Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03992/10
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:05/15/2014
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:CONTRIBUIÇÃO AUTÁRQUICA/ IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS/ ISENÇÃO/ UTILIDADE TURÍSTICA/ CONTAGEM DO PERÍODO DE ISENÇÃO
Sumário:

I. Dispunha o artigo 43º, nº1 do EBF que: 1 - Ficam isentos de contribuição autárquica por um período de sete anos os prédios integrados em empreendimentos a que tenha sido atribuída a utilidade turística. Em idêntico sentido dispõe o actual nº 1 do artigo 47º do EBF relativamente ao Imposto Municipal sobre Imóveis: 1 - Ficam isentos de imposto municipal sobre imóveis, por um período de sete anos, os prédios integrados em empreendimentos a que tenha sido atribuída a utilidade turística.
II. Tendo sido concedida isenção de contribuição autárquica pelo período de sete anos, respeitante ao período de 05/03/97 a 05/03/04, prazo este pelo qual foi atribuída a utilidade turística de empreendimento turístico, tal benefício não pode deixar de ser interpretado, no que respeita à contribuição autárquica e ao imposto municipal sobre imóveis, de acordo com o disposto nos referidos artigos 43º, nº1 do EBF, actual 47º, nº 1 do EBF e, bem assim, tendo presentes os artigos 8º, nº 1 e 10º, nº1, alínea b) do CCA e 8º, nº1 e 9º, nº1, alínea a) do CIMI, os quais nos levam a concluir pela presença, no caso, de impostos anuais, cujo facto tributário ocorre a 31 de Dezembro de um determinado ano (cfr. artigos 18º do CCA e 113º do CIMI).
III. Ou seja, não se pode contabilizar, para efeitos da isenção dos referidos impostos, cada ano civil de Março de 1997 a Março de 2004 para perfazer os 7 anos; no caso, a isenção teve lugar logo em 1997 e não apenas em 1998.
IV. Significa isto, fazendo o enfoque no caso concreto, que a Impugnante, ora Recorrida, ficou isenta de CA no ano de 1997 (não obstante o período de isenção ter o seu início apenas em Março desse ano, importando aqui, porém, a data de 31 de Dezembro daquele mesmo ano), de 1998, de 1999, de 2000, de 2001, de 2002 e de 2003, o que perfaz, precisamente, 7 anos de isenção de contribuição autárquica
V. Por conseguinte, o ano de 2003 correspondeu ao último ano da isenção de sete anos de CA, pelo que em 2004 o IMI é devido, sendo este o ano seguinte ao do termo da situação de isenção, tal como prevê o artigo 9º, nº1, alínea b) do CIMI.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1- RELATÓRIO

A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou procedente a impugnação judicial deduzida, por ... – Empreendimentos ... , S.A, contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra a liquidação de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), do ano de 2004, 1ª e 2ª prestações, no valor de € 9.444,33 cada uma, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional.

Formula, para tanto, as seguintes conclusões:

1- A douta sentença incorreu em erro de julgamento da matéria fáctica e jurídica, violando o disposto no Art.º 9° n.º 1 al. b) do CIMI (anterior Art.º 10° n.º 1 al. b) do CCA), Art.º 47.° do EBF (anterior Art.º 43.° do EBF) e Art.º 8.° do CIMI (anterior Art.º 8.° do CCA);

2- A interpretação dada pela douta sentença de que, desde 5 de Março de 1997 até 5 de Março de 2004, está afastada a tributação, não está correcta, com o devido respeito, já que não teve em conta que o disposto no Art.º 9.° do CIMI tem que ser conjugado com os Art.ºs 43.° do EBF e Art.° 8.° do CIMI, pois,

3- O que vale é que a isenção de Contribuição Autárquica (actual IMI) foi atribuída por 7 anos por despacho do Sr. Secretório de Estado de Turismo, não se podendo contabilizar cada ano civil de Março de 1997 a Março de 2004 para perfazer os 7 anos, já que a isenção teve lugar logo em 1997 e não apenas em 1998, se aquela tivesse ocorrido apenas a partir de Março de 1998 aí sim o ano de 2004 ainda era ano de isenção, mas não foi isso que ocorreu;

4- Além disso, a lógica do IMI é que o facto tributário ocorre no dia 31 de Dezembro de cada ano, sendo nesse momento que nasce a obrigação tributária - Art.º 8.° do CIMI;

5- Até porque o imposto é devido por anos completos (e não de Março a Março de cada ano), com base nos valores patrimoniais tributários dos prédios e em relação aos sujeitos passivos que constem das matrizes em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeita, nos termos do Art.º 18.° do CCA (actual nº 1 do Art.º 113.° do CIMI) - Vide entendimento de Martins Alfaro, in Código de IMI comentado, anotação ao Art.º 8.º do CIMI;

6- Daqui resulta que, sendo o imposto devido por anos completos e não por duodécimos, pelo proprietário em 31 de Dezembro de cada ano, tendo o Empreendimento Turístico ficado isento de 1997/01/01 a 2003/12/31 (7 anos), foi correctamente liquidado o imposto de IMI relativo ao ano de 2004, porque a isenção não poderia ser superior ao período concedido no citado despacho do Sr. Secretário de Estado do Turismo;

7- Estamos aqui perante um benefício fiscal que foi concedido à sociedade impugnante pelo período de apenas 7 anos, logo tendo começado a correr aquela isenção em 1 de Janeiro de 1997 teria que findar o período de isenção temporário por caducidade, necessariamente em 31 de Dezembro de 2003, sob pena de estarmos a alargar a isenção para 8 anos, se considerarmos que no ano de 2004 estaria ainda isenta;

8- A norma do Art.º 9.° al. b) do n.º 1 do CIMI aplica-se ao caso sub judice, mas não com o sentido que a douta sentença lhe deu, até porque tendo a isenção findado a 31 de Dezembro de 2003, com o terminus de 7 anos de isenção atribuída, e como o IMI é devido relativamente ao ano inteiro, pela pessoa que for proprietária ( ... ) do prédio à data de 31 de Dezembro, de cada ano, e não por duodécimos, a liquidação do imposto do IMI do ano de 2004 é devida porque o benefício fiscal terminou no ano imediatamente anterior:

9- Com este entendimento não se está a pôr em causa o disposto no n.º 4 do Art.º 12.° do EBF (anterior Art.º 12° n.º 4 do EBF) como se refere na douta sentença, já que a Administração Tributária não revogou o benefício fiscal, apenas procedeu à aplicação das respectivas normas legais como se explanou anteriormente, pois a prolongar a isenção ao ano de 2004 estava a ultrapassar o período da isenção concedida e a própria lógica de tributação do IMI:

10- Quanto ao Acórdão do TCA do Sul, de 2007/09/11, proc. 01861/07, referido na douta sentença, não é aplicável ao caso sub judice, já que estamos aqui perante uma situação diferente da aí abordada, na medida em que a isenção de IMI aqui concedida não se refere a anos inteiros mas a duodécimos.

Face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogada a sentença recorrida, só assim se fazendo JUSTIÇA”


*

A Recorrida apresentou contra-alegações que rematou nos seguintes termos:

I - O recurso que ora se responde, vem interposto da totalidade do objecto da sentença, que julgou e bem a impugnação procedente.

II - A ora Recorrida, em 1 de Junho de 1998 solicitou junto do Serviço de Finanças de Albufeira a isenção de contribuição autárquica, ao abrigo do artigo 53. º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

III - Tendo tal isenção sido deferida por despacho do Exmo. Chefe de Serviços do Serviço de Finanças de Albufeira, datado de 24 de Junho de 2002, pelo período compreendido entre 5 de Março de 1997 e 5 de Março de 2004.

IV - Pelo que, os benefícios fiscais da ora Recorrida, devem reportar-se à data da verificação dos respectivos pressupostos e quando temporários caducam pelo decurso do prazo por que foram concedidos.

V - À Recorrida foi concedido um período de isenção de Contribuição Autárquica, de 7 anos, compreendido entre 5 de Março de 1997 e 5 de Março de 2004.

VI - A atribuição à ora Recorrida de tal benefício impeditivo da tributação reveste carácter excepcional e por essa razão quando limitados temporalmente apenas caducam pelo decurso do prazo pelo que foram concedidos.

VII - Ora no caso sub judice não assiste qualquer razão à Recorrente quando alega que a isenção temporária teria que findar em 31 de Dezembro de 2003 sob pena de caducidade.

VIII - Porquanto, se foram concedidos à ora Recorrida sete anos de isenção de pagamento de Contribuição Autárquica, com início em 5 de Março de 1997 com o seu terminus em 5 de Março de 2004, a caducidade do benefício temporário que lhe foi concedido, apenas ocorre em 5 de Março de 2004.

IX - Alem de que, e como resulta da Lei Fundamental, e explanado no seu artigo 103.º n.º 2 " ... os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes ... ", constituindo reserva de lei a matéria respeitante aos benefícios fiscais, e não resultando da lei solução diversa mantém toda a relevância a data de 5 de Março de 2004.

X - Assim, o prazo de caducidade de isenção pelo decurso do prazo para o qual foi concedida, apenas é devido a partir do ano seguinte ao termo da isenção

XI - À data dos factos encontrava-se em vigor o artigo 10.º, n.º 1, alínea b) do CCA o qual dispunha que «… em caso de isenção anterior de imposto, o mesmo será apenas devido a partir do ano seguinte ao termo da situação de isenção ... "

XII - Face ao supra exposto, falece toda a argumentação da ora recorrente, pois que tal norma não pode ser afastada, aplicando-se às situações para as quais foi concebida e a todas as outras que caibam na sua previsão.

XIII - Sendo, facilmente perceptível que a motivação alegada pela Recorrente não poderá ter acolhimento, por parte desses Venerandos Desembargadores, pois que, os factos dados como provados são claros, precisos e encontram-se em consonância com a pormenorizada e lógica motivação da decisão de facto.

XIV - Na verdade da leitura e da análise dos elementos constantes dos autos, não resulta que outra devesse ter sido a decisão do Tribunal “a quo” sobre a matéria de facto dada como provada.

XV - Assim, exactamente pelas razões que constam da fundamentação, e que se dispensa de repetir e com as quais concordamos em absoluto, decidiu e bem o “Tribunal a quo” julgar a impugnação procedente.

XVI - De todo o modo sempre se dirá que da fundamentação da matéria de facto bem como jurídica constante da sentença recorrida, não se vislumbra qualquer erro de julgamento.

XVII - Da sentença recorrida, foi feita a correcta interpretação quer dos factos, quer do direito, que serviram para formar a convicção do tribunal e o respectivo processo lógico e racional.

XVIII - Não se vislumbrando a existência de qualquer arbitrariedade impecavelmente bem estruturado, razão pela qual entende a Recorrida, não se suscitar qualquer questão ou dúvida.

Nestes termos e nos mais de Direito, deve ao presente Recurso ser negado provimento, confirmando-se inteiramente a Sentença recorrida, fazendo-se assim, JUSTIÇA!!!


*

Neste TCA, o Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) emitiu parecer defendendo a procedência do presente recurso jurisdicional, no qual refere, em síntese, que:

“(…)

Na verdade, no ano de 1997 está isenta, uma vez que não obstante a isenção só produzir efeitos a partir de 5 de Março, o certo é que o facto tributário só ocorreu em 31 de Dezembro desse ano.

Já no que concerne ao ano de 2004 a recorrida já não gozava de isenção de IMI, tendo sido o ano de 2003, o último ano de isenção desse tributo.

A sentença recorrida ao fazer uma interpretação meramente literal e descontextualizada dos restantes normativos aplicáveis violou os citados normativos e interpretou erroneamente o despacho da AT que determinou a isenção de CA e IMI pelo período de sete anos e não de oito anos.

(…)”


*

Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.

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2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:

A) A Impugnante é proprietária do empreendimento “Hotel ... ... ”, sito na ... , 1 a 5 A - 8200 - 161 Albufeira, constituído em regime de propriedade horizontal, inscrito na respectiva matriz predial sob o n.° 17221, fracções “A a “CF”, da freguesia de Albufeira, cfr. fls. 4 a 6 do apenso.

B) Por despacho do Secretário de Estado do Turismo de 19 de Fevereiro de 1998, publicado no D.R. III Série, n.° 82, de 1998.04.07, foi atribuída a utilidade turística a título definitivo ao empreendimento, nos termos do disposto nos artigos 2.°, n.°1, 3° n.°1, alínea a) (com a redacção dada pelo Decreto - Lei n.° 38/94, de 08/02), 5°, n.°1, alínea a) e 7.°, n.ºs l e 3 do Decreto - Lei n.° 423/83, de 05/12 e nos termos do artigo 2.° do Decreto - Lei n.° 38/94, de 08/02, por um período de sete anos a contar da data da abertura do mesmo, ou seja desde 05 de Março de 1997, cfr. fls. 8 da reclamação em apenso.

C) Em 1998.06.01, a Impugnante solicitou, ao abrigo do então artigo 53.° do EBF, a isenção da Contribuição Autárquica do referido empreendimento, isenção esta concedida por um período de sete anos, com início em 1997.03.05, conforme despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Albufeira, de 24 de Junho de 2002, cfr. fls. 9.

D) A Administração Fiscal procedeu ao respectivo averbamento no sistema informático, cfr. fls. 10 do processo administrativo apenso, de se extrai:

E) Para o ano de 2004 foi liquidado IMI a que se refere a nota de cobrança n.° 2004 72014003, no montante de € 9.444,33 (1.º prestação), com data limite de pagamento em 2005.04.30, e à nota de cobrança n.° 2004 72014103, no mesmo montante (2” prestação), com data limite de pagamento em 2005.09.30, cfr. fls. do processo administrativo apenso.

F) Em 23/05/2005, a Impugnante reclamou graciosamente, cfr. fls.2 da reclamação em apenso.

G) Na reclamação a que se refere a alínea anterior foi informado o seguinte:

«Através do requerimento a fls. 2 dos autos, vem ... - Empreendimentos ... , SA, NIPC ... , com sede na ... , 1 -5 A – 8200- 161 Albufeira, nos termos do artigo 68.° e seguintes do CPPT, reclamar da liquidação de Imposto Municipal Sobre Imóveis (IMI) n.° 200472014003, do ano de 2004 (1.ª prestação), no montante de € 9.444,33, já com certidão de dívida emitida, alegando em síntese que o artigo matricial n.° 17221 constante da mesma, está isento de imposto por utilidade turística, nos termos do artigo 53.° do EBF.

Nestes termos e para efeitos do artigo 75° do CPPT, tenho a honra de informar V. Ex. de que:

O processo é o meio próprio, a reclamação tempestiva, (cf. 1 do artº 70º do CPPT) e a reclamante tem legitimidade para o acto (cf. artº 68º do CPPT).

Por despacho de 1998.02.19, do Secretário de Estado do Turismo, foi atribuída a utilidade turística a título definitivo, por um período de sete anos, ao Hotel ... ... , de que é proprietária a reclamante, desde a sua abertura, ou seja de 1997.03.05 a 2004.03.05 (fls. 7)

Com base no referido despacho foi concedida a isenção de C.A. ao empreendimento por um período sete anos, desde 1997.03.05 a 2004.03.05 (proc.° 326/98), nos termos do então n.° 1 do artigo 53.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, conforme despacho do Chefe deste Serviço de Finanças de 2002.06.24, patente a fls. 8 dos autos.

No entanto, nos termos do então n.° 1 do artigo 8.° do CCA, actual n.° 1 do artigo 8.º do CIMI, o imposto é devido por anos completos e não por duodécimos, pelo proprietário em 31 de Dezembro de cada ano, pelo que ficou o imóvel isento de 1997.01.01 a 2003.12.31, tendo em consequência sido liquidado correctamente o imposto relativo ao ano de 2004 no integra, até porque a isenção não poderia decorrer por um período superior ao concedido no citado despacho, ou seja, sete anos.

Nesta conformidade, sou de parecer que deverá ser proferida decisão a indeferir o pedido, pelas razões expostas»

H) Sobre a informação a que se refere a alínea anterior recaiu, em 27/04/2007, o seguinte parecer (cfr. fls. 10 da reclamação):

«Confirmo. Em face da informação prestada sou de parecer que o pedido deverá ser indeferido pelas razões expostas.

À consideração superior»

I) Sobre os antecedentes informação e parecer recaiu, em 24/07/2007, o seguinte despacho (cfr. fls. 10 da reclamação):

«Concordo com o parecer elaborado e no uso da competência que me é conferida pelo art°. 27° do Dec-Lei 366/99, de 18 de Setembro ( Lei Orgânica da DGCI) indefiro o pedido. Considerando que, estamos, apenas perante factos e argumentos invocados pelo SP e a sua interpretação perante as normas legais vigentes, dispensa-se a audição prévia de acordo com o disposto na alínea a) do n° 3 da Circular 13/99, de 08/07, da DSJT da DGCI.

Cumpra-se»

J) O despacho a que se refere a alínea anterior foi notificado à Impugnante em 27/07/2007, cfr. fls. 11 da reclamação.

K) A petição inicial foi apresentada em 20/08/2009, cfr. carimbo aposto a fls. 3.


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Fundamentação do julgamento.

Todos os factos têm por base probatória, os documentos referidos em cada ponto.


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Factos não provados:

Para a decisão da causa, sem prejuízo das conclusões ou alegações de matéria de direito produzidas, de relevante, nada mais se provou”.

2.2. De direito

Tal como resulta claramente da leitura das conclusões das alegações de recurso, a Recorrente discorda da sentença recorrida que considerou que a isenção de C.A concedida por sete anos (compreendidos entre 05/03/97 e 05/03/04), relativamente ao imóvel m.i em A) supra, inclui o ano de 2004, razão pela qual foi considerado que, nesse ano, a Impugnante mantinha a isenção de IMI (imposto que sucedeu à extinta Contribuição Autárquica). Neste entendimento, foi a impugnação judicial julgada procedente e, em consequência, anulado o acto tributário de liquidação de IMI de 2004, objecto de contestação.

Com efeito, na sentença recorrida, após ter sido exposto o quadro normativo considerado pertinente, concretamente o disposto nos artigos 2º, nº1, 11º, 12º, nºs 1, 2 e 4 e 43, nº1, todos do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), e, ainda, o artigo 8º, nº1 do Código da Contribuição Autárquica (CCA), ponderou-se e decidiu-se nos termos que seguidamente se transcrevem:

“(…)

“O despacho atributivo de utilidade turística a título definitivo, estabeleceu um prazo de validade de sete anos, a contar da data de abertura do empreendimento ao público, isto é, de 5 de Março de 1997 até 5 de Março de 2004.

Por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Albufeira, de 24 de Junho de 2002, foi reconhecida a isenção esta concedida por um período de sete anos, com início em 1997.03.05, “com a consequente anulação das colectas relativas ao citado período que, porventura, tenham sido liquidadas”.

Mandou averbar no sistema informático o período de isenção correspondendo aos anos de 1997 a 2003.

O carácter excepcional dos benefícios fiscais tem como consequência a de apenas vigorarem nos estritos termos em que forem concedidos e no período temporal por eles abrangido.

O direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respectivos pressupostos e quando temporários, caducam pelo decurso do prazo por que foram concedidos.

No caso dos autos, foi atribuída a utilidade turística a título definitivo ao Hotel ... ... , com a classificação — atribuída de quatro estrelas sito na ... lote 1 a 5 A em ... , concelho de Albufeira, distrito de Faro, de que é proprietária a sociedade ... — Empreendimentos ... S A e entidade exploradora a ... — Explorações Hoteleiras, L.da, por um período de 7 anos a contar da abertura do empreendimento ao público, isto é, de 5 de Março de 1997 até 5 de Março de 2004.

A atribuição de benefícios impeditivos da tributação reveste carácter excepcional e por isso, quando limitados temporalmente, apenas caducam pelo decurso do prazo por que foram concedidos.

Assim, se foram concedidos pelo período que vai de 5 de Março de 1997 até 5 de Março de 2004, é nesse período que está afastada a tributação.

Trata-se, assim, de um benefício temporário, pois, caduca pelo decurso do prazo para o qual foi concedido, ou seja, no caso, caduca em 05/03/2004.

Porém, como nos termos do artigo 103.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, a matéria respeitante aos benefícios fiscais constitui reserva de lei e, por isso, só deixará de ser relevante a data de 05/03/2004, se da própria lei regular solução diversa.

Ora, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea b), do CCA, e actualmente nos termos do artigo 9.º, n.º 1, alínea b) do CIMI, a CA ou o IMI são devidos a partir do ano seguinte ao do termo da isenção.

No caso de caducidade da isenção pelo decurso do prazo para o qual foi concedida, o imposto é devido a partir do ano seguinte ao termo da isenção.

Neste sentido pode ver-se o ac. do TCAS, de 11/09/2007, recurso n.º 01861/07, in www.dgsi.pt

«Ora, de acordo com o citado art.º 10.º, n.º 1, alínea b) do CCA, então em vigor, em caso de isenção anterior de imposto, o mesmo seria apenas devido a partir do ano seguinte ao termo da situação de isenção.»

Pese embora a argumentação da Representante da Fazenda Pública, não vemos como afastar a aplicação da norma citada, pois, a mesma aplica-se às situações para as quais foi concebida e a todas as outras que caibam na sua previsão.

Por outro lado, a concessão da isenção de Contribuição Autárquica é um acto tributário constitutivo de direitos cuja revogação está proibida pelo artigo 12.º n.º 4, do EBF.

Termos em que a presente impugnação tem que proceder”.

Vejamos.

No essencial, a apontada discordância da Fazenda Pública em face do decidido assenta no seguinte: o disposto no artigo 9° do CIMI tem que ser conjugado com os artigos 43° do EBF e artigo 8° do CIMI; a isenção de CA (actual IMI) foi atribuída por 7 anos, por despacho do Secretário de Estado de Turismo, não se podendo contabilizar cada ano civil de Março de 1997 a Março de 2004 para perfazer os 7 anos, já que a isenção teve lugar logo em 1997 e não apenas em 1998; no IMI o facto tributário ocorre no dia 31 de Dezembro de cada ano, sendo nesse momento que nasce a obrigação tributária - artigo 8.° do CIMI; o imposto é devido por anos completos, pelo proprietário em 31 de Dezembro de cada ano; tendo o Empreendimento Turístico ficado isento de 1997/01/01 a 2003/12/31 (7 anos), foi correctamente liquidado o imposto de IMI relativo ao ano de 2004, porque a isenção não poderia ser superior ao período concedido no citado despacho.

Vejamos, então.

De acordo com o despacho de atribuição de utilidade turística (cfr. ponto B do probatório), a mesma foi concedida por um prazo de sete anos, a contar da data de abertura do empreendimento ao público, isto é, de 05/03/97 a 05/03/04. Como resulta da leitura do DL nº 423/83, de 5/12 (relativo à atribuição da qualificação da atribuição de utilidade turística), com as alterações introduzidas pelo DL nº 38/94, de 8/2, são diversos os benefícios fiscais aí previstos, entre os quais a isenção de contribuição autárquica (anterior contribuição predial), para além de outros impostos, a redução das respectivas taxas de imposto, a isenção ou redução de taxas devidas por licenças, passando, ainda, pela diminuição dos prazos estabelecidos para as reintegrações e amortizações.

No caso concreto da Contribuição Autárquica, dispunha o artigo 43º, nº1 do EBF que:

1 - Ficam isentos de contribuição autárquica por um período de sete anos os prédios integrados em empreendimentos a que tenha sido atribuída a utilidade turística.

Em idêntico sentido dispõe o actual nº 1 do artigo 47º do EBF relativamente ao Imposto Municipal sobre Imóveis:

1 - Ficam isentos de imposto municipal sobre imóveis, por um período de sete anos, os prédios integrados em empreendimentos a que tenha sido atribuída a utilidade turística.

Por seu turno, e quanto ao sujeito passivo e ao início da tributação, dispunham os artigos 8º, nº 1 e 10º, nº1, alínea b) do CCA que, respectivamente:

“A contribuição é devida pelo proprietário do prédio em 31 de Dezembro do ano a que a mesma respeitar”;

“A contribuição é devida a partir do ano seguinte ao do termo da situação de isenção, salvo se estando o contribuinte a beneficiar de isenção venha a adquirir novo prédio para habitação própria e permanente e continuar titular do direito de propriedade do prédio isento, caso em que a contribuição será devida no ano em que o prédio deixou de ser habitado pelo respectivo proprietário”.

No que respeita ao CIMI, estabelecem os artigos 8º, nº1 e 9º, nº1, alínea a), respectivamente, que:

O imposto é devido pelo proprietário do prédio em 31 de Dezembro do ano a que o mesmo respeitar”;

“1 - O imposto é devido a partir:

b) Do ano seguinte ao do termo da situação de isenção, salvo se, estando o sujeito passivo a beneficiar de isenção, venha a adquirir novo prédio para habitação própria e permanente e continuar titular do direito de propriedade do prédio isento, caso em que o imposto é devido no ano em que o prédio deixou de ser habitado pelo respectivo proprietário”.

Temos, pois, que a isenção concedida – de sete anos, respeitante ao período de 05/03/97 a 05/03/04, prazo este pelo qual foi atribuída a utilidade turística – não pode deixar de ser interpretada, no que respeita à contribuição autárquica e ao imposto municipal sobre imóveis(1), de acordo com os normativos legais supra transcritos que, além do mais, nos levam a concluir pela presença de impostos anuais, cujo facto tributário ocorre a 31 de Dezembro de um determinado ano (cfr. artigos 18º do CCA e 113º do CIMI).

Temos, assim, que a isenção foi concedida por sete anos; que é sujeito passivo do imposto o proprietário do prédio a 31 de Dezembro do ano a que a contribuição/imposto respeitar e que o IMI é devido a partir do ano seguinte ao termo da situação de isenção.

Significa isto, fazendo o enfoque no caso concreto, que a Impugnante, ora Recorrida, ficou isenta de CA no ano de 1997 (não obstante o período de isenção ter o seu início apenas em Março desse ano, importando aqui, porém, a data de 31 de Dezembro daquele mesmo ano), de 1998, de 1999, de 2000, de 2001, de 2002 e de 2003, o que perfaz, precisamente, 7 anos de isenção de contribuição autárquica. Ora, como se viu, sete anos de isenção de CA (ou, actualmente, de IMI) era o previsto no artigo 43º - actual 47º - do EBF para os prédios integrados em empreendimentos a que tenha sido atribuída a utilidade turística.

Portanto, e como bem salienta o EMMP junto deste Tribunal, no “ano de 2004 a isenção – leia-se, de IMI - já não vigora, uma vez que, não obstante o período de sete anos terminar em 5 de Março, o certo é que o facto tributário só ocorreu em 31 de Dezembro”.

Por conseguinte, o ano de 2003 correspondeu ao último ano da isenção de sete anos de CA, pelo que em 2004 o IMI é devido, sendo este o ano seguinte ao do termo da situação de isenção, tal como prevê o artigo 9º, nº1, alínea b) do CIMI.

Outra interpretação, concretamente deste artigo 9º, nº1, alínea b) do CIMI, que considere o período de isenção até 5 de Março de 2004 (e que, em consequência, considere a impugnante isenta de IMI em 2004), resulta descontextualizada, pois que despreza, em absoluto, a periodicidade anual do imposto e a verificação do respectivo facto tributário a 31 de Dezembro de cada ano.

E nem se diga, como argumento contrário, como se refere na sentença recorrida, que a concessão da isenção de Contribuição Autárquica é um acto tributário constitutivo de direitos cuja revogação está proibida pelo artigo 12.º n.º 4, do EBF, pois que, no caso, nenhuma revogação teve lugar. A Administração concedeu sete anos isenção de contribuição autárquica e durante sete anos – de 1997 a 2003 – a Recorrida esteve efectivamente isenta.

O que, em bom rigor, contraria o disposto no despacho que concedeu a isenção de CA é a interpretação sufragada pela impugnante, que a sentença acolheu, pois que, afinal, se traduz num prolongamento por oito anos (de 1997 a 2004, inclusive) de uma isenção de imposto que foi concedida para vigorar sete anos.

Assim sendo, fácil é concluir que a liquidação impugnada, respeitante ao IMI de 2004, é válida e deve, por isso, ser mantida, contrariamente ao decidido pelo TAF de Loulé.

Conclui-se, pois, pelo erro de julgamento de direito em que a sentença posta em crise incorreu, interpretando e aplicando erradamente as disposições legais acima indicadas.

Procedem, assim, as conclusões da alegação do presente recurso jurisdicional, o qual obterá o devido provimento.

3 - DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e, em consequência, julgar improcedente a impugnação judicial.

Custas pela Recorrida.

Lisboa, 15 de Maio de Maio de 2014.


(Catarina Almeida e Sousa)

(José Gomes Correia)

(Joaquim Gameiro)

(Vencido por entender que há lugar a IMI a partir do ano de 2005, não havendo IMI relativamente ao ano de 2004 (cfr. art. 9.º n.º 1 al. b) do CIMI)



1- Dispõem os nºs 1 e 6 do artigo 31º do DL nº 287/2003, de 12/11, diploma que procedeu à reforma da tributação do património, aprovando, além do mais, o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, que:
“1 - A partir da data da entrada em vigor do CIMI, são revogados os Códigos da Contribuição Autárquica, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-C/88, de 30 de Novembro, e da Contribuição Predial e do Imposto sobre a Indústria Agrícola, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 45104, de 1 de Julho de 1963, na parte ainda vigente, considerando-se a contribuição autárquica substituída pelo imposto municipal sobre imóveis (IMI) para todos os efeitos legais”.
“6 - Mantêm-se em vigor os benefícios fiscais relativos à contribuição autárquica, agora reportados ao IMI, bem como os respeitantes ao imposto municipal de sisa estabelecidos em legislação extravagante ao Código aprovado pelo decreto-Lei n.º 41969, de 24 de Novembro de 1958, e no Estatuto dos Benefícios Fiscais, que passam a ser reportados ao IMT.