Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2791/10.1BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:05/21/2020
Relator:LUÍSA SOARES
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO;
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO GERENTE;
GERÊNCIA DE FACTO;
CULPA.
Sumário:I- A responsabilidade subsidiária dos gerentes, por dívidas de IVA da executada originária, tem por pressuposto o exercício efectivo do cargo de gerente.
II - O n.º 1 do artigo 24.º da LGT exige para responsabilização subsidiária a gerência efectiva ou de facto, ou seja, o efectivo exercício de funções de gerência, não se satisfazendo com a mera gerência nominal ou de direito.
IIl- É à Administração Tributária, como exequente, que compete demonstrar o exercício efetivo das funções de gestão.
IV- Na responsabilidade subsidiária dos gerentes por dívidas de coimas, o artigo 8º do RGIT não consagra uma presunção de culpa e, por isso, recai sobre o autor do despacho de reversão o ónus de alegar a culpa do gerente pela insuficiência do património social, sob pena de ilegitimidade do oponente
V. Se à luz da factualidade provada na sentença, se verifica que nada ficou demonstrado quanto à eventual culpa do oponente pela falta de património social para pagamento das dívidas provenientes de coimas, e porque competia à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos para essa responsabilização subsidiária, há que valorar essa falta de prova contra a Fazenda Pública.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I – RELATÓRIO

A Fazenda Pública, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a oposição à execução deduzida por J...................., com referência ao processo de execução fiscal nº ................... e apensos, instaurado à devedora originária “A.................., Lda.”, referentes a dívidas de IVA de 2007 e 2008 e coimas no montante total de € 71.504,03.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos:
“I – Pelo elenco de razões acima arroladas, ressalvando-se sempre melhor entendimento e, com o devido respeito, infere-se que a sentença proferida pelo Tribunal “ad quo” julgou procedente o pedido do oponente escusando-se de melhor análise da prova constante dos autos e, lavrando em erro no que concerne à apreciação da matéria de facto.
II – Todavia, se devidamente analisadas as provas reunidas, prevaleceria uma decisão diferente da adotada pelo Tribunal, pois, pese embora determinados factos tenham sido dados como provados, outros foram afastados da selecção e objeto de uma análise crítica deficiente.
III – No presente caso foi entendido que as questões controvertidas consistem em apreciar e decidir se a parte opoente é parte ilegítima na execução.
IV – Nessa senda, decidiu-se o Tribunal Tributário pela procedência do pedido, declarando a ilegitimidade do oponente aqui recorrido.
V - Neste conspecto, importa averiguar se foram devidamente ponderados os factos e aplicado o direito como é de justiça.
VI - De maneira que, talqualmente como resulta do teor da decisão proferida, o recorrido detém a qualidade de responsável subsidiário da dívida exequenda, exigida coercivamente no processo de execução fiscal n.º n.º ................... e apensos, referente a IVA de 2007 a 2008, e Coimas, inicialmente instaurados contra a devedora originária “A.................., Lda”, sociedade na qual o oponente foi designado gerente e cuja assinatura obrigava, juntamente com a sua assinatura de outro gerente.
VII – Contudo, quando citado por reversão e, apesar de ser essencial a sua subscrição para permitir o giro da sociedade, o oponente veio alegar a sua ilegitimidade na execução.
VIII – Contrariamente ao que concluiu a decisão proferida pelo Tribunal a quo, como se retira da certidão da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa consta, em apenso que a sociedade “A………………….. Lda”, com o nif ............... e sede na Av. ..............., 1.º em Lisboa, foi constituída como sociedade por quotas, com o capital social de 249 398,94 € dividido, sendo a forma de obrigar a intervenção de dois gerentes.
Da referida certidão consta ainda que foram designados gerentes A............... e J...................., o revertido, este designado pela sociedade U............. – ……………. Lda, cfr. fls. 16 a 19 dos autos.
IX - Na verdade, o oponente, ora recorrido, na qualidade de responsável subsidiário, foi citado nos autos por via de um dever especial face à sua formação académica e profissional que lhe impunha uma diligência acima de um padrão de homem médio, colocado nas condições do agente, com as suas características, o seu grau de cultura e formação, (diligente, fiel ao direito, bom chefe de família).
X – Quanto ao que respeita à ilegitimidade do oponente, o recorrido, então gerente, alega a sua ilegitimidade, quanto à dívida exequenda, nos termos da alínea al. b) do n.º1 do art.º 204 do CPPT.
XI - Refere o oponente que esteve em funções nos anos em causa, embora considerasse que não exercia funções “efectivamente”, na medida em que sendo a sua participação titulada por designação da sócia “U………………….., S.A, tendia apenas para a viabilização económica da empresa através de entradas de capital e prestação de garantias reais de modo a que a sociedade, sem qualquer património, pudesse recorrer à banca para financiamento da sua actividade.
XII - Ou seja, como consta da sua p.i. o oponente permitia a viabilização económica da empresa através de entradas de capital; o oponente assumia a responsabilidade pela prestação de garantias reais de modo a que a sociedade sem qualquer património, pudesse recorrer à banca para financiamento da sua actividade.
XIII – Como tal, exercia competências funcionais nos domínios da gestão económica e financeira, numa perspetiva de gestão patrimonial, orçamental e de tesouraria, possibilitando objetivos de atuação a partir das políticas por si definidas com respeito à concessão de crédito para clientes, planeamento, análise de investimentos e, de meios viáveis para a obtenção de recursos para financiar operações e actividades da empresa, ou seja era responsável pela Gestão Financeira na empresa.
XIV - Do extracto da dívida executiva, nos autos, constam as liquidações de IVA, referentes aos anos em causa e, período que corresponde com o exercício da gerência/nomeação do oponente, em representação da sócia “U……………………, S.A”, o que afasta a sua ilegitimidade, face a esta parte da dívida exequenda, tal como previsto na al. b) do n.º1 do art.º 204 do CPPT.
XV - Por outro lado e sem conceder, viabilizava com a sua actuação que as dívidas de imposto se acumulassem. Temos em que está ainda em causa a omissão do dever de diligência que impende sobre os administradores, nos termos do art.º 64.º do CSC.
XVI - Na verdade o recorrido interveio activamente na gestão da sociedade até porque em sede fiscal, as declarações de 2005 a 2007, bem como as declarações de IRC modelo 22 dos anos de 2006 e 2007, têm mencionado como representante legal da devedora originária o próprio.
XVII - Pelo que, com o muito e devido respeito, o douto Tribunal “ad quo”, não esteou a sua fundamentação de facto e de direito nem de acordo com a prova constante nos autos falhando na selecção dos factos, nem conforme já exposto, de acordo com uma boa interpretação e aplicação da lei, máxime art.º 24.º n.º 1 alínea b) da LGT e, nessa medida, a decisão deve ser afastada da ordem jurídica.
Porém, V. EXAS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA”.
* *
O Recorrido contra-alegou tendo apresentado as seguintes conclusões:

“1) A questão decidenda no âmbito dos presentes autos reconduz-se a saber se foi ou não cumprido o ónus da prova relativamente aos pressupostos da reversão previstos no artigo 24.° da LGT e no artigo 8.° do RGIT.
2) Nas suas Alegações de Recurso, a Recorrente vem alegar que o Recorrido exercia a gerência de facto mas esquece-se que o que lhe competia fazer era demonstrar que, no despacho de reversão e ao longo do processo, provou o exercício da gerência de facto e a culpa do gerente na diminuição do património da empresa, nos termos do 342.° do Código Civil (CC) e do n.° 1 do artigo 74° da LGT. Demonstração essa que, no entender do Tribunal a quo e no do Recorrido, não se encontra realizada.
3) Na verdade, ao contrário do que foi defendido pela Recorrente na sua Contestação e que agora veio a seu retomado nas Alegações de Recurso, a demonstração da qualidade de gerente de direito não é suficiente para estabelecer uma “presunção judicial do correspondente normal e natural exercício efectivo das funções tituladas pelo responsável subsidiário citado nos Autos de Execução Fiscal, agora Oponente”, nem “é unânime o entendimento jurisprudencial para infirmar a presunção natural da gerência de facto, decorrente da gerência de direito, basta que se produza contraprova, e esta não foi produzida pela ora Oponente”.
4) O que, face ao registo e ao disposto no artigo 11.° do Código de Registo Comercial, se presume não é a gerência efectiva, mas, sim, tal gerência nominal, ficando terceiros dispensados de a provarem.
5) Assim, do registo da nomeação como gerente não resulta nenhuma presunção legal do exercício de facto dessas funções, pelo que a Recorrente sempre deveria ter indicado os factos sobre os quais podia assentar a conclusão do exercício efectivo das funções de gerente, nos termos dos artigos 259.° e 260.° do CSC. O que não fez.
6) Veja-se, neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), datado de 2 de Março de 2011, referente ao processo n.° 0944/10 (disponível em www.dgsi.pt), bem como o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo n.° 06449/13, de 10 de Julho de 2014.
7) Nem se revela suficiente a alegação de que a sociedade se obrigava mediante a assinatura de dois gerentes, que por si só não constitui qualquer presunção de exercício de gerência de facto (artigos 349.° a 351.° do CC): por um lado, a actividade da sociedade pode não exigir sempre a intervenção de dois gerentes, nomeadamente para a prática de actos que dão origem a impostos; por outro lado, a gerência de facto pode ser exercida por procuradores ou por gerentes delegados, nos termos do n.° 2 do artigo 261.° do CSC. Para além disso, veja-se que a assinatura que se revelava sempre necessária era a do gerente A............... e não a do Recorrido.
8) Assim sendo, não se poderá presumir, como pretende a Recorrente, que o Recorrido exercia a gerência de facto, competindo àquela a prova de que o Recorrido exerceu efectivamente poderes de representação, o que não foi cumprido.
9) A Recorrente apenas veio juntar declarações de IVA e IRC prestadas por um TOC e emitidas pela própria Recorrente, onde consta o NIF do Recorrido, sem qualquer 
assinatura ou declaração do mesmo. Nada é demonstrado quanto ao exercício da gerência de facto pelo Recorrido. Acresce que a Recorrente vem escudar-se em declarações do Recorrido na sua Petição Inicial que não consubstanciam qualquer confissão no sentido da gerência de facto, pelo que a sua argumentação se revela insubsistente.
10) Como ensina o Magistrado Judicial, Francisco Rothes, in Em torno da efectivação da responsabilidade dos gerentes - algumas notas motivadas por jurisprudência recente, I Congresso de Direito Fiscal, Vida Económica, pp. 45/64, “compete à AT invocar como fundamento da reversão que o revertido exerceu efectivas funções como gerente no período a considerar. Se não o fizer, e se limitar a invocar a gerência de direito como fundamento da reversão, não pode o tribunal com competência para julgamento da matéria de facto inferir a gerência efectiva da gerência de direito. Contrariamente ao que temos visto sustentado inúmeras vezes, não pode a Fazenda Pública pretender, ao abrigo da referida presunção legal - que não constitui mais do que a possibilidade do uso das regras da experiência concedida ao julgador no julgamento da matéria de facto que ao abrigo dessa possibilidade concedida ao julgador, que fica dispensada de alegar essa gerência efectiva, o efectivo exercício de funções de gerência, como requisito para reverter a execução ao abrigo do artigo 24° LGT.
11) Assim, competindo à Recorrente o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, nos termos do n.° 1 do artigo 24.° da LGT, do n.° 1 do artigo 342.° do CC e do n.° 1 do artigo 74.° da LGT, e verificando-se que a mesma não apresentou qualquer prova dos factos constitutivos do seu direito, deverá considerar-se como não provado, tal como fez o Tribunal a quo, o exercício efectivo de funções e, por conseguinte, deverá ser julgada ilegal a reversão operada contra o Recorrido.
12) Da mesma forma que a Recorrente não cumpriu o ónus da prova que decorre do artigo 24.° da LGT, também não o fez relativamente ao artigo 8.° do RGIT, no que respeita à responsabilidade pelo pagamento de multas e de coimas.
13) Resulta do n.° 1 do mencionado preceito que não existe qualquer presunção relativamente à culpa do gerente na falta de pagamento de coimas, pelo que não é ao gerente que cabe o ónus da prova de que a insuficiência do património ou a falta de pagamento não lhe são imputáveis mas sim à AT. 
14) Deste modo, para que o processo de reversão pudesse prosseguir, a Recorrente teria de ter demonstrado que a insuficiência do património da devedora principal tivesse sido causada culposamente pelo Recorrido, o que não logrou fazer, conforme acima referido.
15) Por conseguinte, deverá manter-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo, extinguindo-se a execução por reversão iniciada contra o Recorrido.
Nestes termos e nos demais de Direito.
Deverá o Recurso apresentado pela Fazenda Pública ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.”

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
* *
Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II – DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635°, n.° 4 e artigo 639°, n.°s 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente.

Assim, delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações da Recorrente, a questão controvertida consiste em aferir se a sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito por deficiente apreciação dos factos considerados provados e violação das normas legais ao considerar o Oponente como parte ilegítima da execução fiscal.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

1) O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“Compulsados os autos e analisada a prova documental produzida, dão-se como provados, e com interesse para a decisão, os factos infra indicados:
1. O processo de execução fiscal n.º ..........., foi instaurado no Serviço de Finanças de Lisboa 2, em 19/01/2008, contra a sociedade A.................. Lda., por dívidas de IVA do período de 2007-10 no montante de € 20.225,95 – cfr. fls. 23/34 dos autos
2. A estes autos foram apensados os processos executivos n.ºs ..........., ..........., ..........., ........... e ..........., para cobrança coerciva de dívidas de IVA e de coimas, ficando a dívida a valer por € 71.504,03 - cfr. fls. 47 dos autos;
3. No âmbito do processo executivo supra foi em 25/06/2008 lavrado o “Auto de Penhora”, cujo teor se considera aqui reproduzido, e do qual consta, com interesse para a decisão:
Bens Penhorados
Verba única – relação constante da folha em anexo (uma) relativa aos bens do activo imobilizado corpóreo, cujo valor total presumível atribuído é de € 120.000,00 (cento e vinte mil euros), os quais bens assim penhorados foram entregues juntamente com a cópia deste auto, ao fiel depositário A..............., residente na R........... n.º (…)” Tudo conforme fls. 25 e 25v dos autos.
4. Em 04/09/2010, o Serviço de Finanças de Lisboa 2, enviou a A............... carta registada com aviso de recepção que se mostrou assinado em 10/09/2010, no qual lhe era solicitado que no prazo de 10 dias, informasse, de onde se encontravam armazenados os bens penhorados no âmbito dos processos onde era executada a sociedade A.................. Lda. – cfr. fls. 43, 44;
5. Em 29/09/2010, deslocaram-se à Av…………. n.º 212, os funcionários da Direção Geral dos Impostos: V........... e H……………, do que lavraram e assinaram “Auto de Diligências” nos termos que a seguir parcialmente se transcrevem:
“(…) não foi possível cumprir a diligência em virtude de, na morada indicada, constante do auto de penhora elaborado e indicada pela executada, não existir qualquer estrutura que indicie a existência de loja – é entrada para um espaço no rés do chão recuado, sem espaço para montra e no 1º andar direito estão instalados consultórios médicos;
No consultório referido interpelei a funcionária que me informou que desde 2008 não conhece ali qualquer estabelecimento que comercialize cosméticos (…)” Tudo conforme fls. 51 dos autos;
6. Em 30-09-2010, a Chefe de Finanças exarou, no processo executivo a que nos vimos referindo, despacho de reversão, nos termos que a seguir, parcialmente se transcrevem:
“(…)
Assim, face às diligências antes referenciadas, nomeadamente a audição dos responsáveis subsidiários e apreciação das alegações, quando foram prestadas, de conformidade com o determinado no artigo 24.º/1, b) da Lei Geral Tributária e 8.º do Regime Geral das Infrações Tributárias, quanto às coimas, ordeno que se proceda à reversão da dívida em cobrança nos presentes autos, contra os identificados gerentes
(…)
M........................, nif ..................., por esta ser exigível aos administradores, directores ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscal fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo.
(…)” Tudo conforme fls. 53/53v dos autos;
7. Da certidão da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa consta, em AP ..................., que a sociedade “A……………. Lda..”, com o nif ............... e sede na Av. ………….. n.º 220, 1.º, foi constituída como sociedade por quotas denominada de, com o capital social de 249.398,94€ dividido por quotas, sendo a forma de obrigar a intervenção de um gerente – cfr. fls. 16 a 19 dos autos;
8. Da referida certidão e apresentação consta ainda que foram designados gerentes A............... e J...................., este designado pela sociedade U............. – ................... Lda., - cfr. fls. 16 a 19 dos autos;
9. Da mesma certidão consta ainda o registo, em (Av.1) AP…………….., foi registada pela 1.ª Conservatória do Registo Comercial de Santa Comba Dão a renúncia à gerência de J.................... – cfr. fls. 17 dos autos;
10. O Oponente teve conhecimento do despacho a que nos referimos no ponto 6., deste probatório, por carta registada com aviso de recepção que foi assinado em 06/10/2010 – cfr. fls. 55 a 57 dos autos;
11. A PI foi apresentada no Serviço de Finanças de Lisboa 2 em 08/11/2010 - cfr. fls. 3 dos autos;
FACTOS NÃO PROVADOS
Dos autos não resulta provada que, antes de ter sido proferido o despacho de reversão, A............... tivesse indicado a localização dos bens penhorados constantes do auto de penhora identificado em 3., do probatório.
Não resultou igualmente provado que a sociedade executada tivesse mais bens para além daqueles que tinham sido penhorados pela diligência indicada em 3.
A decisão da matéria de facto provada fundou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, nas informações oficiais e documentos constantes dos autos, não impugnados, conforme remissão feita a propósito de cada alínea do probatório.
Relativamente ao facto dado como não provado, o de a sociedade executada ter outros bens para além dos constantes do auto de penhora identificado em 3., da materialidade dada por provada, a convicção do Tribunal fundou-se na inexistência de prova documental que atestasse noutro sentido, bem como no facto de o oponente, mesmo em sede de oposição não ter indicado quaisquer bens de que sociedade devedora pudesse ser titular.
O Oponente prescindiu da prova testemunhal arrolada.”.
* *
De acordo com o art. 662º, nº 1 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi art. 281.º do CPPT, e atendendo ao teor da Certidão do Registo Comercial junta aos autos, procede-se à alteração por correcção do ponto 7 do probatório, e aditamento do ponto 11 do probatório, nos termos seguintes:
“7. Da certidão da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa consta, em AP ..................., que a sociedade “A…………………. Lda..”, com o nif ............... e sede na Av. …………………n.º 220, 1.º, foi constituída como sociedade por quotas, com o capital social de 249.398,94€ dividido por quotas, sendo a forma de obrigar com as assinaturas de dois gerentes, sendo uma necessariamente a do sócio A............... – cfr. fls. 16 a 19 dos autos;”

“11- Da certidão da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa consta, em AP .........., que a sociedade “A………………… Lda..”, passou a obrigar-se com a intervenção de um gerente e a gerência exercida por gerentes eleitos em assembleia geral – cfr. fls. 16 a 19 dos autos”.


IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Com base na matéria de facto acima transcrita o Tribunal Tributário de Lisboa julgou a presente oposição procedente tendo considerado, em síntese, que o Oponente é parte ilegítima na presente execução, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, dado que incumbe à Fazenda Pública a prova da gerência de facto, enquanto pressuposto da reversão e essa prova não foi feita, e que em relação à reversão das coimas não se mostra provada pela Fazenda Pública a culpa do Oponente.

A Recorrente não se conforma com o decidido invocando, também em síntese, que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de facto e de direito ao ter considerado o Oponente, parte ilegítima na presente execução nos termos da alínea b) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT.

Entende que, ao contrário do decidido, resulta da prova documental, nomeadamente da Certidão da Conservatória do Registo Comercial que o Oponente exerceu de facto e de direito a gerência da sociedade executada originária. Por outro lado, invoca que o Oponente interveio “activamente na gestão da sociedade até porque em sede fiscal, as declarações de 2005 a 2007, bem como as declarações de IRC modelo 22 dos anos de 2006 e 2007, têm mencionado como representante legal da devedora originária o próprio”, concluindo ainda que o Tribunal a quonão esteou a sua fundamentação de facto e de direito nem de acordo com a prova constante nos autos falhando na selecção dos factos, nem conforme já exposto, de acordo com uma boa interpretação e aplicação da lei, máxime art.º 24.º n.º 1 alínea b) da LGT e, nessa medida, a decisão deve ser afastada da ordem jurídica”. (cfr. conclusões XVI e XVII).

De salientar que a Recorrente alega que o Tribunal a quo não decidiu “de acordo com a prova constante nos autos falhando na selecção dos factos”, sem especificar e concretizar em que medida ocorreu essa falha na selecção dos factos.

Ora, considerando o disposto no art.° 640.° do CPC, aplicável ex vi do art. 281º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de discordância com tal decisão.

O art. 640º do CPC, sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”, consagra que:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos nºs 1 e 2 aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.° 2 do artigo 636°."

Assim, a Recorrente não indicou, concretamente os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, o que exige o disposto no art. 640.º do CPC, limitando-se a alegar e concluir, genericamente, pelo erro de julgamento da matéria de facto, pelo que, no caso em apreço, face ao incumprimento daquela disposição legal, rejeita-se o recurso nesta parte, nos termos do disposto no n.º 1, alínea a) daquele preceito legal.

Assim, estabilizada que está a matéria de facto dos autos, importa, então, aferir se a decisão recorrida padece de erro de julgamento de direito por errada interpretação dos pressupostos de facto e de direito.

O Tribunal a quo considerou o Oponente, ora Recorrido, como parte ilegítima da execução fiscal, vertendo na sentença recorrida, quanto ao que aqui interessa, a seguinte fundamentação:
“ (…) Compete à Autoridade Tributária provar a verificação dos requisitos para operar a reversão, sendo o despacho de reversão o instrumento adequado para o efeito, o qual precede a concretização da reversão mediante citação dos responsáveis subsidiários (que deverá ser antecedida da audição dos mesmos, nos termos dos artigos 23º, n.º 4 e 60º LGT). (…) A conclusão da administração tributária, para além da gerência de direito que resulta das inscrições da Conservatória do Registo Comercial, resulta igualmente dos elementos juntos com a contestação – declarações de IRC Mod. 22 dos anos de 2006 e 2007 e declarações anuais dos anos de 2005 a 2007. Porém, estes documentos nada revelam quanto ao eventual exercício da gerência de facto pelo revertido.
Mais se diga que do processo não resulta, nem é sequer alegada, a prática por aquele de atos de gestão, como a formalização de contratos ou a representação da sociedade.
Por tudo quanto se expos supra da análise crítica da prova não resulta demonstrado que o oponente exerceu as funções de gerente de facto da sociedade devedora originária, pelo que procede a sua alegação neste ponto, considerando-se não verificado o cumprimento do ónus de prova da gerência de facto que cabia à Autoridade Tributária e que resulta do artigo 342.º do Código Civil e do artigo 74.º n.º1 da LGT.
(…) E quanto à responsabilidade subsidiária por dívidas de coimas aplicadas por contra-ordenações tributárias tem sido muito debatida pela jurisprudência, nomeadamente no que respeita à constitucionalidade material do art. 8.º do RGIT, na parte em que prevê a responsabilidade subsidiária dos gerentes por coimas aplicadas a sociedades comerciais, por ofensa dos arts. 30.º, n.º 3 e 32.º, n.º 2 da CRP.
(…) Dispõe o artigo 8.º do RGIT que:
“1 - Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração em pessoas colectivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades fiscalmente equiparadas são subsidiariamente responsáveis:
a) Pelas multas ou coimas aplicadas a infracções por factos praticados no período do exercício do seu cargo ou por factos anteriores quando tiver sido por culpa sua que o património da sociedade ou pessoa colectiva se tornou insuficiente para o seu pagamento;
b) Pelas multas ou coimas devidas por factos anteriores quando a decisão definitiva que as aplicar for notificada durante o período do exercício do seu cargo e lhes seja imputável a falta de pagamento”.
A redação deste artigo, ao contrário do que resulta do texto do artigo 24.º, al. b) da LGT, não contém em si uma presunção de culpa relativamente à insuficiência do património da devedora principal de que a administração tributária possa prevalecer-se.
Porque assim é, compete àquela alegar a culpa do gerente pela insuficiência do património social da sociedade executada, e, provar a mesma, caso em sede de oposição a existência de culpa seja contestada, como o faz neste caso o oponente. O artigo 74.º, n.º1 da LGT origina assim para a Fazenda Pública o ónus de provar os factos alegados pela administração tributária (vide no mesmo sentido o Ac. do STA 9/04/2014, Processo n.º 0341/13).
Competia pois à administração tributária a alegação de factos de onde pudesse resultar um juízo de culpa, imputável ao revertido, na génese da insuficiência de bens da devedora principal para o pagamentos das coimas.
Alegação que deveria ter sido mencionada no despacho de reversão, o que in casu, não se verifica.”.

Vejamos então.

Quanto às dívidas tributárias de IVA, referenciadas a 2007 e 2008, o regime aplicável de responsabilidade subsidiária dos gerentes é o decorrente do art.° 24.° da Lei Geral Tributária.

Na redacção introduzida pela Lei 30-G/2000, de 29/12, estabelece o n.° l do art.°24.° da LGT:
“Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.

A responsabilidade subsidiária dos gerentes e administradores, por dívidas da executada originária, tem por pressuposto o exercício efectivo do cargo de gerente ou administrador.

Assim, do regime constante do art. 24.º, n.º 1 da LGT resulta que o chamamento dos “administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados”, os quais são subsidiariamente responsáveis em relação à dívida e solidariamente responsáveis entre si, depende da verificação do exercício efectivo de gerência, ou seja a existência de uma situação de gerência de facto (cfr. Acórdão do STA de 09/04/2014, proc. n.º 0954/13), não bastando a mera titularidade do cargo de gerente, isto é, a gerência nominal ou de direito.

No que diz respeito às regras do ónus da prova importa ter presente que o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão do Pleno do Contencioso Tributário de 28/02/2007, proc. n.º 1132/06 (reiterado posteriormente pelo Acórdão do Pleno do Contencioso Tributário do STA de 21/11/2012, proc. n.º 0474/12) considerou, ainda no âmbito do regime do CPT, que competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária, «deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efectivo exercício da gerência».

Antes de mais, contrariamente ao que sustenta a Recorrente, da inscrição no registo comercial da nomeação de alguém como gerente apenas resulta a presunção legal de que é gerente de direito, não de que exerce efectivas funções de gerência.


Entendeu-se no que respeita ao exercício das funções de gerência que sendo possível ao julgador extrair, do conjunto dos factos provados, esse efectivo exercício, tal só pode resultar da convicção formada a partir do exame crítico das provas, que não da aplicação mecânica de uma inexistente presunção legal.

Não obstante, nada impede que se recorra ao conteúdo dos suportes documentais da designação como gerente de direito para extrair os factos indiciadores da gerência de facto, e demais elementos que constem do processo de execução fiscal e dos autos.

O julgador deve extrair do conjunto dos factos provados o efectivo exercício da gerência, formando a sua convicção pelo exame crítico das provas.

Com efeito, no Acórdão do Pleno do CT do STA de 21/11/2012, proc. n.º 0474/12, é referido que: “I - No regime do Código de Processo Tributário relativo à responsabilidade subsidiária do gerente pela dívida fiscal da sociedade, a única presunção legal de que beneficia a Fazenda Pública respeita à culpa pela insuficiência do património social. II - Não existe presunção legal que imponha que, provada a gerência de direito, por provado se dê o efectivo exercício da função, na ausência de contraprova ou de prova em contrário. III - A presunção judicial, diferentemente da legal, não implica a inversão do ónus da prova. IV - Competindo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efectivo exercício da gerência. V - Sendo possível ao julgador extrair, do conjunto dos factos provados, esse efectivo exercício, tal só pode resultar da convicção formada a partir do exame crítico das provas, que não da aplicação mecânica de uma inexistente presunção legal.”

Desta forma, no procedimento de reversão, a Administração Tributária deve verificar se os gerentes de direito exerceram de facto essa gerência, e para formar a sua convicção, deve juntar ao procedimento elementos de prova que a sustentem, por forma a assegurar o seu ónus probatório. Se concluir pelo não exercício de facto da gerência pelos gerentes de direito, deve então apurar quem exerceu a gerência de facto do sujeito passivo, na medida em que tais pessoas são responsáveis subsidiários ainda que a sua actuação seja “somente de facto”, como refere o n.º 1 do art.º 24.º da LGT, pois do preceito legal não se exige a gerência nominal ou de direito, sendo suficiente a mera gerência efectiva ou de facto.

No caso em apreço, o despacho de reversão, no que concerne à gerência de facto do Oponente, assentou apenas na certidão da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, designadamente nas inscrições constantes da matrícula da sociedade executada originária.

Resulta efectivamente daquele documento que o Oponente foi nomeado gerente desde 07/02/1991 até 21/08/2008, data em que renunciou ao cargo (cfr. pontos 7 e 9 do probatório). Acresce que a sociedade se obrigava desde 07/02/1991 com a assinatura de dois gerentes, sendo uma necessariamente a do sócio A............... (cfr. ponto 7 corrigido do probatório) e que a partir de 21/08/2008, passou a obrigar-se com a intervenção de um gerente e a gerência seria exercida por gerentes eleitos em assembleia geral (cfr. ponto 11 do probatório aditado).

Do exposto, desde logo afirmamos que não assiste razão à Fazenda Pública quando pretende ver responsabilizado o Oponente pelo facto de constar como gerente no registo comercial e a sua intervenção ser necessária para obrigar a sociedade devedora originária.

É um facto que a devedora originária se obrigava com a assinatura conjunta de dois gerentes, sendo uma necessariamente a do sócio A..............., contudo, o argumento utilizado pela Fazenda Pública “(...) não se revela assim tão decisivo, na medida em que, se bem que se afigure compreensível que se postule a necessidade da respectiva intervenção no que concerne ao giro comercial normal da executada originária, tal apenas é legítimo, no entanto, à luz do enquadramento legal aplicável, nada impedindo, de facto, que ela exerça a actividade para que se constituiu, negociando com clientes e fornecedores, sem o acatamento da aludida prescrição estipulada no pacto e que, como é sabido, inúmeras vezes é desconhecida daqueles que entram em relações comerciais com as empresas que assim operam.
Ou seja e dito de outra forma, a circunstância do pacto estipular a necessidade da assinatura de um ou mais sócios da executada originária para a poderem vincular perante terceiros, não acarreta forçosamente que ela assim tenha procedido, podendo ter girado comercialmente sem respeitar tal condicionalismo, sendo certo que tal conduta apenas se reflecte ao nível da sua responsabilidade perante aqueles e, por consequência, se e na medida em que não cumpra os acordos e transacções comerciais que tenha celebrado” (Cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 12.06.14, processo n° 00013/12.OBEBRG).

Assim, não obstante a necessidade de intervenção de dois gerentes para vincular a devedora originária, não é seguro que a viabilidade funcional da mesma ficaria comprometida sem a intervenção do Oponente.

Por outro lado, invoca a Fazenda Pública que o ora Recorrido “participou activamente na gestão da sociedade até porque em sede fiscal, as declarações de 2005 a 2007, bem como as declarações de IRC modelo 22 dos anos de 2006 e 2007, têm mencionado como representante legal da devedora originária o próprio”, fundando-se tais afirmações nos documentos juntos com a contestação.

Contudo, não é pelo facto de nas declarações para efeitos fiscais, que foram juntas com a contestação, constar a identificação do Oponente (número de identificação fiscal) como representante legal da devedora originária, que se pode concluir pela gerência efectiva dessa sociedade devedora originária. Note-se ademais que, no caso vertente, nem tão-pouco consta a assinatura do Oponente.


Chegados aqui, dúvidas não existem que perante a factualidade fixada na sentença recorrida é de concluir que, não tendo sido feita qualquer prova de que o Oponente, para além de deter a qualidade de gerente de direito da devedora originária, também a exerceu de facto, praticando os actos próprios e típicos da gerência, no período aqui em causa (seja a assinatura de contratos ou quaisquer outros documentos, a efectivação de pagamentos, a contratação de pessoal, a alienação ou aquisição de património, a negociação de fornecimentos, entre outros), não pode ser responsabilizado, a título subsidiário, pelo pagamento das dívidas exequendas referentes a IVA dos anos de 2007 e 2008, sendo por isso parte ilegítima na execução fiscal. E repete-se, como acima foi referido, que era à Fazenda Pública que competia a prova de tal exercício.

Importa agora analisar a responsabilidade subsidiária da dívida de coimas fiscais do ano de 2009.

Dispõe o art.º 8.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º15/2001, de 5 de Junho, no segmento pertinente para os autos:
«1 - Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração em pessoas colectivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades fiscalmente equiparadas são subsidiariamente responsáveis:
a) Pelas multas ou coimas aplicadas a infracções por factos praticados no período do exercício do seu cargo ou por factos anteriores quando tiver sido por culpa sua que o património da sociedade ou pessoa colectiva se tornou insuficiente para o seu pagamento;
b) Pelas multas ou coimas devidas por factos anteriores quando a decisão definitiva que as aplicar for notificada durante o período do exercício do seu cargo e lhes seja imputável a falta de pagamento».

Como resulta da letra do preceito acima transcrito, a Administração Tributária não tem a seu favor qualquer presunção legal de culpa do revertido, de que se possa prevalecer.


Isto significa que na reversão das dívidas exequendas subjacentes a coimas fiscais, cabe à Fazenda Pública o ónus da prova no que diz respeito aos pressupostos constitutivos da culpa do revertido na insuficiência do património social ou na falta de pagamento da coima.


Como no Acórdão do STA de 27/09/2017 no proc. 0377/17 se refere “O artigo 8º do RGIT não consagra uma presunção de culpa e, por isso, recai sobre o autor do despacho de reversão o ónus de alegar a culpa do gerente pela insuficiência do património social e, sempre que essa alegação seja contestada em sede de oposição, recai sobre a Fazenda Pública o ónus de a provar, em conformidade com o disposto no artigo 74º nº 1 da LGT, sob pena de ilegitimidade do oponente para a execução.”

Ora, se nada consta do despacho de reversão no que concerne à culpa do Oponente na situação de insuficiência patrimonial ou de falta de pagamento das coimas, também a Fazenda Pública na contestação, nada alegou de pertinente e menos logrou provar quanto à culpabilidade do Oponente na insuficiência patrimonial da pessoa colectiva, pelo que quanto a estas dívidas provenientes de coimas fiscais, ocorre efectivamente a ilegitimidade
do Oponente para a execução.

Em suma, porque à luz da factualidade provada se verifica que nada ficou demonstrado quanto à eventual culpa do Oponente pela falta de património social para pagamento das dívidas provenientes de coimas, e porque competia à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos para essa responsabilização subsidiária, há que valorar essa falta de prova contra si.

A falta do preenchimento dos pressupostos da reversão previstos nos artigos 24º da LGT e 8º do RGIT, determina a ilegalidade do despacho de reversão, com a consequente anulação do mesmo e absolvição do revertido da instância executiva.

Ao decidir no sentido da procedência da oposição por não estarem preenchidos os pressupostos da responsabilidade subsidiária, a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica.

V. DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo da Recorrente.

Lisboa, 21 de Maio de 2020

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Luísa Soares
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Mário Rebelo

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Patrícia Manuel Pires