Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 278/13.0BESNT |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 03/16/2023 |
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Relator: | VITAL LOPES |
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Descritores: | OPOSIÇÃO GERÊNCIA ÓNUS DE PROVA RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA |
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Sumário: | I - Sendo o exercício efectivo de funções de administração ou gestão um dos pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária prevista no art. 24.º da LGT, e cabendo à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária, deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efectivo exercício de funções de administração ou gestão pelo Oponente. II - Não pode a Fazenda Pública fazer a prova da efectividade da gerência à data do termo do prazo legal de pagamento ou entrega da dívida tributária com factos relevantes unicamente reportados a períodos anteriores (nomeadamente referenciados ao momento constitutivo das dívidas), ou posteriores, pois assim estaria encontrada via fácil para defraudar a repartição do ónus da prova em matéria de culpa, estabelecido no art.º 24.º, n.º 1 da LGT III - Se o que de pertinente se colhe do probatório com referência ao período de vencimento das dívidas é tão-só que a oponente era a única gerente inscrita da sociedade executada, tal é insuficiente à demonstração da efectividade da gerência. IV - A falta de prova a esse respeito tem de ser valorada contra a Fazenda Pública que é a parte onerada com a prova do facto. |
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Votação: | Unanimidade |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO O Exmo. Representante da Fazenda Pública, vem reclamar para a conferência da decisão sumária do relator de 25/09/2022 que negou provimento ao recurso interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a oposição deduzida por A… à execução fiscal n.º 1562201001114077 contra si revertida e originariamente instaurada contra a sociedade “F…– Arquitectura e Design de Interiores Unipessoal, Lda.” por dívida de IVA referenciada aos anos de 2008 e 2009, no montante global de 2.244,60 euros, alegando para tanto, o seguinte: « 1. Em primeiro lugar não ficou expresso a razão pela qual o Juiz Relator entendeu que a presente decisão cumpre, presumimos nós, os requisitos do artigo 656.º do CPC para ser decidida de forma singular, dispensando-se a intervenção dos restantes juízes do colectivo. 2. Até porque, conforma consta da decisão, além da análise jurídica, não tão simples como aparentemente foi considerada como adiante se desenvolverá, aditaram-se novos factos não considerados na sentença (cfr. fls. 14 e seg.) que, em certos casos, até foram posteriormente desvalorizados na sua análise crítica o que, independentemente do resultado da sua análise, demonstram que a decisão teve um grau de complexidade que, na nossa opinião, mereciam uma decisão colectiva. 3. Por outro lado, na nossa opinião e com todo o respeito, a nossa análise diverge do entendimento assumido pelo que pedimos a vossa atenção para o seguinte: 4. Nada temos a opor à factualidade agora estabelecida que, por conveniência se reproduz (cfr. fls. 13 e seg.): Em sede factual deixou-se consignado na sentença recorrida: i) Foi instaurado, no Serviço de Finanças de Sintra-1, o processo de execução fiscal nº 1562201001114077 e apensos contra a sociedade F… – Arquitectura e Design de Interiores Unipessoal, Lda., por dívidas de IVA dos anos de 2008 e de 2009, com data limite de pagamento voluntário, respectivamente em 21.10.2010 e 04.11.2010, com quantia exequenda total de € 2.244,60 (cfr. fls 20 dos autos e PEF apenso); ii) Na Conservatória do Registo Comercial a Oponente consta como gerente da sociedade referida na alínea anterior (por acordo); iii) Por despacho de 24.09.2012, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido, foi determinada a reversão do PEF referido em a) contra a aqui Oponente, na qualidade de responsável subsidiária (cfr. fls. 30 verso do PEF apenso); iv) Em 08.08.2007, a aqui Oponente na qualidade de representante legal da sociedade F… – Arquitectura e Design de Interiores Unipessoal, Lda., assinou a respectiva declaração de início de actividade (cfr. doc. 1 junto à contestação a fls. 43 a 46 dos autos); v) Foram efectuados descontos para a segurança social, em nome da Oponente e na qualidade de membro de órgão estatutário da mesma sociedade de 09/2007 a 03/2009 (cfr. doc. 2 junto à contestação). Ao abrigo do disposto no art.º 662/1 do CPC, adita-se ao probatório a seguinte factualidade: vi) No contrato de arrendamento comercial celebrado em 01/08/2000 tendo por objecto o imóvel em que se situava a sede da sociedade devedora originária intervieram: como 1.ºoutorgante, R…, na qualidade de locador e em representação de M1…, M2…, M3… e M4; como 2.ª outorgante na qualidade de arrendatária, M5… e, como 3.ª outorgante, na qualidade de fiadora, M6…, constando da respectiva cláusula 3.ª que “As 1.ªs outorgantes autorizam desde já a 2.ª outorgante a ceder a sua posição no presente contrato a A…” (contrato de arrendamento comercial, a fls.37 do apenso de execução). g) Do auto de apreensão de mercadoria levantado pela GNR em 20/05/2012, a fls.43 do apenso de execução, consta ser a oponente quem transportava a mercadoria apreendida e ter declarado que os bens em circulação foram remetidos pela firma F… – Arquitectura e Design de Interiores Unip., Lda., mais constando ter sido a oponente nomeada fiel depositária dos bens apreendidos. h) Na única declaração periódica de IRC apresentada pela sociedade devedora originária com referência ao exercício de 2007 consta como representante da mesma, a oponente (informação executiva de 22/02/2013, a fls.45 do apenso). 5. Mas não se encontra formalmente entre os factos estabelecidos, mas deve ser dado por adquirido que a Oponente, foi a única gerente oficialmente designada da sociedade devedora originária, a “F… – Arquitectura e Design de Interiores Unipessoal, Lda.” desde a sua constituição (25.07.2007) até à sua dissolução (29.03.2016) conforme decorre da certidão do registo comercial ( cfr. inf. do SF e certidão do registo comercial a , fls. 67 SITAF) 6. Trata-se um facto absolutamente relevante que não mereceu qualquer atenção na presente decisão, mas que foi expressamente referido no recurso da FP (artigo 17 e 18 do recurso da FP) e nas respectivas conclusões que, por comodidade, se reproduzem: M. Não obstante, entende a Fazenda Pública que, face à prova documental produzida, e dos factos alegados pelas partes que não foram contrariados, deveriam ter sido levados ao probatório os seguintes factos, cuja pertinência é clamorosa para a decisão prolatada, a saber: - que a sociedade devedora originária, cuja actividade consistia na elaboração de Projectos de Arquitectura e design de interiores; coordenação de obras e projectos; comércio de artigos de decoração e moda, é uma sociedade unipessoal que se obriga pela assinatura de um gerente e que, desde a data da sua constituição (25.07.2007) até à data do cancelamento da matrícula teve como única gerente designada a oponente, ora recorrida. (negrito no original) (…) 7. Esta situação constitui, na nossa opinião, uma omissão de pronúncia por parte do Juiz Relator e seria causa de nulidade da presente decisão nos termos do artigo 125.º do CPPT e 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC. 8. Daí uma segunda razão desta reclamação que é o de evitar que essa situação se concretize, aproveitando-se o reexame da decisão para a sua correcção. 9. E se este facto for efectivamente dado como facto estabelecido, como nos parece pacífico por ser absolutamente incontroverso, mudam os pressupostos factuais e, por consequência, todo o quadro de análise jurídica terá de acompanhar essa mudança. 10. A este respeito, o Juiz Relator da presente decisão indicou o caminho para a solução jurídica nestes casos, em dois acórdãos do TCA SUL em que assumiu também essa qualidade, nos acórdãos proferidos nos processos 534/10.9BELRS de 03/22/2018 e, ainda mais recentemente, no processo 485/14.8BELRS, datado de 03/05/2020, cujo sumário, para melhor entendimento, reproduzimos: 1. Independentemente da alínea a) ou b) do n.º1 do art.º24.º da LGT ao abrigo da qual se tenha concretizado a reversão, à Administração tributária cabe sempre fazer a prova do exercício efectivo, ou de facto, da gerência do oponente na sociedade devedora originária. 2. Ao juiz é lícito inferir a efectividade da gerência do oponente no contexto em que ele é o único gerente inscrito da SDO, se comprova que esta teve actividade no período a que se reportam as dívidas revertidas e o probatório não integra factos que contextualmente conflituem com o facto base daquela presunção. 3. Porém, não pode formar-se um juízo presuntivo quanto à efectividade da gerência partindo do facto de se tratar o oponente do único gerente inscrito da SDO quando constem do probatório factos que manifestamente conflituam com aquela presunção 11. No próprio acórdão, a posição é naturalmente desenvolvida e aprofundada. Quanto ao caso que aqui nos interessa, o facto de ter sido a única gerente da sociedade conhecida durante todo o tempo em que operou, diz-nos o seguinte: Na linha doutrinária daqueles arestos, veio a formar-se jurisprudência no sentido de que sendo o revertido/oponente o único gerente inscrito da sociedade devedora originária, ao juiz era lícito inferir o exercício efectivo dessa gerência do conjunto da prova, usando as regras da experiência e fazendo juízos correntes de possibilidade, pese embora não pudesse ser retirado mecânica e automaticamente do facto de ter sido designado gerente, na falta de presunção legal. E uma das situações em que resultava lícito ao juiz inferir o exercício efectivo da gerência com base na gerência nominal era quando resultasse provado que no período das dívidas era ele o único gerente nomeado da sociedade e sem a assinatura do qual a sociedade não se podia obrigar e que a sociedade se manteve em actividade no período em causa – vd. Acórdão do TCAN, de 21/02/2008, tirado no proc.º00445/06.2BEPNF e a contrario o mais recente Acórdão deste TCAS, de 27/10/2016, tirado no proc.º07665/14. Por outro lado, também se foi firmando jurisprudência nesta instância no sentido de que não pode formar-se um juízo presuntivo quanto à efectividade da gerência partindo do facto de se tratar o oponente do único gerente inscrito quando ele alega e demonstra factos que manifestamente conflituam com o facto base que suporta aquele juízo – vd. Acórdão deste TCAS, de 03/22/2018, tirado no proc.º 534/10.9BELRS (em que é relator o mesmo deste). 12. No caso presente, em primeiro lugar, devemos desde logo dar como adquirido que não constam dos autos nenhuma prova, qualquer facto ou circunstância que demonstrem, ou mesmo criem apenas uma dúvida razoável que a Oponente não era gerente de facto da sociedade devedora originária, pelo que, por aqui, não se verifica qualquer elemento que afaste, desde logo, a gerência efectiva da sociedade por parte da Oponente. 13. Pelo que, parece-nos, seguindo o caminho apontado, resta estabelecer se será lícito inferir que a Oponente era efectivamente gerente da sociedade na altura em que as dívidas aqui em causa se venceram. 14. Lembramos que aqui em causa está a reversão de dívidas provenientes de IVA dos anos de 2008 e de 2009, com data limite de pagamento voluntário, respectivamente em 21.10.2010 e 04.11.2010. (cfr. Decisão, fls. 16) e tendo sido efectuada ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da Lei Geral Tributária, tem como pressuposto que o prazo legal de pagamento ou entrega da dívida terminou no período do exercício do cargo de gerente (cfr. Decisão, fls. 20). 15. Neste contexto, pensamos, da factualidade que nos parece estabelecida deve-se concluir que a Oponente não pode deixar de ser considerada como gerente efectiva da sociedade tendo em conta, em síntese, que: a) A Oponente, foi a única gerente oficialmente designada da sociedade devedora originária, a “F… – Arquitectura e Design de Interiores Unipessoal, Lda.” desde a sua constituição (25.07.2007) até à sua dissolução (29.03.2016); b) Nessa qualidade, em 08.08.2007, a aqui Oponente na qualidade de representante legal da sociedade F… – Arquitectura e Design de Interiores Unipessoal, Lda., assinou a respectiva declaração de início de actividade; c) Foi elemento activo no contrato de arrendamento do imóvel onde se situava a sede da sociedade; d) Na única declaração periódica de IRC apresentada pela sociedade devedora originária com referência ao exercício de 2007 consta como representante da mesma, a oponente (informação executiva de 22/02/2013, a fls.45 do apenso). e) De salientar que em 10 anos de actividade apenas em um exercício foi entregue a correspondente declaração de IRC. Se juntarmos o incumprimento em IVA que está na origem das presentes dívidas, fica perfeitamente estabelecido um padrão de incumprimento das obrigações fiscais por parte da sociedade devedora originária, o que também cria dificuldades suplementares à AT em termos de prova; f) Foram efectuados descontos para a segurança social, em nome da Oponente e na qualidade de membro de órgão estatutário da mesma sociedade de 09/2007 a 03/2009; g) Do auto de apreensão de mercadoria levantado pela GNR em 20/05/2012, a fls.43 do apenso de execução, consta ser a oponente quem transportava a mercadoria apreendida e ter declarado que os bens em circulação foram remetidos pela firma F… – Arquitectura e Design de Interiores Unipessoal., Lda., mais constando ter sido a oponente nomeada fiel depositária dos bens apreendidos. 16. Pelo que, nestas circunstâncias, usando as regras da experiência comum e fazendo juízos correntes de possibilidade só se pode chegar à conclusão que a Oponente não pode deixar de ter sido foi a única gerente efectiva da sociedade enquanto esta teve actividade, incluindo naturalmente o período em se venceram as dívidas aqui em causa, por ser praticamente improvável que qualquer outra pessoa o possa ter sido, nem existem quaisquer elementos nos autos, tendo a Oponente tido evidentemente toda a oportunidade de o fazer que, de perto ou de longe, directa ou indirectamente, permitam colocar a hipótese contrária. 17. E, assim sendo, deve ser responsabilizada pelas dívidas fiscais aqui em causa. 18. Pelo exposto, vimos pedir o reexame da questão através de Acórdão, conforme, salvo melhor opinião, a lei permite. Termos pelos quais se requer que seja deferida a presente reclamação e, consequentemente, ser proferido acórdão que julgue o presente recurso.». Notificada a parte contrária, nada disse. O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu mui douto parecer no sentido da improcedência da reclamação, devendo manter-se, na íntegra, a decisão recorrida. II. FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURÍDICA Transcreve-se o essencial do teor do despacho reclamado: “ «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» «Imagem em texto no original» * Cumpre apreciar em Conferência. Alega o reclamante que não ficou expressa a razão pela qual o Juiz Relator entendeu proferir decisão sumária nos termos do art.º 656.º do CPC. A decisão liminar do objecto do recurso é proferida no uso de um poder discricionário do Relator (art.º 152/4 (2.ª parte)), sendo suficiente a justificação dada de que “…cabe apreciar se estão reunidos os pressupostos legais de que depende a reversão da execução por dívidas tributárias contra os administradores e gerentes de sociedades. Trata-se de tema trazido à apreciação dos tribunais e deste em particular, à saciedade, como também é abundante a jurisprudência uniforme e consolidada que sobre o mesmo se formou, também no Supremo Tribunal Administrativo”. A bondade de tal decisão não é susceptível de impugnação. Considerando-se as partes prejudicadas pelo despacho que julga sumariamente o objecto do recurso, têm sempre a possibilidade de requerer ao tribunal que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão – art.º 652/1 alínea c) e n.º 3, do CPC, o que justamente a Fazenda Pública vem fazer através da presente reclamação para a conferência. Improcede a questão suscitada. Alega também o reclamante que deixou expresso nas alegações de recurso jurisdicional, nomeadamente, o seguinte: “…entende a Fazenda Pública que, face à prova documental produzida, e dos factos alegados pelas partes que não foram contrariados, deveriam ter sido levados ao probatório os seguintes factos, cuja pertinência é clamorosa para a decisão prolatada, a saber: - que a sociedade devedora originária, cuja actividade consistia na elaboração de Projectos de Arquitectura e design de interiores; coordenação de obras e projectos; comércio de artigos de decoração e moda, é uma sociedade unipessoal que se obriga pela assinatura de um gerente e que, desde a data da sua constituição (25.07.2007) até à data do cancelamento da matrícula teve como única gerente designada a oponente, ora recorrida”, sem que sobre o alegado o Relator se tivesse pronunciado, o que, a seu ver, seria causa de nulidade da decisão reclamada por omissão de pronúncia, nos termos do artigo 125.º do CPPT e 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC. Ora, no despacho reclamado deixou-se consignado o seguinte: “Foi aditada ao probatório a matéria julgada pertinente, já levando em conta o erro de julgamento de facto imputado à sentença e traduzido na omissão de factos relevantes ao probatório” (sublinhado nosso). Portanto, a decisão reclamada não deixou de emitir pronúncia sobre a alegada omissão de factos essenciais ao probatório; entendeu é que, contrariamente ao alegado, nem todos os factos pretensamente omitidos eram decisivos ou pertinentes para a decisão a proferir. Tal não constitui omissão de pronúncia invalidante, mas eventualmente erro de julgamento, vício que o reclamante também pretende ver reapreciado pela Conferência. Improcede também este segmento da reclamação. E prosseguindo na apreciação das demais questões, não julgamos que a decisão reclamada enferme de erro de julgamento ao não modificar o facto vertido no ponto b) do probatório, de modo a dele fazer constar que a oponente foi a única gerente inscrita da SDO desde a sua constituição (25/07/2007) até à sua dissolução (29/03/2016). E pelas razões que a própria decisão adianta e que merecem a nossa concordância na medida em que correspondem ao entendimento reiterado da jurisprudência do STA e deste Tribunal. Consigna-se na decisão reclamada: “Como se constata factualmente, a reversão foi efectuada ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da Lei Geral Tributária, que tem como pressuposto que o prazo legal de pagamento ou entrega da dívida terminou no período do exercício do cargo de gerente. Nessa medida, coerentemente, a Fazenda Pública, enquanto parte onerada com a prova, deverá demonstrar factos representativos de uma gerência efectiva com referência a esse período temporal, sem prejuízo de os demonstrar também com referência a outros períodos anteriores e posteriores, de modo a poder concluir-se pelo exercício continuado da gerência pelo revertido. Como está bem de ver, não pode a Fazenda Pública fazer a prova da efectividade da gerência à data do termo do prazo legal de pagamento ou entrega da dívida tributária com factos relevantes unicamente reportados a períodos anteriores (nomeadamente referenciados ao momento constitutivo das dívidas), ou posteriores, pois assim estaria encontrada a via para defraudar a repartição do ónus da prova em matéria de culpa, estabelecido no art.º 24.º, n.º 1 da LGT. Isso assente, colhe-se do probatório que: i. A oponente consta como gerente inscrita da SDO – al. b); ii. Assinou em 08/08/2007, a declaração de início de actividade na qualidade de representante legal da SDO – al. d); iii. Efectuou descontos para a Segurança Social na qualidade de membro de órgão estatutário da SDO, de 09/2007 a 03/2009 – al. e); iv. Consta da cláusula 13.ª do contrato de arrendamento celebrado em 01/08/2000 e que teve por objecto o imóvel que viria a servir de sede da SDO, o consentimento dos outorgantes para a cessão do arrendamento à oponente – al. f); v. Consta do auto de apreensão levantado pela GNR em 20/05/2012 ser a oponente quem transportava a mercadoria apreendida e ter declarado que os bens transportados tinham sido remetidos pela firma “F… – Arquitectura e Design de Interiores Unip., Lda”, auto que assinou como infractora e como nomeada fiel depositária da mercadoria apreendida – al. g); vi. Na única declaração periódica de IRC apresentada pela sociedade devedora originária com referência ao exercício de 2007 consta como representante da mesma, a oponente – al. h) Os factos assinalados em ii), iii) e vi) são imprestáveis para demonstrar a efectividade da gerência no período das datas limite de pagamento voluntário das dívidas, que ocorreram em 21/10/2010 e 04/11/2010, respectivamente para as dívidas dos períodos de 2008 e 2009. Acresce que a assinatura da declaração de inicio de actividade se trata de acto não incompatível com uma estrita gerência de direito. Do facto referido em iv), não alcançamos o que se possa extrair de conclusivo quanto à gerência da oponente, realçando-se que o arrendamento data do distante ano de 2000 e a oponente nem sequer nele interveio como outorgante. Do referido auto de apreensão, embora conste ser a oponente quem transportava a mercadoria e ter ela declarado que a remetente era a SDO, do mesmo não se colhe que agia na qualidade de gerente, lembrando-se que muito antes da data da apreensão (20/05/2012), já a oponente deixara de efectuar descontos para a Segurança Social na qualidade de membro de órgão estatutário da SDO. Neste contexto, apenas sobra o facto referido em i). Mas concluir unicamente com base no mesmo pela efectividade da gerência reconduzir-nos-ia inevitavelmente a extrair por presunção judicial essa conclusão (sublinhado nosso). Mesmo admitindo que a oponente era a única gerente inscrita da SDO, tal não permite assumir, à falta de melhor prova, que tenha gerido os destinos da sociedade, (sublinhado nosso) decidindo o que comprar, o que pagar, o que contratar, ou que movimentava dinheiro e contas bancárias da SDO, a este respeito não sendo despiciendo trazer à colação o que se consigna na informação executiva de fls.45 do apenso: que a conta bancária indicada na declaração de inicio de actividade tinha, afinal, outro titular que não o sujeito passivo, o que bem pode indiciar que um terceiro (o titular da conta, não identificado) reservara para si o controlo dos movimentos bancários e a disposição dos dinheiros da SDO. Como muito bem sintetiza o que, no fundo, vimos dizendo, o Exmo. Sr. PGA no seu douto parecer, «não constam dos autos quaisquer documentos, nomeadamente contratos, declarações de impostos ou outros, relacionados com a actividade da executada originária, que se encontrem assinados pela oponente, relativos ao ano de gestão. À AT competia reunir essa prova documental e terá que ser contemporânea do despacho de reversão. Pelo que terá de concluir-se não ter a Fazenda Pública feito prova da gerência de facto, por parte da oponente nos exercícios fiscais em causa». A sentença recorrida ao ter concluído no sentido de que a AT não carreou para os autos elementos de prova bastantes à demonstração da gerência da oponente no período a que se reporta o vencimento das dívidas revertidas (21/10/2010 e 04/11/2010), não incorreu no apontado erro de julgamento, tendo feito correcta leitura dos factos e aplicação do direito aos mesmos”. No fundo, o que o reclamante pretenderia era que no juízo sobre a efectividade da gerência fosse dada relevância a factos que a não assumem se apreciados à luz da fundamentação contextual do acto de reversão. Não se vislumbrando outros argumentos ponderosos que nos levem a rever a posição do relator expressada na decisão sumária reclamada, entendemos ser de confirmar a mesma e indeferir a reclamação. III. DECISÃO Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em indeferir a reclamação e confirmar a decisão sumária do Relator. Condena-se o Reclamante em custas. Lisboa, 16 de Março de 2023 _______________________________ Vital Lopes ________________________________ Luísa Soares ________________________________ Tânia Meireles da Cunha |