Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 221/11.0BELRS |
![]() | ![]() |
Secção: | CT |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 02/02/2023 |
![]() | ![]() |
Relator: | TÂNIA MEIRELES DA CUNHA |
![]() | ![]() |
Descritores: | FALTA DE NOTIFICAÇÃO INEXIGIBILIDADE DA DÍVIDA |
![]() | ![]() |
Sumário: | I - A falta de notificação da liquidação que dará origem à dívida exequenda é fundamento de oposição à execução fiscal, comportando a inexigibilidade da dívida exequenda por ineficácia do ato. II - Os elementos constantes do sistema informático interno da AT, isoladamente considerados, não são suficientes para efeitos de prova da efetivação da notificação, dado ser fundamental a existência de um elemento de origem externa que prove a expedição. III - As liquidações oficiosas de IVA consubstanciam um ato suscetível de alterar a situação tributária dos contribuintes, pelo que, inexistindo participação do sujeito passivo no procedimento, a respetiva notificação deve ser feita através de carta registada com aviso de receção. |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | I. RELATÓRIO
A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio recorrer da sentença proferida a 06.04.2019, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a oposição apresentada por F… (doravante Recorrido ou Oponente), ao processo de execução fiscal (PEF) n.º 3247200601118625 e apensos, que o Serviço de Finanças (SF) de Lisboa 2 lhe moveu, por reversão de dívidas de imposto sobre o valor acrescentado (IVA), dos anos compreendidos entre 2002 e 2006, da devedora originária F…, Lda. O recurso foi admitido. Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “A. Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença que julgou procedente a Oposição Judicial apresentada nos termos do disposto na alínea i) do art. 204.º e seguintes do CPPT, por considerar que ocorreu falta de notificação das liquidações de IVA referentes aos anos de 2002 a 2006, inclusive, dentro do prazo de caducidade do direito à liquidação. B. Com o devido respeito e salvo melhor opinião, a Fazenda Pública entende que foram incorrectamente julgados os pontos de facto que constam dos artigos 25.º, 26.º e 27.º da contestação apresentada nos autos pela Fazenda Pública. C. Do teor dos documentos que se encontram a fls. 22 a 35 dos autos, resulta demonstrado que a sociedade comercial com a designação “F… Lda.” (doravante, F…), com o NIPC 5…….. foi constituída através de pacto social celebrado em 09/11/1993, tendo como sede a morada “Rua do A….., n.º 2…..”, em Lisboa, morada que não foi alterada até à data em que foi registado na Conservatória do Registo Comercial o encerramento da liquidação e o cancelamento da matrícula (Insc. 2 - Ap. 121/20081205 e Insc. 3 – Of. 20081205 da Certidão Permanente). D. Do teor dos documentos que se encontram a fls. 36 dos autos, resulta demonstrado que a sociedade F… teve como domicílio fiscal, durante o tempo de actividade para efeitos de IRC e de IVA, a morada da sua sede. E. Do teor dos documentos que se encontram a fls. 69 a 71 dos autos, resulta demonstrado que foram emitidas em nome da sociedade F… as liquidações de IVA n.ºs 06148944, 06327707 e 07176876, referentes aos períodos de tributação de 2004, 2005 e 2006, respectivamente. F. Do teor dos documentos que se encontram a fls. 69 a 71 dos autos, resulta demonstrado que as referidas liquidações de IVA n.ºs 06148944, 06327707 e 07176876 foram remetidas para o domicílio fiscal da sociedade F… através de correio postal registado a que foi atribuído os números de registo dos CTT 918712669, 920728693 e 924885836, respectivamente. G. Do teor dos documentos que se encontram a fls. 69 a 71 dos autos, resulta demonstrado que as notificações expedidas com os n.ºs de registo dos CTT 918712669, 920728693 e 924885836 foram efectivamente notificadas à sociedade F… em 17/07/2006, 16/11/2006 e 21/06/2007, respectivamente. H. Com o devido respeito por melhor opinião, e contrariamente ao que considera a douta Sentença proferida, a Fazenda Pública perfilha o entendimento que vem sendo adoptado pela Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, que tem vindo a aceitar os dados constantes do sistema informático da Autoridade Tributária como elementos de prova idóneos para efeitos de demonstrar que as notificações efectuadas pela Autoridade Tributária foram enviadas aos sujeitos passivos em questão, e, por consequência, para fazer funcionar a presunção ínsita na norma do n.º 1 do art. 39.º do CPPT (vide Arestos do STA proferidos em 11/03/2015, no âmbito do processo n.º 01181/13, em 16/05/2012, no âmbito do proc. 01181/11; em 01/10/2014, no âmbito dos procs. n.ºs 0603/13 e 01450/13 e em 11/03/2015, no âmbito do proc. n.º 04/14 e em 05/11/2014, no âmbito dos procs. n.ºs 0609/13, todos disponíveis em www.dgsi.pt). I. Assim, aplicando o critério do n.º 2 do art. 364.º do Código Civil, deve considerar-se o recibo de registo da carta como uma formalidade simplesmente probatória ou “ad probationem”, cuja falta pode ser substituída por outros meios de prova. J. Por conseguinte, deverão ser aditados à matéria de facto dada como provada, por se encontrarem demonstrados com base no teor dos documentos que se encontram a fls. 22 a 36 e 69 a 71 dos autos, os seguintes factos: a. a sociedade comercial com a designação “F… Lda.”, com o NIPC 5……. foi constituída através de pacto social celebrado em 09/11/1993, tendo como sede a morada “Rua do A…, n.º 2…..”, em Lisboa, morada que não foi alterada até à data em que foi registado na Conservatória do Registo Comercial o encerramento da liquidação e o cancelamento da matrícula e que corresponde ao seu domicílio fiscal; b. foram emitidas em nome da sociedade F… as liquidações de IVA n.ºs 06148944, 06327707 e 07176876, referentes aos períodos de tributação de 2004, 2005 e 2006, respectivamente; c. as referidas liquidações de IVA n.ºs 06148944, 06327707 e 07176876 foram remetidas para o domicílio fiscal da sociedade F… através de correio postal registado a que foi atribuído os números de registo dos CTT 918712669, 920728693 e 924885836, respectivamente; d. as notificações expedidas com os n.ºs de registo dos CTT 918712669, 920728693 e 924885836 foram efectivamente notificadas à sociedade F… em 17/07/2006, 16/11/2006 e 21/06/2007, respectivamente. K. A convicção expressa pelo Ilustre Tribunal “a quo” nos pontos b., c. e d. da matéria de facto julgada não provada na douta Sentença proferida ignora o valor probatório dos meios de prova juntos aos autos de primeira instância, sendo que as provas produzidas nos autos de primeira instância a que supra aludimos são suficientes para infirmarem a conclusão diversa da de considerar como não provado que as notificações das liquidações de IVA referentes aos períodos de tributação de 2002 a 2006, inclusive, foram efectuadas nas datas constantes dos referidos meios de prova. L. No que concerne à matéria de direito, com o devido respeito que nos merece a douta Sentença proferida, que é muito, a mesma padece de erro de julgamento da matéria de direito, por violação das disposições legais dos n.ºs do n.º 3 do art. 38.º do CPPT, n.º 1 do art. 39.º do CPPT, n.º 1 e 2 do art. 41.º do CPPT, n.º 1 do art. 36.º do CPPT, n.º 1 do art. 19.º da LGT, n.ºs 1 e 6 do art. 45.º da LGT, n.º 6 do art. 77.º da LGT, n.º 1 do art. 74.º da LGT, n.º 1 do art. 342.º do Código Civil, n.º 1 do art. 344.º do Código Civil, n.ºs 1 e 2 do art. 350.º do Código Civil. M. Com efeito, e contrariamente ao que entende o Ilustre Tribunal “a quo”, o sistema informático da Autoridade Tributária constitui um sistema testado e devidamente auditado pela Inspecção-Geral de Finanças, que foi concebido para integrar (e integra) informação proveniente de diversos organismos públicos e privados, tais como as Conservatórias de Registo Civil, Predial, Comercial e Automóvel, bem como de Notários, Tribunais, inclusivamente também dos CTT Correios de Portugal. N. Não é possível aos órgãos e agentes da Autoridade Tributária, sob pena de grave violação dos direitos liberdades e garantias dos contribuintes, manipular informação que é introduzida directamente por entidades externas, pelo que a informação vertida nos documentos extraídos partir do sistema informático da Autoridade Tributária é rigorosa, sendo a forma pela qual a mesma é obtida fiável, testada e auditada. O. A Secção de Contencioso Tributário do STA tem entendido que os recibos de apresentação e de entrega da carta não são os únicos meio de prova de que a mesma foi expedida sob registo, admitindo-se que os prints obtidos a partir do sistema informático da Autoridade Tributária são documentos idóneos para provar que o registo foi feito. P. Trazemos à colação, meramente a título de exemplo, os Arestos proferidos pelo STA em 11/03/2015, no âmbito do processo n.º 01181/13, em 16/05/2012, no âmbito do proc. 01181/11; em 01/10/2014, no âmbito dos procs. n.ºs 0603/13 e 01450/13 e em 11/03/2015, no âmbito do proc. n.º 04/14 e em 05/11/2014, no âmbito dos procs. n.ºs 0609/13, todos disponíveis em www.dgsi.pt. Q. Os documentos que se encontram juntos aos autos de primeira instância, a fls. 69 a 71, demonstram com segurança que a sociedade F…, teve conhecimento da liquidação de imposto, provando-se que as notificações dos actos de liquidação em questão foram dirigidas à referida sociedade, remetidas por correio postal registado e recebidas na sua sede, que corresponde ao seu domicílio fiscal, o que conduz ao funcionamento da presunção ínsita no n.º 1 do art. 39.º do CPPT. R. Com efeito, a administração tributária tem o ónus de demonstrar que efectuou a notificação de forma correcta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais, sendo certo que, fazendo-o, passa a incumbir ao destinatário da notificação o ónus de provar que, na situação concreta, a recebeu posteriormente ou que nunca a recebeu. (vide n.º 1 do art. 342.º, n.º 1 do art. 344.º e n.ºs 1 e 2 do art. 350.º, todos do Código Civil). S. Ora, dos autos de primeira instância não resulta demonstrado pela Oponente, ora recorrida, que a sociedade F… não tenha recebido, conforme alega, as supra mencionadas notificações, o que, considerando as disposições legais supra mencionadas, terá, necessariamente, como consequência que se inverta por completo a solução adoptada no caso concreto. T. Por outro lado, é importante não olvidar que as notificações efectuadas, ainda que não possam ser considerada válidas nem regulares por eventual omissão de formalidades legais , são, no entanto, eficazes, por terem chegado ao conhecimento do interessado, conforme, in casu, se demonstrou nos autos de primeira instância, pelo que produziram efeitos, designadamente a título de interpelação para pagamento de imposto e para obstar ao decurso do prazo de caducidade do direito à liquidação dos actos notificandos. U. A teoria das formalidades não essenciais é uma decorrência do princípio do aproveitamento dos actos, defendendo que quando uma formalidade não é realizada mas o objectivo material foi atingido, essa formalidade transforma-se em formalidade não essencial, sendo o acto apenas irregular. V. Por outro lado, a douta Sentença deveria ter tido em consideração que a doutrina e jurisprudência têm vindo a entender que o n.º 6 do art. 45.º da LGT consagra uma presunção inilidível para efeitos de contagem do prazo de caducidade do direito à liquidação. (vide DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 5 ao art. 45.º, pág. 359.»). W. Neste sentido, trazemos à colação o seguinte Aresto do STA proferido em 29-10-2014 no âmbito do processo n.º 0726/11, cujo entendimento subscrevemos na íntegra. X. Pelo supra exposto, resulta demonstrado nos autos que não só os actos tributários de liquidação de IVA referentes aos períodos de tributação de 2004, 2005 e 2006 foram efectuados pelos serviços da Autoridade Tributária dentro do prazo geral de quatro anos estabelecido no art. 45.º da LGT, como também foram notificadas à F… dentro do referido prazo, tendo, portanto, nos termos do disposto no n.º 6 do art. 77.º da LGT e do n.º 1 do art. 36.º do CPPT, produzido efeitos em relação aquela sociedade, enquanto sujeito passivo da relação jurídica tributária. Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e acostumada JUSTIÇA!”. O Recorrido apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: “1. É ostensivo que as liquidações de imposto que suportam a dívida exequenda cuja cobrança coerciva é promovida contra o Recorrido nos autos de execução no âmbito dos quais foi deduzida a presente oposição não foram, nem àquele, nem à devedora originária, notificadas. 2. Se evidência documental existe nos autos de que as ditas liquidações foram a determinada altura emitidas pela Autoridade Tributária, semelhante evidência inexiste no que respeita à concretização da sua recepção pela destinatária originária e, nem tampouco, pelo próprio Recorrido. 3. Inexiste nos autos prova de que essas liquidações tenham sido objecto de notificação concretizada de acordo com o disposto no art.º 38.º n.º 1 do CPPT que dispõe que as notificações, incluindo a de liquidações de tributos que não resultem de declarações dos contribuintes ou de correcções à matéria tributável que tenham sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição, são efectuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de recepção. 4. A sobredita notificação há que ser um acto individual, regido pelo princípio da recepção, pois que o direito à notificação do acto administrativo não é apenas o direito de aceder a uma informação que é posta à disposição do interessado, que a pode procurar, mas o direito à recepção do acto na esfera da perceptibilidade normal do destinatário. 5. Semelhante desiderato só será alcançado se os procedimentos de notificação garantirem essa cognoscibilidade, motivo pelo qual a Lei reclama o uso da carta registada com aviso de recepção, pois só esta oferece essas garantias. 6. Doutro passo, competindo à administração tributária o ónus de demonstrar que efectuou a notificação de forma correcta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais, na ausência dessa demonstração e não se comprovando que o oponente tomou conhecimento dos actos notificados - no caso, liquidações que deram origem à dívida exequenda é de julgar procedente a oposição à execução fiscal deduzida com fundamento em inexigibilidade por falta de notificação. 7. Em face de todo o exposto, o Tribunal a quo, tendo feito uma correcta interpretação dos factos, acrescente-se, dos únicos factos nos autos demonstrados e provados pela Autoridade Tributária a quem competia o ónus da prova, simplesmente aplicou o Direito que aos mesmos corresponde, designadamente, o disposto no art.9 38.º n.º 1 do CPPT, mostrando-se, por conseguinte, a sentença sindicada totalmente acertada e, assim, não merecedora de censura alguma, pelo que a mesma deverá ser confirmada e manter-se inalterada, com a consequente improcedência do infundado recurso, o que se requer seja decidido, com todas as devidas e legais consequências. Pelo exposto e pelo mais que for suprido pelos Srs. Juízes Desembargadores, deve o interposto recurso ser julgado improcedente, com a consequente manutenção da decisão recorrida, fazendo-se, desse modo, a devida JUSTIÇA!”. Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 288.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser concedido provimento ao recurso. Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT), vem o processo à conferência.
São as seguintes as questões a decidir: a) A decisão recorrida padece de erro de julgamento da matéria de facto? b) A sentença recorrida incorre em erro de julgamento da matéria de direito, dado terem sido notificadas à devedora originária as liquidações em causa? c) Verifica-se erro de julgamento, na medida em que as notificações chegaram ao conhecimento do interessado, pelo que são eficazes? d) Há erro de julgamento, por não ter sido considerado o disposto no art.º 45.º, n.º 6, da Lei Geral Tributária (LGT)?
II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “1. Em 01/09/2006 foi instaurado sobre a sociedade F…, Lda., o processo de execução fiscal n.º 3247200601118625, para a cobrança de dívidas de IVA relativas aos anos de 2002 e 2003, que correu termos no Serviço de Finanças de Lisboa – 2 – cfr. fls. 16 a 18 dos presentes autos. 2. Ao processo de execução fiscal referido em 1. foram apensos os processos de execução fiscal n.ºs 3247200701009699, 3247200701075454 e 3247200801008587, através dos quais se pretendia a cobrança de dívidas de IVA referentes aos anos de 2004, 2005 e 2006, respectivamente – cfr. fls. 43 e 44 dos presentes autos. 3. Após a referida apensação referida em 2., o montante de dívida exequenda cifrou-se em 7.482,00€ - cfr. fls. 43 e 44 dos presentes autos. 4. Em 01/09/2010 foi elaborado Auto de Diligências com o seguinte conteúdo: “Aos 01 de Setembro de 2010, eu, L…, Técnico de Administração Tributária, do Quadro da Direcção Geral dos Impostos, em funções no Serviço de Finanças de Lisboa 2, a fim de prosseguir a tramitação do processo executivo acima referenciado, verifiquei o seguinte: 1- Pesquisando todos os sistemas informáticos existentes, nomeadamente consulta ao sistema informático para averiguação de existência de bens, não foram encontrados quaisquer bens;… 2- 2- Os pedidos de penhoras efectuados pelo sistema do sipa encontram-se concluídos; com respostas das entidades bancárias negativas dizendo que (não são clientes)…” – cfr. fls. 42 dos presentes autos. 3- Em 01/10/2010 foi elaborado pelo órgão da execução fiscal projecto de despacho de reversão com o seguinte conteúdo: “1 - A sociedade, matriculada sob o n° 4………, na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, iniciou a sua actividade em 1994-04-15, para efeitos fiscais e para o exercício da actividade de indústria de construção civil e obras públicas e particulares, bem como a aquisições de prédios para revenda, urbanização de terrenos próprios, construção de prédios para venda e sua comercialização, CAE Principal: 42990-R3, CAE Secundário: 68100-R3 passando por tal facto a ser sujeito passivo do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), e Sujeito passivo do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), tendo sido cessada oficiosamente a actividade em 2006-12-31, para efeitos de IVA e IRC, e em 2008-12- 05 pela apresentação 121/20081205, foi registada na CRC a dissolução, encerramento da liquidação e cancelamento da matricula. 2 - A sociedade cumpriu com as obrigações declarativas para efeitos fiscais, nomeadamente com as declarações periódicas de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) até ao período 0106T, não tendo desde esse período até á presente data, efectuado qualquer entrega de declaração. No que diz respeito ás Modelos 22 do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, verificou-se a sua entrega até ao ano 2000. 3- Após as diligências efectuadas, nomeadamente consulta ao sistema informático para averiguação de existência de bens, não foram encontrados activos penhoráveis, conforme consta em print’s do sistema informático em anexo, sendo que o valor total da dívida da referida firma ascende nesta data à quantia de € 7.482,00, aos quais acrescem juros e custas. 4- Segundo a informação constante da certidão permanente da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, é/foi gerente: «Imagem no original» 5 - No presente processo são exigidas as seguintes dívidas… FUNDAMENTAÇÃO - A inexistência/insuficiência do património da executada para solver a dívida, pelo que nos termos do artigo 23.º nº 2 e art.º 24° n° 1 ai) b) da LGT e artigo 153.°,n° 2, 159° e 160° do C.P.P.T., devem ser chamados à execução os responsáveis subsidiários. Atendendo ao decurso do seu mandato, à data do facto gerador do imposto, como ao tempo da liquidação e/ou cobrança da divida, foi(ram) identificado(s) como gerente(s) o(s) acima identificado(s), responsável(is) subsidiário(s) pelo pagamento da divida tributária infra indicada. Quanto às coimas é aplicável o disposto na ai. b) do n° 1 do art° 8° do RGIT, por notificada a decisão definitiva durante o período do seu cargo e sendo-lhes imputável a falta de pagamento, de que é virtual responsável o gerente: 2 - A Certidão permanente consultada em 01-10-2010, de teor da matricula da sociedade executada e emitida pela Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, que demonstra a responsabilidade de gerência de direito. Demonstrada a gerência de direito é de presumir a gerência de facto por a ausência desta apenas poder advir da inércia ou falta de vontade do agente e de uma violação dos seus deveres para com a sociedade. Expressando o gerente a vontade da sociedade (artigos 248.°, 249.° e 250 ° do Código Comercial; artigos 26.°, 29.°, 30.° e 31.° da Lei das Sociedades por Quotas; e artigos 262. o, 259.° 260 ° e 261° do Código das Sociedades Comerciais) é licito que seja responsabilizado pelo incumprimento das obrigações públicas da sociedade, pois esta age através dele. Face ao exposto, deve ser chamado à execução de que é virtual responsável os gerentes, pelo que proponho, para decisão superior, que se iniciem as diligências necessárias com vista ã reversão da dívida constante da presente execução contra o contribuinte; F…, NIF: 1………., com domicílio fiscal…” – cfr. fls. 43 e 44 dos presentes autos. 5. O projecto de reversão obteve, em 01/10/2010, seguinte despacho por parte da Chefe de Finanças do órgão da execução fiscal: “Concordo com a informação supra. Proceda-se em conformidade. Notifique-se para o exercício do direito de audição previsto no artigo 60º da Lei Geral Tributária…” – cfr. fls. 45 dos presentes autos. 6. Em 02/10/2010 foi elaborada notificação para o Opoente exercer o direito de audição prévia relativamente ao projecto de reversão referido em 4. e 5. – cfr. fls. 108 dos presentes autos. 7. A notificação referida em 6. no campo dedicado ao objecto e função da notificação dispunha nos seguintes termos: “…Pela presente fica ciente de que, por despacho dc 01/10/2010. determinei a preparação do processo para efeitos de reversão da(s) exccução(ões) fiscal(ais) infra indicada(s) contra V. Ex.\ na qualidade de Responsável Subsidiário. Face ao disposto nos normativos do nº 4 do Art.* 23° e Art.º 60° da Lei Geral Tributária, fica noüficado(a} para, no prazo de 10 dias a contar da presente notificação, exercer o direito de audição prévia para efeitos de avaliação da prossecução ou não da reversão contra V. Ex.ª. O direito dc audição tem por objecto as dividas exigidas no(s) processo(s) abaixo(s) discriminado(s) e deverá ser exercido no prazo acima indicado, e findo este ficará o respectivo direito precludido…” – cfr. fls. 108 dos presentes autos. 8. A notificação referida em 6. no campo dedicado ao projecto da reversão dispunha nos seguintes termos: “…Inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do beneficio da excussão (art° 23°/n.° 2 da LGT): Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções dc administração ou gestão cm pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo (art.º 24ºnº 1/b) LGT)…” – cfr. fls. 108 dos presentes autos. 9. A notificação referida em 6. foi também remetida com a menção “Junto cópia do projecto de reversão”, tendo tal despacho sido enviado ao Opoente junto com a notificação referida em 6. – cfr. fls. 108 a 112 dos presentes autos. 10. A notificação referida em 6. foi remetida ao Opoente via postal e sob registo, sendo o número do registo o “RM 00608180 7 PT” – cfr. fls. 108 dos presentes autos. 11. No serviço de pesquisa de remessas do serviço postal, concretamente os CTT, consta que a notificação referida em 6. foi entregue em 07/10/2010 .cfr. fls. 113 dos presentes autos. 12. Em 2210/2010 foi elaborado despacho de reversão sobre o Opoente com o seguinte conteúdo: “…Vem o presente processo em conclusão, com a informação de que a executada não possui bens para solver a divida. Prova-se nos autos, conforme certidão da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, que nos períodos a que respeitam as dívidas e/ou naqueles em que foram exigíveis, foram sócios gerentes F… e J… A presente execução fiscal refere-se a dividas de IVA, dos anos de 2006 e 2007, sendo a quantia exequenda em dívida de C 7.482.00 (sete mil quatrocentos e oitenta e dois euros).Os gerentes acima identificados foram validamente notificados para exercer o respectivo direito de audição, em 2010-10-07, (segundo informação recolhida através do site CTT, pesquisa de objectos) em anexo aos autos. Até 2010-10-18. data em que terminou o prazo para o exercício daquele direito, o mesmo não foi efectuado pelo sócio-gerente F…. Foi sim exercido o direito de audição pela sócia - gerente J… que apesar de o ter exercido, não juntou nenhum novo elemento aos autos. O artigo 24.° da Lei Geral Tributária (LGT), impõe a responsabilidade dos gerentes das empresas e sociedades de responsabilidade limitada, disposição esta aplicável ao tempo do nascimento da dívida e também ao tempo da obrigação do pagamento. Tal responsabilidade é uma responsabilidade ex lege cujos pressupostos assentam na gerência de direito e de facto. A gerência de direito encontra-se demonstrada, conforme informação não certificada da Conservatória do Registo Comercial de Lisboa junta aos autos. Quanto à gerência de facto, a mesma é de presumir conforme elementos junto aos autos e por a ausência desta apenas poder advir da inércia ou falta de vontade do agente e de uma violação dos seus deveres para com a sociedade, uma vez que. expressando o gerente a vontade da sociedade (artigos 252.°, 259 °, 260.°, 261 ° e 270 ° - G. do Código das Sociedades Comerciais) é licito que seja responsabilizado pelo incumprimento das obrigações públicas da sociedade, pois esta age através dele. A prova de que a gerência de facto não foi exercida (LGT, artigo 24.°. n.° 1, a)) e de que o património da pessoa coiectiva se tomou insuficiente para pagamento das dívidas (LGT, artigo 24.°, n.° 1, b)) terá de ser apreciada e decidida em sede de oposição judicial. Assim sendo, e ao abrigo do que se estabelece nos artigos 22.°, 23 ° e 24.° da LGT, artigos 153.° e 160 0 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) e nos precisos termos da alínea b), n 0 1. artigo 24.°, também da LGT, reverto a execução contra os aludidos gerentes, que passam a responder individualmente, pelo valor de € 7.482,00 (sete mil quatrocentos e oitenta e dois euros), conforme certidões de divida que se juntam e passam a fazer parte integrante deste projecto de decisão. Se o responsável pagar a dívida no prazo para a oposição não lhe serão exigidos juros de mora nem custas da execução, valendo a citação como notificação. Deverá ficar ciente de que se o pagamento não for efectuado dentro do prazo para a oposição ou decair em oposição deduzida, além das custas a que der causa, suportará as que forem devidas pela sociedade originariamente devedora e a execução prosseguirá os termos legais, designadamente para penhora de bens e mais diligências previstas na Lei. Proceda-se à citação pessoal dos responsáveis acima identificados, nos termos do artigo 190.° do CPPT, para. querendo, no prazo de cento e vinte dias a contar da citação deduzir reclamação ou. no prazo de noventa dias a contar da citação, deduzir impugnação judicial contra a liquidação, com vista á sua anulação total ou parcial, no caso de a considerar ilegal, conforme estabelecido na alínea c) do n.° 1 do artigo 102.° do CPPT e artigo 22.°, n.° 4 da LGT ou, no prazo de trinta dias a contar da citação, requerer pagamento em prestações, nos termos do artigo 196.° do CPPT e/ou dação em pagamento no termos do artigo 201.° do CPPT ou deduzir oposição judicial, com base nos fundamentos previstos no artigo 204 ° do CPPT…” . cfr. fls. 56 e 57 dos presentes autos. 13. Em 22/10/2010 foi elabora a citação por reversão do Opoente para o processo de execução fiscal referido em 1. – cfr. fls. 114 e 115 dos presentes autos. 14. A citação referida em 13., no campo dedicado ao objecto e função do mandado de citação, afirmava os seguintes termos: “…Pelo presente fica citado(a) de que é EXECUTADO(A) POR REVERSÃO, nos termos do artigo 160" do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), na qualidade de Responsável Subsidiário para, no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, PAGAR a quantia exequenda de 7.482.00 EUR de que era devedora) o(a) executado(a) infra indicado(a), ficando ciente de que nos termos do n.° 5 do artigo 23* da Lei Geral Tributária (LGT). se o pagamento se verificar no prazo acima referido não lhe serão exigidos juros de mora nem custas. Mais, fica CITADO de que, no mesmo prazo, poderá requerer o PAGAMENTO EM PRESTAÇÕES, nos termos do artigo 196a do CPPT, c/ou a DAÇÃO EM PAGAMENTO, nos termos do artigo 201° do mesmo código, ou então deduzir OPOSIÇÃO JUDICIAL com base nos fundamentos prescritos no artigo 204° do CPPT. Informa-se ainda que. nos termos do n° 4 do artigo 22" da LGT, a contar da data da citação, poderá apresentar RECL AMAÇÃO GRACIOSA ou deduzir IMPUGNAÇÃO JUDICIAL, com base nos fundamentos previstos no artigo 99° do CPPT, e os prazos estabelecidos nos artigos 70" c 102” do CPPT…” – cfr. fls. 114 e 115 dos presentes autos. 15. A citação referida em 13., no campo dedicado aos fundamentos da reversão, afirmava os seguintes termos: “…Inexistência ou insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e responsáveis solidários, sem prejuízo do beneficio da excussão (art.° 23ºn.° 2 da LGT): Dos administradores, directonrs, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da divida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo (art. 24°/n° l/b) LGT)…” – cfr. fls. 114 e 115 dos presentes autos. 16. A citação referida em 13. foi também remetida com a menção “Segue junto cópia do despacho de reversão”, tendo tal despacho sido enviado ao Opoente junto com a citação referida em 13. – cfr. fls. 114 a 120 dos presentes autos. 17. A citação referida em 13. foi remetida ao Opoente para a morada do seu domicílio fiscal, sob registo postal e com aviso de recepção, tendo o respectivo aviso sido assinado e devolvido ao órgão da execução fiscal – cfr. fls. 120 dos presentes autos. 18. No serviço de pesquisa de remessas do serviço postal, concretamente os CTT, consta que a o objecto a cujo registo corresponde a citação referida em 13. foi entregue em 03/11/2010 – cfr. fls. 121 dos presentes autos. 19. Em 20/04/2006 foi elaborada notificação das liquidações oficiosas sobre a sociedade F… n.ºs 5068990 e 04178516 relativas a IVA dos anos de 2003 e 2002, respectivamente, no valor de 1496,40€ cada uma – cfr. fls. 72 dos presentes autos. 20. A notificação referida em 19. foi remetida via postal, com aviso de recepção – cfr. fls. 72 e 73 dos presentes autos. 21. Os avisos de recepção referentes às liquidações referidas em 19. vieram devolvidos sem que se mostrassem assinados –cfr. fls. 73 dos presentes autos. 22. A presente acção deu entrada em 20/12/2010”.
II.B. Refere-se ainda na sentença recorrida: “Com relevância para a pronúncia a emitir nos presentes autos, dá-se como não provado o seguinte facto: a. Após a devolução dos avisos de recepção correspondentes à notificação das liquidações referidas em 19. dos factos provados, o serviço de finanças enviou nova carta com as notificações em causa que não foi devolvida para o domicílio fiscal da sociedade F…. b. A liquidação de IVA de 2004 sobre a devedora originária foi a esta notificada em 17/07/2006. c. A liquidação de IVA de 2005 sobre a devedora originária foi a esta notificada em 16/11/2006. d. A liquidação de IVA de 2006 sobre a devedora originária foi a esta notificada em 21/06/2007”.
II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto: “A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes dos autos, referidos em cada uma das alíneas do elenco dos factos provados, os quais não foram impugnados, merecendo a credibilidade do tribunal, em conjugação com o princípio da livre apreciação da prova. O facto não provado a. foi assim dado porque, ainda que a Fazenda Pública alegue que, após a devolução dos avisos de recepção que acompanharam as notificações das liquidações de IVA de 2002 e 2003 à devedora originária, o serviço de finanças remeteu por via postal nova notificação à qual faz menção de que se trata da constante de fls. 74 dos presentes autos, a verdade é que, uma vez analisada a mesma, se constata que tal documento se consubstancia num envelope em que o remetente é o 2º Bairro Fiscal, com morada em Lisboa, e o destinatário é a devedora originária, e que tal envelope possui aposto um código que é de se considerar como correspondendo a um registo postal. No entanto dos autos não consta elemento algum que permita estabelecer uma correspondência entre o código de registo postal constante de tal envelope e aquele que a Fazenda Pública alega ter sido remetido à devedora originária notificando-a das liquidações oficiosas de 2002 e 2003. Mais, o documento de fls. 74 dos autos é um envelope, que analisando a imagem que consta como documento se apreende que o mesmo se encontra aberto e que na borda esquerda do mesmo consta a indicação de que o mesmo foi remetido com aviso de recepção. Daí que duas conclusões haja de se retirar. A Fazenda Pública alega que as cartas que continham as segundas notificações foram enviadas e não foram devolvidas, logo inexiste razão para que o órgão da execução fiscal possua o envelope sobre qual sustenta que as notificações foram enviadas e não foram devolvidas. A segunda conclusão, impõe-se por maioria de razão: se aquela foi a carta pela qual foram remetidas as segundas notificações à devedora originária, se a mesma foi enviada com aviso de recepção, o mesmo seria sempre devolvido pelos serviços postais, ou assinado – aí havendo prova da entrega e da respectiva data – ou não assinados, com a menção que coubesse na devolução do aviso (se não entregue por insuficiente morada, por o destinatário se ter mudado, por ter recusado a recepção, por não ter levantado a carta junto da estação de correios, etc..). Pelo que, pela mobilização dos dados e resultados da experiência comum aplicáveis à comunicação via postal e respectivo funcionamento, que supra explanamos, conjugados com a total falta de elementos nos autos que permitam concluir pelo envio por parte do serviço de finanças das segundas notificações das liquidações que ora tratamos, deu-se como não provado o facto referido em a. dos factos não provados. Os factos não provados b., c. e d. assim foram considerados mesmo tendo em consideração que a Fazenda Pública apresenta, fazendo expressa menção aos mesmos na contestação que apresentou, documentação que afirma provar a afirmação de tais factos – que as notificações de tais liquidações foram feitas e as datas em que as mesmas ocorreram. No entanto, os documentos que a Fazenda Pública apresenta para sustentar a verificação de tais factos consubstanciam-se em documentos totalmente internos do respectivo serviço de finanças, gerados, preenchidos, geridos, controlados em exclusividade pelo serviço a quem compete a liquidação e a cobrança do imposto aí em causa. Realidade que fulmina a integridade dos mesmos e a susceptibilidade de os mesmos serem mobilizados, pela evidente falta de credibilidade que se lhes acopla por virtude da sua origem, para sustentar a existência de uma realidade em cujo interesse de verificação é da própria parte que os apresenta e que neles sustenta a afirmação da verificação de tais factos favoráveis aos seus interesses. Sendo também certo que, tendo, nos termos da lei (art. 39º, n.º 1 do CPPT) as notificações das liquidações adicionais em causa de ser efectuadas por carta registada com aviso de recepção, em momento algum a Fazenda Pública alega que as mesmas observaram as formalidades procedimentais da notificação, nem juntou os respectivos e correspondentes avisos de recepção. O que na análise da normalidade das coisas, atentas as regras da experiência comum aplicadas à realidade que aqui analisámos, conjugando com o tipo de documentos que a Fazenda Pública apresenta para afirmar a realização das notificações que aqui tratamos, leva a que se conclua que a realização das mesmas não ocorreu. Pelo que, tendo em consideração tudo quanto supra afirmámos, se tenham dado os factos b., c. e d. como não provados”.
II.D. Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto Insurge-se, desde logo, a Recorrente, quanto à decisão proferida sobre a matéria de facto, concretamente quanto aos factos não provados b) a d), entendendo que os mesmos deviam ser dados como provados, uma vez que a prova documental que o Tribunal a quo considerou insuficiente é, na verdade, suficiente. Considera, ademais, que devem ser aditados os seguintes factos provados: “a. a sociedade comercial com a designação “F… Lda.”, com o NIPC 5…….. foi constituída através de pacto social celebrado em 09/11/1993, tendo como sede a morada “Rua do A…, n.º 2…”, em Lisboa, morada que não foi alterada até à data em que foi registado na Conservatória do Registo Comercial o encerramento da liquidação e o cancelamento da matrícula e que corresponde ao seu domicílio fiscal; b. foram emitidas em nome da sociedade F… as liquidações de IVA n.ºs 06148944, 06327707 e 07176876, referentes aos períodos de tributação de 2004, 2005 e 2006, respectivamente; c. as referidas liquidações de IVA n.ºs 06148944, 06327707 e 07176876 foram remetidas para o domicílio fiscal da sociedade F… através de correio postal registado a que foi atribuído os números de registo dos CTT 918712669, 920728693 e 924885836, respectivamente; d. as notificações expedidas com os n.ºs de registo dos CTT 918712669, 920728693 e 924885836 foram efectivamente notificadas à sociedade F… em 17/07/2006, 16/11/2006 e 21/06/2007, respectivamente”. Vejamos então. Considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão(1). Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC]; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC]. Como tal, não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo-se-lhe os ónus já mencionados(2). Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que tais ónus foram minimamente cumpridos, pelo que se irá proceder à apreciação do requerido. ¾ Facto a aditar, supra identificado com a alínea a): Considerando a prova documental produzida, defere-se o requerido, sendo de aditar o seguinte facto: 23. A sociedade comercial com a designação “F… Lda.”, com o NIPC, 5……. foi constituída através de pacto social celebrado em 09/11/1993, tendo como sede a morada “Rua do A…, n.º 2…”, em Lisboa, sede que se manteve registada até ao encerramento da liquidação e o cancelamento da matrícula e que corresponde ao seu domicílio fiscal (cfr. fls. 8 a 10 e 22 do documento com o número de registo no SITAF neste TCAS 003680063).
¾ Factos a aditar, supra identificados com as alíneas b) a d), e factos não provados a suprimir b) a d): Os factos propostos a aditar têm a seguinte formulação: “b. foram emitidas em nome da sociedade F… as liquidações de IVA n.ºs 06148944, 06327707 e 07176876, referentes aos períodos de tributação de 2004, 2005 e 2006, respectivamente; c. as referidas liquidações de IVA n.ºs 06148944, 06327707 e 07176876 foram remetidas para o domicílio fiscal da sociedade F… através de correio postal registado a que foi atribuído os números de registo dos CTT 918712669, 920728693 e 924885836, respectivamente; d. as notificações expedidas com os n.ºs de registo dos CTT 918712669, 920728693 e 924885836 foram efectivamente notificadas à sociedade FERMISA em 17/07/2006, 16/11/2006 e 21/06/2007, respectivamente”. Ademais, os factos não provados contra os quais a Recorrente se insurge têm a seguinte formulação: “b. A liquidação de IVA de 2004 sobre a devedora originária foi a esta notificada em 17/07/2006. c. A liquidação de IVA de 2005 sobre a devedora originária foi a esta notificada em 16/11/2006. d. A liquidação de IVA de 2006 sobre a devedora originária foi a esta notificada em 21/06/2007”. Em termos de motivação, o Tribunal a quo sustentou-se no seguinte: “Os factos não provados b., c. e d. assim foram considerados mesmo tendo em consideração que a Fazenda Pública apresenta (…) documentação que afirma provar a afirmação de tais factos (…). No entanto, os documentos que a Fazenda Pública apresenta para sustentar a verificação de tais factos consubstanciam-se em documentos totalmente internos do respectivo serviço de finanças, gerados, preenchidos, geridos, controlados em exclusividade pelo serviço a quem compete a liquidação e a cobrança do imposto aí em causa. Realidade que fulmina a integridade dos mesmos e a susceptibilidade de os mesmos serem mobilizados, pela evidente falta de credibilidade que se lhes acopla por virtude da sua origem, para sustentar a existência de uma realidade em cujo interesse de verificação é da própria parte que os apresenta e que neles sustenta a afirmação da verificação de tais factos favoráveis aos seus interesses. Sendo também certo que, tendo, nos termos da lei (art. 39º, n.º 1 do CPPT) as notificações das liquidações adicionais em causa de ser efectuadas por carta registada com aviso de recepção, em momento algum a Fazenda Pública alega que as mesmas observaram as formalidades procedimentais da notificação, nem juntou os respectivos e correspondentes avisos de recepção. O que na análise da normalidade das coisas, atentas as regras da experiência comum aplicadas à realidade que aqui analisámos, conjugando com o tipo de documentos que a Fazenda Pública apresenta para afirmar a realização das notificações que aqui tratamos, leva a que se conclua que a realização das mesmas não ocorreu. Pelo que, tendo em consideração tudo quanto supra afirmámos, se tenham dado os factos b., c. e d. como não provados”. Quanto ao facto b. proposto, efetivamente o mesmo resulta provado, atenta a prova documental mencionada pela Recorrente. Já quanto aos factos c. e d., o nosso entendimento é distinto. Com efeito, compulsados os autos, verifica-se que os elementos documentais ali constantes e aqui chamados à colação consubstanciam-se em: ¾ Prints do sistema da administração tributária (AT), relativo às liquidações 04178516, 0568990, 06148944, 06327707 e 07176876, dos quais constam, entre outros, campos relativos à data da notificação e ao número de registo nos CTT; ¾ Ofício elaborado no SF de Lisboa 2, atinente às liquidações 04178516 e 0568990, ao qual está junto um aviso de receção apenas com os campos de remetente e destinatário preenchidos. Ora, considerando tais elementos documentais, não se pode acompanhar o entendimento da Recorrente. Com efeito, ao contrário do que refere a Recorrente, a jurisprudência tem exigido, para efeitos de demonstração da efetividade da notificação, mais do que elementos internos da AT. São, pois, exigíveis, em situações como a presente, documento externos, designadamente emitidos pela distribuidora de correio postal, o que não ocorreu. Neste sentido, a título ilustrativo, v. os Acórdãos deste TCAS de 07.05.2020 (Processo: 1737/13.0BELRS), de 08.05.2019 (Processo: 154/12.3BESNT), de 13.10.2017 (Processo: 1245/09.3BEALM) e de 17.05.2011 (Processo: 04631/11). Sublinhe-se, ademais, que todos os exemplos que a Recorrente dá, ao nível da jurisprudência indicada, não têm paralelo com a situação factual aqui em causa, dado que, em todos eles, se tratava de aferir da força probatória de elementos internos e externos (concretamente, elementos da AT e elementos da distribuidora de correio postal). Ou seja, trata-se de situações em que o Tribunal valorou os elementos internos, porque os mesmos tinham correspondência em elementos externos. O que, como nem é controvertido, não é o caso dos autos, onde os únicos elementos probatórios apresentados respeitam ao sistema interno da AT. No caso, só temos elementos internos, o que, naturalmente, é insuficiente para sustentar a convicção de que a notificação foi feita nos termos registados pela própria remetente, inexistindo aqui o que é, in casu, fundamental: um elemento de origem externa que prove a expedição. Não se trata da questão de um recibo de registo da carta não ser uma formalidade ad substanciam. Trata-se, sim, da absoluta inexistência de elementos de prova de origem externa que permitam confirmar a correção dos elementos constantes dos sistemas da AT. E não é pelo facto de o sistema informático da AT ser auditado que o entendimento é distinto – basta a possibilidade de poder sempre existir erro humano na inserção de dados no sistema. Reiteramos: meros elementos internos da AT são insuficientes para a prova de uma realidade como a em causa, porquanto se trata de ato cuja efetivação é, em casos como o dos autos, levada a cabo pela distribuidora de serviço postal e é fundamental prova externa. Este entendimento ficou de forma particularmente clara espelhado na motivação da decisão proferida sobre a matéria de facto elaborada pelo Tribunal a quo. Como tal, indefere-se o requerido, quanto ao aditamento dos factos c. e d. propostos e, bem assim, quanto à concomitante eliminação dos factos julgados não provados pelo Tribunal a quo. Defere-se apenas, pois, o aditamento de facto correspondente à emissão das liquidações oficiosas de IVA relativas a 2004, 2005 e 2006, nos seguintes termos: 24. Foram emitidas, pela AT, em nome da sociedade F…, as liquidações oficiosas de IVA n.ºs 06148944, 06327707 e 07176876, referentes, respetivamente, aos períodos de tributação de 2004, 2005 e 2006 (cfr. fls.55 a 57 do documento com o número de registo no SITAF neste TCAS 003680063).
III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO III.A. Do erro de julgamento quanto à falta de notificação Considera a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, no tocante à falta de notificação. Cumpre, aqui, antes de mais, fazer algumas observações prévias: a) Os autos referem-se a liquidações de 5 anos; b) O Tribunal a quo enquadrou a situação na alínea i) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT; c) Não resultou provada a notificação de nenhuma das liquidações em causa. Vejamos. A falta de notificação da liquidação constitui fundamento de oposição, enquadrável na alínea i) do n.º 1 do art.º 204.º, do CPPT. Como referido no Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário, do Supremo Tribunal Administrativo, de 18.09.2013 (Processo: 0578/13): “[E]ncontra-se hoje firmada a orientação jurisprudencial entretanto adoptada pelo STA, no sentido de que a ausência de notificação do acto de liquidação, seja antes ou após o decurso do prazo de caducidade do direito à liquidação, configura ineficácia desse acto tributário e constitui, por isso, fundamento de oposição à execução fiscal. Com efeito, é esta a orientação seguida nos recentes acórdãos proferidos pela Secção de Contencioso Tributário em 2/02/2011, no processo nº 0803/10, em 28/09/2011, no processo nº 0473/11, em 20/06/2012, no processo nº 0378/12, em 26/09/2012, no processo nº 0251/12, todos em consonância, de resto, com a jurisprudência contida no acórdão proferido pelo Pleno da Secção em 7/07/2010, no processo nº 0545/09, que subscreve, por sua vez, a fundamentação vertida no acórdão igualmente proferido pelo Pleno em 20/01/2010, no processo nº 0832/08, que inteiramente sufragamos, pelo que, face à sua proficiência, nos limitaremos, nessa parte, também aqui a reproduzir: «(…) Em termos lógicos, sendo a notificação da liquidação um acto posterior e exterior a esta, destinado a assegurar a sua eficácia (arts. 64.º, nº 1, do CPT), a sua falta, bem como as suas deficiências ou ilegalidades, deveriam afectar apenas a sua eficácia e não a validade do acto notificado. Aliás, o entendimento sempre adoptado pelo Supremo Tribunal Administrativo, em geral, era o de que o acto de notificação de um acto tributário é um acto exterior e posterior a este e os vícios que afectem a notificação, podendo determinar a ineficácia do acto notificado, são insusceptíveis de produzir invalidade do acto notificado, por não terem a ver com o próprio acto nem com os seus pressupostos (Neste sentido, entre muitos outros, podem ver-se os seguintes acórdãos do STA: – de 13-4-83 (do Pleno, publicado AD, n.º 262, página 1205); – de 6-7-88, recursos n.ºs 5608 e 5630, CTF n.º 352, páginas 368 e 562; – de 28-9-88, recurso n.º 5631, CTF n.º 352, página 575; – de 26-11-88, recurso n.º 4905, CTF n.º 353, página 230; – de 3-5-89, recurso n.º 5472, AP-DR 15-5-91, página 522, – de 12-7-89, recurso n.º 10428, AP-DR de 28-2-92, página 924; – de 9-10-91, recurso n.º 13540, AP-DR de 20-1-94, página 440; – de 23-9-92, recurso n.º 13713, AP-DR de 30-6-95, página 2237; – de 14-10-92, recurso 14070, AP-DR de 9-10-95, página 2521; e – de 2-12-93, recurso n.º 14471, AP-DR de 20-5-96, página 4152; – de 3-5-2000, recurso n.º 22608.). (…) Na verdade, as situações de falta de notificação antes da execução, afectando a exigibilidade da dívida exequenda e não se enquadrando em qualquer das alíneas anteriores, constituem fundamento de execução fiscal como, sempre entendeu este Supremo Tribunal Administrativo, face às normas dos arts. 176º, alínea g), do CPCI e 286º, nº 1, alínea h) do CPT, a que corresponde actualmente o art. 204º, n.º 1, alínea i), do CPPT. (Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos do STA: – de 16-11-1994, recurso n.º 18059, AP-DR de 20-1-97, página 2585; – de 5-4-1995, recurso n.º 18445, AP-DR de 14-8-97, página 1015; – de 22-5-1996, recurso n.º 20342, AP-DR de 18-5-98, 1768 – de 26-6-96, recurso n.º 18427, AP-DR de 18-5-98, página 2182; – de 23-10-1996, recurso n.º 20783, AP-DR de 28-12-98, página 3060; – de 13-11-1996, recurso n.º 20787, AP-DR de 28-12-98, página 3440; – de 27-11-1996, recurso n.º 20692, CTF n.º 385, página 364, e no AP-DR de 28-12-98, página 3617; – de 5-3-97, recurso n.º 21304, AP-DR de 14-5-99, página 760, – de 19-3-97, recurso n.º 21120, AP-DR de 14-5-99, página 802; – de 21-5-1997, recurso n.º 21605, AP-DR de 9-10-2000, 1563; – de 11-3-1998, recurso n.º 22207, AP-DR de 8-11-2001, página 885; – de 7-10-1998, recurso n.º 22349, AP-DR de 21-1-2002, página 2727; – de 10-2-1999, recurso n.º 22290, CTF n.º 394, página 322, e no BMJ n.º 484, página 199; – de 3-3-1999, recurso n.º 22902; – de 9-3-2000, recurso n.º 23699, AP-DR de 21-11-2002, página 845; – de 24-10-2001, recurso n.º 26430, AP-DR de 13-10-2003, página 2436; – de 20-2-2002, recurso n.º 26291, AP-DR de 16-2-2004, página 561; – de 6-10-2005, recurso n.º 500/05.) (…) Na verdade, em todas as situações em que a execução fiscal foi instaurada sem prévia notificação do acto de liquidação, este acto é ineficaz e, por isso, não produz efeitos em relação aos seus destinatários (arts. 77º, nº 6, da LGT e 36º, nº 1, do CPPT), não podendo com base nesse exigir-se coercivamente o pagamento da dívida liquidada. Todas estas situações em que não houve qualquer notificação da liquidação, antes da instauração da execução fiscal enquadravam-se na alínea h) do nº 1 do art. 286º, pois abrangem-se aí «quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título». E, actualmente, à face do CPPT, todas estas situações em que não houve qualquer notificação, são susceptíveis de enquadramento na alínea i) do n.º 1 do art. 204º, que tem teor idêntico àquela alínea h) do nº 1 do art. 286º do CPT, se não for de entender que a situação se enquadre noutra das alíneas do mesmo número, designadamente na nova alínea e). (…) [C]om o CPPT repôs-se a coerência do sistema global de meios de defesa dos contribuintes em matéria tributária, ao tornar a notificação intempestiva da liquidação fundamento de inexigibilidade da obrigação tributária em vez de ilegalidade da liquidação notificada. Na verdade, à face do novo regime, a notificação intempestiva não constitui ilegalidade do acto notificado, à semelhança do que sucede em relação à generalidade de todos os outros actos administrativos e tributários; esse vício do acto de notificação (intempestividade) afecta-o apenas a ele próprio e não ao acto notificado, retirando-lhe a potencialidade de produzir os efeitos que produziria se não enfermasse dessa ilegalidade, que era o de atribuir eficácia ao acto notificado. Assim, é agora claro que tanto a falta de notificação como a falta de uma notificação tempestiva afectam a eficácia do acto de liquidação e não a sua validade, pelo que é na oposição que devem ser invocadas tanto a inexistência de qualquer notificação como a intempestividade da notificação que tenha sido efectuada. Este regime é, globalmente, mais coerente do que o sustentado pela referida jurisprudência na vigência do CPT, pois a notificação de qualquer acto é um acto autónomo e posterior ao acto notificado e, por isso, é duvidosa a razoabilidade do entendimento que se na vigência do CPT se adoptava, no sentido de a falta ou vício da notificação afectar a validade do acto de liquidação, acto este que já estava praticado e permanecia como estava independentemente da notificação (…)». (…) Assim sendo, o vício de falta de notificação do acto de liquidação invocado pelos Oponentes, afectando a eficácia do acto, constitui, inequivocamente, fundamento de oposição à execução fiscal”. Estamos aqui perante cinco liquidações oficiosas de IVA emitidas pela AT, cuja notificação obedece ao disposto no CPPT. Nos termos do art.º 38.º do CPPT: “1 - As notificações são efetuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de receção, sempre que tenham por objeto atos ou decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes ou a convocação para estes assistirem ou participarem em atos ou diligências. (…) 3 - As notificações não abrangidas pelo n.º 1, bem como as relativas às liquidações de tributos que resultem de declarações dos contribuintes ou de correcções à matéria tributável que tenha sido objecto de notificação para efeitos do direito de audição, são efectuadas por carta registada. (…) 5 - As notificações serão pessoais nos casos previstos na lei ou quando a entidade que a elas proceder o entender necessário”. Por seu turno, dispunha então o art.º 39.º do mesmo código: “1 - As notificações efetuadas nos termos do n.º 3 do artigo anterior presumem-se feitas no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil. 2 - A presunção do número anterior só pode ser ilidida pelo notificado quando não lhe seja imputável o facto de a notificação ocorrer em data posterior à presumida, devendo para o efeito a administração tributária ou o tribunal, com base em requerimento do interessado, requerer aos correios informação sobre a data efetiva da receção. 3 - Havendo aviso de receção, a notificação considera-se efetuada na data em que ele for assinado e tem-se por efetuada na própria pessoa do notificando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro presente no domicílio do contribuinte, presumindo-se neste caso que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário. 4 - O distribuidor do serviço postal procederá à notificação das pessoas referidas no número anterior por anotação do bilhete de identidade ou de outro documento oficial. 5 - Em caso de o aviso de receção ser devolvido ou não vier assinado por o destinatário se ter recusado a recebê-lo ou não o ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal, a notificação será efetuada nos 15 dias seguintes à devolução por nova carta registada com aviso de receção, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada, sem prejuízo de o notificando poder provar justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação da mudança de residência no prazo legal. 6 - No caso da recusa de recebimento ou não levantamento da carta, previstos no número anterior, a notificação presume-se feita no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil”. Apreciando. Comecemos pelas liquidações atinentes aos anos de 2002 e 2003. Analisadas as alegações de recurso, verifica-se que, tratando-se de liquidações oficiosas e não constando dos autos, nem nada nunca tendo sido alegado, no sentido de ter havido participação da devedora originária no procedimento, a sua notificação tem de ser feita através de carta registada com aviso de receção (n.º 1 do art.º 38.º do CPPT), dado tratar-se de atos que alteram a situação tributária do respetivo destinatário. Considerando que não foi posta em causa a decisão proferida sobre a matéria de facto, no que toca ao facto não provado a), desde logo é claro que não se pode considerar que a notificação foi efetuada, no tocante às liquidações relativas aos anos de 2002 e 2003. Com efeito, tratou-se de notificação remetida via correio postal com aviso de receção, em que apenas foi enviada uma primeira notificação, devolvida sem que o aviso de receção se mostrasse preenchido. Foi, ademais, considerado como não provado [facto não provado a)] que tenha havido a segunda notificação (cfr. art.º 39.º, n.º 5, do CPPT). Logo, e considerando que, rigorosamente, esta parte da decisão não foi posta em causa, não assiste razão à Recorrente. Quanto às demais liquidações (relativas aos anos de 2004 a 2006), atenta a matéria de facto assente e considerando a motivação supra referida, aquando da apreciação da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, resulta que não foi sequer provada a expedição da notificação da liquidação em causa, motivo pelo qual, não estando provada a efetiva notificação da sociedade devedora originária, se verifica a inexigibilidade da dívida. Sempre se acrescente que, estando nós perante notificações de liquidações oficiosas, sempre as mesmas deveriam ter sido feitas, pelos motivos já assinalados, através de carta registada com aviso de receção. O que nem sequer foi alegado que tenha ocorrido. Como tal, não assiste razão à Recorrente nesta parte.
III.B. Do erro de julgamento, em virtude de as notificações terem chegado ao conhecimento do interessado Considera, por outro lado, a Recorrente que, ainda que as notificações possam não ser consideradas válidas, são eficazes, por terem chegado ao conhecimento do interessado. Ora, esta questão não encontra qualquer sustentação na factualidade assente nem sequer na posição do Oponente. Não estamos aqui perante uma situação em que o Oponente afirma ter recebido a notificação, mas que a mesma não cumpria as formalidades legalmente exigidas. Estamos, sim, perante situação em que o Oponente afirma que a devedora originária não foi notificada e em que, quem tinha o ónus da prova de tal notificação (a FP), não logrou provar tais factos. Não estando provado que a devedora originária foi notificada, carece de sustentação o alegado, não havendo aqui que apelar à teoria do aproveitamento do ato. Como tal, também nesta parte não assiste razão à Recorrente.
III.C. Do erro de julgamento, por não ter sido considerado o disposto no art.º 45.º, n.º 6, da LGT Entende ainda a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro, ao não considerar a circunstância de o art.º 45.º, n.º 6, da LGT consagrar uma presunção inilidível. Nos termos do mencionado art.º 45.º, n.º 6, da LGT: “6 - Para efeitos de contagem do prazo referido no n.º 1, as notificações sob registo consideram-se validamente efetuadas no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil”. O alegado a este propósito também não releva, por várias ordens de razão. Em primeiro lugar, o Tribunal a quo considerou a oposição procedente por absoluta falta de notificação, situação, como já referimos, enquadrável na alínea i) do n.º 1 do art.º 204.º do CPPT. Em segundo lugar, não ficou provada a notificação. Não o tendo ficado, não há lugar à aplicação de qualquer presunção, que pressupõe justamente que esteja provada a remessa da notificação. Logo, carece de razão a Recorrente.
IV. DECISÃO Face ao exposto, acorda-se em conferência na 2.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: a) Negar provimento ao recurso; b) Custas pela Recorrente; c) Registe e notifique. Lisboa, 02 de fevereiro de 2023 (Tânia Meireles da Cunha) (Susana Barreto) (Patrícia Manuel Pires) _____________________________ (1) Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, p. 169. (2) V., a título exemplificativo, o Acórdão deste TCAS, de 27.04.2017 (Processo: 638/09.0BESNT) e ampla doutrina e jurisprudência no mesmo mencionada. |