Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:842/13.7 BELRA
Secção:CA
Data do Acordão:02/17/2022
Relator: PEDRO NUNO FIGUEIREDO
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
PEDIDO DE SUBSTITUIÇÃO DA GARANTIA BANCÁRIA
LICENCIAMENTO DE OPERAÇÃO URBANÍSTICA
INTIMAÇÃO JUDICIAL; EMISSÃO DE ALVARÁ
Sumário:I. A falta de pronúncia sobre pedido de substituição da garantia bancária não configura violação da lei, caso assente em motivo razoável e válido, tenha sido omitido o pagamento das taxas devidas por emissão do alvará e a requerente se abstenha de esclarecer qual dos pedidos de licenciamento de operação urbanística para a mesma área se deve manter.

II. A intimação judicial prevista no artigo 112.º do RGEU configura-se como o meio adequado para obstar à omissão de decisão de pedido de alvará.

III. A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos e agentes assenta nos mesmos parâmetros do conceito civilístico da responsabilidade civil extracontratual, exigindo-se a verificação cumulativa dos pressupostos facto, ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade entre o facto e o dano.

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO
Construções J...., Lda., entretanto representada pelo Administrador de Insolvência da respetiva Massa Insolvente, intentou ação administrativa comum sob a forma ordinária contra o Município de Abrantes, com vista a obter a condenação do réu no pagamento de indemnização, nos montantes de:
i) € 193 719,00, correspondente aos encargos financeiros que a autora foi obrigada a suportar para fazer face aos custos de financiamento contraído junto da Caixa ...... e que, não fora a atuação ilícita e culposa do réu, não teria de suportar pelo menos desde 01.01.2007, com encargos com o projeto e alterações ao projeto; e de
ii) € 6 500 000,00, a título de lucros cessantes, quantia correspondente à rentabilização do capital (remuneração do capital imobilizado) que a autora poderia e deveria ter recebido até 31.12.2012 (época provável para final da construção e venda) caso o réu não tivesse atuado de forma ilícita e culposa.
Por decisão de 06/06/2019, o TAF de Leiria julgou a ação totalmente improcedente e absolveu o réu do pedido.
Inconformada, a autora interpôs recurso desta decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
“1. A sentença recorrida, ao julgar improcedente a ação administrativa comum intentada pela Recorrente, consubstanciou erro sobre os factos e uma errada interpretação e aplicação da Lei.
— DO ERRO SOBRE OS FACTOS
DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADA
a. Facto 2.1 da sentença recorrida
2. A Recorrente considera incorretamente julgado especificamente o facto de o Tribunal ‘a quo’ não ter dado como provado que a Recorrente recebeu uma proposta a 20/09/2006, pela Sociedade S......, de € 1.500.000,00 a par da entrega de 20 fogos (cfr. art.° 640.°, n.° 1, al. a) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
3. O depoimento da testemunha P...... (sócio gerente da sociedade insolvente Construções J...., Lda.) surge, nesta sede, como o concreto meio probatório que impunha uma decisão, sobre o referido ponto de facto impugnado, diversa da recorrida (cfr. art.° 640.°, n.° 1, al. b) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
4. O referido depoimento decorreu de forma isenta, esclarecida e assertiva, durante a tarde da primeira sessão da audiência final realizada no dia 21/11/2016 e foi gravado com início aos 04:00:04 e termo aos 05:27:57.
5. A referida testemunha afirma expressamente, no minuto 04:37:47, “Então... a S......, acho que era € 1.500.000,00 e 20 fogos acho eu... qualquer coisa assim ou € 2.000.000,00 e 20 fogos, não sei precisar muito bem. Depois havia outras propostas também.” - cfr. transcrição supra dos excertos relevantes (cfr. art.° 640.°, n.° 2, al. a) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
6. Deste depoimento resulta claro que a Sociedade S...... apresentou uma proposta à Recorrente no montante de € 1.500.000,00 pela entrega de 20 fogos, pelo que, nesta matéria, se impunha ter dado como provado o referido facto.
7. A prova deste facto assume decisiva relevância ao conduzir a uma decisão diversa em matéria de verificação de danos (nomeadamente, da sua contabilização) causados pelas atuações do Recorrido em discussão nos presentes autos.
8. Ora, tendo em conta que, a seguir (ponto B. b) e ponto B. c) do presente recurso), também se requer que seja dado como provado que:
a ação judicial intentada em 2009 pelo Recorrido versava sobre um prédio que fazia parte do projeto de loteamento denominado "Encosta Norte”, aprovado pela Câmara Municipal de Abrantes; e
a frustração dos negócios com vários promotores imobiliários interessados no loteamento denominado ‘Encosta do Norte’ se deveu, em exclusivo, ao diferendo entre a Recorrente e o Recorrido relativo ao prédio rústico controvertido,
9. A prova, ora requerida, de que a Sociedade S...... apresentou uma proposta à Recorrente no montante de € 1.500.000,00 pela entrega de 20 fogos, conduzirá necessariamente a uma decisão de verificação do nexo de causalidade entre a instauração da aludida ação judicial e a frustração deste negócio e, consequentemente, a uma decisão de verificação do correspondente dano (no montante de € 1.500.000,00).
10. Portanto, a decisão que deve ser proferida sobre a questão de facto ora impugnada será, em última instância, a decisão de que, no caso dos presentes autos, se encontra verificado o nexo de causalidade entre a instauração da aludida ação judicial e a frustração deste negócio e, consequentemente, o correspondente dano (no montante de € 1.500.000,00) (cfr. art.° 640.°, n.° 1, al. c) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
11. E mediante a verificação do pressuposto do nexo de causalidade e do dano juntamente com a verificação dos demais pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Recorrido, impõe-se ao Tribunal a decisão de procedência da presente ação e, consequentemente, a condenação do Recorrido na indemnização peticionada pela Recorrente (sendo certo que a verificação do dano e do seu exato montante é particularmente decisiva para a determinação do quantum indemnizatório).
b. Facto 2.2 da sentença recorrida
12. A Recorrente considera incorretamente julgado especificamente o facto de o Tribunal ‘a quo’ não ter dado como provado que a ação judicial intentada em 2009 pelo Recorrido versava sobre um prédio que fazia parte do projeto de loteamento denominado ‘Encosta Norte’ aprovado pela Câmara Municipal de Abrantes (cfr. art.° 640.°, n.° 1, al. a) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
13. O depoimento das testemunhas A...... (responsável técnico pelo loteamento ‘Encosta Norte’), M...... (responsável pela parte das engenharias do loteamento "Encosta Norte”) e P...... (sócio gerente da sociedade insolvente Construções J...., Lda.) surgem, nesta sede, como os concretos meios probatórios que impunham uma decisão, sobre o referido ponto de facto impugnado, diversa da recorrida (cfr. art.° 640.°, n.° 1, al. b) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
14. Os referidos depoimentos decorreram de forma isenta, esclarecida e assertiva, durante a primeira sessão da audiência final realizada no dia 21/11/2016 (os dois primeiros durante a manhã e o terceiro durante a tarde).
15. O depoimento da testemunha A...... foi gravado com início aos 00:03:02 e termo aos 01:50:15, afirmando a testemunha nos minutos 00:10:25, 00:10:47, 00:12:48, 00:12:51 e 00:13:27, que o prédio controvertido não foi retirado do referido projeto de loteamento, constando do projeto aprovado como ‘parte restante’ (cfr. transcrição supra dos excertos relevantes (cfr. art.° 640.°, n.° 2, al. a) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
16. Por sua vez, o depoimento da testemunha M...... foi gravado com início aos 02:21:34 e termo aos 03:29:22, afirmando também a testemunha no minuto 02:29:34 que a parcela controvertida sempre esteve no loteamento, mas que não tinha desenho urbano em cima (cfr. transcrição supra dos excertos relevantes (cfr. art.° 640.°, n.° 2, al. a) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
17. Finalmente, o depoimento da testemunha P...... foi gravado com início aos 04:00:04 e termo aos 05:27:57, afirmando a testemunha no minuto 04:06:45 que a parcela objeto de litígio nunca deixou de fazer parte do projeto de loteamento (cfr. transcrição supra dos excertos relevantes (cfr. art.° 640.°, n.° 2, al. a) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
18. Desses depoimentos resulta claro que o prédio controvertido nunca foi retirado do referido projeto de loteamento ‘Encosta Norte’ e versando a ação judicial sobre o prédio controvertido, impunha-se, nesta matéria, ter dado como provado que a ação judicial intentada em 2009 pelo Recorrido versava sobre um prédio que fazia parte do projeto de loteamento denominado "Encosta Norte”, aprovado pela Câmara Municipal de Abrantes.
19. A prova deste facto assume decisiva relevância ao conduzir a uma decisão diversa em matéria de verificação do nexo de causalidade entre a aludida ação judicial e a frustração das propostas de alienação de fogos integrantes do projeto "Encosta Norte”.
20. Ora, tendo em conta que, mais adiante (ponto B. c) do presente recurso), também se requer que seja dado como provado que a frustração dos negócios com vários promotores imobiliários interessados no loteamento denominado ‘Encosta do Norte’ se deveu, em exclusivo, ao diferendo entre a Recorrente e o Recorrido relativo ao prédio rústico controvertido,
21. A prova, ora requerida, de que a aludida ação judicial versava sobre um prédio que fazia parte do projeto de loteamento denominado ‘Encosta Norte’ conduzirá necessariamente a uma decisão de verificação do referido nexo de causalidade.
22. Portanto, a decisão que deve ser proferia sobre a questão de facto ora impugnada será, em última instância, a decisão de que, no caso dos presentes autos, se encontra verificado o nexo de causalidade entre a aludida ação judicial e a frustração das propostas de alienação de fogos integrantes do projeto ‘Encosta Norte’ (cfr. art.° 640.°, n.° 1, al. c) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
23. E, mediante a verificação do pressuposto do nexo de causalidade juntamente com a verificação dos demais pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Recorrido, impõe-se ao Tribunal a decisão de procedência da presente ação e, consequentemente, a condenação do Recorrido na indemnização peticionada pela Recorrente.
c. Facto 2.4 da sentença recorrida
24. A Recorrente considera, também, incorretamente julgado especificamente o facto de o Tribunal ‘a quo’ não ter dado como provado que a frustração dos negócios com vários promotores imobiliários interessados no loteamento denominado ‘Encosta do Norte’ (nomeadamente, com a V...... e com o Gabinete 7......, Lda.) se deveu, em exclusivo, ao diferendo entre a Recorrente e o Recorrido com referência ao prédio rústico, sito no O......, na freguesia de São Vicente, no concelho de Abrantes, com a área total de 2 040 m2, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ….., da secção G, resultante do prédio n.° …. (cfr. art.° 640.°, n.° 1, al. a) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
25. Os depoimentos das já referidas testemunhas A......, M...... e P...... são, também nesta sede, os concretos meios probatórios que impunham uma decisão, sobre o referido ponto de facto impugnado, diversa da recorrida (cfr. art.° 640.°, n.° 1, al. b) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
26. O depoimento da testemunha A...... foi gravado com início aos 00:03:02 e termo aos 01:50:15, afirmando a testemunha nos minutos 00:29:57 e 00:31:12 que uma das condições da proposta apresentada por M...... consistia na resolução do diferendo sobre a parcela controvertida (cfr. transcrição supra dos excertos relevantes (cfr. art.° 640.°, n.° 2, al. a) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
27. O mesmo afirmou a testemunha M...... nos minutos 02:51:08, 02:51:47 e 02:52:15, cujo depoimento foi gravado com início aos 02:21:34 e termo aos 03:29:22 (cfr. transcrição supra dos excertos relevantes (cfr. art.° 640.°, n.° 2, al. a) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
28. Finalmente, o depoimento da testemunha P...... foi gravado com início aos 04:00:04 e termo aos 05:27:57, afirmando a testemunha ao minuto 04:38:57 que M...... referira, na proposta de negócio, que tinha que estar resolvido o litígio com o Recorrido sobre a posse do terreno controvertido e ao minuto 04:39:47 que, por causa desse diferendo, o negócio foi por água abaixo (cfr. transcrição supra dos excertos relevantes (cfr. art.° 640.°, n.° 2, al. a) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
29. Destes depoimentos resulta claro que a frustração dos negócios com vários promotores imobiliários interessados no loteamento denominado ‘Encosta do Norte’ se deveu, em exclusivo, ao diferendo entre a Recorrente e o Recorrido relativo ao referido prédio rústico controvertido, pelo que, nesta matéria, se impunha ter dado como provado o referido facto.
30. A prova deste facto, também, assume decisiva relevância ao conduzir a uma decisão diversa em matéria de verificação do nexo de causalidade entre a aludida ação judicial (diferendo entre a Recorrente e o Recorrido relativo ao referido prédio rústico controvertido) e a frustração das propostas de alienação de fogos integrantes do projeto ‘Encosta Norte’.
31. Ora, tendo em conta que, acima (ponto B. b) do presente recurso), também se requereu que seja dado como provado que a ação judicial intentada em 2009 pelo Recorrido versava sobre um prédio que fazia parte do projeto de loteamento denominado ‘Encosta Norte’, aprovado pela Câmara Municipal de Abrantes.
32. A prova, ora requerida, de que a frustração dos negócios com vários promotores imobiliários interessados no loteamento denominado ‘Encosta do Norte’ (nomeadamente, com M......) se deveu, em exclusivo, ao diferendo entre a Recorrente e o Recorrido relativo ao referido prédio rústico controvertido impõe, também, nesta sede, ao Tribunal uma decisão de verificação do respetivo nexo de causalidade (cfr. art.° 640.°, n.° 1, al. c) do CPC ex vi art.° 140.°, n.° 3 do CPTA).
33. Reiterando-se que a verificação do pressuposto do nexo de causalidade juntamente com a verificação dos demais pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Recorrido, que se demonstrarão ao longo do presente recurso, impõem ao Tribunal a decisão de procedência da presente ação e, consequentemente, a condenação do Recorrido na indemnização peticionada pela Recorrente.
DA ERRADA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA LEI:
DA VERIFICAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
a. Do facto ilícito e culposo
i. Da falta de emissão de alvará
34. Andou mal o Tribunal ‘a quo’ ao ter julgado que a falta de emissão de alvará não consubstanciou a prática de um facto ilícito e culposo por parte da Recorrida.
Senão vejamos,
35. A caducidade constante do art.° 71.° do RJUE não consubstancia uma caducidade preclusiva, mas antes uma caducidade por incumprimento que associada uma margem de discricionariedade da Administração, que deve apreciar as causas concretas do incumprimento de modo a considerar a prorrogação do prazo ou a reabilitação do direito.
36. Por isso, nem vale o argumento de que, até 01/03/2008, ao abrigo do RJUE (anterior à redação da Lei n.° 60/2007, de 04 de setembro), a Lei não exigia que o Recorrido tivesse declarado a caducidade do licenciamento do loteamento ‘Encosta Norte’, porque, à Administração sempre caberia verificar se o efeito extintivo da caducidade se mostraria, no caso concreto, adequado e exigível, à luz do princípio da proporcionalidade, atendo aos bens jurídicos em causa e ao interesse público.
37. A factualidade apurada nos autos demonstra, antes, que a licença referente ao loteamento ‘Encosta Norte’ não se encontrava caducada aquando do requerimento de emissão de alvará da Recorrente (05/12/2006).
38. Tanto assim é que, em data posterior (13/06/2008), o Recorrido emitiu um Parecer, nos termos do qual sugeria que a Recorrente requeresse o arquivo do processo de loteamento ‘Encosta Norte’ atenta a entrada de um novo processo de loteamento Ofélia Club para o mesmo local (cfr. ponto 1.62 e ponto 1. 63) dos factos provados da sentença recorrida), o que denota que o mesmo se encontraria, nessa altura, pendente e válido.
39. A Recorrente nunca anuiu no sugerido arquivamento, o que ficou demonstrado pela ausência de resposta àquela sugestão de arquivamento do Recorrido (cfr. ponto 1.66) dos factos provados da sentença recorrida).
40. Mais tarde, o Recorrido volta a confirmar que o processo de loteamento ‘Encosta Norte’ não se encontra caducado quando, em 16/11/2009, elabora uma informação, nos termos da qual refere que aquele processo de loteamento se encontra pendente desde 03/07/2008 (cfr. ponto 1.67 dos factos provados da sentença recorrida).
41. Posteriormente, em 26/01/2010, a Recorrente informou expressamente o Recorrido que nunca requereu a suspensão, nem o arquivamento do processo de loteamento ‘Encosta Norte’ e que mantinha todo o interesse na sua prossecução, reiterando, ainda, o pedido de emissão de alvará da 1a fase requerido em 2006 (cfr. ponto 1.70) dos factos provados da sentença recorrida).
42. Tanto que o Recorrido, em 10/03/2010, elaborou uma nova informação, nos termos da qual, reconhecendo nunca ter apreciado, nem respondido à questão colocada pela Recorrente acerca da prestação de caução; que não é qualquer silêncio do particular, decorrido o prazo legal, que consubstancia desistência silente, como facto extintivo do procedimento; que a paralisação há de respeitar a uma formalidade indispensável à sequência do procedimento, entendeu não poder considerar-se verificada a deserção do procedimento e propõe a notificação do particular para se pronunciar sobre qual processo pretende manter em curso (‘Encosta Norte’ ou ‘Ofélia Club’) (cfr. ponto 1.71) e ponto 1.72) dos factos provados da sentença recorrida).
43. Acontece, ainda, que, nos termos da referida informação, o Recorrido ordenava a advertência da Recorrente de que não poderia dar seguimento ao procedimento e apreciar o pedido de emissão de alvará de loteamento e de prestação de caução sobre imóveis, apresentado em 06/12/2006, enquanto o particular não se pronunciar nos termos solicitados (cfr. ponto 1.71) e ponto 1.72) dos factos provados da sentença recorrida), donde resulta que, pronunciando-se a Recorrente nos termos solicitados, sempre poderia e deveria o Recorrido dar seguimento ao procedimento e apreciar o pedido de emissão de alvará de loteamento e de prestação de caução sobre imóveis!
44. O aludido processo de loteamento ‘Encosta Norte’ não estava, pois, caducado em 2010 e, ainda, menos na data do requerimento de emissão de alvará em 2006.
45. A falta de pagamento das taxas não justifica a recusa da emissão do alvará atentas as circunstâncias do caso concreto, uma vez que, tendo a Recorrente requerido, em 05/12/2006, a substituição da garantia bancária no valor de € 856.258,38 por caução sobre bens imóveis propriedade do requerente (cfr. requerimento da Recorrente junto como Doc. n.° 24 da petição inicial), facilmente se compreende que a Recorrente aguardasse, primeiramente, por uma resposta relativamente à substituição requerida para, depois, prosseguir com o pagamento da taxa também de valor considerável (€ 104.515,32).
46. Além disso, a falta de resposta da Recorrente em relação ao pedido de substituição da garantia bancária por caução sobre bens imóveis propriedade da Recorrente sempre consubstanciaria - ao contrário do julgado pelo Tribunal ‘a quo’ - senão violação de lei, pelo menos, omissão do dever de pronúncia ou de decisão (cfr. art.° 9.°, n.° 1, als. a) e b) do ‘CPA velho’.
47. Sendo que - ao contrário do que o Tribunal ‘a quo’ julgou - o requerimento da Recorrente de 05/12/2006 preencheu os devidos pressupostos procedimentais (cfr. art.° 74.°, n.° 1 do CPA velho) (cfr. requerimento da Recorrente junto como Doc. n.° 24 da petição inicial).
48. Também - contrariamente ao julgado pelo Tribunal ‘a quo’ - a conduta procedimental da Recorrente por ter dado entrada nos serviços do Recorrido, para a mesma área e prédio, um novo pedido de licenciamento para outra operação urbanística ‘Ofélia Club’ não justifica a falta de emissão de alvará.
49. A dinâmica das comunicações emitidas pelo Recorrido à Recorrente acima elencadas demonstram que o referido novo pedido, em 28/05/2008, não teve o efeito de desistência do processo de loteamento ‘Encosta do Norte’.
50. Além disso, a dinâmica factual veio evidenciar a preferência do Recorrido pela prossecução do projeto de loteamento ‘Ofélia Club’ em detrimento do projeto de loteamento ‘Encosta Norte’, escudando-se, essencialmente, no valor económico e social e no interesse público daquele projeto para o concelho (cfr. depoimentos, nomeadamente, das testemunhas P......, J...... e N......).
51. Tanto assim é que foi o próprio Recorrido a apresentar o projeto de loteamento ‘Ofélia Club’ à Recorrente (cfr. depoimento da testemunha J......).
52. Também a testemunha P...... (sócio e gerente da Recorrente) justificou a entrada do novo projeto de loteamento ‘Ofélia Club’ (apesar de se encontrar em curso o projeto ‘Encosta Norte’) com o facto de se tratar de um negócio promovido pela Câmara, onde pesou também o facto da Recorrente não querer ficar mal com ninguém (incluindo com o Município Recorrido).
53. Consta, inclusivamente, dos factos provados da sentença recorrida, que já em 2006, tinham ocorrido nas instalações do Recorrido uma reunião sobre a possibilidade de se instalar no local objeto do projeto de loteamento ‘Encosta Norte’ um projeto de loteamento denominado ‘Ofélia Club’ (cfr. ponto 1.53 dos factos provados da sentença recorrida).
54. Muito antes ainda da sociedade P......, Lda. ter dado entrada ao projeto de loteamento ‘Ofélia Club’ (2008), já o Recorrido tinha cedido património municipal àquela promotora por deliberação de 29/02/2007 da Assembleia Municipal de Abrantes com vista à criação de espaços verdes e de equipamentos (cfr. ponto 1.55) dos factos provados da sentença recorrida)!
55. Facto este que deixa bem claro o notório interesse do Recorrido na prossecução do projeto de loteamento ‘Ofélia Club’ em detrimento de qualquer um que versasse sobre o mesmo local (entre os quais, o projeto de licenciamento ‘Encosta Norte’ que até tinha dado entrada primeiro).
56. Por isso - ao contrário do julgado pelo Tribunal ‘a quo’ - decorre antes da dinâmica factual que o Recorrido não terá deixado de emitir o alvará do primeiro loteamento da Recorrente (e de se pronunciar sobre o pedido de substituição da garantia bancária) porque isso lhe fosse imposto pelo dever de cuidado e pelo princípio da legalidade urbanística, mas antes porque o Recorrido teria preferência e interesse direto na prossecução do novo projeto de loteamento ‘Ofélia Club’ em detrimento do anterior projeto de loteamento ‘Encosta Norte’ (cfr. expressamente sugerido pela testemunha M......).
57. O exposto - ainda que se entendesse não consubstanciar vício de Lei - sempre consubstanciaria, no campo da discricionariedade, desvio de poder por se mostrar o motivo determinante da atuação do Recorrido para a não emissão de alvará e não apreciação do pedido de substituição de garantia bancária, no âmbito do projeto de loteamento ‘Encosta Norte’, não condizente com o objetivo da Lei, que impunha ao Recorrido ter dado resposta ao requerimento da Recorrente e notificando-a da correspondente decisão.
58. A Recorrente nunca foi notificada de qualquer apreciação (nem de qualquer pretenso indeferimento) do seu requerimento de substituição da garantia bancária, tendo inclusivamente sido criada na sua esfera jurídica a expetativa de tal apreciação vir a ocorrer durante o ano de 2010 (cfr., novamente, a informação de 10/03/2010 e consequente despacho de 23/03/2010, nos termos do qual o Recorrido admitia expressamente que, mediante pronúncia da Recorrente no sentido de prossecução do procedimento de loteamento ‘Encosta do Norte’, daria sequência ao mesmo, apreciando o pedido de emissão de alvará de loteamento e de prestação de caução sobre imóveis requeridos em 05/12/2006 (cfr. ponto 1.71) e ponto 1.72 dos factos provados da sentença recorrida).
59. A negociação da Recorrente com potenciais promotores de operações urbanísticas sobre os prédios objeto do processo de loteamento ‘Encosta Norte’ nunca colidiu necessariamente com o interesse da Recorrente na emissão do alvará e concretizar-se sempre obedeceria a todas as normas legais.
60. Também não merece censura o facto de a Recorrente não ter lançado mão, em tempo, de qualquer mecanismo legal para debater a liquidação da taxa e para obrigar o Recorrido a decidir, pois assim o justificou a importância fundamental da manutenção de um bom relacionamento com um Município (como é o caso do Recorrido), nomeadamente, quando o particular (como é o caso da Recorrente) atua na área da construção e do imobiliário (cfr. depoimento das testemunhas A......, M...... e P......), que no caso concreto, já sofria com a controvérsia da propriedade relativa à parcela de terreno de 1627 m2.
61. Por conseguinte, ainda que se entendesse - o que não se concede e só se admite por mero dever de patrocínio - que não tinha havido violação de lei por não estar a atuação do Recorrido vinculada a regras jurídicas determinadoras do seu concreto modo de agir, ainda assim sempre se diria que, no campo próprio da discricionariedade administrativa, a Recorrida teria cometido desvio de poder e violado os princípios de justiça, de igualdade e de imparcialidade, de proporcionalidade e de tutela da confiança e da boa-fé que enformam a mencionada discricionariedade, nos termos acima explanados.
ii. Da instauração de ação de reivindicação de propriedade
62. Andou, igualmente, mal o Tribunal "a quo” ao ter julgado que a instauração pela Recorrida, em 14/10/2009, de uma ação de reivindicação de propriedade sobre o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 7…. da freguesia de São Vicente e registado pela descrição n.º 040….. (doravante, ‘parcela controvertida’), e que foi julgada improcedente, não consubstanciou a prática de um facto ilícito e culposo por parte da Recorrida.
Senão vejamos,
63. A Recorrente procurou resolver a controvérsia da propriedade relativa à parcela controvertida sem o recurso à via judicial, fornecendo, ao longo dos anos (desde o conhecimento da reclamação de propriedade por parte da M......) ao Recorrido todos os necessários meios de prova da propriedade da Recorrente (cfr. correspondência junta como Doc. n.° 30 da petição inicial e depoimento da testemunha P......).
64. Ainda que o recurso à tutela jurisdicional efetiva possa consubstanciar um direito do Recorrido, não o desonera, contudo, dos deveres de segurança no tráfego, que visam evitar a ocorrência de danos, sob pena de abuso de direito.
65. A factualidade apurada nos autos demonstra que o Recorrido agiu com manifesta violação dos princípios da legalidade, da igualdade, da imparcialidade, da proporcionalidade, da tutela da confiança e da boa-fé e em desvio de poder.
66. É que o Recorrido veio a atuar, ao longo, dos anos, com o intuito direto de se apropriar da propriedade da parcela controvertida.
67. O próprio procedimento de aquisição da parcela de terreno controvertida demonstra a má-fé do Recorrido, pois sempre este soube que o referido imóvel não era sua propriedade (até porque recaía sobre essa parcela uma hipoteca a favor da Caixa ......(cfr. contrato de empréstimo bancário com hipoteca junto como Doc. n.° 27 da petição inicial)!
68. O documento (planta de implantação) que sustentou a aquisição do imóvel por parte do Recorrido (permuta com M......) não continha qualquer indicação de aprovação e certificação das entidades competentes (cfr. Doc. n.° 25 da petição inicial), mostrando-se falso (cfr. depoimento da testemunha A......).
69. Tanto que a Recorrente apresentou, em 31/08/2009, uma reclamação com pedido de intervenção do senhor Provedor de Justiça e, em 11/09/2010, uma denúncia contra o Recorrido (processo de inquérito n.° 623/0.0TABBT), referentes à prática de um crime de falsificação de documentos (cfr. ponto 1.104), ponto 1.105) e ponto 1.106) dos factos provados da sentença recorrida, Doc. n.° 29 e Doc. n.° 28 da petição inicial).
70. Resulta dos factos provados da sentença recorrida, que o Recorrido intentou contra a sociedade M...... uma ação (processo n.° 818/13.4TBABT), no âmbito do qual obteve a homologação por sentença de uma transação em que autor (Recorrido) e ré (M......) reconheciam que o Recorrido seria o dono e legítimo possuidor da parcela controvertida (cfr. ponto 1.22) dos factos provados) - ação em que a Recorrente não interveio (cfr. ponto 1.24) dos factos provados).
71. Ainda, assim, no âmbito da ação de reivindicação de propriedade que o Recorrido instaurou, em 2009, contra a Recorrente, o Recorrido não se coibiu de alegar que se encontrava munido de uma sentença que lhe reconhecia a propriedade da parcela controvertida, o que naturalmente foi desatendido pelo Tribunal (cfr. ponto 1.24) dos factos provados).
72. A conduta do Recorrido descrita violou o princípio da legalidade, que impõem aos órgãos da Administração Pública obediência Lei e ao direito (cfr. art.° 3.°, n.° 1 do CPA velho).
73. Além disso, ao realizar a permuta sobre a parcela controvertida, o Recorrido sabia (ou não podia ignorar) o dano reputacional que seria causado à Recorrente e, consequentemente, ao projeto de loteamento ‘Encosta Norte’.
74. O Recorrido assumiu a posição de parte interessada, com um interesse conflituante ao da Recorrente - conflito este que se veio logo a concretizar quando o Recorrido solicitou à Recorrente que retirasse a parcela controvertida do projeto de loteamento ‘Encosta Norte’ (cfr. ponto 1.36) e ponto 1.37 dos factos provados da sentença recorrida), cometendo, aqui, desvio de poder e violou o princípio da legalidade (prosseguindo fins individuais) assim como o princípio da igualdade (cfr. art.° 5.° do CPA velho) e da imparcialidade (cfr. art.° 6.° do CPA velho), uma vez que tinha um interesse próprio no projeto que ultrapassava a simples prossecução do interesse público (cfr. depoimento da testemunha A......).
75. A perceção da existência de um risco regulatório no âmbito do projeto de loteamento ‘Encosta Norte’ não se iniciou apenas com a propositura da ação de reivindicação de propriedade em 2009, mas vinha pelo menos desde a data da reclamação da M...... em 2003.
76. O diferendo era público e conhecido de todos os agentes intervenientes ainda antes do recurso à via judicial (cfr. depoimento da testemunha P......), pelo que qualquer negócio sobre a parcela controvertida (que constava como parte restante do loteamento) era encarado como portador de níveis elevados de risco, relativos a qualquer interação que o novo adquirente tivesse que ter com o Recorrido.
77. O recurso por parte da Recorrente à ação de reivindicação da propriedade não foi feito de modo a causar o mínimo de dano possível (até porque a Recorrente sempre esteve aberta ao diálogo), violando, desse modo, o princípio da proporcionalidade (cfr. art.° 5.° do CPA velho).
78. Violou, igualmente, o princípio da tutela da confiança e da boa-fé (cfr. art.° 266.°, n.° 2 da Constituição e art.° 5.° e 6.° do CPA velho) porquanto o Recorrido, aquando da permuta com a M...... sobre a parcela controvertida (2006), já conhecia a controvérsia referente à parcela (uma vez que a reclamação da M...... datava de 2003) e, ainda assim, não se absteve de proceder à referida aquisição (sendo que, ainda por cima, já tinha dado entrada nos seus serviços um projeto de loteamento da Recorrente que englobava essa mesma parcela).
79. Face ao exposto, a atuação do Recorrido não consubstanciou o exercício regular de um direito, mas consubstanciou antes um entorpecimento da justiça atentas as circunstâncias acima descritas subjacentes à permuta com a M......, à exigência de alteração do projeto de loteamento ‘Encosta Norte’, à falta de emissão de alvará, bem como a total improcedência da ação de reivindicação de propriedade ora em discussão.
80. Por conseguinte, o Tribunal ‘a quo’, ao ter julgado que a atuação subjacente à falta de emissão de alvará de 1ª fase relativamente ao projeto de loteamento ‘Encosta Norte’ e que a atuação subjacente à instauração da ação de reivindicação de propriedade não consubstanciavam atuações ilícitas violou o disposto no artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 48 051, de 21/11/1967 (em vigor até 30/01/2008) e no artigo 9.° da Lei n.° 67/2007 (em vigor desde 31/01/2008),
81. Pois, as referidas normas jurídicas deveriam ter sido interpretadas e aplicadas no sentido de julgar as referidas atuações como um facto ilícito e culposo subsumível àquelas normas.
82. Também o pressuposto da culpa está verificado nas atuações acima descritas (cfr. art.° 2.° e 3.° do DL n.° 48 051 e art.° 7.°, 8.° e 10.° da Lei n.° 67/2007).
83. Impõe-se, igualmente, ao Tribunal ‘a quo’ julgar a existência de nexo de causalidade entre a atuação ilícita e culposa (acima demonstrada) e os danos sofridos pela Recorrente, porquanto a falta de emissão de alvará e o diferendo relativo à propriedade da parcela controvertida (que culminou com a ação de reivindicação da propriedade proposta pela Recorrente em 2009) provocou danos irreparáveis à Recorrente (provados pelos depoimentos das testemunhas A......, M...... e P......, que foram unânimes relativamente ao montante de lucros cessantes da Recorrente, na ordem de € 6.500.000,00).
84. Por isso, o Tribunal ‘a quo’, ao ter julgado inexistir nexo de causalidade e dano nos termos pugnados pela Recorrente, violou o disposto nos artigos 7.°, 8.°, 9.° e 10.° da Lei n.° 67/2007, de 31 de dezembro (Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e demais Entidades Públicas) em vigor desde 31/01/2008.
Em suma,
85. Ao julgar não verificados, no caso dos presentes autos, os pressupostos cumulativos de ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade subjacentes à responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais entidades públicas, o Tribunal ‘a quo’ violou as disposições conjugadas dos artigos 2.°, 3.°, 6.° do DL n.° 48 051 e dos artigos 7.°, 8.°, 9.°, 10.° da Lei n.° 67/2007, bem como do artigo 22.° da Constituição da República Portuguesa,
86. Porquanto deveriam as normas jurídicas decorrentes de tais disposições ter sido interpretadas e aplicadas pelo Tribunal ‘a quo’ no sentido de julgar verificados os referidos pressupostos e, consequentemente, condenar o Recorrido no pagamento à Recorrente da indeminização por esta peticionada,
87. Razão pela qual deverá a decisão, objeto do presente recurso, ser substituída por outra que julgue verificada a responsabilidade civil extracontratual do Recorrido e condene o mesmo no pagamento à Recorrente da indeminização por esta peticionada, conforme à correta interpretação das acima referidas normas.
O réu apresentou contra-alegações, terminando as mesmas com a formulação das conclusões que seguidamente se transcrevem:
1) O objeto do recurso da Massa Insolvente é por esta entender existir erro sobre os factos e uma interpretação errada da Lei e sua aplicação;
2) Quanto aos factos alega:
Que o facto 2.1. dado como não provado deveria ter sido dado como provado atento o depoimento da testemunha P....... Diga-se que a testemunha P...... estava a depor sobre o papelucho correspondente ao doc. n.° 31 da PI. E com esta prova documental e o depoimento inconclusivo, hesitante, nada preciso do filho e sócio gerente da sociedade insolvente não se pode pretender que o ponto 2.1 dos factos não provados fosse dado como provado. Pelo que andou bem o Tribunal recorrido ao considerar tal facto como não provado.
Que o facto 2.2. dado como não provado deveria ser dado como provado atento o depoimento das testemunhas A......, M...... e P....... Todas estas testemunhas tinham, como já se disse, interesse no negócio relativo ao loteamento e quanto ao Arquiteto já se mencionou que era, enquanto arquiteto, o autor dos projetos da autora; foi Vereador e Vice-Presidente da Câmara com o Pelouro do Urbanismo enquanto os mesmos ali tramitaram; não cumpriu o seu mandato até final tendo saído incompatibilizado com o executivo quando era o n.° 2 do executivo e o Presidente da Câmara de então estava no seu último mandato, sendo ele o natural próximo candidato, o que não aconteceu; não tem boas relações com os executivos posteriores do Município de Abrantes e é amigo de J....... Não é isento nem imparcial, não lhe sendo indiferente a decisão final da presente lide.
A ação proposta em 14/10/2009 versava sobre um prédio que não fazia parte do projeto de loteamento aprovado por deliberação de 24/03/2003.
A área do artigo 53 da secção G (criado pelo cadastro em 2004) saiu voluntariamente por sugestão do Município (devido a reclamação de terceiro - a M......) aceite pelo então sócio gerente da autora, J......, do processo de licenciamento n.° 1…. onde inicialmente estava prevista como área de cedência e não integrou o processo n.° 298/08.
No processo de licenciamento n.° 1….. a área do artigo 5… da secção G estava prevista como área de cedência. Ora numa "área sobrante do loteamento"ou numa área de cedência não se prevê a construção de quaisquer lotes nem obras de urbanização. E foi retirada voluntariamente por J...... deste primeiro processo de licenciamento.
Por outro lado, a ação é proposta em 14/10/2009 e ambos os licenciamentos foram aprovados, respetivamente em 24/03/2003 (o processo n.° 1…/01) e aos 02/09/2008 (o processo n.° 2…/08).
Pelo que andou bem o Tribunal recorrido ao considerar tal facto como não provado.
Quanto ao facto 2,4, dado como não provado, não podem os depoimentos das testemunhas A......, M...... e P...... impor uma decisão em sentido contrário isto porquanto a ação não inviabilizou qualquer projeto de loteamento, nem tinha a potencialidade de causar desconfiança nos investidores quando a área dos loteamentos aprovados antes da sua propositura e cuia área não os integrava!
Pelo que não pode a prova testemunhal indicada levar a outra decisão que não a constante dos pontos dos factos dados como não provados, e bem.
3) Quanto à errada interpretação e aplicação da Lei
3.1. Da falta de emissão do alvará
O pedido de licenciamento de operação de loteamento dá entrada nos serviços do recorrido aos 17/12/2001, dando origem ao processo n.° 1566/01.
Aos 02/04/2004, a Construções J...., Lda. veio requerer a aprovação do pedido de licenciamento das obras de urbanização referentes ao projeto de operação de loteamento n.° 1…… em cinco fases.
Por deliberação de 05/07/2004 foi aprovado o faseamento proposto, mas para se poder emitir o respetivo alvará referente à primeira fase era necessário que o requerente pagasse taxas no valor de 104.515,326 (cento e quatro mil quinhentos e quinze euros e trinta e dois cêntimos) e prestasse uma garantia bancária de 856.258,386 (oitocentos e cinquenta e seis mil duzentos e cinquenta e oito euros e trinta e oito cêntimos) - deliberação de 08/11/2004.
Depois de ter esgotado todos prazos concedidos, aos 05/12/2006. a Construções J...., Lda. vem pedir a emissão do alvará da primeira fase, mas com proposta de negociação para que a caução de 856.258,386 (oitocentos e cinquenta e seis mil duzentos e cinquenta e oito euros e trinta e oito cêntimos) a prestar a favor da Câmara Municipal de Abrantes e que ‘seja prestada sobre bens imóveis do requerente, nomeadamente lotes da urbanização em causa com localização e avaliação a acordar com a CMA’
A não emissão do alvará de loteamento do processo n.° 1…/01 (depois do prazo concedido para o efeito) deveu-se a:
> o pedido da Construções J...., Lda. de 05/12/2006 ser uma proposta de negociação vaga, de prestação de caução (no valor de 856.258,386) em troca de bens imóveis (que não se sabia quais, podiam ser lotes daquela urbanização ou não), tratando-se de uma decisão discricionária do Município, para a qual este não tinha prazo legal para resposta e podia considerar- se tacitamente indeferida e quanto a tal a Construções J
F......, Lda. não lançou mão de qualquer dos meios ao seu alcance e previstos na Lei para alterar a situação;
> o desinteresse da autora naquele processo, face à apresentação ao Presidente da Câmara em outubro de 2007 de um novo projeto para o local - o ‘Ofélia Club’.
No processo com o n.° 2…/08 nunca foi pedida, por qualquer entidade a emissão do alvará.
O Município ao não ter emitido o alvará no primeiro loteamento não configurou qualquer vício de violação da lei ou princípios a que estivesse obrigado.
3.2. Da instauração da ação de reivindicação de propriedade
Quanto à ação, o Município tinha uma escritura de aquisição do prédio entre terceiros, M....../M......, com um croqui rubricado por todos os intervenientes, que nunca foi impugnada nem declarada nula, um artigo urbano inscrito na respetiva matriz, sob o artigo 7… da freguesia de São Vicente, um registo do mesmo na respetiva Conservatória do Registo Predial, sob a descrição n.° 40…., isto é, todos os títulos que levavam a concluir pela propriedade do prédio urbano permutado.
Aliás dessa escritura não podia resultar do destaque mais do que duas parcelas de terreno perante a Lei e perante tal croqui assinado e rubricado constante desta escritura: a parcela para construção urbana com 8.360m2 vendida a I...... e mais tarde à M......, e esta com a configuração constante do desenho, e a área remanescente do prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo ……. da secção G.
À data da entrada do pedido de loteamento, como já se referiu, aos 17/12/2001, um dos prédios sobre o qual incidia essa operação urbanística era a área remanescente do artigo rústico inscrito na matriz sob o artigo ….. da secção G, da freguesia de São Vicente, e não o artigo ….. da secção G da freguesia de São Vicente, uma vez que este artigo foi criado pelo Instituto Geográfico Português aquando da resolução do processo de reclamação administrativa n.° 4…/93 em janeiro de 2004.
E este tendo toda a prova documental, pericial, testemunhal, inspeção do Tribunal ao local, entendeu recorrer à via judicial como é seu direito e convencido desse direito utilizando a forma adequada para o fazer valer.
Não foi causado nenhum dano reputacional nem à recorrente nem ao seu projeto de loteamento ‘Encosta Norte’. O loteamento não teve sucesso devido à crise económica e à falta de investidores e interessados e não à propositura da ação do Município.
Com a propositura da ação de reconhecimento não foi violado qualquer princípio pelo Município de Abrantes.
O Tribunal ‘a quo’ ao ter julgado que a falta de emissão do alvará da primeira fase e a instauração da ação de reivindicação de propriedade não consubstanciavam atuações ilícitas, não violou o disposto no artigo 6o do Decreto-Lei 48051 de 21/11/1967 e no artigo 9o da Lei 67/2007.
4) Da culpa e do nexo de causalidade
- A parcela do processo instaurado em 2009 não fazia parte do processo de licenciamento do loteamento aprovado - nem do primeiro nem do segundo;
- Não foi esse litígio que causou danos reputacionais à recorrente e ao seu projeto ‘Encosta Norte’;
- A recorrente nunca lançou mão de qualquer intimação ou instrumento legal para impugnar quaisquer deliberações, obter respostas ou o próprio alvará;
Não houve qualquer nexo de causalidade entre a atuação do Município - que não foi ilícita nem culposa - e os alegados danos - não provados - que a recorrente alega ter sofrido, nem o valor dos mesmos.
E nada há a apontar à sentença por ter decidido pela não existência de facto ilícito e culposo do recorrido. Não se tendo verificado na sentença qualquer violação dos artigos 2o, 3o e 6o do Decreto-Lei 48 051, dos artigos 7o, 8o, 9o e 10° da Lei 67/2007 nem do artigo 22° da Constituição da República Portuguesa.

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Perante as conclusões das alegações da recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir:
- do erro de julgamento da decisão de facto;
- do erro de julgamento da decisão de direito ao considerar que a falta de emissão do alvará e a instauração da ação de reivindicação de propriedade não consubstanciaram atuações ilícitas;
- do erro de julgamento da decisão de direito ao considerar não verificados os pressupostos da culpa e do nexo de causalidade.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
*
II. FUNDAMENTOS
II.1 DECISÃO DE FACTO
Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
1.1) Encontra-se inscrita na Conservatória do Registo Predial de Abrantes, freguesia de São Vicente, por Ap. 07/0…, cota G-…, a aquisição, por sucessão por morte de I......, a favor de M......, do prédio rústico, denominado “O......”, composto por cultura arvense, oliveiras, solo subjacente de cultura arvense com oliveiras, figueiras, com a área de 36 840 m2, a confrontar a norte e sul com Estrada Nacional, a nascente com M...... e outros e a poente com F...... e outros, inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo ……, da secção G e descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes, freguesia de São Vicente, sob o n.° 01…...
1.2) A 07.05.1992 foi outorgada em Lisboa escritura pública de compra e venda, em que intervieram, na qualidade de 1.a Outorgante e vendedora a proprietária do prédio referido em 1.1), M......, e na qualidade de 2.a outorgante e compradora a sociedade I...... — S......, SA, e na qual se deixou consignado, além do mais, o seguinte: «PELA PRIMEIRA OUTORGANTE FOI DITO:
» Que é legítima dona e possuidora de um prédio rústico, denominado O......, com a área de 36 840 m2, sito na freguesia de São Vicente, concelho de Abrantes, a confrontar de norte e sul com Estrada Nacional, de nascente com M...... e outros e de poente com F...... e outros, descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes, sob o n.° 01…. da ficha daquela freguesia e inscrito na matriz cadastral da dita freguesia sob o artigo….., secção G, com o valor patrimonial de 127 621$00 [...]
» — Que, pela presente escritura e pelo preço de 15 884 000$00, que já recebeu dos representados da Segunda Outorgante, a esta vende, livre de quaisquer ónus ou encargos e ao abrigo do disposto no artigo 5.0 do Decreto-Lei n.° 448/91, de 29 de novembro, uma parcela de terreno destinada a construção urbana, com a área de 8 360 m2, a confrontar de norte com a Estrada Nacional, de sul com a parte do prédio de onde é desanexado, pertença da vendedora, de poente com F...... e de nascente com via pública, parcela esta que fica a constituir um prédio distinto e autónomo, tendo já sido pedida a sua desanexação, como se verifica pelo duplicado da declaração para inscrição na matriz, entrado na Repartição de Finanças de Abrantes, no dia 2 de abril último, que me foi exibida, existindo para a mesma um projeto aprovado pela Câmara Municipal de Abrantes, como se verifica pelo Alvará de Licença de obras n.° 2….., concedido por despacho de 9 de janeiro do ano em curso, que igualmente foi exibido;
» — Que a parte restante do prédio de onde foi desanexada a parcela atrás identificada fica a confrontar, de nascente com a via pública e de sul com Estrada Nacional, encontrando-se devidamente assinalada a tracejado no croqui assinado e arquivado, não resultando do destaque mais de duas parcelas de terreno;
» PELOS SEGUNDOS OUTORGANTES, FOI DITO:
» — Que, para a sociedade sua representada, aceitam a presente venda nos termos exarados e que a parcela de terreno ora adquirida se destina a um contrato de locação financeira [...]».
1.3) A 21.05.1993 a proprietária do prédio referido em 1.1), M......, subscreveu instrumento escrito endereçado ao Chefe da 1.a Repartição de Finanças do Concelho de Abrantes, com o seguinte teor: «M......, [...] para fins notariais e registrais, requer a V.a Ex, nos termos do artigo 32.° do Código da Contribuição Autárquica, a retificação da área do prédio sito em O......, inscrito na respetiva matriz, sob o artigo…...° da secção G, da freguesia de São Vicente, de 36 840 m2 para 27 640 m2, em virtude de ter sido vendida, por escritura de 92/05/07, do Cartório Notarial de Lisboa e de ter sido expropriada uma faixa com 840 m2, para alargamento da via pública».
1.4) O requerimento referido em 1.3) viria a ser autuado naqueles serviços de Finanças sob o n.° «reclamação n.° 4…/93».
1.5) A 13.10.1994 foi inscrita na Conservatória do Registo Predial de Abrantes, freguesia de São Vicente, por Ap. 14, a aquisição, por compra, a favor de M...... – S….., Lda., à I...... - S......, SA, do prédio urbano, sito na Encosta da Barata, Estrada N… n.° …, composto de complexo de rés- do-chão: com stand de peças, stand de automóveis, instalações sanitárias, administrativas, sala de vendedores, sala de espera, zona oficial, com secção de pintura, com dois compartimentos anexos; i.° andar situado em duas zonas, uma com 4 salas, corredor de circulação e 2 arquivos; outra com refeitório, cozinha e arrumos; em separado a célula de lavagem com alpendre, posto de transformação, cobertura metálica para estacionamento e logradouros com vias de circulação, com a área total de 8 360m2, inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo 5…. e descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes, freguesia de São Vicente, sob o n.° 18…….
1.6) A 08.07.1999 foi elaborado instrumento escrito em papel timbrado do aqui réu, sob a designação «Informação», subscrito pelo então Diretor do Departamento de Administração Geral do Município de Abrantes, no qual se deixou consignado, além do mais, o seguinte: «Por deliberação de 98.08.07, a Câmara Municipal de Abrantes decidiu concordar com uma permuta de terrenos a efetuar com o Sr. M…... Verificou-se posteriormente que a parcela de 1 627 m2 situada junto à M...... (assinalada na planta anexa por P1) tinha o ónus decorrente de ser parte de uma outra parcela resultante de um destaque ocorrido há menos de 10 anos, pelo que não pode ser agora destacada dela. Também impende uma hipoteca sobre a mesma, pelo que, antes da alienação, teria a mesma que ser cancelada. Assim, propõe-se o seguinte acordo:
» 1. Permuta das parcelas de terreno que a M...... – S…, Lda. possui no Parque Industrial por uma parcela municipal de 5 483 m2, assinalada na planta anexa por P2.
» 2. Assinatura de contrato promessa de permuta da parcela municipal com a área de 1 627 m2 (assinalada na planta anexa por P3) por aquela que, neste momento, não pode permutar-se (P1) ou outra de valor equivalente que, na altura, a Câmara Municipal de Abrantes aceite permutar.
» [...]
» 5. O gerente da M...... - S......, Lda. vem, por carta de 07.07.99, dar a sua anuência ao ora acordado, desde que salvaguardados os n.os 1 e 2 desta informação que constituírem objeto de proposta de acordo. A ceder pelo Município: [...] e a parcela P3, com a área de 1 627 m2: 12 013 765$00 [...]
» A ceder pela M......: 6 parcelas de terreno no Parque Industrial [...] e a parcela P1, com a área de 1 627 m2: 12 013 7 65$00 » [...]
» As parcelas P3 e P1 serão permutadas quando deixar de subsistir a impossibilidade da permuta em razão do ónus de não fracionamento e hipoteca [...]».
1.7) A informação referida em 1.6) viria a ser aprovada por deliberações adotadas em reunião da Câmara Municipal de Abrantes de 16.07.1999 e da Assembleia Municipal de Abrantes de 27.09.1999.
1.8) Na sequência da informação referida em 1.6) e das deliberações referidas em 1.7), foi outorgada a 02.03.2000 nos serviços notariais do ora réu escritura pública, com a referência «Escritura Pública n.° 1…/2000. Escritura de permuta de prédios sitos na freguesia de Alferrarede, concelho de Abrantes, destinados ao Parque Industrial de Abrantes», na qual se deixou consignado, além do mais, o seguinte: «a) N......, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Abrantes, em representação do Município de Abrantes, declarou que é dono e legítimo possuidor de uma parcela de terreno para a construção urbana, sita em Barata, freguesia de São Vicente, concelho de Abrantes, com a área de 7650 m2, a confrontar do norte e nascente com M...... - S......, Limitada, ao sul com rua e de poente com a Avenida 14 de Junho, omissa na matriz, mas participada a sua inscrição aos 18 de janeiro de 2000, sem valor patrimonial atribuído, mas avaliada em 40 498 000$00, descrita na Conservatória do Registo Predial de Abrantes, sob o n.° 03….. e inscrito a seu favor pela inscrição G-4…;
» b) M.... e E......, na qualidade de sócios gerentes e representando a firma M...... – S…., Lda. declararam que esta é dona e legitima possuidora dos seguintes prédios:
» [...]
-» c) N......, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Abrantes, em representação do Município de Abrantes, declarou que, no âmbito da permuta acordada, pela presente escritura, o Município de Abrantes entrega à M...... — S......, Lda., o prédio anteriormente identificado e descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes sob o n.° 03…..de que é proprietário; à parcela de terreno a entregar a esta sociedade foi-lhe atribuído o valor de 40 498 000$00; a presente escritura de permuta é exarada e conforme deliberação da Câmara Municipal de Abrantes tomada na reunião realizada em 16 de julho de 1999 e da Assembleia Municipal de Abrantes tomada na sessão realizada em 27 de setembro de 1999 e que os prédios rústicos que recebe destinam-se ao Parque industrial de Abrantes;
» d) M.... e E......, na qualidade de sócios gerentes e representando a firma M...... — S......, Lda., declararam que a sociedade que representam, pela presente escritura de permuta, entrega ao Município de Abrantes, os prédios rústicos inscritos nas matrizes prediais da freguesia de Alferrarede sob os artigos [...]
» e) N......, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Abrantes, em representação do Município de Abrantes e M.... e E......, na qualidade de sócios gerentes e representando a firma M...... - S......, Lda., declararam que os prédios rústicos em conjunto com o lote n.° ….. desta sociedade são permutados livres de quaisquer ónus ou encargos e desocupados, pela parcela do Município de Abrantes, pelo valor total de 40 49 000$00, equivalendo- se e não havendo lugar a compensação de ambas as partes e que aceitam a presente permuta para os seus representados [...]».
1.9) A 17.02.2003 foi consignado na Ata da reunião da Câmara Municipal de Abrantes, além do mais, o seguinte: «Departamento de Administração Geral - Informação do Diretor do Departamento de Administração Geral: datada de 30 de janeiro de 2003, informando que na permuta de terrenos de e com M...... - S......, Lda., por erro, foi indicada na escritura área superior para o terreno cedido, diferente do negociado.
» Deliberação: Por unanimidade, notificar a M...... de que se deve proceder à retificação da escritura de permuta 1…/2000, de acordo com os termos subjacentes à deliberação de 16 de julho de 1999, constantes da informação registada sob o n.° 1….. de 1999, incluindo-se as áreas a permutar sob a designação de P1 e P3.
» Informar ainda a M...... que deverá entregar ao Município de Abrantes a parcela com a área de 540 m2 que recebeu a mais na escritura 1…/2000. A escritura deve ser marcada para data incluída nos dois meses próximos que são considerados suficientes para o tratamento prévio dos documentos. salvaguarda-se, no entanto, que, caso terceiro venha efetivamente a provar judicialmente que a propriedade de P1 é sua, o que agora não se demonstra, os pressupostos da permuta oportunamente negociada obrigam a que a M...... entregue ao Município o valor da permuta ou parcela equivalente».
1.10) Na sequência da deliberação referida em 1.9), foi a 27.01.2006 outorgada nos serviços notariais do ora réu escritura pública, com a referência «Escritura Pública de retificação à Escritura n.° 1…..», na qual se deixou consignado, além do mais, o seguinte: «N......, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Abrantes e M.... e E......, na qualidade de sócios gerentes e representando a firma M...... - S......, Lda., declararam que, pela presente escritura, procedem à retificação da escritura n.° 1….., lavrada em 2 de março de 2000, em face dos documentos que revelam a havida vontade das partes, nos seguintes termos: 
» a) N......, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Abrantes declarou que, no âmbito da referida permuta, o Município de Abrantes, em vez de todo o prédio, com a área de 7650 m2, identificado como sendo parcela de terreno para a construção urbana, sita em Barata, freguesia de são Vicente, inscrita na matriz sob o artigo 6….., entrega à sociedade M...... - S......, Limitada, para sua propriedade, apenas uma parcela com a área de 7 110 m2, a destacar do referido e identificado prédio e que fica a confrontar do norte com M...... - S......, Limitada, do nascente com M...... - S......, Limitada e Município de Abrantes, do sul com arruamento e do poente com a Avenida 14 de Junho, ficando a restante área de 540 m2 na posse da Câmara Municipal de Abrantes;
» b) M.... e E......, na qualidade de sócios gerentes e representando a firma M...... — S......, Lda. declararam que, no âmbito da permuta, esta sociedade entrega para propriedade do Município de Abrantes, para além dos bens já identificados na referida escritura n.° 1….., também uma parcela de terreno com a área de 1 627 m2, que fica a confrontar do norte com M...... - S......, Lda., do nascente com M...... e outros e do sul e poente com Município de Abrantes, inscrito provisoriamente na matriz sob o artigo P7….., sem valor patrimonial tributável atribuído, mas avaliado em € 59 924,41, para efeitos desta escritura, a destacar do prédio de que M...... - S......, Limitada é dona e legítima possuidora do prédio denominado “Encosta da Barata” - E. N. n.°…., composto de complexo de rés-do-chão com stand de peças, stand de automóveis, instalações sanitárias, administrativos, sala de vendedores, sala de espera, zona oficinal, com secção de pintura, com dois compartimentos anexos e primeiro andar situado em duas zonas, uma com quatro salas, corredor de circulação e dois arquivos, outra com refeitório, cozinha e arrumos, em separado a célula de lavagem com alpendre, posto de transformação, cobertura metálica para estacionamento, com 2 203 m2 e logradouros com vias de circulação, com 6 157 m2, que confronta do norte com EN3, do sul com O......, do nascente com via pública e do poente com F......, inscrito na matriz predial urbana, da freguesia de São Vicente, sob o artigo 5….., com o valor patrimonial de € 456 280,36, descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes sob o n.° 0….., inscrito a seu favor pela inscrição G-…;
» c) N......, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Abrantes e M.... e E......, na qualidade de sócios gerentes e representando a firma M...... - S......, Lda., declararam que em tudo o mais se mantém o teor da referida escritura 1….., lavrada a 2 de março de 2000 e os bens são permutados livres de quaisquer ónus ou encargos, equivalendo-se e não havendo lugar a quaisquer outras compensações [...]».
1.11) Entretanto, já a 14.01.2000 fora outorgada na Agência da Caixa ……, em Abrantes, escritura pública de compra e venda, em que intervieram na qualidade de 1.os outorgantes e vendedores a proprietária do prédio referido em 1.1) e esposo, e na qualidade de 2.a outorgante e compradora a aqui autora, nesse ato representada pelo seu sócio gerente e legal representante, e na qual se deixou consignado, além do mais, o seguinte: «PELA PRIMEIRA OUTORGANTE MULHER FOI DITO:
» Que, pelo preço de 45 000 000$00 (quarenta e cinco milhões de escudos), importância que já recebeu da firma Construções J......, Limitada, a esta vende o prédio rústico, composto de cultura arvense, oliveiras, solo subjacente de cultura arvense com olival e figueiras, com a área de 27 640 m2, sito no lugar de O......, freguesia de São Vicente, concelho de Abrantes, descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes, sob o n.° 0….., da dita freguesia de São Vicente, com a aquisição ali registada a favor da vendedora pela inscrição G-…, inscrito na matriz sob o artigo….., da secção G, objeto de um pedido de alteração à matriz quanto à sua área em 21 de maio de 1993, ainda pendente de efetivação e sobre o qual incide um ónus de não fracionamento pelo prazo de dez anos a contar de 12 de janeiro de 1993, conforme consta da inscrição F-…, da citada Conservatória;
» PELO PRIMEIRO OUTORGANTE MARIDO FOI DITO:
» Que autoriza a sua mulher a efetuar esta venda;
» PELO SEGUNDO OUTORGANTE FOI DITO:
» Que, para a sociedade sua representada, aceita a venda nos termos exarados [...]».
1.12) Pela 1.a outorgante da escritura referida em 1.11) foi apresentado nesse ato, além do mais, um instrumento escrito em papel timbrado do Instituto Português de Cartografia e Cadastro, sob a designação «Certificado», subscrito pelo Chefe da Delegação Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Instituto Português de Cartografia e Cadastro e datado de 11.01.2000, no qual se deixou consignado, tendo por referência o requerimento referido em 1.3), além do mais, o seguinte: «S….., engenheiro agrónomo, Chefe da Delegação Regional de Lisboa e Vale do Tejo do Instituto Português de Cartografia e Cadastro, certifica a pedido do interessado, que o processo de reclamação administrativa n.° 4…., instaurado na Repartição de Finanças da Abrantes em nome de M...... referente ao artigo n.°…., da secção G, da freguesia de São Vicente, do concelho de Abrantes, ainda não produziu efeito [...]». 
1.13) Na sequência da escritura referida em 1.11), foi inscrita na Conservatória do Registo Predial de Abrantes, freguesia de São Vicente, por Ap. 10 de 2000/01/1…, a aquisição a M......, por compra, a favor da autora, de um prédio rústico, denominado “O......”, situado em Abrantes, na freguesia de São Vicente, composto de olival, com a área total de 2040 m2, a confrontar a norte com M...... - S......, Limitada, a sul com M...... e a nascente e poente com Município de Abrantes, inscrito na respetiva matriz sob o artigo…., da secção G e descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes, freguesia de São Vicente, sob o n.° 1…...
1.14) Tendo por referência o prédio referido em 1.1), as sucessivas transmissões do mesmo tituladas pelas escrituras referidas em 1.2), 1.10) e 1.11) e a reclamação referida em 1.3) e 1.4), foi a 01.09.2009 elaborado instrumento escrito em papel timbrado do Instituto Geográfico Português - Delegação Regional de Lisboa e Vale do Tejo, sob a referência «Ofício n.° 0…./DRLVT/09», endereçado ao Presidente da Câmara Municipal de Abrantes e subordinado ao assunto «Esclarecimento sobre a resolução do processo de reclamação administrativa n.° 4…/93, da freguesia de São Vicente, do concelho de Abrantes», no qual se deixou consignado, além do mais, o seguinte: «Relativamente aos fundamentos expressos nos ofícios enviados a esta Delegação a 21-08-09 e a 04-10-07, manifestamos a nossa concordância, ou seja, do destaque operado sobre o prédio n.°…., da secção G, da freguesia de São Vicente, do concelho de Abrantes, pela escritura de compra e venda de 7 de maio de 1992, não poderiam ter resultado mais de 2 parcelas de terreno, em conformidade com o disposto no artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 448/91, de 29 de novembro, em vigor à época.
» Acontece, porém, que, aquando a resolução do processo de reclamação administrativa n.° 4…/93, em janeiro de 2004, na deslocação ao local do prédio, verificou-se que, embora a área do destaque para construção (8360 m2) e a expropriação para alargamento da via pública (840 m2) cumpri[sse]m os critérios de tolerância de áreas em vigor à época, o destaque em si procedia à criação de 3 parcelas distintas.
» Tal discrepância, em nossa opinião, deve-se à interpretação do croqui apresentado para a realização da escritura de 7 de maio de 1992 que não coincide com a demarcação apresentada pelo proprietário da parcela para construção destacada do prédio n.° 37, da secção G, da citada freguesia, pelo que seria impossível a Delegação do IGP determinar à partida tal divergência sem efetuar a deslocação ao local do prédio. Em virtude da deslocação ao local do prédio só ser efetuada mediante pagamento da taxa de urgência que visa assegurar os custos da resolução, somente em 2003 foi possível constatar os factos já expressos.
» É de notar que tais discrepâncias são recorrentes não só no concelho de Abrantes, mas em praticamente todos os concelhos do distrito de santarém, sobretudo nos períodos em que a utilização de sistemas de informação Geográfica por parte dos municípios e a exigência de levantamentos topográficos rigorosos por parte das Conservatórias não era prática comum.
» Porém, tendo em consideração que o destaque efetuado e consequentemente o fracionamento do prédio rústico se fundamenta na alínea c) do artigo 1311.0 do Código Civil, com base em informação jurídica emitida pelo Gabinete Jurídico deste Instituto fundamentada no n.° 3 do artigo 1379.0 do Código Civil, procedeu-se à desanexação da parcela urbana com a área de 8360 m2 por ter caducado o prazo de anulação de 3 anos do ato de fracionamento expresso pela escritura de compra e venda de 7 de maio de 1992. Por existir descontinuidade física entre os prédios sobrantes foram então criados os prédios n.° …e…., da secção G, da freguesia de São Vicente, do concelho de Abrantes.
» Esta prática tem sido uma das formas de fracionamento de prédios rústicos à revelia da legislação em vigor e que compromete a eficácia de qualquer bom plano de ordenamento do território, seja a nível municipal ou regional. De modo similar ao caso apresentado é frequente a realização de escrituras públicas, e agora de contratos públicos, de fracionamento de prédios rústicos com completo atropelo às unidades mínimas de cultura ou com criação de prédios encravados mas em que passados três anos, atingida a caducidade do prazo de anulação do ato de fracionamento, as parcelas resultantes passam a ser legítimas.
» Pela escritura de compra e venda de 14 de janeiro de 2000, foi adquirido pela firma “Construções J....” um prédio rústico, com a área de 27 640 m2. Por não serem mencionadas as confrontações do prédio, o técnico responsável ter-se-á equivocado ao assumir que a parte sobrante do prédio original composto pelos já referidos prédios n.°…. e …. corresponderia ao prédio transacionado em virtude de a área do mesmo ser praticamente idêntica ao somatório da área dos prédios n.° …e….. » Depreende-se agora, confrontando a escritura de 7 de maio de 1992 e o croqui anexo à mesma, que o prédio com a área de 27 640 m2 corresponde somente ao prédio n.° ….como área de 25 640 m2.
» Assim sendo, e em virtude de nenhum dos títulos apresentados justificar a área sobrante de 2 040 m2 relativa ao prédio n.°…., em conformidade com o artigo 35.° do CiMi, por não ser conhecido com rigor o verdadeiro titular, o prédio n.° ….será inscrito em nome do Estado Português.
» Pelo exposto, conclui-se que:
» 1. O destaque da parcela urbana com a área de 8360 m2, embora em violação à legislação em vigor, foi realizado por ter caducado o prazo de anulação do ato de fracionamento;
» 2. A M......, a I......, a Construções J.... e a Câmara Municipal de Abrantes não possuem títulos aquisitivos da parcela de terreno com área de 2 040 m2 correspondente ao prédio rústico n.°…., da secção G, da freguesia de São Vicente, do concelho de Abrantes;
» 3. Pela inexistência de título aquisitivo, o prédio rústico n.° 53, da secção G, da freguesia de São Vicente, do concelho de Abrantes, será inscrito em nome do Estado Português, por ser desconhecido o proprietário correto;
» 4. Recorrendo às possibilidades exaradas no Código do Registo Predial, os interessados deverão proceder à retificação dos títulos de propriedade em vigor, no que respeita à área e titularidade do prédio rústico n.°…., da secção G, da freguesia de São Vicente, do concelho de Abrantes [...]».
1.15) Consta da caderneta predial rústica do Serviço de Finanças de Abrantes que a aqui autora foi titular do direito ao rendimento tributável do prédio rústico, sito no O......, na freguesia de São Vicente, no concelho de Abrantes, com a área total de 25 640 m2, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo…., da secção G, resultante do prédio n.°…...
1.16) Consta igualmente da caderneta predial rústica do Serviço de Finanças de Abrantes que a aqui autora foi titular do direito ao rendimento tributável do prédio rústico, sito no O......, na freguesia de São Vicente, no concelho de Abrantes, com a área total de 2 040 m2, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo…., da secção G, resultante do prédio n.°…..
1.17) A 14.10.2009 o aqui réu interpôs no Tribunal Judicial de Abrantes uma ação declarativa comum sob a forma ordinária contra a ora autora, peticionando o reconhecimento do direito de propriedade sobre o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …. e descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes a seu favor sob o n.° 4…..da freguesia de S. Vicente e, em consequência, a declaração de extinção, com consequente ordem de cancelamento das inscrições matriciais e descrições registrais que colidissem com tal direito constituído.
1.18) No âmbito do processo referido em 1.17), que correu termos no Tribunal Judicial de Abrantes sob o n.° 1148/09.1TBABT, foi a 15.07.2011 proferida sentença, na qual, depois de se deixar enunciada, no essencial, a factualidade referida nos pontos 1.1) a 1.16) supra, se deixou consignado, em sede de excurso fundamentador fáctico-jurídico e segmento dispositivo o seguinte: «B) ANÁLISE DOS FACTOS E APLICAÇÃO DO DIREITO
» § 0. Atento o objeto da presente ação, delimitado pelo respetivo pedido e cansa de pedir, as questões jurídicas nucleares que importa conhecer tomam o seguinte perfil e cadência:
» Primeira, apurar se deve ser reconhecido o alegado direito de propriedade do A. sobre o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 7…. e descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes a seu favor sob o n.° 4…. da freguesia de S. Vicente do concelho de Abrantes;
» Segunda, caso se responda afirmativamente a essa questão, decidir se deve ser declarada a extinção e ordenado o cancelamento de todos os direitos e todas as inscrições matriciais e descrições registrais que colidam, com tal direito constituído.
» § 1. Apreciemos a primeira questão, notando-se que esse prédio é o supra descrito na factualidade provada emergente das alíneas U) e V) da matéria de facto assente.
» O direito de propriedade pode ser adquirido pelos diversos modos previstos no art2 1316.° do Código Civil: contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão e demais modos previstos na lei.
» A causa de pedir nas ações reais é, de acordo com a teoria da substanciação, o ato ou facto jurídico de que deriva o direito de propriedade. Tem sido dominante na nossa doutrina e jurisprudência o entendimento de que, quem invoca em juízo o direito de propriedade sobre uma coisa, deverá efetuar a prova da sua aquisição originária. Assim, nomeadamente nas ações de reivindicação, não bastará ao autor a prova resultante do título constitutivo da aquisição derivada da propriedade, para que possa ver reconhecido o seu direito contra o possuidor ou detentor ilegítimo. Nas ações de reivindicação a causa de pedir reside no ato ou facto de que deriva o direito de propriedade, ou também na ocupação abusiva do prédio constituindo o reconhecimento do direito de propriedade o efeito jurídico que com a ação se pretende obter, de que deriva, como consequência lógica, a entrega da coisa reivindicada.
» O direito de propriedade, regulado nos artigos 1302.° e seguintes do Código Civil, confere ao seu titular o gozo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição do seu objeto dentro dos limites da lei e com a observância das restrições por ela impostas . É um direito real pleno, porque acima dele não existe qualquer outro poder, e exclusivo, na medida em que o proprietário pode exigir que qualquer terceiro se abstenha de invadir a sua esfera jurídica.
» O modo como o direito de propriedade entra na esfera jurídica do sujeito é regulado nos artigos 1316.° e seguintes do Código Civil, relativos à aquisição da propriedade.
» O legislador não diferenciou a aquisição do direito de propriedade, de acordo com a tradicional distinção doutrinal, entre os modos de aquisição derivada e originária. Na aquisição derivada o direito adquirido funda-se ou filia- se na existência de um direito na titularidade de outra pessoa”. A sua extinção ou limitação é que geram a aquisição do direito pelo novo titular, constituindo deste modo, a sua causa. Por seu turno, na aquisição originária “...o direito adquirido não depende da existência ou extensão de um direito anterior, que poderá até não existir”.
» A usucapião constitui um dos modos de aquisição originária da propriedade sobre as coisas. A usucapião consiste, conforme decorre expressamente do disposto no art.° 1287.° do Código Civil, no facto de a posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, facultar ao possuidor, salvo disposição em contrário, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde a sua atuação. Por sua vez, a posse é o poder de facto (corpus - elemento material ou empírico) exercido por uma pessoa ou pessoas sobre determinada coisa por forma correspondente ao exercício de qualquer direito real (animus - elemento intencional ou psicológico; mas animus possidendi)”. A verificação da usucapião depende de dois elementos: a posse e o decurso de certo período de tempo, variável consoante a natureza móvel ou imóvel da coisa. A posse, tal como definida no artigo 1251.0 do Código Civil tem por base dois elementos: um, «o corpus», traduzido na prática de atos materiais sobre a coisa e o outro, o «animus sibi habendi», traduzido na intenção de exercer um poder sobre as coisas correspondente a um direito real no próprio interesse. O «corpus» é o exercício de poderes de facto que implica uma vontade de domínio, de poder jurídico-real, enquanto o «animus» pressupõe a vontade de agir como titular de um direito real, que se exprime em certa atuação de facto. A posse é, pois, o exercício de poderes de facto sobre uma coisa em termos de um direito real, rectius do direito real correspondente a esse exercício.
» Em rigor, a presente ação não é de reivindicação, mas somente de reconhecimento do direito de propriedade, sendo assim somente ação de simples apreciação positiva.
» Mas, conforme se decidiu, entre outros, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de julho de 2010, “também [nos] casos em que o proprietário se limita a pedir a declaração de que é dono” se exige a prova da aquisição originária do direito de propriedade, cujo ónus incumbe a quem se arroga titular do respetivo direito.
» Atenta a matéria de facto provada é inquestionável que o A. não demonstrou ter praticado, por si e eventualmente pelos antepossuidores, qualquer ato demonstrativo de posse. Por conseguinte, inviabilizada está a prova da aquisição por usucapião do direito de propriedade do prédio objeto do pedido.
» Mais: com ou sem intenção, a verdade é que o A. nem sequer alegou factos suscetíveis de integrarem eventual posse do prédio e subsequente usucapião do mesmo.
» Por conseguinte, não está demonstrada a aquisição originária do invocado direito de propriedade do imóvel.
» Resta apreciar a via da aquisição derivada.
» O A. centrou a sua alegação na aquisição dessa propriedade por contrato de permuta e na aquisição de propriedade estar registada a seu favor na Conservatória do Registo Predial de Abrantes.
» Dispõe o art.° 7.º do Código do Registo Predial que “O registo definitivo constitui presunção de que o direito existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos em que o registo o define”. Este artigo estabelece uma presunção registral, elidível mediante prova em contrário - presunção juris tantum nos termos do disposto no art. 350.°, n.° 2 do Código Civil. A presunção registral atua relevantemente em relação ao facto inscrito e aos sujeitos e objeto da relação jurídica dele emergente , mas já não em relação às áreas, composição e confrontações do respetivo prédio.
» Por outro lado, recorde-se que os factos sujeitos a registo só produzem efeitos em relação a terceiros depois da data do respetivo registo, pelo que a aquisição da propriedade do prédio em causa por banda do A. só é oponível à Ré após a data da inscrição registral dessa aquisição.
» Convém ainda mencionar que, por força do disposto no art.° 6.°, n.° 1, do Código do Registo Predial o direito que se inscreve em primeiro lugar no registo predial prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos e, dentro da mesma data, pelo número de ordem das apresentações correspondentes. 
» Os factos de que resulte transmissão de direitos ou constituição de encargos sobre bens imóveis não podem ser titulados sem que os bens estejam definitivamente inscritos a favor da pessoa de quem se adquire o direito ou contra a qual se constitui o encargo, conforme se prescreve no art.° 9.°, n.° 1, do Código do Registo Predial.
» Recordemos que o pedido do A. se reporta apenas ao reconhecimento do direito de propriedade do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes sob o n.° 40…...
» O registo predial tem função essencialmente declarativa, e não constitutiva, pelo que não dá nem tira direitos.
» Também o contrato de compra e venda ou o contrato de permuta não originam o direito de propriedade, mas apenas o transferem da esfera jurídica de um sujeito de direitos para a esfera jurídica de outro sujeito de direitos. O efeito do contrato quanto ao direito de propriedade não é constitutivo desse direito, mas meramente translativo.
» Quem alega ser titular do direito de propriedade cuja aquisição está registada a seu favor tem o dever de alegar e provar também, para poder beneficiar da presunção registral, que o direito já existia na titularidade do transmitente. É preciso ainda que quem se arroga titular do direito de propriedade demonstre que o imóvel permutado integrava prédio ou parte de prédio pertencente ao transmitente e registado definitivamente a seu favor. É o que decorre do principio nemo plus iuris ad alium transfere potest quam ipse habet.
» As inscrições matriciais em nada colidem com o direito de propriedade, nem atribuindo-o, nem negando-o.
» Vejamos se o A. logrou provar tais requisitos legais.
» Não oferece dúvidas de que a aquisição, por permuta com a sociedade M......, Lda. , do prédio assim aí descrito está efetuada a favor do A. desde 7 de abril de 2006.
» Mas igualmente está demonstrado que o A. não demonstrou que a M...... adquiriu esse prédio - totalmente ou em parte — seja por via originária, seja por via translativa ou derivada.
» Provou-se que a área vendida pela M...... à I...... e, depois, por esta à M...... é de pelo menos 8360 m2 e que esta tem essa área vedada, não a tendo, assim, permutado com o Autor.
» O título de aquisição pela M...... do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes sob o n.° 1…., adquirido à I......, não comporta a aquisição do prédio que veio a permutar ao A. por via da escritura de retificação à permuta, pois que isso não está demonstrado pelos factos apurados.
» Quanto aos prédios descritos na Conservatória do Registo Predial de Abrantes sob os n.os 3… e 4…, cujas descrições foram inutilizadas por anexações, dando origem ao prédio descrito nessa Conservatória sob o n.° 4…., não se provou existir título que atribuísse ao transmitente desses prédios para o A. a titularidade dos respetivos direitos de propriedade.
» Acresce que o remanescente do prédio originário, descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes sob o n.° 1… e após desanexação da parte de pelo menos 8360 m2 vendida à I...... e depois por esta à M......, está registado a favor da Ré desde 17 de janeiro de 2000, por o ter adquirido por contrato de compra e venda à transmitente proprietária M....... Essa presunção registral não foi elidida.
» Numa palavra, antes dos factos provados resulta que o A. não provou que a M...... fosse proprietária do prédio objeto do pedido antes ou à data da permuta inicial e mesmo da permuta retificada, nem demonstrou que esse prédio, rectius a parcela integrante de 1627 m2, tinha a sua aquisição inscrita a favor da M...... antes das permutas original ou retificada terem sido realizadas e de o registo desse prédio ter sido efetuado a favor do A. em 7 de abril de 2006; e nada mais se provou sobre o transmitente da parte restante do prédio objeto do pedido.
» Não pode, assim, o A. beneficiar da presunção registral invocada.
» Note-se que a Ré beneficia também de presunção registral a seu favor, não elidida, como se disse.
» Fácil é de ver que o que se devia ter discutido na presente ação era a aquisição originária do direito de propriedade por usucapião, prova maior da aquisição desse direito, reportada a áreas e configurações concretas.
» Por conseguinte e sem necessidade de mais pormenorizada argumentação, deve ser negada a pretensão do A. quanto ao reconhecimento do seu alegado direito de propriedade sobre o prédio objeto do pedido formulado na ação.
» § 2. Em face do exposto, fica prejudicada a apreciação da segunda questão enunciada, pois que também não pode proceder o respetivo segmento do pedido formulado pelo Autor.
» § 3. Face aos contornos do litígio, cedo se percebeu que a matéria alegada pelas partes e o pedido expresso pelo A. não resolveria definitivamente o litígio material entre as partes. Este reclama a discussão da aquisição originária do direito de propriedade, e respetiva titularidade, sobre a parcela de terreno em causa, bem como a discussão dos exatos limites dessa parcela. Para tanto a inscrição registral é meio manifestamente insuficiente e a presente ação não vedará aquela discussão.
» Uma nota mais para afirmar que o pedido genérico formulado pelo A. atinente a cancelamento de inscrições matriciais e descrições registrais deveria ter sido formulado em termos precisos e definidos.
» Ainda se menciona que não se justificaria ter proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento para alegação de factos tendentes à demonstração da aquisição originária, porquanto lhe faltava por completo a respetiva causa de pedir - o A. não quis configurar a presente ação nesses termos.
» § 4. As custas da ação, ante o plasmado nos n.os 1 e 2 do art.° 446.° do Código de Processo Civil e o sentido decisório desta sentença, são a suportar pelo A..
» IV. DECISÃO
» Pelo exposto, o Tribunal decide:
» a) Julgar a presente ação totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, absolver a ré do pedido;
» b) Condenar o A., no pagamento das custas da ação [...]».
1.19) A sentença referida em 1.18) foi confirmada por acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 22.03.2012.
1.20) Por decisão sumária de 13.09.2012 o Supremo Tribunal de Justiça julgou inadmissível o recurso interposto pelo ora réu do acórdão referido em 1.19).
1.21) Em função das decisões referidas em 1.19) e 1.20), a decisão referida em 1.18) transitou em julgado a 01.10.2012.
1.22) Ainda com referência à discussão da propriedade do prédio referido em 1.1), o ora réu intentou contra a sociedade M...... uma ação que correu termos sob o n.° 818/13.4TBABT na Secção Cível - J 1 da Instância Central da Comarca de Santarém, no âmbito do qual foi homologada por sentença transitada em julgado transação com os seguintes termos: «1.° - Autor e ré reconhecem que o Município de Abrantes é dono e legítimo possuidor do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 7… da freguesia de São Vicente, do concelho de Abrantes (hoje com a área total de 2167,00m2) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes sob o n.° 4…./2… e que correspondia anteriormente ao artigo urbano 7…. da mesma freguesia e concelho e descrição 0…/0…, por o Município o haver recebido por escritura de permuta n.° …./2006 outorgada aos 07/01/2006 à qual reconhecem plena validade e eficácia;
» 2.° - Para além desta aquisição derivada, ao Município também aproveita a aquisição de tal prédio por usucapião por a posse derivada deste título por parte da M...... ter sido transmitida ao Município na escritura de permuta n.° …/2006 e por a ré ter adquirido o prédio e sobre ele exercido posse, que se traduziu na sua utilização e ocupação desde pelo menos a data do contrato promessa de compra e venda e posteriormente a escritura pública de compra e venda, datada de 07/05/1992 exarada de fls. 67 verso a fls. 69 do livro de notas 6…-A do oitavo Cartório Notarial de Lisboa, em que M......, vendeu à sociedade I...... - S......, S.A., pelo preço de quinze milhões oitocentos e oitenta e quatro mil escudos, uma parcela de terreno destinada a construção urbana, com a área de 8.360m2, a confrontar pelo norte com a estrada nacional, sul com a parte do prédio de onde é desanexado pertença da vendedora, poente com F...... e do nascente com via pública, a desanexar do artigo rústico 3… da secção G. Pela apresentação 14 de 13/10/1994 foi registada a aquisição do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo 5686, com a área total de 8.360m2 e descrito na CRP de Abrantes sob o n.° 1…/1…, a favor da M...... por aquisição à I......, S......, S.A.
» 3.° - Posse que já exerciam os anteriores possuidores do prédio M...... e antes desta I......, há mais de 30 anos, sem interrupção, de forma pública, pacífica, de boa-fé, sem oposição de ninguém».
1.23) Ainda com referência à discussão da propriedade do prédio referido em 1.1), na sequência das decisões referidas em 1.18) e 1.22), e após terem sido apreendidos para a massa insolvente da aqui autora os prédios referidos em 1.14), 1.15) e 1.16), o aqui réu instaurou contra a ora autora e respetivos credores uma ação que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo de Comércio de Santarém - Juiz 2, sob o n.° 1692/12.3TBABT-M, ao abrigo do disposto nos artigos 141.°, n.° 1 e 146.°, n.°s 1 e 2 do CIRE para restituição e separação de bens da massa insolvente, contra os réus, peticionando que seja decidido pela restituição ao Município de Abrantes da área de 1627m2 do prédio correspondente ao artigo rústico 5… da secção G da União das Freguesias de Abrantes (São Vicente e São João) e Alferrarede, inscrito na matriz a favor da insolvente Construções J...., Lda., descrito na Conservatória do Registo Predial a seu favor por aquisição a M......, sob o n.° 1…/1…., ap. 10 de 17/01/2000.
1.24) No âmbito do processo referido em 1.23) foi a 27.05.2018 proferida sentença na qual se deixou consignado, no respetivo excurso fundamentador e segmento dispositivo, além do mais, o seguinte: «DE DIREITO:
» Da aquisição pelo Autor da parcela de terreno com a área de 1627m2 do prédio correspondente ao artigo rústico 5… da secção 1G da União das Freguesias de Abrantes (São Vicente e São João) e Alferrarede, inscrito na matriz a favor da insolvente Construções J...., Lda., descrito na Conservatória do Registo Predial a seu favor por aquisição a M......, sob o n.° 1…/1…, ap. 10 de 17/01/2000, com o valor patrimonial atual de 30,00c, com as seguintes confrontações: norte com M......, do nascente com M...... e outros e do sul e poente com Município, o qual consta da verba n.° 1…:
» Conforme acima mencionado, foi proferido despacho saneador, em sede do qual foi julgada verificada a exceção de caso julgado, no que tange à causa de pedir alegada pelo Autor Município de Abrantes referente à aquisição derivada da área de 1627m2 do prédio correspondente ao artigo rústico 5… da secção 1… da União das Freguesias de Abrantes (São Vicente e São João) e Alferrarede (verba 1… do auto de apreensão) e, consequentemente, foram absolvidos os Réus da instância, nessa parte.
» Assim sendo, o objeto do presente litígio cinge-se à questão da aquisição originária do direito de propriedade do Autor, por via do instituto da usucapião.
» O Autor Município de Abrantes veio alegar que essa questão também se mostra ultrapassada, uma vez que se encontra munido de uma sentença, em sede da qual se reconhece que o mesmo é dono e legítimo proprietário da parcela em discussão, quer por via da aquisição derivada, quer mesmo por via do instituto da usucapião.
» Refere-se, pois, à ação que correu termos [sob o] n.° 818/13.4TBABT na Secção Cível - J 1 da Instância Central da Comarca de Santarém, em que era Autor o Município de Abrantes e Ré M...... - S......, Lda., em sede da qual foi homologada por sentença transitada em julgado a transação [...]
» Ora, com o devido respeito, a alegação em causa, rasa a má-fé processual, é uma afirmação totalmente temerária e despropositada. 
» A perspetiva do Autor leva a que, no limite, qualquer pessoa possa adquirir todos os imóveis que bem entender, bastando propor uma ação contra um qualquer terceiro e fazer uma transação com o mesmo, onde uma declara que a outra é proprietária por via de qualquer modo de aquisição da propriedade.
» Obviamente que a força vinculativa de uma sentença transitada em julgado tem os limites a que alude o artigo 619.° do CPC, que determina que “transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.° e 581.° (...)”, referindo-se estes preceitos à noção e requisitos da litispendência e do caso julgado.
» A exceção de caso julgado pressupõe a repetição de uma causa já julgada, havendo essa repetição quando há identidade de sujeitos, de pedido e de causa de pedir.
» ora, sem necessidade de grandes considerações, inexiste evidentemente identidade de sujeitos, uma vez que nenhum dos aqui Réus interveio na citada ação, não sendo a sentença homologatória a estes vinculativa.
» Prosseguindo.
» De acordo com o disposto no artigo 1316.° do CC, o direito de propriedade adquire-se por contrato, sucessão por morte, usucapião, ocupação, acessão.
» Sendo a usucapião uma forma de aquisição originária do direito real, destrói qualquer outro direito anterior. Assim, feita a prova da posse com as características exigidas para a usucapião, fica provado o direito real de que o autor se arroga.
» De acordo com o artigo 1251.° do CC, a posse traduz-se no exercício de poderes de facto sobre uma coisa em termos do direito de propriedade ou de outro direito real, integrando dois elementos: o corpus - seu elemento material - que consiste no domínio de facto sobre a coisa, traduzido no exercício efetivo de poderes materiais sobre ela, ou na possibilidade física desse exercício; e o animus, que consiste na intenção de exercer sobre a coisa como seu titular, o direito real correspondente àquele domínio de facto - vide Henrique Mesquita, in Direitos Reais, pág. 66 e 67.
» Em conformidade com o artigo 1287.° do CC, a usucapião baseia-se na posse do direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, com determinadas características e durante certo lapso de tempo.
» Volvendo ao caso concreto, atenta a factualidade dada como provada, o Autor não logrou provar o exercício por si e por parte dos alegados antepossuidores [I......, M......, I...... - S......, S.A. e M...... - S......, Lda. - para efeito de sucessão na posse (artigo 1255.° do CC)], de quaisquer atos materiais (corpus) sobre a parcela de terreno com a área de 1627m2 do prédio correspondente ao artigo rústico 5… da secção 1… da União das Freguesias de Abrantes (São Vicente e São João) e Alferrarede, inscrito na matriz a favor da insolvente Construções J...., Lda., descrito na Conservatória do Registo Predial a seu favor por aquisição a M......, sob o n.° 1…/1…, ap. 10 de 17/01/2000, com o valor patrimonial atual de 30,00€, com as seguintes confrontações: norte com M......, do nascente com M...... e outros e do sul e poente com Município, o qual consta da verba n.° 1….
» Esses factos seriam essenciais (como ponto de partida) para a prova da aquisição originária do direito de propriedade sobre a parcela de terreno, por via do instituto da usucapião, como acima mencionado.
» Com efeito, àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos seus factos constitutivos - n.° 1 do artigo 342.° do CC.
» Os direitos de que as pessoas são titulares no confronto com outras têm a sua essência em factos que os constituem, pelo que se deles se pretenderem prevalecer em juízo têm, em regra, de os alegar e provar.
»In casu, o ónus da prova dos factos constitutivos do direito do Autor, a este incumbia, ou seja, de que havia adquirido o direito de propriedade sobre o bem apreendido no processo de insolvência para a massa insolvente.
» Ao não cumprir esse ónus, não pode proceder a sua pretensão de separação.
» *
» DECISÃO:
» Assim sendo, face ao exposto e pelos motivos expendidos, julgo a ação totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, absolvo os Réus MASSA INSOLVENTE DE CONSTRUÇÕES J...., LDA., OS CREDORES constantes da insolvência e CONSTRUÇÕES J...., LDA do peticionado contra si nesta ação pelo Autor MUNICÍPIO DE ABRANTES [...]».
1.25) Entretanto, após a celebração da escritura de 14.01.2000 referida em 1.11), a aqui autora apresentou a 04.10.2000 junto dos serviços competentes do aqui réu um pedido de informação prévia, com a referência «Operação de Loteamento. Encosta Norte — Abrantes», que seria tramitado nos serviços da entidade demandada sob o n.° «1261/00».
1.26) Do pedido de informação prévia referido em 1.25) constava uma «Memória Descritiva» na qual se deixou consignado, além do mais, o seguinte:
«Requerente: CONSTRUÇÕES J...., LDA.
» Localização: Encosta Norte - Abrantes
» Freguesia: S. Vicente
» Área Total do Terreno: 77 858 m2
» 1 — INTRODUÇÃO
» A presente Memória Descritiva é parte integrante de um Pedido de Informação Prévia a propor à Câmara Municipal de Abrantes nos termos do Artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 448/91, de 29 de novembro com a redação dada pelo Decreto-Lei n.° 334/95 de 28 de 
dezembro e restante legislação complementar, nomeadamente o Decreto-Lei n.° 292/95, o Decreto-Regulamentar n.° 63/91 e a Portaria n.° 1182/92.
» [...]
» 2 - OBJECTIVOS DO PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA
» Tendo em conta que o Promotor da urbanização já tinha a aprovação da fase de Operação de Loteamento para uma das parcelas de terreno envolvidas, e que só posteriormente adquiriu as restantes 2 parcelas, pode-se sintetizar nos seguintes termos os objetivos gerais deste Pedido de Informação Prévia:
» 1. Englobar num único projeto mais coerente, os 3 terrenos adquiridos;
» 2. Garantir numa Informação Prévia o conjunto de direitos que possibilitem a gestação do projeto de “loteamento” com mais tranquilidade;
» 3. Garantir a Informação Prévia antes da turbulência do processo de discussão Pública do Plano de Urbanização de Abrantes.
» 3 - ENQUADRAMENTO URBANO
» 3.1 - LOCALIZAÇÃO
» O terreno a lotear localiza-se na Encosta Norte da cidade de Abrantes, entre a Av. Defensores de Chaves e EN 3, na Freguesia de S. Vicente, dentro do perímetro urbano da Cidade de Abrantes.
» 3.2 - CADASTRO
» O terreno é constituído atualmente por 3 artigos distintos, registados na Conservatória do Registo Predial de Abrantes com os seguintes números:
» Artigo n.° 0…/1… com 44 138 m2 »
Artigo n.° 0…/0… com 27 640 m2
» Artigo n.° 0…/2… com 6080 m2
» Área Total do terreno: 77 858 m2
» 3.3 - ÁREA DE INTERVENÇÃO
» De modo a realizar uma intervenção urbanística coerente para o local, propomos ao nível do desenho urbano e do futuro loteamento, o envolvimento de uma pequena parcela de terreno pertencente atualmente ao Município, com uma área a confirmar de aproximadamente 4797 m2.
» Nesse sentido considerámos uma possível permuta de terrenos de igual dimensão localizados dentro da área de intervenção, de acordo com a Planta de proposta de permutas de terrenos, Desenho n.° 0….
» Mantendo em termos numéricos a mesma área de terreno, esta estratégia de permutas permite:
» Realizar um desenho urbano mais coerente e de melhor qualidade;
» Transmitir para o Município um terreno de maior qualidade, tendo em conta a localização e a sua apetência natural para a implantação de equipamentos; 
» Evitar que o terreno do Município ficasse encravado entre urbanizações, inviabilizando a sua utilização. Este cenário seria agravado pela reduzida dimensão da sua largura [...]».
1.27) O pedido de informação prévia referido em 1.25) foi ainda instruído, além do mais, com o seguinte mapa:


1.28) O pedido de informação prévia referido em 1.25) viria a ser deferido por deliberação da Câmara Municipal de Abrantes de 18.12.2000.
1.29) A 19.12.2001 a aqui autora apresentou junto dos serviços competentes do aqui réu um pedido de licenciamento da operação de loteamento a que se reportava o pedido de informação prévia referido em 1.25), deferido pela deliberação referida em 1.28).
1.30) O pedido de licenciamento de loteamento referido em 1.29) seria tramitado na Divisão de Obras Particulares e serviços urbanos da Câmara Municipal de Abrantes sob o n.° «1…/01».
1.31) Do pedido de licenciamento de loteamento referido em 1.29) constavam o prédio referido em 1.14) e 1.16), tal como constava do pedido de informação prévia referido em 1.25), deferido pela deliberação referida em 1.28).
1.32) O pedido de licenciamento foi objeto de apreciação e discussão pública promovida pelo aqui réu durante o ano de 2002.
1.33) No âmbito do período de discussão pública referido em 1.32), a sociedade M...... apresentou uma reclamação junto do aqui réu, alegando que uma parcela de terreno englobada no pedido de loteamento, que se reportava ao prédio referido em 1.14) e 1.16), não pertencia à autora mas àquela reclamante, em função dos atos referidos em 1.2) e 1.5).
1.34) A 23.10.2002 o ora réu expediu o ofício com a referência «1…/02», endereçado à aqui autora, dando conta da reclamação referida em 1.33) e notificando a aqui demandante para «[...] no prazo de 15 (quinze) dias apresentar prova de que a parcela mencionada [era] sua propriedade [...]».
1.35) A autora apresentou instrumento escrito, em resposta à comunicação referida em 1.34), sustentando, em síntese, que havia adquirido 27 640 m2 enquanto que a M...... comprara 8360 m2, motivo pelo qual o prédio em apreço não podia pertencer à reclamante.
1.36) No âmbito do procedimento referido em 1.30), foi elaborado a 20.01.2003 instrumento escrito em papel timbrado do ora réu, sob a designação «Informação Interna», subscrita pelo Diretor do Departamento da Administração Geral da Câmara Municipal de Abrantes, com o seguinte teor: «Foi junta ao processo reclamação da M...... - S......, Lda., relativamente à posse de parcela que, no loteamento acima referido, aparece com área destinada a equipamentos (que terá 1752 m2) e que, de acordo com o reclamante, ter-lhe-á sido vendida há 11 anos.
» Junta uma escritura onde se nota que foi vendida uma área com 8360 m2 a I...... - S......, SA.
» Construções J...... Lda., por sua vez vem referir que “compraram 27 640 m2 enquanto que a M...... comprou 8360 m2, razão pela qual não pode alegar pertencer-lhe”, juntando certidão da Conservatória do Resisto Predial de Abrantes.
» O que dizer?
» 1. a) É facto que houve a referida escritura de compra e venda a favor de I...... - S......, SA com a área de aquisição de 8360 m2.
» b) A escritura dá-nos informação sobre as confrontações, mas não a confirmação geométrica de bem negociado.
» c) No processo de licenciamento n.° 1…/91 em nome de M......, há plantas de implantação com inclusão da área em litígio (desenho n.° … relativo a instalação telefónica) e respetiva planta onde consta implantações das instalações da M...... com aparente linha de delimitação a sul paralela à Avenida D. João I.
» d) Diz-se também na 3.a linha da folha das assinaturas da fotocópia da escritura outorgada - 7/5/1992 em frase aparentemente truncada ou com deficiência de pontuação: “não resultando do destaque mais de duas parcelas de terreno”.
» A assim ser, pressuporia a manutenção em continuidade do prédio originário. 
» 2. Quanto à argumentação de Construções J......, não possuímos elemento cadastral da delimitação geométrica da parcela. Ainda que possamos assentar que o seu raciocínio está correto, quanto à soma das áreas, não temos os elementos de localização corretos das parcelas.
» 3. A Conclusão a extrair:
» — O processo do loteamento carece de decisão final.
» — A área em litígio constitui no referido loteamento espaço para equipamentos de natureza público.
» — Por força do art.° i6.° n.° 2 do DL 448/91, de 29/11 na redação da Lei 26/96 de 1/8, estas parcelas constituem área de cedência e integram-se automaticamente no domínio público com a emissão do alvará.
» — A aceitação da referida parcela significa registá-la no domínio público municipal, transferindo o eventual litígio com terceiros para os serviços da Câmara Municipal.
» — A sugestão é que não se aceite como área de cedências a referida parcela, dado a incerteza jurídica quanto à propriedade. Não é a Câmara Municipal obrigada a aceitar um bem sobre que é questionada a titularidade.
» — A sugestão passa pela emissão do alvará (quando estiver na altura) sem consideração do referido espaço, prevenindo-se porém, compensação se contabilizados as restantes áreas de cedências, assim for exigível.»
1.37) Ainda no âmbito do procedimento referido em 1.30), a informação referida em 1.36) foi submetida à deliberação da Câmara Municipal de Abrantes na sua reunião de 03.02.2003, tendo sido consignada em ata, por minuta, deliberação com o seguinte teor: «Informação do Diretor do Departamento de Administração Geral - datada de 20 de janeiro de 2003, informando na sequência de uma reclamação apresentada pela M...... - S......, Lda., relativamente ao loteamento de uma parcela de terreno, sita na Encosta Norte, em Abrantes, requerido por Construções J...., Lda.,- 1…/01.
» Deliberação: Por unanimidade, deve proceder-se à audiência escrita do interessado, nos termos dos Artigos 100.° e 101.° do Código do Procedimento Administrativo, dando-se-lhe conhecimento do sentido provável da deliberação final, que consta:
» Não aceitar a parcela de terreno em litígio como área de cedência, atendendo às dúvidas quanto à propriedade por parte de Construções J..... De acordo com as três certidões da Conservatória do Registo Predial apresentadas e que abrangem a área a lotear não decorre que alguma se refira se refira à parcela situada entre a propriedade municipal e a M....... Não pode o Município aceitar a parcela para o domínio público, quando não é provada a legitimidade sobre a mesma.
» O loteador deverá apresentar alterações ao projeto de loteamento, no prazo de 60 dias, de forma a não incluir a parcela de terreno objeto de incerteza jurídica. 
» Pode o interessado pronunciar-se no prazo de 10 dias, podendo consultar o processo nos serviços municipais, na Praça Raimundo Soares, entre as 9.00 - 12. 30 e as 14.00 - 17.30 horas.
» Nada sendo dito, é esse o teor final da deliberação produzindo os seus efeitos definitivos após o decurso do referido prazo.»
1.38) A aqui autora foi notificada do teor da deliberação referida em 1.37) por comunicação expedida pelo réu sob a referência «Ofício n.° 3…/03», datada de 12.02.2003.
1.39) Na sequência da deliberação referida em 1.37), a aqui autora, na qualidade de loteadora do procedimento referido em 1.30), apresentou a 20.02.2003 nesse mesmo procedimento e junto do ora réu um requerimento com alteração do pedido de loteamento, no qual deixou consignado, além do mais, o seguinte: «CONSTRUÇÕES J...., LDA., Pessoa Coletiva n.° 502…., com sede social em Abrantes, na Rua N. S…, Chaínça, 2… - 1… Abrantes, enquanto proprietária de um conjunto terrenos localizados na Encosta Norte em Abrantes, Freguesia de S. Vicente no Concelho de Abrantes vem apresentar elementos retificados ao processo de Operação de Loteamento n.° 1….
» Os elementos apresentados dão cumprimento à decisão da CMA de 03.02.2003, alterando as áreas de cedência por forma a não incluir uma pequena parcela de terreno alvo de dúvida sobre a sua propriedade, conforme reclamação apresentada durante o fase de inquérito público.
» Apresentam-se assim novos elementos desenhados com uma proposta de áreas de cedência já apresentada ao Sr. Vereador P......em reunião no dia 14.02.2003.»
1.40) Do requerimento referido em 1.39) constava uma nova planta de síntese do loteamento, aí indicando:
a. como área total do terreno: 77 858,00 m2;
b. como terreno a lotear (a tracejado grosso): 70 673,00m2;
c. como área restante (a tracejado fino), fora da área de intervenção do loteamento: 7158,00m2, sendo:
• 5433,00m2 de uma parcela situada a sul junto da Av. Defensores de Chaves;
• a parcela a que se reportava o prédio referido em 1.14) e 1.16) a poente, com a área de 1752,00m2. 
1.41) Do requerimento referido em 1.39) constava ainda uma Memória Descritiva na qual se deixou consignado, além do mais, o seguinte: «Requerente: CONSTRUÇÕES J...., LDA.
» Localização: Encosta Norte - Abrantes
» Freguesia: S. Vicente
» Área Total do Terreno: 77 858 m2
» Área do Terreno a Lotear: 70 673,00m2;
» 1 - INTRODUÇÃO
» A presente Memória Descritiva é parte integrante de um Projeto de Licenciamento de Operação de Loteamento a propor à Câmara Municipal de Abrantes ao abrigo disposto no Decreto-Lei n.° 555/99, de 16 de dezembro, com as alterações dadas pelo Decreto- Lei 177/2001 de 4 de junho e restante legislação complementar, nomeadamente a Portaria n.° 1110/2001 e a Portaria 1136/2001.
» O terreno a lotear localiza-se na Encosta Norte, entre a Av. Defensores de Chaves e EN …, Freguesia de S. Vicente, dentro do perímetro urbano da Cidade de Abrantes.
» Em termos de Ordenamento Municipal, o presente projeto encontra-se apenas abrangido pelas normas, princípios e regulamento do PDM de Abrantes.
» O presente Projeto de Operação de Loteamento agora apresentado dá cumprimento à INFORMAÇÃO PRÉVIA de 2000/12/22 - Proc. 1…/00, Ofício n.° 2…/00.
» [...]
» 2 - ENQUADRAMENTO URBANO
» 2.1 - LOCALIZAÇÃO
» O terreno a lotear localiza-se na Encosta Norte da cidade de Abrantes, entre a Av. Defensores de Chaves e EN …, na Freguesia de S. Vicente, dentro do perímetro urbano da Cidade de Abrantes.
» 2.2 - CADASTRO
» O terreno é constituído atualmente por 3 artigos distintos, registados na Conservatória do Registo Predial de Abrantes com os seguintes números:
» Artigo n.° 0…/1… com 44 138 m2
» Artigo n.° 0…/0… com 27 640 m2
» Artigo n.° 0…/2…1 com 6080 m2
» Área Total do terreno: 77 858 m2
» 2.3 - ÁREA DE INTERVENÇÃO
» Do terreno original com 77858 m2 foram envolvidos no Loteamento apenas 70 673 m2, ficando uma área restante do Artigo n.° 0…/0…com 7185m2.
» [...]
» 5 - ÍNDICES E INDICADORES URBANÍSTICOS
» [...]
» 5.2 - INDICADORES URBANÍSTICOS DA PROPOSTA


1.42) No âmbito do procedimento referido em 1.30), foi elaborado a 10.03.2003 instrumento escrito em papel timbrado do ora réu, sob a designação «Informação Interna», subscrita pelo Chefe da Divisão de Obras Particulares e de Serviços Urbanos da Câmara Municipal de Abrantes, com o seguinte teor: «Relativamente ao processo de loteamento em epígrafe, informa-se que, na sequência da informação técnica n.° 2…/02, foi submetido a discussão pública e que foi alterado por forma a eliminar da área a lotear, uma parcela de terreno que foi objeto de reclamação por parte da M......, que a considera como sua propriedade. Esta parcela de terreno, foi substituída por uma outra, com a mesma área, retirada da parte do terreno que não era objeto de loteamento, pelo que se mantém os indicadores urbanísticos previstos na proposta inicial, que não sofreu alteração. Em face do exposto, retoma-se o teor da informação n.° 2…/02, procedendo-se a pequenos ajustamentos.
» [...]

» Sendo as medidas preventivas desnecessárias, sugere-se a aprovação do loteamento.

» Os indicadores urbanísticos para a proposta de loteamento são os seguintes:

“(texto integral no original;imagem)”



1.43) Ainda no âmbito do procedimento referido em 1.30), a informação referida em 1.42) foi submetida à deliberação da Câmara Municipal de Abrantes na sua reunião de 24.03.2003, tendo sido consignada em ata, por minuta, deliberação com o seguinte teor: «Informação da Divisão de Obras Particulares e Serviços urbanos - datada de 10 de março de 2003, informando relativamente ao loteamento de um terreno na Encosta Norte - Abrantes, requerido por Construções J......, Lda. – 1…/01.
» Deliberação: Por unanimidade, aprovado o referido processo de loteamento, nos termos da informação da Divisão de Obras Particulares e Serviços Urbanos, que se dá por transcrita, devendo o processo ser completado com a apresentação dos projetos das especialidades, no prazo de um ano, nomeadamente infraestruturas viárias, redes de abastecimento de águas, esgotos e drenagem, de gás, de eletricidade, de telecomunicações e arranjos exteriores, contendo orçamento da obra por especialidades e global, nos termos previstos no art.° 9.° da Portaria n.° 1110/2001, de 19 de Setembro.
» É dispensada a audiência dos interessados nos termos da alínea b) do n.° 2 do artigo 103.° do Código do Procedimento Administrativo.»
1.44) A aqui autora foi notificada do teor da deliberação referida em 1.43) por comunicação expedida pelo réu sob a referência «Ofício n.° 5…/03», datada de 02.04.2003.
1.45) A 02.04.2004 a ora autora apresentou requerimento junto do réu, ainda no âmbito do procedimento referido em 1.30), para aprovação do pedido de licenciamento das obras de urbanização referentes ao projeto de operação de loteamento n.° 1…., por fases, em cinco fases.
1.46) O requerimento de faseamento referido em 1.45) foi deferido por deliberação da Câmara Municipal de Abrantes de 05.07.2004.
1.47) No âmbito do procedimento referido em 1.30), foi elaborado a 14.10.2004 instrumento escrito em papel timbrado do ora réu, sob a designação «Informação», na qual se deixou consignado, além do mais, o seguinte: «O requerente apresentou em 2/4/2004, sob o registo L 0…., plano de faseamento para as obras de urbanização. O presente plano comporta 5 (cinco) fases:
» Fase 1: Execução de infraestruturas e vias + áreas públicas.
» Lotes abrangidos: 1,2,3,6,7,8 e 9
» Prazo de execução: 36 meses;
» Orçamento parcial: € 856 258,38
» Fase 2: Execução de infraestruturas e vias + áreas públicas
» Lotes abrangidos: 4,5,10,11,12 e 27
» Prazo de execução: 12 meses;
» Orçamento parcial: € 146 635,10
» Fase 3: Execução de infraestruturas e vias + áreas públicas
» Lotes abrangidos: 13,14 e 15 » Prazo de execução: 18 meses;
» Orçamento parcial: € 216 205,71
» Fase 4: Execução de infraestruturas e vias + áreas públicas
» Lotes abrangidos: 20,21,22,23,24,25, e 26
» Prazo de execução: 24 meses;
» Orçamento parcial: € 377 742,72
» Fase 5: Execução de infraestruturas e vias + áreas públicas
» Lotes abrangidos: 16,17,18, e 19
» Prazo de execução: 18 meses;
» Orçamento parcial: € 164 756,98

» Globalmente o processo está em condições de merecer aprovação, podendo ser emitido o respetivo alvará referente à i.a fase mediante garantia bancária no valor de € 856 258,38 (Oitocentos e cinquenta e seis mil e duzentos e cinquenta e oito euros e trinta e oito cêntimos).
» Conforme faseamento aprovado, o prazo para conclusão das obras de urbanização da í.a Fase é de 36 (trinta e seis) meses.
» [...]
» O valor devido pela realização da í.a fase da operação urbanística, de acordo com o Regulamento da urbanização e da Edificação e artigos correspondentes da Tabela de Taxas em vigor, é o seguinte:
» Taxa devida no âmbito do art.° 11.0 do Regulamento
» Art.° 14.0 da Tabela de Taxas
» Habitação Coletiva + Comércio + Serviços
» TI - 15 764,00m2 x € 6,63 = € 104 515,32
» O valor devido pela realização da í.a fase da operação de loteamento ascende a € 104 515,32 (Cento e quatro mil, quinhentos e quinze euros e trinta e dois cêntimos).
» É dispensada a audiência dos interessados nos termos da alínea b) do n.° 2 do artigo 103.0 do Código do Procedimento Administrativo.»
1.48) Ainda no âmbito do procedimento referido em 1.30), a informação referida em 1.47) foi submetida à deliberação da Câmara Municipal de Abrantes na sua reunião de 08.11.2004, tendo sido consignada em ata, por minuta, deliberação com o seguinte teor: «Por unanimidade, aprovado o referido processo de loteamento nos termos da citada informação, que se dá por transcrita, podendo ser emitido o respetivo alvará referente à 1.a fase mediante garantia bancária no valor de 856 258,38 € (oitocentos e cinquenta e seis mil duzentos e cinquenta e oito euros e trinta e oito cêntimos).
» O valor devido pela realização da 1.a faseada operação urbanística, de acordo com o Regulamento da urbanização e da Edificação e artigos correspondentes da Tabela de Taxas em vigor, é o seguinte:
Taxa devida no âmbito do art.° 11.° do Regulamento
» Art.° 14.° da Tabela de Taxas
» Habitação Coletiva + Comércio + Serviços
» TI ~ 15 764,00m2 x € 6,63 = € 104 515,32
» O valor devido pela realização da 1.a fase da operação de loteamento ascende a € 104 515,32 (Cento e quatro mil, quinhentos e quinze euros e trinta e dois cêntimos).»
1.49) A aqui autora foi notificada do teor da deliberação referida em 1.48) por comunicação expedida pelo réu sob a referência «Ofício n.° 1…/04», datada de 17.11.2004.

1.50) A autora não requereu junto dos serviços do réu a emissão do alvará da 1.a fase até dezembro de 2006.

1.51) A autora não solicitou a emissão do alvará porque estava em negociações com outros promotores imobiliários igualmente interessados no loteamento da Encosta do Norte.

1.52) A 05.12.2006 a aqui autora apresentou junto do aqui réu um requerimento para emissão do alvará da i.a fase do loteamento, sem liquidar a taxa referida em 1.48), mais requerendo que a caução a prestar a favor da Câmara Municipal de Abrantes no valor de € 856 258,38 fosse prestada sobre bens imóveis propriedade do requerente, nomeadamente lotes da urbanização em causa, com localização e avaliação a acordar com a entidade demandada.

1.53) Em data não apurada, mas situada no final de 2006, realizou-se nas instalações da entidade demandada uma reunião com os legais representantes da autora e do réu e ainda com representantes da sociedade R…., na qual foi aflorada a possibilidade de instalar no local objeto da operação de loteamento a que se reportava o procedimento referido em 1.30) um projeto denominado “Ofélia Club”, que seria um complexo médico-social destinado a uma clientela sénior norte europeia, que iria previsivelmente criar 500 postos de trabalho diretos, um movimento permanente de mais de 2000 pessoas e um investimento de cerca de € 60 000 000,00, promovido pelo Grupo E..., SA.
1.54) Para a viabilização daquele investimento, o Grupo E...., SA outorgou um contrato promessa de compra e venda de prédios detidos pela autora, com uma área de 57 000m2.
1.55) A 29.02.2007 a Assembleia Municipal de Abrantes deliberou aprovar a proposta da Câmara Municipal para alienação, por ajuste direto, de uma área de 22 860 m2 na Encosta Norte, destinado à criação de espaços verdes e equipamentos a incluir no projeto imobiliário referido em 1.53).
1.56) O projeto referido em 1.53) e a deliberação referida em 1.55) foram objeto de divulgação na comunicação social nos anos de 2007 e 2008, e inclusive viria a ser anunciado publicamente no Edifício Pirâmide a 30.09.2008.

1.57) A 28.05.2008 deu entrada nos serviços do réu um novo pedido de licenciamento de outra operação urbanística para a mesma área a que se reportavam os projetos referidos em 1.30) e 1.53) pela empresa P......, Lda.

1.56) A promotora do pedido referido em 1.57) apresentou esse pedido a coberto de uma procuração emitida a seu favor pelo sócio gerente da autora e sua mulher, datada de 27.05.2008, pela qual lhe era permitido «[...] requerer e praticar todas as diligências necessárias relativas ao licenciamento de loteamento, anexando os [...] prédios [...] números 0…/2…, 0…/1… e 0…/1… da freguesia de São Vicente, do concelho de Abrantes [...]».
1.59) Os prédios mencionados na procuração referida em 1.58) faziam parte da área a lotear diretamente pela autora ao abrigo do licenciamento de 24.03.2003 no procedimento referido em 1.30).
1.60) O pedido referido em 1.57) foi autuado nos serviços competentes do réu sob o n.° «2…/08».
1.61) Em função do conhecimento do novo projeto e considerando a proposta da autora de substituição da caução por entrega de prédios ou lotes, referida em 1.52), como uma proposta de negociação vaga e que conduziria a um mau negócio para a entidade demandada e um mau uso dos dinheiros públicos, o réu não chegou a emitir o alvará da 1.a fase do loteamento.
1.62) Considerando a entrada do pedido referido em 1.57), foi no âmbito do procedimento referido em 1.30) elaborado a 13.06.2008 instrumento escrito em papel timbrado do réu, sob a designação e referência «Parecer n.° 08…», com o seguinte teor: «Atendendo à entrada nesta câmara do processo n.° 2…/08, em nome da Sociedade de Construções J...., Lda., para o mesmo local do presente processo sugiro que a firma titular do processo requeira o arquivo deste, uma vez que neste momento já não fará sentido emitir-se o alvará de Loteamento solicitado.
À consideração superior».
1.63) Sobre o parecer referido em 1.62) foi exarado despacho de concordância pelo Vice-Presidente da Câmara Municipal de Abrantes datado de 24.06.2008.
1.64) A 03.07.2008 foi expedido instrumento escrito em papel timbrado da Divisão de Ordenamento e Gestão Urbanística da Câmara Municipal de Abrantes, com a referência «Ofício n.° DOCU 08…. Processo 01…», endereçado à aqui autora, subordinado ao assunto «Operação de Loteamento», com o seguinte teor: «Em relação ao processo supra referenciado, para a operação de loteamento que pretendia levar a efeito na Encosta Norte, serve o presente para, de acordo com o despacho proferido em 2008/06/24, informar que deverá solicitar o arquivo deste, uma vez que neste momento já não fará sentido emitir-se o alvará de

Loteamento solicitado, atendendo a que neste momento está em curso o processo n.° 2…/08 para o mesmo local».
1.65) A autora recebeu a comunicação referida em 1.64) a 15.07.2008.
1.66) A autora não endereçou nenhuma comunicação ao réu em resposta à comunicação referida em 1.64).
1.67) Ainda no âmbito do procedimento referido em 1.30), foi a 16.11.2009 elaborado instrumento escrito em papel timbrado do réu, sob a designação e referência «Informação n.°3…/2009», subordinado ao assunto «Operação de Loteamento», com o seguinte teor: «O presente processo encontra-se pendente desde 3 de julho de 2008, do esclarecimento solicitado através do nosso ofício n.° 08….
» Para o mesmo local existe o processo n.° 2…/08, que embora se encontre aprovado, para o mesmo ainda não foi requerida a emissão do alvará de Loteamento.
» Como até ao presente momento, não entregou a firma requerente quaisquer documentos ou informações, desde a data acima mencionada, sugiro, que se considere deserto o procedimento, nos termos do Artigo 111.° do Código do Procedimento Administrativo, na atual redação, uma vez que o processo supra mencionado se encontra pendente há mais de 6 meses [...]».
1.68) A informação referida em 1.67) obteve despacho de concordância pelo Vice- — Presidente da Câmara Municipal de Abrantes datado de 05.01.2010.
1.69) Por ofício de 07.01.2010 a autora foi notificada pelo réu da sua intenção de declarar deserto o processo administrativo n.° 1566/2001, a que se reportava o procedimento referido em 1.30), mais sendo notificada para exercer o direito de audiência prévia.
1.70) Em resposta à comunicação referida em 1.69) a aqui autora subscreveu e endereçou ao ora réu um instrumento escrito, datado de 26.01.2010, no qual consignou o seguinte: «Em resposta ao vosso oficio datado de 11 de janeiro de 2010 com a referência 00232 consideramos o seguinte:
» Enquanto requerente do processo de loteamento da Encosta Norte nunca requeremos a sua suspensão ou o seu arquivamento pelo facto de mantermos todo o interesse em avançar com o referido Loteamento.
» Nesse sentido esclarecemos que aguardamos ainda a resposta da CMA ao nosso pedido de Emissão de Alvará da 1.a Fase do Loteamento, requerido em data oportuna e nos termos legais acompanhado de todos os elementos necessários, do qual, até à data ainda não obtivemos resposta.

» Clarificamos ainda que não pressionámos a CMA para responder ao referido pedido, pelo facto de ter estado a decorrer entretanto um outro projeto, denominado "Ofélia Club” e era necessário aguardar para perceber se o mesmo era viável e se tinha sequência.
» Esse projeto, “Ofélia Club”, como é sabido publicamente não avançou nem vai avançar, pelo que mantemos todo o interesse em continuar com o nosso projeto inicial, cuja configuração urbana ficou aliás desenhada no Plano de Urbanização e Abrantes.
» Nesse sentido, solicitamos resposta da CMA ao nosso pedido, de Emissão de Alvará da i.a Fase, nomeadamente em relação à nossa proposta de prestação de caução.
» Com os melhores cumprimentos, [...]».
1.71) Ainda no âmbito do procedimento referido em 1.30), foi a 10.03.2010 elaborado instrumento escrito em papel timbrado do réu, sob a designação e referência «Informação Interna n.° 2…/2010/PV», subordinado ao assunto «Processo n.° 1…/01 (J...., Ida.) - Deserção de procedimento», com o seguinte teor: «Foi solicitado parecer jurídico a fim de saber se o procedimento se encontra deserto ou não, dado que nunca foi respondida a questão colocada acerca da prestação de caução.
» Tendo presente o enquadramento de facto enunciado na informação n.° 1…/2010, de fls. 390-391, que aqui se dá por reproduzida, e:
» Considerando que, em 06.12.2006, o requerente solicitou a emissão do alvará de loteamento, requerendo também que a caução fosse prestada sobre bens imóveis, nos termos do art. 54.° do RJUE (Decreto-Lei n.° 555/99, de 16 de dezembro, na redação do Decreto-Lei n.° 177/2001, de 4 de junho) e que estes pedidos nunca foram apreciados;
» Considerando que a deserção é, nos termos do art. 111.° do CPA, declarada quando o procedimento, por causa imputável ao interessado, esteja parado por mais de seis meses, salvo se houver interesse público na decisão;
» Considerando que “não é, na verdade, qualquer silêncio do particular, decorrido o prazo legal, que funciona em jeito de desistência silente, como facto extintivo do procedimento”, sendo que a declaração emitida pela administração “supõe o referido juízo de prévia imputabilidade e que impõe, portanto, a sua fundamentação”;
» Considerando também que “a paralisação há de respeitar a uma formalidade indispensável à sequência do procedimento, porque, de outro modo, este prosseguirá, embora da omissão da formalidade possam, naturalmente, derivar outras consequências prejudiciais para o respetivo interessado”;
» Entendo que não pode considerar-se verificada a deserção do procedimento já que, para além de a paralisação que deu origem à declaração de deserção não configurar uma formalidade indispensável à sequência do procedimento, existe no processo um requerimento apresentado pelo loteador ao qual não foi dada resposta e sobre o qual foi manifestado interesse.
» Nessa medida, sugere-se que se revogue a decisão de arquivar o processo, de 05.01.2010, constante de fls. 387, nos termos do art. 138.° do CPA.
» Atendendo, todavia, a que existe novo pedido de licenciamento de loteamento, em nome do mesmo requerente, para o mesmo local (processo n.° 2…/08), sugere-se que notifique o particular para que se pronuncie sobre qual processo pretende manter em curso, advertindo-o, nos termos do art. 91.°, n.° 4, do CPA, que a câmara municipal não poderá dar seguimento ao procedimento e apreciar o pedido de emissão de alvará de loteamento e de prestação de caução sobre imóveis, apresentado em 06.12.2006, enquanto o particular não se pronunciar nos termos solicitados.
» O mesmo procedimento deverá ser adotado, em paralelo, no processo n.° 2…/08, de forma a ficar esclarecido qual processo o requerente pretende que seja tramitado até final e proceder-se ao arquivo do outro. Esta é uma posição que tem que ser tomada pelo requerente, não podendo ser assumida pela câmara.
» À consideração superior [...]».
1.72) A informação referida em 1.71) obteve despacho de concordância pelo Vice- Presidente da Câmara Municipal de Abrantes datado de 23.03.2010.
1.73) A 23.04.2010 o aqui réu expediu, por via postal registado com aviso de receção, um instrumento escrito em papel timbrado da entidade demandada, com a referência «Ofício n.° DOGU 10…», endereçado à aqui autora, subordinado ao assunto «Deserção do procedimento», e com o seguinte teor: «Em resposta à vossa exposição com a referência L0…/1…, datada de 2010/01/27 referente ao assunto supra mencionado, para a operação de loteamento que pretendem levar a efeito na Encosta Norte, Abrantes, freguesia de São Vicente, por despacho proferido em 2010/03/23, fica pelo presente notificada de acordo com informação jurídica que a seguir se transcreve: “Atendendo, todavia, a que existe novo pedido de licenciamento de loteamento, em nome do mesmo requerente, para o mesmo local (processo n.° 2…/08), sugere-se que se notifique o particular para que se pronuncie sobre qual processo pretende manter em curso, advertindo-o, nos termos do art.° 91.°, n.° 4, do CPA, que a Câmara Municipal não poderá dar seguimento ao procedimento e apreciar o pedido de emissão de alvará de loteamento e de prestação de caução sobre imóveis, apresentado em 06.12.2006, enquanto o particular não se pronunciar nos termos solicitados.
» “O mesmo procedimento deverá ser adotado, em paralelo, no processo número 2…/08, de forma a ficar esclarecido qual o processo o requerente pretende que seja tramitado até final e proceder-se ao arquivo do outro. Esta é uma posição que tem que ser tomada pelo requerente, não podendo ser assumida pela Câmara.”
» Mais se informa que foi revogada a decisão de arquivar o processo, de 05 de janeiro de 2010, nos termos do art.° 138.° do Código do Procedimento Administrativo.»
1.74) A autora foi notificada da comunicação referida em 1.73) a 30.04.2010.
1.75) A autora não respondeu à comunicação referida em 1.73).
1.76) Entretanto, no âmbito do procedimento referido em 1.60), foi a 02.09.2008 consignada em ata de reunião da Câmara Municipal de Abrantes minuta de deliberação com o seguinte teor: «[...] aprovar o projeto de arquitetura do loteamento apresentado, nos termos da referida Informação N.° 2…/2…RC da Divisão de Ordenamento e Gestão Urbanística, que se dá por transcrita.
» Aprovar também o projeto das obras de urbanização apresentadas, nos termos da presente informação técnica, que igualmente se dá por transcrita e nos demais termos legais.
» Informar a requerente, P......, Lda., que deverá proceder à entrega das telas finais, antes da emissão do alvará de loteamento.
» À Divisão de Ordenamento e Gestão Urbanística para proceder em conformidade.
» É dispensada a audiência da interessada nos termos da alínea b) do n.° 2 do Artigo 103.° do Código do Procedimento Administrativo.»
1.77) O projeto de loteamento aprovado pela deliberação referida em 1.76) tinha a configuração constante da planta geral apreciada nos serviços do réu com a referência «2…/2…RC», referida na deliberação supra aludida, e da qual não
constava o prédio referido em 1.14) e 1.16).
1.78) O réu expediu a 04.09.2008 ofício endereçado à sociedade P......, notificando-a da aprovação provisória do seu projeto pela deliberação referida em 1.76).
1.79) Ainda no âmbito do procedimento referido em 1.60), após o período de discussão pública, foi a 21.10.2008 consignada em ata de reunião da Câmara Municipal de Abrantes minuta de deliberação com o seguinte teor: «N.° 1… — Proposta de Deliberação do Vereador P......, referente a uma Informação da Divisão de Ordenamento e Gestão Urbanística, datada de 14 de outubro de 2008, acerca do pedido de licenciamento de operação de loteamento, sito na Encosta Norte freguesia de S. Vicente, Abrantes, requerida por P......, Lda., que após ter terminado o período de discussão pública, nos termos do Artigo 22.° do Decreto- Lei n.° 555/99, de 16 de dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 177/2001, de 4 de junho, se verificou não ter havido registo de qualquer reclamação. - …/08
» Deliberação: Por unanimidade, aprovar a referida operação de loteamento, nos termos do Artigo 23.° do Decreto-Lei n.° 555/99, de 16 de dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 177/2001, de 4 de junho, e de acordo com a informação técnica constante do processo, datada de 29 de agosto de 2008.
» É dispensada a audiência da interessada nos termos da alínea b) do n.° 2 do Artigo 103.° do Código do Procedimento Administrativo.
» À Divisão de Ordenamento e Gestão Urbanística para proceder em conformidade.»
1.80) O réu expediu a 27.10.2008 ofício endereçado à sociedade P......, notificando-a da aprovação definitiva do seu projeto pela deliberação referida em 1.79), mais informando que o promotor dispunha de um ano para requerer a emissão do respetivo alvará.
1.81) O ofício referido em 1.80) foi devolvido, frustrando-se a notificação da deliberação referida em 1.79) à sociedade P.......
1.82) O réu expediu a 17.11.2008 novo ofício endereçado à sociedade P......, com o mesmo teor da comunicação referida em 1.80).
1.83) O ofício referido em 1.82) foi recebido pela sociedade P...... a 28.11.2008.
1.84) Ainda no âmbito do procedimento referido em 1.60), a aqui autora apresentou junto dos serviços do ora réu um instrumento escrito datado de 21.08.2009 com o seguinte teor: «Informamos que no dia 20 de agosto de 2009, no Cartório Notarial de S......, em Abrantes, foi revogada a Procuração que esta Sociedade “CONSTRUÇÕES J...., LDA.” fez a favor de P....... Lda., conforme cópia que juntamos.
» O original está arquivado no referido Cartório.
» Assim, a partir desta data não poderá a referida procuração ser utilizada.»
1.85) Ainda no âmbito do procedimento referido em 1.60) e face à comunicação da autora referida em 1.84), foi a 21.09.2009 elaborado instrumento escrito em papel timbrado do réu, sob a designação e referência «Informação Interna n.° 8…», subordinado ao assunto «Processo n.° 2…/08 — Revogação de Procuração», com o seguinte teor: «Vem a firma Construções J...., Lda. informar, através do documento com o registo de correspondência E0…,datado de 21.08.2009, que em 20 de agosto de 2009, no Cartório Notarial S......, em Abrantes declararam revogar e considerar nula e de nenhum efeito a procuração, datada de 27 de maio de 2008, a favor da sociedade “P......, Lda.”
» Anexa cópia da referida Revogação de Procuração.
» O pedido de licenciamento de operação de loteamento, entrado neste município em 28.05.2008, através do registo n° L0…, foi efetuado pela firma P......, Lda. como procuradora de Construções J...., Lda.
» Acompanhava o referido pedido Procuração redigida no Cartório Notarial de S......, sito em Abrantes, na qual se declarava atribuir a firma P......, Lda. poderes de substabelecimento para: “...a) requerer e praticar toda as diligências necessárias relativas ao licenciamento de loteamento, anexando os referidos prédios, e eventualmente com outros prédios de terceiros, executando todos os atos junto da Câmara Municipal, serviço de Finanças, Conservatória do Registo Predial, da Administração Central, Local, ou entidades dotadas de poderes de autoridade;
» “b) requerer e praticar todas as diligências necessárias ao licenciamento das edificações requerendo e praticando tudo o que for necessário na Câmara Municipal de Abrantes e junto das entidades com jurisdição sobre a matéria;
» “c) requerer os licenciamentos das atividades a funcionar nas edificações e instalações a construir, junto das diversas entidades com tutela, jurisdição sobre as mesmas;
» “d) ...”
» Pelo que a legitimidade de intervir no processo administrativo é agora da firma Construções J...., Lda. no que, no processo de licenciamento de operação de loteamento n.° 2…/08, lhe concerne, nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 52.° do CPA [...]».
1.86) Sobre a informação referida em 1.85) foi a 28.09.2009 exarado despacho de concordância e a ordenar fosse dado conhecimento à sociedade P.......
1.87) O réu expediu ofícios datados de 28.09.2009, 09.10.2009 e a 10.11.2009, endereçados à sociedade P......, visando a notificação da decisão referida em 1.86).
1.88) Os ofícios referidos em 1.87) não foram entregues à sociedade P.......
1.89) Ainda no âmbito do procedimento referido em 1.60) e face à frustração das comunicações referidas em 1.87), foi a 24.11.2009 elaborado instrumento escrito em papel timbrado do réu, sob a designação e referência «Informação Interna n.° 4…/2009», subordinado ao assunto «Operação de Loteamento», com o seguinte teor: «Na sequência da revogação da Procuração, que a firma Construções J...., tinha facultado à firma P......, Lda., por despacho proferido em 2009/09/28, foi decidido dar-lhe conhecimento de que toda a legitimidade para intervir no presente processo, é agora da referida firma Construções J.....
» Oficiada a firma P......, Lda, por três tentativas, todas elas foram devolvidas, uma vez que as cartas não foram reclamadas, voltei a fazer o reenvio da última.
» Mais informo que consultado o processo, verifico que terminará em 2009/11/30 o prazo para a firma requerente solicitar a emissão do alvará de loteamento.
» Como até setembro passado, toda a correspondência era enviada para a firma P......, Lda., sugiro que se comunique a firma Construções J...., dando-lhe conhecimento, através de ofício, sobre o mencionado prazo para que o processo não caduque.
» À Consideração Superior.»
1.90) Sobre a informação referida em 1.89) viria a ser exarado despacho a 02.12.2009 ordenando a notificação à autora de que o prazo para emissão do alvará havia terminado aos 30.11.2009.
1.91) Por ofício expedido a 04.12.2009, na sequência do despacho referido em 1.90), foi a ora autora de que o prazo para emissão do alvará no procedimento referido em 1.60) havia terminado a 30.11.2009 e que o réu poderia declarar a caducidade da aprovação definitiva do seu projeto pela deliberação referida em 1.79).
1.92) A autora foi notificada do teor da comunicação referida em 1.91) a 07.12.2009.
1.93) Ainda no âmbito do procedimento referido em 1.60), foi a 03.03.2010 elaborado instrumento escrito em papel timbrado do réu, sob a designação e referência «Informação Interna n.° 2…/2010», subordinado ao assunto «Operação de Loteamento», com o seguinte teor: «Em 2009/12/04 foi comunicado à firma Promotora do presente loteamento que o prazo para levantamento do alvará, já tinha terminado em 2009/11/30.
» Remetido o processo à Fiscalização em 2010/03/01, para verificar se as obras tinham sido executadas sem o respetivo licenciamento, foi pelo mesmo serviço informado em 2010/03/02 que não foram executadas quaisquer obras de urbanização.
» Face ao exposto, propõe-se assim que seja declarada a caducidade do processo, nos termos da alínea b) do n.° 1 do artigo n.° 71.° do Decreto-Lei n.° 555/99,de 16 de dezembro, na redação da Lei n.° 60/2007, de 4 de setembro.»
1.94) Sobre a informação referida em 1.93) viria a ser exarado a 17.06.2010 parecer da Chefe da Divisão de Ordenamento e Gestão Urbanística com o seguinte teor: «Propõe-se [a declaração de] caducidade do ato de aprovação da operação de loteamento nos termos da presente informação.»
1.95) Sobre a informação referida em 1.93) e o parecer referido em 1.94) viria a ser exarado a 09.07.2010 despacho pelo Vice-Presidente da Câmara Municipal de Abrantes com o seguinte teor: «Aguarde-se agendamento de reunião com o requerente.»
1.96) A autora não requereu em qualquer altura do procedimento referido em 1.30), nomeadamente após os requerimentos referidos em 1.52) e 1.70) ou as comunicações do réu referidas em 1.69) e 1.73), nenhuma das intimações a a que aludem o artigo 112.0 ou o n.° 3 do artigo 113.0 do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação.
1.97) Durante a pendência do procedimento referido em 1.30), a aqui autora recebeu algumas propostas de aquisição de alguns prédios compreendidos no projeto de loteamento.
1.98) Entre outras propostas, a 25.04.2007 a aqui autora recebeu uma proposta de compra apresentada pela Vodafone com o seguinte teor: «A/C. Exmo. Sr.
» J…
» Assunto: Proposta de aquisição parcial de um imóvel em Abrantes » Exmo. Sr., antes de mais viemos em meu nome pessoal pedir-lhes as nossas desculpas pelos incómodos causados ou que possam vir a causar, por todas estas demoras e indecisões no negocio que se perspetiva a concretizar entre nós (esperando com sucesso).
» Tendo sido apresentado pelo Exmo. Sr. Arq. A...... há já algum tempo um imóvel em Abrantes com uma área de 77 858 m2 (Localizado: Abrantes). Identificado por: “Urbanização da Encosta a Norte de Abrantes”. Autor do projeto: Arquiteto A.......
» Que pertence à empresa: “ Construções J...., LDA "
» Loteamento este que está aprovado com licença de construção por levantar, e a mesma por pagar à Câmara Municipal de Abrantes, no seu ato de levantamento, mais as taxas respetivas de lei e suas “condicionantes” exigidas pela Câmara Municipal, tal qual como está identificadas nos respetivos quadros: Dimensionamento do Espaço Público, Quadro de Áreas de Cedências, índices Urbanísticos, Quadro de Áreas.
» Tendo o loteamento : 315 fogos para habitação, 57 espaços comerciais, 7 espaços para serviços. Num total de 27 lotes.
» Sendo de nosso interesse adquirir no vosso Loteamento uma parcela de terreno que abrange os Lotes do numero 1 ao numero 10 com uma área de 13 950m2 (que confina a Sul com a C… e a G.N.R. a Oeste Feira …. e terreno do Exmo. Sr. J… e R….).
» A nossa melhor proposta é de 1 000 000 00€ com as seguintes condicionantes:
» 1 — Garantia por parte da Câmara Municipal de Abrantes, a alteração de uso (habitação para comércio). E sua aprovação para tal.
» 2 — Que fique bem claro a posição da cedência ou venda do terreno entre os intervenientes: Exmo. Sr. J…, a Câmara Municipal de Abrantes, Sr. da R… e outros (localizado este a Norte com à R… a Sul com o Feira….).
» 3 — Com a aprovação da DGE (Direção-geral da Economia).
» Sem outro assunto de momento, apresento os meus melhores cumprimentos. » M......».
1.99) A 22.01.2008 a aqui autora outorgou um contrato promessa de compra e venda com a sociedade Gabinete 7….., Lda., subordinado, além do mais, às seguintes cláusulas: «1.a
» Por este contrato a Primeira Outorgante por si e na qualidade em que intervém promete vender o terreno abaixo indicado, de que é legítima proprietária, à Segunda Outorgante, que por sua vez este promete comprar ou a quem este indicar.
» 2.a
» Terrenos sito em Santana, Freguesia de São Vicente, Concelho de Abrantes, descritos na conservatória do Registo Predial de Abrantes, sob as fichas N° 01… e 02 …, inscritos na matriz predial rústica da freguesia de São Vicente, Abrantes Secção I Art…. e Secção I Art. …e terreno sito em O...... Freguesia de São Vicente, Concelho de Abrantes, descrito na conservatória do Registo Predial de Abrantes, sob a ficha N° 03…., inscrito na matriz predial rústica da freguesia de São Vicente, Abrantes Secção G Art…..
» 3.a
» O preço global é de 2 500.000,00 € (dois milhões e quinhentos mil euros), [...]».
1.100) Nenhuma das propostas referidas em 1.97) a 1.99) se concretizou
1.101) Até ao pedido do alvará referido em 1.52) a aqui autora apresentava uma conta corrente na Caixa ......referente aos mútuos bancários para aquisição dos prédios e construções dos lotes referentes ao projeto referido em 1.30), bem como respetivas garantias bancárias, nos seguintes montantes:
a. a 18.10.2004: € 918 664,00;
b. a 28.01.2005: € 832 528,00;
c. a 01.04.2005. € 784 155,00;
d. a 15.02.2006: € 656 018,00.
1.102) Em 2012 a aqui autora requereu a sua entrada em processo especial de revitalização, processo que correu termos no 2.0 Juízo do Tribunal Judicial de Abrantes sob o n.° 1692/12.3TBABT.
1.103) No âmbito do processo referido em 1.102) a aqui autora foi declarada insolvente por sentença proferida a 21.05.2013.
1.104) Na sequência da instauração da ação de reivindicação que o ora réu interpôs contra a aqui autora referida em 1.17), a ora demandante apresentou a 31.08.2009 reclamação com pedido de intervenção do Sr. provedor de Justiça, consignado na reclamação o seguinte: «Excelência.
» A n/empresa que está devidamente constituída desde 1991, NIPC 502…. com sede na CHAINÇA concelho de ABRANTES há muito tempo que tem vindo a ser molestada por parle da edilidade local, a de Abrantes.
» Foram várias as situações anormais que desabonam a conduta daquela edilidade. Referir-nos-emos nesta carta apenas a duas situações que denotam a falta de conduta para com os munícipes e neste caso para com a n/empresa, a saber:
» 1) Permuta de Terrenos entre M...... e a Câmara Municipal de Abrantes e em que a Câmara Municipal veio tomar posse dos terrenos que são pertence desta n/Empresa através de uma escritura irregular. Neste ato foram falsificados documentos com a anuência da Câmara. Nós alertámos a Câmara para tal irregularidade e mesmo assim levaram por diante a consumação do ato.
» 2) Loteamento — segundo alvará n.° 1…/87 de 14/10/1987. Foram aprovados pelo alvará lotes para 4 (quatro) prédios, sendo esta empresa proprietária de (três). O supracitado alvará foi aprovado não existindo qualquer documento sobre infraestruturas. No alvará era indicado que seria a Câmara Municipal a preparar/fornecer as estruturas previamente desenhadas por esta edilidade o que até hoje nunca fez. Posteriormente construíram-se 3 (três) prédios numa urbanização de que não há sequer projeto nem infraestrutura.
» Com outra configuração a Câmara aprovou para o mesmo local prédios que não correspondem ao loteamento tanto nas áreas como nas confrontações.
» A não concretização das infraestruturas - que são de facto - da responsabilidade da Câmara Municipal de Abrantes, já que o respetivo alvará se encontra caducado desde 2005, acarretou para a n/Empresa — já “per si” com a tesouraria debilitada - sérios problemas financeiras que a não serem resolvidos - como aliás já deveriam ter sido — nos leva ao colapso económico-financeiro.
» De todos os argumentos que apresentamos temos documentos que de pronto e a v/pedido enviaremos. Contudo, e para uma primeira abordagem deste assunto juntamos algumas peças para v/apreciação, a saber:
» 1) Registo da Conservatória Registo Predial de Abrantes; Correspondência enviada e recebida da Câmara Municipal; Copia da Caderneta Predial rústica; Certidão do Registo Predial da Conservatória Reg Predial de Abrantes.
» 2) Fotocópia do alvará de loteamento e 2 (duas) cópias da urbanização (uma carimbada correspondente ao alvará) e outra correspondente aos prédios efectivamente construídos no local (totalmente diferente - sem qq aprovação e cujos números dos lotes totalmente diferentes e sem qq relação com o que foi aprovado).
» A intervenção de V.Exa neste processo é imprescindível para repor a verdade nestes e noutros processos que temos em mãos já que se mostrou infundada as diligências que fizemos junto da Câmara para de uma forma ordeira resolvesse estes assuntos.
» Ficamos no entanto esperando o favor das v/noticias ávidos que estamos na reposição da verdade e justiça que se impõe.
» Dispomos de todos os documentos - originais — e eventualmente outros que porventura ajudem a aclarar esta situação, que de pronto vo-los faremos chegar e ou mesmo estaremos dispostos a pessoalmente nos apresentarmos para esclarecer todo este assunto que decerto envergonha o n/Pais e além disso o nosso Concelho de Abrantes [...]».
1.105) Ainda na sequência da instauração da ação que o ora réu interpôs contra a aqui autora referida em 1.17), a ora demandante apresentou a 11.09.2010 denúncia contra a entidade demandada, na sequência do que foi aberto o processo de inquérito que correu termos nos serviços do Ministério Público de Abrantes sob o n.° 623/10.0TABBT.
1.106) No âmbito do processo de inquérito referido em 1.105), foi a 14.07.2012 proferido despacho de arquivamento no qual se deixou consignado, além do mais, o seguinte: «I. Da Denúncia
» O presente inquérito teve início com denúncia de fls. 1 a 3, datada de 10.09.2010, na qual J......, relatou a prática por desconhecido (s), dos factos que resumidamente se expõem:
» M...... era proprietária de um terreno de grandes dimensões, sito, na Encosta da Barata, em Abrantes, tendo no ano de 1992 vendido parte desse terreno à empresa “M......”.
» A empresa “Construções J......, Lda., cujo denunciante é o sócio-gerente, adquiriu, em janeiro de 2000 a M......, o remanescente daquele terreno, com uma área de 2040 m2, inscrito na matriz com o n.° …-G. Aquando da aquisição do referido terreno o sócio-gerente da empresa, ora denunciante, registou-o.
» Posteriormente, em novembro de 2009, o referido terreno encontrava-se registado na Conservatória do Registo Predial em nome da Câmara Municipal de Abrantes, por via de uma permuta efetuada entre a referida Câmara e a empresa “M......”, que havia adquirido aquela parcela de terreno comprado pela firma do denunciante. A empresa “M......" entregou, pois, o referido terreno à Câmara, em troca de um outro terreno sito nas imediações.
» De forma a provar que aquela parcela de terreno era pertença da empresa “M......” foram falsificados diversos documentos.
» [...]
» III — Da Subsunção Jurídica dos Factos
» Face aos elementos recolhidos, verifica-se que os factos denunciados são suscetíveis de consubstanciar, em abstrato, a prática de um crime falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256.°, do C. Penal.
» * » Analisados os elementos de prova carreados para os autos, é possível afirmar que já no ano de 1992, aquando da escritura de aquisição por parte da “M......”, existia uma planta do local na qual foi assinalada a parte do terreno adquirida por essa empresa, onde se encontra incluída a parcela com cerca de 2000m2. A própria vendedora M...... afirmou que já havia visto essa planta aquando das negociações com a citada empresa. Na escritura de aquisição celebrada entre a “M......” e a vendedora M......consta um parágrafo no qual é referido que daquela venda não resultam mais de duas parcelas de terreno, pelo que a parcela em causa terá de ser propriedade da “M......”. Anexa a essa escritura surge sempre uma planta e onde se inclui a parcela em causa.
» Aquando da compra efetuada pelo denunciante, este requereu, junto do IGP, a resolução do processo relativo ao terreno que adquiriu a M…., de forma a ficar esclarecida a área de terreno remanescente. Assim, o IGP concluiu que, após a venda de parte do terreno de M…. à empresa “M......”, com cerca de 8500m2 restaram dois prédios rústicos com os n.os … e … que, face às áreas constantes dos títulos de propriedade correspondentes, foi atribuída a titularidade desses prédios ao denunciante, sendo que a parcela n.° …corresponde à parcela alvo de disputa que deu origem aos presentes autos.
» A decisão do IGP baseou-se exclusivamente nas áreas das parcelas do terreno, vindo posteriormente o representante da empresa “M......” referir que a área que tinha adquirido era superior àquela que constava da escritura de aquisição, não tendo sido realizado qualquer levantamento topográfico aquando do negócio.
» Em conclusão, após a efetivação das várias diligências cujos resultados foram carreados para os autos, nomeadamente do resultado das buscas efetuadas, não foi possível encontrar provas inequívocas de qualquer falsificação de documentos ou da prática de qualquer outro crime.
» os documentos referidos na denúncia como tendo sido falsificados foram entregues no ano de 1992, aquando da escritura de aquisição celebrada entre a empresa “M......” e M….. Assim, sobre tais factos ocorreram, pelo menos, 20 anos.
» Desta forma, não foi possível recolher provas da prática dos crimes em investigação.
» * » IV — Decisão
» Atento todo o exposto, uma vez que não foram recolhidos indícios suficientes da prática de crime ou de quem foram os seus agentes, determino o arquivamento dos

presentes autos de inquérito, nos termos do artigo 277.0, n.° 2 do Código de Processo Penal.
» [...]
» Para efeitos da Circular da PGR n.° 8/2008, de 23.05.2008, consigna-se que a prescrição ocorrerá em 29-09-2019 [...]».
1.107) A autora despendeu entre 2007 e a data da entrada da presente ação no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, a título de encargos bancários com o mútuo contraído com a Caixa ...... referido em 1.101) o montante de € 89 143,00.
1.108) No período compreendido entre 2007/2008 e 2012/2013, verificou-se uma crise económica e financeira grave e estrutural, de dimensão e efeitos globais.

*


1. Factos Não Provados
Todos os demais, sendo com relevância para a decisão, considerando todas as soluções de Direito plausíveis, os seguintes:

2.1) A aqui autora recebeu uma proposta a 20.09.2006, pela Sociedade “S......”, de € 1 500 000,00 a par da entrega de 20 fogos.

2.2) A ação judicial intentada em 2009 pelo aqui réu, referida em 1.17), versava sobre um prédio que fazia parte do projeto de loteamento aprovado pela deliberação referida em 1.43).

2.3) o facto de a ação judicial intentada em 2009 pelo aqui réu, referida em 1.17), não versar sobre um prédio que fazia parte do projeto de loteamento aprovado pela deliberação referida em 1.43) não era do conhecimento dos potenciais compradores de lotes ou fogos do mesmo loteamento.

2.4) A frustração dos negócios referidos em 1.51), 1.54) e 1.97) a 1.99) deveu-se, em exclusivo, ao diferendo entre a aqui autora e ora réu com referência ao prédio referido em 1.16).

2.5) A degradação da situação económica e financeira da autora ficou a dever-se em exclusivo:

a. à frustração dos negócios referidos em 1.51), 1.54) e 1.97) a 1.99);

b. ao diferendo entre a aqui autora e ora réu com referência ao prédio referido em 1.14) e 1.16);

c. à não emissão do alvará de construção no âmbito do procedimento referido em 1.30).
2.6) Os valores padrão do m2 na Encosta Norte de Abrantes eram:
a. de € 25,00 a 14.01.2000;
b. de €110,00 a 31.12.2006;
c. de € 764,00, quanto a m2 construído, e de € 45,00, quanto a m2 sem construção, à data da interposição da presente ação.

2.7) A autora despendeu € 57 626,55 com o projeto e respetivas reformulações, no âmbito do procedimento referido em 1.30).

2.8) A autora despendeu € 46 950,13 com pagamentos efetuados à C….


*

2. Motivação
Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 607.°, n.° 4, do Código de
Processo Civil, aqui aplicável por força da remissão operada pelos artigos 1.° e 35.°, n.° 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos na redação vigente à data da instauração da ação, faz-se consignar que o tribunal atendeu à factualidade essencial alegada pelas partes, bem como à factualidade instrumental que decorreu da instrução da causa e à factualidade complementar sujeita a contraditório, nomeadamente em sede de audiência final [artigo 5.°, n.°s 1 e 2, alíneas a) e b), do Código de Processo Civil]. Para o efeito, atendemos a todos os factos invocados e trazidos ao conhecimento do tribunal, bem como a todas as provas documentais carreadas para os autos, independentemente de aproveitarem ou não à parte que as produziu (artigo 413.° do Código de Processo Civil), mais atendendo, também por força do princípio do inquisitório, aos factos notórios e àqueles de que o tribunal teve conhecimento no exercício das suas funções (artigos 411.° e 412.° do Código de Processo Civil).
A esta luz, consigna-se que a convicção do tribunal se formou essencialmente com base na análise crítica do relatório pericial e da documentação não impugnada junta aos articulados iniciais e demais instrumentos processuais produzidos pelas partes e que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais, bem como nos depoimentos prestados em sede de audiência final, cujas atas antecedem. Aplicaram-se ainda, quer o princípio cominatório semipleno pelo qual se deram como provados os factos admitidos por acordo pelas partes, quer as regras gerais de distribuição do onus probandi. Tudo nos termos e com os fundamentos melhor discriminados de seguida.
Está provada documentalmente (cf. artigo 607.°, n.° 5, do Código de Processo Civil) a matéria referida nos pontos 1.1) (doc. 3 junto à petição inicial), 1. 2) (doc. 4 junto à petição inicial), 1.3) e 1.4) (doc. 5 junto à petição inicial), 1.8) (doc. 6 junto à petição inicial), 1.10) (documentos 7 e 8 juntos à petição inicial), 1.11) (doc. 2 junto à petição inicial), 1.12) (doc. 9 junto à petição inicial), 1.13) (doc. 1 junto à petição inicial), 1.14) (doc. 10 junto à petição inicial), 1.15) e 1.16) (doc. 11 junto à petição inicial), 1.19) (doc. 13 junto à petição inicial), 1.20) (doc. 14 junto à petição inicial), 1.22), 1.23) e 1.24) (cf. sentença junta a fls. 1037 ss. dos autos em paginação eletrónica), 1.25), 1.26) e 1.27) (doc. 15 junto à petição inicial), 1.28) (doc. 16 junto à petição inicial), 1.29), 1.30) e 1.31) (doc. 7 junto à contestação), 1.32), 1.33) e 1.34) (doc. 19 junto à petição inicial), 1.35), 1.36), 1.37) e 1.38) (doc. 20 junto à petição inicial), 1.39), 1.40) e 1.41) (documentos 21 junto à petição inicial e 6 junto à contestação), 1.42) (doc. 8 junto à contestação), 1.43) (doc. 9 junto à contestação), 1.44) (doc. 22 junto à petição inicial), 1.45) (doc. 10 junto à contestação), 1.46) (doc. 11 junto à contestação), 1.47) (doc. 12 junto à contestação), 1.48) (doc. 13 junto à contestação), 1.49) (doc. 23 junto à petição inicial), 1.52) (documentos 24 junto à petição inicial e 14 junto à contestação), 1.55) (doc. 15 junto à contestação), 1.56) (documentos 16 a 22 juntos à contestação), 1.57) (doc. 23 junto à contestação), 1.58), 1.59) e 1.60) (doc. 24 junto à contestação), 1.62) e 1.63) (doc. 25 junto à contestação), 1. 64) e 1.65) (doc. 26 junto à contestação), 1.67) e 1.68) (doc. 27 junto à contestação), 1.69) (doc. 28 junto à contestação), 1.70) (doc. 29 junto à contestação), 1.71) e 1.72) (doc. 30 junto à contestação), 1.73) e 1.74) (doc. 31 junto à contestação), 1.76) (doc.32 junto à contestação), 1.77) e 1.78) (doc. 33 junto à contestação), 1.79) (doc. 34 junto à contestação), 1.80) e 1.81) (doc. 35 junto à contestação), 1.82) e 1.83) (doc. 36 junto à contestação), 1.84) (doc. 37 junto à contestação), 1.85) e 1.86) (doc.38 junto à contestação), 1. 87) e 1.88) (documentos 39, 40 e 41 juntos à contestação), 1.89) e 1.90) (doc. 42 junto à contestação), 1.91) e 1.92) (doc. 43 junto à contestação), 1.93), 1.94) e 1.95) (doc. 44 junto à contestação), 1.98) (doc. 33 junto à petição inicial), 1.99) (doc. 32 junto à petição inicial), 1.101) (doc. 35 junto à petição inicial), 1.102) e 1.103) (doc. 1 junto à contestação), 1.104) (doc. 29 junto à petição inicial), 1.105) e 1.106) (doc. 28 junto à petição inicial) e 1.107) (doc. 34 junto à petição inicial).
Está ainda provada documentalmente (tendo por referência a certidão apresentada pela autora como doc. 12 junto à petição inicial) e por acordo (cf. artigo 490.°, n.° 2, do Código de Processo Civil vigente à data da apresentação dos articulados) a matéria levada ao probatório nos pontos 1.5), 1.6), 1.7), 1.9), 1.17), 1.18) e 1.21).
A factualidade levada ao probatório no ponto 1.108) constitui facto notório
(artigo 412.°, n.° 1, do Código de Processo Civil).
A convicção do tribunal no tocante à matéria levada ao probatório nos pontos 1.50), 1.52), 1.53), 1.54), 1.66), 1.75) e 1.96), relativa à conduta procedimental, quer da autora, quer do réu, no âmbito dos diversos procedimentos de licenciamento, resultou de uma análise conjugada e integrada de diversos meios de prova.
Desde logo, sendo sabido e conhecido que a tramitação procedimental (impulsos procedimentais dos requerentes promotores e decisões da autoridade administrativa demandada) é necessariamente burocrática, formalizada e carecendo de ser externada, em princípio, sob a forma escrita, o tribunal atendeu ao que resultou provado documentalmente nos autos. Nesse conspecto, não tendo sido carreada documentação que atestasse qualquer resposta da autora às comunicações referidas em 1.63) e 1.73), ou qualquer outro impulso procedimental que não o referido no ponto 1.70), só podemos inferir que, de facto, inexistiu qualquer outro impulso procedimental da demandante, nomeadamente, para os efeitos que interessam à economia da presente decisão, aqueles referidos no probatório e ora motivados. Ademais, tal resultou provado pelo depoimento isento, esclarecido e assertivo da testemunha C.......
Por seu turno, para a formação da convicção probatória no que diz respeito ao específico contexto de negociações da autora com outros potenciais promotores de operações urbanísticas com interesses imobiliários sobrepostos e que versavam sobre os prédios da demandante, que decorriam em paralelo ao procedimento sub judicio factualidade levada ao probatório nos pontos 1.50), 1.51), 1.53) e 1.54)], o tribunal tomou em linha de consideração o teor de depoimentos prestados em sede de audiência final. Assim foi, nomeadamente, por referência aos depoimentos de testemunhas arroladas pelo réu, como o da testemunha N......, à altura dos factos Presidente de Câmara, e que referiu que a reunião referida em 1.53) fora solicitada pela autora; ou como os das testemunhas C...... e C......, que revelaram, através de depoimentos objetivos, articulados e com facilidade em recordar e contextualizar os seus relatos, um conhecimento direto e esclarecido das diversas incidências procedimentais. Mas assim foi igualmente com referência aos depoimentos das testemunhas arroladas pela própria autora, como a testemunha P......, sócio da empresa requerente do licenciamento, que afirmou na audiência de discussão e julgamento que a demandante estava a aguardar uma oportunidade de negócio para pedir o alvará do loteamento licenciado a 24.03.2003, ou a testemunha M...... que, referindo-se ao mesmo alvará e a propósito das negociações com a P......, também declarou que o loteador ficou na expectativa de saber o que dava o negócio com aquela sociedade.
Ainda a propósito das motivações subjacentes às partes no âmbito do procedimento de licenciamento do loteamento sub judicio, mas agora com referência ao réu, designadamente no tocante ao ponto 1.61) dos factos provados, o tribunal fundou a sua convicção no depoimento da testemunha P......, à data Vice- Presidente e com o pelouro do urbanismo, que afirmou em sede de audiência final que considerou estar perante uma proposta de negociação vaga e que, a ser aceite, consubstanciaria sempre um mau negócio para a Câmara e um mau uso dos dinheiros públicos. Mais asseverou que, apesar de ter solicitado a intervenção da comissão de avaliação da Câmara, e não se recordando se chegou a haver desenvolvimento a esse respeito, a sua decisão final, sobre a qual seria baseada a deliberação a tomar pela Câmara, seria no sentido de não se aceitar tal proposta de substituição da caução por entrega de prédios ou lotes, por ser sempre um mau negócio para o Município.
Quanto à existência de propostas de alienação dos fogos e ao insucesso das mesmas, a que se reporta a matéria levada ao probatório nos pontos 1.97) e 1.100) dos factos provados, o tribunal tomou em consideração, além dos meios de prova documental que atestaram em concreto as específicas negociações referidas em 1.98) e 1.99), também os depoimentos que, quanto a esta matéria, foram unânimes, coerentes (porque coincidentes entre si), assertivos e esclarecidos das testemunhas arroladas pela autora, A......, M......, P...... e J.......
Os depoimentos aludidos já não permitiram que o tribunal pudesse dar como provada a factualidade enunciada no ponto 2.1). Nenhum dos depoimentos aludidos referiu em concreto esta proposta. E ainda que exista nos autos um instrumento escrito, datado de 20.09.2006, sob a referência de doc. 31 junto à petição inicial, certo é, porém, que do mesmo não se pode extrair nada de relevante, por quatro ordens de razão distintas, que enunciamos muito sucintamente de seguida. Desde logo, a aludida proposta consta de uma mera folha de um bloco, riscada, sob o timbre de uma sociedade «O…. » («autoclismos, mobiliário e acessórios de casa de banho, hidromassagem, torneiras, lava-loiças, aquecimento central, tubagens, esquentadores e termoacumuladores, motores e grupos»), timbre esse rasurado e sobre o qual foi aposto, agora sob a forma autógrafa, a firma «S......, Lda.». Depois, não surge identificado o alegado proponente, nem em que qualidade vincula a aludida sociedade. Em terceiro lugar, o documento não identifica qualquer prédio. Por último, no documento foi consignada a subordinação de uma qualquer suposta validade e eficácia da proposta à seguinte menção: «ficou pendente do Sr. aceitar e arranjar financiamento para isto».
Por fim, importa aqui deixar consignadas as razões que, em concreto, levaram este tribunal a considerar não provada a demais matéria constante das alíneas dos factos não provados, posto que o artigo 607.°, n.° 4, do Código de Processo Civil impõe que «[n]a fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência».
Para tanto, tomámos em linha de consideração as particulares regras de distribuição do ónus da prova a este respeito. Assim, como mandam as regras do direito probatório, quem invoca um direito deve fazer prova dos factos constitutivos do mesmo (artigo 342.0, n.° 1, do Código Civil), competindo àquele contra quem é feita tal invocação provar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado (artigo 342.0 n.° 2, do Código Civil).
Faz-se aqui notar que estes são factos que se têm de considerar como factos essenciais nucleares, porquanto desempenham uma função individualizadora ou identificadora da causa petendi nos presentes autos, reportados que estão aos requisitos de procedibilidade do nexo de causalidade [pontos 2.2), 2.3), 2.4) e 2.5)] ou dos danos [pontos 2.6), 2.7) e 2.8)]. Como tal, incumbia à autora, não só alegar os factos aí enunciados (artigo 5.°, n.° 1, do Código de Processo Civil), como prová-los (artigo 342.°, n.° 1, do Código Civil).
Em concreto, no que respeita à matéria enunciada nos pontos 2.2), 2.3), 2.4) e 2.5), não só a autora não logrou provar tal factualidade, como a mesma foi, total ou parcialmente, infirmada pela dinâmica factual efetivamente apurada nos autos.
Desde logo, que a ação judicial intentada em 2009 pelo aqui réu, referida em 1.17), não versava sobre nenhum dos prédios que faziam parte do projeto de loteamento aprovado pela deliberação referida em 1.43) (embora fizesse parte do pedido de informação prévia que fora anteriormente aprovado) resulta do facto de a própria autora, ainda que a instâncias do réu, ter retirado do seu projeto de loteamento tal prédio que seria depois controvertido
[cf. pontos 1.16), 1.17), 1.30), 1.36), 1.37), 1.39) e 1.40) dos factos provados].
Além disso, não se logrou apurar que esse litígio [ainda para mais bem posterior aos acordos e propostas comprovados e levados ao probatório nos pontos 1.98) e 1.99), datados de 2007 e 2008] tivesse sido o motivo decisivo e determinante para que esses negócios não se tivessem concretizado. Ainda que possamos anuir que a eventual consciência, pelos interlocutores da autora, da existência de um litígio (já concretizado ou latente) em torno da propriedade de prédios pudesse contribuir para a dissuasão dos investidores, não se provou sequer que eles não tivessem a consciência de que o prédio controvertido não estava abrangido pelo projeto de loteamento. Assim como não podemos desconsiderar, a este respeito e mais decisivamente, a natureza, a dimensão, as causas e os efeitos globais da crise financeira que se abateu sobre a República Portuguesa a partir de 2008, que transcenderam em muito a esfera de atuação e de controlo dos agentes económicos e que consubstanciou uma crise económica e financeira grave e estrutural, de dimensão e efeitos globais, que, a nível interno, mais se acentuaram nos anos subsequentes, como é por todos conhecido e pode considerar-se notório [cf. ponto 1.108) do probatório]. Tal crise ocasionou, designadamente, o abrandamento do ritmo económico, com períodos de recessão, a retração do consumo, a quebra do investimento e a insolvência de milhares de empresas, e terá seguramente contribuído, quer para o abrandamento do mercado imobiliário, quer para o insucesso das propostas recebidas pela autora, quer para a própria situação de insolvência da demandante.
Por seu turno, a convicção do tribunal quanto ao ponto 2.6) resultou da constatação de que a autora nada demonstrou que suportasse cabalmente as asserções relativas aos valores por m2 (por construir ou a construir) na Encosta Norte de Abrantes. Não deixa, aliás, de causar estranheza, em primeiro lugar, que a demandante tenha alegado (sem comprovar) valores reportados às datas da escritura de compra dos prédios rústicos, do pedido de emissão de alvará e da instauração da ação, mas nada tenha alegado quanto aos valores reportados à data do ato de aprovação do licenciamento de loteamento, em 2003. Não seria esse um momento determinante para aferir da pretensão ressarcitória, considerando que foi aí que o réu deferiu a pretensão urbanística da demandante?
De resto, não se percebe qual o raciocínio da autora para suportar os valores invocados. Tomemos por exemplo a alínea a. do ponto 2.6), que enuncia o alegado valor/m2 à data da escritura referida em 1.11): se os prédios adquiridos naquela altura tinham uma área total de 27 640 m2 e foram adquiridos por PTE 45 000 000$00 (equivalente a € 22 4458,83), então o prédio foi na altura transacionado por € 0,81/m2, e não por € 25,00.
Também a matéria levada ao probatório nos pontos 2.7) e 2.8) não se encontra provada. A autora nada juntou de suporte documental que atestasse terem sido aqueles os valores concretamente despendidos, nem suportou tais alegações por qualquer outro meio de prova.
Aliás, a este respeito, nada demonstrou a autora. Ficamos sem saber, afinal, quanto despendeu a autora com os projetos, com a alteração dos projetos, e que outros encargos financeiros teve; assim como ficamos sem saber, qual a percentagem, nesses montantes, de capital próprio, de financiamento interno (suprimentos, etc.), de financiamento externo, e, neste último caso, qual a taxa de juro. E qual a taxa de rentabilização do investimento estimada? E a real? Como esperava a autora amortizar o investimento efetuado? Qual o valor de mercado dos lotes ou fogos de loteamento em 2006, em 2009 e em 2012? Qual era a situação económica e contabilística (valor global de prejuízos?, solvabilidade?, capitais próprios?, lucro fiscal?, nível de suprimentos?, endividamento externo?, montante de garantias pessoais prestadas pelos sócios?) da autora nos 5 exercícios anteriores ao deferimento do loteamento?; e entre 2003 e 2009?; e entre 2009 e 2012? Não o sabemos, porque a demandante nada demonstrou — e dispôs de diversas ocasiões para fazer (ou, ao menos, se propor fazer) a pertinente prova: na petição inicial; nos diversos instrumentos processuais produzidos durante a tramitação dos autos; no requerimento probatório produzido ao abrigo do disposto no artigo 5.0, n.° 4, da Lei n.° 41/2013, de 26 de junho; na audiência prévia; nos requerimentos probatórios produzidos após a audiência prévia; por requerimento pericial à contabilidade da autora antes do processo de insolvência; em instrumento processual que pretendesse apresentar nos 20 dias anteriores à realização da audiência final, ao abrigo do disposto no artigo 423.°, n.° 2, do Código de Processo Civil; no decorrer da própria audiência final, nos termos e para os efeitos do disposto, quer no artigo 423.°, n.° 3, in fine, quer no artigo 466.°, ambos do Código de Processo Civil (pelo administrador de insolvência), ou até por meio de prova testemunhal (designadamente por intermédio daqueles que haviam sido os sócios gerentes da sociedade antes da insolvência).
Não o tendo feito, e atento o princípio traduzido pelo brocardo latino non liquet, consagrado no artigo 414.° do Código de Processo Civil, contra ela é resolvida a incerteza quanto à verificação daqueles factos.”

*

II.2 APRECIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Conforme supra enunciado, as questões a decidir cingem-se a saber se:
- ocorre erro de julgamento da decisão de facto;
- ocorre erro de julgamento da decisão de direito ao considerar que a falta de emissão do alvará e a instauração da ação de reivindicação de propriedade não consubstanciavam atuações ilícitas;
- ocorre erro de julgamento da decisão de direito ao considerar não verificados os pressupostos da culpa e do nexo de causalidade.


a) do erro de julgamento de facto

Nesta sede, sustenta a recorrente o seguinte:
- foi incorretamente dado como não provado ter a recorrente recebido proposta a 20/09/2006, pela Sociedade S......, de € 1.500.000,00 a par da entrega de 20 fogos, facto que resulta do depoimento da testemunha P...... em 21/11/2016, na passagem ao minuto 04:37:47;
- foi incorretamente dado como não provado que a ação judicial intentada em 2009 pelo Recorrido versava sobre um prédio que fazia parte do projeto de loteamento denominado ‘Encosta Norte’ aprovado pela Câmara Municipal de Abrantes, facto que resulta do depoimento das testemunhas A......, passagens aos minutos 00:10:25, 00:10:47, 00:12:48, 00:12:51 e 00:13:27, M......, passagem ao minuto 02:29:34, e P...... Ferreira, passagem ao minuto 04:06:45;
- foi incorretamente dado como não provado que a frustração dos negócios com vários promotores imobiliários interessados no loteamento denominado ‘Encosta do Norte’ (nomeadamente, com a V...... e com o Gabinete 7......, Lda.) se deveu, em exclusivo, ao diferendo entre a Recorrente e o Recorrido com referência ao prédio rústico, sito no O......, na freguesia de São Vicente, no concelho de Abrantes, com a área total de 2 040 m2, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo …, da secção G, resultante do prédio n.°…, facto que resulta do depoimento das testemunhas A......, passagens aos minutos 00:29:57 e 00:31:12, M...... passagens aos minutos 02:51:08, 02:51:47 e 02:52:15, e P...... Ferreira, passagens aos minutos 04:38:57 e 04:39:47.
Dispõe como segue o artigo 640.º do CPC, sob a epígrafe ‘ónus a cargo da recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto’:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve a recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe aa recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões da recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º”.
Daqui decorre que, ao impugnar a matéria de facto em sede de recurso, recai sobre a recorrente o ónus de indicar (i) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e (ii) os concretos meios probatórios que impõem decisão distinta, mais devendo identificar precisa e separadamente os depoimentos caso se trate de meios probatórios gravados.
E cabe-lhe alegar o motivo pelo qual os meios probatórios que indica impõem decisão diversa e também porque motivo os meios probatórios tidos em conta pelo tribunal não permitem se considere provado determinado facto.
Há que ter ainda em consideração que é em função da definição do objeto do processo e das questões a resolver nos autos que deve ser apreciada a relevância da matéria fáctica alegada pelas partes. Assim, nem toda a matéria fáctica que se possa considerar provada deve ser levada, sem mais, ao probatório.
E como é consabido, os factos respeitam à ocorrência de acontecimentos históricos, afastando-se de tal qualificação os juízos de natureza valorativa, que comportam antes conclusões sobre factos.
Outrossim, deve ter-se em consideração que no novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, se optou por reforçar os poderes da 2.ª instância em sede de reapreciação da matéria de facto impugnada, incrementados os respetivos poderes e deveres, com vista a permitir-lhe alcançar a verdade material, conforme consta da exposição dos motivos e se consagra no atual artigo 662.º, n.º 1, “[a] Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
Isto sem que, nesta reapreciação, especificamente quando se trate de analisar a gravação dos depoimentos prestados em audiência, como ocorre no caso, se olvide a livre apreciação da prova obtida em primeira instância, assente nos princípios da imediação e da oralidade, cf. artigos 396.º do Código Civil e 607.º, n.º 5, do CPC.
Perante as alegações de recurso, afigura-se que o recorrente cumpriu os ónus que sobre si impendiam.
No que concerne à prova da recorrente ter recebido proposta a 20/09/2006, pela Sociedade S......, de € 1.500.000,00 a par da entrega de 20 fogos, ampara-se aquela tão-só numa breve passagem do depoimento do seu sócio gerente. Que nem sequer indica um montante exato, hesitando entre dois valores, admitindo não saber precisar muito bem.
O que se afigura claramente insuficiente para chegar a conclusão distinta da primeira instância.
Desde logo porque dali não se retira um conhecimento exato e preciso do facto.
E bem assim porque tem de ser equacionado pelo tribunal tratar-se do depoimento do legal representante da autora, com evidente interesse no dissídio. Nesta medida, visto este depoimento, dúbio, para mais, em conjugação com o teor da suposta proposta junta aos autos, com o timbre de uma empresa rasurado, sem identificação do alegado proponente, sem identificação de qualquer prédio, como se assinala na sentença, bem se compreende que não estamos perante elementos convincentes quanto à formulação de um juízo de certeza sobre o facto em questão.
Quanto ao segundo ponto, entende a recorrente que deve ser dado como provado que a ação judicial intentada em 2009 pelo recorrido versava sobre um prédio que fazia parte do projeto de loteamento denominado ‘Encosta Norte’ aprovado pela Câmara Municipal de Abrantes, com base no depoimento das testemunhas A......, M...... e P.......
Ora, novamente releva que as referidas testemunhas tinham interesse no negócio relativo ao loteamento, por via da sua ligação à autora. E analisadas as aludidas passagens dos seus depoimentos, verifica-se que a recorrente claramente extrapola dos mesmos uma conclusão sem suporte, qual seja, a de que a ação proposta em 14/10/2009 versava sobre um prédio que fazia parte do projeto de loteamento aprovado por deliberação de 24/03/2003.

Como se assinala na decisão objeto de recurso, aquela ação judicial não versava sobre nenhum dos prédios que faziam parte do projeto de loteamento aprovado pela aludida deliberação, tendo sido a própria autora, ainda que a instâncias do réu, a retirar tal prédio do seu projeto de loteamento
Com isto se impõe concluir que os depoimentos das referidas testemunhas não abalam a decisão quanto a este facto, onde fica por detetar erro de análise ou a existência de elementos que permitam inverter a decisão do julgador.
Quanto ao terceiro ponto da impugnação, sustenta a recorrente estar provado que a frustração de negócios com vários promotores imobiliários interessados no loteamento denominado ‘Encosta do Norte’ se deveu, em exclusivo, ao diferendo entre si e o recorrido com referência ao prédio rústico, sito no O......, na freguesia de São Vicente, no concelho de Abrantes, com a área total de 2 040 m2, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo…, da secção G, resultante do prédio n.º…. Para tanto, novamente se ampara em passagens dos depoimentos das testemunhas A......, M...... e P.......
Tal não procede.
Desde logo porque, conforme já se viu, ficou por demonstrar que a invocada ação judicial versasse sobre prédios abrangidos pelo projeto de loteamento. Pelo que evidentemente não tinha a potencialidade de causar desconfiança nos investidores, como salienta o recorrido nas suas contra-alegações. De todo o modo, dos aludidos depoimentos, de testemunhas com claras ligações à autora, apenas consta a invocação de uma suposta exigência de um terceiro quanto ao diferendo com o recorrido, o qual nem sequer foi chamado a depor. Pelo que os aludidos depoimentos se afiguram insuficientes para criar no julgador uma convicção quanto à formulação de um juízo de certeza sobre o facto em questão.
Ademais, não se afigura despicienda a chamada à colação dos efeitos da crise financeira do ano de 2008 e seguintes, que transcenderam em muito a esfera de atuação e de controlo dos agentes económicos, como se assinala na decisão objeto de recurso, o que terá contribuído para o abrandamento do mercado imobiliário e insucesso das propostas recebidas pela recorrente e sua subsequente insolvência.
Atento o exposto, tem de improceder integralmente a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.


b) dos erros de julgamento de direito

Quanto à qualificação como facto ilícito e culposo da falta de emissão de alvará, consta da sentença recorrida a seguinte fundamentação:
[O] legislador do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação estabeleceu, no n.º 5 do artigo 71.º, a partir da alteração promovida pela Lei n.º 60/2007, de 4 de setembro, que «[a]s caducidades previstas no presente artigo devem ser declaradas pela câmara municipal, verificadas as situações previstas no presente artigo, após audiência prévia do interessado». Ergo, desde 02.03.2008 (data da entrada em vigor da Lei n.º 60/2007, de 4 de setembro) todas as caducidades previstas no artigo 71.º do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação carecem de ser declaradas pela câmara municipal.
CXIV. No entanto, e isso é que importa reter, até àquela alteração legislativa, a redação do n.º 5 do artigo 71.º era diversa. Aí se estabelecia que apenas «[a] caducidade prevista na alínea d) do n.º 3 [era] declarada pela câmara municipal, com audiência prévia do interessado» (sublinhados nossos). E a caducidade prevista na alínea d) do n.º 3 do mesmo artigo 71.º reportava-se aos casos em que as obras não fossem concluídas no prazo fixado na licença ou sua prorrogação, contado a partir da emissão do alvará. Não era esse manifestamente o caso dos autos.
CXV. Importa ainda ter em atenção duas vicissitudes normativas de relevância não despicienda. A primeira é a de que a Lei n.º 60/2007, de 4 de setembro, apenas entrou em vigor 180 dias após a publicação em Diário da República (artigo 7.º), ou seja, a 02.03.2008. A segunda é a de que a possibilidade de aplicação retrospetiva (isto é: aos procedimentos pendentes) do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação com as alterações introduzidas pela Lei n.º 60/2007, de 4 de setembro, não abrangia o caso dos autos. Note-se que, de acordo com o regime transitório estabelecido no artigo 6.º, n.º 1, da Lei n.º 60/2007, «[à]s obras de edificação e às operações de loteamento, obras de urbanização e trabalhos de remodelação de terrenos cujo processo de licenciamento decorra na respetiva câmara municipal à data da entrada em vigor do presente diploma é aplicável o regime anteriormente vigente, […]» (n.º 1). Significa isto que as alterações não se aplicam a operações de loteamento cujos processes de licenciamento já tivessem sido concluídos, e mesmo aos que estivessem ainda a correr termos, era aplicável o regime que decorria da reação originária do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (ou das alterações anteriores àquela Lei n.º 60/2007).
CXVI. Vale isto por dizer que, pelo menos em 2004, 2005, 2006 e mesmo 2007, não se exigia na lei, expressamente, que o ora réu declarasse a caducidade do licenciamento de loteamento, decorrente de não ter sido pela autora requerido o alvará único a que se refere o n.º 3 do artigo 76.º do mesmo diploma no prazo de um ano a contar da notificação do ato de autorização das respetivas obras de urbanização.
CXVII. Ora, constando a cominação da caducidade expressamente do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação e não se exigindo aí qualquer declaração dessa caducidade por parte da autoridade administrativa numa situação como a dos autos, é assim pertinentemente equacionável, e até acomodado pelo regime jurídico positivo vigente à data dos factos, a verificação in casu de uma de duas possibilidades: i) ou a caducidade do licenciamento do loteamento sub judicio operava automaticamente, não carecendo sequer de ser declarada pela Câmara Municipal de Abrantes; ii) ou, no mínimo, mesmo que se advogasse a necessidade, utilidade ou conveniência na emissão de uma declaração de caducidade (para efeitos de certificação e de estabilização, tributários dos princípios de certeza e segurança jurídicas), a tal declaração seria associada uma eficácia meramente declarativa mas não constitutiva dessa caducidade, que já se verificara a montante.
CXVIII. Em qualquer dos casos, e seguindo aqui a linha de raciocínio que se tem enunciado, extraindo dela todos os corolários, dado que a caducidade se constituíra em momento jurídica, lógica, cronológica e ontologicamente anterior à apresentação do pedido da autora de 05.12.2006, nenhuma censura mereceria, verdadeiramente, a falta de decisão no pedido de licenciamento que a demandante reclama ser devida no caso dos autos. De outra sorte, estaríamos a compaginar com a possibilidade de uma aporia jurídica: a de o réu ter de apreciar (e inclusive poder deferir) uma pretensão associada a uma posição jurídica que já se extinguira por caducidade.
CXIX. Secundum, como vimos também, mesmo que não se considerasse ter ocorrido a caducidade do licenciamento do loteamento (porventura porque tal caducidade careceria de ser declarada), ainda assim haveria um outro fundamento, este sim, verdadeiramente decisivo, para a recusa da emissão do alvará, igualmente previsto no n.º 5 do artigo 76.º do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação: a falta de pagamento das taxas devidas.
CXX. Com efeito, a lei é bem clara ao determinar que o requerido alvará é emitido no prazo de 30 dias, desde que se mostrem pagas as taxas devidas (artigos 76.º, n.os 4 e 5, e 113.º, n.os 2, 3 e 4, 116.º, n.º 1, e 117.º, n.os 1 e 5, todos do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação).
CXXI. Ora, caso sub judice, tanto quanto se apurou, tais taxas, apesar de terem sido liquidadas pela autoridade administrativa competente, não se mostram nem pagas, nem depositadas pelo promotor urbanístico. Logo, a conduta do ora réu, ao não emitir o requerido alvará no prazo de 30 dias, é conforme com as normas legais e regulamentares aplicáveis — e portanto legal. Hoc sensu, vide, inter alia, os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 03.04.2008 (processo n.º 01033/07) e do Tribunal Central Administrativo Sul de 04.07.2019 (processo n.º 400/07.5BEBJA), ambos acessíveis online in http://www.dgsi.pt.
CXXII. Qualquer destas vicissitudes, como vimos já, milita em sentido moderadamente favorável à conclusão de que o aqui réu poderia estar efetivamente impedido, por comandos normativos imperativos, de emitir o alvará em apreço.
CXXIII. Tertium, sempre se refira, adicionalmente e a latere, que mesmo que situássemos o caso dos autos, não numa situação de impedimento legal de prática de ato de emissão de alvará, mas sim no domínio da discricionariedade administrativa (no tocante à prerrogativa de avaliação e à livre apreciação relativa aos termos da localização e avaliação dos bens imóveis propriedade do requerente, nomeadamente lotes da urbanização em causa, que pudessem traduzir a caução), a conclusão a que chegaríamos não seria diversa. Isto é: a atuação do réu não traduziu nenhuma violação de lei, nem sequer por suposta violação do dever de pronúncia ou decisão (artigo 9.º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo de 1991, vigente à data dos factos).
CXXIV. Tenha-se presente que o dever de decisão consagrado no artigo 9.º, n.º 1, do Código de Procedimento Administrativo de 1991, apenas se verifica mediante o preenchimento de pressupostos procedimentais «[…] a que a lei condiciona o desenvolvimento regular do procedimento […]» (ESTEVES DE OLIVEIRA et al., 1998: 128). Esse requisitos são subjetivos (como a competência do órgão que recebe o pedido e a legitimidade do requerente) e objetivos (aqui se reportando à «ininteligibilidade, unidade e tempestividade do pedido, atualidade do direito que se pretende exercer e inexistência de decisão sobre pedido igual (do requerente) tomada há menos de dois anos (art. 9.º, n.º 2)» (idem, ibidem). Sendo certo que, «[n]ão existindo tais pressupostos, também não existe o dever de decidir, embora possa […] subsistir o dever genérico de pronúncia» (idem, ibidem).
CXXV. Ora, como tivemos oportunidade de deixar estabelecido já, não se prefigura que o pedido apresentado a 05.12.2006 seja tempestivo, nem que o direito que aí se pretendeu exercer fosse atual. Quedam por preencher, nesta perspetiva, alguns pressupostos procedimentais objetivos para que se verificasse tal dever de pronúncia.
CXXVI. Mais do que isso (e quartum): como teremos oportunidade deixar estabelecido infra, a própria conduta procedimental da autora demonstra que a aqui demandante não imprimiu um impulso (procedimental ou mesmo processual) decisivo no sentido de obter a emissão do alvará que agora reclama ser devido.
CXXVII. Assim, para além do que já se referiu a montante, a propósito de ter deixado expirar o prazo máximo da licença, por um lado, e de não ter comprovado ter liquidado, processado e pago as devidas taxas para a emissão do alvará, por outro lado, a dinâmica factual apurada demonstra ainda que para a mesma área e prédio (além das parcelas cedidas pelo demandado) deu entrada nos serviços do ora réu um novo pedido de licenciamento para outra operação urbanística, em nome da sociedade P......, Lda., a coberto de uma procuração emitida a seu favor pelo sócio gerente da ora autora e sua mulher, pela qual lhe era permitido «[…] requerer e praticar todas as diligências necessárias relativas ao licenciamento de loteamento, anexando os […] prédios […] números 01…/26…, 03…/17… e 02…/10… da freguesia de São Vicente, do concelho de Abrantes […]», prédios esses que integravam manifestamente a área a lotear diretamente pela autora ao abrigo do licenciamento de 24.03.2003. Tudo nos termos da matéria levada ao probatório nos pontos 1.53) a 1.60).
CXXVIII. Ora, o facto de os mesmos prédios serem objeto de dois procedimentos urbanísticos distintos, nos quais inclusive figurava como promotora a ora autora (diretamente, no procedimento n.º 1…/01; no procedimento n.º 2…/08, num primeiro momento apenas como representada pela P......, e depois de expressamente revogar a procuração, também diretamente — cf. pontos 1.84) a 1.86) do probatório), traduz uma entropia assinalável na delimitação do interesse da demandante. A partir do momento em que, sem deter o alvará no âmbito do primeiro procedimento, a autora intervém ativamente num segundo procedimento com referência aos mesmos prédios mas incompatível com aqueloutro, poder-se-á perguntar, afinal, qual o procedimento pelo qual optava verdadeiramente a demandante.
CXXIX. A esta luz, não se vislumbra em que medida é que a atuação do réu possa traduzir uma violação do princípio da legalidade. Poder-se-á mesmo asseverar, nesta perspetiva, que o demandado não emitiu o alvará do primeiro loteamento da autora porque isso lhe foi desde logo imposto pelo dever de cuidado e pelo princípio da legalidade urbanística, logo que teve conhecimento da existência de um novo projeto de loteamento para a mesma área promovido pela demandante, por interposta empresa.
CXXX. Tanto assim que, precisamente considerando o novo pedido, o réu notificou expressamente a autora a 15.07.2008 de que deveria «[…] solicitar o arquivo [do procedimento n.º 1…/01, uma vez que [entretanto] já não far[ia] sentido emitir-se o alvará de Loteamento solicitado, atendendo a que [estava]á em curso o processo n.º 2…/08 para o mesmo local». Todavia, a autora nada disse ou requereu, mesmo depois de expressamente interpelada pelo réu. Só quando confrontada com o projeto de decisão de declarar deserto aquele primeiro procedimento, ao abrigo do disposto no artigo 111.º do Código de Procedimento Administrativo de 1991, é que a demandante veio, finalmente, pedir a emissão do alvará da primeira fase. Fê-lo por requerimento datado de 26.01.2010, isto é, sete anos depois da aprovação do loteamento, que ocorrera a 24.03.2003. Vide pontos 1.65) a 1.70) do probatório.
CXXXI. Entretanto, o réu reviu a sua intenção de declarar deserto o procedimento e voltou a notificar a autora para que, em definitivo, esclarecesse «[…] sobre qual processo pretend[ia] manter em curso, [mais advertindo a autora], nos termos do art.º 91.º, n.º 4, do CPA, que a Câmara Municipal não poder[ia] dar seguimento ao procedimento e apreciar o pedido de emissão de alvará de loteamento e de prestação de caução sobre imóveis, apresentado em 06.12.2006, enquanto [a demandante] não se pronuncia[sse] nos termos solicitados […]». Mais uma vez, contudo, a autora nada disse ou requereu. Cf. pontos 1.71) a 1.75) dos factos provados.
CXXXII. Esta inércia da aqui autora é tanto mais impressionante quanto se constata que, em sede já do segundo procedimento que ¯concorria com aquele no âmbito do qual se perscruta a suposta ilicitude da atuação do ora réu, a ora demandante revogou a 20.08.2009 a procuração que outorgara in illo tempore à sociedade P......, disso dando conta o aqui demandado a 21.08.2009. Porém, depois de expressamente notificada pelo município de que o prazo para emissão do alvará havia terminado aos 30.11.2009 e de que o réu poderia declarar a caducidade de aprovação definitiva, a autora nada requereu ou informou. Vide pontos 1.85) a 1.92) do probatório.
CXXXIII. Como tal, e concluindo, inexiste vício de violação de lei.
Ao que contrapõe a recorrente, em síntese:
- a caducidade prevista no artigo 71.° do RJUE não é preclusiva, operando antes por incumprimento, pelo que se impunha à Administração verificar se o efeito extintivo se mostraria, no caso concreto, adequado e exigível, à luz do princípio da proporcionalidade;
- à data do requerimento de emissão de alvará, 05/12/2006, a licença do loteamento não se encontrava caducada, como o demonstra o parecer emitido pelo recorrido em 13/06/2008, no qual sugere à recorrente que peça o arquivamento do processo de loteamento, e a informação de 16/11/2009, que refere a pendência daquele processo;
- e em 10/03/2010 o recorrido reconhece nunca ter apreciado a questão da prestação de caução e propõe a notificação do particular para se pronunciar sobre qual processo de loteamento pretende manter em curso;
- a falta de pagamento das taxas não justifica a recusa da emissão do alvará atentas as circunstâncias do caso concreto, pois requereu a substituição da garantia bancária;
- a falta de resposta em relação ao pedido de substituição da garantia bancária configura, senão violação de lei, pelo menos omissão do dever de decisão, até porque o seu requerimento preencheu os pressupostos procedimentais;
- o facto da recorrente apresentar novo pedido de licenciamento, para a mesma área e prédio, para outra operação urbanística ‘Ofélia Club’ não justifica a falta de emissão de alvará, pois inexiste desistência do processo de loteamento ‘Encosta do Norte’, sendo aquele um negócio promovido pela Câmara;
- a considerar-se inexistir violação de lei, ocorre desvio de poder quanto à falta de emissão de alvará e não apreciação do pedido de substituição de garantia bancária, com violação dos princípios de justiça, de igualdade e de imparcialidade, de proporcionalidade e de tutela da confiança e da boa-fé que enformam a discricionariedade.
Vejamos.
Sabemos que o pedido de licenciamento da operação de loteamento em causa data de 17/12/2001 (ponto 1.29 do probatório) e que em 02/04/2004 a autora requereu a sua aprovação em cinco fases (ponto 1.29 do probatório).
Após a aprovação deste faseamento em 05/07/2004 (ponto 1.46 do probatório), foi emitida nova deliberação em 08/11/2004, determinando que a requerente pagasse taxas no valor de € 104.515,326 e prestasse garantia bancária no valor de € 856.258,386, para efeito de emissão do alvará (ponto 1.48 do probatório).
Por estar em negociações com interessados no loteamento, a autora só em 05/12/2006 veio pedir a emissão do alvará, propondo que a garantia fosse prestada sobre bens imóveis seus (pontos 1.50 a 1.52 do probatório).
Em 28/05/2008 foi apresentado novo pedido de licenciamento de operação urbanística para a mesma área por empresa com procuração emitida a seu favor pelo sócio gerente da autora e sua mulher (pontos 1.57 e 1.58 do probatório).
Tal pedido veio a ser autorizado pelo réu no decurso do ano de 2008, mas não se logrou a notificação da respetiva promotora, tendo vindo a autora revogar a procuração que lhe outorgara (pontos 1.76 a 1.91 do probatório).
Igualmente no decurso do ano de 2008, em função do conhecimento do novo projeto, o réu não emitiu o alvará da 1.a fase do loteamento, por considerar vaga a proposta da autora de substituição da garantia e que conduziria a mau negócio para si e mau uso dos dinheiros públicos (ponto 1.61 do probatório) e notificou a autora para requerer o arquivamento do primeiro processo de loteamento, atenta a pendência do segundo, ao que esta nunca respondeu (pontos 1.62 a 1.66 do probatório).
Já em 2010 foi proposta pelos serviços do réu a declaração de caducidade da aprovação do segundo pedido de loteamento, ficando a aguardar agendamento de reunião com representante da autora (pontos 1.91 a 1.95 do probatório).
Na sequência de notificação para se pronunciar quanto à deserção daquele primeiro processo, já em 2010, a autora veio dizer que mantinha interesse no mesmo, uma vez que o segundo estava inviabilizado (pontos 1.67 a 1.70 do probatório).
Os serviços do réu pronunciaram-se então no sentido de não ocorrer deserção e foi notificada a autora para esclarecer que pedido de loteamento se devia manter, ao que esta não respondeu (pontos 1.71 a 1.75 do probatório).
Sabemos ainda que a autora nunca requereu em qualquer altura do primeiro procedimento de loteamento, nenhuma das intimações previstas no Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação respondeu (ponto 1.96 do probatório).
Como bem se vê da factualidade dada como assente, a questão da caducidade prevista no artigo 71.º do RGEU, afigura-se lateral na apreciação dos vícios imputados pela recorrente à atuação do réu / recorrido. A questão é a de saber se a omissão de pronúncia por parte do recorrido, em particular sobre o pedido de substituição da garantia bancária, naturalmente conexo e dependente do pedido de emissão do alvará, violou a lei, o dever de decisão ou incorreu em desvio de poder. E a resposta é necessariamente negativa.
Em primeiro lugar, a falta de pronúncia sobre a pretendida substituição da garantia bancária assentou em motivo razoável e válido, sendo certo que estavam por pagar as taxas devidas pela emissão do alvará. E carece de qualquer respaldo a associação que a recorrente faz entre a omissão deste pagamento e aquele pedido de substituição, quando estão em causa duas obrigações distintas.
Em segundo lugar, foi a autora, através de empresa à qual passou procuração, a apresentar novo pedido de licenciamento de operação urbanística para a mesma área, já em 2008.
À evidência, estavam em causa dois pedidos e dois procedimentos que mutuamente se excluíam, apenas um se poderia manter, à partida o mais recente, por traduzir uma nova vontade de dar um destino diferente à área em questão.
E eis que, notificada para esclarecer que pedido de loteamento se devia manter, a autora absteve-se de responder.
Ademais, como salienta o recorrido nas suas contra-alegações, a recorrente absteve-se de lançar mão dos meios ao seu dispor e previstos no RGEU, designadamente a intimação prevista no artigo 112.º, para alterar a situação.
Foi esta intimação judicial a solução que o legislador consagrou, no caso de um ato “que devesse ser praticado por qualquer órgão municipal no âmbito de um processo de licenciamento, possibilitando ao interessado requerer em tribunal a intimação da autoridade administrativa para proceder à prática do ato legalmente devido. E isto vale para todas as situações em que o órgão municipal competente tenha omitido o respetivo dever de decisão ou não haja praticado qualquer outro ato previsto no presente diploma, designadamente a emissão de alvará” (João Pereira Reis, Regime jurídico da urbanização e da edificação: Decreto- Lei nº 559/99, de 16 de Dezembro: anotado, 2002).
Por aqui se torna cristalino que, em face da inércia da autora, não ocorre vício de violação de lei ou incumprimento do dever de decisão.
E é evidente a improcedência do vício de desvio de poder, quando nem sequer são invocados os respetivos factos constitutivos, a demonstração concreta do fim ilícito prosseguido, diverso do fim legal no exercício do poder discricionário do Município, aqui recorrido.
Improcede, pois, a presente questão.

Quanto à relevância da instauração da ação de reivindicação de propriedade, em concreto se consubstanciaria a prática de facto ilícito e culposo por parte do recorrido, como sustenta a recorrente, ficou por demonstrar que a mesma versava sobre prédio que fazia parte do projeto de loteamento denominado ‘Encosta Norte’.
Conforme prévia decisão sobre a impugnação da matéria de facto dada como assente.
Pelo que à evidência tem de claudicar a pretensão da recorrente.

Resta por apreciar a derradeira questão, relativa à responsabilidade civil extracontratual do recorrido.
A responsabilidade das entidades públicas encontra-se prevista no artigo 22.º da CRP, onde se estatui que “[o] Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por ações ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.”
Está em causa a responsabilidade civil extracontratual do recorrido decorrente dos encargos financeiros que a autora foi obrigada a suportar para fazer face aos custos de financiamento contraído junto da Caixa ......e que, não fora a atuação ilícita e culposa do réu, não teria de suportar pelo menos desde 01/01/2007, com encargos com o projeto e alterações ao projeto; que mais peticiona montante a título de lucros cessantes, correspondente à rentabilização do capital (remuneração do capital imobilizado) que a autora poderia e deveria ter recebido até 31/12/2012 caso o réu não tivesse atuado de forma ilícita e culposa.
Factos ocorridos entre 2006 e 2012.
Como entre estas datas se sucederam os regimes previstos no Decreto-Lei n.º 48.051, de 21/11/1967, e na Lei n.º 67/2007, de 31 de dezembro, rege o princípio que resulta do artigo 12.º do Código Civil, da lei nova se aplicar aos factos posteriores à sua entrada em vigor, com respeito do regido pela lei antiga, sendo aplicáveis os dois regimes, em concorrência e sucessivamente.
Constava do artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 48.051, que “[o] Estado e demais pessoas coletivas públicas respondem civilmente perante terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de atos ilícitos culposamente praticados pelos respetivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício.”
O artigo 3.º da Lei n.º 67/ 2007 veio prever o seguinte:
“1 - Quem esteja obrigado a reparar um dano, segundo o disposto na presente lei, deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.
2- A indemnização é fixada em dinheiro quando a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa.
3 - A responsabilidade prevista na presente lei compreende os danos patrimoniais e não patrimoniais, bem como os danos já produzidos e os danos futuros, nos termos gerais de direito.”
A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos e agentes assenta nos mesmos parâmetros do conceito civilístico da responsabilidade civil extracontratual (cf. artigos 483.º e ss. do Código Civil), exigindo-se, também por referência aos normativos a seguir indicados do regime aprovado pela Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro, a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos legais:
- o facto, que se pode traduzir numa ação ou numa omissão, cf. artigo 7.º;
- a ilicitude, ação ou omissão violadora de normas ou deveres objetivos de cuidado, podendo ainda traduzir-se em funcionamento anormal do serviço, cf. artigos 7.º e 9.º;
- a culpa, juízo de censura dirigido ao agente, em função da diligência e aptidão exigíveis no caso concreto, cf. artigo 10.º;
- o dano, lesão ou prejuízo, patrimonial ou não patrimonial, resultante da ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos, cf. artigos 3.º e 9.º;
- o nexo de causalidade entre o facto e o dano, cf. artigo 7.º.
Verificados estes pressupostos, constitui-se na esfera do Estado a obrigação de indemnizar.
Ora, com a resposta negativa à verificação de facto ilícito e culposo, queda inapelavelmente improcedente a pretensão da recorrente.

Em suma, impõe-se negar provimento ao recurso.
*


III. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.
Custas a cargo da recorrente.

Lisboa, 17 de fevereiro de 2022
(Pedro Nuno Figueiredo)

(Ana Cristina Lameira)

(Ricardo Ferreira Leite)