Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06629/13
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:07/02/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:REGIME DOS BENEFÍCIOS FISCAIS.
REGIME DE INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS QUE CONSAGRAM BENEFÍCIOS FISCAIS.
BENEFÍCIO FISCAL CONSAGRADO NO ARTº.46, Nº.2, DO E.B.F., NA REDACÇÃO RESULTANTE DA LEI 65/90, DE 28/12.
ÓNUS DA PROVA.
Sumário:1. De acordo com a lei, os benefícios fiscais devem considerar-se medidas de carácter excepcional, instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes e que sejam superiores aos da tributação que impedem (cfr.artº.2, nº.1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo dec.lei 215/89, de 1/7).

2. Do ponto de vista jurídico, e na óptica da relação jurídica de imposto, os benefícios fiscais consubstanciam, antes de mais, factos que estando sujeitos a tributação, são impeditivos do nascimento da obrigação tributária ou, pelo menos, de que a mesma surja em plenitude. Na verdade, enquanto facto impeditivo, o benefício fiscal traduz-se sempre em situações que estão sujeitas a tributação, isto é, que são subsumíveis às regras jurídicas que definem a incidência objectiva e subjectiva do imposto. E, precisamente porque o benefício fiscal constitui um facto impeditivo da tributação-regra, a sua extinção ou falta de pressupostos de aplicação tem por efeito imediato a reposição automática dessa mesma tributação, como estabelece o artº.12, nº.1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

3. As normas que consagram benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, embora admitam a interpretação extensiva (cfr.artº.9, do E.B.F.).

4. O benefício fiscal consagrado no nº.2, do artº.46, do E.B.F., na redacção resultante da Lei 65/90, de 28/12, deve considerar-se dependente de reconhecimento, dado necessitar da verificação do Ministro das Finanças (cfr.artº.4, do E.B.F.).

5. Igualmente se deve concluir que o mesmo benefício fiscal reveste características temporárias, sendo que a sua caducidade opera pelo decurso do prazo pelo qual foi concedido e a sua extinção tem por efeito imediato a reposição automática da tributação regra (cfr.artº.12, nº.1, do E.B.F.).

6. Atento o disposto no artº.74, nº.1, da L.G.T., é ao sujeito passivo de imposto que compete fazer prova dos pressupostos de sujeição ao regime de determinado benefício fiscal, enquanto facto impeditivo da tributação-regra.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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JOÃO ………………., com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.215 a 222 do presente processo, através da qual julgou improcedente impugnação judicial, tendo por objecto mediato liquidação de I.R.S., referente ao ano de 1997 e no montante total de € 3.088,56.
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O recorrente termina as alegações (cfr.fls.252 a 263 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Salvo o devido respeito que nos merecem a opinião e a ciência jurídica do Meritíssimo Juiz “a quo”, afigura-se ao recorrente que a douta sentença recorrida, não poderá manter-se, na medida em que a mesma é injusta e não rigorosa;
2-No que concretamente respeita aos factos, importa referir uma vez mais que em Setembro de 2000 foi o recorrente notificado da nota de liquidação adicional de I.R.S. em resultado da qual a 2ª. Direcção de Finanças de Lisboa procedeu à liquidação de I.R.S. no valor de Esc.619.200$00/€ 3.088,56, referente ao ano de 1997;
3-Esta liquidação correspondia aos vencimentos auferidos pelo recorrente no âmbito de um acordo de cooperação entre a sua entidade empregadora “L…….. - Companhia ………………, S.A.” e a “I…………”, empresa angolana;
4-Na sequência desse acordo, em Novembro de 1991, a L……… requereu uma isenção de I.R.S. para todos os trabalhadores que passaram a desempenhar as suas funções em Angola, neles se incluindo o recorrente;
5-Na medida em que o acordo de assistência técnica estabelecido com a entidade angolana previa, na sua duração, renovações automáticas, o pedido de isenção de I.R.S. requeria que aquele fosse concedido para os rendimentos dos trabalhadores deslocados em Angola em função daquele contrato e suas prorrogações;
6-O artº.46, nº.2, do E.B.F., na redacção dada pela Lei 10-B/96, de 23 de Março, não fez depender o reconhecimento do regime de isenção da verificação de qualquer âmbito de vigência temporal do acordo;
7-Assim sendo, no ano de 1997 o recorrente, à semelhança do que sucedia no ano de 1991, continuava deslocado em território angolano, no âmbito do acordo de cooperação entre a “L………..” e a “I……………..”;
8-O próprio despacho que concede o benefício de isenção limita-se a reconhecer o regime de isenção “(...) aos rendimentos auferidos pelos trabalhadores (onde se inclui o ora recorrente) da L……….. destacados em Angola e no que respeita ao contrato junto ao pedido”, isto é, o despacho limita-se a elencar os requisitos legais condicionantes do reconhecimento do regime de isenção;
9-Não poderá agora proceder o argumento invocado no artº.23 da resposta apresentada, do referido no artº.14, da L.G.T., que estabelece a “regra geral de transitoriedade dos benefícios fiscais, de modo a que, sendo temporários, sujeita-os a uma avaliação periódica para que não se mantenham situações em que já tenha cessado o «interesse público»”;
10-Como ficou demonstrado, o referido pedido de isenção foi suportado no especial interesse que o acordo entre a “L………” e a “I………..” representava quer a nível da economia nacional quer para o plano político, ao nível do consistente reforço da cooperação entre os estados português e angolano;
11-Daí que mantendo-se o mencionado contrato por um lapso de tempo superior a um ano, o seu especial interesse manteve-se pela sua duração integral;
12-Portanto, a empresa requerente não solicitou a isenção do pagamento de I.R.S. para o ano de 1991, mas sim para esse ano e para os demais decorrentes de eventuais prorrogações contratuais que estavam previstas no respectivo contrato de cooperação que acompanhou o pedido de isenção;
13-O próprio despacho não impôs qualquer limitação temporal para a isenção requerida; pelo contrário, o que se diz é que a isenção é concedida no âmbito do contrato de cooperação abrangendo, como é lógico, as eventuais prorrogações como veio a suceder;
14-Portanto, e a admitir-se que tal limitação temporária seria possível ela teria que constar expressamente do despacho que concede a isenção sempre que o contrato de cooperação fosse plurianual ou previsse a sua natural prorrogação, como faz o pedido;
15-Aliás, atendendo aos critérios enunciados no artº.16, do C.I.R.S., o recorrente não era tido como residente em território português, pelo que se apresentou declaração de rendimentos relativa ao ano de 1997, a tal não estava obrigado por força do artº.57, do mesmo diploma legal;
16-Em face do exposto, o acto tributário que originou a liquidação em sede de I.R.S. dos rendimentos do recorrente auferidos em Angola ao abrigo do contrato de cooperação celebrado entre a sua entidade empregadora e a empresa angolana “I…………”, no ano de 1997, deveriam considerar-se incluídos no benefício fiscal concedido anteriormente;
17-Termos em que deverá o presente recurso interposto ser considerado procedente, e em consequência ser a liquidação de I.R.S. do ano de 1997 ser anulada, com todas as consequências legais daí decorrentes, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!!!
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso (cfr.fls.275 a 277 dos autos).
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Corridos os vistos legais (cfr.fls.279 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.217 a 221 dos autos):
1-O impugnante apresentou, em 12/03/1998, declaração de IRS do ano de 1997, tendo mencionado no Campo 407, do Quadro 4, do seu Anexo H - relativo a “remunerações auferidas ao abrigo de acordos de cooperação - artº.46, do EBF” - a importância de € 20.386,87;
2-No âmbito de um procedimento de análise, suscitaram-se aos serviços dúvidas sobre se os rendimentos mencionados no referido anexo se encontravam efectivamente abrangidos pela isenção estabelecida no artº.46, do EBF;
3-Foram colhidas as pertinentes informações burocráticas, tendo os serviços apurado junto da DSBF, o seguinte:
“Que por despacho ministerial proferido em 12-05-1992, fora concedida "isenção de IRS a partir do ano de 1991, aos rendimentos do trabalho dependente auferidos no âmbito da deslocação para Angola, por força do contrato de gestão e assistência técnica celebrado entre a L………. e a I………", entre outros trabalhadores, ao Sr. João …………………….;
Que, não tendo aquele despacho determinado a duração da isenção, se entendeu que deveria prevalecer apenas para o ano de 1991, momento em que a L…………l apresentara o correspondente pedido;
Que, relativamente aos anos de 1995 e 1996, nem todos os contribuintes cuja identificação constava da relação fornecida pela L………. se encontravam abrangidos pelos despachos que haviam concedido isenção de IRS relativamente aos anos dela constantes;
Que a L………, considera que o despacho de 12-05-1992 abrangia rendimentos auferidos, entre outros, pelo Sr. João …………………., nos anos de 1993, 1994, 1995 e 1996, situação essa que não correspondia à realidade factual, considerando que o respectivo despacho incidira, unicamente, sobre os rendimentos auferidos por esse contribuinte e, pelos restantes, no ano de 1991”;

4-Face ao teor da informação colhida junto da DSBF, diligenciaram os serviços a correcção no sentido da tributação dos rendimentos mencionados no Anexo H da declaração apresentada pelo impugnante para o ano de 1997, como rendimentos da Categoria A, não abrangidos pela isenção do artº.46, nº.2, do EBF;
5-Foi preenchida declaração oficiosa de correcção de cuja liquidação veio a resultar a emissão de uma nota de cobrança na importância de € 3.088,56, com prazo de pagamento até 25/10/2000 (cfr.documento junto a fls.11 do apenso de reclamação graciosa);
6-Em 4/01/2001, o impugnante deduziu reclamação graciosa (cfr.documento junto a fls.3 do apenso de reclamação graciosa);
7-Por despacho de 17/06/2002, foi indeferida a reclamação graciosa, entre o mais, com o fundamento de que “todos os pedidos feitos pela entidade pagadora dos rendimentos tinham um limite temporal (por exemplo, “para o ano de 1991”) e um limite relativamente aos trabalhadores abrangidos... dos quais o reclamante apenas consta para o ano de 1991” (cfr.projecto de despacho e despacho decisório junto a fls.54 e 61 do atinente apenso);
8-O impugnante foi notificado do despacho de indeferimento da reclamação graciosa em 28/06/2002 (cfr.talão de aviso de recepção junto a fls.65 do apenso);
9-Interpôs recurso hierárquico para o Sr. Ministro das Finanças em 26/07/2002 (cfr.documento junto a fls.2 do apenso de recurso hierárquico);
10-O recurso hierárquico foi indeferido por despacho de 10/11/2002, do Sr. Subdirector-Geral - exarado sobre informação/parecer dos serviços constante de fls.28 do apenso respectivo e que damos aqui por integralmente reproduzida - cujo teor se transcreve:

“Concordo, pelo que na ausência de pedido de concessão de isenção de IRS ao abrigo do art°27° (ex - 46°) do EBF para as remunerações auferidas eventualmente pelo recorrente no âmbito de acções de cooperação ali previstas, não poderá invocar-se o direito a tal benefício, pelo que nego provimento ao recurso”;

11-Da decisão de indeferimento do recurso hierárquico foi o impugnante notificado em 22/11/2002 (cfr.talão de aviso de recepção junto a fls.34 do respectivo apenso);
12-Interpôs em 23/01/2003 recurso contencioso para o Tribunal Central Administrativo, convolado, no seguimento de remessa do processo ao tribunal tributário de 1a instância, em impugnação judicial (cfr.fls.2 e despacho de convolação a fls.175 dos presentes autos);
13-Em 18/11/1991, a “L…… - Companhia …………, S.A.”, dirigiu ao Sr. Ministro das Finanças o requerimento que constitui fls.18 do apenso de reclamação graciosa de que consta, entre o mais que damos por integralmente reproduzido, o seguinte:
“...vimos requerer a V. Exa., de acordo com o n°2 do art°46° do Decreto Lei n°215/89, de 1 de Julho (Estatuto dos Benefícios Fiscais), na redacção dada pela Lei n°65/90, de 28 de Dezembro, a concessão de isenção do IRS para o ano de 1991 relativamente aos rendimentos do trabalho dependente aos nossos empregados deslocados em Angola ao serviço do contrato supra mencionado e suas prorrogações naquele país:
- (...);
- João …………………………..”;

14-A requerente L…………… - entidade pagadora dos rendimentos do impugnante aqui em causa - foi notificada do deferimento do pedido de isenção de IRS por ofício de 21/05/1992, a fls. 48 do apenso de reclamação, do seguinte teor:
“Em referência ao pedido apresentado em 19 de Novembro de 1991, tenho a honra de informar V. Exas. de que, por despacho de S.E.S.E.A.S.E.A.O., de 12 de Maio de 1992, foi concedida isenção de I.R.S., nos termos do n°2 do art°46° do EBF aos rendimentos auferidos pelos trabalhadores da L……….. - S. A., deslocados em Angola, a que respeita o contrato junto ao pedido.
Desta isenção aproveitam os rendimentos auferidos a partir da entrada em vigor do citado n°2 do art°46°na redacção que lhe foi dada pela Lei 65/90, de 28 de Dezembro. Junta-se a lista dos trabalhadores constantes do mesmo contrato”;

15-A lista a que se refere o ofício integra, entre outros trabalhadores, o ora impugnante João ………………… (cfr.documento junto a fls.49 do apenso de reclamação).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Com interesse para a decisão, nada mais se provou de relevante, nomeadamente, não se provou que no ano de 1997 o impugnante se encontrava deslocado em Angola ao serviço da L………..e no âmbito do acordo de cooperação celebrado entre essa entidade pagadora e a empresa angolana I…………”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Assenta a convicção do tribunal no conjunto da prova dos autos e apensos de reclamação e recurso hierárquico, com destaque para a assinalada. Os factos não provados assentam na falta de prova…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida ponderou, em síntese, julgar totalmente improcedente a impugnação que originou o presente processo, mais julgando válida e legal a liquidação identificada no nº.5 do probatório.
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Refira-se, antes de mais, que são as conclusões das alegações do recurso que, como é sabido, definem o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.684 e 690, do C.P.Civil, então em vigor; António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.89 e seg.; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.41).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em síntese e como supra se alude, que a liquidação impugnada corresponde aos vencimentos auferidos pelo apelante no âmbito de um acordo de cooperação entre a sua entidade empregadora “L.. - Companhia …………….., S.A.” e a “I………….”, empresa angolana. Que na sequência desse acordo, em Novembro de 1991, a L……….. requereu uma isenção de I.R.S. para todos os trabalhadores que passaram a desempenhar as suas funções em Angola, neles se incluindo o recorrente. Que, na medida em que o acordo de assistência técnica estabelecido com a entidade angolana previa, na sua duração, renovações automáticas, o pedido de isenção de I.R.S. requeria que aquele fosse concedido para os rendimentos dos trabalhadores deslocados em Angola em função daquele contrato e suas prorrogações. Que o artº.46, nº.2, do E.B.F., na redacção dada pela Lei 10-B/96, de 23 de Março, não faz depender o reconhecimento do regime de isenção da verificação de qualquer âmbito de vigência temporal do acordo. Assim sendo, no ano de 1997 o recorrente, à semelhança do que sucedia no ano de 1991, continuava deslocado em território angolano, no âmbito do acordo de cooperação entre a “L……..” e a “I……….”. Que o próprio despacho não impôs qualquer limitação temporal para a isenção requerida. Pelo contrário, o que se diz é que a isenção é concedida no âmbito do contrato de cooperação abrangendo, como é lógico, as eventuais prorrogações como veio a suceder. Portanto, e a admitir-se que tal limitação temporária seria possível ela teria que constar expressamente do despacho que concede a isenção sempre que o contrato de cooperação fosse plurianual ou previsse a sua natural prorrogação, como acontece no caso concreto. Que atendendo aos critérios enunciados no artº.16, do C.I.R.S., o recorrente não era tido como residente em território português, pelo que se apresentou declaração de rendimentos relativa ao ano de 1997, a tal não estava obrigado por força do artº.57, do mesmo diploma legal. Que os rendimentos do recorrente auferidos em Angola ao abrigo do contrato de cooperação celebrado entre a sua entidade empregadora e a empresa angolana “I……….”, no ano de 1997, deveriam considerar-se incluídos no benefício fiscal concedido anteriormente (cfr.conclusões 1 a 16 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, segundo percebemos, um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a sentença recorrida comporta tal vício.
De acordo com a lei, os benefícios fiscais devem considerar-se medidas de carácter excepcional, instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes e que sejam superiores aos da tributação que impedem (cfr.artº.2, nº.1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo dec.lei 215/89, de 1/7 - E.B.F.).
Do ponto de vista jurídico, e na óptica da relação jurídica de imposto, os benefícios fiscais consubstanciam, antes de mais, factos que estando sujeitos a tributação, são impeditivos do nascimento da obrigação tributária ou, pelo menos, de que a mesma surja em plenitude. Na verdade, enquanto facto impeditivo, o benefício fiscal traduz-se sempre em situações que estão sujeitas a tributação, isto é, que são subsumíveis às regras jurídicas que definem a incidência objectiva e subjectiva do imposto. E, precisamente porque o benefício fiscal constitui um facto impeditivo da tributação-regra, a sua extinção ou falta de pressupostos de aplicação tem por efeito imediato a reposição automática dessa mesma tributação, como estabelece o artº.12, nº.1, do E.B.F. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/12/2012, proc.5810/12; Nuno Sá Gomes, Teoria Geral dos Benefícios Fiscais, C.T.F. 359, pág.75 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, I, 1996, Editora Rei dos Livros, pág.323 e seg.).
É hoje pacífico que as leis fiscais se interpretam como quaisquer outras, havendo que determinar o seu verdadeiro sentido de acordo com as técnicas e elementos interpretativos geralmente aceites pela doutrina (cfr.artº.9, do C.Civil; artº.11, da L.G. Tributária; José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e Teoria Geral, Editorial Verbo, 4ª. edição, 1987, pág.335 e seg.; J. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1989, pág.181 e seg.; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de C.T.Fiscal, nº.174, 1996, pág.363 e seg.).
Especificamente as normas que consagram benefícios fiscais não são susceptíveis de integração analógica, embora admitam a interpretação extensiva (cfr.artº.9, do E.B.F.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/6/2013, proc.6588/13; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª.edição, Coimbra Editora, 2007, pág.463 e seg.; Nuno Sá Gomes, Teoria Geral dos Benefícios Fiscais, Cadernos C.T.F., nº.165, 1991, pág.253 e seg.).
O benefício fiscal em discussão no presente processo foi concedido ao abrigo do artº.46, nº.2, do E.B.F., através de despacho datado de 12 de Maio de 1992, embora com referência ao ano de 1991 (cfr.nºs.13 e 14 do probatório).
Haverá, antes de mais, que fazer a exegese do artº.46, nºs.1 e 2, do E.B.F., na redacção vigente em 1991, o qual dispunha sob a epígrafe:
Artº.46º.
(Acordos e relações de cooperação)

“1 - Ficam isentas de IRS as pessoas deslocadas no estrangeiro ao abrigo de acordos de cooperação, relativamente aos rendimentos auferidos no âmbito do respectivo acordo.
(redacção resultante da Lei 65/90, de 28/12).
2 - O Ministro das Finanças pode, a requerimento das empresas interessadas, ou registo, conceder isenção de IRS relativamente aos rendimentos auferidos por pessoas deslocadas no estrangeiro ao serviço daquelas, ao abrigo de contratos celebrados com entidades estrangeiras, desde que sejam demonstradas as vantagens desses contratos para o interesse nacional.
(redacção resultante da Lei 65/90, de 28/12).

O benefício fiscal consagrado no nº.2, do artº.46, do E.B.F., na redacção supra, deve considerar-se dependente de reconhecimento, dado necessitar da verificação do Ministro das Finanças (cfr.artº.4, do E.B.F.; Nuno Sá Gomes, Teoria Geral dos Benefícios Fiscais, Cadernos de C.T.F. 165, 1991, pág.132 e seg.).
Igualmente se deve concluir que o mesmo benefício fiscal reveste características temporárias, sendo que a sua caducidade opera pelo decurso do prazo pelo qual foi concedido e a sua extinção tem por efeito imediato a reposição automática da tributação regra, consoante mencionado acima (cfr.artº.12, nº.1, do E.B.F.; Nuno Sá Gomes, Teoria Geral dos Benefícios Fiscais, Cadernos de C.T.F. 165, 1991, pág.132 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, conforme se retira do probatório (cfr.nºs.13 e 14 da factualidade provada), o pedido de isenção de I.R.S. formulado pela sociedade “L………. - Companhia …………………., S.A.” somente incidia sobre o ano de 1991, sendo este pedido que foi objecto de deferimento pelo despacho datado de 12 de Maio de 1992.
Ora, sendo a isenção requerida somente para o ano de 1991, e revestindo carácter temporário o benefício fiscal em causa, é manifesto que o mesmo não poderia vigorar para o ano de 1997, como pretende o recorrente.
Por outro lado, o pedido formulado pelo recorrente igualmente improcederia por falta de prova (e o ónus probatório pertencia-lhe, atento o disposto no artº.74, nº.1, da L.G.T.) de que se encontrava deslocado em Angola, no ano de 1997, ao serviço da sociedade “L………” e no âmbito do acordo de cooperação celebrado entre esta empresa e a angolana “I………….” (cfr.factualidade não provada).
Por último, sempre se dirá que a alegada falta de residência em território português no ano de 1997, por parte do recorrente, não reveste qualquer relevo na economia da decisão do presente recurso, visto que a incidência pessoal de I.R.S. também pode abarcar rendimentos de que seja titular um não-residente no nosso país (cfr.artº.14, nº.1, do C.I.R.S., na redacção em vigor no ano de 1997; Rui Duarte Morais, Sobre o I.R.S., 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.16 e seg.).
Sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o recurso sob exame e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 2 de Julho de 2013

(Joaquim Condesso - Relator)

(Eugénio Sequeira - 1º. Adjunto)

(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)