Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1635/13.7 BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:02/08/2024
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:PSP
ANULAÇÃO DAS PROVAS
CONCURSO
FRAUDE
Sumário:I- É incontornável que o júri do Concurso é responsável pela realização de todas as operações concursais, as quais deverão constar fundadamente das correspondentes Atas, competindo-lhe "assegurar a tramitação do procedimento concursal, desde a data da sua designação até à elaboração da lista de ordenação final", como decorre do disposto nos artigos 5º da Portaria nº 938/2000, de 20 Dezembro, e 22º da Portaria nº 83-A/2009, de 22 Janeiro, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 145-A/2011, de 6 Abril;
II- Tendo o júri do Concurso tomado conhecimento de que muitos candidatos que realizaram as provas psicológicas, teriam na sua posse um diagrama que permitia resolver a prova de memória, é legitimo e compreensível que tenha optado pela anulação da referida prova, determinando a sua repetição em simultâneo por parte de todos os candidatos.
III- É manifesto que o júri não poderia ignorar os factos participados quanto a irregularidades verificadas, sob pena de se gerar e consolidar um clima de impunidade permissiva, com o qual seria conivente.
IV- Tratando-se de um concurso para Chefes de Polícia da PSP, em que, por duas vezes candidatos, polícias, publicitam ter acesso prévio à prova, tal desprestigia a condição de agente de autoridade, criando impacto negativo na imagem da PSP, se nada fosse feito em termos corretivos.
V- No que respeita à invocada violação do direito de audiência prévia dos Autores, tal não se verifica, uma vez que o júri fundadamente declarou a razão pela qual a não realizaria, atenta a demora que o procedimento concursal já evidenciava, ponto em risco a realização em tempo do curso que teria de ser frequentado pelos candidatos apurados, mormente tendo presente a existência de 570 candidatos.
VI- Se é certo que a regra do CPA é da obrigatoriedade da Audiência prévia, é claro que estão reunidos os pressupostos constantes do seu artigo 103º, n.º 1, alínea a), tendentes a, excecionalmente, ser a mesma dispensada, inverificando-se o vicio suscitado decorrente da não realização da referida audiência.
Votação:
UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção SOCIAL
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
R....... e Outros, intentaram Ação Administrativa Especial de impugnação de atos, contra o Ministério da Administração Interna/PSP, tendente à anulação
(a) Do ato de revogação da prova psicológica de seleção realizada em junho de 2013, no âmbito do procedimento de Concurso de Admissão ao 2° Curso de Formação de Chefes da Policia,
(b) Do ato que determinou a realização de nova prova psicológica de seleção, em 27.10.2013, no âmbito do procedimento de Concurso de Formação de Chefes de Polícia.
Inconformados com a Sentença proferida em 25 de janeiro de 2017 que julgou improcedente a Ação, vieram os Autores, em 1 de março de 2017, Recorrer para esta instância, concluindo:
“a) Impugnou-se, nos presentes autos, um ato de anulação de uma prova tomada em concurso tendo em vista a promoção, com fundamento em preterição de audiência prévia e de erro nos pressupostos de facto;
b) A sentença impugnada fez errado julgamento da matéria de facto, ao dar como provado, nas alíneas E), I), J), M), N), O), P), Q), R), dos factos dados como provados o constante da Ata n.° 14, quando o que está em causa não é se tais supostos factos estão vertidos na referida Ata mas se os mesmos, de factos, ocorreram;
c) Isto porquanto os aqui Recorrentes puseram em causa o facto de os factos ali relatados e os documentos ali referidos, e que serviram de fundamento ao ato, existissem;
d) Esses factos, aqueles cuja existência os Recorrentes impugnaram, apenas poderiam ser dados como provados através dos documentos que os corporizam os quais nunca foram exibidos;
e) Pelo que a sentença em apreço deveria dar por provado que os factos referidos na Ata n.° 14 não foram dados como provados;
f) Ao assim não fazer incorreu em erro de facto causal de violação do artigo 141. n.° 1, do CPA que também violou;
g) A sentença em apreço violou, ainda, por desaplicação os artigos 100.° e seguintes do CPA;
h) Dado que a urgência invocada para não facultar aos Recorrentes o direito de audiência prévia, não se encontrar fundamentada;
i) Tampouco se concebendo a sua dispensa com fundamento no elevado número de interessados atento o disposto no artigo 103.°, n.° 1, alínea c) do CPA;
j) E a sua atinência ao disposto no artigo 103.°, n.° 1, alínea a) do CPA quando, segundo a Ré teria tido conhecimento dos factos que deram origem à anulação um mês antes da prática do ato anulatório, o direito de audiência prévia satisfaz-se em dez dias e a data para a realização de nova prova só foi designada para dois meses depois;
k) Ainda que se dê como provada a existência dos documentos indicados na Ata n.° 14 ainda assim violou a sentença recorrida o disposto no artigo 141.°, n.° 1, do CPA, na medida em que, de acordo com a Ata n.° 14, se tratará de documentos anónimos ou assinados com pseudónimo por autor desconhecido remetidos, inclusivamente mais de um mês apos a realização das provas e que não provam o que deles se pretende provar;
Termos em que, deve o presente recurso jurisdicional ser declarado procedente, sendo a sentença revogada e substituída pro outra que declare procedente a ação.”

Por Despacho 5 de abril de 2017 foi admitido o Recurso Jurisdicional interposto.

O aqui Recorrido/Ministério-PSP veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 18 de maio de 2017, aí concluindo:
“1ª - Os factos descritos na Ata n.° 14 e os documentos que lhe dão suporte, constantes do p.a., são causa adequada à deliberação tomada de anulação da prova psicológica e constituem fundamento bastante para o efeito e mesmo incontornável no critério do júri, único responsável pelas operações do concurso.
2ª - Tendo uma apurada perceção da relevância da credibilidade que devem ter as operações de um concurso para admissão de chefes da polícia a um curso subsequente de formação de chefes, com a duração de 9 meses, impunha-se ao júri, constituído por oficiais de polícia, como imperativa, uma decisão que não deixasse a mínima dúvida ou interrogação em todos os candidatos e na opinião pública, sobre as suspeitas de conhecimento prévio da prova psicológica que, aliás, era única para os vários grupos de candidatos, e a realizar em dias diferentes.
3ª - A relevância jurídica dos elementos de prova em que se baseou o júri é, no contexto deste procedimento concursal, de tal ordem de grandeza que determinou a aplicação a todos os candidatos, no mesmo dia e à mesma hora, da prova psicológica realizada a 27.10.2013, para acabar de vez com todo o tipo de suspeições, o que foi feito com sucesso.
4ª - Ao contrário, ou seja, se o júri não relevasse juridicamente os elementos de prova do seu conhecimento e, em seu poder, jamais se libertaria da acusação de ter permitido o favorecimento de candidatos que agiram em erro ou engano sobre factos denunciados, para obterem um benefício ilegítimo e fraudulento.
5ª - Não podem, consequentemente, proceder as alegações dos Autores de que tal deliberação sofra de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto.
6ª - Por outro lado, não podia o júri, perante a factualidade de que tomou conhecimento, deixar de anular a prova psicológica, sob pena de poder incorrer em grave violação dos princípios da igualdade, da justiça e da imparcialidade que devem verificar-se relativamente a todos os candidatos, contrariamente ao que vem alegado pelos Autores.
7ª - A igualdade entre os candidatos e um juízo de imparcialidade e de justiça só poderiam verificar-se tendo todos os candidatos as mesmas oportunidades de demonstração de conhecimentos, as mesmas condições de resolução da prova sem reservas de qualquer espécie e sem sombra de suspeição entre os 570 candidatos em disputa dos 200 lugares de acesso ao curso de chefes.
8ª - Foi exatamente o que veio a verificar-se com a anulação da prova e a solução encontrada de uma nova prova em simultâneo de todos os candidatos no mesmo dia e à mesma hora, sendo que, sem a anulação das provas de junho de 2013, seria o próprio júri a violar aqueles princípios, criando condições para o desprestígio da condição de agente da autoridade do próprio júri e dos candidatos a chefes, com impacto negativo na imagem da PSP.
9ª - Segundo o n.° 18 da ata n.° 14, o júri deliberou não proceder à audiência dos interessados, atendendo à urgência e demora já provocada pela anulação das provas psicológicas no processo de seleção, por haver urgência na decisão, pelo que não ocorreu a violação do direito de audiência prévia dos Autores.
10ª - Trata-se, por um lado, de uma deliberação que não comprometia de forma irremediável a posição jurídica dos Autores, na medida em que eles sempre poderiam recorrer da classificação final, se fosse caso disso, e, por outro lado, é visível que júri tomou aqui uma decisão que fundamentou num dado objetivo consubstanciado na anterior anulação das provas psicológicas, conforme a Ata n.° 11, para concluir pela urgência da decisão final.
11ª - Considerando a especificidade deste procedimento concursal que se destinava a selecionar 200 candidatos para posteriormente frequentarem o “Curso de Formação de Chefes de Polícia (CFC)”, como consta do Aviso, a urgência configurava-se também como aferida em relação a esta situação objetiva.
12ª - Não estamos, assim, na presença de atos administrativos a que falte qualquer elemento essencial ou para os quais a lei comine expressamente a nulidade (art.° 133 ° do CPA), nem se verifica a existência de qualquer vício de violação de lei que inquine os atos impugnados, nos termos do artigo 135.° do CPA, para além de que não se verifica também a violação de qualquer preceito ou princípio constitucional.
13ª - Assim, a douta sentença recorrida não merece censura jurisdicional, devendo negar-se provimento ao recurso, com as legais consequências.”
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 23 de junho de 2017, veio a emitir Parecer em 3 de julho de 2017, pugnando pela improcedência do Recurso.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, nomeadamente, verificando se se verificarão os invocados erros nos pressupostos de facto, falta de audiência prévia dos AA. e ainda alegada violação dos princípios da igualdade e imparcialidade, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade:
A) Por aviso publicado na Ordem de Serviço nº 164-B, II parte, de 23.10.2012, foi aberto concurso de admissão ao 2º Curso de Formação de Chefes da PSP – procedimento concursal nº 3/2012, para preenchimento de 200 vagas na categoria de Chefe – ver doc nº 2 junto com o requerimento inicial da providência apensa, com o nº 1437/13.0BESNT.
B) Consta do aviso, sobre os métodos de seleção e critérios de avaliação, o seguinte:
9. Os candidatos admitidos serão submetidos aos seguintes métodos de seleção com caráter eliminatório:
9.1. Provas físicas – destinam-se a verificar se o candidato reúne as condições físicas indispensáveis à função a desempenhar, nos termos do Anexo do Concurso de Admissão ao Curso de Formação de Subchefes, aprovado pela Portaria nº 938/2000 (2ª série), de 30.6, alterada pela Portaria nº 968/2007, de 8.11.
9.2. Exame psicológico – visa avaliar as capacidades e as caraterísticas de personalidade dos candidatos, com o fim de determinar a sua adequação para o exercício da função.
9.3. Prova escrita de aptidão profissional – destina-se a avaliar os conhecimentos técnico-policiais dos seguintes temas:
a) teste de instrução geral, tática e técnica (realizado nos moldes referidos nos anexos D, E e F do presente aviso);
b) Resolução de um caso de natureza policial (efetuado nos moldes referidos no anexo D, E, F do presente aviso);
c) A classificação da prova escrita de aptidão profissional corresponde à média aritmética dos termos que a compõem.
9.4. Prova escrita de aptidão cultural – destina-se a avaliar os conhecimentos de cultura geral e capacidade de exposição do candidato e consta do seguinte:
a) exposição sobre um tema (efetuado nos moldes referidos no anexo D, E e F do presente aviso).
b) Questões sobre diversas matérias (efetuado nos moldes referidos no anexo D, E e F do presente aviso).
10. Classificação final - A classificação final dos candidatos corresponde à média ponderada dos resultados obtidos no exame psicológico, na prova escrita de aptidão profissional e na prova escrita de aptidão cultural, após aplicação dos seguintes coeficientes de ponderação:
a) exame psicológico - 3
b) prova escrita de aptidão profissional - 3
c) prova escrita de aptidão cultural - 2.
10.1. Os candidatos serão ordenados segundo a média das classificações obtidas, com aproximação ás centésimas, por ordem decrescente. Havendo igualdade de classificação, preferem por esta ordem, os seguintes candidatos:
a) tenha melhor avaliação de serviço no conjunto das avaliações consideradas,
b) maior antiguidade na PSP.
10.2. Serão considerados não aprovados os candidatos que tenham sido considerados inaptos nas provas físicas, que tenham obtido a menção qualitativa de «com reservas» ou «não favorável» no exame psicológico ou que tenham obtido nota inferior a 9,5 valores nas provas escritas de aptidão profissional ou cultural - ver doc n° 2 junto com o requerimento inicial da providência apensa.
C) Os autores concorreram ao concurso - por acordo e docs juntos aos autos.
D) O júri procedeu à primeira aplicação do método de seleção - prova psicológica de 15 a 24.4.2013 em Portugal Continental, dia 29.4.2013 na Região Autónoma da Madeira e dia 7.5.2013 na Região Autónoma dos Açores - ver doc n° 3 junto com o requerimento inicial dos autos apensos.
E) Por deliberação de 16.5.2013, o júri procedeu à anulação dessa prova por ter havido a divulgação, entre candidatos, de partes da prova, designadamente do exercício de memória, do qual foi entregue um manuscrito por um agente que denunciou essa situação - ver doc n° 3 junto com o requerimento inicial dos autos apensos.
F) Foi adquirida pela Polícia de Segurança Pública uma nova prova psicológica, constituída por 20 licenças da prova, que só permite a aplicação, em simultâneo, a 20 candidatos. Deve referir-se aqui que, mesmo que a PSP adquirisse licenças suficientes para aplicação simultânea a todos os candidatos, com custos certamente incomportáveis, teriam que existir igual número de computadores em contexto de sala de formação e aplicadores credenciados suficientes, o que, devido ao universo de candidatos, não é exequível - ver doc n° 3 junto com o requerimento inicial dos autos apensos.
G) Neste contexto procedeu-se à aplicação da nova prova psicológica, que decorreu na Escola Prática de Polícia de 13 a 20.6.2013, em 24.6.2013 na Região Autónoma da Madeira e em 28.6.2013 na Região Autónoma dos Açores. A aplicação da prova foi feita a grupos de 20 candidatos em simultâneo, num máximo de 80 candidatos por dia - ver doc n° 3 junto com o requerimento inicial dos autos apensos.
H) Os autores efetuaram exame psicológico no mês de junho de 2013 e foram classificados com 20 valores - admissão por acordo.
I) Consta no ponto 6 da ata n° 14, junta como doc n° 3 com o requerimento inicial dos autos apensos, que antes do início da prova para cada grupo de candidatos, estes foram alertados para o impacto negativo que teve a anulação da anterior em termos de imagem da PSP e no atraso do início do Curso de Formação de Chefes daí resultante, exortando todos os candidatos a adotar um comportamento digno e ético na resolução desta prova, consentâneo com a sua condição de agentes de autoridade e candidatos a funções de chefia da PSP.
J) Durante a aplicação da prova apenas foram recebidos pelo júri uma carta anónima, datada de 18.6.2013 em que dava conta da possível circulação de informação sobre o exercício de memória, indicando a resolução muito incompleta desse exercício e, também, uma carta de uma candidata, datada de 25.6.2013, denunciando, também, a possível circulação dessa informação, mas sem apontar qualquer facto concreto - ver doc n° 3 junto com o requerimento inicial dos autos apensos.
K) A 18.7.2013 foi notificada a deliberação do júri com a lista provisória de candidatos aptos e não aptos e concedido aos candidatos o prazo de audiência dos interessados - ver doc n° 3 junto com o requerimento inicial dos autos apensos.
L) Foram, então, apresentadas reclamações, pela forma diferida no tempo como foi aplicada a prova psicológica e também pela existência de um número muito elevado de notas de 20 valores nessa mesma prova, que contribuíram, em alguns casos, que candidatos com notas mínimas nas provas escritas ficassem ordenados nos primeiros 200 candidatos, com direito a entrada no concurso - ver doc n° 3 junto com o requerimento inicial dos autos apensos.
M) Consta no ponto 10 da ata n° 14, junta como doc n° 3 com o requerimento inicial dos autos apensos, que no dia 19.7.2013 o júri tomou conhecimento da seguinte situação:
a. Uma candidata ao Concurso de Admissão ao CFC, devidamente identificada no relatório que será enviado ao Ex mo Sr. Diretor Nacional da PSP com a proposta de medidas a tomar, enviou, nessa data, ao Sr. Subintendente P........, vogal do júri do concurso, uma mensagem de correio eletrónico que se junta ao referido relatório, que tinha recebido em 10.6.2013, três dias antes do início da aplicação da prova psicológica;
b. A mensagem foi recebida de um endereço designado de limpinho@tormail.ors e era dirigida, para além dessa candidata, a mais sete destinatários, dos quais foi possível identificar seis deles.
c. O texto da mensagem continha os seguintes dizeres:
«Olá a todos. Como se devem estar a questionar quem sou, digo desde já que sou um vosso conhecido, mas por motivos óbvios não vou revelar quem sou. Em vez disso, vou dar-vos um rebuçadinho de Santo António, para vocês espalharem pelos vossos amigos (amigos, chibos não !!) cujos contactos eu não tenho. Anularem os primeiros, logo boquinha calada e vamos todos tirar 20 nesta merda».
d. A mensagem trazia, ainda, um ficheiro anexo «psicotécnicos.exe.zip» protegido por palavra passe.
e. O ficheiro anexo indicado abre com a palavra passe EPP e, aparentemente, não contém nenhum dado relevante. Segundo a candidata, a palavra passe foi-lhe enviada, nesse mesmo dia, a seu pedido, pelo mesmo «limpinho».
f. Desconhece-se se havia mais ficheiros nessa mensagem ou se foram enviados posteriormente. Contudo, não nos parece que se tenha tratado de uma simples brincadeira, uma vez que os endereços de correio eletrónico a quem foi enviada pertencem a pessoas que em determinada altura terão constituído um grupo de amigos, muito possivelmente, segundo a mesma candidata, ligado a uma esquadra do Comando Metropolitano de Lisboa, onde a maioria dos destinatários pertence ou já pertenceu.
N) Consta no ponto 11 da ata n° 14, junta como doc n° 3 com o requerimento inicial dos autos apensos, que no dia 24.7.2013 chegou ao conhecimento do júri, também, o seguinte acontecimento:
a. No dia 24.7.2013, às 22h39m, foi publicada, no fórum PSP, com o endereço www.forumvsy.net, uma parte substancial da prova psicológica aplicada, pela segunda vez no concurso de admissão ao CFC, que se junta em anexo, parte essa, ainda assim, a título exemplificativo.
b. A mensagem contendo a prova psicológica foi publicada por um participante que se identifica com a sigla SDCM, que acreditamos ser o candidato indicado no relatório anteriormente referido.
c. Consultada a Divisão de Psicologia sobre a parte da prova publicada no fórum, foi-nos transmitida a seguinte informação:
«Os itens referidos do Fórum são os mesmos que constam na prova psicológica, aplicada ao CFC (2a aplicação), nomeadamente, quanto à sub prova «Memória», a sua matriz de memorização, que permanece em ecrã durante 3 minutos; Esta matriz de memorização permite a resolução de todas as questões da subprova «Memória»; A prova aplicada compõe-se de 9 subprovas. No fórum em questão conseguimos identificar questões relativas a 4 destas subprovas; Nalgumas das questões verifica-se a simplificação da própria questão, mas sem alterar o sentido das mesmas; Em nosso entendimento, cremos ser pouco provável a possibilidade de memorização, por parte dos candidatos para a transcrição das questões apresentadas, pelo que se nos afigura como mais provável a gravação das provas».
d. Embora esta publicação tenha ocorrido em data posterior às da aplicação de provas, que decorreram de 13 a 20 de junho na EPP, em 24.6 no CR Madeira e em 28.6 no CR Açores, não poderão deixar de ser levantadas questões sobre quando e como este candidato obteve aquela prova e se foi usado esse conhecimento na realização da mesma e/ou transmitido a outros candidatos.
e. Por outro lado, a publicação desta prova, recentemente adquirida pela PSP, causa prejuízos imediatos à Polícia de Segurança Pública.
f. Essa publicitação poderá ter violado os direitos de Autor da mesma, pelo que o júri irá propor a averiguação da existência eventual de responsabilidade criminal e disciplinar na sua divulgação.
g. Desta publicação no fórum indicado foi dado eco em muitas das reclamações que chegaram ao júri.
O) Consta no ponto 12 da ata n° 14, junta como doc n° 3 com o requerimento inicial dos autos apenso, que «em carta de 30.7.2013, um candidato fez chegar ao júri um print screen de uma página, também do fórum www.formpsp.pt, de 18.6, data em que ainda decorriam as provas, de um participante no fórum que não é possível identificar nessa impressão, com a seguinte mensagem: «Fui o primeiro a fazer as provas para os psicos. No dia seguinte já todos sabiam resultados e um outro quadro (...) para o fim já sabem a sabem a solução dos 20 problemas e já sabem as respostas ao quadro. Digo-te mais ... ligaram-me a perguntar se queria o quadro ... eu respondi que já tinha feito o dito cujo.
P) Consta no ponto 13 da ata n° 14, junta como doc n° 3 com o requerimento inicial dos autos apensos, que «também em carta datada de 2.8.2013, um outro candidato acompanha a sua reclamação com uma impressão de uma página do Facebook, com uma mensagem datada de 25.7.2013, de um perfil em nome de A........, que se intitula como pertencendo ao Comando de Setúbal, existindo um candidato A........ no concurso, desse comando, com os seguintes dizeres, entre outros: «só sei que vi uma mensagem de um colega com parte do teste em pdf... por azar o colega já o tinha feito quando a recebeu».
Q) Consta no ponto 14 da ata n° 14, junta como doc n° 3 com o requerimento inicial dos autos apensos, que «muitos candidatos fizeram chegar ao júri reclamações da forma como alguns candidatos que saiam da prova transmitiam aos seguintes informações sobre a mesma».
R) Assim, em 14.8.2013 o júri considerando as situações descritas, sobretudo nos pontos n° 10 a 14 da ata n° 14 junta como doc n° 3 com o requerimento inicial dos autos apensos, aliadas ao elevado número de notas 20 na prova psicológica, decidiu ser «forte convicção dos membros do júri que alguns candidatos já tinham bastante informação sobre a prova e mesmo que a poderão ter realizado de modo fraudulento. Não pode, por isso, em consciência, propor a V Exa., senhor Diretor Nacional uma lista de ordenação final para homologação tendo em conta esses factos descritos, que considera muito graves.
Nestes termos, o júri deliberou o seguinte:
a. anular a prova psicológica que decorreu na Escola Prática de Polícia de 13 a 20.6.2013, em 24.6.203 na RA da Madeira e em 28.6.2013 na RA dos Açores, bem como os seus resultados, voltando o concurso à fase de aplicação dos métodos de seleção;
b. o júri irá avaliar a melhor solução para aplicação deste método de seleção, que será, oportunamente, comunicado aos candidatos;
c. o júri irá elaborar um relatório circunstanciado com as situações descritas na presente ata, propondo a S Ex a. o Diretor Nacional da PSP a averiguação da eventual existência de responsabilidades a nível criminal e/ ou disciplinar, para que não voltem a ocorrer no futuro.
Atendendo à urgência e demora já provocada pela anulação das provas psicológicas no processo de seleção, não procede à audiência de interessados, nos termos do art 103o, n° 1, al a) do Código de Procedimento Administrativo, por haver urgência na decisão.
Os candidatos ao concurso irão ser notificados desta deliberação através de aviso a publicar em Ordem de Serviço e também através de correio eletrónico.
Da presente deliberação do júri cabe recurso para o Diretor Nacional da PSP, a interpor no prazo de 10 dias a contar da data da notificação.
S) Os autores interpuseram recursos hierárquicos, da deliberação do júri de 14.8.2013, para o Diretor Nacional da PSP - ver doc n° 4 junto com o requerimento inicial dos autos apensos e processo administrativo apenso.
T) A 7.10.2013 os recursos foram indeferidos nos termos que constam do doc n° 5 junto com o requerimento inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
U) A partir de 15.10.2013 os autores passaram a ser notificados da decisão dos recursos hierárquicos - ver paa.
V) A 15.10.2013 foi enviado um e-mail a alguns candidatos para efeitos de notificação para comparência às provas psicológicas na Escola Prática de Polícia em Torres Novas, no dia 27.10.2013, às 9h 30m, e para o seguinte:
i. A prova será de realização única, não sendo justificada qualquer tipo de falta. Os candidatos que não compareçam, por qualquer motivo, na data e hora indicados, serão considerados faltosos e serão eliminados do concurso - ver doc n° 1 junto com o requerimento inicial dos autos apensos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
W) A 23.10.2013 o 1° autor requereu providência cautelar de (i) suspensão do ato pelo qual foi revogada a prova psicológica realizada durante o mês de junho de 2013 e, consequentemente, (2) suspensão da prova que se encontra marcada para ter lugar no dia 27.10.2013, (3) provisoriamente, a intimação do Diretor nacional da PSP, sob pena de incorrer em crime de desobediência, a abster-se de levar a cabo a prova que se encontra marcada para ter lugar no dia 27.10.2013, pelas 9h 30m, na Escola Prática da Polícia - ver processo cautelar apenso.
X) 19.11.2013 foi proferida decisão no processo cautelar que recusou a pretensão do ora 1° autor - ver processo cautelar apenso.
Y) No dia 27.10.2013 realizou-se a terceira prova psicológica no procedimento concursal - por acordo.
Z) A presente instância teve início no dia 28.11.2013 - ver pi.
AA) Por despacho de 21.1.2014 foram homologadas as listas de ordenação final dos candidatos aprovados - ver docs juntos aos autos em 27.11.2014.
BB) A 24.1.2014 as referidas listas foram publicadas na Ordem de Serviços n° 16B-II Parte, da DN/PSP - ver docs juntos aos autos em 27.11.2014.
CC) A 11.6.2014teve início o 2° Curso de formação de chefes, tendo a lista de candidatos admitidos sido publicada na OS n° 77 A - II Parte, de 13.5.2014.

IV – Do Direito
No que aqui releva, discorreu-se no discurso fundamentador da decisão recorrida:
“(…) 1) A 19.7.2013 uma candidata ao Concurso de Admissão ao CFC, devidamente identificada enviou ao Subintendente P........, vogal do júri do concurso, uma mensagem de correio eletrónico que tinha recebido em 10.6.2013, três dias antes do início da aplicação da prova psicológica.
A mensagem foi recebida de um endereço designado de limpinho@tormail.org e era dirigida, para além dessa candidata, a mais sete destinatários, dos quais foi possível identificar seis deles.
O texto da mensagem continha os seguintes dizeres: «Olá a todos. Como se devem estar a questionar quem sou, digo desde já que sou um vosso conhecido, mas por motivos óbvios não vou revelar quem sou.
Em vez disso, vou dar-vos um rebuçadinho de Santo António, para vocês espalharem pelos vossos amigos (amigos, chibos não!!) cujos contactos eu não tenho. Anularem os primeiros, logo boquinha calada e vamos todos tirar 20 nesta merda».
A mensagem trazia, ainda, um ficheiro anexo «psicotécnicos.exe.zip» protegido por palavra passe. O ficheiro anexo indicado abre com a palavra passe EPP e, aparentemente, não contém nenhum dado relevante.
Segundo a candidata, a palavra passe foi-lhe enviada, nesse mesmo dia, a seu pedido, pelo mesmo «limpinho».
Desconhece-se se havia mais ficheiros nessa mensagem ou se foram enviados posteriormente.
Contudo, não nos parece que se tenha tratado de uma simples brincadeira, uma vez que os endereços de correio eletrónico a quem foi enviada pertencem a pessoas que em determinada altura terão constituído um grupo de amigos, muito possivelmente, segundo a mesma candidata, ligado a uma esquadra do Comando Metropolitano de Lisboa, onde a maioria dos destinatários pertence ou já pertenceu.
2) No dia 24.7.2013, às 22h39m, foi publicada, no fórum PSP, com o endereço www.forumpsp.net, uma parte substancial da prova psicológica aplicada, pela segunda vez no concurso de admissão ao CFC, que se junta em anexo, parte essa, ainda assim, a título exemplificativo.
3) Em carta de 30.7.2013, um candidato fez chegar ao júri um print screen de uma página, também do fórum www.formpsp.pt, de 18.6, data em que ainda decorriam as provas, de um participante no fórum que não é possível identificar nessa impressão, com a seguinte mensagem: «Fui o primeiro a fazer as provas para os psicos. No dia seguinte já todos sabiam resultados e um outro quadro (...) para o fim já sabem a solução dos 20 problemas e já sabem as respostas ao quadro. Digo-te mais ... ligaram-me a perguntar se queria o quadro ... eu respondi que já tinha feito o dito cujo».
4) Também em carta datada de 2.8.2013, um outro candidato acompanha a sua reclamação com uma impressão de uma página do Facebook, com uma mensagem datada de 25.7.2013, de um perfil em nome de A........, que se intitula como pertencendo ao Comando de Setúbal, existindo um candidato A........ no concurso, desse comando, com os seguintes dizeres, entre outros: «só sei que vi uma mensagem de um colega com parte do teste em pdf... por azar o colega já o tinha feito quando a recebeu».
5) Muitos candidatos fizeram chegar ao júri reclamações da forma como alguns candidatos que saiam da prova transmitiam aos seguintes informações sobre a mesma.
O ato relata as situações denunciadas, trazidas ao júri do procedimento por candidatos do Concurso, que inclusive fizeram chegar ao júri reclamações da forma como alguns candidatos que saiam da prova transmitiam aos seguintes informações sobre a mesma.
Obviamente, o júri não anulou as provas psicológicas do Concurso e respetivos resultados com fundamento em factos provados de que houve candidatos que tiveram acesso às respostas antes ou no decurso da prova.
No entanto os relatos que foram chegando ao júri - de suspeita de alguns dos candidatos terem obtido conhecimento prévio do conteúdo da prova psicológica - foram-lhe trazidos por candidatos, referem-se às provas psicológicas do concurso, que decorreram em dias diferentes, o que de todo se afiguram «atoardas» ou simples rumores, notícias sem sustento palpável.
Nessas denúncias existem elementos de ligação aos exames em causa.
E os autores não impugnam, com factos, as situações descritas nos n° 10 a 14 da ata, apenas entendem que os mesmos integram boatos, sem prova.
Assim não o entendeu o júri, que «considerando as situações descritas, sobretudo nos pontos n° 10 a 14 da ata n° 14, aliadas ao elevado número de notas 20 na prova psicológica, decidiu ser «forte convicção dos membros do júri que alguns candidatos já tinham bastante informação sobre a prova e mesmo que a poderão ter realizado de modo fraudulento. Não pode, por isso, em consciência, propor uma lista de ordenação final para homologação tendo em conta esses factos descritos, que considera muito graves».
E assim determinou a aplicação a todos os candidatos, no mesmo dia e à mesma hora, da prova psicológica realizada a 27.10.2013.
De facto, tratando-se de um concurso para Chefes de Polícia da PSP, em que, por duas vezes, candidatos, policias, publicitam ter acesso prévio à prova, desprestigia a condição de agente de autoridade e cria impacto negativo na imagem da PSP, tanto mais que os candidatos em causa têm a pretensão de vir a ser Chefes da Polícia.
Por estes motivos improcede a alegada violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto.
Preterição do direito de audiência prévia.
Os autores dizem que o ato revogatório da prova psicológica, que decorreu na Escola Prática de Polícia de 13 a 20.6.2013, em 24.6.203 na RA da Madeira e em 28.6.2013 na RA dos Açores, bem como os seus resultados, foi praticado impedindo, nomeadamente, os autores de sobre o mesmo se pronunciarem. Mas o júri, desde a reclamação de 19.7. até 14.8.2013, quase um mês depois teria tido possibilidade de facultar aos interessados o direito de audiência prévia, mas não o fez.
A justificação para a inexistência de audiência dos interessados foi dada no ato impugnado, o qual, nos termos do art 103°, n° 1, al a) do Código de Procedimento Administrativo, atendendo à urgência e demora já provocada pela anulação das provas psicológicas no processo de seleção, concluiu pela urgência na decisão.
A data apontada pelos autores - 19.7.2013 - em relação à decisão impugnada, não pode ser a única a ter em conta, porque a anulação das provas de junho de 2013 teve por base não uma denúncia - a de 19.7.2013 - mas várias, a de 19.7.2013, a de 24.7.2013, 30.7.2013, 2.8.2013.
Pelo que usando o raciocínio dos autores a urgência invocada pela demandada já se justificava em relação à denúncia de 30.7. e 2.8.2013.
No entanto, mesmo que se avalie a urgência na decisão atendendo à data de 19.7.2013, não se vê que a resposta no caso possa ser negativa, atento o número de vagas a preencher e de candidatos, cerca de 500, a poderem exercer o direito de audiência prévia no procedimento concursal.
Isto vale para dizer que os argumentos dos autores não procedem nem são suficientes para prova de falta de urgência no caso, por reporte à previsão de inexistência de audiência prévia do art 103°, n° 1, al a) do CPA.
A urgência na decisão, como refere Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa, J Pacheco de Amorim, em CPA, comentado, 2ª edição, pág 464, é, portanto, aferida em relação à situação objetiva, real, que a decisão procedimental se destina a regular, não em relação à urgência procedimental, que, por regra, não justifica a preterição de formalidades essenciais do procedimento.
Também, note-se, que a decisão impugnada, sendo lesiva, não constitui a decisão final do procedimento concursal.
No caso estava em curso procedimento concursal para preenchimento das 200 vagas na categoria de chefe e a urgência, do art 103°, n° 1, al a) do Código de Procedimento Administrativo, foi explicada atendendo à demora já provocada pela (primeira) anulação das provas psicológicas no processo de seleção.
Pelo que não se vê razão para que a urgência alegada pela demandada não justifique a não realização de audiência prévia.
Relegando a demandada a averiguação da eventual existência de responsabilidades a nível criminal e/ ou disciplinar, para que não voltem a ocorrer no futuro.
Da falta de fundamentação
Mais carece de fundamentação a respeito de cada um dos recursos hierárquicos interpostos da deliberação do júri de 14.8.2013.
Fundamentar um ato, decidiu o Tribunal Central Administrativo Sul, em 6.11.2008, no processo n° 1628/06, no que concordamos na íntegra, «consiste na indicação dos motivos, das razões de facto e, quando a lei o exija, de direito por que o mesmo se pratica, de modo a que o destinatário possa «deduzir expressamente a resolução tomada das premissas em que assenta, ou em exprimir os motivos por que se resolve de certa maneira e não de outra» impondo-se, entre outros requisitos, os de indicação expressa, clara, suficiente e congruente, embora sucinta, dos fundamentos.
A suficiência da fundamentação há-de aferir-se pelo critério da compreensibilidade das razões da decisão segundo um destinatário normal ou razoável colocado na situação concreta».
Os nossos autores bem perceberam que a anulação de provas psicológicas no procedimento concursal se ficou a dever a suspeita de alguns candidatos terem obtido conhecimento prévio do conteúdo das provas. Tanto assim que os mesmos qualificam tais suspeitas como boatos, sem prova da veracidade dos mesmos. Ou seja, a alegação de erro sobre os pressupostos de facto, inevitavelmente, afasta a alegação de falta de fundamentação. Porque ocorre erro de facto «quando estamos perante uma (...) «divergência entre a realidade empírica e aquilo que o ato tomou como tal», ou seja, quando o ato administrativo se alicerçou numa materialidade que não era aquela que a lei queria que fosse tomada como base para a decisão» (in CJA, n° 27, pág n° 50, anotação de Luís Cabral de Moncada, sob o título Erro de facto e falta de fundamentação no ato administrativo, ao Ac do Tribunal Central Administrativo, de 29.6.2000, processo n° 2590).
Donde se julga improcedente o vício de forma, por falta de fundamentação.
Dos princípios da igualdade, da imparcialidade.
A demandada diz, perante a factualidade que lhe foi dada a conhecer, que a sua decisão de anular a prova psicológica foi a única conforme o direito e a justiça.
De outro modo, ficando a dúvida sobre o prévio acesso de alguns candidatos à solução dos exames, inevitavelmente acarretaria a violação dos princípios que regem os concursos.
Nesta conformidade, com o ato impugnado, o júri anulou a prova única, para os vários grupos de candidatos e a realizar em dias diferentes, e agendou nova data, para aplicação a todos os candidatos, no mesmo dia e à mesma hora, da prova psicológica realizada a 27.10.2013.
Cabendo ao júri cuidar da tramitação do procedimento concursal, desde a data da sua designação até à elaboração da lista de ordenação final, com respeito pelo princípio constitucionalidade da igualdade.
No caso, as dúvidas lançadas sobre o acesso de alguns candidatos a provas e a necessidade de o júri atuar com isenção, imparcialidade e no respeito pelo princípio da igualdade entre os candidatos, ditaram o ato de anulação das provas de 13 a 28.6.2013.
O que significa, nas circunstâncias do caso concreto, que a legalidade do procedimento concursal exigiu fosse proferido o ato impugnado, por isso, não padece de violação de lei, por violação de princípios administrativos.
Da violação do art 69° do CPA (de 1991).
Os autores alegam que a decisão de 7.10.2013 viola o prazo legal de 8 dias que, nos termos do art 69° do Código de Procedimento Administrativo, é imposto para proceder às notificações, da decisão do recurso hierárquico e a data da marcação de nova prova.
Os autores esquecem, no entanto, de dizer que tipo de recurso hierárquico foi interposto e, consequentemente, quais os seus efeitos.
Também foi-lhes negada a suspensão de eficácia do ato, a título provisório e mesmo cautelar.
Ainda assim, a falta de notificação de ato administrativo, dentro do prazo legal previsto no art 69° do CPA, não gera a invalidade da prova realizada a 27.10.2013, porque a notificação constitui requisito de eficácia, não de validade.”

Vejamos:
Está em causa no presente recurso a apreciação da legalidade da deliberação tomada pelo júri, de 14 Agosto 2013, no âmbito do concurso para Chefes de Polícia, promovido pela PSP, a qual anulou a prova psicológica realizada no mês de Junho de 2013 e os seus resultados, em sede do procedimento concursal nº 23/2012, aberto por aviso publicado em Ordem de Serviço, tendente à admissão ao 2.° Curso de Formação de Chefes da PSP com vista ao preenchimento de 200 vagas na categoria de Chefe e, por outro lado, a subsequente deliberação do júri de marcar uma nova prova psicológica de seleção para o dia 27 Outubro 2013.

Os Recorrentes limitam-se nesta sede recursiva a retomar a argumentação já esgrimida em 1ª Instância, mais do que imputar eventuais vícios à Sentença Recorrida.

Importa predominantemente apreciar as seguintes questões recursivamente suscitadas, a saber, erro dos pressupostos de facto, falta de audiência prévia dos AA. e ainda alegada violação dos princípios da igualdade e imparcialidade.

Desde logo, e no que respeita à invocação de que a “sentença impugnada fez errado julgamento da matéria de facto, ao dar como provado, nas alíneas E), I), J), M), N), O), P), Q), R), dos factos dados como provados o constante da Ata n.° 14, quando o que está em causa não é se tais supostos factos estão vertidos na referida Ata mas se os mesmos, de factos, ocorreram”, refira-se que, se é certo que os Recorrentes reconhecem que os referenciados factos constam descritivamente da Ata nº 14, não é menos verdade que não lograram demonstrar que os mesmos não ocorreram, atenta a convicção firmada desde logo a esse respeito em 1ª Instância.

De resto é incontornável que o júri do Concurso é responsável pela realização de todas as operações concursais, as quais deverão constar fundadamente das correspondentes Atas, competindo-lhe "assegurar a tramitação do procedimento concursal, desde a data da sua designação até à elaboração da lista de ordenação final", como decorre do disposto nos artigos 5º da Portaria nº 938/2000, de 20 Dezembro, e 22º da Portaria nº 83-A/2009, de 22 Janeiro, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 145-A/2011, de 6 Abril;

Objetivamente, em 16 de maio de 2013, o júri deliberou anular a prova psicológica, uma primeira vez, face à denúncia feita por dois candidatos, através de correio eletrónico, de que muitos candidatos que realizaram as provas psicológicas na Escola Prática de Polícia, no dia 23 de abril anterior, teriam na sua posse um diagrama que permitia resolver a prova de memória, tendo um desses candidatos entregue cópia manuscrita desse diagrama.

A segunda prova psicológica, realizada entre 13 e 28 de junho de 2013, veio a ser anulada, conforme deliberação do júri de 14 de agosto de 2013, ora objeto de impugnação, como resulta da ata n.° 14.

No que aqui releva, consta do n.° 10 da referida ata n.° 14, o seguinte:
"No dia 19.07.2013 o júri tomou conhecimento da seguinte situação:
a) Uma candidata ao Concurso da Admissão ao CFC, devidamente identificada no relatório que será enviado a S. Ex.ª o Diretor Nacional da PSP com a proposta de medidas a tomar, enviou, nessa data, ao Sr. Subintendente P........, vogal do júri do concurso, uma mensagem de correio eletrónico que se junta ao referido relatório, que tinha recebido em 10.06.2013, três dias antes do início da aplicação da prova psicológica;
b) A mensagem foi recebida de um endereço designado de limpinho@tormail.org e era dirigida, para além dessa candidata, a mais sete destinatários, dos quais foi possível identificar seis deles;
c) O texto da mensagem continha os seguintes dizeres:
“Olá a todos. Como se devem estar a questionar quem sou, digo desde já que sou um vosso conhecido, mas por motivos óbvios não vou revelar quem sou.
Em vez disso, vou dar-vos um rebuçadinho de Santo António, para vocês espalharem pelos vossos amigos (amigos, chibos não!!) cujos contactos eu não tenho. Anularam os primeiros, logo boquinha calada e vamos todos tirar 20 nesta merda".
d) A mensagem trazia, ainda, um ficheiro em anexo ‘‘psicotécnicos.exe.zip” protegido por palavra passe.
e) O ficheiro anexo indicado abre com a palavra passe EPP e, aparentemente, não contém nenhum dado relevante. Segundo a candidata, a palavra passe foi-lhe enviada, nesse mesmo dia, a seu pedido, pelo mesmo “limpinho".
f) Desconhece-se se havia mais ficheiros nessa mensagem ou se foram enviados posteriormente. Contudo, não nos parece que se tenha tratado de uma simples brincadeira, uma vez que os endereços de correio eletrónico a quem foi enviada, pertencem a pessoas que em determinada altura terão constituído um grupo de amigos, muito possivelmente, segundo a mesma candidata, ligado a uma esquadra do Comando metropolitano de Lisboa, onde a maioria dos destinatários pertence ou já pertenceu"

Consta ainda do n.° 11 da Ata n.° 14, que:
“No dia 24.07.2013 chegou ao conhecimento do júri, também, o seguinte acontecimento:
a) No dia 24.07.2013, às 22H39, foi publicada, no fórum PSP, com o endereço www.forumpso.net uma parte substancial da prova psicológica aplicada pela segunda vez no concurso de admissão ao CPC, que se junta em anexo, parte essa, ainda assim, a título exemplificativo.
b) A mensagem contendo a prova psicológica foi publicada por um participante que se identifica com a sigla SDCM, que acreditamos ser o candidato indicado no relatório anteriormente referido.
c) Consultada a Divisão de Psicologia sobre a parte da prova publicada no fórum, foi-nos transmitida a seguinte informação:
“Os itens referidos do Fórum são os mesmos que constam na prova psicológica, aplicada ao CFC (2.ª aplicação), nomeadamente, quanto à subprova "Memória'', a sua matriz de memorização, que permanece no ecrã durante 3 minutos: Esta matriz de memorização permite a resolução de todas as questões da subprova “Memória", A prova aplicada compõe-se de 9 subprovas. No Forum em questão, conseguimos identificar questões relativas a quatro destas subprovas: Nalgumas das questões verifica-se a simplificação da própria questão, mas sem alterar o sentido das mesmas; Em nosso entendimento, cremos ser pouco provável a possibilidade de memorização, por parte dos candidatos para a transcrição das questões apresentadas, pelo que se nos afigura como mais provável a gravação da prova".

Mais se refere no n.° 12 da citada Ata n.° 14:
"Em carta datada de 30.07.2013, um candidato fez chegar ao júri um print screen de uma página, também do fórum www.forumDSD.pt. de 18 de Junho, data em que ainda decorriam as provas, de um participante no fórum que não é possível identificar nessa impressão, com a seguinte mensagem: “Fui o primeiro a fazer as provas para os psicos. No dia seguinte já todos sabiam resultados e um outro quadro. (…) para o fim já sabem a solução dos 20 problemas e já sabem as respostas ao quadro. Digo-te mais.. ligaram-me a perguntar se queria o quadro., eu respondi que já tinha feito o dito cujo".

Refere-se ainda no n.° 13, da Ata n.° 14 que:
"Também em carta datada de 02.08.2013, um outro candidato acompanha a sua reclamação com uma Impressão de uma página do Facebook, com uma mensagem datada de 25.07.2013, de um perfil em nome de A........, que se intitula como pertencendo ao Comando de Setúbal, existindo um candidato A........ no concurso, desse comando, com os seguintes dizeres, entre outros: "Só sei que vi uma mensagem de um colega com parte do teste em pdf.. .por azar o colega já o tinha feito qd a recebeu...".

Perante os factos descritos na referida ata, é manifesto que a entidade aqui Recorrida não os poderia ignorar, sob pena de se gerar e consolidar um clima de impunidade permissiva, pelo que não merece censura que, desde logo, o júri tenha deliberado anular a prova psicológica em causa.

Com efeito, os factos descritos na Ata n.° 14 e correspondentes documentos são causa adequada à deliberação tomada de anulação da prova psicológica e constituem fundamento bastante para o efeito.

Perante a factualidade demonstrada e dada como provada, é, assim, compreensível que tenha vindo a ser marcada a realização da controvertida prova para todos os candidatos em 27.10.2013.

Como afirmado em 1ª Instância, “De facto, tratando-se de um concurso para Chefes de Polícia da PSP, em que, por duas vezes candidatos, polícias, publicitam ter acesso prévio à prova, desprestigia a condição de agente de autoridade e cria impacto negativo na imagem da PSP, tanto mais que os candidatos em causa têm a pretensão de vir a ser Chefes de Policia’'.

Improcedem pois, por natureza, as alegações dos Autores, aqui Recorrentes, de acordo com os quais a deliberação objeto de impugnação, padecerá de vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto.

Efetivamente, não podia o júri, e a própria entidade aqui Recorrida, perante a dimensão da factualidade descrita e provada, deixar de anular a prova psicológica, sob pena de, assim não atuando, incorrer em grave violação dos princípios da igualdade, da justiça e da imparcialidade, tornando-se conivente com os comportamentos ilícitos detetados.

Foi exatamente o comportamento corretivo levado a cabo pelo júri e pela Entidade Recorrida, que permitiu aliviar alguma da lesividade causada pelos comportamentos ilícitos detetados, mitigando os danos decorrentes da situação descrita.

Assim, é patente que a anulação da prova e a realização universal de uma nova prova em simultâneo, era a única solução para salvar a dignidade que se pretende dar a um procedimento concursal para chefias policiais.

Já no que respeita à invocada violação do direito de audiência prévia dos Autores, tal como entendido em 1ª Instância, entende-se que a mesma se não verifica.

Factualmente, consta do n.° 18 da Ata n.° 14, que o júri deliberou não proceder à audiência dos interessados, atendendo à urgência e demora já provocada pela anulação das provas psicológicas no processo de seleção, por haver urgência na decisão.

Estando a decisão fundamentada e mostrando-se a mesma manifestamente urgente, em função das diversas vicissitudes verificadas no procedimento concursal, não merece censura a circunstancia de ter sido dispensada a audiência dos interessados, mormente tendo presente que os candidatos bem conheciam as condicionantes ocorridas, sendo que não perderam, naturalmente, as suas prerrogativas impugnatórias.

Assim, atenta a especificidade do procedimento, tendente à seleção de 200 candidatos para posteriormente frequentarem o “Curso de Formação de Chefes de Polícia (CFC)”, cuja dilação não poderá ser eternizada, através de sucessivos adiamentos, a urgência declarada não merece dúvidas nem censura, tanto mais que a “Audiência” dispensada teria 570 interessados, o que desde logo permite concluir pela espectável demora procedimental resultante da sua realização.

Se é certo que a regra do CPA é da obrigatoriedade da Audiência prévia, é claro que estão reunidos os pressupostos constantes do seu artigo 103º, n.º 1, alínea a), tendentes a excecionalmente ser a mesma dispensada, inverificando-se assim igualmente o vicio suscitado decorrente da não realização da referida audiência.

* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Subsecção Social da Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao Recurso, confirmando-se a Sentença Recorrida.

Custas pelos Recorrentes.

Lisboa, 8 de fevereiro de 2024
Frederico de Frias Macedo Branco

Rui Pereira

Pedro Figueiredo