Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07766/14
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:10/16/2014
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
DESPACHO DE REVERSÃO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
ERRO NA FORMA DO PROCESSO
CONVOLAÇÃO
CITAÇÃO
Sumário: I - O ora recorrente não veio, através da impugnação deduzida, sindicar qualquer dos actos de liquidação de imposto objecto da execução contra si revertida, antes veio atacar o próprio acto de reversão da execução, com fundamento em factos que, na sua óptica, provocariam a inexigibilidade da dívida tributária em causa ou a sua não responsabilidade pelo pagamento, que se enquadram na oposição à execução fiscal.

II - A convolação, em regra, é obrigatória para o tribunal que constata o erro na forma do processo ou perante o qual é arguido. A excepção é já não poder operar­se por terem decorrido os prazos para propositura da acção que é a própria, como acontece no caso em apreço.

III - O facto de na citação efectuada ao executado por reversão serem indicados como meios de reacção a oposição à execução fiscal e a impugnação judicial não significa de modo algum que ele possa optar sem critério por um daqueles meios processuais mas, ao invés, que lhe estão abertas aquelas duas vias judiciais, que devem ser escolhidas de acordo com a pretensão de tutela judicial a deduzir e os fundamentos que a suportam. Na escolha dos meios processuais de defesa sempre haverá que respeitar o âmbito de cada um deles, pois a cada direito corresponde o meio processual adequado para o fazer valer em juízo.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l - RELATÓRIO


FERNANDO ……………………, não se conformando com o despacho do TAF de Loulé, exarado a fls. 25 a 26 dos autos, que lhe indeferiu liminarmente a petição inicial da impugnação que deduziu contra a Fazenda Pública e na qual peticiona a nulidade do despacho que reverteu contra si a execução fiscal nº …………….. instaurada pelo Serviço de Finanças de ……….., por erro na forma do processo não passível de convolação, veio interpor recurso jurisdicional em cujas alegações formula as seguintes conclusões:

A. O Recorrente deduziu impugnação judicial contra a decisão de reversão, nos termos do art. 99 CPPT como forma de arguir a sua ilegalidade, uma vez que não exerceu quaisquer funções de gerente da devedora principal durante o tempo a que se refere a dívida em execução;


B. Ainda nos termos do art. 99, desta vez alínea d) o Recorrente arguiu a preterição de formalidades legais ao não ter a administração fiscal averiguado da insuficiência de bens do devedor principal antes de decidir a reversão nem ter fundamentado a decisão de reversão com a alegação dessa insuficiência.


C. Ambos os fundamentos estão correctos e são legais quanto a fundamentarem o pedido de impugnação fiscal.


D. A citação para a reversão informa o Recorrente que tem três formas de reagir à reversão (para além da de pagar a dívida): oposição judicial, reclamação graciosa e impugnação judicial.


E. Porém, a sentença ora em recurso declara que há uma e só uma forma de reagir à reversão: a oposição judicial.


F. O que significa que a informação prestada pela Administração Fiscal aos contribuintes sujeitos a reversão fiscal é incorrecta.


G. A incorrecção da informação envolve o cerceamento grave dos direitos dos contribuintes: na verdade, a oposição é muito mais restritiva do que a impugnação fiscal, desde logo no prazo que é reduzido de 90 para 30 dias e nos fundamentos e na prova, que têm que cingir-se aos previstos no art. 204 CPPT.


H. À Administração Pública, no cumprimento do dever de colaboração com os contribuintes compete prestar informação completa e precisa sobre os direitos e obrigações destes.


I. A falta ou o erro na prestação das informações aos contribuintes faz incorrer a administração tributária na obrigação de reparar os efeitos da informação defeituosa.


J. No caso dos autos, a falta de informação correcta sobre a forma processual adequada de arguir os vícios da reversão e sobre o prazo em que essa forma processual correcta deveria ser adoptada deve ter como efeito a aceitação da impugnação judicial com convolação para oposição judicial e deve ainda fazer aceitar a prática da oposição judicial dentro do prazo que, por indução em erro pela Administração, o contribuinte tinha para a dedução da impugnação judicial.


Termos em que deve ser dado provimento ao recurso e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida, substituindo-se a mesma por outra que julgue que o decurso do prazo não é, em concreto, obstáculo à convolação da impugnação judicial em oposição, fazendo-se baixar os autos à primeira instância e seguindo-se os demais termos do processo de oposição judicial.

Não foram apresentadas contra-alegações.


O Ministério Público, junto deste Tribunal, emitiu douto parecer no sentido da decisão recorrida não merecer censura, pelo que se deve negar provimento ao recurso (cfr. fls. 63 a 65 dos autos).

Colhidos os Vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

II.1. De Facto

O despacho recorrido, embora sem proceder à sua especificação separada, considerou provada a seguinte a matéria de facto:


A) Corre termos no Serviço de Finanças de Albufeira a execução nº …………., instaurada para cobrança da quantia de € 1.634,32;

B) Na execução referida na alínea anterior foi citado, em 05.08.2013, como executado por reversão, Fernando …………………… (cfr. fls. 21 e 22 dos autos);

C) Consta da nota de citação, além do mais, o seguinte (cfr. fls. 21 dos autos):

"Mais fica citado de que, no mesmo prazo [30 dias] poderá (…) deduzir OPOSIÇÃO JUDICIAL com base· nos fundamentos prescritos no artigo 204º do CPPT.

Informa-se ainda que, nos termos do nº 4 do artigo 22º da LGT, a contar da data da citação, poderá apresentar RECLAMAÇÃO GRACIOSA ou deduzir IMPUGNAÇÃO JUDICIAL, com base nos fundamentos previstos no artigo 99º do CPPT, e os prazos estabelecidos nos artigos 70º e 102º do CPPT".

D) A petição inicial deu entrada no Serviço de Finanças de Albufeira em 04.11.2013, conforme carimbo aposto a fls. 3 dos autos.

II.2. De Direito

Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remate a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 639°, n°1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, o objecto do mesmo está circunscrito à questão de saber se o Tribunal a quo errou quando indeferiu liminarmente a impugnação por erro na forma do processo e não procedeu à convolação da mesma para a forma processual conveniente.

Vejamos.

O recorrente termina a petição inicial pedindo que seja "julgada procedente a presente impugnação judicial, declarando-se nula a reversão e fazendo cessar a execução fiscal contra o impugnante".

Como fundamento dessa pretendida nulidade invoca a falta de fundamentação da reversão, por não discriminar as diligências que foram feitas e que permitem afirmar que ao devedor principal não são conhecidos outros bens.

E também alega que não é responsável subsidiário, para efeitos de qualquer das alíneas do nº 1 do art. 24º da LGT.

O despacho recorrido indeferiu liminarmente a impugnação atendendo que para a pretensão que o Impugnante pretende fazer valer em tribunal, o meio adequado seria a Oposição, pois não toca na relação jurídica tributária conformada pela liquidação exequenda. Os mencionados argumentos invocados na Impugnação são direccionados ao processo de execução, visando impedir que seja chamado a esse processo através da reversão. O meio processual adequado para contestar a ilegalidade do despacho de reversão é a Oposição, atento o disposto nos artigos 204° al b) da LGT.

Mais foi decidido que, no caso dos autos, o aproveitamento da petição não é possível porque a oposição seria extemporânea.


Sustenta o recorrente que deduziu fundamentos da impugnação, ao alegar que não exerceu quaisquer funções de gerente e ocorreu preterição de formalidades legais por falta de indicação das diligências de averiguação da insuficiência de bens do devedor principal antes da reversão e por esta não estar fundamentada.
E diz, que "ambos os fundamentos estão correctos e são legais quanto a fundamentarem o pedido de impugnação fiscal".

Não tem razão o recorrente.
Isto é, não são efectivamente correctos porque tais fundamentos são privativos do processo de oposição, regulado nos artigos 203º e sgs. do CPPT.
De facto, como bem notou o tribunal a quo, há erro na forma de processo.

Como resulta do preceituado no art. 97º, nº 1, do CPPT, o processo de impugnação é adequado a impugnar os actos indicados nas alíneas a) a g) do mesmo número, em que se inclui expressamente a palavra «impugnação», entre as quais não se inclui o acto que decide a reversão da execução fiscal.
Como também resulta do mesmo art. 97º, nº 1, do CPPT, o ataque contencioso a actos praticados no processo de execução fiscal faz-se através de meios especiais, designadamente o recurso no próprio processo de execução e a oposição à execução fiscal, referidos nas suas alíneas n) e o).
Sendo a reversão da execução fiscal decidida no processo de execução fiscal (arts. 23º, nº 1, da LGT e 153° a 161° do CPPT), os meios que se podem considerar adequados serão os referidos naquelas alíneas n) e o), próprios para reacção dos interessados contra actos praticados em processo de execução.

Sucede, contudo, que o ora recorrente não veio, através da impugnação deduzida, sindicar qualquer dos actos de liquidação de imposto objecto da execução contra si revertida, antes veio atacar o próprio acto de reversão da execução, com fundamento em factos que, na sua óptica, provocariam a inexigibilidade da dívida tributária em causa ou a sua não responsabilidade pelo pagamento, que se enquadram na oposição à execução fiscal.

Ora, a impugnação deduzida pelo responsável subsidiário há-de incidir sobre ilegalidades do próprio acto de liquidação que gerou a dívida que lhe é imputada, e não sobre eventuais e posteriores vícios do procedimento de reversão (cfr. acordão do STA de 02-05-2012, proc. nº 0300/12).

No entendimento de doutrina qualificada e jurisprudência consolidada o meio processual adequado para a discussão da legalidade do acto de reversão (no caso concreto com fundamento na inexistência dos pressupostos substantivos da responsabilidade subsidiária) é a oposição à execução fiscal, nunca a impugnação judicial (Cfr. Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado, 5ª edição, Volume II, p. 355 e, entre muitos outros, os acórdãos do STA de 29-06-2005 processo nº 501/05; de 08-03-2006 processo nº 1249/05; de 04-06-2008 processo nº 76/08; de 25-06-2008 processo nº 123/08; de 19-11-2008 processo nº 711/08; de 27-05-2009 processo nº 448/09 e de 28-10-2009 processo nº 578/09, de 20-01-2010 processo nº 0989/09 e de 11-09-2013 processo nº 0669/13)·

A convolação, em regra, é obrigatória para o tribunal que constata o erro na forma do processo ou perante o qual é arguido. A excepção é já não poder operar­se por terem decorrido os prazos para propositura da acção que é a própria, como acontece no caso em apreço.

Concluindo, verifica-se de facto erro na forma do processo, sendo a "convolação" da impugnação em oposição à execução fiscal impedida pelo decurso do tempo, uma vez que quando a p.i. deu entrada no órgão de execução fiscal em 04/11/2013, já haviam decorrido mais de 30 dias desde a data da citação (cfr. art. 203º, nº1, alínea a) do CPPT) que ocorreu em 05/08/2013, sendo certo que o processo não pode prosseguir como impugnação por a causa de pedir e o pedido não estarem talhados para tal.

Uma nota final sobre o reparo que o recorrente faz de que a Administração Fiscal lhe prestou uma informação incorrecta ao indicar-lhe na citação várias formas de reacção possíveis à reversão, designadamente, a impugnação judicial. Como narra, entre outros, o acórdão do STA de 27-06-2012, proc. nº 0508/12, o facto de na citação efectuada ao executado por reversão serem indicados como meios de reacção a oposição à execução fiscal e a impugnação judicial não significa de modo algum que ele possa optar sem critério por um daqueles meios processuais mas, ao invés, que lhe estão abertas aquelas duas vias judiciais, que devem ser escolhidas de acordo com a pretensão de tutela judicial a deduzir e os fundamentos que a suportam. Na escolha dos meios processuais de defesa sempre haverá que respeitar o âmbito de cada um deles, pois a cada direito corresponde o meio processual adequado para o fazer valer em juízo.
Pelo que não pode ser imputado ao tribunal a quo uma deficiente interpretação da passagem da nota de citação acima transcrita (alínea C) do probatório), que no entender do recorrente lhe cerceia os seus direitos e envolve uma incorrecta informação.
Tal não corresponde à realidade, pois o que a passagem em causa revela é que o recorrente a leu em diagonal, sem intermediação dos normativos na mesma referidos, pois uma leitura atenta destes impediria que afirmasse que a citação lhe abriu três alternativas possíveis a escolher à sua vontade. Com efeito, as três alternativas processuais são possíveis mas têm de ser utilizadas de harmonia com a causa de pedir e o pedido que sejam adequados a cada uma.

Bem andou, pois, o Tribunal a quo ao indeferir liminarmente a impugnação.


III – DECISÃO

Termos em que, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, negar provimento ao recurso e confirmar integralmente a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.

Registe e notifique.


Lisboa, 16 de Outubro de 2014

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[Lurdes Toscano]
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[Joaquim Condesso]
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[Catarina Almeida e Sousa]