Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03851/10
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:07/14/2010
Relator:LUCAS MARTINS
Descritores:FONTE/ORIGEM DO RENDIMENTO.
QUANTIFICAÇÃO PRESUMIDA
Sumário:1.Em caso de manifestação de fortuna apta a suportar o recurso à tributação por avaliação indirecta, nos termos do art.º 89.º-A, da LGT, o contribuinte, para afastar a presunção de evasão fiscal que a justifica não carece de fazer prova do facto gerador dos rendimentos utilizados em tal manifestação na medida em que, comprovadamente, não sejam de considerar omitidos à declaração de rendimentos respectiva;

2. Sendo de proceder à quantificação de rendimento, por avaliação indirecta, nos termos daquele artigo 89.º-A, da LGT, a AT não pode deixar de excluir desse “quantum” a fixar, o valor do empréstimo bancário utilizado na manifestação de fortuna, enquanto montante justificado não sujeito a imposto.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:23
Rec.; 3.851/10 (Urg.)
- O Director de Finanças de Lisboa, por se não conformar com a decisão documentada de fls. 445 a 461, inclusive, dos autos e que, ao que aqui releva, julgou procedente o recurso interposto por Liu ..............., com os sinais dos autos, de despacho do ora recorrente que fixou, por avaliação indirecta o seu rendimento colectável, em sede de IRS, relativo ao ano de 2004, no valor de € 96 600,00, dela veio interpor o presente recurso apresentando, para o efeito, as seguintes conclusões;

A. O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença a fls. …, que decidiu conceder provimento ao recurso e anular o acto tributário recorrido.

B. A Douta Sentença Recorrida fez, contudo uma errada aplicação da Lei aos factos, nomeadamente no que respeita à interpretação e aplicação do n.º 3 do Artigo 89.º-A da LGT, pelo que se recorre da mesma, na parte em que decidiu que, perante os factos dados como provados ficou ilidida a presunção de evasão fiscal relativa aos rendimentos declarados face aos meios de fortuna evidenciados.

C. A Mma. Juiz a quo, não obstante considerar que se verificam em abstracto, os pressupostos da avaliação indirecta da matéria colectável, por outro lado, conclui com base na alínea M) dos factos assentes que foi ilidida a presunção de evasão fiscal, “porquanto demonstrou que a fonte da manifestação de fortuna evidenciada foi outra que não se encontrava sujeita A declaração em sede de IRS.”.

D. Ora, o n.º 3 do Artigo 89.º-A da LGT referido determina que é necessário comprovar a fonte/origem do rendimento e não, que simplesmente possui esse montante à data da manifestação de fortuna.

E. De facto, o Recorrente comprovou que celebrou um contrato de mútuo com hipoteca no valor de € 450 000,00, para aquisição do imóvel, com o Banco ..............., mas no que toca aos restantes € 33 000,00 apenas comprova que o contribuinte detinha na sua conta bancária em 21/06/2004 (portanto, antes da escritura), o valor de € 38 517,06.

F. Como se vê, dos factos assentes não resulta qual a origem dos rendimentos existentes naquela data na sua conta, ou melhor, que a fonte dos rendimentos que detinha naquela data era outra e que por isso não se encontravam sujeitos a declaração em sede de IRS.

G. E nem se diga que a fonte dos rendimentos do Recorrente provinha da República Popular da China, onde supostamente tem negócios onde aufere ganhos que trará para Portugal de forma que não ficou explicita, pois além de tal facto não ter ficado assente nos factos provados, também não comprova que o montante de € 38 517,06, que existia em 21/06/2004 na sua conta, tivesse essa origem, ou que não tivesse que ser declarado em sede de IRS no exercício de 2004.

H. Para ilidir a presunção, nos termos do n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT, não basta comprovar através de extractos bancários que detém à data da escritura o montante necessário para realizar a aquisição, (ou no caso, que detinha o remanescente entre o valor da aquisição e do empréstimo, no valor de € 33 000,00) tal não é relevante, caso contrário, não podia adquirir o imóvel.

I. Para fazer a prova de que a origem dos rendimentos evidenciados não foram omitidos na declaração de IRS de 2004, deveria comprovar que manteve saldo suficiente para essa despesa desde 31/12/2003 até à data da escritura, caso contrário, não se demonstra que aquele rendimento não se encontra sujeito a declaração em sede de IRS em 2004.

J. Pelo exposto, a Douta Sentença recorrida errou, ao considerar que o Recorrente demonstrou através dos factos provados na alínea M) que a fonte da manifestação de fortuna evidenciada foi outra e que não se encontrava sujeita a declaração em sede de IRS, por o Recorrente ter provado que possuía quantia superior a € 33 000,00 depositada na conta antes da escritura.

K. Assim, a douta sentença incorreu na violação do n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT, razão pela qual deve ser substituída por outra, que mantenha o acto recorrido por ter sido proferido de acordo com a legislação em vigor.


- Contra-alegou o recorrido Liu ................, pugnando pela manutenção do julgado e requerendo, ainda, a ampliação do recurso, nos termos do seguinte quadro conclusivo;

I- A AT dirigiu as suas doutas alegações ao Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no artigo 26.º, alínea b) do ETAF.
Contudo, o Recorrido, apresentou, em 17 de Dezembro de 2009, um recurso da douta sentença para o Tribunal Central Administrativo do Sul, no qual solicitou a reapreciação da matéria de facto constante da douta sentença.
Mas não é só, já que o Recorrido, à cautela, nas presentes alegações – no ponto V das mesmas – ao abrigo do disposto no artigo 684.º-A do CPC por remissão do artigo 2.º alínea e) do CPPT, requer que o âmbito do seu recurso seja ampliado, quer quanto à decisão da matéria de facto, quer quanto às questões de direito.
Tal ampliação do âmbito do recurso – quanto à questão de facto – determinada a incompetência material do Supremo Tribunal Administrativo para apreciar o douto recurso apresentado pela AT, nos termos conjugados do disposto nos artigos 38.º alínea a) e 26.º alínea b), todos do ETAF, já que o recurso apresentado não tem como fundamento único matéria de direito mas também matéria de facto, a qual se pretender ver reapreciada.
Pelo exposto, ao abrigo do disposto nos artigos 38.º alínea a) e 26.º alínea b), todos do ETAF deve ser declarada a incompetência do Supremo Tribunal Administrativo para a apreciação do presente recurso, declarando-se competente para o efeito a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul.

II- Ora, como bem demonstram os factos provados, o Recorrido, à data dos factos, era titular de duas sociedades na China e de três sociedades em Portugal das quais auferia retribuições.
Da mesma forma, resultou provado dos autos, entre outros, que o Recorrente, em 31-12-2003, era titular, em Portugal, de um saldo bancário na sua conta n.º .............. do B............, da quantia de € 200.577,71 (duzentos mil quinhentos e setenta e sete euros e setenta e um cêntimos) e que mobilizou parte desse dinheiro – mais precisamente € 60.000,00 (sessenta mil euros) para proceder à aquisição da fracção autónoma em causa.
Ora, face aos factos supra expostos, os quais estão documentalmente comprovados, salvo melhor entendimento, carece de qualquer fundamento as alegações da AT quando refere que o Recorrido não comprovou qual a origem dos seus rendimentos e que estes não foram omitidos à sua declaração de IRS de 2004, já que este provou ser detentor, no dia 31 de Dezembro de 2003, de um saldo bancário mais do que suficiente para proceder à referida aquisição, tendo igualmente comprovado que movimentou esse mesmo saldo, numa quantia de € 60 000,00 (sessenta mil euros) para proceder a mesma aquisição.
Não nos podemos olvidar que ao Recorrido, nos termos do disposto no artigo 89.º-A da LGT, competia comprovar, apenas e só, qual a origem da quantia de, pelo menos € 33.000,00 (trinta e três mil euros).
O Recorrido, ao comprovar nos presentes autos que, já no ano de 2003, era detentor de uma avultada quantia na sua conta à ordem junto do Banco ..................... e que mobilizou parte dessa mesma quantia para efectuar a aquisição em causa ilidiu a presunção que sobre si impedia.
Efectivamente, de acordo com o quadro legal vigente à data dos factos, o Recorrido não necessita, por a tal não ser obrigado, de demonstrar como adquiriu esse capital, pois o que está em causa é apenas averiguar se estes foram ou não omitidos na declaração de rendimentos do ano de 2004 e não em quaisquer outras.
Pelo exposto, temos de concluir que o Tribunal a quo ao considerar que o Recorrido ilidiu a presunção que sobre si impendia fez uma correcta interpretação do disposto no artigo 89.º-A da LGT, pelo que, quanto a esta matéria, não há nada a censurar à douta sentença.

III- No seu recurso o Recorrido, ora Recorrente, pediu a procedência do seu recurso, invocando vários fundamentos: (1) Nulidade da notificação efectuada ao Recorrente; (2) Ilegalidade do despacho do Director de Finanças por não estarem preenchidos os requisitos de que depende a aplicação do disposto no artigo 89.º-A da LGT e (3) Incorrecta quantificação da matéria colectável.
Na douta decisão recorrida, o Tribunal a quo apenas considerou procedente a segunda questão colocada.
Assim sendo, sem prejuízo da reapreciação da matéria de facto, prevenindo hipótese da procedência da questão suscitada pela Recorrente, requer-se a V. Exas. que, ao abrigo do disposto no artigo 684.º-A do CPC por remissão do artigo 2.º alínea e) do CPPT, se tome conhecimento dos fundamentos alegados pelo Recorrido, no qual este decaiu.
Igualmente, para um melhor esclarecimento dos autos, requer-se a alteração da decisão sobre a matéria de facto, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 684.º-A do CPC.

III- Face à prova carreada para os autos e documentos supra referidos, os quais não foram impugnados pelo Digníssimo Representante da Fazenda Pública mal andou o Tribunal a quo ao não considerar provados os factos descritos nos artigos 19.º (vide fls. 64 dos autos), 40.º (vide – Anexo VI, fls. 1 a 7 – a fls. 122 a 128 do processo administrativo) 43.º e 44.º (vide a fls. 29 e 40 do processo administrativo), 50.º, 51.º e 52.º (por todos vide fls. 42 a 59 e 64 a 121 do processo administrativo, respectivamente, Anexo IV, fls. 22 a 39 e Anexo V, fls. 5 a 62 da decisão impugnada), todos da petição inicial, devendo os mesmos considerarem-se impugnados nos termos dos artigos 684.º e 685.º-B, todos do CPC, e, consequentemente, V. Exas considerarem os mesmos PROVADOS nos precisos termos supra alegados.
Da mesma forma, o facto constante do artigo 41.º da petição inicial, face aos documentos constantes a fls. 163 a 171 e 410 dos autos, deverá ser dado como PROVADO com a seguinte redacção:
“O sinal e princípio de pagamento do preço da fracção autónoma foi efectuado através de dois cheques do Recorrente:
a) um no valor de € 25 000,00 (vinte e cinco mil) sacado, em 14 de Abril de 2004, da sua conta n.º ............. do Banco ............................; e
b) um no valor de € 35 000,00 (trinta e cinco mil) sacado, em 14 de Abril de 2004, da sua conta n.º .....................do Banco ..........................
O Recorrente emitiu e levantou, no dia 13 de Abril de 2004, um cheque seu do Banco ......................, o qual depositou na sua conta n.º ................ do ................. Argentaria, para cobrir o cheque constante da alínea a).”

Por outro lado, tendo em conta a declaração do Banco ................. constante a fls. 170 dos autos, o facto constante do artigo 47.º da petição inicial deverá ser considerado PROVADO, com a seguinte redacção:
“No dia 31-12-2003, o Recorrente era detentor, em Portugal, na sua conta bancária no ...................... n.º ................. da quantia de € 200 577,71 (duzentos mil quinhentos e setenta e sete euros e setenta e um cêntimos).
Ao não considerar provados os factos supra referidos, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 511.º, n.º 1 do CPC, por desconsiderar factos de extrema relevância para a boa decisão da causa.

IV- Caso, por mera hipótese, o Tribunal ad quem considere procedente as doutas alegações da AT, ainda, assim, deverão ser apreciados os restantes fundamentos alegados pelo Recorrente, os quais passamos a indicar.

V- O direito tributário é regulado por códigos próprios e legislação própria, quer em matéria substantiva quer em matéria processual.
Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 38.º do CPPT a notificação, alegadamente, efectuada ao Recorrente do ofício n.º 88031, de 14 de Novembro de 2008, deveria ser efectuada por carta registada com aviso de recepção. O que não veio a acontecer, já que embora a Directora de Finanças Adjunta tenha emitido um mandado para se proceder à notificação do Recorrente nos termos do disposto no artigo 40.º do CPPT, a funcionária encarregue dessa notificação entendeu - em desrespeito com o disposto no n.º 5 do artigo 38.º do CPPT – promover a notificação pessoal do Recorrente, sem que para tal estivesse devidamente mandatada.
O Tribunal a quo entende, contudo, que, in casu, a falta do mandado para a funcionária Maria ......................... para proceder a notificação pessoal do Recorrente não tem qualquer relevância porque o Recorrente demonstrou conhecer o despacho de que recorreu, o que não é verdade.
Ora, sendo certo que o Recorrente nunca recebeu o despacho/ofício do Director de Finanças, obviamente, cai por terra o argumento invocado pelo Tribunal a quo, já que não se comprovou que essa notificação foi, efectivamente, efectuada. Comprovou-se, pelo contrário que o Recorrente nunca recebeu o referido despacho nem a sua fundamentação.
Não estamos, assim, perante uma mera falta de forma da notificação, sem qualquer consequência para o Recorrente, mas sim perante um desconhecimento efectivo do Recorrente do teor do ofício do Director de Finanças e da sua fundamentação.
Assim sendo, o uso indevido da notificação efectuada ao Recorrente através da notificação por hora certa, teve, in casu, por consequência a sua nulidade, por preterição de formalidades essenciais, já que o Recorrente não teve conhecimento, até à presente data, do teor do ofício do Director de Finanças.
Pelo exposto, o Tribunal a quo, ao decidir como decidiu violou os disposto nos artigo 263.º, n.º 3 da C RP e artigos 38.º a 42.º do CPT.
Deve, assim, a douta sentença ser revogada e substituída por douto acórdão que julgue nula a notificação efectuada ao Recorrente, por preterição de formalidades essenciais.

Ainda que se entenda, o que nem por mera hipótese e dever de patrocínio se concede, que a notificação não é nula por falta de forma, sempre se dirá que:

VI- Conforme foi já supra referido, a funcionária tributária Maria ...................... entendeu notificar o Recorrente utilizando a forma de notificação pessoal. À notificação pessoal do contribuinte, por força do disposto nos artigos 2.º e 38.º, n.º 5 e 6 do CPPT, são aplicáveis as regras referidas nos artigos 239.º e 240.º do CPC.
Assim sendo, no cumprimento da lei, um funcionário das Finanças ao promover a notificação pessoal de um contribuinte deverá respeitar o disposto nos artigos 235.º, 239.º e 240.º, todos do CPC e artigo 36.º, n.º 2 do CPPT.
Contudo, de acordo com os elementos constantes dos autos podemos, desde já, afirmar que a Administração Tributária quando, alegadamente, procedeu à notificação do Recorrente desrespeitou o disposto no artigo 235.º do CPC, já que nem Certidão de Verificação de Hora Certa, nem na carta que o Recorrente recebeu no dia 10 de Dezembro de 2008, consta o n.º de processo e prazo dentro do qual se poderá oferecer a defesa ou recorrer da referida decisão.
Pelo exposto, concluímos que não foram cumpridas pela Administração Tributária todas as formalidades a que estava obrigada para efectuar a notificação da decisão da inspecção tributária ao Recorrente, sendo certo que a omissão das mesmas veio a prejudicar a sua defesa.
A Administração Tributária com a sua actuação violou, assim, o disposto no artigo 268.º, n.º 3 da CRP, nos artigos 36.º, n.º 2, 38.º, n.º 1 e n.º 5 e 40.º do CPPT e os artigos 240.º e 241.º do CPC.
Assim sendo, não nos restam dúvidas que a notificação efectuada ao Recorrente no dia 5 de Dezembro de 2008, não foi perfeita nem eficaz perante este, sendo esta nula, ao abrigo do disposto no artigo 198.º, n.º 1 do CPC e artigo 133.º, n.º 2 alínea d) do CPA, por remissão do artigo 2.º, alínea d) do CPPT e artigo 198.º n.º 1 do CPC, por remissão do artigo 2.º, alínea e) do CPPT, nulidade esta que aqui, expressamente, se invoca.
Deve, assim, ser proferido douto acórdão que julgue nula a notificação efectuada ao recorrente por preterição de formalidades essenciais.

VII- O Tribunal a quo parece não colocar em causa que Recorrente adquiriu o im´vel em causa com o recurso a um crédito para habitação no valor de € 450.000,00, o qual não está sujeito a declaração para efeitos de IRS do ano de 2004 e que foi aplicado nessa mesma compra.
Acontece que o Tribunal a quo sem ter atenção á quantia mutuada ao Recorrente, bem como contrariamente ao disposto no artigo 89.º-A, n.º 3, in fine da LGT entendeu aplicar o disposto no artigo 89.º-A da LGT à totalidade do valor do preço da fração adquirida pelo Recorrente, isto é, ao valor de € 483.000,00, quando, na nossa modesta opinião, a fazê-lo- só o poderia ter feito sobre o diferencial entre os € 483.000,00 e os € 450.000,00 que se sabe, à partida, que o Recorrente obteve através do mútu que efectuou. Só quanto a este diferencial é que poderia, alegadamente, operar a presunção a que se reporta o artigo 89.º-A da LGT, isto é, quanto à quantia de € 33.000,00. Ou seja, quanto à parte que – na posição da Administração Tributária – o Recorrente não esclareceu a proveniência. Sendo incontestável que o Recorrente obteve € 450.000,00 junto de uma instituição bancária para a aquisição da fracção em apreço, tem, necessariamente, de deduzir-se essa quantia ao rendimento tributável, calculado nos termos da alínea d) do artigo 87.º e do artigo 89.º-A da LGT. O que implica que o rendimento colectável nunca poderia exceder a quantia de € 6.600 (seis mil e seiscentos euros), calculada pela aplicação de 20% sobre a quantia, alegadamente, não justificada.
Ao partir da totalidade do preço, ignorando o mútuo, para achar a importância de € 96.600,00, o Tribunal a quo, tal como já havia feito a Administração Tributária, violou o disposto no artigo 89.º-A da LGT, o qual nunca poderá ser interpretado no sentido de não permitir a dedução à matéria colectável das quantias que, comprovadamente, o Recorrente demonstrou a sua origem, sob pena de tal interpretação ser inconstitucional por violação do disposto nos artigos 13.º, 103.º e 104.º da CRP, nomeadamente, neste último caso, do disposto no seu n.º 1.
Assim sendo, o Tribunal a quo, ao decidir não deduzir ao rendimento tributável calculado nos termos do disposto no artigo 89.º-A da LGT as quantias que sabe que o Recorrente obteve através de crédito bancário, fez uma interpretação inconstitucional do referido artigo, violando o disposto nos artigos 13.º, 103.º e 104.º da CRP, nomeadamente, neste último caso, do disposto no seu n.º 1.
Deve, assim, a douta sentença ser revogada por padecer de uma inconstitucionalidade ao nível interpretativo do artigo 89.º-A da LGT e substituída por douto Acórdão que, interpretando correctamente o referido artigo, deduza ao rendimento tributável, calculado nos termos da alínea d) do artigo 87.º e do artigo 89.º-A da LGT, a quantia de e 450.000,00 (quatrocentos e cinquenta mil euros), que o Recorrente obteve por crédito bancário, o que implica que o seu rendimento colectável nunca poderá exceder a quantia de € 6.600 (seis mil e seiscentos euros), calculada pela aplicação de 20% sobre a quantia, alegadamente, não justificada.


- Conclui que peticonando que;
a) seja negado provimento ao recurso apresentado pela AT;
b) caso seja necessário, seja admitidas a ampliação do corrido se pronuncie sobre as questões que omitiu âmbito do recurso e, nessa medida, julgado totalmente procedente o recurso que deduziu do despacho do DDFinanças.

- O STA, para onde o recurso foi, inicialmente, interposto, declarou-se hierarquicamente incompetente para dele conhecer, mais declarando caber tal competência a este tribunal.

- O EMMP, junto deste Tribunal, emitiu o douto parecer de fls. 603 pronunciando-se, a final, no sentido da improcedência do recurso.
*****

- Com dispensa de vistos, atenta a natureza do processo, vêm, os autos, à conferência para decisão.

- A decisão recorrida deu por provada a seguinte;
- MATÉRIA DE FACTO -

A). Em 21/06/2004, o Recorrente adquiriu uma fracção autónoma designada pela letra “C”, correspondente ao 1º piso e rés-do-chão esquerdo no ............, habitação duplex, do prédio urbano sito na ......................, lote 48, descrito na 6.ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o n.º.........., pelo valor de € 483 000,00 – cf. documento de fls. 29 Processo Administrativo;

B). Na mesma data celebrou o Recorrente contrato de mútuo com hipoteca a favor do..................... no valor de € 450 000,00 a amortizar em 480 meses – cf. documento de fls. 35 Processo Administrativo;

C). Em cumprimento da ordem de serviço n.º..................... foi efectuada uma acção inspectiva interna de âmbito parcial com vista à averiguação da consistência entre os rendimentos declarados pelo Recorrente, em sede de IRS, em 2004 no valor anual de € 16 004,17 e a manifestação da sua capacidade aquisitiva atento o valor de aquisição da fracção autónoma identificada em A) – cf. documento de fls. 2 do PA;

D). Através do ofício n.º 075165, de 6/10/2008, foram solicitados ao Recorrente através da sua mandatária, esclarecimentos adicionais à audiência prévia, procedendo à junção dos extractos bancários da conta do empréstimo e depósito à ordem da conta indicada no contrato de mútuo com hipoteca indicado na alínea B), relativamente aos anos de 2004 e 2005 – cf. documento de fls. 131 do PA;

E). Em resposta o Recorrente informou que não faz arquivo de tais documentos, pelo que não poderia juntar tais documentos – cf. documento de fls. 133 do PA;

F). Em 13/11/2008, pelo Director de Finanças foi proferido despacho de concordância com o seguinte parecer; “Face à situação de facto verificada e em pormenor exposta no relatório, nada tenho a opor quanto aos seus fundamentos que impliquem o recurso à avaliação indirecta relativamente aos rendimentos de IRS para o ano de 2004. Efectivamente, naquele ano, adquiriu um imóvel pelo valor de € 483 000,00, e declarou um rendimento global que ascende a € 16 004,17. Assim para o ano acima referido, foi apurada uma desproporção superior a 50% para menos, em relação ao rendimento padrão apurado do sujeito passivo, pelo que se encontram reunidos os condicionalismos legais, previstos no art. 87.º al. d) e art. 89.º-A nº 1 e 4, ambos da Lei Geral Tributária (LGT), conjugados com o art. 39.º do Código do IRS (CIRS), para a fixação do Rendimento Tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G – art. 9.º n.º 1 al. d) do CIRS. O Sujeito Passivo exerceu o direito de audição, em consequência da notificação que lhe foi feita, (…) apresentando os seguintes fundamentos, para fazer face à referida aquisição: Empréstimo hipotecário que obteve no mercado financeiro nacional, no montante de € 450 000,00; Rendimentos que obtém da República Popular da China, através de duas sociedades familiares, rendimentos esses que são trazidos em moeda (Euros ou dólares), mensalmente, por forma a fazer face às prestações mensais, respeitantes ao empréstimo hipotecário. Estando perante uma situação, eventualmente, de entrada de capitais, em território nacional, de forma ilegal e não tendo sido provado cabalmente tal situação, conjugado com a insuficiência de rendimentos obtidos e declarados, para solver as obrigações mensais, inerentes ao empréstimo hipotecário, tais factos, não prejudicam a proposta de fixação do rendimento nos termos do referido art. 89ª-A da LGT – ver Grupos IX do relatório. Nestes termos, confirmo o valor proposto, no montante de € 96 600,00, apurado nos termos do n.º 4 do art. 89.º-A da LGT para efeitos do disposto no art. 89.º-A, n.º 6 da LGT (na redacção que lhe foi dada pela Lei 53-A/2006, de 29.12) (…)” – cf. documento de fls. 2 do PAT;

G). Em 4/12/2008, pela Directora de Finanças adjunta, foi emitido mandado com vista à notificação do Recorrente residente na Urb ................. – Lote 48 – ......... – RC – 1900-137 – Lisboa, do teor do ofício n.º 88031, de 14/11/2008, relativo às conclusões da acção de inspecção tributária indicada na alínea D)., “nos termos do artigo 40” do CPPT – cf. fls. não numeradas do PA;

H). Com data de 4/12/2008, Maria .............. e Carla .................., funcionárias da Direcção de Finanças de Lisboa, certificaram que se deslocaram à morada do Recorrente sita na Urb ................... – Lote 48 ................ – RC – 1900-137 – Lisboa, a fim de notificar o recorrente do teor do ofício n.º 88031, de 14/11/2008, relativo às conclusões da acção de inspecção tributária, não a puderam levar a efeito em virtude de não o ter encontrado no lugar indicado, tendo deixado a indicação de Hora Certa, nos termos do disposto no artigo 240.º do CPC, ficando avisado para o dia 5/12/2008, pelas 15.30 horas de que seria contactado para levar a efeito a referida notificação – cf. fls. não numeradas do PA;

I). Com data de 5/12/2008, Maria ................ e Carla ................, funcionárias da Direcção de Finanças de Lisboa, certificaram que se deslocaram à hora indicada na certidão referida na alínea anterior, à morada do Recorrente sita na Urb ................ – Lote 48 – ............... - RC – 1900-137 – Lisboa, a fim de notificar o recorrente do teor do ofício n.º 88031, de 14/11/2008, relativo às conclusões da acção de inspecção tributária, não se encontrando o notificando, nem qualquer pessoa, efectuou a notificação por afixação á porta da sua residência – cf. fls. não numeradas do PA;

J). Através do ofício n.º 094781, de 5/12/2008, enviado por carta registada, recebida em 11/12/2008, foi o Recorrente notificado do conteúdo do ofício n.º 88031, de 14/11/2008 por afixação edital, e informado de que o respectivo ofício e fundamentação ficariam à sua disposição na Secretaria Geral dos Serviços de Inspecção Tributária – cf. fls. não numeradas do PA.

K). Em 4/12/2008 a funcionária Maria ................... .... deslocou-se à mora identificada em H), acompanhada de Carla ........................, ambas Inspectoras Tributárias, a primeira munida de certidão do mandado indicado em G, tido sido atendidas por um homem que não falava português, facto confirmado por um adolescente que entretanto surgira no local e que se encontrava de saída, que se recusou a receber qualquer documentação, pelo que procedeu á afixação na porta da referida habitação da certidão aludida em H) coma aposição de fita cola – cf. depoimento das próprias;

L). No dia seguinte, em 5/12/2008, voltaram ao local, verificando que ninguém atendeu, afixaram na porta da morada identificada em H), a certidão referida em I) com a aposição de fita cola – cf. depoimento das próprias;

M). Em 21/6/2004 o Recorrente apresentava na conta de depósito com o n.º ................... de que é titular junto do Banco .................., um saldo inicial da conta à ordem de € 38 517,06, verificando-se em 22/6/2004 os seguintes movimentos: foi efectuado depósito de € 2 470,00, foi transferida para a respectiva conta a quantia de € 28 500,00, foi ainda depositada a quantia de € 450 000,00, referente a concessão de crédito imobiliário, e que o saldo final nesse dia reportado à data valor de 21/6 era de € 79 740,50 – cf. documento de fls. 409 e 412;

N). Em 21/6/2004 o Recorrente apresentava na conta de depósito com o NIB .................................. de que é titular junto do Banco BB.........., um saldo de € 5 081,94 – cf. documento de fls. 410.

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- Mais se deram, como não provados, quaisquer outros factos, diversos dos mencionados nas precedentes alíneas, enquanto relevantes à decisão de mérito a proferir.

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- Em sede de fundamentação do julgamento da matéria de facto consignou-se, expressamente, na decisão recorrida, que “o depoimento das testemunhas Maria ............................ e Carla ....................... foi considerado isento e prestado com convicção, revelando conhecimento directo dos factos sobre que incidiu, factos que determinaram a convicção do tribunal.”.
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- Nas conclusões III e IV o recorrente acusa, desde logo, a decisão recorrida, de erro de julgamento da matéria de facto na medida em que entende os factos alegados nos art.ºs 19.º, 40.º, 41.º, 43.º, 44.º, 47.º e 50.º a 52.º inclusive, são relevantes à decisão de mérito a proferir, encontram-se documentados e, contudo, não foram levados ao probatório.

- De tais artigos exclui-se, por ora, a apreciação do imputado erro de julgamento quanto à matéria alegada no art.º 19.º na medida em que a mesma se prende com a invocada nulidade da notificação do recorrente questão que apenas caberá enfrentar caso o recurso da FP seja procedente, em decorrência da sua requerida ampliação.

- No art.º 40.º do articulado inicial o recorrente invoca que a compra do imóvel em causa nos autos foi precedida de um contrato promessa, por si celebrado, através de um seu representante e da procuradora da vendedora.

- Ora, na primeira alínea do probatório dá-se conta do contrato definitivo, a que se reporta o referido contrato promessa, e dos termos em que foi efectivado, em consonância com o alegado no referido art.º 40.º da p.i., pelo que, naquilo que coincidente com o estipulado no contrato definitivo, nenhuma utilidade teria, tendo em vista a decisão final a proferir, a pretendida inclusão da matéria de tal articulado no probatório; Contudo, tal contrato estipula(ou), para além do que veio a ser consignado no contrato definitivo, o pagamento, até à data da sua feitura, de uma determinada importância, por conta do preço, a título de sinal de princípio de pagamento, matéria esta que já se apresenta como pertinente face ao alegado pelo recorrente e à questão que se visa dirimir.

- Por outro lado tem-se por impertinente ao dirimir da controvérsia estabelecida nos autos, a matéria constante dos art.ºs 43.º e 44.º, do articulado inicial, a qual, excluídos os juízos conclusivos, se prende com o contrato de financiamento, junto do Banco ......................., por parte do recorrente, para adquirir aquele aludido imóvel; É que, a alínea B) do probatório atesta, precisamente, esse contrato de financiamento, nos precisos termos em que foi elaborado, apropriando-se, para o efeito, dos documentos que o integram pela expressa convocação de fls. 35 do PA.

- Já a matéria relativa à participação social do recorrente no capital de duas sociedades chinesas, a emissão de cheque por conta do preço final da aquisição do imóvel ou o saldo da sua conta bancária, em 2003DEZ31, no Banco ......................., se apresentam como pertinentes àquela aludida decisão, à luz de todas as possíveis soluções de direito convocáveis, razão porque, na medida em que demonstrada tal factualidade, se procede ao seu aditamento ao probatório.

- Assim, e por se encontrar documentalmente demonstrada, adita-se ao probatório, a seguinte factualidade;

O). O recorrente, pelo menos entre 2003 e 2006, foi sócio de duas empresas chinesas, detendo 50% do respectivo capital – cfr., designadamente, os docs. de fls.71 a 87, do PA;

P). Em 2003 e 2004 foram distribuídos, ao recorrente a título de dividendos, por parte das empresas referenciadas na precedente alínea e por cada uma delas as quantias, em moeda chinesa, respectivamente, de 160000.00, 350000,00 e de 750000,00 e de 150000,00 – cfr. os documentos a que se faz alusão na alínea que antecede;

Q). A Aquisição referida na alínea A) foi precedida de um contrato promessa de compra e venda, datado de 2004ABR13, em que, além do mais, se convencionou, por conta do preço final de € 483.000,00, o pagamento, por referência a tal data, da quantia de €60.000,00, a título de sinal e princípio de pagamento – cfr. fls. 122 a 128, inclusive, do PA, particularmente a cláusula 3.ª, a fls. 124;

R). Em 2004ABR12, o recorrente emitiu, a favor de Álvaro ................., o cheque ................, sobre a sucursal do .............., da Av. . .............o, no valor de € 35.000,00 e pago a 20 desse mesmo mês e ano – cfr., designadamente, fls. 154 dos autos;

S). Em 2004ABR06, o recorrente emitiu o cheque n.º .............sobre a mesma agência bancária identificada na alínea que antecede, à ordem e no valor de € 25.000,00 – cfr. doc. de fls. 155, destes autos;

T). Em 2004JAN30, o recorrente emitiu o cheque n.º .............., sobre a agência do banco BB......., na Amadora, no valor de € 25.000,00 e favor de “M............ – Soc, de ....................., Ld.ª”, no acto de assinatura da proposta de compra do imóvel em causa nos autos – cfr. docs. de fls. 156 e 157, destes autos;

U). À data de 2003DEZ31,a conta de que, o recorrente, era titular no banco .........., e a que se reportam os cheques identificados nas precedentes alíneas R) e S), apresentava um saldo à ordem de € 200.577,71 (duzentos mil, quinhentos e setenta e sete euros e setenta e um cêntimos) – cfr. doc. de fls. 159, destes autos.
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- ENQUADRAMENTO JURÍDICO -


- A questão que aqui se controverte consiste em saber se, estando, a AT, legitimada a recorrer à metodologia de avaliação indirecta na determinação do rendimento colectável do recorrente, em sede de IRS e com referência ao ano de 2004, ao abrigo do disposto no artigo 89.º-A, da LGT, em virtude de ter declarado, com referência a tal ano, rendimentos sujeitos a tributação no valor de € 16 004,17 e de, nesse mesmo ano, ter adquirido um imóvel, no valor de e 483.000,00, tendo, pata o efeito, obtido um financiamento junto do Millennium BCP na importância de € 453 000,00, o recorrente logrou fazer prova de que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que a fonte dos rendimentos necessários para assegurar as manifestações de fortuna evidenciadas é outra, nos termos do que preceituava o art. 89.º-A, da LGT, designadamente o seu n.º 3, na redacção dada a tal normativo pela Lei n.º 30-G/2000DEZ29, aqui aplicável, ou, ao menos e em caso de resposta negativa a tal questão, se ocorre excesso da quantificação operada pela AT, no caso concreto.

- A Mm.ª juiz recorrida veio a considerar e a decidir que, em sede do presente recurso da decisão do DDFinanças, o recorrente veio a demonstrar de que era possuidor de um saldo bancário, à data da realização da escritura de compra e venda (2004JUN26), no banco ................, superior à diferença entre o financiamento obtido junto de tal entidade bancária para a aquisição do imóvel aqui em causa, no valor de € 453.000,00 e o valor de tal aquisição de € 480.000,00, isto é, de € 33.000,00 e, nessa medida, elidiu a presunção de evasão fiscal com referência aos rendimentos declarados no ano em questão por ter demonstrado que a manifestação de fortuna evidenciada era outra e não sujeita a declaração em sede de IRS, determinando a anulação do decisão recorrida.

- A recorrente insurge-se contra esta decisão por considerar, ao que aqui releva, que não bastava ao recorrente demonstrar os meios de fortuna suficientes, mas porque carecia, ainda, de demonstrar qual era a origem desses mesmos saldos/rendimentos (cfr., por todas, a conclusão F), das conclusões do recurso da FP).

- Crê-se, contudo, que não assiste razão à recorrente.

- Na realidade como o refere o recorrente, na conclusão II, das suas contra- -alegações, o que está em causa é apenas averiguar se é caso de evasão fiscal, no que concerne à sua declaração de rendimentos de 2004, ou, como se refere no Ac. deste Tribunal, citado pelo recorrido, «(…) o Contribuinte ilidiu a presunção de evasão fiscal relativamente aos rendimentos declarados naquele ano, que era o que estava em causa, pois demonstrou que o imóvel foi adquirido com meios que não estavam sujeitos a declaração para efeitos de IRS. Na verdade, os depósitos a prazo, rectius, os juros gerados pelos capitais depositados não estão sujeitos a declaração obrigatória (sem prejuízo de o contribuinte poder optar pelo englobamento dos rendimentos de capitais)».

- Ora, no caso vertente, os autos demonstram, de forma pacífica e não contestada, que à data de 2003DEZ31, o recorrente tinha disponível, em conta de DO, no Banco ................, quantia superior a € 200.000,00, e, ainda, que, em 2004JAN30, emitiu um cheque de “reserva de compra” do imóvel em questão, no valor de € 25.000,00, sobre o BB........, que veio a ser integrado no valor do sinal e princípio de pagamento, o qual refira-se, nos termos do contrato celebrado com a promitente compradora e que se não dá conta de incumprido, teve de ser liquidado, pelo valor de € 60.000,00, sendo certo que, no dia anterior, o recorrente emitiu, ainda, um outro cheque que alega ter sido para esse mesmo efeito – o que se não vislumbra sindicado pela AT -, no valor de € 35.000,00 e que, adicionados àqueles € 25.000,00, perfaz, precisamente, a importância de € 60.000,00.

- Acresce que esta importância adicionada do valor do financiamento, obtido e não contestado, com vista á aquisição do imóvel em causa, excede, já e em cerca de € 27.000,00 o valor de compra sendo certo, que tendo o cheque de € 35.000,00, referido em R) , e o cheque no valor de € 25.000,00, mencionado em T), ambas da probatório, sido pagos à data da realização da escritura, a esta mesma data, ou seja 2004JUN21, as contas bancárias de que, o recorrente era, à data titular, no ......... e no BB.........., apresentavam, ainda assim, um saldo global de € 84.822,34 (cfr. als. M) e N) do probatório).

- Por outro lado e ao contrário do que sustenta a recorrente, não se afigura poder inferir-se da lei que a mesma imponha ao contribuinte o ónus de demonstrar, no que aqui nos importa, como obteve, isto é, qual a origem dos montantes depositados nas suas contas nas referidas entidades bancárias, ou, citando uma vez mais, aquele referido aresto, com a única e irrelevante diferença, relativamente ao caso que aqui nos ocupa, que «(…) não carecia o Contribuinte, para efeitos de ilidir a referida presunção, de demonstrar a forma como adquiriu esses capitais, pois o que está em causa é apenas averiguar se estes foram ou não omitidos na declaração de rendimentos respeitante ao ano de 2002 e não a outros. Só assim não seria se tivesse ficado demonstrado que os capitais mobilizados no ano de 2002 foram gerados no próprio ano. Nessa hipótese, sim, careceria o Contribuinte de demonstrar qual a origem desses capitais, por forma a poder sindicar-se se os mesmos haviam ou não sido omitidos à declaração de rendimentos desse ano.
Poderia o legislador ter estabelecido que compete aos contribuintes a prova da forma como adquiriram os meios que lhes permitem determinadas manifestações de fortuna, sob pena de avaliação indirecta do rendimento tributável. Nessa eventualidade, teriam razão a Entidade recorrida e a Juíza do Tribunal de 1.ª instância. Mas, a nosso ver, a lei não foi tão longe, ficando-se pela inversão do ónus da prova da veracidade dos rendimentos declarados no ano em causa, bastando ao contribuinte demonstrar que os meios que lhe permitiram as manifestações de fortuna em causa não estavam sujeitos a declaração nesse ano.
Não podemos nunca esquecer que está em causa apenas a determinação da matéria tributável para efeitos de IRS do ano de 2002 e que só relativamente a este ano funciona a inversão do ónus da prova, que faz recair sobre o contribuinte a prova da veracidade dos rendimentos declarados.»(1).

- E, a ser assim, como se crê dever ser, tanto basta para concluir pela falência do presente recurso, na medida em que improcede a invocada causa de erro de julgamento alegada pela recorrente.

- Sem embargo crê-se que, ainda que assim não fosse, sempre se teria de concluir no mesmo sentido final apurado pela decisão recorrida, por erro na quantificação da matéria tributável com que, o recorrente, não deixa de esgrimir.

- De facto, na linha da mais recente jurisprudência, tirado no recente acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA, de 2010MAI19, tirado no Proc. n.º 0734/09 (2), cuja doutrina se acompanha em absoluto e sem quaisquer reservas, no entendimento, que sempre sufragámos, da iniquidade a que conduzia a doutrina afastada pelo aresto em causa, «(…) no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de IRS, (…) a justificação parcial há-de relevar para a fixação presuntiva do montante do “acréscimo patrimonial não justificado” sujeito a imposto, atenta a natureza das normas em causa – concernentes à incidência objectiva do imposto -, a proibição constitucional de presunções legais absolutas de rendimentos derivada do princípio da capacidade contributiva, o disposto no artigo 73.º da Lei Geral Tributária - que determina que «as presunções consagradas nas normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário»-, e bem assim a busca de um cânone interpretativo conforme aos princípios da igualdade, da capacidade contributiva, da tributação dos rendimentos reais, e do Estado de Direito Democrático, que a solução adoptada no acórdão recorrido não permite alcançar.
(…) Assim, embora a justificação parcial não afaste a aplicação do método de avaliação indirecta previsto no artigo 89.º-A da LGT, não pode deixar de ser considerada na quantificação do rendimento tributável que vai ser determinado por esse método, entendendo-se que a quantificação do rendimento tributável da recorrente deve ser igual a 20% do valor de aquisição, deduzindo-se a este valor de aquisição o montante do empréstimo bancário que a recorrente demonstrou ter efectuado para a aquisição do imóvel, já que este montante não está, nem pode estar, sujeito a IRS, não podendo, consequentemente, ser presumido ou considerado como rendimento sujeito a tributação.
(…) Não tendo a administração tributária efectuado a dedução relativa ao empréstimo bancário na avaliação do rendimento tributável da recorrente a que procedeu, há manifesto excesso na quantificação, o que fere de ilegalidade o acto fixou à ora recorrente o rendimento tributável (…)».

- Tal é, exactamente a situação acontecida no caso vertente, em que a AT fixou o rendimento tributável do recorrente, em sede IRS e para o ano de 2004, em € 96.600,00, isto é, no correspondente a 20% do valor de aquisição de € 483.000,00, não operando qualquer dedução, com referência ao financiamento obtido e não contestado, no valor de € 453.000,00, e aplicado na aquisição do imóvel em causa nos autos.

- Chegados a esta conclusão fica, necessariamente, prejudicada a apreciação das questões suscitadas pela ampliação do recurso, deduzida pelo recorrente.

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- D E C I S Ã O -


- Nestes termos acordam, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do TCASul, em negar provimento ao recurso, assim se confirmando a decisão recorrida que, nessa medida, se mantém na ordem jurídica.
- Custas pela recorrente.
Lisboa, 2010 JUL 14
Lucas Martins
Magda Geraldes
José Correia
(1) Neste mesmo sentido se pronunciaram, ainda, os mais recentes acórdãos deste Tribunal, 2008MAR14, 2008MAI06, 2008SET23, 2009JAN13 e 2009JUN09, tirados, respectivamente, nos Procs. n.ºs 02259/08, 02284/08, 02605/08, 02821/08 e 03204/09, todos eles disponíveis em www.dgsi.pt..
(2) Igualmente disponível em www.dgsi.pt..