Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 981/22.3BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 02/02/2023 |
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Relator: | SUSANA BARRETO |
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Descritores: | COMPENSAÇÃO ATO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO ATOS MATERIAIS DE EXECUÇÃO |
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Sumário: | I - No CPPT, a compensação configura-se como um modo geral de extinção da obrigação fiscal diferente do cumprimento. II - A compensação, por iniciativa da administração tributária, está condicionada à prévia prática de ato que declare a compensação. III - Este ato administrativo que determinou a compensação de dívidas, para ser eficaz, tinha que ser previamente comunicado à Executada, por forma a permitir o exercício dos meios de reação que a lei lhe propicia |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | I - Relatório A Autoridade Tributária e Aduaneira, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a reclamação de atos de órgão de execução fiscal deduzida por A…- Investimento Imobiliário, S.A. (Massa Insolvente), contra os atos materiais de compensação, processados no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3336201501207750, no valor global de € 990 737,89, com fundamento na ilegalidade das compensações por erro sobre os pressupostos de direito, dela veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo Sul. Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente, Autoridade Tributária e Aduaneira, formula as seguintes conclusões: A) Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença, a qual julgou procedente a reclamação apresentada por A...- INVESTIMENTO IMOBILIARIO S.A. (MASSA INSOLVENTE) e em consequência determinou a anulação dos atos materiais de compensação no montante 990.737,89 (novecentos e noventa mil, setecentos e trinta e sete euros e oitenta e nove cêntimos). B) Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em saber: a) se os presentes autos de reclamação deveriam ser indeferidos liminarmente por erro na forma do processo e, b) se deve ser procedente a anulação das compensações operadas no âmbito do PEF n.º 3336201501207750 e apensos. II - DO RECURSO: C) Com o devido respeito, discorda a Fazenda Publica do entendimento sufragado na douta sentença, com o mesmo não se conformando, porquanto, salvo melhor, esclarecido e superior entendimento, padece a douta sentença, de erro de julgamento de facto, por errada valoração da prova apresentada pela Fazenda Pública, e de direito, por incorreta interpretação e aplicação das normas estabelecidas respeitantes ao erro na forma do processo e a compensação de dívidas de tributos por iniciativa da Administração Tributária. Vejamos, 1) Erro na Forma do Processo D) O erro na forma do processo, já foi debatido diversas vezes pela doutrina e pela jurisprudência e nesse sentido veja-se a titulo de exemplo o Acórdão o Tribunal Central Administrativo Norte de 27-11-2014, da 2ª Secção do Contencioso Tributário, Processo n.º 01799/13.0BEBRG, “ (…) V. Havendo erro na forma de processo, deverá ser ordenada a convolação do meio processual inadequado para o meio processual adequado, salvo se a petição for extemporânea para o efeito.” (sublinhado nosso). E) Ou ainda, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, da 2ª Secção, de 23-05-2012, Processo n.º 0451/12, “I - Em face da correspondência entre direito e a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, haverá um determinado meio processual a que, em cada caso, pode ser utilizado para obter a tutela judicial. É à face do pedido ou conjunto de pedidos formulados pelo interessado que se afere a adequação das formas de processo especiais e, consequentemente, se ocorre erro na forma de processo. II - A reclamação prevista nos arts. 276º a 278º do CPPT destina-se a obter a anulação de actos praticados no processo de execução fiscal, como decorre dos próprios termos daquele art. 276º e não a extinção do próprio processo de execução fiscal, sendo que para obter este efeito o meio processual próprio seria o de processo de oposição à execução fiscal.(…). F) Na presente Reclamação de Atos do Órgão de Execução Fiscal, o reclamante vem invocar a “não notificação da compensação de créditos”. Não reclama de um despacho ou de uma decisão de indeferimento do órgão de Execução Fiscal, assim sendo, a ação adequada para defender o direito do reclamante seria a oposição ou a ação para reconhecimento do direito do contribuinte a receber as quantias em causa. (ref. artigo 145º do CPPT). G) Isto é, se o reclamante defende que não houve notificação da compensação dos créditos e como consequência a mesma deve ser anulada, não se percebe porque o reclamante não interpôs uma ação de reconhecimento do direito de receber o seu crédito, nos termos do artigo 145º do CPPT. H) Pois, “se for materializada compensação, através da afetação de quantias a pagamento de dividas (nomeadamente de forma automática, por meios informáticos), sem que tenha sido previamente praticado um ato administrativo que declare o direito da Administração Tributária a efetuá-la, estar-se-á perante uma situação de compensação ilegal, que pode ser judicialmente declarada através de uma ação para reconhecimento do direito do contribuinte a receber as quantias em causa (artigo 145º do CPPT)” – Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 6ª edição, ano 2011, de Áreas Editora, Volume I, página 732. I) Concluímos assim que, o reclamante não deveria ter optado pela Reclamação de Atos do Órgão de Execução Fiscal, e existindo erro na forma do processo, poderia o tribunal optar pela convolação e se tal não fosse possível, estaríamos perante um indeferimento liminar da petição inicial. 2) Compensação de dívidas Tributárias J) Nos termos do artigo 89º do CPPT pode haver compensação de dívidas de tributos por iniciativa da Administração Tributária. K) Assim, reunidos os requisitos do n.º 1 do artigo 89º do CPPT, a compensação é obrigatória para a Administração Tributária, não estando no leque das suas competências, não efetuar qualquer compensação por sua própria iniciativa. L) E neste sentido vide nomeadamente o Acórdão da Relação de Coimbra de 28-10-2020, processo n.º 145/15.2IDLRA.CI, “I – Para efeitos do disposto no artigo 105.º, n.º 4, al. b), do RGIT, não se exige que o pagamento previsto na norma seja feito à custa do património da sociedade devedora, sendo ainda irrelevante a inacessibilidade ao património do ente colectivo declarado insolvente. II – A autoridade tributária pode, por sua iniciativa, proceder à compensação de dívidas de tributos, quanto se verifiquem as condições estabelecidas no art. 89.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT). (sublinhado nosso). III – De acordo com a previsão dos n.ºs 1 e 5 daquele normativo, os créditos do executado resultantes de reembolso, revisão oficiosa, reclamação ou impugnação judicial de qualquer acto tributário são aplicados na compensação das suas dívidas cobradas pela administração tributária, sendo a compensação efectuada através da emissão de título de crédito destinado a ser aplicado no pagamento da dívida exequenda e demais acréscimos. IV – Assim, a compensação assume-se como um acto de natureza coerciva, uma modalidade forçada de cobrança (cfr. arts. 78.º, 89.º e 148.º do CPPT), em que a autoridade tributária pode decidir não reembolsar o crédito do sujeito passivo e impor-lhe que o crédito seja compensado nas dívidas fiscais. (sublinhado nosso). V – Por isso, o Fisco só pode operar a compensação, em relação ao crédito fiscal, quando seja certo, líquido e exigível, definitivamente fixado, sem possibilidade de o contribuinte discutir a legalidade do imposto (…)” M) De salientar que a norma do artigo 89º n.º 1 do CPPT, restringe a possibilidade de compensação por iniciativa da Administração Tributária aos casos em que já há um “executado”, atribuindo-lhe na respetiva execução fiscal todos os direitos de defesa dos executados. N) Se todos os direitos de defesa do executado já estão assegurados, não vislumbra a Representação da Fazenda Pública porque não poderia haver compensação. O) Concluindo, a Administração Tributária, mais concretamente o Serviço de Finanças de Lisboa 6, tinha que proceder a afetação das quantias que tinha em seu poder e proceder ao pagamento das dívidas fiscais do executado, através da figura da compensação, até porque “não vislumbrava” outro modo para satisfazer os créditos tributários, tendo em conta a insolvência da executada. P) Nestes termos, a sentença ora recorrida ao não ter feito uma correta interpretação e aplicação das normas e decidindo no sentido que efetivamente apontou, estribou o seu entendimento numa inadequada valoração da matéria de direito e de facto relevante para a boa decisão da causa. Q) Em molde a subsumir a situação real contida nos autos à boa decisão da causa, deverá esta ser corrigida de acordo com a verdade substantiva. Face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso, consequentemente, revogada a sentença recorrida, e superiormente ponderada a verificação dos seus pressupostos, seja determinada a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça prevista no n.º 7 do art.º 6º do RCP. V. Excelências, porém, farão a costumada JUSTIÇA» B. Contudo, não lhe assiste razão porquanto, em primeiro lugar, é notório que não existe nenhum fundamento atendível que obste à idoneidade do meio de reação utilizado pela Massa para tutelar a sua posição jurídica – contrariamente ao que a AT defende nas conclusões D) a I) das alegações de recurso – e de, em consequência, serem anulados os atos materiais de compensação em relevo, pelo facto de não ter sido praticado nenhum ato administrativo prévio que os tenha ordenado. C. Ademais, sempre se diga que não deverá sequer ser conhecida a questão de existência de eventual erro na forma do processo invocada pela AT, somente invocada em sede de alegações de recurso, por ser intempestiva, ao abrigo do disposto do artigo 193.º, do n.º 2 do artigo 197.ºe do n.º 1 do artigo 198.º, todos do CPC, aplicáveis ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT. D. Neste sentido, leia-se, por exemplo, o Acórdão do STA proferido no processo n.º 01256/13, de 24.09.2015 e o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido no processo n.º 1734/18.9T8VLG.P1, de 14.07.2020, que são claros ao referir esta nulidade processual só pode ser arguida até à contestação, ou neste articulado. E. Assim sendo, se ao longo da tramitação deste processo até à prolação da sentença final a AT deixou que o processo corresse os seus termos sem nunca ter invocado a existência do pretenso erro na forma do processo, exercitando ainda os seus direitos de acordo com a forma processual utilizada, renunciou tacitamente à sua invocação, não podendo depois da prolação da sentença invocar este vício. EM ACRÉSCIMO, F. O argumento esgrimido pela AT para abalar o veredicto do Tribunal a quo, relativo ao facto da douta sentença padecer “de erro de julgamento de facto, por errada valoração da prova apresentada pela Fazenda Pública (…)” – cfr. conclusão C) das alegações de recurso – não tem qualquer fundamento legal. G. Na realidade, a posição pugnada pela AT viola, patentemente, o ónus consagrado no artigo 640.º do CPC, aplicável ex vi artigo 281.º do CPPT, uma vez que esta regra determina que “(…) o recorrente apenas observa os ónus de impugnação legalmente exigidos, quando especifica os concretos meios de prova que impõem que, para cada um dos factos impugnados, fosse julgado não provado, quando indica qual a decisão que em concreto deve ser proferida sobre a matéria impugnada e menciona os documentos ou pontos da gravação com referência ao que ficou expresso na acta da audiência de discussão e julgamento ou, pelo menos, apresenta transcrições dos depoimentos das testemunhas que corroboram a sua pretensão – cfr. Acórdão do TCA Sul proferido no processo n.º 838/17.0BELRS, de 08.05.2019, reproduzido no Acórdão do mesmo Tribunal proferido no processo n.º 1447/11.2BELRS, de 22.10.2020 o que, in casu, manifestamente não aconteceu. H. Pois bem, a AT não pôs em causa a matéria de facto apurada na sentença, mas apenas defende que deveria ter sido melhor considerado e valorado o consignado no acervo probatório documental apresentado pela AT, sem, contudo, concretizar qualquer crítica ou ataque à valoração efetuada ou avançar com outra que, ao invés daquela, pudesse conduzir a uma decisão diferente daquela o que chegou o Tribunal a quo. I. Deste modo, dúvidas não poderão restar que a AT, nas suas conclusões, limitou-se a contestar genericamente a valoração da prova realizada pelo Tribunal a quo, mas sem força capaz de evidenciar o erro manifesto ou grosseiro em que incorreu o Tribunal ao valorar a prova nos termos em que esta foi valorada, ou como será o iter que cabalmente conduziria a uma decisão diferente daquela que chegou o Tribunal a quo. J. Termos em que, o recurso, na parte em que respeita ao erro de julgamento de facto, deverá ser julgado improcedente, por força da manifesta falta de cumprimento do supracitado ónus estabelecido pela lei processual civil. POR FIM, K. A Recorrida não consegue alcançar qual é a oportunidade e idoneidade da argumentação vertida nas conclusões J) a O) das suas alegações de recurso, que se resume ao facto de os requisitos, previstos no n.º 1 do artigo 89.º do CPPT, que habilitam a AT a proceder à compensação de dívidas de tributos por sua iniciativa se encontrarem verificados in casu – o que não se admite (por força dos vícios escalpelizados pela Massa, aquando da apresentação da reclamação, cujo conhecimento ficou prejudicado ao abrigo do n.º 2 do artigo 608.º do CPC, aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT), mas apenas se equaciona por mero dever de patrocínio – constitui uma razão para obstar à procedência da reclamação em apreço. L. Isto porque, na realidade, aquilo que o Tribunal a quo julgou na sua fundamentação de direito foi que, com base nos factos não provados 1) e 2) da sentença, não foi praticado, nem notificado à Massa, nenhum ato administrativo tributário que ordene a compensação; i.e., os atos materiais de compensação em contenda não foram precedidos de nenhum ato administrativo tributário que os ordene e determine, o que é, manifestamente, ilegal, por violação do princípio da legalidade enunciado no artigo 55.º da Lei Geral Tributária e artigo 3.º do Código do Procedimento Administrativo, bem como do disposto no n.º 6 do artigo 77.º da Lei Geral Tributária e n.º 1 do artigo 36.º do CPPT (cfr. Acórdão do TCA Norte proferido no processo n.º 00135/12.7BEAVR, de 18.04.2012 e o Acórdão do Supremo STA proferido no processo n.º 1686/13, de 12.12.2013, que subscreveu o julgamento deste Tribunal proclamado no processo n.º 299/13.2BEAVR, de 23.08.2013). M. Sendo certo que a AT, nas conclusões J) a O) das suas alegações de recurso, não logrou provar que, efetivamente, estes atos materiais de compensação foram precedidos de um ato administrativo tributário que os tenha ordenado e determinado e que este tenha sido notificado à Massa. NO ENTANTO, N. Sempre se diga que mesmo que se entendesse que este argumento, apresentado pela AT apenas em sede de recurso, partilha da probidade necessária para atacar a valoração da matéria de direto empregue pelo Tribunal a quo – o que não se aceita, mas apenas se pondera por dever de patrocínio –, a verdade é que este fundamento não foi suscitado pela AT perante o Tribunal a quo, tratando-se, portanto, de uma “questão nova”, conforme decorre de jurisprudência uniforme (v., por todos, o Acórdão do STA proferido no processo n.º 01508/12, de 05.11.2014), dela não se podendo conhecer no âmbito do presente recurso. O. Consequentemente, não pode agora o Tribunal ad quem, por não lhe assistir poder jurisdicional, conhecer de tal questão no âmbito do presente recurso. P. Por conseguinte, a sentença deve manter-se, na parte objeto do presente recurso, e consolidar-se na ordem jurídica, com todas as consequências legais. TERMOS EM QUE DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO IMPROCEDENTE, POR NÃO PROVADO, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, DESIGNADAMENTE A MANUTENÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA.» A) Em 27/09/2015, 19/12/2015, 25/03/2017, 20/05/2018 e 09/03/2019, foram instaurados, respetivamente, os PEF n.º 3336201501207750 e apensos, PEF n.º 3336201501263544, PEF n.º 3336201701048716 PEF n.º 3336201801091948 e PEF n.º 3336201901044265 – cf. documento com o registo n.º 007426270. B) Em 30/10/2021, por referência à Reclamante, foi efetuado o movimento “Excesso a restituir Proc. Ex. Fiscal 3441200601037595” no montante de “+ € 440.370,47”, referente ao período 01/01/2021 a 31/12/2021 – cf. documento com o registo n.º 007462116 (fls. 3 do documento). C) Em 03/11/2021, por referência à Reclamante, foi efetuado o movimento “Penhoras em Execução Fiscal”, no montante de “- 440.370,47” referente ao período 01/01/2021 a 31/12/2021 – cf. documento com o registo n.º 007462116 (fls. 3 do documento). D) Em 04/11/2021, foi, através de notificação eletrónica, enviado à Reclamante o documento n.º 2021 00010302910, com o título “Informação sobre aplicação do crédito”, de cujo teor se extrai o seguinte:
– cf. documento com o registo n.º 007462116 (fls. 3 e 7 do documento). E) Em 12/11/2021, foi efetuado um movimento de “Dep. Penhora Nr: 3336.2021.00000000611” “+ 440.370,47” – cf. documento com o registo n.º 007462116 (fls. 4 do documento). F) Em 13/11/2021, foi efetuada compensação no montante de € 440.370,47 – cf. documento com o registo n.º 7462116 (fls. 5 do documento). G) Em 15/11/2021, foi efetuado um movimento de “Aplicação em Compensação de JT – 2021 2190524” no montante de “- 440.370,47” – cf. documento com o registo n.º 007462116 (fls. 4 do documento). H) Em 30/10/2021, por referência à Reclamante, foi efetuado o movimento “Dep. Penhora Nr. 3336.2021.00000000558” no montante de “+ € 550.367,42”, referente ao período 09/03/2019 a 09/03/2019 – cf. documento com registo n.º 007462116 (fls. 8 do documento). I) Em 03/11/2021, por referência à Reclamante, foi efetuado o movimento “Compensação”, “- € 550.367,42”, referente ao período 09/03/2019 a 09/03/2019 – cf. documento com o registo n.º 007462116 (fls. 8 do documento). J) Em 03/11/2021, foi efetuada compensação no montante de € 550.367,42 – cf. documento com o registo n.º 007462116 (fls. 10 do documento). K) Em 04/11/2021, foi, através de notificação eletrónica, enviado à Reclamante o documento n.º 2021 00010302911, com o título “Informação sobre aplicação do crédito”, de cujo teor se extrai o seguinte: – cf. documento com o registo n.º 7462116 (fls. 8 do documento). L) Em 16/11/2021, o administrador da insolvência da Reclamante teve acesso aos documentos mencionados em D) e K) – por admissão (ponto 3 do requerimento com o registo n.º 7456124). M) Em 25/11/2021, a Reclamante dirigiu pedido de informação à Autoridade Tributária, de cujo teor se extrai o seguinte: – cf. documento 3 junto com a p.i. N) Em 20/12/2021, foi enviada à Reclamante pelo Serviço de Finanças de Lisboa-6, mensagem de correio eletrónico de cujo teor se extrai o seguinte: O) Em 13/01/2022, a Reclamante apresentou a petição da presente reclamação – cf. documento com o registo n.º 007426270.» *
Quanto a factos não provados, na sentença exarou-se o seguinte: 1) «Pela Autoridade Tributária, tenha sido praticado ato prévio que ordenasse as compensações referidas em F) e J); 2) Tenha sido notificado à Reclamante qualquer ato prévio respeitante às compensações referidas em F) e J). 3) Não existem outros factos alegados relevantes para a decisão, em face das possíveis soluções de direito, que importe referir como provados ou não provados.» *
E quanto à motivação da decisão de facto, consignou-se: «A decisão da matéria de facto fundou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente nos documentos juntos aos autos, conforme referido em cada alínea do probatório, bem como na posição expressa pelas partes, tendo sido considerados os factos relevantes para a decisão dentro das várias soluções plausíveis das questões de direito [nos termos conjugados do n.º 2 do artigo 123.º do CPPT e dos n.ºs 4 e 5 do artigo 607.º do CPC, este último preceito aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT]. No que respeita ao facto não provado, o mesmo decorre da total ausência de substrato probatório que o pudesse sustentar.» II.2 Do Direito A Reclamante e ora Recorrida notificada dos reembolsos resultantes da execução de sentença pela Autoridade Tributária e Aduaneira relativos a um outro processo judicial tributário, e de que não haveria lugar à restituição daquelas quantias porquanto iriam ser aplicadas nos processos de execução fiscal (PEF) nº 3336201501207750, PEF n.º 3336201501263544, PEF n.º 3336201701048716 PEF n.º 3336201801091948 e PEF n.º 3336201901044265, reclamou daqueles atos materiais de compensação de dívidas. O Tribunal Tributário de Lisboa julgou a reclamação procedente, decisão com a qual se não conforma agora a Autoridade Tributária e Aduaneira e da qual interpôs o presente recurso. Nas alegações de recurso defende que se verifica o erro na forma de processo eleita pela Executada e ora Recorrida, porquanto deveria, em seu entender, ter sido instaurada sim ação para reconhecimento de um direito, processo que seria o adequado para o conhecimento da legalidade do ato de compensação. Nas contra-alegações defende a Recorrida ser esta a forma de processo adequada e ainda que, tendo a Recorrente suscitado esta questão apenas em sede de recurso jurisdicional, a mesma já não poderá ser conhecida. Quanto a este último argumento diremos desde já que a questão relativa ao erro na forma do processo foi conhecida na sentença recorrida, sentença essa de que recorre a Fazenda Pública. Vejamos, então: Como é por demais consabido e tal como alegado pelas partes, o erro na forma de processo ocorre sempre que a forma processual escolhida não corresponde à natureza ou valor da ação e constitui nulidade, de conhecimento oficioso: artigo 193º e 196º do Código de Processo Civil (CPC). O erro na forma de processo afere-se pelo pedido ou pretensão que o autor pretende obter do tribunal com o recurso à ação. Entretanto, o pedido é o efeito jurídico que se pretende obter com a ação, ou seja, a finalidade, o resultado, a providência que se quer alcançar: artigo 581/3 do CPC. No caso em análise, o pedido formulado na petição inicial apresentada em juízo formalmente é de extinção dos processos de execução fiscal com todas as consequências legais, designadamente, o processamento do reembolso das quantias compensadas e respetivos juros moratórios. Ora, é em função destes pedidos que tem que se aferir se o meio processual utilizado é o adequado ao fim por ele visado. Assim, se o pedido formulado pelo autor não se ajusta à finalidade abstratamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo. Relembremos que o pedido abstratamente formulado na petição de reclamação é de extinção dos processos de execução fiscal e tal como decidido na sentença recorrida o meio processual adequado para dele conhecer é a oposição, como se verá infra. Na sentença recorrida atendeu-se ainda ao pedido implícito. Da sentença recorrida, transcreve-se o seguinte segmento: (…) quanto ao pedido da Reclamante consubstanciado na extinção dos PEF, cumpre fazer uma ressalva. É a oposição à execução fiscal o meio processual adequado ao pedido de extinção de PEF; contudo, ainda que a Reclamante formule este pedido a final, decorre da análise da petição que a verdadeira pretensão da Reclamante é a de anulação das compensações efetuadas e consequente reembolso dos montantes aplicados nos PEF – sendo este o pedido implícito e, aliás, adequado à forma de processo utilizada (cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 29/05/2014, exarado no proc. n.º 514/05, disponível em www.dgsi.pt). Com efeito, nos presentes autos, a Reclamante insurge-se contra as compensações feitas nos PEF n.º 3336201501207750 e apensos, operadas através da utilização de montantes que lhe haviam sido reembolsados no PEF n.º 3441200601037595, não existindo, assim, erro na forma do processo quanto a este pedido, cabendo ao Tribunal conhecer da legalidade dessas compensações, por forma a assegurar a tutela jurídica efetiva. A propósito da relevância do pedido implícito, veja-se, nomeadamente, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 14/08/2019, exarado no proc. n.º 997/19.7BEBRG e o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 30/09/2020, exarado no proc. n.º 2589/19.1BELRS, disponíveis em www.dgsi.pt. Vejamos: Como já referimos supra, defende a ora Recorrente nas alegações de recurso, na conclusão H), que o processo adequado seria a ação para reconhecimento do direito do contribuinte, citando Jorge Lopes de Sousa. Todavia, refira-se desde já que na mesma anotação 12 ao artigo 89º do Código de Procedimento Processo Tributário (CPPT), prossegue o insigne Autor: «(…) Em situações deste tipo, em que não for razoável exigir-se ao contribuinte que conhecesse a inexistência de acto, será admissível que use um meio impugnatório, que será a acção administrativa especial (se a actuação da Administração ocorreu fora do processo de execução fiscal), ou a reclamação prevista no art. 276.° do CPPT (se a afectação ocorreu no âmbito de um processo de execução fiscal). (…) » Diz o artigo 276º CPPT, com a redação introduzida pela Lei nº109-B/2001 de 27 de dezembro: As decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afetem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro são suscetíveis de reclamação para o tribunal tributário de l.ª instância. Assim não merece censura o decidido porquanto resulta da petição que a Reclamante e ora Recorrida veio reagir contra os atos de compensação praticados no processo de execução fiscal que se traduziram na aplicação dos créditos/reembolsos que resultaram da execução da sentença no pagamento de dívidas exequendas. Ora, desde já diremos que os autos não padecem da nulidade de erro na forma do processo, porquanto esta é a forma processual adequada para a Contribuinte reagir contra os atos de compensação de créditos efetuada por iniciativa da administração fiscal e no âmbito de uma execução fiscal. Nesse sentido veja-se a jurisprudência da qual citamos a título meramente exemplificativo o Ac. STA de 2012.01.18, Proc nº 0245/11, disponível em www.dgsi.pt, com o qual concordamos e para cuja fundamentação remetemos, no qual se decidiu que tal pedido é compatível com o processo de “reclamação dos actos do órgão da execução fiscal”. Termos em que, sem necessidade de mais fundamentar, improcedem as conclusões D) a I) das alegações de recurso. Prosseguindo: Como enunciado supra, a Recorrente não se conforma com a decisão que determinou a anulação dos atos de compensação praticados no âmbito dos processos de execução fiscal, alegando que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto por não ter valorado devidamente prova documental carreada pela Fazenda Pública e de direito por incorreta interpretação das normas legais aplicáveis ao caso. Na verdade e como alega a Recorrida, quando impugna a matéria de facto, a Recorrente tem de cumprir os ónus que sobre si impendem, sob pena de rejeição do recurso [artigo 640º, n.º 1, alíneas a) a c) e n.º 2, alínea a) do CPC, aplicável ex vi artigo 281º CPPT], cabendo à Recorrente especificar: a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas quanto aos indicados pontos da matéria de facto; Nas alegações de recurso a Recorrente não indicou nas respetivas conclusões, nem nas alegações, com a precisão que lhe era exigida, os factos que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios que imporiam decisão diferente, e a decisão que, no seu entender pretende aditar, pelo que, desde já diremos que não se considera cumprida esta obrigação que sobre si recaía. Iniciando a apreciação por esta última, a Recorrente não impugna a matéria de facto decorrente da prova documental, não requer qualquer aditamento por complementação ou substituição, apenas convoca um erro de julgamento no sentido de que deveria ter sido valorada de forma distinta a prova documental constante dos autos. Com efeito, mesmo atendendo às considerações vertidas nas conclusões das alegações de recurso, a ora Recorrente além de não concretizar os factos que considera incorretamente julgados estas não são de molde a sustentar qualquer alteração à matéria de facto assente. A ora Recorrente não cumpriu assim o ónus que sobre si recaía de concretização dos segmentos que considera erradamente julgados quer de indicação dos meios de prova que determinam uma decisão diversa GERALDES, António Santos et altri, CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: ANOTADO, i Vol., 2ª Ed., Almedina, pág. 797. De resto, o Tribunal a quo valorou de forma fundamentada e devidamente pormenorizada as razões que lhe permitiram fixar a factualidade constante probatório, permitindo sindicar quais as razões que fundaram o iter cognoscitivo, relevando os aspetos basilares dos documentos em que alicerçou a decisão da matéria de facto. Assim, e sem necessidade de mais fundamentar, improcede o alegado erro de julgamento da matéria de facto. Vejamos agora, em linhas necessariamente breves e quase esquemáticas, o que neste âmbito se deve entender por compensação de dívidas e qual a sua regulamentação. A compensação no direito civil é uma causa de extinção das obrigações além do cumprimento prevista no artigo 847.º do Código Civil, onde no nº 1 se estipula: Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor (...)”. A compensação, no CPPT, configura-se também como um modo geral de extinção da obrigação fiscal diferente do cumprimento NABAIS, José Casalta, DIREITO FISCAL, Almedina, 2ª Ed., pág. 278..
Entretanto, de acordo com a alínea A) dos factos provados as dívidas a extinguir pela compensação efetuada, estavam a ser exigidas nos processos de execução fiscal (PEF) n.º 3336201501207750, PEF n.º 3336201501263544, PEF n.º 3336201701048716 PEF n.º 3336201801091948 e PEF n.º 3336201901044265. * Relativamente à condenação em custas importa considerar que nos termos dos artigos 527/1 CPC: a decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa (…). Assim, atento o princípio da causalidade, consagrado no artigo 527/2, do CPC, aplicável por força do artigo 2º, alínea e), do CPPT, as custas são pela Recorrente, que ficou vencida. Por fim, e tendo em consideração que o valor da causa foi fixado em € 990 737,89, considerando a conduta processual das partes a atividade desenvolvida no processo, visto o princípio da proporcionalidade, concluímos que no caso vertente se verificam os pressupostos para a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça do artigo 6/7 do RCP. Sumário/Conclusões: I. No CPPT, a compensação configura-se como um modo geral de extinção da obrigação fiscal diferente do cumprimento. II. A compensação, por iniciativa da administração tributária, está condicionada à prévia prática de ato que declare a compensação. III. Este ato administrativo que determinou a compensação de dívidas, para ser eficaz, tinha que ser previamente comunicado à Executada, por forma a permitir o exercício dos meios de reação que a lei lhe propicia III - Decisão Termos em que, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida. Custas pela Recorrente que decaiu, com dispensa do remanescente da taxa de justiça nesta instância, nos termos expostos. Lisboa, 2 de fevereiro de 2023 Susana Barreto Tânia Meireles da Cunha Jorge Cortês |