Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:5526/01
Secção:Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/14/2002
Relator:Francisco Rothes
Descritores:OPOSIÇÃO
PRESCRIÇÃO
DIREITOS ADUANEIROS
SOBRETAXA DE IMPORTAÇÃO
DIREITOS ABOLIDOS
LEI GERAL TRIBUTÁRIA
LEI 87-B/98, DE 31 DE DEZEMBRO
Sumário:I- A prescrição refere-se à obrigação tributária e o início do seu prazo está reportado exclusivamente ao facto tributário.
II- Assim, concedidas a título provisório a isenção de 50% dos direitos aduaneiros e a isenção da sobretaxa de importação com referência à importação de bens de equipamento efectuada entre os anos de 1982 e 1983, benefícios que vieram a ser declarados caducados por despacho proferido em 1996, o facto tributário não deixa de ser a importação daqueles bens, momento ao qual deverá referir-se o início do prazo da prescrição da respectiva obrigação, pois estamos perante impostos de obrigação única, ainda que até à data em que foi declarada a caducidade daqueles benefícios inexistisse a obrigação de imposto.
III- Não pode, pois, pretender-se que o prazo de prescrição se inicia apenas com o despacho que declarou a caducidade e, muito menos, com a sua notificação ao contribuinte, pois tais ocorrências não se confundem com o facto tributário.
IV- Os direitos aduaneiros da Pauta de Importação nacional e sobretaxa de importação foram abolidos com o termo da 1.ª etapa da Adesão de Portugal às Comunidades Europeias (então Comunidade Económica Europeia), de acordo com os arts. 190.º, 196.º, 198.º e 266.º do Acto de Adesão.
V- Nos termos do disposto no art. 48.º, n.º 1, da LGT, e 5.º, n.º 2, do DL n.º 398/99, de 17 de Dezembro, em relação aos impostos abolidos o prazo de prescrição de oito anos fixado por aquela lei conta-se todo o tempo decorrido, independentemente de suspensões ou interrupções.
VI- Assim, atento o disposto nos arts. 48.º, n.º 1, da LGT, e 5.º, n.º 2, e 6.º, do DL n.º 398/99, de 17 de Dezembro, as dívidas de direitos tributários e sobretaxa de importação originadas pela importação de bens de equipamento em 1982 e 1983 prescreveram em 1 de Janeiro de 1999.
VII- Apesar do art. 53.º, n.º 2, da Lei n.º 87-B/98, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 1999), ter excluído da previsão do art. 5.º, n.º 2, do DL n.º 398/99, de 17 de Dezembro, os direitos aduaneiros e a sobretaxa de importação, tal exclusão só se tornou eficaz e, por isso, obrigatória, em 16 de Janeiro de 1999, data em que aquela lei foi publicada.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:1. RELATÓRIO
1.1 A sociedade denominada I... (adiante Recorrente, Oponente ou Executada) recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo (STA) da sentença da 1.ª instância que julgou improcedente a oposição por ela deduzida contra a execução que corre termos contra ela para cobrança da quantia de esc. 5.112.784$00 proveniente de direitos aduaneiros, sobretaxa de importação e juros compensatórios.

1.2 Na petição inicial da oposição, a Executada, como causa de pedir do pedido de que a execução fosse julgada extinta, invocou a prescrição da dívida exequenda, alegando para o efeito, em síntese, que, tendo os factos tributários ocorrido entre 1981 e 1983, data da importação dos bens, quando foi notificada para pagar a dívida, em 1998, tinha já decorrido o prazo de prescrição de oito anos estabelecido no art. 48.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT), bem como o prazo de 10 anos do art. 34.º do Código de Processo Tributário (CPT).

1.3 Na sentença recorrida considerou-se, em síntese:
- que o prazo prescricional só começa a contar-se da notificação do despacho que declarou a caducidade dos incentivos aduaneiros, em 1996, motivo por que nunca as dívida exequendas estariam prescritas, qualquer que fosse o regime legal aplicável, o do Código de Processo das Contribuições e Impostos (CPCI), o do CPT ou o da LGT;
- ainda que assim não fosse, ou seja, que o prazo prescricional começasse a contar-se da data em que foram efectuadas as importação, e atento o disposto no art. 279.º do Código Civil (CC), à data da sentença (8 de Setembro de 2000) não estava ainda prescrita a dívida, qualquer que fosse o regime legal da prescrição aplicável.

1.4 A Recorrente apresentou alegações, que concluiu nos seguintes termos:

«
I. Salvo melhor opinião, o Meritíssimo Juiz a quo não decidiu bem relativamente ao pedido formulado pela Agravante, na oposição que deduziu à execução, de declaração de extinção da mesma, por prescrição da dívida exequenda.
II. De facto, como ficou provado nos presentes autos, a ora Agravante importou, entre 1981 e 1983, diversos bens de equipamento, tendo, por requerimento de 4 de Dezembro de 1981, solicitado os incentivos fiscais e financeiros previstos nos arts. 12º e 13º do Decreto-Lei nº 194/80, de 1 de Junho, posteriormente revogado pelo Decreto-Lei nº 132/83, de 18 de Março, tendo os referidos incentivos sido concedidos, provisoriamente, por despacho do Secretário de Estado do Planeamento, por delegação do Ministro das Finanças e do Plano, datado de 27 de Dezembro de 1983.
III. Nos termos do art. 43º do mencionado Decreto-Lei nº 194/80, a concessão definitiva daqueles incentivos estava condicionada à realização, sujeita a verificação, dos objectivos constantes do projecto de investimento da Agravante, dentro dos correspondentes prazos, bem como à observância das demais condições constantes da mencionada decisão ministerial.
IV. O não cumprimento dos referidos objectivos e condições implicava, de acordo com o nº 3 do referido art. 43º, a caducidade de todos os benefícios concedidos à Agravante.
V. Sucede que, por não ter sido possível, à Agravante, apresentar todos os elementos constantes nos nºs. 3 e 9 da Portaria nº 229/86, de 21 de Maio, com as alterações introduzidas pela Portaria nº 472/86, de 28 de Agosto, dentro dos prazos previstos, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, por delegação do Ministro das Finanças, proferiu, em 5 de Agosto de 1996, um despacho definitivo determinando a caducidade dos mencionados incentivos.
VI. A mencionada Portaria nº 229/86 previa um prazo de 90 dias, a contar da data da sua publicação, para a entrega de todos os elementos necessários à comprovação do investimento.
VII. Não tendo a Agravante entregue todos esses elementos até 19 de Agosto de 1986, os referidos incentivos, nos termos do já citado nº 3 do art. 43º do Decreto-Lei nº 194/80, caducaram, automaticamente.
VIII. Nos termos do nº 1 do artigo 5º do Decreto-Lei nº 398/98, de 17 de Dezembro, que aprovou a Lei Geral Tributária, e do nº 1 do art. 48º da aludida Lei, as dívidas tributárias prescrevem no prazo de oito anos (10 anos, tendo em conta o prescrito no já revogado nº 1 do art. 34º do C.P.T. e no nº 1 do art. 297º do Código Civil), contando-se o prazo de prescrição a partir da data em que o facto tributário ocorreu, isto é, o facto gerador do imposto.
IX. O facto gerador do imposto, no caso em apreço, foi, indubitavelmente, a importação dos referidos bens pela Agravante, facto este verificado há mais de dezasseis anos!
X. Dos factos expostos, não consegue a Agravante perceber qual o raciocínio utilizado pelo Meritíssimo Juiz a quo para concluir que da análise do aludido nº 3 do artigo 43º do Decreto-Lei nº 194/80 se verifica que o prazo prescricional só começou a correr a partir do momento em que a Agravante foi notificada do despacho que determinou a caducidade dos incentivos aduaneiros, uma vez que, de acordo com o Meritíssimo Juiz a quo, o facto tributário se manteve, até essa data, em suspensão e, em consequência, o prazo prescricional só se iniciou a partir de então.
XI. Por um lado, o Meritíssimo Juiz a quo não fundamenta esta sua conclusão, limitando--se a emiti-la, e, por outro lado, do mencionado nº 3 do art. 43º, não pode resultar qualquer conclusão que vá no sentido da alcançada pelo Meritíssimo Juiz a quo.
XII. De facto, o nº 3 do art. 43º, determina que o não cumprimento dos objectivos e condições a que aludem os números anteriores do mesmo artigo, implica, entre outras consequências, a caducidade de todos os benefícios concedidos à empresa promotora.
XIII. Se as dívidas tributárias prescrevem no prazo de oito anos (10 anos, tendo em conta o prescrito no já revogado nº 1 do art. 34º do C.P.T. e no nº 1 do art. 297º do Código Civil), contando-se o prazo de prescrição a partir da data em que o facto tributário ocorreu, isto é, o facto gerador do imposto, e se, no caso em apreço, o facto gerador do imposto foi a importação dos referidos bens pela Agravante, facto este verificado há mais de dezasseis anos, então, a dívida exequenda, há muito prescreveu.
XIV. Prescrição esta que Agravante volta a evocar para todos os devidos efeitos.

Resolvendo no sentido da total procedência do presente recurso e da revogação da decisão recorrida, com a consequente declaração de extinção da execução, com base na prescrição da dívida exequenda, só assim Vossas Excelências farão, como sempre,
JUSTIÇA!» (() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, constituem transcrições.).

1.5 Não houve contra-alegações.

1.6 O STA declarou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do recurso, declarando competente para o efeito esta Tribunal Central Administrativo (TCA), ao qual o processo foi remetido a pedido da Recorrente.

1.7 O Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento, remetendo para o parecer do Ministério Público junto do STA, nos termos do qual o recurso deve ser julgado improcedente porque se não verifica a prescrição invocada, quer se aplique a LGT, quer o CPT, quer o Código de Processo das Contribuições e Impostos.

1.8 A questão que cumpre apreciar e decidir é a de saber se a sentença enferma de erro de julgamento por ter considerado que a dívida exequenda não se encontrava prescrita.

* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

Na sentença recorrida deu-se como provada a seguinte matéria de facto:

A) - A Fazenda Pública instaurou execução fiscal, que tomou o n.º 98/102049.8 da 2.ª Repartição de Finanças de Torres Vedras, instaurada contra a executada para cobrança coerciva da quantia de 5.112.784$00 proveniente de imposições devidas pela mercadoria constante do processo de cobrança n.º 58/98, da Divisão de Procedimentos Aduaneiros e Fiscais – Conferência Final e Valor da Direcção das Alfândegas de Lisboa, sendo:
- 875.988$00 de direitos aduaneiros,
- 1.098.060$00 de sobretaxa de importação e
- 3.138.736$00 de juros compensatórios.

B) - As imposições exequendas respeitam a importação de bens de equipamento através dos Bilhetes de Despacho n.ºs 81934/82, 82332/82, 1955/83 e 91797/82, processados na Delegação Aduaneira de Xabregas, conforme doc. de fls. 95 a 96.

C) - Por despacho provisório do Sr. Secretário de Estado de 27.12.83 foi concedida, nos termos do DL. n.º 194/80, a redução de 50% dos direitos aduaneiros devidos pela importação, em virtude da mercadoria estar integrada num projecto de investimento.

D) - Foi igualmente concedida a isenção de sobretaxa de importação ao abrigo do DL. n.º 271-A/75, de 31 de Maio.

E) - Porque a oponente não apresentou todos os elementos necessários à concessão efectiva dos incentivos nos prazos legais, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, ao abrigo do disposto no art.º 43º n.ºs 1 a 4 do DL. n.º 194/80, proferiu em 05.08.96 um despacho definitivo determinando a caducidade dos incentivos provisoriamente concedidos.

F) - Com base no despacho referido na alínea anterior, o Sr. Director das Alfândegas de Lisboa notificou em 14.08.98 a ora recorrente para proceder ao pagamento da quantia global de 5.112.784$00, discriminada na al. A) supra, conforme doc. de fls. 95 a 96.

G) - Apesar de notificada para o pagamento das ditas quantias nos termos e para os efeitos indicados no indicado documento/ofício de fls. 95 a 96, a oponente não as pagou, pelo que para a cobrança das mesmas foi instaurada a execução identificada na al. A) supra.

H) - A citação da executada para a execução fiscal foi efectuada no dia 08.04.99, conforme documento de fls. 111 a 112 e informação oficial de fls. 9 a 9vº.

I) - A oposição foi deduzida no dia 28 de Abril de 1999.

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2.2 DE DIREITO

2.2.1 SOBRE O DOCUMENTO APRESENTADO PELA RECORRENTE A FLS. 177/178

A fls. 177/178 a Recorrente veio juntar cópia de uma sentença proferida pela 2.ª Secção do 3.º Juízo do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Lisboa num processo de impugnação de um acto de liquidação de receitas tributárias aduaneiras e pela qual, declarando a prescrição da dívida aduaneira impugnada, o Tribunal julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.
Pretende a Recorrente, se bem interpretamos a sua alegação, que tal declaração de prescrição se imporia neste processo de oposição, uma vez que a liquidação aí impugnada seria a mesma que deu origem à dívida aqui exequenda.
Salvo o devido respeito, não é assim, ou, pelo menos, não é assim em relação a toda a dívida exequenda pois, como resulta linearmente da cópia da sentença que foi junta, a liquidação impugnada reporta-se a direitos respeitantes à importação de equipamentos efectuada através do Bilhete de Despacho n.º 82333/82, enquanto a dívida exequenda teve a sua origem nos direitos respeitantes à importação de equipamentos efectuada, não só através daquele Bilhete de Despacho, mas também nos que têm os n.ºs 28422/82, 81934/82, 1955/83 e 91797/82 (cfr. alínea B) do factos provados).
Assim, a argumentação da Recorrente só poderá colher em relação à parte da dívida exequenda que se refere à importação de equipamentos efectuada ao abrigo daquele Bilhete de Despacho e já não em relação à parte restante.
Justificar-se-ia, pois, a sugestão feita pelo Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal, de que se notificasse a Recorrente para juntar aos autos certidão da sentença de que foi junta cópia, com nota de trânsito em julgado, bem dos demais elementos pertinentes para estabelecer eventual correspondência entre a liquidação ali impugnada e a que deu origem à dívida exequenda ou a parte dela.
No entanto, como resulta da decisão a proferir, tal diligência revelar-se-á inútil e, por isso, a dispensamos.

2.2.2 DA PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA EXEQUENDA

2.2.2.1 SOBRE O INÍCIO DO PRAZO DA PRESCRIÇÃO

Contrariamente ao que sustenta a sentença recorrida, o início do prazo de prescrição não ocorreu com a notificação do despacho que declarou a caducidade dos benefícios que foram provisoriamente concedidos à Oponente, traduzidos na isenção de 50% dos direitos aduaneiros e na isenção da sobretaxa de importação.
O início do prazo da prescrição só pode reportar-se ao facto tributário, sendo de todo irrelevante para esse efeito o momento em que se efectua a liquidação (() Neste sentido e com abundante fundamentação, vide o acórdão do STA de 22 de Outubro de 1997, proferido no recurso com o n.º 21.813 e publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Março de 2001, págs. 2704 a 2707.). De igual modo, é irrelevante, quer para efeitos de início do prazo de prescrição, quer para efeitos da sua suspensão ou interrupção, que tenham sido provisoriamente concedidos benefícios fiscais e, depois, declarada a sua caducidade. Em caso algum se pode considerar que o facto tributário é o despacho que declarou a caducidade dos benefícios (() Neste sentido, vide o acórdão do STA de 20 de Dezembro de 2000, proferido no recurso com o n.º 25.616.) e, muito menos, a notificação desse despacho, motivo por que não pode referir-se a nenhum desses momentos o início do prazo da prescrição, como parece ter-se sustentado na sentença recorrida.
Assim, concedidos a título provisório a isenção de 50% dos direitos aduaneiros e isenção da sobretaxa de importação com referência à importação de bens de equipamento efectuada entre os anos de 1982 e 1983, benefícios que vieram a ser declarados caducados por despacho proferido em 1996, o facto tributário não deixa de ser a importação daqueles bens, momento ao qual deverá referir-se o início do prazo da prescrição da respectiva obrigação, pois estamos perante impostos de obrigação única, ainda que até à data em que foi declarada a caducidade daqueles benefícios inexistisse a obrigação de imposto.
Note-se, finalmente, numa tentativa de encontrar explicação para a posição assumida na 1.ª instância, que os regimes relativos à suspensão e interrupção dos prazos são diversos na prescrição e na caducidade, por força da diferente natureza destes dois institutos. Assim, enquanto o prazo da caducidade se suspende por força da concessão de benefícios fiscais susceptíveis de caducar, este mesmo facto é irrelevante para o decurso do prazo da prescrição (arts. 34.º, n.º 3, do CPT, e 4.º, n.º 2, 11.º, 12.º, n.º 3, e 50.º, n.º 6, do Estatuto dos Benefícios Fiscais (DL n.º 215/89, de 1 de Julho) e, hoje, o art. 46.º, n.º 2, alíneas b) e c), da LGT).

2.2.2.2 A ABOLIÇÃO DOS DIREITOS ADUANEIROS NACIONAIS E SOBRETAXA ADUANEIRA

As dívidas exequendas têm origem em direitos aduaneiros da Pauta de Importação nacional e sobretaxa aduaneira e tiveram origem nos anos de 1982 e 1983 (cfr. alíneas A) e B) dos factos provados).
Tais impostos foram abolidos com o termo da 1.ª fase da adesão de Portugal à então denominada Comunidade Económica Portuguesa, de acordo com o disposto nos arts. 190.º, 196.º, 198.º e 266.º do Acto de Adesão.

2.2.2.3 A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA EM EXECUÇÃO

Nos termos do disposto no art. 48.º da LGT, aprovada pelo DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro, o prazo da prescrição das dívidas tributárias passou a ser de oito anos, a contar, no caso dos impostos de obrigação única, da data em que o facto tributário ocorreu.
Pese embora o n.º 1 do art. 5.º do referido DL n.º 398/88 determinar que ao novo prazo de prescrição se aplica o art. 279.º do CC, o n.º 2 daquele preceito legal criou um regime de excepção para os casos que se reportam a impostos já abolidos. Para estes, «aplicam-se os novos prazos de prescrição, contando-se para o efeito todo o tempo decorrido, independentemente de suspensões ou interrupções de prazo».
Significa isto, tendo ainda em conta que a LGT entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1999, por força do disposto no art. 6.º do DL n.º 398/98, que a obrigação tributária em causa – respeitante a direitos aduaneiros e sobretaxa de importação dos anos de 1982 e 1983 – prescreveu nessa data (() Neste sentido, vide os acórdãos do STA de 15 de Junho de 2000 e de 14 de Novembro de 2001, proferidos nos recursos com os n.ºs 24.688 e 26.074.).
Assim, fica prejudicada a questão de indagar da eventual prescrição da obrigação tributária à luz dos regimes do CPCI e do CPT, sempre se adiantando que em 1 de Janeiro de 1999 não podia verificar-se, pois não tinham ainda decorrido vinte anos sobre o mais antigo dos factos tributários, nem dez anos sobre a data da entrada em vigor do CPT (cfr. arts. 27.º do CPCI, 34.º do CPT e 279.º do CC).

2.2.2.4 NÃO APLICAÇÃO DO ART. 53.º, N.º 2, DA LEI N.º 87-B/87

Poderá eventualmente argumentar-se que não tem aplicação ao caso o prazo de prescrição do art. 48.º da LGT, uma vez que o art. 53.º, n.º 2, da Lei n.º 87-B/87, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 1999), estabelecendo uma excepção à regra geral prevista no art. 5.º, n.º 2, do DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro, excluiu dessa regra os direitos (aduaneiros) nacionais e a sobretaxa de importação.
No entanto, como é do conhecimento público, o Diário da República em que aquela lei se contém – 5.º Suplemento ao Diário daquela data – só foi distribuído em 16 de Janeiro de 1999.
Como é sabido, o art. 119.º, da Constituição da República Portuguesa, que se refere à publicidade dos actos legislativos, impõe a publicação das leis no Diário da República, sob pena de ineficácia jurídica.
Também o art. 5.º, n.º 1, do CC, estabelece que a lei só se torna obrigatória depois de publicada no jornal oficial.
Por outro lado, a Lei n.º 6/83, de 29 de Julho, que tem subjacente a publicação como condição da eficácia de qualquer diploma legal, recomenda ao legislador que a data do diploma seja a da sua publicação e que esta se concretize no dia correspondente ao da sua data (cfr. art. 1.º). No que se refere ao começo da vigência, diz o art. 2.º daquela lei que o diploma legal entra em vigor no dia nele fixado, ou na falta de fixação, no continente no quinto dia após a sua publicação e nos Açores e Madeira no décimo quinto dia.
Assim, em sede de eficácia/obrigatoriedade das leis o que releva é a sua efectiva publicação no Diário da República, como tem vindo a afirmar desde sempre e uniformemente a jurisprudência (() Cfr., entre outros, o acórdãos do STA, de 28 de Dezembro de 1985, este do Pleno, e de 30 de Novembro de 1988, proferidos nos recursos com os n.ºs 15.165 e 4.356, respectivamente, bem como os Pareceres da Procuradoria-Geral da República, de 1 de Março de 1978 e de 10 de Janeiro de 1985, publicados, respectivamente, no Boletim do Ministério da Justiça n.º 290, pág. 115, e no Diário da República, II série, n.º 234, de 11 de Outubro de 1985.).
Não pode, pois, considerar-se que a data do início da vigência da Lei n.º 87-B/98 seja a constante da sua publicação, como está previsto no seu art. 87.º, sendo antes de entender como data de início de vigência, à face dos princípios expostos, aquela em que ela foi efectivamente publicada, ou seja, 16 de Janeiro de 1999.
Assim, porque a Lei n.º 87-B/98 não prevê, quanto a esta matéria, a sua eficácia retroactiva (() E, se o fizesse, por certo seria de considerar-se a respectiva norma como inconstitucional por violadora do princípio da não retroactividade das leis fiscais, que mereceu consagração no art. 103.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa, na redacção em vigor à data (revisão de 1997), como judiciosamente se adverte no já referido acórdão do STA de 14 de Novembro de 2001.), há que concluir que quando a mesma entrou em vigor, em 16 de Janeiro de 1999, já a prescrição da dívida exequenda se tinha consumado, nos termos que ficaram referidos em 2.2.2.3, ao abrigo das disposições legais então em vigor (() Neste sentido, vide os mesmos acórdãos referidos na nota (4), cuja exposição se seguiu de muito perto, quando não se transcreveu.).
*
A dívida exequenda está, pois, prescrita, motivo por que será dado provimento ao recurso e, declarando a prescrição, a oposição será julgada procedente e extinta a execução.

2.2.3 CONCLUSÕES
Preparando a decisão, formulam-se as seguintes conclusões:

I – A prescrição refere-se à obrigação tributária e o início do seu prazo está reportado exclusivamente ao facto tributário.

II – Assim, concedidas a título provisório a isenção de 50% dos direitos aduaneiros e a isenção da sobretaxa de importação com referência à importação de bens de equipamento efectuada entre os anos de 1982 e 1983, benefícios que vieram a ser declarados caducados por despacho proferido em 1996, o facto tributário não deixa de ser a importação daqueles bens, momento ao qual deverá referir-se o início do prazo da prescrição da respectiva obrigação, pois estamos perante impostos de obrigação única, ainda que até à data em que foi declarada a caducidade daqueles benefícios inexistisse a obrigação de imposto.

III – Não pode, pois, pretender-se que prazo de prescrição se inicia apenas com o despacho que declarou a caducidade dos benefícios e, muito menos, com a sua notificação ao contribuinte, pois tais ocorrências não se confundem com o facto tributário.

IV – Os direitos aduaneiros da Pauta de Importação nacional e sobretaxa de importação foram abolidos com o termo da 1.ª etapa da Adesão de Portugal às Comunidades Europeias (então Comunidade Económica Europeia), de acordo com os arts. 190.º, 196.º, 198.º e 266.º do Acto de Adesão.

V – Nos termos do disposto no art. 48.º, n.º 1, da LGT, e 5.º, n.º 2, do DL n.º 398/99, de 17 de Dezembro, em relação aos impostos abolidos o prazo de prescrição de oito anos fixado por aquela lei conta-se todo o tempo decorrido, independentemente de suspensões ou interrupções.

VI – Assim, atento o disposto nos arts. 48.º, n.º 1, da LGT, e 5.º, n.º 2, e 6.º, do DL n.º 398/99, de 17 de Dezembro, as dívidas de direitos tributários e sobretaxa de importação originadas pela importação de bens de equipamento em 1982 e 1983 prescreveram em 1 de Janeiro de 1999.

VII – Apesar do art. 53.º, n.º 2, da Lei n.º 87-B/98, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento de Estado para 1999), ter excluído da previsão do art. 5.º, n.º 2, do DL n.º 398/99, de 17 de Dezembro, os direitos aduaneiros e a sobretaxa de importação, tal exclusão só tornou eficaz e, por isso, obrigatória, em 16 de Janeiro de 1999, data em que aquela lei foi publicada.
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3. DECISÃO
Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo acordam, em conferência, em conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida e, considerando prescrita a dívida exequenda, julgar procedente a oposição e declarar extinta a execução fiscal.

Sem custas.

Lisboa, 14 de Maio de 2002