do EMFAR reza assim: o militar na situação de reserva tem direito a uma remuneração calculada com base no posto, posição remuneratória e tempo de serviço, tal como definido no presente Estatuto, bem como aos suplementos que a lei preveja como extensivos a esta situação. (os evidenciados são nossos). o que a norma do número um do artigo 119.º do EMFAR claramente nos diz é que a remuneração da reserva deve levar em conta vários factores, a saber: o posto, a posição remuneratória [e não a “posição remuneratória do último posto detido” ...] e o tempo de serviço...”. Conclui, referindo que a lei não faz nenhum apelo ao suposto conceito de “remuneração do último posto detido”, mas tão só ao conceito de “remuneração base mensal”, que mais não pode ser, a nosso ver, do que a remuneração base mensal efetivamente auferida pelo Militar na data em que transita para a situação de reserva.
Vejamos.
Em conformidade com os artigos 2.º e 3.º do EMFAR – Estatuto dos Militares das Forças Armadas, as formas de prestação de serviço militar são as seguintes: a) nos quadros permanentes (QP); b) em regime de contrato (RC); c) em regime de voluntariado (RV); d) decorrente de convocação ou mobilização.
Independentemente da forma de prestação de serviço, nos termos do artigo 43.º do EMFAR, o militar encontra-se numa das seguintes situações quanto à efetividade de serviço: a) na efetividade; b) fora da efetividade.
Por outro lado, os militares dos QP podem encontrar-se no ativo, na reserva ou na reforma, em conformidade com o artigo 140.º do EMFAR e o n.º 3 do artigo 112.º do EA – Estatuto da Aposentação.
Pois bem, a reserva é a situação para que transita o militar do ativo quando verificadas as condições estabelecidas nos artigos 152.º e 154.º do EMFAR, mantendo-se, no entanto, disponível para o serviço [cfr artigo 12.º do EMFAR], sendo que o militar na reserva pode encontrar-se na efetividade de serviço ou fora da efetividade de serviço.
Por outro lado, a transição dos militares (do ativo) para a reserva está sujeita ao preenchimento de uma das condições a seguir enunciadas:
a) No artigo 152.º do EMFAR: quando o militar tenha sido atingido o limite de idade estabelecido para o respetivo posto; tenham completado 20 ou mais anos de serviço militar (neste caso depende de requerimento e subsequente deferimento); declarem, por escrito, desejar passar à reserva depois de completar 36 anos de tempo de serviço militar e 55 anos de idade; sejam abrangidos por outras condições legalmente previstas;
b) No artigo 154.º do EMFAR: tenha sido atingido o limite de permanência no mesmo posto; que seja excluído da promoção ao posto imediato nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 185.º e no artigo 189.º do EMFAR.
No caso dos autos, está provado que o recorrente, sendo Major-General do Exército, se encontra na situação de reserva (facto A.). A seu requerimento pediu para transitar para a situação de reserva em 31 de maio de 2016 (facto D.).
Ora, e a questão a dilucidar é a de saber, na prática, qual a remuneração do recorrente, militar na reserva?
A remuneração dos militares na reserva (estejam ou não na efetividade de serviço) é composta por RB – remuneração base e SR – suplementos remuneratórios.
No caso dos autos, o recorrente passou à reserva, sem efetividade de funções, nos termos estabelecidos pelo disposto nos artigos 3.º, 4.º, 6.º e 15.º a 24.º do Decreto-Lei n.º 296/2009, de 14 de outubro [Estatuto Remuneratório] e artigo 121.º do EMFAR, definindo-se que se o militar se encontrar fora da efetividade de serviço [como é o caso do recorrente] – a remuneração na reserva corresponderia:
1) à 36.ª parte da remuneração base mensal multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a reserva, a qual não pode ser superior a 36;
2) à 36.ª parte do Suplemento de Condição Militar e dos suplementos de âmbito específico, recebidos no último posto do ativo, multiplicada pela expressão em anos do número de meses em que foi exercida a atividade que conferiu direito a esses suplementos, a qual não pode ser superior a 36.
E o militar que transitar para a situação de reserva por sua iniciativa (designadamente nos termos das alíneas b) e c) do artigo 152.º), só pode regressar à efetividade de serviço, a seu pedido, decorrido um ano sobre a data da mudança de situação e desde que haja interesse para o serviço (cfr. n.º 4 do artigo 155.º do EMFAR).
Por outro lado, determina o artigo 119.º do Estatuto dos Militares das Forças Armadas [EMFAR], aprovado pelo DL 90/2015, de 29 de maio, com a redação original, a aplicável aos autos, em especial:
Artigo 119.º
Remuneração na situação de reserva
1 - O militar na situação de reserva tem direito a uma remuneração calculada com base no posto, posição remuneratória e tempo de serviço, tal como definido no presente Estatuto, bem como aos suplementos que a lei preveja como extensivos a esta situação.
2 - O militar que esteja nas condições previstas nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 153.º tem direito a perceber remuneração, de montante igual à do militar com o mesmo posto e posição remuneratória na situação de ativo, acrescida dos suplementos que a lei preveja como extensivos a esta situação.
3 - O militar que transite para a situação de reserva ao abrigo da alínea d) do n.º 1 do artigo 153.º tem direito a perceber, incluindo na remuneração de reserva, o suplemento da condição militar, bem como outros suplementos que a lei preveja como extensivos a esta situação, calculados com base no posto, na posição remuneratória e na percentagem correspondente ao tempo de serviço.
4 - O militar que transitar para a situação de reserva ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 153.º e no artigo 155.º e que, por razões que não lhe sejam imputáveis, não tenha completado 40 anos de serviço efetivo, tem direito a completar aqueles anos de serviço na situação de reserva na efetividade de serviço, independentemente do quantitativo fixado nos termos da lei.
5 - Ao militar na situação de reserva que seja autorizado o exercício de funções públicas em quaisquer serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integram o setor empresarial regional e municipal e demais pessoas coletivas públicas é aplicável o regime de cumulações previsto no regime de proteção social aplicável.
6 - Os militares convocados para desempenhar cargos e exercer funções de interesse público no âmbito das missões das Forças Armadas, nos termos do artigo 156.º, mantêm o direito a auferir a remuneração de reserva ou a optar pela remuneração correspondente ao novo cargo ou função.

Determina, ainda, o artigo 18.º do EMFAR que “... 1 - O militar tem direito a auferir remuneração em função da forma de prestação de serviço, posto, tempo de serviço e cargo que desempenha, nos termos previstos em diploma próprio...”. E o artigo 26.º do EMFAR estatui que “... 1 - A hierarquia militar tem por finalidade estabelecer, em todas as circunstâncias, relações de autoridade e subordinação entre os militares e é determinada pelos postos, também designados por patentes, antiguidades e precedências previstos na lei. 2 - A hierarquia funcional decorre dos cargos e funções militares e respeita a hierarquia dos postos e antiguidade dos militares, ressalvados os casos em que a lei determine de forma diferente. 3 - As escalas hierárquicas dos militares são organizadas por ordem decrescente de postos e, dentro destes, de antiguidade relativa...”.
Quanto ao artigo 27.º do mesmo EMFAR, estabelece-se que “... A carreira militar é o conjunto hierarquizado de postos, desenvolvida por categorias, que se concretiza em quadros especiais e a que corresponde o desempenho de cargos e o exercício de funções diferenciadas entre si...”.
Por outro lado, dispõe o artigo 28.º/3 do mesmo diploma legal que o “posto” é a posição que, na respetiva categoria, o militar ocupa no âmbito da carreira militar e que a antiguidade do militar se avalia em cada posto, reportando-se à data fixada no respetivo documento oficial de promoção, considerando-se de menor antiguidade o promovido em data mais recente, conforme artigo 29.º do EMFAR.
Finalmente, sublinha-se o disposto no artigo 42.º do EMFAR, cujo n.º 3 determina que o militar, enquanto desempenhar cargo de posto superior, tem os direitos inerentes a esse posto, designadamente remuneratórios, mas que, nos termos do seu n.º 2, a nomeação para cargo a que corresponda posto superior tem caráter excecional e provisório.
Porém, por força do disposto no artigo 119.º/2 do EMFAR, o militar que esteja nas condições previstas nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 153.º tem direito a perceber remuneração, de montante igual à do militar com o mesmo “posto” e “posição remuneratória” na situação de ativo, ou seja, estando nessa situação o militar que declare, por escrito, desejar passar à reserva depois de completar 40 anos de tempo de serviço militar e 55 anos de idade, como foi o caso do recorrente (facto D.).
Tudo isto para chegarmos à conclusão de que a referência ao “posto”, “posição remuneratória” e “tempo de serviço” do militar, na determinação daquela que será a remuneração do militar na situação de reserva, não pode ter outro enquadramento que não o próprio Estatuto dos Militares das Forças Armadas, e respetivo Estatuto Remuneratório acima descrito.
Coisa diferente são “cargos” correspondentes a estruturas de, quer no Exército, como na GNR, determinando o artigo 21.º/2 da Lei n.º 63/2007, de 06 de novembro [Lei orgânica da GNR], que uma das estruturas de comando é o 2.º Comandante-geral, assim como se estatuindo, no caso, no artigo 13.º/3 do regime remuneratório dos militares da GNR que a remuneração base do titular de cargo de 2.º comandante-geral da Guarda é fixada por referência ao nível remuneratório 74 da tabela remuneratória única.
Por outro lado, o 2.º Comandante-geral é um tenente-general, nomeado pelo ministro da tutela, sob proposta do comandante-geral da Guarda e quando o nomeado for oficial general das Forças Armadas, a nomeação é feita com o acordo do membro do Governo responsável pela área da defesa nacional, conforme previsto no artigo 25.º da Lei n.º 63/2007, de 06 de novembro [Lei orgânica da GNR], do EMFAR.
Acresce sublinhar que, em matéria de remunerações dos militares das Forças Armadas na reserva, releva o artigo 15.º-A do DL 296/2009, de 14 de outubro, aprovado pelo DL 14/2020, de 7 de abril, entrado em vigor a 8 de abril de 2020, que aprovou uma norma interpretativa do antecedente artigo 15.º.
Na verdade, dispunha o artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 296/2009, de 14 de outubro, na sua redação atual, que aprovou o regime remuneratório aplicável aos Militares dos Quadros Permanentes (QP) e em regime de contrato (RC) e de voluntariado (RV) dos três Ramos das Forças Armadas, que “... 1 - A remuneração dos militares na situação de reserva é igual à 36.ª parte da remuneração base mensal multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a reserva, a qual não pode ser superior a 36. 2 - À remuneração referida no número anterior acresce uma parcela de valor igual à 36.ª parte do suplemento de condição militar e dos suplementos devidos pelo exercício de funções em particulares condições de perigosidade, insalubridade, risco e desgaste percebidos no último posto do ativo, multiplicada pela expressão em anos do número de meses em que foi exercida a atividade que conferiu direito aos suplementos, a qual não pode ser superior a 36. 3 - A remuneração dos militares na reserva na efetividade de serviço é igual à dos militares do ativo do mesmo posto e posição remuneratória...”.
Já o artigo 15.º-A do DL 14/2020, de 7 de abril, que veio interpretar o antecedente artigo 15.º, determinou que “... 1 - Do cálculo referido no artigo anterior não pode resultar para os militares em situação de reserva perceção de remuneração inferior à que resultaria da aplicação do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro. 2 - O número anterior não prejudica o disposto no n.º 4 do artigo 10.º do presente decreto-lei [Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro] ...”.
E determina o artigo 27.º/1 do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro que “... 1 - A remuneração dos militares na situação de reserva é igual à 36.ª parte da remuneração base mensal do respetivo posto e de outras remunerações abrangidas pelo n.º 1 do artigo 47.º do Estatuto da Aposentação, multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a reserva, o qual não pode ser superior a 36. 2 - À remuneração referida no número anterior acrescem, para efeitos de cálculo da remuneração na reserva e nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 47.º do Estatuto da Aposentação, o suplemento de serviço nas forças de segurança, sempre que a passagem à situação de reserva se tenha verificado ou venha a verificar-se em qualquer dos seguintes casos: a) Por limite de idade, estabelecido para o respetivo posto; b) Por declaração do próprio, após completar 36 anos de tempo de serviço; c) Por serem julgados fisicamente incapazes para o serviço ativo por competente junta médica que comprove ser a incapacidade resultante de acidente ocorrido em serviço ou por motivo do mesmo, ou de doença adquirida em serviço ou por motivo do mesmo...”.
Ora, sabemos que as normas interpretativas se integram nas leis interpretadas (vide artigo 13.º, n.º 1 do CC) e têm força vinculante de todas as leis. Contudo, uma das consequências, por natureza, deste tipo de normas é [a)] a fixação obrigatória de um certo sentido à lei interpretada, com exclusão de outros possíveis e [b)] a sua eficácia retrotrai-se à data da entrada em vigor da lei interpretada.
O seu caráter prescritivo e obrigatório da norma interpretativa não difere da força vinculativa. Portanto, não há dúvida de que as normas interpretativas produzem os seus efeitos retroativamente, confundindo-se com o preceito interpretado, de que fica fazendo parte integrante, formando os dois, desde a origem [ex tunc] um todo único, nos termos do artigo 13.º, n.º 1, do CC. Em síntese, a entrada em vigor do sentido normativo imposto pela lei interpretativa ocorre com a entrada em vigor da lei interpretada – Vide Acórdão TCA 395/17, processo n.º 751/2016, de 12 de julho de 2017.
Contudo, a lei/norma interpretativa não pode extravasar o sentido que a norma interpretada pode comportar, ou seja, a lei interpretativa não pode ser materialmente inovadora, não podendo representar uma nova e diferente valoração jurídica dos factos regulados pela lei/norma supostamente interpretada, pois que a ratio da norma interpretativa é fixar obrigatoriamente um determinado sentido à norma interpretada. Não se trata de fixar um novo direito, pois interpretar não é inovar.
Se se considerar a lei/norma interpretada inovadora, o Tribunal não poderá deixar de a considerar, mas fá-lo-á, antes, como substancialmente retroativa, sendo ela, apenas, formalmente interpretativa, e isso é tecnicamente distinto de uma lei materialmente interpretativa.
Portanto, há limites à retroatividade das leis interpretativas, quanto são materialmente interpretativas [as que impõem um dos sentidos comportados pela lei interpretada], como é o caso do princípio da confiança, ou seja, a sua aplicação retroativa está condicionada à não afetação arbitrária dos direitos dos destinatários da lei interpretada. Aqui, esta retroatividade não viola expectativas legítimas e fundadas dos destinatários dela, antes trazendo o benefício de trazer segurança à sua interpretação e uma justiça relativa da busca pela uniformidade de tratamento de casos idênticos.
Ora, quando a lei interpretativa é apenas formalmente interpretativa, por prever conteúdo inovador não contido da lei interpretada, considerando que os seus destinatários tinham como seguro as interpretações cabíveis na norma interpretada, a introdução de critérios inovadores, afeta a segurança jurídica, dando lugar, por isso, a uma norma substancialmente retroativa, e estando sujeita, em especial, ao princípio da confiança e da proporcionalidade.
Enfim, o último requisito da interpretação autêntica: a nova fonte não deve ser hierarquicamente inferior à fonte interpretada. E no caso dos autos, tal mostra-se cumprido.
Tal significa que esta norma interpretativa deve ser assumida desde os efeitos da norma interpretada, portanto retroativamente, confundindo-se com o preceito interpretado, de que fica fazendo parte integrante, formando os dois, desde a origem [ex tunc] um todo único, nos termos do artigo 13.º, n.º 1, do CC.
Assim, sendo, do cálculo referido da remuneração do militar na reserva não pode resultar para estes militares perceção de remuneração inferior à que resultaria da aplicação do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 298/2009, de 14 de outubro, ou seja, equivalente ao produto relativo à 36.ª parte da remuneração base mensal do respetivo “posto” e de outras remunerações abrangidas pelo n.º 1 do artigo 47.º do Estatuto da Aposentação, multiplicada pela expressão em anos do número de meses de serviço contados para a reserva, o qual não pode ser superior a 36, a que somará o suplemento de serviço nas forças de segurança. Ora, sempre por referência ao seu “posto” e não a “cargo” desempenhado em momento antecedente à situação de reserva.
E não há qualquer violação do princípio salário igual, trabalho igual, já que nada disso está em causa. De resto a violação deste princípio constitucional não foi sequer substanciado, como era seu dever, não explicitando o recorrente em que medida tal princípio foi violado.
Na verdade, o princípio para “trabalho igual salário igual” não proíbe que o mesmo trabalho prestado em quantidade, natureza e qualidade seja remunerado em termos quantitativamente diferentes. O que o princípio proíbe são as discriminações ou distinções sem fundamento material, designadamente porque assentes em meras categorias subjetivas. Tal princípio não compreende apenas um conteúdo negativo (a proibição de discriminações), mas comporta também uma vertente positiva, reclamando a igualdade substantiva de tratamento dos trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho aferido este pelos critérios da quantidade, natureza e qualidade.
Pois bem, nada disso está em causa, porquanto a discussão se centra em saber se a determinação concreta da remuneração de um militar que transitou para a condição de reserva está adequadamente calculado nos termos da lei.
Ora, desde logo, o recorrente confunde conceitos, designadamente entre o conceito de “posto” e de “cargo”.
Analisando.
O recorrente requereu a 5 de maio de 2016 a sua passagem à reserva, razão pela qual a 23 de maio de 2016 a ministra da Administração Interna o exonerou do cargo de 2.º Comandante-Geral da GNR (factos D. e E.). O despacho de exoneração do referido cargo foi publicado em DR a 6 de junho de 2016 (facto F.). Em consequência, o recorrente transitou para a condição de reserva em junho de 2016 (facto G.). Tal significa que foram formalmente cessadas as suas funções, como 2.º Comandante da GNR, em 23 de maio de 2016, regressando, tecnicamente, ao seu posto de origem, só transitando para a reserva em junho de 2016.
Depois, verifica-se que o Tribunal a quo fez uma adequada interpretação do direito aplicável aos factos, na medida em que as disposições legais que estabelecem a remuneração na reserva dos militares, a que acima nos referimos, foi adequadamente aplicada ao caso concreto, pois que o próprio recorrente confessa que ocupava o posto de Major-General do Exército, sendo remunerado na origem pela posição remuneratória 60 (facto A.), tendo sido nomeado para, provisória e temporariamente, ocupar, não diferente “posto”, mas um “cargo” de comando, esse sim remunerado pela posição remuneratória 74 (facto C.).
A remuneração de militar na reserva, sem efetividade de funções nunca se refere, para efeitos de cálculo da respetiva remuneração, à remuneração de “cargo” antecedentemente ocupado, mas antes à 36.ª parte da remuneração base mensal do respetivo “posto”, entre outras componentes.
E o “posto” corresponderá à posição que, na respetiva categoria, o militar ocupa no âmbito da carreira militar e que a antiguidade do militar se avalia em cada posto, reportando-se à data fixada no respetivo documento oficial de promoção, considerando-se de menor antiguidade o promovido em data mais recente, conforme artigo 29.º do EMFAR. E nada disto tem a ver com “cargo” de comando para o qual o militar possa estar nomeado transitória e provisoriamente.
Por fim, por força do disposto no artigo 119.º/2 do EMFAR, o militar que esteja nas condições previstas nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 153.º tem direito a perceber remuneração, de montante igual à do militar com o mesmo “posto” e “posição remuneratória” na situação de ativo, ou seja, estando nessa situação o militar que declare, por escrito, desejar passar à reserva depois de completar 40 anos de tempo de serviço militar e 55 anos de idade, como foi o caso do recorrente (facto D.), não pode passar, na reserva, a receber menos que outro militar no mesmo “posto”, que esteja no ativo. Mais uma vez não se pode confundir “posto” com “cargo de comando”.
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Em consequência, será de negar provimento ao recurso, por não provados os seus fundamentos e em manter a sentença recorrida, com a fundamentação antecedente.
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IV – DISPOSITIVO

Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, por não provados os seus fundamentos e em manter a sentença recorrida, com a fundamentação antecedente.
Custas pelo Recorrente.
Registe e Notifique.
Lisboa, dia 11 de abril de 2024
(Eliana de Almeida Pinto - Relatora)
(Helena Filipe – 1.º adjunto)
(Julieta França – 2.º adjunto)