Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12666/15
Secção:CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:12/16/2015
Relator:ANTÓNIO VASCONCELOS
Descritores:(NÃO) VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA
NULIDADE DA SENTENÇA – OMISSÃO DE PRONÚNCIA
EFEITO SUSPENSIVO DA ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DOS ACTOS PREVISTOS NO ARTIGO 106º DO RJUE
Sumário:
I - Não está em causa o princípio da tutela jurisdicional efectiva consagrado no artigo 2º do CPTA e artigos 20º e 268º nº 4 da CRP quando o Tribunal a quo entendeu que os factos alegados pelo ora Recorrente ou se provavam por simples prova documental ou se traduziam em simples considerações e juízos conclusivos.

II – A nulidade da sentença por omissão de pronúncia prevista na al. d) do nº 1 do artigo 615º do CPC verifica-se quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar, sendo certo que o mesmo deve apreciar todas as questões que lhe forem submetidas e desde que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras, de acordo com o disposto no artigo 608º nº 2 do CPC, entendendo-se por questões todas as matérias respeitantes ao pedido, à causa de pedir ou aos pressupostos processuais e não os argumentos ou razões invocadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista.

III - O artigo 106º do RJUE consagra a possibilidade de o presidente da câmara ordenar a demolição total ou parcial da obra ou a reposição do terreno nas condições em que se encontrava antes da data do inicio das obras ou trabalhos, fixando um prazo para o efeito.
Havendo impugnação dos actos previstos no artigo 106º do RJUE, o efeito suspensivo da acção administrativa especial aqui consagrado parece ser mais benéfico do que o recurso ao regime geral previsto no CPTA. A atribuição do efeito suspensivo à acção de impugnação concretizada pelo artigo 115º do RJUE é uma excepção ao regime geral da acção administrativa especial consagrada no CPTA, a qual não apresenta efeito suspensivo, obrigando à utilização da providência cautelar de suspensão da eficácia de acto administrativo, consagrada no artigo 112º nº 2 al a) do CPTA.

IV - Com a propositura de acção nos termos do artigo 115º do RJUE suspender-se-ão de imediato os efeitos do acto de demolição, sendo destarte desnecessário o esforço de iniciar um procedimento cautelar, de nele fazer prova sumária dos factos alegados com a consequente sujeição aos critérios de decisão previstos no artigo 120º do CPTA.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em Conferência , na Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo , do Tribunal Central Administrativo Sul:


João …………………………….., com sinais nos autos, inconformado com a sentença do TAF de Leiria, de 24 de Agosto de 2015, que indeferiu o pedido de suspensão da eficácia dos despachos de 28 de Abril de 2015 pelos quais o Presidente da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere ordenou a demolição de muros de vedação e contenção de terras edificadas na localidade de Covas, Bairrada, freguesia do Zêzere, bem como da pavimentação, em calçada, do logradouro de habitação na mesma localidade, dela recorreu e em sede de alegações formulou as seguintes conclusões:

“1.ª A douta decisão recorrida enferma de erro decisório ao considerar estarem reunidos todos os elementos para a decisão, tendo violado, além do mais, o disposto no art. 118.º/3 do CPTA, bem como os princípios da tutela jurisdicional efectiva, da promoção de acesso à justiça, da verdade material e da prova plasmados nos arts. 2.º /1 e 7.º do CPTA e arts. 2.º, 20.º e 268.º/4 da CRP, pelo que deve tal decisão ser anulada, ordenando-se a produção de prova, além do mais, sobre os arts. 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º, 13.º e 27.º do r.i., pois as questões de facto invocadas nos arts. 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º e 13.º, relativamente, além do mais, à questão jurídica suscitada no art. 27.º , encontram-se ainda controvertidos – saber se a aprovação pelos serviços da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere da Memória Descritiva e plantas em anexo abrange os muros de vedação e a pavimentação do logradouro objecto dos despachos que ordenaram a demolição – as quais se revelam essenciais para a decisão da presente providência cautelar – Cf. texto n.ºs 1 a 3;

2.ª A douta sentença ora recorrida é nula, devendo ser apreciada e decidida a questão suscitada no art.º 27.º do r.i. sobre a ilegalidade dos despachos pela menção errónea de que o ora Recorrente não apresentou qualquer pronúncia de sede de audiência prévia, sendo certo que, no caso ora em apreço, o ora Recorrente peticionou que fosse decretada a suspensão de eficácia dos despachos do Senhor Presidente da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere, de 28 de Abril de 2015, comunicados pelos Ofícios n.ºs 3387 e 3389 da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere, por parte do Sr. Chefe de Divisão do Urbanismo, Obras Municipais e Ambiente, Eng.º João …………………., ao abrigo de delegação de competências, invocando que tais actos são ilegais, além do mais, pelas razões constantes do art.º 27.º do r.i., o qual invoca expressamente o seguinte:

“Nessa medida, os despachos ora em causa nem sequer têm em consideração o invocado pelo Requerente na sua pronúncia em sede de audiência prévia, de forma concreta e precisa, sendo certo que é mencionado – erradamente -, que o Requerente não apresentou qualquer pronúncia em sede de audição prévia perante aquela edilidade “ – Cf. texto n.ºs 4 a 5;

3.ª O acto sub judice violou claramente e frontalmente os arts. 267º/5 e 268º da CRP, bem como os arts. 12º, 114º, 121º e 126º do CPA, pois o ora Recorrente, apesar de ter sido ouvido antes das decisões finais sobre a intenção de se proceder à demolição, nas decisões finais dever-se-ia incluir a posição assumida pelo ora Recorrente relativamente à pretensão do ora Recorrido nos termos dos arts. 121º/1 do CPA, sintetizando as razões de facto e de direito que a justificassem, sendo certo que uma interpretação actual dos princípios expostos não permite interpretar o principio audi alteram partem como uma mera formalidade que se basta com o convite a pronunciar – como sucedeu in casu -, antes impondo que a administração considere especificadamente e tome posição sobre a pronúncia em sede de audição prévia apresentada ; - Cf. texto n.ºs 6 a 7;

4.ª A sentença recorrida enferma assim de evidentes erros de julgamento, tendo violado claramente os arts. 2.º e 120.º do CPTA, bem como os arts. 106.º e 115.º do RJUE, pois o ora Recorrente, apesar de ter manifestado no r.i. que iria intentar acção administrativa especial de impugnação dos actos que ordenaram as demolições, a providência cautelar requerida sempre seria um meio idóneo para assegurar o efeito útil da sentença a proferir em sede da acção principal a intentar, regulando provisoriamente a situação sob litigio até que seja definitivamente decidida, naquela acção, a contenda que opõe as partes, sendo certo que não se verifica qualquer impedimento legal para que seja requerida de imediato a tutela cautelar e não a acção administrativa especial de impugnação, nos termos dos artigos 106.º e 115.º do RJUE, pese embora o efeito suspensivo desta – Cf. texto n.ºs 8 a 9.”

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Os Recorridos contra – alegaram pugnando pela manutenção do decidido.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste TCAS emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmada a sentença recorrida.

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Sem vistos vem o processo submetido à conferência para julgamento.

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A matéria de facto pertinente é a constante da sentença recorrida, a qual se dá aqui por reproduzida, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 663º nº 6 do Código de Processo Civil.

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Tudo visto cumpre decidir.

Veio o presente recurso jurisdicional interposto da sentença do TAF de Leiria que decretou a suspensão da eficácia dos despachos de 28 de Abril de 2015 pelos quais o Presidente da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere ordenou a demolição de muros de vedação e contenção de terras edificadas na localidade de Covas, Bairrada, freguesia do Zêzere, bem como da pavimentação, em calçada, do logradouro de habitação na mesma localidade.


No essencial, o Tribunal a quo acompanhando jurisprudência do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN) que cita, entendeu que, estando-se no âmbito da previsão do artigo 106º do RJUE, a impugnação contenciosa teria de ser feita única e exclusivamente através de acção administrativa especial prevista no artigo 115º do RJUE, sendo desnecessária e inadmissível a cumulação com procedimento cautelar de suspensão da eficácia de acto. Segundo o entendimento perfilhado na sentença em crise, o artigo 115º do RJUE consagra um regime especial que afasta o regime inserto no CPTA e, em consequência, o requerimento de uma providência cautelar apresenta-se ilegal por violador dos artigos 106º e 115º do RJUE e 50º, 112º, 113º e 128º do CPTA.

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O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões, das respectivas alegações nos termos do artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA, e ainda dos artigos 5º, 608º nº 2 , 635º nº 4 e 5 e 639º nº 1, 2 e 3, todos do Código de Processo Civil aplicáveis ex vi artigos 1º e 140º do CPTA.

Vejamos então o que se nos oferece dizer.

1 – Na conclusão 1ª da sua alegação o Recorrente alega que a sentença em crise “enferma de erro decisório ao considerar estarem reunidos todos os elementos para a decisão, tendo violado, além do mais, o disposto no art. 118.º/3 do CPTA, bem como os princípios da tutela jurisdicional efectiva, da promoção de acesso à justiça, da verdade material e da prova plasmados nos arts. 2.º /1 e 7.º do CPTA e arts. 2.º, 20.º e 268.º/4 da CRP, pelo que deve tal decisão ser anulada, ordenando-se a produção de prova, além do mais, sobre os arts. 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º, 13.º e 27.º do r.i., pois as questões de facto invocadas nos arts. 6.º, 7.º, 8.º, 9.º, 10.º e 13.º, relativamente, além do mais, à questão jurídica suscitada no art. 27.º , encontram-se ainda controvertidos – saber se a aprovação pelos serviços da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere da Memória Descritiva e plantas em anexo abrange os muros de vedação e a pavimentação do logradouro objecto dos despachos que ordenaram a demolição – as quais se revelam essenciais para a decisão da presente providência cautelar “.
Desde logo quanto a este aspecto afigura-se não estar em questão a impossibilidade de utilização de qualquer meio de prova adequado a comprovar o pretendido.
Com efeito, não se pretende coartar qualquer direito à prova ou o acesso à justiça e, sequer, pôr em causa o princípio da tutela jurisdicional efectiva consagrado no artigo 2º do CPTA e artigos 20º e 268º nº 4 da CRP.
Ocorre que o Tribunal a quo entendeu que os factos alegados pelo ora Recorrente ou se provavam por simples prova documental ou se traduziam em simples considerações e juízos conclusivos. Verdadeiramente o que o Recorrente pretende ver provado é “saber se a aprovação pelos serviços da Câmara Municipal de Ferreira do Zêzere da memória descritiva e plantas em anexo abrange os muros de vedação e a pavimentação do logradouro objecto dos despachos que ordenaram a demolição”. Neste contexto, entendeu o Tribunal a quo que tal prova deveria ser feita por documentos, dispensando-se assim a prova testemunhal apresentada. Esclareça-se que a documentação emitida pela CCDR - LVT concluiu pela impossibilidade de realização das obras em questão por as mesmas se encontrarem inseridas na área da reserva ecológica nacional (REN).
Nestes termos, de acordo com os fundamentos expostos, improcede a conclusão 1ª da alegação do Recorrente.

2 – Na conclusão 2ª da sua alegação o Recorrente sustenta que a sentença é nula (por omissão de pronúncia) “devendo ser apreciada e decidida a questão suscitada no art.º 27.º do r.i. sobre a ilegalidade dos despachos pela menção errónea de que o ora Recorrente não apresentou qualquer pronúncia de sede de audiência prévia (…)”.
Vejamos.
A nulidade da sentença por omissão de pronúncia resulta “quando o juiz deixa de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar” (cfr. al. d) do nº 1 do artigo 615º do CPC).
Tal nulidade – omissão de pronúncia – verifica-se, pois, quando o juiz deixe de se pronunciar sobre questões que deva apreciar, sendo certo que o mesmo deve apreciar todas as questões que lhe forem submetidas e desde que não se encontrem prejudicadas pela solução dada a outras, de acordo com o disposto no artigo 608º nº 2 do CPC entendendo-se por questões todas as matérias respeitantes ao pedido, à causa de pedir ou aos pressupostos processuais e não os argumentos ou razões invocadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista.
Pese embora a sentença recorrida não se tenha efectivamente pronunciado sobre a pretensão do ora Recorrente já que concluiu pela necessária recusa do presente meio processual, por não se apresentar como um meio adequado à pretensão atendendo ao regime consagrado no artigo 115º do RJUE, forçosamente tal nulidade por omissão de pronúncia não existe na medida em que tal questão jurídica ficou prejudicada pela solução assumida na sentença de recusa do presente meio processual utilizado.
Nestes termos improcede a conclusão 2ª da alegação do Recorrente atinente à invocada nulidade por omissão de pronúncia.

3 – Na conclusão 3ª da sua alegação o Recorrente invoca que o acto suspendendo padece do vício de falta de fundamentação pois, apesar de ter existido audiência dos interessados, os argumentos apresentados na sua pronúncia não foram considerados na decisão final.

Não se vislumbra como se pode extrair a conclusão de um erro de julgamento da sentença recorrida por “ não terem sido considerados, de forma concreta, os argumentos expendidos pelo Recorrente na sua pronúncia em sede de audiência prévia” na medida em que tal questão é relativa às decisões finais sobre a intenção de se proceder à demolição e, tal como ficou expendido supra, tal questão não foi sequer objecto de pronúncia pelo Tribunal a quo, uma vez que o pedido formulado foi de suspensão da eficácia de tais actos e se entendeu que o Recorrente não fez uso do meio processual devido.

Nestes termos, improcede a conclusão 3ª da alegação do Recorrente.

4 - Na conclusão 4ª da sua alegação o Recorrente sustenta que a sentença em crise enferma de evidente erros de julgamento, tendo violado claramente os artigos 2º e 120º do CPTA, bem como os artigos 106º e 115º do RJUE, na medida em que, em seu entender, a providência cautelar requerida sempre seria o meio idóneo para assegurar o efeito útil da sentença a proferir em sede principal, regulando provisoriamente a situação sob litigio até que seja definitivamente decidida, naquela acção, a contenda que opõe as partes.
Como vimos, a sentença recorrida, estribada nos artigos 106º e 115º do RJUE, questionou a idoneidade do meio processual acessório utilizado pelo Recorrente – uma providência cautelar de suspensão da eficácia de acto administrativo – concluindo pela recusa da providência requerida.
E, em nosso entender, tal juízo não merece qualquer reparo.
O artigo 106º do RJUE consagra a possibilidade de o presidente da câmara ordenar a demolição total ou parcial da obra ou a reposição do terreno nas condições em que se encontrava antes da data do inicio das obras ou trabalhos, fixando um prazo para o efeito. Já o artigo 115º vem estabelecer que a acção administrativa especial dos actos previstos no referido artigo 106º tem efeito suspensivo.
Em anotação ao artigo 115º do RJUE FERNANDA PAULA OLIVEIRA, MARIA J. CASTANHEIRA NEVES, DULCE LOPES e FERNANDA MAÇÃS in “ REGIME JURIDICO DA URBANIZAÇÂO E EDIFICAÇÃO – COMENTADO “,Ed., Almedina, 2011, referem que, havendo impugnação dos actos previstos no artigo 106º do RJUE, o efeito suspensivo da acção de impugnação aqui consagrado parece ser mais benéfico do que o recurso ao regime geral previsto no CPTA. A atribuição do efeito suspensivo à acção de impugnação concretizada pelo artigo 115º do RJUE é uma excepção ao regime geral da acção administrativa especial consagrada no CPTA, a qual não apresenta efeito suspensivo, obrigando à utilização da providência cautelar de suspensão da eficácia de acto administrativo, consagrada no artigo 112º nº 2 al a) do CPTA. Ora, afirmam as Autoras supra citadas que com o regime estabelecido no artigo 115º do RJUE se evita o esforço de um procedimento cautelar, em que serão convocados os contra interessados a pronunciarem-se, e que se encontra sujeito à ponderação do juiz, nos termos do artigo 120º do CPTA, nomeadamente sobre a falta de fundamento da pretensão principal. Assim, o estabelecimento de um regime especial parece pretender afastar o regime geral da acção administrativa especial de impugnação de acto administrativo.
No mesmo sentido, acompanhando a doutrina citada e outra avalizada, o Acórdão do TCAN de 9 de Setembro de 2011 in Proc. nº 640/11.2 BEPRT refere o seguinte: “ VIII. Sustentou-se naquele acórdão [ do TCAN de 13.01.2011 in PRoc. nº 1885/10.8BEPRT], cujo entendimento aqui se reitera, que “… estando-se em concreto face a situação que se enquadra no âmbito da previsão do art. 106.º do RJUE temos que a sua impugnação contenciosa no nosso ordenamento jurídico terá de ser feita única e exclusivamente através da acção administrativa especial, sendo absolutamente desnecessária e legalmente não admissível a sua cumulação/articulação com procedimento cautelar de suspensão de eficácia.
É que resulta do art. 115.º do RJUE, enquanto regime especial que afasta o geral inserto no CPTA [cfr. seus arts. 50.º, n.º 2, 112.º, 113.º, 128.º e segs.], que a “… acção administrativa especial dos actos previstos no artigo 106.º tem efeito suspensivo …” (n.º 1), que com “… a citação da petição de recurso, a autoridade administrativa tem o dever de impedir, com urgência, o início ou a prossecução da execução do acto recorrido …” (n.º 2) e que a “… todo o tempo e até à decisão em 1.ª instância, o juiz pode conceder o efeito meramente devolutivo à acção, oficiosamente ou a requerimento do recorrido ou do Ministério Público, caso do mesmo resultem indícios da ilegalidade da sua interposição ou da sua improcedência …” (n.º 3).
Deste quadro legal ressalta, pois, o claro afastamento da possibilidade ou admissibilidade de dedução de procedimento cautelar de suspensão de eficácia como o “sub judice” tendente a obter a suspensão da execução do acto administrativo proferido no quadro no art. 106.º do RJUE, já que a sua impugnação contenciosa está reconduzida apenas à instauração da competente acção administrativa especial (cfr. João Pereira Reis, Margarida Loureiro e Rui R. Lima Maçãs in: “Regime Jurídico da Urbanização e Edificação”, 3.ª edição revista e actualizada, págs. 291 e 312; Isabel Celeste Fonseca em “Direito Contencioso Administrativo Autárquico” in: “Tratado de Direito Administrativo Especial”, vol. IV, pág. 319, nota 25; Fernanda Paula Oliveira, Maria J. Castanheira Neves, Dulce Lopes e Fernanda Maçãs in: “Regime Jurídico da Urbanização e Edificação - Comentado”, 2.ª edição, págs. 603 e 604).
É que por expressa determinação legal aquela acção goza ou possui efeito suspensivo automático na certeza de que com a citação para os seus termos sobre a autoridade administrativa demandada impende o dever de impedir, com urgência, o início ou continuação da execução do acto impugnado, tudo num quadro específico que afasta o regime geral de impugnação contenciosa de acto administrativo previsto no CPTA (seja a título principal seja a título cautelar).
Desta forma, a dedução do presente procedimento cautelar … com vista à obtenção da suspensão da execução do acto administrativo em crise apresenta-se como ilegal por violadora do que se dispõe conjugadamente nos arts. 106.º e 115.º do RJUE, 50.º, 112.º, 113.º e 128.º do CPTA, e, nessa medida, constitui uso indevido de procedimento contencioso não legalmente admissível conducente à sua rejeição [art. 116.º, n.º 2, al. d) do CPTA] …”.

IX. Valendo em pleno para o caso vertente o entendimento acabado de parcialmente reproduzir temos que ocorre, assim, situação de manifesta ilegalidade da pretensão cautelar formulada [por uso indevido daquele meio processual] pelo que a mesma necessariamente teria de ser rejeitada e nesta fase negada em sede de decisão final, irrelevando assim e nessa medida, por inútil, a análise dos demais fundamentos/questões também objecto de recurso jurisdicional.

Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrentes e do presente recurso jurisdicional, se impõe ainda que com diversa fundamentação manter a decisão de improcedência da pretensão cautelar “sub judice”, com todas as legais consequências.”

Cabe referir em última análise que é desajustada a afirmação do Recorrente de que o efeito útil da acção principal apenas será assegurado se a providência requerida tiver sido concedida, assim se evitando a concretização das demolições em causa, porquanto com a propositura de acção nos termos do artigo 115º do RJUE suspender-se-ão de imediato os efeitos do acto de demolição, sendo destarte desnecessário o esforço de iniciar um procedimento cautelar, de nele fazer prova sumária dos factos alegados com a consequente sujeição aos critérios de decisão previstos no artigo 120º do CPTA.

Em conformidade, improcede a conclusão 4ª da alegação do Recorrente.

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Pelo exposto, improcedendo todas as conclusões da alegação do Recorrente, é de negar provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmar na íntegra a sentença recorrida.

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Acordam, pelo exposto, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo, deste TCAS, em negar provimento ao recurso jurisdicional e confirmar na íntegra a sentença recorrida.

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Custas pelo Recorrente.


Lisboa, 16 de Dezembro de 2015


António Vasconcelos
Catarina Jarmela
Conceição Silvestre