Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1838/17.5BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:09/23/2021
Relator:PEDRO NUNO FIGUEIREDO
Descritores:PODER DISCRICIONÁRIO; PODER VINCULADO
SINDICÂNCIA DA AVALIAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO
RETROSPETIVIDADE
Sumário:I. Nas provas escritas de conhecimento, com hipóteses múltiplas de resposta, em que apenas uma deve ser considerada correta, não há margem de discricionariedade da Administração, mas antes uma atividade vinculada à lei.

II. Não havendo aqui liberdade de avaliação por parte da Administração, pode e deve o Tribunal sindicar se a avaliação jurídica efetuada foi a mais correta.

III. Esta sindicância incide sobre o momento em que o júri determina qual a resposta considerada correta nas várias hipóteses previstas e apresentadas aos candidatos, fixando na grelha de correção uma determinada resposta para determinada questão.

IV. Na avaliação de competências pessoais não cabe aos Tribunais substituir-se à Administração, atribuindo a classificação que entende ser a justa, salvo nos casos em que seja flagrante que o júri não procedeu de forma correta na aplicação dos critérios de classificação.

V. É de admitir a retrospetividade, com aplicação de regime novo e distinto a direito ainda em formação, caso não implique intervenção gravosa na liberdade e/ou no património do concorrente.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul
I. RELATÓRIO
R... instaurou ação administrativa contra o Ministério das Finanças, convolada em ação de contencioso de procedimentos de massa, visando o despacho n.º 3…/2017-XXI, datado de 12/07/2017, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que indeferiu o recurso hierárquico apresentado do despacho da Diretora-Geral da Autoridade Tributária, de 19/05/2017, que homologou a lista de classificação final do estágio para ingresso na categoria de inspetor tributário, nível I do grau 4 da carreira de inspeção tributária do mapa de pessoal da Autoridade Tributária e Aduaneira, realizado no âmbito do concurso interno aberto por Aviso n.º 15564/2012, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 225, de 21/11/2012.
Pede:
- a revogação do despacho de 21/07/2017;
- a alteração da cotação atribuída à questão n.º 4 do 2.º teste de conhecimentos, de avaliação do estágio do autor, nos termos acima expostos, revendo a classificação de 16,50 valores para 17,00 valores;
- a alteração da avaliação do desempenho de estágio do Autor para 20,00 valores ou pelo menos 19,20 valores ou, em alternativa, substituir a avaliação do desempenho de estágio pela avaliação de serviço do ano anterior à conclusão do estágio, 19,07 valores;
- a alteração da lista de classificação final de estágio do concurso interno de ingresso na categoria de IT, do grau 4, nível 1;
- se for o caso, facultar ao autor, a possibilidade de optar pela sua afetação a uma das unidades orgânicas pertencentes aos Serviços Centrais da AT;
- a condenação do réu a pagar ao autor indemnização correspondente a uma quantia nunca inferior a € 10 000,00 (dez mil euros), acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos;
- a condenação do réu em todas as demais despesas que resultem para o autor e sejam consequência direta do resultado da avaliação de estágio.
Por sentença de 24/03/2021, o TAC de Lisboa julgou improcedente a ação e absolveu a entidade demandada dos pedidos.
Inconformado, o autor interpôs recurso daquela decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
“1. No que respeita à cotação atribuída à questão n.º 4 do 2.º teste de conhecimentos, de avaliação do estágio do Apelante, o Tribunal “A Quo” defende, que a entidade inspecionada era a empresa, porque esta é expressamente designada de sujeito passivo;
2. De uma forma muito ampla, a lei esclarece que o sujeito passivo é a pessoa singular ou coletiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária (artigo 18º, n.º 3, 1.ª parte, da LGT);
3. A melhor doutrina não deixa dúvidas sobre o conceito amplo de sujeito passivo adoptado pelo legislador: «o sujeito passivo da relação fiscal é toda e qualquer pessoa, singular ou colectiva, a quem a lei imponha o dever de efectuar uma prestação tributária, seja a prestação de imposto, sejam as prestações correspondentes às múltiplas e diversificadas obrigações acessórias» (J. CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, 10ª Edição, 2017, Almedina, p. 249);
4. Designar-se um contribuinte coletivo ou singular de sujeito passivo, não determina que o mesmo seja um sujeito passivo, necessariamente inspecionado, nos termos do enunciado, pelo que o propugnado pelo Tribunal “A Quo”, sobre a consequência de se designar a empresa de sujeito passivo, não colhe;
5. Em sede de derrogação do sigilo bancário, mormente no que à decisão se refere, existem dois momentos bem distintos e relevantes para análise desta questão e que se encontram distinguidos na parte final do n.º 5 do art.º 63.º-B da Lei Geral Tributária, designadamente o momento da proposta de decisão e o momento da decisão;
6. No momento da proposta de decisão, os sujeitos passivos não inspecionados (familiares ou terceiros que se encontrem numa relação especial com o sujeito passivo inspecionado) são notificados para exercer o seu direito de audição prévia à decisão;
7. No momento da decisão, os sujeitos passivos não inspecionados, já não têm possibilidade de exercer o seu direito de audição prévia à decisão, porque tiveram possibilidade de exercer tal direito no momento anterior (proposta de decisão), restando-lhes agora o recurso judicial daquela decisão;
8. Tanto no texto do enunciado da questão do teste de avaliação de conhecimentos, como no texto das opções de resposta, não restam dúvidas de que o enfoque do quesito incide, sempre e apenas, sobre uma decisão de derrogação do sigilo bancário já consumada, que recaiu sobre as contas bancárias de todos os sujeitos passivos identificados no enunciado (empresa e sócios);
9. Não se trata, assim, de uma mera proposta (projeto) de decisão de derrogação do sigilo bancário… trata-se antes, de uma decisão já consumada;
10. O objeto da audição prévia, não pode deixar de ser, apenas e necessariamente, um projeto de decisão e não uma ulterior decisão a proferir no futuro;
11. A lei esclarece de modo lapidar, que os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento, antes de ser tomada a decisão, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta, sendo que a notificação fornece o projeto de decisão (artigo 121.º, n.º 1 e 122.º, n.º 2, do CPA), e não ainda decisão;
12. Como esclarece a melhor doutrina, a existir o direito de audição prévia:
i) «o visado deve obrigatoriamente ser ouvido antes do acto intrusivo ser levado a efeito» (J. FREITAS DA ROCHA, Lições de Procedimento e de Processo Tributário, 6.ª Edição, 2018, Almedina, pág. 206);
ii) «trâmite formal mediante o qual se proceda à audiência dos interessados, em momento imediatamente anterior ao da tomada de decisão» (MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Teoria Geral do Direito administrativo, 5.ª Edição, 2018, Almedina, pág. 155).
13. O que não constitui nada de novo em relação à audição prévia. De outro modo, não seria um verdadeiro direito de participação na formação das decisões (artigos 267.º, n.º 5 da Constituição da República, 12.º, do CPA e 60.º, nº 1 da LGT), não podendo o contribuinte ser confrontado, em sede de audição prévia, com uma decisão já formada (proferida) pelo Diretor-Geral, encontrando-se, por isso, já findo o procedimento de derrogação administrativa do sigilo bancário;
14. In casu, estando perante uma decisão já tomada pelo Diretor-Geral, não estamos, nos termos do disposto no artigo 63.º-B, n.ºs 1 e 2 da Lei Geral Tributária, perante um acto na sua fase de proposta de decisão e que por isso implique o direito de audição prévia;
15. O direito à audição prévia, apenas pode ser exercido em sede de proposta de decisão, mas quer a questão formulada quer as opções de resposta, nunca fazem qualquer referência a uma proposta de decisão… antes, fazem sempre referência à decisão já consumada;
16. A própria lei esclarece, lapidarmente, que os elementos novos, suscitados na audição dos contribuintes, são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão (artigo 60.º, n.º 7, da LGT), ou seja, devem ser considerados, obrigatoriamente, na fundamentação de uma decisão necessariamente posterior;
17. A decisão de derrogação do sigilo bancário é suscetível de recurso judicial com efeito suspensivo e já não de audição prévia, dado esta última (audição prévia) não existir no âmbito do processo judicial;
18. Ao contrário do sufragado pelo Tribunal “A Quo”, a solução apresentada pelo ora Apelante, resulta sim das normas citadas, designadamente do estatuído no n.º 5 do art.º 63.º-B da Lei Geral Tributária, especialmente da parte final do mesmo, em que se determina o direito dos sujeitos passivos (familiares ou terceiros) de recorrerem judicialmente de uma decisão de derrogação já consumada;
19. A abrangência do n.º 5 do art.º 63.º-B da Lei Geral Tributária, ao contrário do que o tribunal “A Quo” defende, não se cinge meramente à problemática de quem pode exercer o direito de audição prévia, mas também se tal direito existe. Tal distinção é manifesta e por essa razão, tal normativo faz referência explícita, quer ao direito de audição prévia à decisão quer ao direito do recurso judicial da decisão;
20. O direito de audição prévia à decisão designa-se como tal (prévia), por ser um direito que só pode ser exercido antes da decisão e em nenhum outro momento, menos ainda, por maioria de razão, quando a decisão já foi proferida, tal como resulta do enunciado e das opções de resposta;
21. Se de acordo com o enunciado e respetivas opções de resposta, a decisão já está tomada/consumada, naturalmente, naquele momento (em que a decisão está tomada), o direito de audição prévia já não existe;
22. Existindo decisão, como é o caso exposto no enunciado, um inspetor tributário terá sempre de se cingir à letra da lei, in casu, ao n.º 5 do art.º 63.º-B da Lei Geral Tributária (LGT), resultando de tal normativo o seguinte:
i) Se ainda não existisse decisão, o que não resulta do enunciado nem das respetivas opções de resposta, determina o n.º 5 do art.º 63.º-B da LGT que “os atos previstos no n.º 2 dependem da audição prévia do familiar ou terceiro”, isto é, tais actos de derrogação do sigilo bancário de familiares e terceiros, não devem ser praticados, sem que o inspetor lhes conceda o direito de audição prévia à decisão;
ii) O n.º 5 do art.º 63.º-B da LGT prossegue, determinando que os tais actos, previstos no n.º 2, “são suscetíveis de recurso judicial com efeito suspensivo”, isto é, encontrando-se tais actos consumados (decisão de derrogação do sigilo bancário), apenas resta aos sujeitos passivos não inspecionados (familiares ou terceiros) recorrer judicialmente da decisão;
iii) A Administração está sujeita ao escrupuloso cumprimento da lei vigente, tendo por fundamento e limite a referida lei. Isto é, a Administração apenas pode fazer o que a lei permite, não estando habilitada a agir de outra forma;
iv) Assim, tomada que está a decisão, tal como resulta do enunciado e das respetivas opções de resposta, o inspetor tributário já não pode notificar os sujeitos passivos não inspecionados para exercício do direito de audição prévia à decisão, nem pode admitir favoravelmente qualquer pedido destes nesse sentido, não estivesse a decisão já tomada;
v) Nestes termos, tomada a decisão, inexiste o direito de audição prévia à decisão, nem para os sujeitos passivos inspecionados nem para os sujeitos passivos não inspecionados, isto é, tal como o Apelante indicou na folha de respostas, não existe lugar ao direito de audição.
23. Ainda que se admitisse o exercício do direito à audição prévia, o que não se concede, a verdade é que, conforme dispõe o artigo 63.º-B, n.º 2 e n.º 5 da Lei Geral Tributária, tal somente podia ser admitido, no caso específico e tipificado na lei de recusa da exibição de documentos bancários ou de recusa de autorização de acesso ao teor dos mesmos por parte de familiares ou terceiros que se encontrem numa relação especial com os contribuintes inspecionados;
24. No regime de derrogação administrativa do sigilo bancário para efeitos fiscais, a regra é a da não exigência de audição prévia, apenas sendo de observar esta em circunstâncias tipificadas na lei;
25. A questão colocada aos candidatos, na prova escrita, é absolutamente omissa em relação à existência deste requisito: recusa de prestação de informação bancária ou de autorização de acesso a essa informação por parte dos sócios da empresa, pelo que não é manifesto, antes pelo contrário, que a opção de resposta tenha de passar única e exclusivamente pela opção A);
26. Sendo o enunciado omisso, em relação à eventual recusa de cooperação dos sócios em prestar informações bancárias, o normal será sempre optar pela regra geral e não sobre uma regra de excepção, cujos pressupostos não se encontram verificados, por não referidos nem no enunciado nem nas opções de resposta;
27. A doutrina tem explicado que «Com a entrada em vigor da Lei n.º 94/2009, de 1 de Setembro, apenas nestas situações está prevista a faculdade de audição, uma vez que a administração tributária e os contribuintes devem abster-se da prática de actos inúteis ou dilatórios (artigo 57.º, n.º 1, 2.ª parte, da LGT)» (PAULO MARQUES, Sigilo Bancário: a Constituição e as Garantias dos Contribuintes, Revista o Direito, Ano 148, n.º 2, Faculdade de Direito de Lisboa, 2016, pág. 297);
28. Com referência ao caso em concreto, se o enunciado é omisso a respeito da eventual recusa de cooperação dos sócios em prestar informações bancárias, então, deve-se aplicar a regra geral e considerar que inexistem pressupostos para uma eventual audição prévia (por não indicados no enunciado) e, por isso, a audição prévia não deve realizar-se… nestes termos, a audição prévia seria um acto inútil e dilatório, algo que deve ser evitado tanto pela administração como pelos contribuintes;
29. Fortifica-se assim, a convicção de que a opção B) não pode deixar de estar correta, porquanto:
i) Uma vez já proferida a decisão, no âmbito do procedimento de derrogação administrativa do sigilo bancário, referida no enunciado da questão em discussão, já não há lugar ao exercício de audição prévia;
ii) E, mesmo antes da decisão já proferida, o que não é o que aqui se impõe analisar, dados os factos referidos no enunciado da questão e a não referência àquelas circunstâncias tipificadas na lei (pressupostos para realizar audição prévia), não é de exigir a audição prévia;
iii) Aliás, a não exigência deste trâmite procedimental (audição prévia) é, como já se disse, a regra geral a aplicar, o que se explica pela especial e manifesta preocupação demonstrada pelo legislador, no sentido de imprimir celeridade ao procedimento de derrogação do sigilo bancário, em nome do muito relevante interesse público fiscal e do combate à fraude e evasão fiscal em especial, em que tempo é mesmo dinheiro.
30. Entrando já no campo da especulação em detrimento da letra do enunciado, isto é, admitindo que o redator da questão quis referir-se a uma proposta de decisão, que pretendeu colocar as opções de resposta no particípio passado e que na sua mente encontrar-se-iam reunidas as condições para o exercício do direito de audição, o que não se concede, então, ainda assim, qualquer das opções de resposta poderia ser considerada correta, porque o texto do enunciado não esclarece sobre quem está a ser inspecionado, ficando ao critério do examinando, determinar quais os sujeitos passivos inspecionados e consequentemente quem poderia ou não poderia exercer o direito de audição prévia nos termos da lei;
31. Considerar como correta a opção de resposta A), em detrimento da opção de resposta B), constitui total desconsideração pelos mais elementares e basilares princípios associados à derrogação do sigilo bancário e pelo texto e espírito da lei nesta matéria, bem como promoção de uma completa e total arbitrariedade no âmbito do teste de conhecimentos;
32. O Tribunal Recorrido, ao não ter validado a resposta indicada pelo Apelante, nos termos pugnados por este, violou o estatuído no artigo 63.º-B, n.º 2 e 5 da Lei Geral Tributário;
33. A opção de resposta selecionada pelo Apelante (alínea “B)”) deve ser considerada correta, isto é, que “não há lugar ao exercício de audição prévia da decisão de derrogação do sigilo bancário”;
34. Assim, deve ser alterada a cotação atribuída à questão n.º 4 do 2.º teste de conhecimentos, de avaliação do estágio do Apelante, modificando-se a classificação desse teste de 16,50 valores para 17,00 valores, em virtude da resposta correta ser a assinalada pelo Apelante;
35. No que se refere à avaliação da competência comportamental “3 – Capacidade de adaptação e de melhoria contínua”, resultou provado (art.ºs 3.º a 8.º do doc. n.º 4 e art.ºs 34.º a 38.º do doc. n.º 11, juntos à PI), que o Apelante demonstrou flexibilidade, capacidade de adaptação e de trabalhar em situações distintas bem como de actualização de conhecimentos e de aperfeiçoamento profissional, muito acima da média;
36. Pese embora ser estagiário da área informática e ao contrário dos demais estagiários da mesma área, ao Apelante nunca foi atribuído qualquer serviço relacionado com informática, tendo o mesmo sido, inclusivamente, incumbido de fazer arquivo e de pesquisar manualmente dados cadastrais de milhares de contribuintes, que como é evidente, não tem conexão com a área informática;
37. O Apelante exerceu funções nos serviços locais, distritais e centrais, bem como efectuou serviço externo em equipa no âmbito de controlo de inventários, serviços que decorreram muito bem e sem reparo, conforme emerge da informação processual (processo administrativo instrutor) respeitante ao Apelante;
38. Atenta a prova produzida através dos documentos n.ºs 4 e 11 juntos à PI, deve ser aditado aos factos provados o seguinte item: o Apelante demonstrou flexibilidade, capacidade de adaptação e de trabalhar em situações distintas, bem como capacidade de actualização de conhecimentos e de aperfeiçoamento profissional, muito acima da média:
39. Na análise realizada pelo Avaliador P... e sufragada pelo Júri do Estágio, em sede de apreciação do direito de audiência prévia exercido pelo Apelante, apenas é dito por aquele Avaliador, que lhe parece ter atribuído a cotação correta à competência em causa, não apresentando qualquer outra fundamentação;
40. A análise realizada pelo Avaliador P… é notoriamente discricionária por não fundamentada;
41. A conduta do Júri do Estágio é conivente com a postura evidenciada pelo Avaliador e, atenta a discricionariedade e falta de fundamentação, resultam colocados em causa os princípios da transparência, boa-fé e legalidade;
42. Contrariamente ao sufragado pela Sentença Recorrida, a cotação atribuída ao item “3 – Capacidade de adaptação e de melhoria contínua” do parâmetro de avaliação “Competências comportamentais” do Estágio frequentado pelo Apelante, deve ser alterado para 5 valores, já que as análises sufragadas pelo Júri do Estágio, não apresentam quaisquer elementos que permitam obstar a que assim não seja nem refutam as alegações apresentadas pelo Apelante tanto em sede de audição prévia, como sem sede de recurso hierárquico;
43. No que se refere à competência comportamental “4 – Capacidade de relacionamento”, o Apelante também demonstrou, em sede de audiência prévia (art.ºs 9.º a 16.º do doc. n.º 4) e posteriormente em sede de recurso hierárquico (art.ºs 39.º a 48.º do doc. n.º 11), ter demonstrado espírito de equipa muito acima da média;
44. O Apelante sempre demonstrou ser muito solícito em ajudar os seus colegas quando se apercebe que estes se encontram em dificuldades;
45. O Apelante faz questão de ir ter com os seus colegas para os ajudar e para envolver-se em debates construtivos que envolvem o grupo de trabalho;
46. Durante o estágio, o Apelante sempre prestou apoio aos seus colegas, estagiários e não estagiários;
47. Ao contrário da maioria dos demais colegas estagiários, o Apelante nunca se envolveu em qualquer contenda com qualquer colega, nomeadamente com o colega M...;
48. Deve ser aditado aos factos provados que: O Apelante demonstrou, durante o estágio, espirito de equipa acima da média;
49. Em sede de apreciação do direito de audiência prévia, o Avaliador não presta quaisquer esclarecimentos sobre a notação atribuída a esta competência nem aborda quaisquer alegações apresentadas pelo Apelante, limitando-se a afirmar que o Apelante “necessitava melhorar” esta competência, pese embora ter atribuído uma notação que não tem conexão com tal afirmação;
50. O Avaliador acaba por ter uma postura omissiva em relação a esta matéria e o Júri do Estágio, mais uma vez, aceita as análises do Avaliador na íntegra;
51. A análise sufragada pelo Júri do Estágio, relativamente à reapreciação da cotação de tal desempenho do Apelante, não apresenta quaisquer elementos que permitam obstar a que a nota atribuída não seja valorizada;
52. Não resultaram refutadas as alegações do Apelante e, inclusive, esta competência nem sequer foi alvo de pronúncia nem decisão em sede de apreciação do recurso hierárquico;
53. O Tribunal Recorrido devia ter modificado a notação atribuída ao Apelante relativamente ao item “4 – Capacidade de relacionamento” do parâmetro de avaliação “Competências comportamentais”, para a cotação de 5 valores;
54. No que concerne à competência comportamental “5 – Responsabilidade e compromisso com o serviço”, por via do documentado em sede de audiência prévia (art.ºs17.º a 45.º do doc. n.º 4) e posteriormente em sede de recurso hierárquico (art.ºs 49.º a 108.º do doc. n.º 11), resulta demonstrado que o Apelante, sempre que necessário, trabalhou fora do horário de trabalho formal, com o intuito de cumprir os objectivos do serviço;
55. Tal matéria, também resulta demonstrada, por via de todos os E-mails que o Apelante remeteu para o Avaliador e para a sua Chefe de Equipa, fora do horário de trabalho formal, bem como trabalhou fora daquele horário, quer individualmente quer em directo apoio ao Avaliador (cfr. doc. n.º 11), factos que desmentem as palavras críticas do Avaliador sobre cumprimento de horários pelo Apelante (“significativo rigor no cumprimento do horário de saída”);
56. O Tribunal “A Quo” ignorou os Emails juntos aos autos (cfr. doc. n.º 11 páginas 47 a 61), que têm correspondência temporal com o estágio (12/01/2015 a 06/10/2015);
57. O Avaliador demonstra compreender, que o Apelante também trabalha fora do horário de trabalho formal, já que quando necessário, não deixou de contactar o Apelante via telemóvel, fora do horário de trabalho formal e fora do local de trabalho, para receber apoio na resolução de assuntos de serviço, conforme reconhecido pelo próprio em resposta à audiência prévia (cfr. doc. n.º 5 junto à Petição Inicial);
58. Ainda que o exemplo apresentado, não tenha correspondência com o período temporal do estágio, porquanto ocorreu durante a pendência do procedimento concursal e já depois do Apelante ter tido conhecimento, de que o Avaliador não cumpriu a lei, para poder penalizar a avaliação de estágio do Apelante, a sua conduta não pode deixar de relevar;
59. Se após descobrir que estava a ser prejudicado, o Apelante manteve-se, ainda assim, sempre disponível para ajudar o serviço, não há motivos para duvidar que antes de tal descoberta, o Apelante também se manteve sempre disponível para ajudar o serviço;
60. Os demais estagiários, não cumprem na íntegra o horário de trabalho formal, já que costumam ausentar-se do serviço a partir das 12h00m para almoçar, nas sextas-feiras à tarde costumam sair bem mais cedo do local de trabalho, não costumam chegar ao serviço às 9h00m e não raro saem do local de trabalho bem antes das 17h00m, conforme resulta do mapa de assiduidade junto pelo Apelante e que constitui apenas um exemplo ocorrido na pendência do procedimento concursal, não sendo por isso irrelevante (doc. n.º 19 junto à PI);
61. Essa falta de compromisso, da parte dos demais Estagiários, não resultou em qualquer penalização em relação aos mesmos no que respeita a tal item avaliativo, contrariamente ao sucedido com o Apelante;
62. Tal é representativo da violação do princípio da boa-fé bem como do princípio da igualdade, consubstanciada num tratamento discriminatório e desfavorável ao Apelante e que o tribunal Recorrido não relevou em sede de análise crítica da presente matéria;
63. Contrariamente ao sufragado em sede de avaliação, não se justifica qualquer penalização ao Apelante pelo alegado não cumprimento de horários;
64. O Tribunal “a Quo” devia ter relevado, o que até o cidadão mais humilde alcança, isto é, que as justificações apresentadas pelo Avaliador (cfr. doc. n.º 5 junto à Petição Inicial), nomeadamente sobre uma suposta reunião entre o Avaliador, o ora Apelante e a Chefe de Equipa, durante a qual o Apelante teria, pasme-se, pedido para ser prejudicado na sua avaliação de estágio, é no mínimo um absurdo. Tal afirmação, só pode ser entendida como um acto de má-fé que visa o profissionalismo e o caracter do Apelante e até como um insulto;
65. O Tribunal “a Quo” devia ter relevado, que existem consequências para os trabalhadores que incumpram horários sem justificação aceitável, designadamente através da marcação de falta pela responsável do serviço e superior hierárquica do Avaliador, o que nunca aconteceu;
66. O Apelante também demonstrou compromisso com o serviço acima da média, já que realizou 1/3 dos processos de “selecção de contribuintes para inspecção”, que a sua equipa (constituída por mais de 10 estagiários) tinha de elaborar, quer no ano de 2015 quer no ano de 2016;
67. Não resulta demonstrado, em sede de avaliação, que durante o período de estágio, o avaliado tenha incumprido qualquer prazo de execução de serviço, contrariamente ao invocado pelo avaliador que não concretiza tal incumprimento por parte do Apelante através de factos concretos temporalmente enquadráveis com o período de estágio;
68. O Avaliador não apresenta um único exemplo, de tarefas elaboradas pelo Apelante durante o período de estágio avaliado (entre 12/01/2015 e 06/10/2015), cujos prazos tivessem sido incumpridos.
69. É manifesto, através dos presentes autos e por via da análise de todo o processo junto aos autos alusivo ao estágio frequentado pelo Apelante, que o mesmo teve um alto desempenho na execução das suas tarefas, manifestou enorme disponibilidade para colaborar no acompanhamento das mais diversas e relevantes matérias (vide a abordagem da matéria inspectiva alusiva a paraísos fiscais), mesmo fora do seu horário de expediente;
70. O Apelante foi alvo de tratamento desigual em relação aos demais estagiários;
71. Deve ser aditado aos factos provados um novo item que deve passar a dispor o seguinte: O Apelante, durante o período de estágio, teve um alto desempenho na execução das suas tarefas e manifestou enorme disponibilidade para colaborar no acompanhamento das mais diversas e relevantes matérias, actuando mesmo fora do seu horário de expediente;
72. O Tribunal Recorrido devia ter considerado que a cotação atribuída ao item “5 – Responsabilidade e compromisso com o serviço” do parâmetro de avaliação “Competências comportamentais”, devia ser alterada para 5 valores, já que as análises sufragadas pelo Júri do Estágio, não apresentam quaisquer elementos que permitam obstar a que assim não seja nem refutam as alegações apresentadas pelo Apelante, inclusive limitam-se a abordar apenas uma alegação que não tinha conexão temporal com o período de estágio avaliado;
73. Em relação ao item 2.2 correspondente ao parâmetro de avaliação “Atitude pessoal”, o Apelante demonstrou enorme esforço e atitude pessoal, mesmo em relação a determinadas tarefas que lhe foram atribuídas e que não tinham qualquer conexão com as suas habilitações académicas e profissionais (ex.: arquivo, pesquisa manual de dados cadastrais de milhares de contribuintes, serviços não relacionados com informática, etc.);
74. A Demonstração do seu pleno cumprimento do parâmetro de avaliação “atitude pessoal”, resulta ainda, do Apelante ter aceitado contactar o Avaliador fora do horário de trabalho formal e fora do local de trabalho, para ajudar na prossecução dos objectivos do serviço, como por exemplo, para facultar dados à Directora-Geral;
75. O Avaliador, em sede de apreciação do direito de audiência prévia, não apresenta qualquer elemento probatório que corrobore a sua decisão, optando por olvidar todo o zelo e dedicação que sempre pautaram a conduta do Apelante ao longo do tempo, conforme resulta visível nas dezenas de E-mails remetidos pelo Apelante, durante o estágio e na pendência do procedimento concursal, fora do horário de trabalho formal (Anexo 7 ao Recurso Hierárquico – doc. n.º 11 junto à P.I.);
76. Resulta demonstrado pelo Apelante, em sede de audiência prévia, um conjunto de factos reveladores do alto desempenho do Apelante durante o estágio e na pendência do procedimento concursal;
77. A Sentença Recorrida não sanciona tal critério avaliativo, o que devia ter feito atento o que resulta evidenciado no âmbito destes autos;
78. Pelo que nos factos provados, deve passar a constar que: O Apelante demonstrou enorme esforço e atitude pessoal durante o período de estágio;
79. A cotação atribuída ao item 2.2 correspondente ao parâmetro de avaliação “Atitude pessoal”, deve ser alterada para 5 valores, conforme peticionado pelo Apelante;
80. A Sentença Recorrida deve ser modificada, porquanto resultou evidenciado, que a conduta do Apelante durante todo o período de estágio salientou-se de um padrão de elevada qualidade, tal como definido nas competências descritas, devendo ser modificada a avaliação atribuída às competências comportamentais fixadas nos itens 3, 4 e 5 do ponto 2.1 do parâmetro de avaliação “Competências comportamentais”, e no ponto 2.2 correspondente ao parâmetro de avaliação “Atitude pessoal”, entendendo que todos aqueles itens devem ser cotados em 5 valores;
81. No âmbito do escrutínio dos parâmetros de avaliação do seu Estágio, peticionou o Apelante, subsidiariamente, caso a avaliação de estágio não fosse corrigida para 20 valores ou para pelo menos 19,20 valores, nos termos supra alegados, a aplicação do n.º 2 do art.º 12 do Regulamento de Estágio, sustentando que a revogação de tal disposição regulamentar não é aplicável ao presente concurso;
82. Afigura-se, que o tribunal “A Quo” confundiu o conceito de estágio com o conceito de concurso ou procedimento concursal, pelo que torna-se imperioso clarificar tais conceitos:
i) Estágio: período prático, que teve o seu curso em 2015 e cuja avaliação de estágio, que foi atribuída posteriormente em 2016, diz respeito, apenas e somente, ao estágio decorrido em 2015. Este período de estágio faz parte integrante de um procedimento mais amplo, designado de concurso ou procedimento concursal;
ii) Concurso ou procedimento concursal: inclui e tem o seu início com o estágio (em 2015), e termina com a homologação da lista de classificação final, tendo esta sido homologada já em 2017, dizendo respeito a todo o período em que decorreu o concurso ou procedimento concursal, resultando portanto, da conjugação dos diversos elementos avaliativos (avaliação de estágio e notas obtidas nos testes de conhecimentos).
83. Resulta claro, que ao contrário do propugnado pelo tribunal “A Quo”, em Fevereiro de 2017, o estágio já tinha sido concluído e mesmo avaliado há mais de um ano (em 2016), faltando apenas concluir o procedimento concursal, envolvendo este último, elementos de avaliação absolutamente distintos do período prático de estágio e da sua avaliação (consolidados há muito);
84. Estabelece o artigo 2.º do Despacho n.º 1552-A/2017 o seguinte: O presente despacho produz efeitos a partir do dia 11 de fevereiro de 2017, sendo aplicável aos estágios em vigor nos termos do disposto no n.º 1 do art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 17/2017, de 10 de fevereiro";
85. O artigo 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 17/2017, estabelece a seguinte norma de natureza transitória: “Os estagiários que, no âmbito do período experimental em curso à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, não observem os critérios de aprovação previstos no artigo 30.º na redação anterior à conferida pelo presente decreto-lei, são posicionados em último lugar na lista de ordenação final dos canditados pela ordem da sua classificação, desde que cumpram os critérios de aprovação estabelecidos pela presente alteração";
86. A avaliação, do estágio frequentado pelo Apelante, foi atribuída em 2016, ou seja, antes das alterações feitas ao regulamento de estágio (em 2017) decorrentes da entrada em vigor do Despacho n.º 1552-A/2017;
87. À data da atribuição da avaliação do estágio, frequentado pelo Apelante, aplicava-se o Regulamento em vigor naquela data (2016);
88. Naquela data (2016), a avaliação de estágio deveria ter sido atribuída nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 12.º do Regulamento de estágio, porquanto tal norma somente foi revogada à posteriori, ou seja, mais de um ano após finalização do estágio e da atribuição da respetiva avaliação;
89. Na avaliação do estágio então conferida ao ora Apelante, em 2016, a Administração, na pessoa do Avaliador, ao arrepio da lei, atribuiu uma classificação de estágio sem qualquer apoio na lei então vigente, designadamente não cumprindo o estatuído inequivocamente no artigo 30.º, n.º 3, alínea a) e 5 e 6, do Decreto-Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro e concretizado nos n.ºs 2 dos artigos 6.º e 12.º do Regulamento de estágio;
90. A única lei então vigente, durante todo o período de estágio e com base na qual todos os candidatos realizaram o seu trabalho prático de estágio, esclarecia inequivocamente, que para efeito da classificação final dos funcionários com a categoria de técnico de administração tributária-adjunto que sejam admitidos ao estágio para ingresso nas categorias do grau 4, a avaliação referida ao interesse e qualidades de desempenho demonstrados durante o estágio, será substituída pela classificação de serviço referida ao ano anterior ao da conclusão do estágio (artigo 30.º, n.º 3, alínea a) e 5 e 6, do Decreto-Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro);
91. Sem a existência de uma lei que o habilitasse para tal e menos ainda contra o que a lei expressamente preceitua, inequivocamente, a avaliação de estágio deveria consistir na classificação de serviço referida ao ano anterior ao da conclusão do estágio, pelo que o avaliador não podia atribuir ao ora Apelante, que detinha justamente a categoria profissional de técnico de administração tributária-adjunto, uma avaliação ao período prático de estágio para ingresso na categoria de inspetor tributário (grau 4);
92. A lei então vigente é, como se viu, muito clara a esse respeito, sobre as regras que subordinaram o período prático de estágio, designadamente no caso de funcionários com a categoria de técnico de administração tributária-adjunto, como era o caso do Apelante;
93. Como é consabido, a Administração, na sua atuação, está sujeita ao escrupuloso cumprimento da lei vigente, tendo por fundamento e limite a referida lei. Isto é, a Administração apenas pode fazer o que a lei permite, não estando habilitada a agir de outra forma, entendimento unânime na melhor doutrina;
94. Posto isso, cita-se aqui, a título de exemplo, apenas alguns dos muitos doutrinadores que entendem neste sentido:
i) «não há um poder livre de a Administração fazer o que bem entender, salvo quando a lei lho proibir; pelo contrário, vigora a regra de que a Administração só pode fazer aquilo que a lei lhe permitir que faça.
Por outras palavras, a regra geral, geral – em matéria de atividade administrativa – não é o princípio da liberdade, é o princípio da competência […] ou seja, o que não for permitido considera-se que é proibido» (DIOGO FREITAS DO AMARAL Curso de Direito Administrativo, 3ª Edição, 2016, Almedina, pág. 40).
ii) «precedência da lei - Consubstancia-se na mencionada necessidade de habilitação legal para os atos da Administração Pública» (JOÃO CAUPERS/VERA EIRÓ, Introdução ao Direito Administrativo, 12ª Edição, 2016, Âncora Editora, pág. 41).
iii) «todo o agir administrativo se tem de fundar ou basear numa norma legal habilitante, sendo a sua falta sinónimo de proibição de ação ou permissão de omissão administrativa» (Direito do Procedimento Administrativo, Volume I, 2016, Almedina, p. 142).
95. No caso em concreto, na data em que foi atribuída a avaliação de estágio (em 2016), inexistia qualquer lei que permitisse à Administração, na pessoa do avaliador, agir de forma distinta e desconforme à lei então vigente em sede de avaliação de estágio, mas os factos não deixam dúvidas de que a lei não foi respeitada;
96. Salvaguardando as legítimas expectativas jurídicas e os princípios da segurança e certeza, o Despacho n.º 1552-A/2017 delimita muito claramente a sua aplicação ao previsto no artigo 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 17/2017, ou seja, apenas aos candidatos que não reuniam condições para aprovação ao abrigo da lei anteriormente vigente;
97. O Decreto-Lei Decreto-Lei n.º 17/2017 e o Despacho Despacho n.º 1552-A/2017, não são passiveis de serem aplicados ao ora Apelante, uma vez que este reunia todas as condições para aprovação ao abrigo da lei anteriormente vigente, menos ainda desfavorecendo e surpreendendo o Apelante, que já finalizara no ano anterior, com êxito, o período prático de estágio;
98. Não é aceitável, conforme estabelece a Sentença Recorrida, que a aplicabilidade de tal despacho decorra da circunstância de ainda não ter sido homologada a respectiva lista final de estágio;
99. Tal interpretação, contraria, absolutamente, os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima, que estão subjacentes à aplicação de qualquer norma jurídica, porquanto, efetivamente, o estágio que o Apelante integrou já havia terminado em 2015 e havia sido avaliado em 2016, estando assim esgotada integralmente a prestação/intervenção do Apelante para efeitos avaliativos;
100. A alusão à revogação da citada norma regulamentar de estágio, nos termos pugnados pelo tribunal recorrido, diga-se que em prejuízo do Apelante, é ainda ofensiva do princípio da irretroatividade das normas, previsto no artigo 12.º do Código Civil e «E mesmo que se apliquem para o passado – eficácia retroactiva – presume-se que há a intenção de respeitar os efeitos jurídicos já produzidos» (PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, Volume I, 4ª Edição, 2011, Coimbra Editora, pág. 61);
101. Ainda que subsistissem dúvidas sobre a eventual aplicação retroativa da legislação, a verdade é que resulta da letra da nova lei, que a mesma visava quanto muito, em relação aos procedimentos concursais pendentes, conferir um regime de avaliação mais favorável aos candidatos que não reuniam condições para aprovação ao abrigo da lei anterior;
102. A interpretação do Tribunal “A Quo”, diga-se que manifestamente errada, redunda no oposto, isto é, num claro prejuízo para o Apelante enquanto candidato;
103. O tribunal a quo defende a aplicação retroativa de regras de avaliação ao procedimento concursal pendente mas cujo estágio já havia sido finalizado, em benefício de alguns candidatos, mas incompreensivelmente em prejuízo de outros candidatos, como é o caso do ora Apelante, sendo que este último, já realizou integralmente a sua prestação no período prático de estágio e agora é confrontado, com inteira e natural estupefação, com uma interpretação praeter legem (ou mesmo contra legem), que o surpreende com novas regras de avaliação, por sinal desfavoráveis, quando ele, como já se referiu, já realizou a sua prestação subordinada ao quadro legal então vigente;
104. Com tal interpretação, o tribunal “A Quo” favorece alguns candidatos em detrimento de outros, que são mesmo prejudicados, promovendo a desigualdade entre candidatos, em clara violação do princípio da igualdade previsto no art.º 13.º da Constituição da República Portuguesa, o que o legislador segura e expressamente não quis nem podia querer;
105. É manifesto, que andou mal o Tribunal Recorrido, ao afastar a aplicação do artigo 30.º, n.º 3, alínea a) e 5 e 6, do Decreto-Lei n.º 557/99, de 17 de Dezembro bem como do artigo 12.º n.º 2 do Regulamento de Estágio, relativamente à avaliação do estágio frequentado pelo Apelante;
106. Atentos os fundamentos apresentados no aresto recorrido, têm-se por violadas, por parte do Tribunal “A Quo”, as normas insertas nos artigos 6.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2, ambos do Regulamento de Estágio, no artigo 30.º, n.º 3, alínea a) e 5 e 6, do Decreto-Lei n.º 557/99, no artigo 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 17/2017, assim como no artigo 12.º do Código Civil e no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa;
107. Atendendo também, a que o Apelante era titular da Categoria de Técnico de Administração Tributária Adjunto do Grau 2 do GAT, ao estágio frequentado pelo mesmo e devidamente identificado nestes autos, devia ter sido aplicado o artigo 12.º, n.º 2 do Regulamento de Estágio à data da avaliação do estágio (em 2016);
108. Não resultando alterada a avaliação nos termos peticionados pelo Apelante, ao mesmo devia ter sido atribuída a classificação de serviço referente ao ano anterior ao da conclusão do estágio” que corresponde a 19,07 valores;
109. A lista de classificação final, do procedimento concursal de ingresso na categoria de IT, do Grau 4, nível 1, no que ao Apelante diz respeito, deve ser alterada, passando a constar o seguinte:
i) Classificação do 2.º teste: 17,00 valores;
ii) Avaliação de estágio: 20,00 valores ou no mínimo 19,07 valores.
110. O Despacho n.º 300/2017-XXI de 21/07/2017 do Secretário de Estado dos Assuntos Ficais deve ser revogado;
111. Ao contrário do propugnado pelo tribunal “A Quo”, não resultou omitido em sede de alegações, que ainda não havia ocorrido o afastamento do Apelante dos Serviços Centrais da AT, tal como resulta do artigo 177.º da Petição Inicial;
112. A Sentença Recorrida deve ser modificada, devendo o Apelante ser colocado num dos serviços centrais da AT, nos termos do art.º 177.º da Petição Inicial;
113. Por via do presente recurso, está demonstrado que o Apelante, no âmbito da avaliação do seu estágio, foi alvo de conduta discriminatória por parte do Avaliador, não tendo tido tratamento igual ao dos seus colegas estagiários, o que redundou em atentado moral e “mobbing” por parte dos serviços integrados na administração directa do Apelado, quer na pessoa do Avaliador quer na pessoa da Presidente e demais elementos do Júri do Estágio;
114. Tanto o Avaliador como o Júri de estágio, tinham conhecimento de que em 2016, data em que o estágio foi avaliado, não existia legislação alguma que visasse a eventual revogação dos n.ºs 2 dos art.ºs 6.º e 12.º do Regulamento de Estágio e que, por isso, naquela data, tal normativo encontrava-se em vigor;
115. Ainda assim, Avaliador e Júri de estágio, não respeitaram tal normativo legal, bem sabendo que desse modo estariam a penalizar o Apelante à margem da lei, impondo-lhe uma avaliação significativamente inferior à avaliação atribuída à vasta maioria dos estagiários, quando pelas funções por eles exercidas, tinham o especial dever de respeitar os princípios da imparcialidade e da legalidade;
116. Desta forma, Avaliador e Júri de estágio, objetivamente, conseguiram impedir, que o Apelante conseguisse lugar na sua primeira opção (Serviços Centrais) e que apenas fosse colocado na sua segunda opção (Direção de Finanças de Lisboa), isto já após entrada da Petição Inicial, o que redundou em deslocações para local de trabalho mais distante da sua residência e maior despesa com transportes;
117. A conduta supra descrita nestes autos, perpetrada pelo Avaliador e respectivo Juri, que deve classificar-se de ilícita, provocou e continua a provocar enorme consternação, mau estar e angústia na pessoa do Apelante;
118. O Apelante assimilou plenamente, na sua mente, a noção de que o Apelado, na pessoa dos seus dirigentes, procurará sempre prejudicá-lo por todos os meios ao seu alcance, ainda que em violação dos normativos legais em vigor, como aliás, acabou por acontecer em sede de avaliação de desempenho de 2017/2018 e de obtenção de elementos de cariz administrativo (vide processos n.º 2129/18.0BELSB, 2337/19.6BELSB e 1561/20.3BELSB);
119. Todo o cenário, descrito pelo Apelante, acabou por ter consequências graves para a saúde do Apelante, que continuou a ter reflexos numa fase posterior à conclusão do estágio, e não deixou de ser consequência da conduta praticada pelos funcionários afectos à estrutura do Apelado;
120. As consequências nefastas para a saúde e para a estabilidade emocional do Apelante não podem ser assim negligenciadas e têm claros reflexos na estabilidade psicológica do mesmo, decorrente da enorme instabilidade que o Apelante vem vivenciando em relação à sua vida profissional e por conseguinte em relação à sua vida pessoal;
121. Contrariamente ao aludido na Sentença Recorrida, todos estes factos estão demonstrados e são constitutivos da violação dos mais elementares direitos do Apelante, constituindo danos não patrimoniais decorrentes ademais duma clara ofensa aos direitos de personalidade deste, para além de constituirem prejuízo da afirmação profissional do Apelante;
122. Tais factos, merecedores da tutela do direito, provocaram no Apelante, danos passíveis de responsabilidade civil nos termos do artigo 483.º do Código Civil e artigos 1.º, 3.º, 8.º, 9.º e 10.º da Lei n.º 67/2007 de 31 de Dezembro, disposições normativas que o tribunal Recorrido violou ao não julgar procedente o pedido indemnizatório formulado pelo Apelante;
123. Encontrando-se demonstrados os pressupostos inerentes ao instituto da responsabilidade civil, cabe ao Apelado, a obrigação de indemnizar o Apelante nos termos dos artigos 3.º e 8.º, n.º 2 da Lei n.º 67/2007 de 31 de Dezembro;
124. O Apelante, ao contrário do que dispõe a Sentença Recorrida deve assim ser devidamente ressarcido, mediante o pagamento de uma indemnização que compense os danos morais, o prejuízo da afirmação profissional do mesmo e acima de tudo que force os funcionários e dirigentes do Apelado, a reverem os seus comportamentos no sentido de fazer cessar os atentados morais de que o Apelante foi e continua a ser vítima;
125. A Sentença Recorrida deve ser modificada, devendo o Apelante ser ressarcido através do pagamento de quantia indemnizatória nunca inferior a € 10 000,00 (dez mil euros), acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos.”
A entidade demandada apresentou contra-alegações, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
“1. Improcedem os argumentos do recorrente, e deve manter-se a douta sentença, que entendeu indeferir os pedidos, apoiando inequivocamente a tese da entidade recorrida.
2. Dendo manter-se válido e eficaz o despacho nº3.../2017-XXI, de 12/07/17 do SEAF que indeferiu o recurso hierárquico por si apresentado da homologação da lista de classificação final, bem como de todos os atos subsequentes.
3. Decidiu bem o Tribunal ao entender que não houve qualquer Erro de Correção das Provas, quanto àquela que seria a resposta correta à questão 4 da 1ª Chamada do 2º Teste de Conhecimentos realizado em 24/10/2015.
4. As respostas consideradas corretas nas provas de conhecimentos contêm a solução para o enunciado de cada questão, por serem estas as únicas que encontram total correspondência e sustentação no ordenamento legal vigente, não enfermando nenhuma delas em qualquer erro material ou jurídico e estando em total conformidade com as normas a que respeitam.
5. Nesse sentido, está correta a decisão de rejeitar a reclamação do recorrente, tal como bem entendeu a Douta sentença recorrida, que se deve manter e que evidenciou o seguinte: os termos do enunciado da questão em preço não oferecem qualquer dúvida de que a entidade inspecionada era a sociedade, expressamente designada de sujeito passivo, relativamente à qual os sócios (…) são considerados terceiros que necessariamente se encontram numa relação especial com o contribuinte inspecionado.
6. Quanto à questão da sua avaliação de desempenho, os argumentos de que persiste em lançar mão, não podem ser atendidos apenas pelo facto de que discorda da sua avaliação de desempenho e pretender obter a pontuação máxima possível em sede de avaliação de desempenho.
7. Muito menos podem colher os argumentos de que a Administração violou os princípios da boa-fé, da transparência e do interesse publico, com base no desconhecimento de que determinados elementos de avaliação são valorizados em detrimento de outros.
8. Não bastava por isso, como continuou a decidir a sentença, que não bastava ao Recorrente referir-se genericamente a situações e circunstâncias que não demonstra mas que, em sua opinião, determinariam, uma notação superior nos itens em avaliação, em que não obteve a notação máxima.
9. Como bem notou a sentença, verifica-se que a avaliação de desempenho do Recorrente está sobejamente fundamentada, designadamente quanto à questão dos horários.
10. Por tudo isto, conclui o Tribunal que a avaliação dada é legítima e que não enferma de nenhum vício de ilegalidade e que foi atribuída, como é bom de ver, no contexto dos poderes discricionários do avaliador.
11. O julgamento sobre o mérito da avaliação não pertence aos Tribunais, pelo que na ausência de qualquer ilegalidade, estando tais valorações dentro da esfera da discricionariedade técnica da Administração, atento o princípio de separação de poderes, não pode o Tribunal de recurso sindicar acerca do mérito da decisão final da entidade requerida quanto ao recurso hierárquico e na parte da avaliação de desempenho.
12. Pelo que deverá manter-se a decisão posta em causa, bem como a avaliação final.
13. Quanto ao pedido de condenação da entidade demandada no pagamento de uma indemnização e em todas as demais despesas resultantes e que sejam consequência da avaliação do estágio, bem como em custas processuais, não está demonstrado nem qualquer dano emocional, para além do que alega, nem qualquer nexo de causalidade entre um eventual dano e a conduta da Administração.
14. Como não está demonstrada a existência de facto ilícito. Aliás, nenhum dos elementos da responsabilidade civil vem demonstrado, como bem decidiu a sentença recorrida.”

Perante as conclusões das alegações do recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir:
- dos erros do julgamento de facto, devendo ser aditado aos factos provados (i) que demonstrou flexibilidade, capacidade de adaptação e de trabalhar em situações distintas, bem como capacidade de atualização de conhecimentos e de aperfeiçoamento profissional, muito acima da média, atento o teor dos documentos 4 e 11 juntos à PI; (ii) que demonstrou, durante o estágio, espirito de equipa acima da média; (iii) que, durante o período de estágio, teve um alto desempenho na execução das suas tarefas e manifestou enorme disponibilidade para colaborar no acompanhamento das mais diversas e relevantes matérias, atuando mesmo fora do seu horário de expediente; (iv) e que demonstrou enorme esforço e atitude pessoal durante o período de estágio;
- dos erros de julgamento de direito quanto (i) à correção da questão n.º 4 do 2.º teste de conhecimentos, por violação do estatuído no artigo 63.º-B, n.º 2 e 5, da Lei Geral Tributária; (ii) à correção da avaliação da competência comportamental; (iii) e à violação do princípio da igualdade, ao afastar a aplicação dos artigos 30.º, n.º 3, al. a), 5 e 6, do Decreto-Lei n.º 557/99, de 17 de dezembro, e 12.º, n.º 2, do Regulamento de Estágio.

Dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.
*
II. FUNDAMENTOS
II.1 DECISÃO DE FACTO
Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
“A) Em 12/01/2015, o A. iniciou período experimental (estágio) como Inspetor Tributário Estagiário na Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), na Direcção de Serviços de Planeamento e Coordenação da Inspeção Tributário da AT - Divisão de Estudos e Coordenação (DSPCIT-DEC), local de trabalho onde já se encontrava a exercer funções há diversos anos - alegado e não contestado;
B) O estágio referido em A) refere-se ao concurso aberto através do Despacho datado de 21/11/2012 do Diretor Geral da AT divulgado através do Aviso n.º 15564/2012 publicado no Diário da República n.º 225, II Série - cfr. documento sob o registo 007574893;
C) Durante o estágio referido em A), o A. teve como Orientador de Estágio e Avaliador, o Chefe de Divisão em substituição na DSPCIT P…; como Chefe de Equipa R…; como Diretora de Serviços A… e como Subdiretora-geral da Inspeccão Tributária, A… - não contestado e documento sob o registo 007627031 (PA, 3.ª parte);
D) Faziam parte do Júri do Estágio referido em A), entre outros, a Presidente A… (Subdirectora-Geral da Inspeção Tributária) e a vogal efetiva A… (Diretora de Serviços na DSCPIT), ambas superioras hierárquicas do Avaliador e do Autor - alegado e não contestado; e atas do júri de estágio (cfr. documento sob o registo 007627031 (3.ª parte);
E) No âmbito do estágio referido em A), o A. realizou três testes de conhecimentos escritos, nos quais obteve a média de 16,17 valores, sendo a média dos demais estagiários colocados no mesmo serviço que o A. de 13,74 - alegado e não contestado;
F) O enunciado da versão B da 1.ª Chamada do 2.º teste de conhecimentos específicos do estágio referido em A) (referência B - Informática), realizado em 24/10/2015, tinha entre outras, a seguinte questão: «04. Pedro, Inspetor Tributário a exercer funções na Direção de Finanças de Coimbra, solicitou, ao Diretor-Geral da AT, a derrogação do sigilo bancário relativamente ao sujeito passivo Construções de Luxo, S.A., bem como aos seus sócios, Manuel Andrade e Joaquim Silva, tendo a mesma sido devidamente autorizada. Face aos factos descritos, indique a afirmação correta:
a) Apenas os dois sócios devem ser notificados da decisão de derrogação do sigilo bancário para efeitos de audição prévia;
b) Não há lugar ao exercício de audição prévia da decisão de derrogação do sigilo bancário;
c) O contribuinte Construções de Luxo, S.A., bem como os seus dois sócios, devem ser notificados da decisão de derrogação do sigilo bancário para efeitos de audição prévia;
d) Nenhuma das afirmações anteriores está correta.»
- cfr. fls. 5 do PA, no documento sob o registo 007626986 (1.ª parte do PA);
G) A grelha de correção do teste referido em F) considerou como resposta correta a alínea a) - cfr. fls. 20 do PA, no documento sob o registo 007627000 (2.ª parte do PA);
H) Na resposta à questão referida em F), o A. assinalou como correta a opção b) - cfr. fls. 25 do PA no documento sob o registo 007627000 (2.ª parte do PA);
I) Em 27/11/2015, o A. exerceu o seu direito de participação sobre os resultados dos testes, requerendo que fosse considerada correta a opção b) e por consequência, ser alterada a sua média final dos dois primeiros testes de 15,50 para 15,75. - cfr. fls. 1 a 4 do documento da PI sob o registo 007495575 e fls. 21 a 22 do PA (documento sob o registo 007627000, 2.ª parte), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
J) O júri do estágio referido em A), relativamente à reclamação referida em I), manteve como correta a resposta constante da grelha de correção, referindo que: « 2.º teste - 24/Outubro/2015 Versão B Pergunta 4
1- Pretende-se com a questão que os candidatos evidenciem a capacidade de aplicar corretamente o disposto no n.9 5 do Artigo 63-B da LGT.
2- O ITE alega que não só estamos perante a decisão de derrogação de sigilo bancário devidamente autorizada, existindo nesta fase apenas a possibilidade de recurso judicial dessa decisão, como também ficou ao critério de leitor identificar os sujeitos passivos inspecionados. A argumentação elaborada pelo ITE conduz à conclusão de que o júri deverá considerar como correta a alínea b).
3- Face à formulação da questão, estamos perante a decisão de derrogação de sigilo bancário, prevendo o n.º 5 do artigo 63-B da LGT que os atos praticados ao abrigo da competência definida no n.º l são suscetíveis de recurso judicial, com efeito meramente devolutivo e, os previstos no n.º 2, dependem da audição prévia do familiar ou terceiro e são suscetíveis de recurso judicial com efeito suspensivo por parte destes. Assim, da formulação apresentada, fica claro que a entidade inspecionada é a Construções de Luxo, SA, tendo sido estendido o pedido de derrogação de sigilo bancário aos sócios, pelo que se pretendia que os candidatos indicassem como correta a alínea que decorre da aplicação do n.º 5 do artigo 63-B da LGT, ou seja, que apenas os dois sócios devem ser notificados da decisão da derrogação de sigilo bancário para efeitos de audição prévia.
4- Consequentemente, não se acolhe o alegado, mantendo-se como correta a resposta constante da grelha de correção.» - cfr. fls. 25 do PA (documento sob o registo 007627000, 2.ª parte);
K) Dá-se por reproduzido o teor da Ficha de Avaliação de Desempenho do A., no âmbito do estágio referido em A), e relativo ao período de 12/01/2015 a 06/10/2015, ora a fls. 42 e 43 do PA - cfr. documento sob o registo 007627031 (3.ª parte);
L) O A. obteve a avaliação do desempenho de estágio de 16,20 valores e a média da avaliação de desempenho dos restantes 12 estagiários colocados no mesmo serviço foi de 19,18 - cfr. fls. 6 do documento sob o registo 007495575 (documentos da PI);
M) Em 17/03/2017, o A. pronunciou-se sobre o projeto de classificação final do estágio e da avaliação de desempenho, bem como da classificação final de estágio, nos termos do requerimento a fls. 7 a 18 do documento sob o registo 007495575 (documentos da PI), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o qual foi apreciado nos termos do anexo à ata n.º 32 do júri do estágio referido em A), ora a fls. 19 a 20 do documento sob registo 007495575 (documentos da PI), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
N) Do anexo referido em M), destaca-se o seguinte: «(…) Apenas na competência "Responsabilidade e compromisso com o serviço" foi atribuída a pontuação de 3 valores. Esta avaliação, apesar de positiva, "3 (três) valores - Enquadra-se no modelo de conhecimentos definido para a competência, revelando capacidade de desempenho e atuando de forma positiva.", foi penalizada por alguns fatores, nomeadamente a recorrente falta de rigor no cumprimento do horário de entrada, mas o significativo rigor no cumprimento do horário de saída, que penaliza a disponibilidade para responder às necessidades do serviço e que representa um não cumprimento das regras regulamentares relativas ao funcionamento do serviço. Quando confrontado com o recorrente incumprimento de horários, numa reunião com o Chefe de Equipa, respondeu para o penalizarem na avaliação. O compromisso para com o serviço do candidato varia entre uma preocupação e disponibilidade para com a resolução das situações, e noutros momentos, com alheamento face aos compromissos assumidos pelo serviço, não só não respondendo aos pedidos no prazo, como não disponibilizando os dados relativos ao trabalho efetuado, de modo a que outros funcionários possam concluir o trabalho e assim responder a pedidos externos nos prazos fixados à Direção de Serviços. Foi na sequência de um não cumprimento de um pedido estipulado, sem disponibilizar dados nem dar qualquer informação sobre o ponto de situação do trabalho, que o candidato foi contactado telefonicamente pelo Chefe de Divisão, situação deserhr nas alegações do candidato. Face ao exposto, os aspetos negativos verificados beneficiaram de alguns aspetos positivos de modo a considerar adequada a atribuição de uma avaliação positiva, de 3 valores. Atitude Pessoal Relativamente a este ponto, considerando que o candidato ao longo do estágio intercalou períodos de elevado empenho e dedicação, com outros de menos disponibilidade e dedicação considero que a classificação de 4 valores - “Manifestou muito interesse em aprofundar os seus conhecimentos, manteve um alto nível de motivação pessoal, assim como altos padrões de exigência em relação àquilo que faz, mantém muito boas relações interpessoal com os colegas e fomenta ativamente o esforço da equipa a que pertence;”, foi atribuída valorizando os aspetos positivos e desvalorizando até os aspetos menos positivos do estágio. Propõe-se a manutenção da avaliação de desempenho atribuída (16,2 valores).
4 O júri aceita o sentido da decisão do orientador de estágio.».
O) Em 06/06/2017 o A. apresentou recurso hierárquico do despacho da Diretora-Geral da AT, datado de 19/05/2017 que homologou a lista de classificação final de estágio referido em A), nos termos do requerimento a fls. 29 a 53 do documento sob registo 007495575 (Documentos da PI), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
P) O A foi notificado em 21/07/2017 da decisão do recurso hierárquico referido em O), bem como do parecer do júri sobre as alegações de recurso - cfr. fls. 54 a 56 do documento sob o registo 007495583 (documentos da PI), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
Q) O recurso hierárquico referido em O) foi indeferido pelo Despacho 300/2017- XXI do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, datado de 12/07/2017, nos autos a fls. 3 do documento sob o registo 007574893 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
R) Na lista de classificação final de estágio, alterada conforme Despacho SEAF nº 300/2017 -XXI, o A. ficou no número de ordem 2… - cfr. documento sob o registo 008087971;
S) Entre 12/01/2015 e 06/10/2015, o A. remeteu aos seus superiores hierárquicos, mensagens de correio eletrónico relativas a assuntos de trabalho, designadamente listagens e estatistas por si elaboradas, entre as 12:59h e as 13:30h; e entre as 17:14h e 19:53h- cfr. documentos na PI, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
T) Previamente ao inicio do estágio referido em A) o A. detinha a categoria de Técnico de Administração Tributária Adjunto - alegado e não contestado.

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II.2 APRECIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Conforme supra enunciado, as questões a decidir cingem-se a saber se:
- ocorrem erros do julgamento de facto da sentença, devendo ser aditado aos factos provados (i) que demonstrou flexibilidade, capacidade de adaptação e de trabalhar em situações distintas, bem como capacidade de atualização de conhecimentos e de aperfeiçoamento profissional, muito acima da média, atento o teor dos documentos 4 e 11 juntos à PI; (ii) que demonstrou, durante o estágio, espirito de equipa acima da média; (iii) que, durante o período de estágio, teve um alto desempenho na execução das suas tarefas e manifestou enorme disponibilidade para colaborar no acompanhamento das mais diversas e relevantes matérias, atuando mesmo fora do seu horário de expediente; (iv) e que demonstrou enorme esforço e atitude pessoal durante o período de estágio;
- dos erros de julgamento de direito da sentença quanto (i) à correção da questão n.º 4 do 2.º teste de conhecimentos, por violação do estatuído no artigo 63.º-B, n.º 2 e 5, da Lei Geral Tributária; (ii) à correção da avaliação da competência comportamental; (iii) e à violação do princípio da igualdade, ao afastar a aplicação dos artigos 30.º, n.º 3, al. a), 5 e 6, do Decreto-Lei n.º 557/99, de 17 de dezembro, e 12.º, n.º 2, do Regulamento de Estágio.


a) do erro de julgamento da decisão de facto

Sustenta nesta sede o recorrente que se impõe o aditamento ao probatório dos seguintes factos:
(i) que demonstrou flexibilidade, capacidade de adaptação e de trabalhar em situações distintas, bem como capacidade de atualização de conhecimentos e de aperfeiçoamento profissional, muito acima da média, atento o teor dos documentos 4 e 11 juntos à PI;
(ii) que demonstrou, durante o estágio, espirito de equipa acima da média;
(iii) que, durante o período de estágio, teve um alto desempenho na execução das suas tarefas e manifestou enorme disponibilidade para colaborar no acompanhamento das mais diversas e relevantes matérias, atuando mesmo fora do seu horário de expediente;
(iv) e que demonstrou enorme esforço e atitude pessoal durante o período de estágio.
Dispõe como segue o artigo 640.º do CPC, sob a epígrafe ‘ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto’:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º”.
Daqui decorre que, ao impugnar a matéria de facto em sede de recurso, recai sobre o recorrente o ónus de indicar (i) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e (ii) os concretos meios probatórios que impõem decisão distinta, mais devendo identificar precisa e separadamente os depoimentos caso se trate de meios probatórios gravados.
E cabe-lhe alegar o motivo pelo qual os meios probatórios que indica impõem decisão diversa e também porque motivo os meios probatórios tidos em conta pelo tribunal não permitem se considere provado determinado facto.
Há que ter ainda em consideração que é em função da definição do objeto do processo e das questões a resolver nos autos que deve ser apreciada a relevância da matéria fáctica alegada pelas partes. Assim, nem toda a matéria fáctica que se possa considerar provada deve ser levada, sem mais, ao probatório.
E como é consabido, os factos respeitam à ocorrência de acontecimentos históricos, afastando-se de tal qualificação os juízos de natureza valorativa, que comportam antes conclusões sobre factos.
Outrossim, deve ter-se em consideração que no novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, se optou por reforçar os poderes da 2.ª instância em sede de reapreciação da matéria de facto impugnada, incrementados os respetivos poderes e deveres, com vista a permitir-lhe alcançar a verdade material, conforme consta da exposição dos motivos e se consagra no atual artigo 662.º, n.º 1, “[a] Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
É patente a falta de razão do recorrente.
Com efeito, o mesmo ampara a sua pretensão de alteração da decisão de facto indicando como meios probatórios peças procedimentais interpostas em seu nome, que evidentemente não provam mais do que isso mesmo, a apresentação de tais peças. Para aqui, de todo irrelevante.
Por outro lado, da existência de comunicações eletrónicas de trabalho elaboradas pelo recorrente, ponto s) da matéria de facto dada como assente, apenas resulta isso mesmo, que tais comunicações foram efetuadas, e nada nos diz quanto ao desempenho do recorrente, designadamente para efeito de prova de qualquer dos factos que pretende ver aditados.
Como tal, ter-se-á de concluir que improcede a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.


b) dos erros de julgamento de direito

(i)
A primeira questão colocada pelo recorrente, nesta sede, reporta-se a um pretenso erro na correção da sua resposta à questão n.º 4 do 2.º teste de conhecimentos, de avaliação do estágio.
É consabido, como se reconhece na sentença sob recurso, existir uma ampla margem de discricionariedade da Administração no processo de classificação dos candidatos, nomeadamente quanto à elaboração das provas escritas de conhecimentos. Contudo, nestas provas em que são apresentadas hipóteses múltiplas de resposta, em que apenas uma deve ser considerada correta, não se vislumbra sombra de discricionariedade por parte da Administração, mas antes uma atividade vinculada à lei.
É que inexiste aqui liberdade de avaliação por parte da Administração, ao fixar-se na grelha de correção uma determinada resposta para determinada questão, podendo e devendo o Tribunal sindicar se a avaliação jurídica efetuada foi a mais correta.
Como entendeu já o Supremo Tribunal Administrativo, em acórdão de 03/03/2016 (proc. n.º 0768/15, disponível em http://www.dgsi.pt), em caso com evidentes paralelos com o que presentemente nos ocupa, nas “provas de conhecimento como método de seleção, os Tribunais não podem proceder à avaliação das prestações dos concorrentes e substituir-se à Administração, atribuindo a classificação que entendem ser a justa, salvo nos casos em que seja flagrante que o júri não procedeu de forma correta na aplicação dos critérios de classificação, que estabeleceu como padrão da resposta exata.”
Contudo, tal como aqui, estava-se “perante uma avaliação traduzida na realização de um teste de escolha múltipla, ‘multiple choice’, vulgo, teste americano, em que das soluções de resposta apresentadas aos candidatos, só uma é considerada correta, por assim haver sido previamente determinado por uma Comissão de Avaliação, supostamente em cumprimento da legislação aplicável. Ou seja, estamos perante um quadro em que tudo aponta para que a discricionariedade atribuída à Administração seja negativa, tudo se passando como se houvesse discricionariedade, mas não há. No caso de teste de escolha múltipla, a aparente discricionariedade ou discricionariedade negativa verifica-se num momento prévio ao da correção do teste e apuramento concreto da resposta considerada certa; ou seja, verifica-se no momento em que o júri/comissão de avaliação determina qual a resposta considerada correta nas várias hipóteses previstas e apresentadas aos candidatos.”
Concluindo-se no citado aresto, em entendimento que perfilhamos, apenas caber ao Tribunal sindicar da existência do erro no momento prévio à avaliação, em que o júri considerou determinada resposta como certa, pois só aqui existe a chamada discricionariedade imprópria.
No caso vertente, o júri criou uma grelha de correção, contendo as respostas para cada questão, justificadas em normas jurídicas, por forma a garantir a objetividade e uniformidade da aplicação dos critérios fixados para avaliação daquelas respostas.
Conforme consta do ponto F) do probatório, a questão em causa tinha a seguinte formulação:
“Pedro, Inspetor Tributário a exercer funções na Direção de Finanças de Coimbra, solicitou, ao Diretor-Geral da AT, a derrogação do sigilo bancário relativamente ao sujeito passivo Construções de Luxo, S.A., bem como aos seus sócios, Manuel Andrade e Joaquim Silva, tendo a mesma sido devidamente autorizada. Face aos factos descritos, indique a afirmação correta:
a) Apenas os dois sócios devem ser notificados da decisão de derrogação do sigilo bancário para efeitos de audição prévia;
b) Não há lugar ao exercício de audição prévia da decisão de derrogação do sigilo bancário;
c) O contribuinte Construções de Luxo, S.A., bem como os seus dois sócios, devem ser notificados da decisão de derrogação do sigilo bancário para efeitos de audição prévia;
d) Nenhuma das afirmações anteriores está correta.”
Como se alvitra na decisão recorrida, está em causa um procedimento de derrogação de sigilo bancário no âmbito de uma ação de inspeção tributária realizada pela AT, pelo que o regime legal aplicável é o que consta do artigo 63.º- B da LGT.
Que, à data, com relevo para o caso, tinha a seguinte redação:
“1 - A administração tributária tem o poder de aceder a todas as informações ou documentos bancários, bem como a informações ou documentos de outras entidades financeiras previstas como tal no artigo 3.º da Lei n.º 25/2008, de 5 de junho, alterado pelos Decretos-Leis n.os 317/2009, de 30 de outubro, e 242/2012, de 7 de novembro, sem dependência do consentimento do titular dos elementos protegidos: (Redação da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro) (…)
2 - A administração tributária tem, ainda, o poder de aceder diretamente aos documentos bancários e aos documentos emitidos por outras entidades financeiras previstas como tal no artigo 3.º da Lei n.º 25/2008, de 5 de junho, nas situações de recusa da sua exibição ou de autorização para a sua consulta, quando se trate de familiares ou terceiros que se encontrem numa relação especial com o contribuinte. (Redação da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro) (…)
4 - As decisões da administração tributária referidas nos números anteriores devem ser fundamentadas com expressa menção dos motivos concretos que as justificam e, salvo o disposto no número seguinte e no n.º 13, notificadas aos interessados no prazo de 30 dias após a sua emissão, sendo da competência do diretor-geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, ou dos seus substitutos legais, sem possibilidade de delegação. (Redação da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro)
5 - Os atos praticados ao abrigo da competência definida no n.º 1 são suscetíveis de recurso judicial com efeito meramente devolutivo e, sem prejuízo do disposto no n.º 13, os atos previstos no n.º 2 dependem da audição prévia do familiar ou terceiro e são suscetíveis de recurso judicial com efeito suspensivo, por parte destes. (Redação da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro)”.
Ora, conforme vem contextualizada a questão formulada, está em causa a derrogação do sigilo bancário relativamente a uma sociedade sujeito passivo, bem como relativamente aos seus sócios.
As duas situações são claramente objeto de estatuições distintas no normativo legal acabado de citar.
No que respeita à sociedade sujeito passivo, o acesso às informações ou documentos bancários é concretizado sem dependência de audiência prévia do titular dos elementos protegidos, conforme resulta da conjugação do n.º 1 e do n.º 5, primeira parte.
Já no que respeita aos sócios, o acesso às informações ou documentos bancários depende de audiência prévia do titular dos elementos protegidos, conforme claramente resulta da conjugação do n.º 2 e do n.º 5, segunda parte.
Com efeito, os administradores e/ou sócios são pessoas distintas da sociedade e como tal necessariamente têm de ser considerados terceiros em relação ao contribuinte que está a ser alvo de inspeção, não obstante a sua relação especial com este (cf. José Maria Fernandes Pires [coord.], Lei Geral Tributária comentada e anotada, 2015, pág. 680, e os acórdãos do STA de 16/02/2005, proc. n.º 1395/04, e de 26/04/2007, proc. n.º 0187/07, disponíveis em www.dgsi.pt,).
Porque assim é, apenas a resposta a) se pode ter como correta, como bem se decidiu na sentença objeto de recurso.

(ii)
Pretende ainda o recorrente que se proceda à correção de vários pontos da avaliação da sua competência comportamental.
Já na análise da primeira questão se avançou que não cabe aos Tribunais proceder à avaliação das prestações dos concorrentes e substituir-se à Administração, atribuindo a classificação que entendem ser a justa, salvo nos casos em que seja flagrante que o júri não procedeu de forma correta na aplicação dos critérios de classificação, tal como entendeu o STA no aresto aí citado.
Ora, nada nos autos permite retirar tal conclusão, pois ficou por demonstrar que as classificações obtidas pelo recorrente padecessem de qualquer erro manifesto ou ostensivamente inadmissível, dos quais resulte a violação dos princípios da atividade administrativa que invocou, como se concluiu na sentença.
Em boa verdade, a presente questão encontrava-se inelutavelmente dependente da resposta à impugnação da decisão da matéria de facto.
Improcedendo esta, naturalmente que improcede a presente questão, uma vez que a factualidade provada não lhe dá qualquer suporte.

(iii)
Invoca ainda o recorrente a violação do princípio da igualdade, ao afastar a aplicação dos artigos 30.º, n.º 3, al. a), 5 e 6, do Decreto-Lei n.º 557/99, de 17 de dezembro, e 12.º, n.º 2, do Regulamento de Estágio.
O artigo 30.º, n.º 3, al. a), 5 e 6, do Decreto-Lei n.º 557/99, com a epígrafe ‘desenvolvimento dos estágios’, tinha a seguinte redação:
3 - Na classificação final dos estagiários serão ponderados os seguintes fatores:
a) Avaliação referida ao interesse e qualidades de desempenho demonstrados durante o estágio; (…)
5 - Os funcionários com a categoria de técnico de administração tributária-adjunto que sejam admitidos ao estágio para ingresso nas categorias do grau 4 serão dispensados da atividade prática, sendo, no entanto, obrigados à frequência do curso, bem como à realização dos testes de conhecimentos realizados durante o estágio e da prova final a efetuar após o mesmo.
6 - Para efeito de classificação final dos funcionários referidos no número anterior, o fator indicado na alínea a) do n.º 3 será substituído pela classificação de serviço referida ao ano anterior ao da conclusão do estágio.”
Já o artigo 12.º, n.º 1, al. a), e n.º 2, do Regulamento de Estágio, aprovado pelo Despacho n.º 1667/2005, de 07/01/2005, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, previa o seguinte:
“1 - A classificação final dos estagiários compete ao júri de estágio e será a resultante da média ponderada das notas obtidas nos seguintes fatores:
a) Avaliação do desempenho obtida nos termos do artigo 9.º (…)
2 - Para efeito de classificação final do estágio dos funcionários com a categoria de técnico de administração tributária-adjunto do grau 2 do GAT, o fator indicado na alínea a) do número anterior é substituído pela classificação de serviço referente ao ano anterior ao da conclusão do estágio.”
O Despacho n.º 1552-A/2017, de 14/02/2017, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, revogou este artigo 12.º, n.º 2, prevendo no respetivo artigo 2.º que produz efeitos a partir do dia 11/02/2017, sendo aplicável aos estágios em vigor nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 17/2017, de 10 de fevereiro.
De acordo com este normativo, “[o]s estagiários que, no âmbito do período experimental em curso à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, não observem os critérios de aprovação previstos no artigo 30.º na redação anterior à conferida pelo presente decreto-lei, são posicionados em último lugar na lista de ordenação final dos candidatos pela ordem da sua classificação, desde que cumpram os critérios de aprovação estabelecidos pela presente alteração.”
Segundo o ponto 2 do Aviso n.º 15564/2012, o concurso em causa rege-se pela Lei de Vínculos, Carreiras e Remunerações (LVCR), aprovada pela Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, pelo Decreto-Lei n.os 204/98, de 11 de julho, e pelo Decreto-Lei n.º 557/99, de 17 de dezembro, ambos aplicáveis nos termos dos artigos 19.º e 20.º do Decreto-Lei n.º 69-A/2009, de 24 de março e pelo Código do Procedimento Administrativo.
Mais se referindo no ponto 11, que o período experimental será realizado de acordo com o regulamento aprovado pelo Despacho n.º 1667/2005, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 17, de 25 de janeiro de 2005, alterado pelo Despacho n.º 15584/2005, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 137, de 19 de julho de 2005.
Vale isto por dizer que, no decurso do estágio, o recorrente viu alterado o critério de classificação de serviço.
À data de início do estágio, o critério era o de lhe ser atribuída a classificação de serviço referente ao ano anterior. No momento da atribuição da classificação pelo júri, esta já decorria da avaliação do próprio estágio.
Trata-se de um caso claro de retroatividade imprópria, ou retrospetividade.
Como se descreve em recente acórdão do Tribunal Constitucional, n.º 751/2020, de 16/12/2020 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt), “a Constituição não proíbe, em geral, que as novas escolhas legislativas - tomadas pelo legislador ordinário no quadro da sua estrutural habilitação para rever opções antes tomadas por outros legisladores históricos - façam repercutir os seus efeitos sobre o passado. Mas, para além disso, não proíbe nem pode proibir genericamente que o legislador recorra a uma ‘técnica’ de modelação da repercussão dos efeitos das suas escolhas em face da variabilidade dos graus de intensidade de que ela pode revestir. Na verdade, a repercussão sobre o passado das novas escolhas legislativas pode assumir uma intensidade forte ou máxima, sempre que a lei nova faça repercutir os seus efeitos sobre factos pretéritos, praticados ao abrigo de lei anterior, redefinindo assim a sua disciplina jurídica. Mas pode também assumir uma intensidade fraca, mínima ou de grau intermédio, sempre que a lei nova, pretendendo embora valer sobre o futuro, redefina a disciplina de relações jurídicas constituídas ao abrigo de um (diverso) Direito anterior. Neste último caso, designa-se este especial grau de repercussão dos efeitos das novas decisões legislativas como sendo de «retroatividade fraca, imprópria ou inautêntica», ou ainda, mais simplesmente, de «retrospetividade». Como quer que seja, e não sendo o recurso por parte do legislador a qualquer uma destas formas de retroação da eficácia dos seus atos genericamente proibida pela Constituição, a convocação legislativa de qualquer uma destas técnicas não deixa de colocar problemas constitucionais, face justamente ao imperativo de segurança jurídica que decorre do princípio do Estado de direito.
É, com efeito, evidente que a repercussão sobre o passado das novas escolhas legislativas, qualquer que seja a forma ou o grau de que se revista, diminui ou fragiliza a faculdade, que os cidadãos de um Estado de direito devem ter, de poder saber com o que contam, nas relações que estabelecem com os órgãos de poder estadual. Precisamente por isso, a Constituição proibiu expressamente o recurso, por parte do legislador, à retroatividade forte, sempre que a medida legislativa que a ela recorre implicar intervenções gravosas na liberdade e (ou) no património das pessoas, assim sucedendo quando estejam em causa restrições a direitos, liberdades e garantias (artigo 18.º, n.º 3), a definição de comportamentos criminalmente puníveis (artigo 29.º, n.º 1), ou a criação de impostos ou definição dos seus elementos essenciais (artigo 103.º, n.º 3)”.
No caso, à data da reformulação do regime aplicável, o direito do autor a ser-lhe atribuída a pretendida classificação encontrava-se em formação, posto que se encontrava ainda por classificar o estágio.
Sendo certo que a atribuição de classificação ao próprio estágio, em detrimento da classificação do serviço anterior, se afigura uma solução mais igualitária e adequada do que a anterior.
O que nos leva a concluir que a retrospetividade imposta não se afigura uma intervenção gravosa, nem constitui, à evidência, qualquer violação do princípio da igualdade.
Em suma, é de negar provimento ao recurso e manter o decidido em primeira instância, com a fundamentação exposta.

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III. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento e manter a decisão recorrida.
Custas a cargo do recorrente.

Lisboa, 23 de setembro de 2021

Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de maio, o relator consigna e atesta que as Juízas Desembargadoras Ana Cristina Lameira e Catarina Vasconcelos têm voto de conformidade com o presente acórdão.
(Pedro Nuno Figueiredo)