Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04603/11
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/09/2011
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IMPUGNAÇÃO DE IRS.
IMPUGNAÇÃO DE VALORES PATRIMONIAIS E/OU DE ACTOS DE AVALIAÇÃO DIRECTA.
Sumário:I) -O nº 1 do artº134º, ainda do CPPT, prevê que podem ser impugnados no prazo de 90 dias após a sua notificação ao contribuinte os actos de fixação dos valores patrimoniais, com fundamento em qualquer ilegalidade, com a ressalva expressa no nº 7 do mesmo artigo que estabelece que a possibilidade de impugnação prevista e permitida não tem efeitos suspensivos e só é admitida depois de esgotados os meios graciosos previstos no processo de avaliação.

II) - Mas, resultando dos autos que ao tempo da dedução da presente impugnação não tinha a recorrente esgotado e contrariado pela via graciosa a defesa dos seus direitos como o impunha o nº 7 do artº 134º do CPPT, isso estaria dependente o recurso judicial pois se a impugnante discordava do valor encontrado em 1ª avaliação, tinha de requerer, necessariamente, uma segunda avaliação e só o resultado desta é que poderia ser impugnado.

III) - Assim, precludida a possibilidade de requerer a 2ª avaliação, o valor patrimonial atacado consolidou-se na ordem jurídica como «caso resolvido» já não podendo ser discutido em sede de impugnação do acto de liquidação da contribuição autárquica que nele se baseou.

IV) - Por outro lado, prevê-se nos artºs 9º e 95º da LGT que o processo judicial tributário é o meio que garante o «acesso à justiça tributária», dispondo este último preceito, ao que ao caso importa, que o «...interessado tem o direito de impugnar ou recorrer de todo o acto lesivo dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, segundo as formas de processo prescritas na lei» (nº1), podendo ser lesivos, designadamente “A fixação de valores patrimoniais” (nº2).

V) - Face à LGT e à factualidade apurada nos autos, suscita-se a questão prévia da falta de pressupostos da impugnação porquanto a impugnação a que estes autos se reportam visa a liquidação de IRS tendo por fundamento a errada avaliação da matéria tributável.

VI) -A impugnação da avaliação directa depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão por injunção do artigo 86º nºs 1 e 2 da LGT.

VII) -estando em causa a liquidação do IRS, como bem se aduziu na sentença recorrida, decorre do disposto no n°1, do art°15°, conjugado com a alínea a), do n°1, do art°27°, do Dec. - Lei n°287/2003, de 12.11, que sendo tais prédios objecto de transmissão após 1 de Janeiro de 2004, o valor de avaliação releva, não só para efeitos do IMI e do IMT, como também e por força do referido preceito do IRS, para efeitos de determinação do ganho resultante do valor de realização, sendo assim é forçoso concluir que, fixado em auto de avaliação o valor do prédio e não tendo o impugnante requerido 2ª avaliação, o valor ficou definitivamente fixado, sendo vedado ao tribunal colocá-lo em causa.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acorda-se, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo:
1. – VIRGINÍA …………….. e PAULO …….. vem sindicar a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra Beja, exarada a fls. 93/98 em 21 de Outubro de 2010 que lhes julgou improcedente a impugnação judicial que haviam deduzido contra o acto de liquidação adicional de IRS, do ano de 2007.
Em sede de alegações formularam as seguintes conclusões:
“1. A sentença dá como provado que o valor patrimonial tributário no montante de €245.790,00 relativo à metade transmitida serviu de base à liquidação de IMT nesse ano, mas, na verdade, a única Liquidação de IMT é a que consta na Escritura de Compra e Venda, outorgada em 19 de Julho de 2007, no valor de €3.250,00 (três mil duzentos e cinquenta euros).
2. O Tribunal a quo não considerou os demais factos alegados como provados, não obstante constarem dos documentos e informações oficiais juntos aos autos.
3.A sentença recorrida julgou totalmente improcedente a impugnação deduzida contra a Liquidação Adicional de IRS dos rendimentos que foram sujeitos a tributação referente ao exercício de 2007 com o número …………………, por considerar que foram os Recorrentes que sujeitaram tais rendimentos a tributação por via da Declaração de Substituição do Modelo 3 de IRS.
4. O Tribunal a quo indevidamente desconsiderou a entrega da 2ª. Declaração de Substituição, considerado o acto válido, quando, na verdade, o valor efectivamente declarado a considerar é o que consta da 2.ª Declaração de Substituição de Modelo 3 de IRS, entregue em 15 de Julho de 2009, ao abrigo das faculdades indiscutivelmente reconhecidas aos contribuintes nas suas relações com a Administração fiscal, e ao abrigo da presunção de veracidade que decorre da lei sobre as suas declarações.
5. A sentença recorrida invoca a aplicação do disposto no n.º1 do artigo 15.º, conjugado com a alínea a) do nº1 do artigo 27º do Decreto-Lei n.º287/2003 de 12 de Novembro, por força do previsto no n.°2 do artigo 44.° do CIRS, aplicando tais normativos para efeitos da determinação do ganho resultante do valor de realização.
6. Por outro lado, invoca a aplicação do nº 2 do artigo 39º da Lei Geral Tributária (LGT) para justificar, como critério legal de combate à evasão fiscal, o valor determinado por avaliação dos imóveis que se impõe aos valores declarados pelas partes.
7. O Tribunal faz uma errónea interpretação da norma contida no nº 2 do artigo 44º do (CIRS) e uma errada aplicação no caso concreto, que conduz a sentença recorrida a uma violação não apenas da norma contida no artigo 73º da (LGT) - que admite a possibilidade de prova em contrário relativamente às presunções consagradas em normas de incidência - mas ainda dos Princípios da Igualdade e da Capacidade Contributiva consagrados nos artigos 13º e 104º nº1 da CRP.
8. A sentença recorrida não reconhece uma presunção absoluta de rendimentos, uma presunção Jures et Jure, como expressamente proibida pelo nosso ordenamento jurídico, e aceita como valor de referência para efeitos de tributação das mais-valias imobiliárias o valor patrimonial definitivo, sem possibilidade de prova do preço efectivo.
9. Por não se ter pronunciado sobre de que forma se pode afastar, liminarmente, a suspeita de uma violação do principio da igualdade quanto aos contribuintes que obtêm ganhos derivados dos mesmos factos jurídicos, quando enquadráveis na categoria G, afastando a aplicação do n.°5 do artigo 31-° A do CIRS, a sentença encontra-se ferida de nulidade por omissão de pronúncia, devendo por isso ser reformulada.
10. A norma contida no nº 2 do artigo 44.° do CIRS, interpretada no sentido perfilhado pelo Tribunal a quo - tributação com base no valor patrimonial definitivo que serviu de base à liquidação de IMT sem admissão de prova em contrário, terá de considerar-se inconstitucional.
11. O Tribunal desconsiderou a prova apresentada pelos Recorrentes e interpretou erradamente as normas legais invocadas.
12. É pois evidente que a sentença recorrida merece total censura, devendo em consequência proceder totalmente o presente recurso, devendo o nº 2 do artigo 44º do CIRS ser considerado inconstitucional quando interpretado no sentido do Tribunal a quo, por violação expressa das normas contidas no artigo 13º e nº1 do artigo 104º, da CRP, e ainda por violação da norma contida no artigo 73º da LGT.
Termos em que deve o presente recurso proceder, revogando-se a sentença recorrida com todas as consequências legais.
Não houve contra -alegações.
A EPGA pronunciou-se no sentido de que o recurso não merece provimento por não se mostrar provado nenhum dos vícios apontados nas alegações recursórias.
Satisfeitos os Vistos legais, cumpre decidir.

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2.- Para a decisão importa ter em conta em sede fáctica o que consta do probatório da sentença, a saber:
1- Em 19.07.2007, os impugnantes venderam pelo preço de €50.000,00, a metade indivisa de um prédio urbano em regime de propriedade total, inscrito na matriz predial da freguesia de Almada sob o art° n° ……..°, com um valor patrimonial de € 39.875,92. - cfr. cópia da escritura de compra e venda, de fls 22 a 26, dos autos.
2- Os serviços da Adm Fiscal procederam à avaliação do imóvel referido em 1, e não tendo os interessados requerido uma segunda avaliação do mesmo foi determinado, em 26.05.2009, o valor patrimonial tributário no montante de €245.790,00 relativo à metade transmitida, o qual serviu de base à liquidação de IMT nesse ano.- Cfr "Notificações de Avaliação" de fls 27 a 35, dos autos.
3- Em 02.07.2009, os impugnantes apresentaram uma declaração de substituição da primeira declaração de rendimentos do ano de 2007, na qual consideraram o valor de transmissão do imóvel, de acordo com o valor patrimonial fixado anteriormente e referido em 2, na sequência da qual resultou uma liquidação adicional de IRS do ano de 2007, com o número 20095004707546, e correspondente nota de cobrança, no montante de €36.681,50- cfr. Demonstração de liquidação de IRS, de fls 65 e de fls 68, Nota de Cobrança de fls 67, "Prints Informáticos" de fls 77 a 81 , do P.A apenso.
4- Em 07.08.2009, os impugnantes apresentaram um requerimento com um pedido de prova do preço efectivo de transmissão de imóvel, tendo merecido despacho de indeferimento proferido em 20.08.09, pelo Director de Finanças Adjunto da D.F. de Lisboa, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido, por se haver entendido que aquele procedimento não se aplicava à determinação dos rendimentos qualificados como mais valias em sede de IRS - cfr. Oficio de fls 46, Informação e Despacho de fls 47 a 50, dos autos.
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Factos não Provados
Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.
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Motivação da decisão de facto
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.

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3. Atenta a ordem do julgamento estabelecida no artº 660º do CPC, aplicável ao recurso por força das disposições combinadas dos artºs. 713º nº 2 e 749º, ambos daquele Código, vemos que a questão a conhecer prioritariamente neste recurso, por, a proceder, prejudicar o conhecimento das demais, é a de saber se ocorre a excepção prévia suscitada pela FP na sua contestação de fls. 57 e ss e sobre a qual o MP se pronunciou na 1ª instância no parecer pré - sentencial de fls. 91 e para o qual remete a EPGA nesta instância, consistente em, por os impugnantes não terem requerido a segunda avaliação do imóvel, nos termos do artº76º do CIMI, não poderem discutir judicialmente o valor patrimonial de mesmo.
Ora, a sentença julgou improcedente a impugnação com base numa fundamentação que tem implícito o entendimento de que não podia discutir-se o valor encontrado na 1ª avaliação pois este teria de impor-se na de fixação da matéria tributável para efeitos de liquidação do IRS impugnado.
Com efeito, é o que se retira da fundamentação adoptada, do seguinte teor, com o qual se concorda adrede quanto à apreciação das demais questões:
(…)
Considerando que o que serviu de base à liquidação de imposto foi a própria determinação dos rendimentos sujeitos a tributação conforme declarado pelos contribuintes na respectiva Declaração Periódica, como resulta do n°3, do probatório.
Efectivamente, na sequência da apresentação de uma declaração periódica de substituição, foi efectuada a liquidação de imposto pela Adm. Fiscal, tendo considerado, para efeitos de determinação do ganho sujeito a IRS, o valor patrimonial definitivamente fixado em resultado da avaliação do prédio, conforme resulta do ponto 2 do probatório e de acordo com o declarado pelos próprios sujeitos passivos, pelo que será de considerar que o acto tributário encontra a sua fundamentação legal no rendimento colectável declarado, não relevando nessa sede a invocado erro na qualificação dos factos por parte dos contribuintes, estando devidamente cientes que o ganho que foi considerado como valor de realização era o que resultava do valor considerado para efeitos de liquidação do IMT, como de resto é patente na p.i.- cfr art° 6°, 14° e 15° da petição.
Quanto à errónea interpretação do disposto no n°2, do art° 44° do CIRS, devendo considerar-se o mesmo como revogado (tacitamente), e no sentido de o mesmo permitir a tributação com base no valor patrimonial definitivo que serviu de base à liquidação de IMT sem que se admita prova em contrário constituindo-se como uma presunção inilidível, o que violaria o principio constitucional da capacidade contributiva, importa que se diga que, nem aquela norma foi implicitamente revogada, nem a mesma se constitui como uma presunção legal, nem se vê em que é que aquela interpretação viola o princípio da capacidade contributiva, pois que, conforme decorre do disposto no n°1, do art° 15°, conjugado com a alínea a), do n°1, do art° 27°, do Dec.-Lei n° 287/2003, de 12.11, resulta que sendo tais prédios objecto de transmissão após 1 de Janeiro de 2004, o valor de avaliação releva, não só para efeitos do IMI e do IMT, como também e por força do referido preceito do IRS, para efeitos de determinação do ganho resultante do valor de realização. Em 2° lugar tal disciplina nada tem a ver com as regras que foram fixadas quanto a esses ganhos em sede de determinação do lucro tributável das actividades empresarias e profissionais que obedecem às normas próprias introduzidas por aquele mesmo Dec-Lei. - cfr art°s 3° a 6° daquele diploma. Em 3° lugar, a relevância do valor dos imóveis em sede de IRS em função do valor determinado por avaliação surge como um critério legal de combate à evasão fiscal, impondo-se aos próprios valores declarados pelas partes através de um negócio formal de compra e venda, o que encontra apoio legal na própria LGT, conforme resulta do disposto na 1° parte do n° 2, do art° 39° da mesma lei, não se tratando de um caso de presunção legal de rendimentos, antes de uma regra de aferição do valor de transmissão de imóveis. Por último diga-se que pelo facto de aquele valor do ganho resultar do valor de avaliação do imóvel, sendo que este último resulta dos factores objectivos fixados pelo legislador fiscal para a determinação do valor patrimonial dos prédios, nos termos do disposto nos art°s 38° e segs, do CIMI, pelo que não resulta, da sua aplicação ao caso vertente, qualquer violação do princípio da capacidade contributiva.”
Nenhuma censura nos merece o assim fundamentado e decidido que inteiramente se sufraga.
Na verdade, os recorrentes impugnaram a liquidação adicional de IRS, referente ao ano de 2007, incidente sobre as mais-valias derivadas da alienação de prédio sito na freguesia e concelho de Almada, ao qual foi fixado o valor patrimonial tributário de €491.580,00, com fundamento em errónea fixação deste valor patrimonial.
Ora, a determinação do valor patrimonial tributário dos imóveis encontra-se fixada no artigo 38º do CIMI, de acordo com a fórmula: Vt= Vc x A x Ca x CL x Cq x Cv.
Todavia, tais "critérios objectivos" para a determinação do valor patrimonial tributário fixados nos artigos 38º e seguintes do Código do IMI, foram flexibilizados com a entrada em vigor da Lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2009) cujo artigo 93º que deu nova redacção ao 76º daquele Código, em termos de que, quando a aplicação daqueles critérios conduza à fixação de um valor patrimonial tributário que se apresente distorcido relativamente ao valor normal de mercado (considerando-se como tal, para além de outra situação que aqui não importa considerar, um valor superior ou inferior em mais de 15% ao valor normal de mercado - cfr. o actual nº 5 do artigo 76º do Código do IMI), o valor patrimonial tributário dos terrenos para construção possa ser fixado por aplicação do método comparativo dos valores de mercado (cfr. o nº 4 do artigo 76º do Código do IMI, na redacção que lhe foi conferida pela Lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro).
Cfr., nesse sentido, o Acórdão de STA de 18.11.2009 (Relatora: Conselheira Isabel Marques da Silva), disponível em www.dgsi.pt.jsta.
Não obstante e como assertivamente enfatiza o MP na 1ª instância, “A nova redacção do artigo 76º do Código do IMI apenas entrou em vigor no dia 1 de Janeiro de 2009, pelo que não pode tal norma ser aplicada à avaliação efectuada em data anterior à sua entrada em vigor.(1)
Todavia, como refere a AT, os impugnantes não requereram a segunda avaliação do imóvel, nos termos do artigo 76º do CIMI, pelo que não podem discutir judicialmente o valor patrimonial do referido imóvel.”
Como se diz no Acórdão do TCA Sul de 23/09/2003- rec. 546/03, o acto de inscrição e fixação da matriz constitui, na verdade, não um mero acto preparatório, mas um autêntico acto pressuposto, o qual, não só prepara, como verdadeiramente condiciona e influencia o acto final de liquidação.
Na verdade, o acto pressuposto é o que tem por objecto fazer a qualificação jurídica de determinada situação da vida, qualificação essa que funciona como pressuposto de acto definitivo (cfr. Ac. do STA de 30/04/81, Ads 241-1). «In casu» o acto definitivo é a liquidação do tributo que pressupõe a prévia determinação da matéria colectável, do seu valor tributável e do respectivo titular.
Acresce que o objecto material da impugnação é o acto da liquidação, o acto tributário em sentido estrito (artºs. 99º e seguintes do C.P.P.T.) porque é esse o acto administrativo do qual resulta, com carácter definitivo e efeitos executórios, a declaração do direito do Estado a um determinado quantitativo pecuniário.
Todavia, nos termos do nº 1 do artº 96º do CPPT, o processo judicial tributário tem por função a tutela judicial dos direitos e interesses legalmente protegidos em matéria fiscal.
Acresce que nos termos do nº 1 do artº 134º do CPPT, constitui fundamento de impugnação judicial qualquer ilegalidade na errónea qualificação e quantificação dos valores patrimoniais.
O nº 1 do artº 134º, ainda do CPPT, prevê que podem ser impugnados no prazo de 90 dias após a sua notificação ao contribuinte os actos de fixação dos valores patrimoniais, com fundamento em qualquer ilegalidade, com a ressalva expressa no nº 7 do mesmo artigo que estabelece que a possibilidade de impugnação prevista e permitida não tem efeitos suspensivos e só é admitida depois de esgotados os meios graciosos previstos no processo de avaliação.
Nesse sentido, esclarece o nº 2 do artº 134º do CPPT que constitui motivo de ilegalidade, além da preterição de formalidades legais, o erro de facto ou de direito na fixação.
Mas, do presente processo de impugnação e em face do que se deixou provado, resulta que ao tempo da dedução da presente impugnação não tinha o recorrente esgotado e contrariado pela via graciosa a defesa dos seus direitos como o impunha o nº 7 do artº 134º do CPPT, do que estaria dependente o recurso judicial, sendo certo que a recorrente vislumbra no acto um erro na fixação do aludido valor.
Na verdade e de acordo com o artº76 do CIMI, quando o contribuinte não concordar com o resultado da avaliação efectuada, deverá requerer uma 2ª avaliação, o que significa que não poderá impugnar, desde logo, o resultado daquela 1ª avaliação como sucedeu no caso concreto em que a impugnante não requereu aquela avaliação nem a mesma foi promovida pelo sr. CRF nos termos do mesmo preceito.
Donde que, se a impugnante discordava do valor encontrado em 1ª avaliação, tinha de requerer, necessariamente, uma segunda avaliação, ao abrigo do referido artº76º do CIMI e só o resultado desta é que poderia ser impugnado.
Termos em que, precludida a possibilidade de requerer a 2ª avaliação, o valor patrimonial atacado se consolidou na ordem jurídica como «caso resolvido» já não podendo ser discutido em sede de impugnação do acto de liquidação de IRS que nele se baseou, estando o presente recurso votado ao fracasso.
Por outro lado, prevê-se nos artºs 9º e 95º da LGT que o processo judicial tributário é o meio que garante o «acesso à justiça tributária», dispondo este último preceito, ao que ao caso importa, que o «...interessado tem o direito de impugnar ou recorrer de todo o acto lesivo dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, segundo as formas de processo prescritas na lei» (nº1), podendo ser lesivos, designadamente, “A fixação de valores patrimoniais” (nº2).
Face à LGT e à factualidade apurada nos autos, suscita-se a questão prévia da falta de pressupostos da impugnação porquanto a impugnação a que estes autos se reportam visa a liquidação de IRS tendo por fundamento a errada avaliação da matéria tributável.
Ora, como é manifesto, os impugnantes não deduziram impugnação contenciosa directa do acto de avaliação directa, sendo certo que a impugnação da avaliação directa depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão por injunção do artigo 86º nºs 1 e 2 da LGT.
Não tendo usado nenhum desses meios, não era, pois, admissível impugnação contra o acto de liquidação com aquele fundamento.
O fundamento base da impugnação estriba-se na ilegalidade da decisão de corrigir, por avaliação directa, o valor tributável, o que decorre do teor da impugnação e todas as peças posteriores em que todos os fundamentos concretos que ditaram a decisão de recurso a método directo para avaliação do valor tributável foram objecto de contestação.
Assim, a impugnação da liquidação é directa e reportada a matéria que visa apenas pôr em causa a avaliação da matéria tributável.
Definindo o âmbito da avaliação directa, dispõe o Artigo 81.° da LGT que:
1. A matéria tributável é avaliada ou calculada directamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstos na lei.
No preceito faz-se a referência cumulativa a avaliação e cálculo da matéria colectável e dir-se-á, na senda de Diogo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, LGT Comentada e Anotada, 3ª ed., pág. 418 e ss, que a designação de avaliação estará reservada para os casos em que a determinação da matéria tributável é feita através de métodos que, mesmo com uti­lização de critérios objectivos (como exige o n°1 do art. 84° da L.G.T.), não podem dei­xar de envolver uma margem de subjectividade, como sucede nos casos de determinação do valor de bens (entre outros casos, para efeitos de sisa, imposto sobre sucessões e doa­ções, contribuição autárquica, em certos casos, direitos alfandegários e imposto automó­vel) e naqueles em que a determinação é feita utilizando métodos indirectos.
Destarte as referências a avaliação circunscrevem-se aos casos em que houver aplicação de elementos de carácter subjectivo.
Ora, decorre do artº 81º da LGT que a utilização da avaliação directa é a regra como meio de determinação da matéria tributável e que tem carácter subsidiário da ava­liação indirecta, que só pode ser utilizada dentro do condicionalismo e nos casos previs­tos na lei.
E, como se disse, essa regra, tem um âmbito de aplica­ção limitado aos casos em há a necessidade de utilização de elementos subjectivos.
Conforme preceitua o Artigo 83.° da LGT a avaliação directa, visa a determinação do valor real dos rendi­mentos ou bens sujeitos a tributação (nº 1) e a avaliação indirecta (que o contribuinte disse ter sido utilizada) visa a determinação do valor dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária disponha (nº 2).
Resulta do inciso legal transcrito que quer a avaliação directa como a indirecta têm por fim determinar o valor dos ren­dimentos ou bens sujeitos a tributação, nos seguintes termos:
a) -no primeiro caso, a avaliação é feita com base em elementos de prova do valor real dos bens ou rendimentos tributáveis e, por isso, visa-se determinar com exactidão este valor;
b) -Os casos em que se procede a avaliação indirecta, indicados no art. 87.° da L.G.T., são situações em que não existem elementos fiáveis suficientes para demonstrar exacta­mente o valor daqueles bens ou rendimentos.
De resto, dado o seu carácter excepcional, apenas se procede a avaliação indirecta em casos em que não seja viável determi­nar a matéria tributável através de avaliação directa, quer por falta de elementos para esta ser levada a cabo, quer por haver razões para suspeitar que o valor a que conduz a apli­cação dos métodos de avaliação directa não é a matéria tributável real [arts. 87.°, n.° l, alínea c), e 89.° da L.G.T.].
É forçoso concluir, pois, que a avaliação directa se realiza seguindo critérios objectivos em acatamento do comando legal contido no Artigo 84.° que impõe a utilização de critérios técnicos ao determinar que a avaliação dos rendimentos ou valores sujeitos a tributação baseia-se em critérios objectivos (nº 1), devendo a fundamentação da avaliação conter obrigatoriamente a indica­ção dos critérios utilizados e a ponderação dos factores que influenciaram a determinação do seu resultado (nº 2).
Assim, e de acordo com a lei, a avaliação efectuada pela AT tem de basear-se em critérios objectivos, com a possível base técnico - científica, pois da análise das razões que levaram à atribuição do valor tributável e não de outro, o percurso lógico que foi seguido na avaliação para chegar ao resultado alcançado, terá de estar em perfeito silogismo, demonstrado integralmente de forma objectiva, quer quanto aos ele­mentos utilizados quer quanto ao método de cálculo que tenha sido utilizado.
Isso apesar de a objectividade não poder ser concretizada totalmente, pois para realizar a avaliação foram ponderados factores claramente subjectivos.
É por isso que, segundo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, a exigência de objectivi­dade nos critérios de avaliação terá de ser meramente tendencial, a objectividade possí­vel no caso concreto, que se traduzirá, nos casos em que têm de ser valorados factores subjectivos, na utilização de uma fundamentação que ultrapasse a estrita subjectividade e permita controlar a correcção dos juízos formulados.
Daí que como requisito maior da fundamentação do acto de avaliação, figure a exigência de que ela contenha a indicação dos critérios utilizados e a ponderação dos fac­tores que influenciaram a determinação do seu resultado, devendo esta indicação e ponderação dar a conhecer, na sua totalidade, o itinerário seguido na avaliação para se alcançar o valor da matéria tributável, permitindo conhecer integralmente as razões por que foi atingido esse valor e não qualquer outro.
É, pois, indiscutível que nos encontramos perante uma avaliação directa, havendo que atentar no regime leal de impugnação judicial, regulado no artigo 86.° da LGT, de acordo com o qual:
1. A avaliação directa é susceptível, nos termos da lei, de impugnação contenciosa directa.
2. A impugnação da avaliação directa depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão.
Registe-se que a redacção do n.° 2 foi introduzida pela Lei n.° 100/99, de 26 de Julho, sendo a sua redacção inicial a seguinte:
2. A impugnação da avaliação indirecta depende do esgotamento dos meios administrativos previstos para a sua revisão.
Como ensinam os ilustres anotadores, em anotação ao artº 86º da LGT e na sede indicada, no contencioso tributário vigora o princípio da impugnação unitária, nos ter­mos do qual só há impugnação contenciosa do acto final do procedimento, que afecta imediatamente a esfera patrimonial do contribuinte, fixando a posição final da adminis­tração tributária perante este, definindo os seus direitos ou deveres.
Este princípio é concretizado no art. 66.° desta Lei e no art. 54.° do C.P.P.T., em que se estabelece que, salvo quando forem imediatamente lesivos dos direitos do contribuinte ou disposição expressa em sentido diferente, não são susceptíveis de impugnação conten­ciosa autónoma os actos interlocutórios do procedimento, sem prejuízo de poder ser invo­cada na impugnação da decisão final qualquer ilegalidade anteriormente cometida.
No entanto, por vezes, a lei prevê a impugnabilidade contenciosa imediata de actos anteriores ao acto final do procedimento, que têm especial relevo para condicionar a - "decisão final.
Estes actos preparatórios da decisão final que são directa e imediatamente impug­náveis por via contenciosa assumem a natureza de actos destacáveis.
Ora, vindo os impugnantes atacar o acto de liquidação não podem servir-se dos fundamentos que tivessem para atacar a avaliação directa e, designadamente, não poderão sustentar que a matéria tributável a considerar não é a que foi utilizada, para efectuar a liquidação.
Na presente impugnação, que foi deduzida contra a liquidação com base em quantificação com a qual os contribuintes não concordam, não são invocados fundamentos legalmente admissíveis para a atacar já que apenas discorda da quantificação da matéria colectável que lhe serviu de base.
Assim, no âmbito deste processo de impugnação, o tribunal não pode conhecer do acto pressuposto ou prejudicial, de que a liquidação é consequente. E, na verdade, tratando-se de acto administrativo, e enquanto tal (como objecto directo do pedido), o tribunal não pode dele tomar conhecimento no âmbito dum processo de impugnação, por estar prevista via processual autónoma para o efeito: cf. art. 86° n.° 1 da LGT.
De acordo com Alberto Xavier, o acto tributário pode ser definido como o acto que aplica uma norma reguladora de uma obrigação de imposto, ou seja, uma norma material, definindo no caso concreto a existência e o quantitativo da prestação tributária individual.
E, atendendo à função exercida pelos mais diversos actos praticados no processo {iter} de definição desse acto tributário (actos que lhe são complementares), a definição que caberia ao acto de avaliação em causa seria, segundo esse ilustre autor, a de acto pressuposto, cuja nota característica reside na " (...) função de reconhecimento ou qualificação de situações previstas pela norma tributária e apenas dentro das quais se poderá praticar legitimamente o acto tributário ou poderá praticar-se de certo modo" e, enquanto acto pressuposto, ele constitui uma questão prejudicial não impugnável autonomamente.
É certo que, usando as palavras de Jorge de Sousa, as ilegalidades que afectam o acto tributário e constituem fundamento de impugnação judicial podem não ocorrer directamente em relação a ele mas sim relativamente a actos procedimentais preparatórios cuja ilegalidade se repercute no acto subsequente que tem aqueles como pressuposto.
Ora, no caso em apreço, o acto de avaliação ao qual são imputadas as ilegalidades constitui um acto autónomo, uma questão prejudicial pelo que, se a invalidade do acto prejudicial não pode ser directamente invocada preclude-se o seu conhecimento, que já não poderá ser solicitado a respeito do acto prejudicado.
Como veio de provar-se, foi em decorrência do acto de avaliação directa que foi operada a liquidação impugnada, donde que é uma consequência do ajustamento obrigatório resultante do caso resolvido formado por aquele uma vez que não foi atacado na oportunidade, sendo que o que os serviços da AT fizeram foi proceder aos correspondentes ajustamentos.
A esta luz, a liquidação configura a prática de um acto administrativo consequente. Este, é aquele que é praticado ou dotado de certo conteúdo em virtude da prática de acto anterior; isto é, estamos na presença de actos consequentes quando a Administração prática um acto no qual se alicercem outros.
A lei considera a impugnabilidade de um acto cometido no procedimento que culmina com a liquidação que era o acto de "fixação definitiva do imposto". Ou seja, na falta de reacção autónoma mediante impugnação contenciosa, o acto de avaliação e o respectivo quantum consolidava-se, tornando indiscutí­vel os seus eventuais vícios.
Mas não assim quanto aos vícios próprios do acto tributário de liquidação que na impugnação da liquidação podiam ser sus­citados, porque se tratariam de vícios de um acto não destacável, inserido no procedimento que culmina com a própria liquidação. O princípio da impugnação unitária impõe que todos os vícios ocorridos ao longo do procedimento sejam denun­ciados na impugnação do seu acto terminal, salvo quan­do a lei destaque como autonomamente sindicável um acto intermédio.
Todavia, na parte final do n.° 2 do artº 86º da LGT, estabelece-se o “princípio da exaustão dos meiso graciosos” determinando-se que a impugnação contenciosa do acto de avaliação directa apenas é possível após estarem esgotados os meios de impugnação administrativa, que estiverem previstos na lei.
Como se viu, na redacção inicial deste n.° 2, só quanto à avaliação indirecta é que se pre­via a necessidade de esgotamento dos meios administrativos de impugnação, mas, actualmente e já ao tempo da dedução da impugnação, o esgotamento dos meios administrativos justifica-se quer na avaliação directa como na indirecta, sempre que haja uma avaliação propriamente dita, com intervenção de elementos subjectivos, e não um mero cálculo, baseado em operações matemáticas.
Como salientam Diogo Leite de Campos e os Exmºs. Conselheiros Benjamim Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, obra citada, pág. 427,a subjectividade inerente a qualquer avaliação (seja directa, como a determinação do valor de um imóvel, seja a indirecta, como a assente em presunções) recomenda um esgotamento dos mecanismos administrativos de reapreciação, como meio de procurar diminuir essa carga subjectiva e, tendencialmente, promover a fixação tão objectiva quanto possível da matéria colectável, desejada pela lei (art. 84.°, n.°1, da L.G.T.)- exigência, de resto, feita pelo contribuinte no uso do seu direito de audição.
Tendo em conta os critérios próprios do CIMI - (cfr. nº 1 do artº 81º da LGT) os meios administrativos previstos para a revisão eram a 2ª avaliação nos termos do artº.76º do CIMI.
Significa isto que, em face da necessidade de esgotamento dos meios administrativos, foi impugnado contenciosamente um acto de avaliação directa antes do esgotamento de tais meios, havendo ilegalidade na impugnação, que torna indiscutível o valor encontrado.
Ademais, estando em causa a liquidação do IRS, como bem se aduziu na sentença recorrida, decorre do disposto no n°1, do art° 15°, conjugado com a alínea a), do n°1, do art° 27°, do Dec.-Lei n° 287/2003, de 12.11, que sendo tais prédios objecto de transmissão após 1 de Janeiro de 2004, o valor de avaliação releva, não só para efeitos do IMI e do IMT, como também e por força do referido preceito do IRS, para efeitos de determinação do ganho resultante do valor de realização, sendo assim é forçoso concluir que, fixado em auto de avaliação o valor do prédio e não tendo o impugnante requerido 2ª avaliação, o valor ficou definitivamente fixado, sendo vedado ao tribunal colocá-lo em causa.
Do que vem dito, resulta que a sentença não incorreu na nulidade por omissão de pronúncia que lhe é assacada na conclusão 9ª pois, a solução que deu ao caso e cuja justeza se reforçou na presente fundamentação, prejudicou implicitamente a apreciação da questão de saber de que forma se podia afastar, liminarmente, a suspeita de uma violação do princípio da igualdade quanto aos contribuintes que obtêm ganhos derivados dos mesmos factos jurídicos, quando enquadráveis na categoria G, afastando a aplicação do n°5 do artigo 31-° A do CIRS, como prejudicada ficou a questão da inconstitucionalidade da norma contida no nº 2 do artigo 44° do CIRS, interpretada no sentido perfilhado pelo Tribunal a quo - tributação com base no valor patrimonial definitivo que serviu de base à liquidação de IMT sem admissão de prova em contrário, suscitada na conclusão 10ª.
Termos em que improcedem as conclusões recursivas, sendo de manter o acto impugnado.
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3. Face ao exposto acordam os Juízes deste TCAS em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.
Custas pelos recorrentes.

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Lisboa, 09/11/2011
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Joaquim Condesso)

(1) Isso no que tange à 1ª avaliação, pois se a 2ª fosse requerida na vigência dessa lei, já seria aplicável, como se defende no douto aresto do STA citado.