Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07026/13
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:02/13/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”).
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL.
VÍCIOS DE ACTIVIDADE CONTRAPÕEM-SE AOS VÍCIOS DE JULGAMENTO.
PROCEDIMENTO DE INSPECÇÃO INTERNO OU EXTERNO. CRITÉRIO DO LUGAR DA REALIZAÇÃO.
QUESTÕES NOVAS.
Sumário:1. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr.artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil).
2. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma.
3. A sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso.
4. Quanto ao lugar da realização, o procedimento de inspecção pode classificar-se como interno ou externo, consoante os actos que o integram se efectuem, respectivamente, nas dependências orgânicas e nos serviços da Administração Tributária ou em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais entidades abrangidas. Note-se que para que possa ser classificado como interno, o procedimento deve materializar-se em actos, todos eles, praticados exclusivamente nos serviços da Fazenda Pública, instalações ou dependências, designadamente, através da análise formal e de coerência dos documentos da escrita do contribuinte. Caso contrário (isto é, caso existam actos praticados fora, ainda que diminutos), estaremos perante um procedimento externo (cfr.artº.13, do R.C.P.I.T., aprovado pelo dec.lei 413/98, de 31/12). Esta classificação é de extrema relevância na medida em que apenas o procedimento externo tem a virtualidade de suspender o prazo de caducidade do direito à liquidação, não tendo o procedimento interno esse efeito, conforme se retira do artº.46, nº.1, da L.G.T.
5. A qualificação dada pela Administração Fiscal a um procedimento não tem carácter vinculativo, se vier a revelar-se que o conteúdo dos actos praticados for contrário à qualificação dada, isto é, a classificação formal do procedimento será, posteriormente, validada, ou não, pelos actos que a Administração Tributária efectivamente praticar. Numa situação em que os actos materialmente praticados revelam a existência de um procedimento distinto daquele que foi formalmente indicado pela Administração, ou seja, um procedimento externo “de facto”, embora formalmente qualificado como interno, os vícios referentes à falta de notificação prévia ao sujeito passivo exigida pelo artº.49, nº.1, do R.C.P.I.T., bem como a ausência de ordem de serviço exigida pelo artº.46, nº.2, do mesmo diploma, devem ter como consequência a invalidade de uma eventual liquidação, nomeadamente, levando à sua anulação.
6. O direito português segue o modelo do recurso de revisão ou reponderação (modelo que tem as suas raízes no Código Austríaco de 1895). Daí que o Tribunal “ad quem” deva produzir um novo julgamento sobre o já decidido pelo Tribunal “a quo”, baseado nos factos alegados e nas provas produzidas perante este. Os juízes do Tribunal de 2ª. Instância, ao proferirem a sua decisão, encontram-se numa situação idêntica à do juiz da 1ª. Instância no momento de editar a sua sentença, assim valendo para o Tribunal “ad quem” as preclusões ocorridas no Tribunal “a quo”. Nesta linha, vem a nossa jurisprudência repetidamente afirmando que os recursos são meios de obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos Tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do Tribunal de que se recorre, visto implicar a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição.


O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
“... - ... ”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mmª. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.62 a 73 do presente processo, através da qual julgou improcedente a presente impugnação tendo por objecto liquidações adicionais de I.V.A. e juros compensatórios, relativas ao ano de 2003 e no montante total de € 93.714,10.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.85 a 91 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Ao contrário do decidido, a ordem de serviço deveria ter sido comunicada à recorrente, nomeadamente para efeitos de contagem do prazo da caducidade do direito à liquidação, que é diferente, caso haja ou não cumprimento de prazos da inspecção;
2-O nº.1, do artº.46, da Lei Geral Tributária, é muito claro a este respeito. A douta sentença deveria ter levado em conta que a ordem de serviço deve ser notificada ao contribuinte, ou o início da acção de inspecção externa;
3-A recorrente não foi notificada, através de membro dos seus órgãos directivos ou de algum colaborador, do relatório da inspecção, desconhecendo quem é Ângela Rocha, que a Senhora Juíza deu como provado que recebeu o relatório da inspecção;
4-Foi preterido o direito essencial de defesa e audiência do contribuinte, omissão de formalida­de essencial que torna nulo todo o procedimento inspectivo e inquina de vício de forma todo o procedimento, sendo também nulo o acto administrativo final de liquidação;
5-Nos termos do disposto no nº.2, do artº.45, da Lei Geral Tributária, o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de três anos, quando haja recurso a métodos indiciários. É o caso: a caducidade ocorreu em 31/12/2006;
6-Cabia à Administração Fiscal, nos termos do disposto no artº.74, nº.2, da Lei Geral Tributá­ria, comprovar quaisquer notificações da recorrente, elementos que a existirem lhe não foram notificados em 1ª. Instância, pelo que o Tribunal “ad quem” deverá anular oficiosamente a douta sentença, ordenando a repetição do julgamento, com ampliação da matéria de facto;
7-Foi violado o regime do artº.268, nº.3, da Constituição, que estabelece: “Os actos adminis­trativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente prote­gidos”;
8-A douta sentença recorrida omitiu o conhecimento desta questão. Trata-se de omissão que deve ser suprida, com anulação do julgamento;
9-Termos em que, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, revogando-se a douta sentença recorrida, com as legais consequências, ou, caso assim não seja entendido, ser anulado o julgamento, com baixa dos autos, à 1ª. Instância, para renovação da prova, com as legais consequências. Assim se fará BOA JUSTIÇA.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.102 dos autos).
X
Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.64 a 68 dos autos - numeração nossa):
1-Em cumprimento do despacho interno nº.DI200700306, de 2007/04/09, foi iniciada uma acção inspectiva relativa à impugnante, referente ao ano de 2003 (cfr.relatório de inspecção junto a fls.29 a 41 do processo instrutor apenso);
2-O despacho identificado no ponto anterior foi substituído pela ordem de serviço interna nº.OI200700262, de 2007/06/26 (cfr.relatório de inspecção junto a fls.29 a 41 do processo instrutor apenso);
3-Através do ofício nº.02237, de 11 de Julho de 2007, foi remetido o projecto de correcções do relatório de inspecção, para a sede da impugnante, através de carta registada com aviso de recepção, tendo o aviso sido assinado por Fernando José Barata Vasco (cfr.cópia do ofício e do aviso de recepção juntos a fls.46 a 47 do processo instrutor apenso);
4-A 3 de Agosto de 2007, foi elaborado o relatório de inspecção, que aqui se considera integralmente reproduzido (cfr.relatório de inspecção junto a fls.29 a 41 do processo instrutor apenso), onde consta, nomeadamente, o seguinte:
"(…)
1.3.2. Imposto sobre o Valor Acrescentado – IVA

1.3.2.1. IVA Liquidado

O sujeito passivo contabilizou nas contas 72.4.0223, 72.4.0230 e 72.1.1.0222, prestações de serviços e transmissões de bens conexas relativas à actividade de aluguer de ginásio e de cacifos e à actividade dos campos de férias, considerando que as mesmas estão sujeitas a IVA, nos termos do artigo 4° do CIVA, a associação deveria ter liquidado IVA no montante de € 81.017,23 (ver ponto 3.2.).
(...)

2.2. Motivo, âmbito e incidência temporal

A Direcção de Serviços de Consultadoria Jurídica e do Contencioso (DSCJC), através do ofício n° 3715, de 28/12/2006, enviado para a Direcção de Serviços de Planeamento e Coordenação da Inspecção Tributária (OSPCIT) que, posteriormente, o enviou para esta Direcção de Serviços (Entrada n° 92 de 2007/01/08), solicita que se desse cumprimento ao despacho de 20/12/2006, do Senhor Subdirector-Geral e se executasse o n° 2 do despacho do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 29/05/2006, no que respeita à matéria referida na segunda parte do n° 9.3 e no n° 8.2.3, alinea b), do parecer n° 67/2006 da DSCJC. Estes pontos referem "que se deverá realizar uma acção de fiscalização às entidades Associação Cristã da Mocidade - Covilhã e Associação Cristã da Mocidade - Nacional, visando não só a situação tributária, mas também as actas da reunião das Direcções das aludidas entidades onde se deliberou a sua representação pelo funcionário Joaquim Gaspar e as deslocações ao seu serviço na cidade de Lisboa e a outros locais". Neste sentido, efectuou-se uma acção de inspecção à ... .
Nos termos da alinea a) do n.° 1 do artigo 14° do RCP1T, aprovado peto Decreto-Lei n.° 413/98, de 31/12, o âmbito desta acção classifica-se em Geral e incide sobre o exercício de 2003.
(…)

3.2. Imposto sobre o Valor Acrescentado – IVA

IVA em falta - imposto não liquidado pelo sujeito passivo

Da análise efectuada verifica-se que:

a) Alugueres do ginásio e dos cacifos

No caso concreto desta associação, a mesma considerou indevidamente como isentos de IVA (enquadrando-os no nº 9 do artigo 9°), os alugueres do ginásio e dos cacifos. De acordo com o entendimento dos Serviços do IVA (Despacho de 15/09/93, Proc. A 425 93 004, do SAIVA), a cedência das instalações desportivas, quer a empresas, quer a outras entidades não se encontra abrangida pelo nº 9 do artigo 9° do CIVA, na medida em que não são utilizadoras directas, mas apenas intermediários na sua utilização. Assim, estas actividades estão sujeitas a IVA, nos termos do n° 1 do artigo 4° do CIVA, sendo a taxa de IVA a aplicar de 19%, nos termos do artigo 18°, n" 1, alínea c) do mesmo código. Este imposto toma-se exigível nos termos dos artigos 7° e 8° do CIVA.

b) Campo de férias

No que respeita à actividade dos campos de férias em instalações locadas, esta associação considerou indevidamente a mesma isenta de IVA (enquadrando-a no n° 8 do artigo 9° do CIVA). Esta isenção abrange as prestações de serviços e transmissões de bens estritamente conexas efectuadas no exercício da actividade dos campos de férias por quaisquer equipamentos sociais pertencentes a pessoas colectivas de direito público ou a instituições de solidariedade social. As referidas prestações de serviços e transmissões de bens encontram-se igualmente isentas quando efectuadas por equipamentos sociais pertencentes a quaisquer outras entidades, seja ou não prosseguida uma finalidade lucrativa.
No entanto, para que a isenção anteriormente referida se verifique, toma-se necessário o reconhecimento da utilidade social de tais equipamentos, o que deverá ser feito, caso a caso, pelos Centros Regionais de Segurança Social que emitirão, para o efeito, a respectiva declaração de reconhecimento dessa utilidade social.
Por outro lado, a isenção do n° 8 do artigo 9° abrange somente as prestações de serviços e transmissões de bens efectuadas aos utentes directos dos equipamentos nele referidos, não se aplicando, consequentemente, às prestações de serviços e transmissões de bens efectuadas ao exterior, nomeadamente a quaisquer prestações de serviços e transmissões de bens facturados a terceiros, ainda que no exercido da actividade normal em que se inserem essas entidades ou como sua consequência. A isenção aplica-se só aos utentes directos dos equipamentos sociais nela referidos, quer sejam sócios ou não.
Em conformidade com o exposto, verifica-se que esta associação não preenche os pressupostos da isenção prevista no artigo 9º, nº 8. Efectivamente, não sendo esta associação pessoa colectiva de direito público (apenas tem reconhecida a utilidade pública), nem instituição particular de solidariedade social, nem possuindo os equipamentos o reconhecimento de utilidade social pela entidade competente, é evidente que os serviços prestados pela referida entidade não se encontram abrangidos pela isenção em referência. E isto verifica-se, quer nas prestações de serviços e transmissões de bens conexas efectuadas aos sócios da referida entidade, quer nos serviços prestados a entidades terceiras.
Assim, a actividade dos campos de férias está sujeita a IVA, nos termos do nº 1 do artigo 4° do ClVA, sendo que as taxas a aplicar, nos termos do artigo 18°, n° 1 do mesmo código, poderão ser diferentes conforme os serviços prestados sejam facturados globalmente ou sejam facturados separadamente.
Se os serviços forem facturados globalmente, a taxa a aplicar é de 19% (taxa em vigor em 2003).
Se os serviços forem facturados separadamente, isto é, alojamento, refeições e outros serviços, as taxas a aplicar serão em conformidade com os diferentes serviços prestados, sendo que:
> em relação ao alojamento, que inclui o pequeno almoço desde que não seja objecto de facturação separada, a taxa é de 5%* (verba 2.15 da Lista l);
> em relação às refeições a taxa é de 12%* (verba 3.1 da Lista II);
> e em relação aos outros serviços, porque não constantes de nenhuma das listas anexas ao CIVA, a taxa é de 19%*

* taxas em vigor em 2003

Deste modo, a associação em causa deveria ter procedido à liquidação do imposto relativamente à actividade de aluguer de ginásio e de cacifos e à actividade dos campos de férias pelo que, não o tendo feito, o IVA em falta totaliza o montante de € 81.017,23, assim discriminado (ver anexo 2):

Base Tributável
IVA em falta
Data de Entrega
da DP do IVA
Janeiro
14.811,90
2.814,26
10/03/2003
Fevereiro
8.709,00
1.671,81
10/04/2003
Marco
54.459,80
10.347,36
10/05/2003
Abril
18.152,00
3.448,88
10/06/2003
Maio
39-197,35
7.447,50
10/07/2003
Junho
63579,75
12.023,15
10/08/2003
Julho
34.954,08
6641,28
10/09/2003
Agosto
46.198,88
8.777,79
10/10/2003
Setembro
17.091,23
3.247,33
10/11/2003
Outubro
126.641,13
24.061,81
10/12/2003
Novembro
1.788,85
339,88
10/01/2004
Dezembro
1.032,50
196,18
10/02/2004
Total
426.406,47
81.017,23

5-Através do ofício nº.02554, de 7 de Agosto de 2007, foi remetido o relatório de inspecção, com as correcções resultantes da acção de inspecção, para a sede da impugnante, através de carta registada com aviso de recepção, tendo o aviso sido assinado por Ângela Rocha (cfr.cópia do ofício e do aviso de recepção juntas a fls.50 a 54 do processo instrutor apenso);
6-A 17 de Outubro de 2007, foi a impugnante notificada das liquidações de I.V.A. nº. 07284352 (0301), no valor de € 2.814,26, nº. 07284463 (0302), no valor de € 1.671,81, nº. 07284354 (0303), no valor de € 10.347,36, nº. 07284356 (0304), no valor de € 3.448,88, nº. 07284360 (0305), no valor de € 7.447,50, nº. 07284465 (0306), no valor de € 12.023,15, nº. 07284362 (0307), no valor de € 6.641,28, nº. 07284364 (0308), no valor de € 8.777,79, nº. 07284366 (0309), no valor de € 3.247,33, nº. 07284368 (0310), no valor de € 24.061,81, nº. 07284467 (0311), no valor de € 339,88, nº. 07284370 (0312), no valor de € 196,18, todas com data limite de pagamento a 30 de Novembro de 2007 (cfr.cópias das notificações juntas à p.i. a fls.9 a 20 dos presentes autos e fls.64 a 75 do processo instrutor apenso);
7-A 22 de Outubro de 2007, foi a impugnante notificada das liquidações de juros compensatórios nº. 07284353 (0301), no valor de € 507,41, nº. 07284464 (0302), no valor de € 291,49, nº. 07284355 (0303), no valor de € 1.750,83, nº. 07284357 (0304), no valor de € 572,33, nº. 07284361 (0305), no valor de € 1.212,00, nº. 07284466 (0306), no valor de € 1.914,48, nº. 07284363 (0307), no valor de € 1.035,68, nº. 07284365 (0308), no valor de € 1.340,00, nº. 07284367 (0309), no valor de € 484,70, nº. 07284369 (0310), no valor de € 3.512,37, nº. 07284468 (0311), no valor de € 48,38, nº. 07284371 (0312), no valor de € 27,30, todas com data limite de pagamento a 30 de Novembro de 2007 [cfr.documentos juntos a fls.76 a 87 do processo instrutor apenso);
8-A 29 de Fevereiro de 2008 foi interposta a presente impugnação judicial (cfr.carimbo de entrada do 2º. Serviço de Finanças de Lisboa, aposto a fls.3 dos autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Nada mais se provou com interesse para a decisão a proferir…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Assenta a convicção deste Tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos e no processo instrutor, não impugnados, referidos a propósito de cada alínea do probatório…”.
X
Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apensos este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
9-Na p.i. que originou o presente processo, mencionada no nº.8 da matéria de facto, que a entidade recorrente, “... - ... ”, com o n.i.p.c. 500 032 238, titula como impugnação judicial, apresenta como fundamentos (cfr.p.i. junta a fls.3 a 7 dos presentes autos):
a)que desconhece a razão de ser das liquidações impugnadas, porquanto as mesmas nunca lhe foram comunicadas ou notificadas; desconhecendo se foi instaurado algum procedimento inspectivo, uma vez que não foi notificada de qualquer ordem de serviço, ou para exercer o direito de audição prévia, em violação do direito de defesa nos termos do artº.60, da L.G.T.;
b)que foi ultrapassado o prazo de caducidade do direito à liquidação de quatro anos, em violação do disposto no artº.45, nº.1, da L.G.T.;
c)que foi violado o princípio da fundamentação do acto tributário, consignado nos artºs.77, da L.G.T., 61, do R.C.P.I.T., bem como no artº.268, nº.3, da Constituição da República Portuguesa;
d)terminando a pedir a procedência da presente impugnação, em consequência do que devem ser anuladas as liquidações identificadas nos nºs.6 e 7 supra.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar improcedente a presente impugnação, mais mantendo os actos tributários objecto do presente processo (cfr.nºs.6 e 7 do probatório).
X
Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar e como supra se alude, que foi violado o regime do artº.268, nº.3, da C.R.Portuguesa, que estabelece: “Os actos adminis­trativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente prote­gidos”. Que a douta sentença recorrida omitiu o conhecimento desta questão. Trata-se de omissão que deve ser suprida, com anulação do julgamento (cfr.conclusões 7 e 8 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar, supomos, nulidade por omissão de pronúncia.
Deslindemos se procede a nulidade da sentença suscitada pelo recorrente.
A sentença é uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias. Tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto. Esta peça processual pode padecer de vícios de duas ordens, os quais obstam à eficácia ou validade da dicção do direito:
1-Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e então a consequência é a sua revogação;
2-Por outro, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artº.615, do C.P.Civil.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13).
Mais se dirá que a sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, não sendo deduzido recurso (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).
Trata-se, em qualquer caso, nesta nulidade, de falta de pronúncia sobre questões e não de falta de realização de diligências instrutórias ou de falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas. A falta de realização de diligências constituirá uma nulidade processual e não uma nulidade de sentença. A falta de avaliação de provas produzidas, tal como a sua errada avaliação, constituirá um erro de julgamento da matéria de facto. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e referir se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P. Tributário).
Mais, a nulidade de omissão de pronúncia impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr.artº.608, nº.2, do C.P.Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade da sentença, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artºs.577 e 578, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artº.133, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac.T.C.A.Sul-2.ªSecção, 25/8/2008, proc.2569/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.365).
Revertendo ao caso dos autos, nas conclusões do recurso, o recorrente, segundo percebemos, alega o vício de omissão de pronúncia em virtude da sentença recorrida não ter examinado a suposta violação do regime previsto no artº.268, nº.3, da C.R. Portuguesa.
Ora, tal alegação não é verdadeira, como muito bem sabe o recorrente, aproximando-se, perigosamente, da negligência grosseira substancial típica da litigância de má-fé (cfr. ac.T.C.A.Sul-2.ªSecção, 19/2/2013, proc.5203/11).
Assim é, porquanto, no âmbito do exame do terceiro fundamento da impugnação, a alegada falta de fundamentação dos actos tributários objecto do presente processo, consta da sentença recorrida o seguinte trecho, o qual integralmente reproduzimos:

“Razão pela qual também não ocorreu qualquer violação do disposto no n.º 3 do art. 268.° da CRP, ao estipular que "os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos."
Pelo que improcede o invocado vício por falta de fundamentação.”.

Em suma, não se vê que a sentença recorrida tenha omitido pronúncia e, nestes termos, devendo improceder este fundamento do recurso.
Mais aduz o apelante que, ao contrário do decidido, a ordem de serviço deveria ter sido comunicada ao recorrente, nomeadamente para efeitos de contagem do prazo da caducidade do direito à liquidação, que é diferente, caso haja ou não cumprimento de prazos da inspecção. Que o nº.1, do artº.46, da Lei Geral Tributária, é muito claro a este respeito. A douta sentença deveria ter levado em conta que a ordem de serviço deve ser notificada ao contribuinte, ou o início da acção de inspecção externa. Que a recorrente não foi notificada, através de membro dos seus órgãos directivos ou de algum colaborador, do relatório da inspecção, desconhecendo quem é Ângela Rocha, que a Senhora Juíza deu como provado que recebeu o relatório da inspecção. Que foi preterido o direito essencial de defesa e audiência do contribuinte, omissão de formalida­de essencial que torna nulo todo o procedimento inspectivo e inquina de vício de forma todo o procedimento, sendo também nulo o acto administrativo final de liquidação (cfr.conclusões 1 a 4 e 6 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Apuremos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
O apelante chama à colação, antes de mais, a falta de notificação, por parte da A. Fiscal, da ordem de serviço fonte da inspecção tributária que esteve na origem dos actos tributários impugnados, mais relacionando tal alegada preterição de formalidade com o artº.46, nº.1, da L.G.T.
Quanto ao lugar da realização, o procedimento de inspecção pode classificar-se como interno ou externo, consoante os actos que o integram se efectuem, respectivamente, nas dependências orgânicas e nos serviços da Administração Tributária ou em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais entidades abrangidas. Note-se que para que possa ser classificado como interno, o procedimento deve materializar-se em actos, todos eles, praticados exclusivamente nos serviços da Fazenda Pública, instalações ou dependências, designadamente, através da análise formal e de coerência dos documentos da escrita do contribuinte. Caso contrário (isto é, caso existam actos praticados fora, ainda que diminutos), estaremos perante um procedimento externo (cfr.artº.13, do R.C.P.I.T., aprovado pelo dec.lei 413/98, de 31/12).
Esta classificação é de extrema relevância na medida em que apenas o procedimento externo tem a virtualidade de suspender o prazo de caducidade do direito à liquidação, não tendo o procedimento interno esse efeito, conforme se retira do artº.46, nº.1, da L.G.T.
Mais, a qualificação dada pela Administração Fiscal a um procedimento não tem carácter vinculativo, se vier a revelar-se que o conteúdo dos actos praticados for contrário à qualificação dada, isto é, a classificação formal do procedimento será, posteriormente, validada, ou não, pelos actos que a Administração Tributária efectivamente praticar. Numa situação em que os actos materialmente praticados revelam a existência de um procedimento distinto daquele que foi formalmente indicado pela Administração, ou seja, um procedimento externo “de facto”, embora formalmente qualificado como interno, os vícios referentes à falta de notificação prévia ao sujeito passivo exigida pelo artº.49, nº.1, do R.C.P.I.T., bem como a ausência de ordem de serviço exigida pelo artº.46, nº.2, do mesmo diploma, devem ter como consequência a invalidade de uma eventual liquidação, nomeadamente, levando à sua anulação (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/07/2012, proc.5289/12; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.385 e seg.; Joaquim Freitas da Rocha e Outro, R.C.P.I.T. anotado e comentado, 1ª. Edição, Coimbra Editora, 2013, pág.81 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, levando em consideração a factualidade provada (cfr.nºs.1 a 4 do probatório), tal como examinando o teor do relatório de inspecção junto a fls.29 a 41 do processo instrutor apenso, deve concluir-se que nos encontramos perante procedimento inspectivo interno, face ao qual não era necessário cumprir as formalidades previstas nos citados artºs.46, nº.2, e 49, nº.1, do R.C.P.I.T. De igual modo, também o procedimento inspectivo a que foi sujeito a recorrente não releva para efeitos de suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação, nos termos do artº.46, nº.1, da L.G.T., contrariamente ao defendido pela mesma.
Passemos ao exame da alegada preterição da formalidade legal que consiste na audiência do contribuinte, tal como a falta de notificação do relatório da inspecção.
Quanto à preterição de formalidade legal que consiste na audiência do contribuinte, não tem razão a recorrente, porquanto da análise da factualidade provada (cfr.nº.3 do probatório) foi a mesma notificada através de carta registada com a.r., para o efeito remetida para a sua sede, assim se dando cumprimento, por excesso (bastava carta registada), ao formalismo previsto na lei (cfr.artº.60, nº.4, da L.G.T.; artº.60, do R.C.P.I.T.).
Passando à notificação do próprio relatório final de inspecção, também de acordo com a factualidade provada (cfr.nº.5 do probatório), foi a recorrente notificada através de carta registada com a.r. enviada para a sua sede, assim se cumprindo, mais uma vez por excesso, o disposto nos artºs.77, nº.6, da L.G.T., e 62, nº.2, do R.C.P.I.T. (a lei exige somente carta registada).
Pelo que, não se vislumbra como pode sustentar a recorrente, de forma minimamente credível, que não foi notificada para exercer tal direito de audiência prévia ou do relatório final da inspecção. E, recorde-se, que a apelante não impugna a factualidade provada pelo Tribunal “a quo” (cfr.artº.640, do C.P.Civil).
Concluindo, não se descortina qualquer sustentabilidade da afirmada falta de notificação, por parte do recorrente, quer para exercer o seu direito de audição, quer do teor do relatório final, assim improcedendo este fundamento do recurso.
Por último, aduz o apelante que nos termos do disposto no nº.2, do artº.45, da Lei Geral Tributária, o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de três anos, quando haja recurso a métodos indiciários. Que é o caso, sendo que a caducidade ocorreu em 31/12/2006 (cfr.conclusão 5 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar, supomos, erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
O fundamento de recurso ora sob apreciação constitui questão que não foi invocada no articulado inicial do presente processo (cfr.nº.9 do probatório). Na verdade, não se alcança da p.i. que a matéria vertida nas conclusões que se deixaram expostas haja sido alegada em 1ª. Instância, pelo que não poderia ser objecto de conhecimento e correcção pelo Tribunal “a quo”, sendo nesta sede de recurso pela primeira vez suscitada. Igualmente sendo matéria que não é de conhecimento oficioso(1).
É que o direito português segue o modelo do recurso de revisão ou reponderação (modelo que tem as suas raízes no Código Austríaco de 1895). Daí que o Tribunal “ad quem” deva produzir um novo julgamento sobre o já decidido pelo Tribunal “a quo”, baseado nos factos alegados e nas provas produzidas perante este. Os juízes do Tribunal de 2ª. Instância, ao proferirem a sua decisão, encontram-se numa situação idêntica à do juiz da 1ª. Instância no momento de editar a sua sentença, assim valendo para o Tribunal “ad quem” as preclusões ocorridas no Tribunal “a quo”. Nesta linha, vem a nossa jurisprudência repetidamente afirmando que os recursos são meios de obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos Tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do Tribunal de que se recorre, visto implicar a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/1/1992, rec.13331; ac.S.T.J., 25/2/1993, proc.83552; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 8/8/2012, proc.5857/12; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 12/12/2013, proc.7119/13). Não vale, contudo, também entre nós, em toda a sua pureza, o modelo de recurso de reponderação. Além de outras excepções (v.g.as partes podem acordar, em 2ª. Instância, a alteração ou ampliação do pedido - cfr.artº.264, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), o Tribunal “ad quem” pode conhecer de questões novas, ou seja, não suscitadas no Tribunal recorrido, desde que de conhecimento oficioso e ainda não decididas com trânsito em julgado. E essas questões podem referir-se, quer à relação processual (v.g.excepções dilatórias, atento o disposto no artº.578, do C.P.Civil), quer à relação material controvertida (v.g.prescrição e duplicação de colecta - cfr.artº.175, do C.P.P.Tributário). No que respeita à matéria de direito, são os Tribunais de recurso inteiramente livres quanto à determinação, interpretação e aplicação das normas jurídicas ao caso ajuizado, devendo, mesmo, tomar em consideração as modificações da lei sobrevindas após o julgamento ocorrido na instância inferior, caso elas abranjam a relação jurídica litigiosa (cfr.António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.92 e seg.; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.153 e seg.; Armindo Ribeiro Mendes, Direito Processual Civil III, Recursos, AAFDL, 1982, pág.174).
Concluindo, o recorrente pretende a emissão de pronúncia sobre questão nova, o que o mesmo é dizer que o tema suscitado nas conclusões apelatórias em análise excede o objecto do recurso, implicando a sua apreciação a preterição de um grau de jurisdição, pelo que dela se não conhece.
Pelo que se julga improcedente também este fundamento do recurso.
Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
X
Condena-se a recorrente em custas.
X
Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 13 de Fevereiro de 2014



(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)





1- (cfr.entre muitos outros, podem mencionar-se os seguintes acórdãos nos quais se defende o não conhecimento oficioso da matéria da caducidade do direito à liquidação no âmbito do processo tributário: ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/10/2012, proc.5792/12; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 28/11/2013, proc.7031/13).