Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1920/20.1BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:03/19/2024
Relator:MARA DE MAGALHÃES SILVEIRA
Descritores:RECLAMAÇÃO CONTA
DISPENSA DE PAGAMENTO DO REMANESCENTE
IMPUTAÇÃO DO REMANESCENTE DA PARTE VENCEDORA À PARTE VENCIDA
Sumário:I - Não enferma de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão ou ininteligibilidade da decisão, a decisão da reclamação da conta de custas que, considerando nos factos provados a imputação à Recorrente (parte vencida) do remanescente da taxa de justiça devida pelos impulsos processuais das partes vencedoras nos termos do art. 14.º, n.º 9 do RCP, decide ser a mesma legalmente devida;
II - Após o trânsito em julgado da decisão, designadamente em sede de incidente de reclamação da conta de custas, não pode o juiz, oficiosamente, dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, mostrando-se, igualmente, precludido o direito da parte a requerer essa dispensa;
III - Não se mostrando dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça nos termos do n.º 7 do art. 6.º do RCP, em conformidade com art. 14.º, n.º 9 do RCP é imputado à parte vencida o pagamento dos montantes devidos pelas partes vencedoras a título de remanescente da taxa de justiça.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de CONTRATOS PÚBLICOS
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa, subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

M...... & A...... – A...... S.A. (doravante Recorrente, Reclamante ou R.) veio recorrer da decisão do incidente de reclamação da conta de custas proferida em 14.7.2023, pelo Juízo de Contratos Públicos do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, pela qual foi indeferida tal reclamação.
Nas suas alegações, formulou as seguintes conclusões:

A. A decisão é nula por força da alínea c) do n.° 1 do artigo 615.° do CPC, porquanto não é possível compreender a referência a que estão em dívida €21.267,00 "correspondente à soma das taxas em dívida [€ 153,00+3.519,00+3.519,00 +3.519,00 +3.519,00 +3.519,00 +3.519,00]", quando é claro que o substrato factual dado como assente não permite retirar essa conclusão;
B. É, assim, evidente que os fundamentos de facto (factos provados) estão em oposição com a decisão (que conclui pela existência da putativa dívida de €21.267,00, que incluí €7.038,00 de que não sabemos de "onde vêm"), bem como se verifica uma clara ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
C. O que torna a Sentença nula, nos termos do supra citado artigo do CPC;
D. O Tribunal a quo condenou a Recorrente no pagamento de custas como se a Recorrente (ou o Réu) tivessem lançado mão de uma 3ª instância recursiva, fazendo uma duplicação de custas!;
E. Não se encontra justificação possível para a "cobrança" de €7.038,00 (€3.519,00+€3.519,00) entre o valor de €21.267,00, já que tal valor não encontra correspondência na atividade processual das partes;
F. Verifica-se, assim, uma impossibilidade de ser devidos, por inexistência de atividade processual que o justifique, os valores constantes em dois itens da conta de custas denominados por "Outros", que, no total, perfazem um valor em causa de €7.038,00 (€3.519,00+€3.519,00);
G. Ora, ao decidir assim o Tribunal a quo viola, pelo menos, as seguintes normas: artigo 30.° do RCP; n.° 1 e 2 do artigo 527.°, n.° 1 do artigo 530.° ambos do CPC;
H. Pelo que, face aos argumentos aqui expostos e violação dos normativos invocados, impugna-se a decisão, nos termos do artigo 638.° do CPC;
I. Resulta do probatório que o Supremo Tribunal de Justiça não chegou sequer a debruçar-se sobre o mérito da causa, pois o referido Tribunal considerou que a decisão em sede de 2ª Instância, prolatada por este Tribunal, não admitia revista, nos termos do artigo 671.° do CPC;
J. Refere o n.° 7 do artigo 6.° do RCP que ‘‘Nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento".
K. Assim, sempre que ocorra uma desproporção que afete claramente a relação sinalagmática que a taxa pressupõe entre o custo do serviço e a sua utilidade para a parte, como é o caso, impõe-se ao Juiz o uso do poder-dever conferido pelo n.° 7. do artigo 6.°. do RCP com vista a dispensar, total ou parcialmente o pagamento da taxa de justiça remanescente - conforme jurisprudência citada;
L. Só após a elaboração a conta de custas, de forma definitiva e correta, o que ainda não se verificou, é que pode a Recorrente, ciente daquilo que lhe é corretamente apresentado, exercer o seu direito de solicitar a dispensa do remanescente da taxa de justiça - o que, seja como for, faz desde já;
M. Seja como for, o Tribunal a quo, verificando que o recurso dirigido ao Supremo Tribunal Administrativo não foi julgado (tendo sido não admitida a revista), deveria ter, desde logo, corrigido esse erro na sua decisão, já que a lei o impõe, independentemente de a parte suscitar essa questão ou não, pois trata-se de uma questão de salvaguarda dos direitos constitucionais;
N. Pelo que a decisão de que se recorre viola também, pelo menos, a norma constante do n.° 6 do artigo 7.° do RCP;
O. E, face aos argumentos aqui expostos, é impugnada a decisão nos termos do artigo 638.° do CPC;
P. É, portanto, face ao vertido em i. e ii. do Capítulo III. do presente Recurso, devido apenas o valor de €7.191,00 a título de custas;
Q. No limite, caso não se julgue procedente a argumentação prevista em ii. do Capítulo III. do presente Recurso, o que não se admite, pois seria chocante cobrar tais montantes por um recurso que não veio a ser julgado, a Recorrente deveria apenas a título de custas o valor de €14.229,00, tudo sob pena de se violarem as normas legais acima invocadas.
Nestes termos, deverá ser o presente Recurso de apelação julgado totalmente procedente, por provado, devendo, como tal, ser a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue a reclamação da conta de custas totalmente procedente, por provada, fazendo- se a necessária
JUSTIÇA!!

O recurso foi admitido, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo. A Mm.ª Juíza do Juízo de Contratos Públicos do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa pronunciou-se sobre a nulidade arguida nos termos do art. 641.º, n.º 1 do CPC, pugnando pela sua não verificação.

O Ministério Público junto deste TCA Sul, notificado nos termos e para efeitos do disposto no n.º 1, do artigo 146.º do CPTA, não emitiu pronúncia.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II. Delimitação do objeto do recurso

Em face das conclusões formuladas, cumpre apreciar se a decisão proferida quanto ao incidente de reclamação da conta de custas enferma de,
i. Nulidade decorrente de oposição entre os fundamentos e a decisão e ambiguidade e obscuridade que torna a decisão ininteligível (art. 615.º, n.º 1 al. c) ex vi art. 613.º, n.º 3 do CPC);
ii. Erro de julgamento por violação (i) do disposto nos arts. 30.° do RCP, n.° 1 e 2 do artigo 527.°, n.° 1 do artigo 530.° ambos do CPC quanto à cobrança da quantia de 7.038,00 € e (ii) do art. 6.º, n.º 7 do RCP por não ter sido oficiosamente dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça.

III. Fundamentação de facto

III.1. Na decisão recorrida foi julgada provada a seguinte factualidade:

A) A aqui A…… & A….. – A….., S.A., com a apresentação da p.i., pagou taxa de justiça no valor de € 204,00 - cfr. fls. 40, do SITAF.
B) A Entidade Demandada deduziu incidente de levantamento do efeito suspensivo automático, ao que a A. respondeu, tendo pago taxa de justiça no valor de € 51,00 — cfr. fls. 398, do SITAF.
C) Por decisão de 15/02/2021 foi julgado improcedente o incidente suscitado, com custas a cargo da Entidade Demandada, com taxa de justiça que se fixou em 2 UC's — cfr. fls. 430, do SITAF.
D) Na sequência do recurso interposto pela Entidade Demandada da decisão do incidente, veio a A. apresentar contra-alegações, tendo pago taxa de justiça no valor de € 306,00 — cfr. fls. 542, do SITA.
E) Em 12/05/2021 foi proferido Despacho Saneador que fixou o valor da causa em € 850.000,00 — cfr. fls. 553, do SITAF.
F) Em 19/07/2021 foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e, em consequência, absolveu a Entidade Demandada do pedido, condenando-se a A. em custas — cfr. fls. 633, do SITAF.
G) A A. interpôs recurso da sentença para o TCA Sul, tendo pago taxa de justiça no valor de € 816,00 — cfr. fls. 720 e 821, do SITAF.

H) O acórdão do TCA Sul foi proferido em 16/12/2021, no qual se negou provimento ao recurso interposto pela A. e manteve-se a sentença recorrida, condenando-se a A./Recorrente em custas. — cfr. fls. 844, do SITAF.
I) A A. interpôs recurso de revista para o STA, tendo pago taxa de justiça no valor de € 816,00 - cfr. fls. 963-964, do SITAF.
J) Por acórdão de 10/03/2022 foi decidido não admitir a revista, com custas pela A./Recorrente — cfr. fls. 1094, do SITAF.
K) Em 25/10/2022 foi elaborada a conta de custas, da responsabilidade da A., onde consta o seguinte:
“(texto integral no original; imagem)”

- cfr. fls. 1148, do SITAF.


III.2. Na decisão recorrida nada mais se consignou.

IV. Fundamentação de direito

IV.1. Da nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão e ambiguidade ou obscuridade que torna a decisão ininteligível.

A Recorrente imputa a nulidade da decisão, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.° 1 do artigo 615.° do CPC, sustentando que considerando os factos provados, concretamente a conta de custas e, bem assim, que apenas houve lugar a dois recursos, não é possível compreender de onde se retira o montante de € 7.038.00 (€3.519.00+€3.519.00), e, consequentemente, não é possível concluir pela existência da dívida de 21.267,00 €, que inclui aquele valor de 7.038,00 €.
O artigo 615.º, n.º 1, do CPC, sob a epígrafe, “Causas de nulidade da sentença”, preceitua que a sentença é nula quando: “c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;”.
A nulidade da sentença a que se refere este normativo verifica-se quando se constate que os fundamentos de facto e/ou de direito da sentença não podiam logicamente conduzir à decisão que veio a ser tomada no segmento decisório da sentença ou quando neste se verifica uma obscuridade ou ambiguidade que torna a própria decisão ininteligível. Ou seja, a explicação que está subjacente à decisão conduz, logicamente, a resultado oposto do adotado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou ocorra alguma ambiguidade, que permite duas ou mais interpretações (ambiguidade), ou não é possível saber com certeza, qual o pensamento exposto na sentença (obscuridade).
Em sede de fundamentação de facto a decisão recorrida no ponto K) deu como demonstrada a elaboração da conta da responsabilidade da A., transcrevendo o seu conteúdo e do qual consta, entre o mais,
· Quanto ao recurso interposto para o TCA Sul, nos dois campos designados “Outro” a taxa devida e a taxa em dívida de 3.519,00 €, correspondente conforme consta dos itens “obs.” “Art. 14.º n.º RCP – ED – TCA Sul” e “Art. 14.º, n.º 9 do RCP – CI – TCA Sul”, nos seguintes termos,


· Também quanto ao recurso interposto para o STA, nos dois campos designados “Outro” encontra-se a taxa devida e a taxa em dívida de 3.519,00 €, correspondente conforme consta dos itens “obs.” “Art. 14.º n.º RCP – ED – STA” e “Art. 14.º, n.º 9 do RCP – CI – STA”, nos seguintes termos,


Ou seja, resulta dos factos provados, concretamente da conta elaborada, que, nos termos do art. 14.º n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais, foi imputada à A. a responsabilidade pelo pagamento do remanescente nos termos do n.° 7 do artigo 6.° - quantificado em 3.519,00 € - relativamente às contra-alegações de recurso apresentadas pela Entidade Demandada e pela Contrainteressada (fls. 734 e 774 do SITAF) quanto ao recurso interposto para este Tribunal da sentença proferida pela 1.ª Instância, totalizando os referidos 7.038,00 € (3.519,00€ +3.519,00€), e, bem assim, pelas contra-alegações daquelas partes (fls. 989 e 1046 do SITAF) referentes ao recurso para o STA do Acórdão deste Tribunal, também aqui totalizando os referidos 7.038,00 € (3.519,00€ +3.519,00€).
Ou seja, é perfeitamente percetível na fundamentação de facto da decisão a origem do montante que é exigido à Recorrente.
Em conformidade lógica, escreveu-se na decisão recorrida que “As rubricas Outro [concernentes com o recurso no TCA Sul e STA] decorrem da aplicação do disposto no art° 14°, n° 9, do RCP, conforme aí também vem referido.
O art° 14.°, n.° 9, do RCP regula os casos em que deva ser pago o remanescente da taxa de justiça nos termos do art° 6.°, n.° 7, do RCP.
Aí se estabelece que, “Nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do n.° 7 do artigo 6.°, o responsável pelo impulso processual que não seja condenado a final fica dispensado do referido pagamento, o qual é imputado à parte vencida e considerado na conta a final.”.
Isto é, o responsável pelo impulso processual que não seja condenado a final, fica dispensado de efetuar o pagamento de tal remanescente, que é imputado à parte vencida na conta final.
Assim, também os valores aí apurados estão corretos.
Em conclusão, as regras aplicáveis, e que vêm de referir-se, foram respeitadas na elaboração da conta de custas, sendo da responsabilidade da A. o pagamento de € 21.267,00, correspondente à soma das taxas em dívida [€ 153,00+3.519,00+3.519,00 +3.519,00 +3.519,00 +3.519,00 +3.519,00].”. E, consequentemente, termina a decisão pelo indeferimento da reclamação, incluindo quanto à exigência do valor de 7.038,00 € (3.519,00€ +3.519,00€) que corresponde ao remanescente da taxa de justiça devido pelo impulso processual (contra-alegações) da Entidade Demandada e Contrainteressada em sede de recurso para este Tribunal e para o STA.
Ou seja, resultando da conta ter sido imputado à Recorrente, nos termos do art. 14.º, n.º 9 do RCP, o montante de 7.038,00 € (3.519,00€ +3.519,00€) referente ao remanescente da taxa de justiça devido pelo impulso processual (contra-alegações) quer da Entidade Demandada e quer da Contrainteressada, por um lado em sede de recurso para este Tribunal e por outro no âmbito do recurso para o STA, o Tribunal julgou ser tal montante devido, fundamentando de forma clara as razões porque assim o entendeu e, consequentemente, indeferiu a reclamação da conta apresentada pela Reclamante/Recorrente.
O exposto permite verificar que inexiste contradição entre os fundamentos e a decisão, nem tão pouco esta é, por ambiguidade ou obscuridade, ininteligível. Na realidade, os fundamentos de facto e de direito conduzem, em termos lógicos, à decisão de indeferimento da reclamação, assumindo-se esta como de fácil compreensão.
Em conformidade, não padece a decisão da nulidade que lhe é imputada.

IV.2. Do erro de julgamento

A Recorrente imputa à decisão o erro de julgamento referindo, em síntese, que a "cobrança" de 7.038,00 € não encontra correspondência na atividade processual das partes, não sendo, pois, devida e, por outro, que a dispensa do pagamento do remanescente nos termos do n.° 7 do artigo 6.° do RCP deveria ser decidida oficiosamente pelo Tribunal a quo e que, em todo o caso, não sendo a conta definitiva ainda estaria dentro do prazo para a requerer, verificando-se os requisitos para essa dispensa face à desproporção entre o serviço prestado e taxa cobrada (dado que o recurso de revista não foi admitido).
Considerando o valor atribuído à causa (850.000,00 €), atento o disposto na Tabela I do RCP onde se refere que “Para além dos (euro) 275 000, ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada (euro) 25 000 ou fracção, 3 UC, no caso da col. A, 1,5 UC, no caso da col. B, e 4,5 UC, no caso da col. C.”, temos, para além dos 275.000,00 €, vinte e três parcelas de 25.000,00 € que multiplicadas por 1,5 UC totalizam os 3.519,00 € correspondentes ao remanescente de taxa de justiça.
Dispõe-se no n.º 7 do art. 6.º do RCP que, salvo se houver lugar à dispensa de pagamento, “nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final”.
E no n.º 9 do art. 14.º do RCP que “Nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do n.º 7 do artigo 6.º, o responsável pelo impulso processual que não seja condenado a final fica dispensado do referido pagamento, o qual é imputado à parte vencida e considerado na conta a final.”.
O que este normativo prescreve é a imputação a final à parte vencida do pagamento dos montantes devidos pela(s) parte(s) vencedora(s) a título de remanescente da taxa de justiça.
Refira-se que, no caso, não foi requerida pela Autora/Recorrente, nem foi oficiosamente dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça e, opostamente, ao alegado pela Recorrente, não cabia ao Tribunal a quo fazê-lo em sede de decisão do incidente de reclamação da conta de custas.
Em primeiro lugar, porque após o trânsito em julgado, salvo omissão quanto a custas na decisão final, o tribunal não pode oficiosamente alterar tal decisão designadamente no que respeita à dispensa do pagamento da taxa de justiça.
Em segundo lugar, porque não tendo sido oficiosamente dispensado esse pagamento, cabia à parte requerê-lo até ao trânsito em julgado da decisão sob pena de preclusão do direito de requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a que se reporta o n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais (neste sentido, o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do STJ n.º 1/2022, o Acórdão deste Tribunal de 15.12.2022 proferido no processo 176/16.5BEFUN).
Não tendo sido, até ao trânsito em julgado do Acórdão de 10.3.2022 proferido pelo STA nestes autos, oficiosamente dispensado o pagamento do remanescente, nem apresentado pela Autora/Recorrente requerimento nesse sentido, e dado que à data da reclamação a conta de custas (10.11.2022) já há muito havia transitado em julgado o Acórdão proferido, naturalmente que o Tribunal de 1.ª Instância ao decidir a reclamação da conta de custas tinha que o fazer considerando não ter ocorrido tal dispensa (como, corretamente, fez), em conformidade com a decisão condenatória e a lei.
Não se verifica, pois, o imputado erro de julgamento à decisão recorrida.
Assim, constatado que a Recorrente interpôs recurso da sentença proferida pela 1.ª Instância para este Tribunal e recurso para o STA do Acórdão proferido por este Tribunal e que a Entidade Demandada e a Contrainteressada apresentaram contra-alegações em ambos os recursos, é devido o pagamento de taxa de justiça pelos correspondentes impulsos processuais nos termos do art. 6.º, n.º 1 e 2 do RCP.
Essa taxa de justiça devida pela Entidade Demandada e pela Contrainteressada correspondia, quanto a ambos os recursos e por cada um dos impulsos processuais, nos termos da tabela I-B a 816 € (8 UC) acrescida do remanescente que, como vimos, se computa em 3.519,00 €.
Nos Acórdãos proferidos pelo TCA Sul e pelo STA a A. foi condenada em custas, pelo que, nos termos do art. 14.º, n.º 9 do RCP, dado que os responsáveis pelos impulsos processuais – a Entidade Demandada e a Contrainteressada – não foram a final condenadas em custas, ficaram dispensadas do pagamento do remanescente e este foi imputado à Recorrente por ter ficado vencida.
Considerando que o remanescente se computa em 3.519,00 €, estando em causa quatro impulsos processuais das partes vencedoras – a saber a apresentação das contra-alegações de recurso da ED ao recurso da sentença para o TCA Sul (1) e ao recurso do Acórdão do TCA Sul para o STA (2) e as contra-alegações da CI ao recurso da sentença para o TCA Sul (3) e ao recurso do Acórdão do TCA Sul para o STA (4) -, tal valor multiplicado por dois ascende a 7.038,00 € e por quatro aos 14.076,00 €, que são cobrados à Recorrente.
Ou seja, opostamente ao alegado, a exigência do(s) montante(s) de 7.038,00 € encontra correspondência na atividade processual das partes e o seu pagamento é devido pela Recorrente, tal como foi decidido na sentença do incidente de reclamação da conta de custas recorrida, a qual deve, por isso, manter-se.

V. Decisão

Nestes termos, acordam os juízes desembargadores da Secção Administrativa, subsecção de Contratos Públicos, do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmam a decisão do incidente de reclamação da conta de custas recorrida.

Custas a cargo da Recorrente.
*

Mara de Magalhães Silveira
Ana Cristina Lameira
Paula Cristina Oliveira Lopes de Ferreirinha Loureiro (tem voto de conformidade, não assina por motivos técnicos)