Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1558/22.9 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:05/18/2023
Relator:HÉLIA GAMEIRO SILVA
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ATOS DO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL
CITAÇÃO POR VIA POSTAL SIMPLES E/OU REGISTADA
NULIDADE DA CITAÇÃO
Sumário:A citação por via postal simples ou registada, prevista nos números 1 e 2 do artigo 191.º do CPPT, não configura uma citação em sentido próprio e técnico e não produz os efeitos típicos da citação, nomeadamente no que respeita aos direitos de defesa dos executados, constituindo outrossim, uma citação provisória, já que se limita a dar conhecimento ao executado que contra si foi instaurado o processo executivo.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

P....., melhor identificado nos autos, interpôs junto do Serviço de Finanças de Lisboa 3, reclamação da decisão do órgão de execução fiscal proferida no processo executivo n.º 3085202101148982 contra si instaurado, de indeferimento do pedido de declaração de nulidade da citação que havia efetuado no âmbito do referido processo.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por decisão de 20 de janeiro último, julgou improcedente a reclamação e absolveu a Fazenda Publica do pedido.

Inconformado, o reclamante, P....., veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

“I- O Tribunal a quo, na douta sentença proferida, ao declarar improcedente a reclamação do Reclamante, na totalidade, cometeu um erro de julgamento e omissão de pronúncia, ao julgar não verificada a nulidade por falta de citação do recorrente;

II- De facto, o Tribunal a quo fez uma incorreta aplicação dos pressupostos da falta e da nulidade, insanável, da citação conforme previsto nos artigos 165. °, n.° 1 alínea a), 190. °, 191. ° n.° 2 e 3, 192. °, n.° 2 e 3, todos do CPPT;

III- Há falta de citação que prejudica a defesa do interessado, porquanto houve preterição das formalidades essenciais e a omissão do ato probatório da recorrida, isto é, do aviso de receção, assinado pelo Recorrente, que comprove o seu efetivo conhecimento;

IV- No caso concreto, há lugar à anulação de todo o processado posterior à falta de citação, que deveria ter sido efetuada com regularidade, para não prejudicar a defesa do citando, reclamante/recorrente, o qual conduz à absolvição do executado da instância;

V- Há Nulidade da sentença, porquanto há falta de pronúncia sobre questões que a Mm. a Juíza devia apreciar;

VI- Destarte, a douta sentença extravasa o pedido da reclamação, dando origem a uma clara omissão de pronúncia, que constitui causa de nulidade da douta sentença recorrida nos termos do artigo 125. ° do CPPT;

VII- A falta do aviso de receção, assinado, que comprove o efetivo conhecimento da citação pelo Recorrente conduz a que o órgão de execução fiscal deveria repetir a citação, enviando nova carta com aviso de receção ao citando, nos termos do disposto nos n.° 2 e 3 do artigo 192. ° do CPPT;

VIII- A citação pessoal, efetuada mediante carta registada, com aviso de recepção para Bucareste, na Roménia, que nunca foi assinado pelo Recorrente por estar impossibilitado de levantar a carta no domicílio fiscal, que não havia alterado, faz prova nos autos da impossibilidade de comunicação da alteração do seu domicílio, conforme prescreve o n.° 3 do artigo 192.° do CPPT;

IX- De acordo com a jurisprudência e a doutrina unânimes, a arguição de nulidade da citação deve ser atendida, para tanto bastando que haja a possibilidade de prejuízo para a defesa do executado, ora recorrente;

X- Logo, o comportamento do recorrente resulta conforme aos dispositivos legais e do ADT, celebrado entre Portugal e Roménia, então em vigor, não se verificando no caso sub judice os pressupostos da responsabilidade tributária e do processo de execução fiscal, instaurado contra o Recorrente;

XI- Acresce que incumbia à Recorrida a prova dos factos constitutivos do ato de citação pessoal e postal, registada com aviso de receção, cujo comprovativo dos correios CTT não foi junto aos autos, o que não logrou provar os factos por si alegadamente suportados, conforme se estatuí no n.° 2 do art.° 74.° da LGT e no n° 1 do artigo 342.° do CC.

XII- Além disso, a Recorrida apenas alega a verificação de um ofício de citação com base num mero print do sistema da AT, mas não faz prova da efetiva receção da citação e dos seus elementos constitutivos, pelo recorrente;

XIII- No limite, devia o Tribunal a quo ter observado o disposto no n.° 2 do artigo 74.° da LGT, determinando à recorrida, Administração Tributária, que fizesse prova documental, nos autos, do aviso de receção, assinado pelo recorrente, que comprovasse a citação efetiva e não de um mero print; 

XIV- Por fim, sendo ilegal, uma vez não comprovada, nos autos, a assinatura do aviso de receção pelo recorrente do aviso de receção da citação do PEF, não pode ser estabelecido qualquer nexo causal entre esse suposto ato instrumental com base num print do sistema informático do órgão de execução fiscal da Recorrida e a manutenção do domicílio fiscal do Recorrente em Bucareste, para provar a validade e eficácia do ato de citação;

Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, com as legais consequências, fazendo-se assim

Justiça!»


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A recorrida, Fazenda Publica, notificado do recurso, não contra-alegou.

»«

O Exmo. Sr. Procurador-geral Adjunto junto deste Tribunal, pronuncia-se pela improcedência e pela manutenção, na íntegra, a douta sentença recorrida, que, em seu entender “se encontra correta e bem fundamentada, tendo interpretado adequadamente os factos e efetuado acertada subsunção dos mesmos ao direito, não tendo violado quaisquer preceitos legais, nem a decisão padece de qualquer vício ou nulidade.”

»«

Com dispensa dos vistos, atento o carácter urgente dos presentes autos, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.

II – QUESTÕES A APRECIAR

Importa, nesta sede referir que, independentemente das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões do recorrente nas alegações de recurso que se determina o âmbito de intervenção do tribunal (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho.

Assim e constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Termos em que, atentas as conclusões das alegações do recurso interposto, a questão que importa aqui decidir, consiste em aferir se a sentença recorrida padece da nulidade que lhe vem assacada e, bem assim, se errou no seu julgamento, ao decidir que soçobram os argumentos da reclamante quanto à nulidade da citação levada a efeito no âmbito do PEF aqui em conflito.

II - FUNDAMENTAÇÃO

A sentença recorrida considerou os seguintes factos provados:

«A)Em 24/02/2021, foi instaurado contra o Reclamante o PEF n.° 3085202101148982, com vista à cobrança de dívida proveniente de IRS referente ao ano 2016, no montante de € 47.325,87 — cf. documentos com a ref. n.° 7501051 e 7501053 no SITAF.

B) Em 20/10/2017, o Reclamante alterou o seu domicílio fiscal, junto da AT, para a morada “Strada Doctor Vasile Sion …… Blocul ….. Scara 2 apt-…. Bucareste” — cf. documento com a ref. n.° 7501052.

C) O Reclamante não alterou o seu domicílio fiscal no ano 2021 — facto não controvertido.

D) Em 05/05/2021, no âmbito do PEF mencionado em A), foi elaborado ofício de citação postal, com o n.° de identificação T20210114898221681384020210505, dirigido ao Reclamante para a morada mencionada na alínea que antecede, de cujo teor se extrai o seguinte:


“(texto integral no original; imagem)”

- cf. documento com a ref. n.° 7501051 no SITAF.

E) Em 07/05/2021, foi expedido, por via postal registada (com n.° de registo postal RQ709790340PT) o documento mencionado na alínea que antecede — cf. documento com a ref. n.° 7572914 no SITAF.


*

Não existem outros factos alegados relevantes para a decisão, em face das possíveis soluções de direito, que importe referir como provados ou não provados.

*

MOTIVAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

A decisão da matéria de facto fundou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente nos documentos juntos aos autos, conforme referido em cada alínea do probatório, bem como na posição expressa pelas partes, tendo sido considerados os factos relevantes para a decisão dentro das várias soluções plausíveis das questões de direito [nos termos conjugados do n.° 2 do artigo 123.° do CPPT e dos n.°s 4 e 5 do artigo 607.° do CPC, este último preceito aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.° do CPPT].

Nos termos estatuídos no artigo 662.º do CPC aditam-se ao probatório os seguintes factos:

F) Do documento referido no ponto E) deste probatório consta o seguinte:





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De Direito

Em sede de aplicação de direito, a sentença recorrida julgou improcedente a presente reclamação, ao ter concluído pela inexistência de nulidade da citação efetuada no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º 3085202101148982.

Para assim o decidir considerou que “a AT efetuou a citação regularmente, desde logo, porque enviou o ofício para a última morada conhecida, ou seja, a que consta da base de dados do Reclamante, não lhe sendo oponível qualquer alteração que não tenha sido comunicada aos serviços.”

E acrescentou que “[A]ademais, o montante da dívida exequenda é superior a 50 unidades de conta e inferior a 500 unidades de conta, pelo que a citação cumpre a exigência prevista no n.° 2 do artigo 191.° do CPPT, pois foi efetuada por via postal registada.”

Conclui dizendo que: “o teor do ofício de citação cumpre os elementos exigidos pelo disposto no artigo 190.°, n.° 1 e alíneas a), c), d) e e) do n.° 1 do artigo 163.°, ambos do CPPT.”

Dissente, a Fazenda Publica, vem recorrer da referida decisão, assacando-lhe “erro de julgamento e omissão de pronúncia, ao julgar não verificada a nulidade por falta de citação do recorrente;” – concl. I

Acrescenta que “o Tribunal a quo fez uma incorreta aplicação dos pressupostos da falta e da nulidade, insanável, da citação conforme previsto nos artigos 165.°, n.° 1 alínea a), 190.°, 191.° n.° 2 e 3, 192.°, n.°s 2 e 3, todos do CPPT;” – concl. II

Na conclusão V e VI, vem dizer que: “[H]há Nulidade da sentença, porquanto há falta de pronúncia sobre questões que a Mm. a Juíza devia apreciar;” e bem assim que, a sentença “extravasa o pedido da reclamação, dando origem a uma clara omissão de pronúncia, que constitui causa de nulidade da douta sentença recorrida nos termos do artigo 125.° do CPPT.

Com o que, entendemos nós, pretende assacar ao texto recorrido, nulidade por omissão de pronuncia.

Vejamos então se a mesma se verifica.

a. nulidade por omissão de pronuncia.

Constituindo a sentença uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional, visa dirimir um conflito de interesses (públicos e privados) no âmbito das relações jurídicas, neste caso, administrativo-tributárias, tratando-se, assim, de uma peça processual que pode padecer de dois tipos de vícios, capazes de obstar à eficácia ou validade do direito ditado, são eles: (i) o erro no julgamento dos factos e do direito o que tem como consequência a sua revogação; ou (ii) contrariar as regras próprias da sua elaboração ou contra ou o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade.

De facto, enuncia o n.º 1 do artigo 125.º do Código de Procedimento e de processo Tributário (CPPT), que constitui causa de nulidade da sentença entre outras, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronuncia sobre questões que não deva conhecer.

No mesmo sentido a alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil (CPC) diz que é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento.

A omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes e ocorre sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido).

Em suma quando falamos em vicio de omissão de pronuncia na sentença reportamo-nos à falta de pronúncia sobre questões e não sobre “argumentos”, “razões” ou quaisquer outro tipo de faltas que ao julgador possam ser indigitadas, como falta de realização de diligências instrutórias ou de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas, que poderão constituir outro tipo de vícios, nomeadamente, nulidades processuais ou erro de julgamento, mas não nulidade da sentença.

Dito isto e volvendo ao caso que aqui nos ocupa e, bem assim à análise das alegações e conclusões recursivas para concluir que in casu, foram apreciadas e decididas no tribunal “a quo”, todas as questões formuladas pela impugnante e que à Mma juíza cumbia conhecer, sendo certo que, por seu lado o recorrente, não concretizou a aludida arguição, uma vez que não especificou as questões que, em seu entender, o tribunal deixou por conhecer, devendo tê-lo feito.

Termos em que a mesma se encontra, sem mais, condenada à improcedência, o que aqui, desde já se declara.

Dito isto prosseguimos.

b. Erro de julgamento

Em todo o articulado recursivo o apelante vem assumir que a citação que lhe foi dirigida no âmbito do processo executivo n.º 3085202101148982, aqui em analise deveria ter sido efetuada por carta registada como aviso de receção e, não o tendo sido, deixa prejudica a sua defesa, porquanto, “houve preterição das formalidades essenciais e a omissão do ato probatório da recorrida, isto é, do aviso de receção, assinado pelo Recorrente, que comprove o seu efetivo conhecimento;”.- concl. III.

Face ao que apela ao disposto nos n.°s 2 e 3 do artigo 192.° do CPPT para dizer que “[A]a falta do aviso de receção, assinado, que comprove o efetivo conhecimento da citação pelo Recorrente conduz a que o órgão de execução fiscal deveria repetir a citação, enviando nova carta com aviso de receção ao citando, nos termos do disposto” – concl. VII

Refere ainda que “[A)a citação pessoal, efetuada mediante carta registada, com aviso de recepção para Bucareste, na Roménia, que nunca foi assinado pelo Recorrente por estar impossibilitado de levantar a carta no domicílio fiscal, que não havia alterado…” – concl. VIII

Considera que incumbia à recorrida a prova dos factos constitutivos do ato de citação pessoal e postal, registada com aviso de receção, conforme se estatuí no n.° 2 do artigo 74. ° da LGT e no n° 1 do artigo 342. ° do CC. – concl. XI

Em suma, o recorrente demarca sua divergência com o decidido na sentença, face ao entendimento de que a Administração Tributária devia ter feito prova do efetivo envio da citação postal, nos termos previstos no artigo 192.º do CPPT mediante carta registada, com aviso de receção, para Bucareste, na Roménia e, bem assim, quanto á inexistência de prova de que aquela (citação) chegou ao conhecimento do seu destinatário, prova essa que, como diz, se bastava com o aviso de recção assinado.

Vejamos então

Auscultado o regime da citação em processo de execução fiscal, damos desde logo conta que sendo este um processo de natureza judicial o ato de dar a conhecer ao executado que contra ele foi instaurada qualquer execução deve respeitar as regras previstas nos artigos 188.º e seguintes do CPPT.

Emerge do disposto no artigo 191.º do referido compendio legal, com epigrafe “Citações por via postal”, que:

“1 - Nos processos de execução fiscal cuja quantia exequenda não exceda 500 unidades de conta, a citação efetua-se, mediante via postal simples, aplicando-se-lhe as regras do artigo anterior, com as necessárias adaptações. (Redação da Lei n.º 82-B/2014, de 31/12)
2 - A citação referida no número anterior é feita por via postal registada quando a dívida exequenda for superior a 50 vezes a unidade de conta. (Redação da Lei n.º 82-B/2014, de 31/12)
3(*) - A citação é pessoal:
a) Nos casos não referidos nos números anteriores;
b) Na efetivação da responsabilidade solidária ou subsidiária;
c) Quando houver necessidade de proceder à venda de bens;
d) Quando o órgão de execução fiscal a considerar mais eficaz para a cobrança da dívida.
(* - Redação da Lei n.º 82-B/2014, de 31/12)
(…)”

No n.º 1 e 2 da norma citada o legislador estabelece regras para os casos em que a citação deve se concretizada por via postal, registado ou não, fixando-se em 500 UC o limite para além do qual a citação tem de ser pessoal. E, apenas nos casos ali não referidos a citação deverá ser pessoal como enuncia o n.º 3.

Dito isto e volvendo à questão que nos ocupa temos que in casu, ficou demonstra que o OEF remeteu para a morada conhecida do executado (STRADA DV.S. …..SCARA, 2 APT-….. BUCARESTE na ROMENIA) uma “CITAÇÂO POSTAL” em 05/05/2021, dando-lhe conta de que contra si havia sido instaurada execução para cobrança coerciva de divida de IRS de 2016 no montante de € 47.325,87 – cfr. resulta do probatório (ponto D.)

Este aviso foi envido sob registo, como decorre da correspondente identificação do documento – cfr. ponto D. e F. da materialidade que deixamos aditada.

Assim e tendo em conta que o valor da unidade de conta fixado para o ano de 2021 era € 102,00(1), constatamos que 500 UC correspondem a 52.500,00 €, o que deixa claro que, e atento o valor da divida exequenda, a citação poderia ter sido efetuada, como foi, por postal registado, em conformidade com o disposto no, citado artigo 191.º, nºs 1 e 2 do CPPT, nada havendo a censurar ao procedimento levado a efeito pelo OEF, o que, diga-se, deita, desde logo, por terra, os argumentos recursivos quanto à exigência de um aviso de receção assinado.

Com efeito, a lei apenas impõe a citação pessoal, nomeadamente a carta registada com aviso de receção nas situações previstas no n.º 3 do artigo 191.º supra enunciado, o que não é o caso dos autos.

Contudo, e tal como a recorrente parece pretender fazer valer, “esta citação mediante postal registado não configura uma citação em sentido próprio e técnico e não produz os efeitos típicos da citação, nomeadamente não determina o “dies a quo” do exercício dos direitos de defesa dos executados, constituindo uma citação com carácter provisório, uma diligência de aviso quanto à pendência da execução, pois a efectiva citação (pessoal ou edital) só ocorre caso se venha a efectuar a penhora de bens.”, tal como se deixou dito pelo STA no processo proferido em 21/03/2012 no processo n.º 081/12, que por concordância aqui seguiremos de perto.

Assim e tal como tem sido amiudadamente asseverado pela doutrina e a jurisprudência, a citação postal a que se reporta os n.ºs 1 e 2 do artigo 190.º do CPPT, consiste numa citação provisória, que só dispensa a citação definitiva até ao momento em que seja efetuada a penhora de bens.

Neste sentido nos diz Jorge Lopes de Sousa(2) que “esta forma de citação, embora tendencialmente funcione como meio de proporcionar ao destinatário o conhecimento da instauração de uma execução contra ele, não fornece garantias para o processo de a citação ter chegado ao conhecimento do citando, principalmente nos casos que o postal nem sequer é registado.
Por isso, ela é considerada como uma citação meramente provisória que só dispensa uma citação definitiva (pessoal ou edital), nos casos em que não vier a ser efectuada penhora.
Com efeito, no art. 193.º do CPPT, prevê-se que, quando a citação é efectuada por simples postal, se ele não vier devolvido ou não indicar nova morada do destinatário, proceder-se-á de imediato à penhora, mas, se se conseguir penhorar bens, faz-se a citação pessoal do executado, levando-se a cabo citação edital se não for conhecida a sua morada.
Nestas condições, a utilização da citação provisória, pode aceitar-se, já que, não havendo penhora de bens, não pode resultar do processo lesão patrimonial para a pessoa singular ou colectiva contra quem corre a execução e, consequentemente, não se torna indispensável assegurar que lhe é dada possibilidade de defesa contra a pretensão do exequente.”

Dito isto, importa reter que a citação a que nos vimos referido, ou seja a citação postal cumpre a função que lhe é atribuída, que é, como dissemos a de levar ao conhecimento do executado que contra si foi instaurado determinado processo executivo, porém, pela falta de segurança que reveste não tem força capaz de abrir, para o executado, qualquer prazo de defesa, nomeadamente, o prazo para deduzir oposição à execução fiscal nem para o exercício de outros direitos que hajam de ser exercidos dentro daquele prazo, como resulta inequivocamente do disposto no artigo 203.º, n.º 1, alínea, a), do CPPT(3).

Daqui se retira que, ainda que a citação postal tenha sido recebida pelo executado (situação que, no caso em apreço, não resulta clara), a lei não dispensa à posteriori, a efetiva citação (pessoal ou edital), o que demonstra que a diligência postal não representa o verdadeiro e definitivo ato de citação, não demarcando, como se disse, o marco temporal inicial para deduzir oposição e para exercer as restantes faculdades processuais, nomeadamente o pedido de pagamento em prestações ou de dação em pagamento.

E isto é assim tanto nas situações em que o postal foi recebido pelo executado, como naquelas em que o mesmo vem devolvido por não existir norma que preveja ou estabeleça presunção do seu recebimento e bem assim, norma que permita estabelecer a data do seu recebimento pelo executado.

O mesmo se diga quanto à inexistência de norma que imponha a repetição da diligência postal, como claramente resulta para o regime da citação pessoal (artigo 192.º n.º 2 do CPPT) ou da injunção legal de realização subsequente da penhora sem imposição de nova tentativa de citação – o certo é que nunca é dispensada a citação definitiva no ato de penhora que posteriormente venha a ocorrer.

Face ao que se deixou dito, na situação que aqui nos ocupa, constatamos que a citação levada a efeito pelo órgão de execução fiscal sob a forma de citação postal obedeceu à forma legal e por isso não padece da nulidade que lhe vem assacada, contudo, não pode dar-se o executado por citado para todos os efeitos legais, uma vez que ainda não teve lugar a fase processual de penhora de bens e assim sendo, a citação efetuada tem-se por realizada, como supra se deixou dito, a título provisório.

O que, como é óbvio, não pode determinar a procedência da pretensão formulada pelo executado/reclamante, traduzida no pedido de reconhecimento da nulidade do processo executivo por falta de citação do recorrente. dado que ainda não chegou o momento ou fase processual que a lei prevê para levar a cabo o referido ato (de citação), não tendo, assim, havido qualquer omissão ou infração à lei.

E isto porque, como se diz no acórdão 21/03/2012 que vimos seguindo, “[A)a nulidade processual é sempre o resultado de um pronunciamento judicial sancionatório, alicerçado na atipicidade ou irregularidade relevante de um acto processual – seja pela omissão de acto prescrito pela lei, seja pela prática de acto que a lei não admite – que não pode ser reconhecida se nenhuma irregularidade é detectada perante a fase em que se encontra o ordenamento processual.

Sendo certo que, repete-se, esta solução não prejudica o exercício do direito de defesa da executada, já que o executado/reclamante sempre terá direito de se opor à execução quando for citada pessoalmente para a execução, isto é, quando tiver lugar a penhora de bens e se der o cumprimento ao disposto no artigo 193.º do CPPT.

Termos em que se impõe manter a decisão de improcedência da reclamação, embora com a presente fundamentação.


III - Decisão

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso, e manter a sentença recorrida com a presente fundamentação.

Custas a cargo do Recorrente.

Registe e notifique

Lisboa, 18 de maio de 2023


Hélia Gameiro Silva – Relatora
Ana Cristina Carvalho – 1.ª Adjunta
Isabel Fernandes – 2.º Adjunta
(com assinatura digital)


(1)Cfr. artigo 232.º da Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado para 2021, que estipulou que: “[E]m 2021, mantém-se a suspensão da atualização automática da unidade de conta processual prevista no n.º 2 do artigo 5.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, mantendo-se em vigor o valor das custas vigente em 2020.”
Assim, a Unidade de Conta (UC) fica fixada em €102,00 para vigorar no ano de 2021.
(2)In CPPT – Anotado e Comentado – 6.ª Edição 2011 – Volume III - Áreas Editora - em anotação (5) ao artigo 191.º pag. 373
(3)A oposição deve ser deduzida no prazo de 30 dias a contar: (a) Da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora.