Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:18/23.5BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:07/26/2023
Relator:LINA COSTA
Sumário:
Votação:Voto de vencido
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em sessão do Tribunal Central Administrativo Sul:

M…, devidamente identificado como requerente nos autos da acção intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias instaurada contra o Ministério da Administração Interna, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença, proferida em 7.3.2023, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [doravante apenas TACL], que indeferiu liminarmente o requerimento inicial.
Nas respectivas alegações, o Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem:
«A) O Tribunal a quo faz um[sic] interpretação errada da Lei e ignora a Jurisprudência assente no STA e TCA SUL sobre a idoneidade do presente instrumento legal.
B) A Intimação para Defesa de Direitos, Liberdades e Garantias é o Único instrumento legal adequado para a defesa dos interesses do Requerente os quais estão[sic]
C) É o instrumento legal mais adequado na defesa dos valores constitucionais em jogo.
D) O uso da providência cautelar pela sua precariedade é incerto no seu desfecho.
E) Depende de uma Ação principal que poderá demorar anos e anos.
F) Somado a isso o Réu SEF recorre atualmente das providências cautelares.
G) O que aumenta ainda mais a incerteza do Requerente.
H) O signatário fez jurisprudência no TCA-SUL e por quatro vezes sobre a idoneidade do presente instrumento legal e ainda no STA.
I) O Requerente vê ameaçada a sua identidade em território nacional o seu emprego, está a pagar impostos e não vê reconhecidos os seus direitos.
J) Estão ultrapassados os prazos legais previstos no artigo 111°, 1 do CPTA
N) Não existe tempo a perder devendo o R. SEF ser devidamente Intimado a decidir e a emitir o respectivo título de residência ao Autor.»
Requerendo,
«A) SER CONSIDERADO PROCEDENTE O PRESENTE RECURSO.
B) DEVE SER REVOGADA A SENTENÇA A QUO.
C) DEVE SER RECONHECIDA EM DEFINITIVO A INTIMAÇÃO PARA DEFESA DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS COMO O ÚNICO INSTRUMENTO LEGAL PARA MELHOR SALVAGUARDA DOS INTERESSES DO REQUERENTE E NA DEFESA DA LEI E DA CONSTUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA.
D) DEVE SER AINDA O RÉU SEF INTIMADO OU CONDENADO A DECIDIR DE IMEDIATO.
E) DEVE AINDA SER O RÉU SEF CONDENADO A EMITIR A RESPECTIVA RESIDÊNCIA LEGAL DO AUTOR COM URGÊNCIA.».

Citado para a providência e notificado do recurso, o Recorrido não contra-alegou.

O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Notificada as partes, o Recorrente pronunciou-se sobre o parecer que antecede, concluindo como no recurso.

Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente (cfr. o nº 2 do artigo 36º do CPTA), o processo vem à sessão para julgamento.

A questão suscitada pelo Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 a 3 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consiste, no essencial, em saber se a sentença fez uma interpretação errada do direito aplicável ao decidir indeferir liminarmente a petição inicial por inidoneidade do meio processual.

A sentença recorrida não fixou factos provados, mas do seu teor é possível extrair o seguinte circunstancialismo processual, completado com o que resulta dos autos no SITAF:

«1. Por despacho, proferido em 15.2.2023, o TACL conheceu da (in)adequação do meio processual utilizado, considerando não observados os requisitos da indispensabilidade e da subsidiariedade previstos no nº 1 do artigo 109º do CPTA, e decidindo “que não se verificam, no caso concreto dos presentes autos, os pressupostos do recurso ao processo urgente de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias, notifique o requerente para, querendo, no prazo de (5) cinco dias, substituir a petição inicial, para o efeito de requerer a adoção da providência cautelar adequada à tutela do direito que pretende fazer valer, sob cominação de indeferimento liminar da petição inicial– cfr. de fls. 71 a 78 do SITAF;

2. Em 16.2.2023 o despacho que antecede foi notificado via electrónica ao Ilustre Mandatário do Requerente/recorrente [que a leu na mesma data] – cfr. de fls. 79 do SITAF [e pesquisa das notificações electrónicas];

3. Em 7.3.2023 foi proferida a sentença recorrida que indeferiu liminarmente o requerimento inicial, de cuja fundamentação se extrai:
«(…)
Notificado do referido Despacho, o requerente não substituiu a petição inicial, o que obsta à convolação do presente processo urgente de intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias em processo cautelar.
Nesta conformidade, por não se encontrarem verificados os pressupostos de recurso ao presente processo de intimação, e considerando, ainda, que se mostra insuscetível de convolação a presente intimação em requerimento cautelar, por falta de impulso processual do requerente nesse sentido, tal circunstância traduz-se numa inadequação do meio processual utilizado (ou a impropriedade do meio processual), que constitui uma exceção dilatória inominada, que acarreta a nulidade de todo o processado (sem possibilidade de aproveitamento ou convolação), determinante do indeferimento liminar da petição inicial, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 109.º n.º 1 e 110.º n.º 1, ambos do CPTA, e 590.º n.º 1 do CPC, ao que se provirá na parte dispositiva da presente decisão.
(…)» – cfr. de fls. 81 a 82 do SITAF.

A saber, foi no despacho de 15.2.2023 que o tribunal a quo conheceu e decidiu, ao abrigo do previsto no nº 1 do artigo 109º do CPTA, a questão da inidoneidade do meio processual de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, por referência ao alegado e peticionado na petição inicial [p.i.] apresentada em juízo pelo Requerente/recorrente.
Nesse despacho, contudo, não foi decidido o indeferimento liminar da p.i, por força do disposto no artigo 110º-A, nº 1 idem, tendo o juiz a quo determinado a notificação do Requerente para substituir a p.i. por requerimento cautelar, no prazo de cinco dias, com a cominação de indeferimento liminar daquela.
Assim, se o Requerente tivesse apresentado articulado, alterando a acção de intimação para providência cautelar, os autos seguiriam os trâmites desta, o mesmo é dizer que não haveria fundamento para o indeferimento liminar da p.i. original. Já a não apresentação de novo articulado, implicaria o indeferimento liminar da p.i. de intimação, por não observar os pressupostos exigidos no referido nº 1 do artigo 109º.
Foi esta a situação que ocorreu, notificado do despacho de 15.2.2023, o Requerente nada apresentou ou requereu nos autos.
Em face do que, dando sequência à cominação prevista no fim daquele despacho, o tribunal recorrido proferiu sentença de indeferimento liminar, consequência jurídico-processual da inércia do Requerente numa situação já decidida de não verificação dos pressupostos da acção de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, ou seja, de inidoneidade ou impropriedade do meio processual utilizado, excepção dilatória inominada que acarreta a nulidade de todo o processado, sem possibilidade de aproveitamento ou convolação da p.i.

O Recorrente, não se referindo ao despacho de 15.2.2023, alega no presente recurso, em síntese, que: o tribunal a quo errou na interpretação que fez da Lei, ignorando a Jurisprudência assente do STA e do TCAS sobre a idoneidade do presente instrumento legal; a presente acção é o único instrumento legal adequado à defesa dos seus interesses; o que não sucede com a providência cautelar, atenta a sua precariedade e incerteza; vê ameaçada a sua identidade, o seu emprego, está a pagar impostos e não vê reconhecidos os seus direitos; há muito que estão ultrapassados os prazos legais previstos no artigo 111º do CPTA; não existindo tempo a perder, deve o Recorrido ser intimado a decidir e a emitir o título de residência pretendido.

Não sendo admissível apreciar os concretos fundamentos em que o tribunal recorrido suportou a decisão de inidoneidade do meio processual, por o despacho de 15.2.2023, que os contém, não ter sido objecto de recurso e, por isso, ter transitado em julgado, entendemos, no entanto, ser de apreciar as conclusões do recurso, formuladas em termos genéricos por referência à inidoneidade do meio processual de intimação e à adequação do meio cautelar aos interesses que o Recorrente pretende defender na acção, porque são esses os fundamentos invocados na sentença recorrida para o indeferimento liminar.
Adiantamos, desde já, que nenhuma razão assiste ao Recorrente.
Com efeito, a jurisprudência que vem alegada no recurso não é a mais recente, nem resulta do labor do signatário do recurso [ao contrário das conclusões A) e H), sendo que são os tribunais superiores que fazem jurisprudência e não os advogados].
Ao contrário do alegado, este Tribunal tem, recentemente, vindo a pronunciar-se sobre a inidoneidade deste tipo de acção de intimação relativa à não emissão de autorização de residência – cfr. o decidido nos acórdãos de 7.6.2023, proc. nº 166/23.1BEALM, in www.dgsi.pt, e de 13.7.2023, prolatado no proc. nº 866/23.6BELSB (ainda não publicado), de cujo teor, consultado no SITAF, se extrai: «(…)
21. O requerente, e ora recorrente, afirma que tem direito a que a entidade requerida decida a pretensão por si formulada em 4-4-2022 e, consequentemente, emita o seu título de residência, e que se verifica uma violação desse direito, por já ter sido ultrapassado o prazo legal para o processamento do seu pedido, o que, por si só, justifica o direito de recorrer ao presente processo de intimação. Contudo, não lhe assiste razão.
22. Com efeito, está em causa a alegada omissão do SEF em apreciar o pedido de autorização de residência formulado pelo recorrente e, segundo este alega, emitir a correspectiva autorização. Porém, é patente que o recorrente não deu satisfação ao ónus de alegação e de prova que lhe estava cometido, de acordo com as regras gerais do ónus da prova, no sentido de demonstrar a imprescindibilidade do recurso ao presente meio processual, por não ser possível, em tempo útil, o recurso a uma acção administrativa de condenação à prática do acto devido, complementada com um pedido cautelar.
23. Percorrendo novamente quer o requerimento inicial, quer a alegação de recurso, constata-se que o requerente/recorrente não alega um único facto concreto do qual resulte que, pela circunstância da sua pretensão ser apreciada no âmbito da acção administrativa e, portanto, de uma decisão final com trânsito em julgado numa tal acção poder demorar, pelo menos – atendendo aos prazos previstos para a sua tramitação e à possibilidade de recurso jurisdicional – vários meses, tal circunstância seja susceptível de retirar utilidade à apreciação do seu pedido de autorização de residência que só nessa data seja efectuado.
24. Com efeito, o requerente/recorrente não alegou – e, consequentemente, não provou – que, caso a decisão de mérito não fosse proferida num processo de natureza urgente, haveria (a) uma perda irreversível de faculdades de exercício desse direito (o direito a residir em Portugal), e (b) uma qualquer situação de carência pessoal ou familiar em que estivesse em causa a imediata e directa sobrevivência pessoal de alguém. O recorrente limitou-se a alegar está a fazer descontos e a pagar impostos desde 2022 em território nacional, não tem a sua identidade reconhecida em Portugal, tem o seu trabalho em risco, pelo que estar a propor outro tipo de acção não tem qualquer sentido e, pior, vem aumentar o sofrimento do autor, sendo certo que este, não tem só deveres, mas também direitos e aplicáveis por via do artigo 15º da CRP.
25. De tudo quanto se afirmou, resulta inequívoco que o requerente/recorrente não alegou – e também não alega no presente recurso – um único facto concreto que permita concluir que o invocado direito a obter a autorização de residência não terá utilidade caso só venha a ser concedido mediante uma decisão a proferir em acção administrativa, eventualmente cumulada com um pedido de natureza cautelar, isto é, que estas acções não são suficientes para assegurar o exercício em tempo útil desse direito. Ou, dito por outras palavras, o requerente/recorrente não invoca qualquer facto concreto do qual resulte que, pela circunstância da sua pretensão vir apenas a ser apreciada no âmbito duma acção administrativa, ficará sem qualquer utilidade a eventual condenação dos réus que aí possa vir a ocorrer, de deferimento do pedido de autorização de residência oportunamente formulado.
26. A inadequação do meio processual “intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias” decorre ainda da possibilidade da acção administrativa poder ser acompanhada de um pedido de decretamento de providência cautelar, pois tal como salientou a sentença recorrida, o decretamento de uma providência cautelar que intime a entidade requerida a emitir um título de residência provisório mostra-se suficiente para assegurar o exercício, em tempo útil, dos direitos que o recorrente invoca, além de não esgotar o objecto da acção principal.».
Este acórdão teve voto de vencido pelo 2º Adjunto que «(…), teria entendido que a intimação para a protecção de direitos, liberdades e garantias, se mostrava o meio processual adequado ao fim visado.».
E declaração de voto do 1º Adjunto, de cujo teor se extrai: «Subscrevo o sentido da decisão, mas não a sua fundamentação, porquanto entenderia que não se mostra legalmente possível regular cautelarmente/provisoriamente a pretensão trazida a juízo pelo requerente/recorrente.
(…)
Depois, porque entendemos que não será possível determinar a atribuição de uma autorização residência “a título provisório", em sede cautelar, sem consumir o objecto da acção principal.
Conforme previsto no artigo 74º e segs. da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho, apenas existem as autorizações de residência temporária (artigo 75º) com a duração de 2 anos e renovável por períodos sucessivos de 3 anos e a autorização de residência permanente (artigo 76º), que não tem qualquer limite de validade.
No caso vertente, o requerente pretende ver-lhe atribuída autorização de residência para exercício de actividade profissional subordinada, a qual se encontra prevista no artigo 88º da Lei nº 23/2007, de 4/7, e que, no seu nº 1, remete para os termos e requisitos previstos no artigo 77º, relativo aos requisitos para atribuição de autorização de residência temporária.
Em relação a esta autorização de residência temporária, nos termos do artigo 75º, nº 2 da Lei nº 23/2007, a única possibilidade de obtenção de uma autorização de residência temporária divergente daquela "genericamente prevista" é uma outra, superior a 90 dias e inferior a 1 ano, renovável por igual período, mas apenas se o requerente estiver abrangido pelo Acordo CPLP e for titular de um visto de curta duração ou tenha uma entrada legal em território nacional.
Isto posto, tal como vimos entendendo nos arestos em que somos relatores, a pretensão em causa, devidamente demonstrada a urgência para acautelar direitos, liberdades e garantias, apenas é susceptível de ser decidida por via de um meio principal e nunca por via de uma providência cautelar.
Aqui, em abstracto, o meio idóneo seria a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, porquanto seria a forma processual de ver acautelada a pretensão do recorrente.
Contudo, se o seria em abstracto, não o será em concreto.
Para que o fosse era necessário que do requerimento inicial apresentado se pudesse vislumbrar que o adiamento deste processo de espera que vem tendo lugar desde que apresentou requerimento no SEF, estivesse a pôr em causa, de forma irremediável, intolerável e iminente algum seu direito, liberdade ou garantia (ou direito análogo).
A extrema urgência inerente ao presente meio processual impõe que devamos fazer uma triagem estrita daquilo que é verdadeiramente urgente e indispensável para salvaguarda de direitos, liberdades e garantias ou outros direitos e garantias de natureza análoga.
Isto sob pena de vulgarizarmos a urgência e passarmos a ter, na presente intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, uma espécie processual ineficiente e votada ao fracasso na protecção das verdadeiras urgências e atropelos aos verdadeiros direitos, liberdades e garantias.».
Concordando com os fundamentos dos referidos acórdãos, entendemos que a idoneidade do meio processual, previsto no artigo 109º do CPTA, afere-se em função da concreta causa de pedir, da prova produzida e do pedido formulado em cada acção, não bastando alegar de forma genérica e conclusiva a violação de direitos, liberdades e garantias, ou uma urgência que não resulte do articulado e provado, tão premente de uma decisão de mérito, como exige aquela norma.
A tutela cautelar adequada permitirá, como resulta do disposto no artigo 112º, nº 1 do CPTA, assegurar a utilidade da sentença a proferir na acção principal, o que não resulta infirmado pela alegação do Recorrente de que é transitória e precária, ou mesmo que o Recorrido tem vindo a interpor recurso das decisões cautelares proferidas, aumentando a incerteza.
A tutela cautelar caracteriza-se, precisamente por ser provisória, sumária e instrumental, não pretendendo resolver o litígio de forma definitiva, mas sim até à decisão que venha a ser proferida na acção de que depende.
Acresce que se o Requerente/recorrente tivesse, na sequência da notificação do tribunal, apresentado requerimento cautelar não poderia manter os mesmos pedidos que formulou na p.i. – por nesta, relativa a acção de intimação, visar uma decisão sobre o mérito da causa e naquele uma tutela provisória dos seus direitos e interesses. Assim poderia ter requerido providência de intimação do Recorrido a emitir autorização de residência provisória, ou, procurando obviar ao seu não decretamento por razões como as defendidas pelo 1º Adjunto na declaração de voto no acórdão de 13.7.2023, proc. nº 866/23.6BELSB, a de intimação do mesmo a abster-se de adoptar as condutas que normalmente adoptaria perante cidadãos estrangeiros que não são titulares de autorização de residência no território nacional, enquanto não decidir o pedido de autorização de residência que aquele lhe dirigiu. Ou outra [separada ou requerida com a anterior] de intimação a aceitar ou considerar válidos os documentos e vistos relativos à sua permanência no território nacional, cuja validade tenha expirado, enquanto não decidir o referido pedido de autorização de residência. Ou, de intimação a reconhecer, emitindo declaração em conformidade, que o documento que comprova que apresentou manifestação de interesse na emissão de autorização de residência, ao abrigo do artigo 88º, nº 2 da Lei 23/2007, é comprovativo de situação regular para os efeitos de poder beneficiar, exercer os direitos indicados na p.i. de intimação, juntos de serviços públicos, até à decisão desse pedido. Ou qualquer outra providência inominada desde que adequada à finalidade pretendida enquanto não fosse decidida a acção principal [não urgente e ainda não instaurada, ou eventualmente o pedido de emissão de autorização de residência, se ocorresse primeiro].
Também a alegação de que há muito decorreram os prazos previstos no artigo 111º do CPTA, não pode proceder, dado que o indeferimento liminar da p.i., por inidoneidade do meio, obsta à decisão de mérito da acção de intimação, a que os referidos prazos respeitam, quer pelo tribunal a quo quer pelo tribunal ad quem.

Consequentemente, não pode proceder o presente recurso.

Uma última nota, para dizer que a relatora neste recurso foi 1ª Adjunta e assinou sem qualquer declaração de voto o acórdão de 29.6.2023, proc. nº 603/23.5BELSB no qual foi defendida a inadequação da tutela cautelar quando está em causa a emissão de uma autorização de residência. Ora, resulta evidente pela argumentação expendida supra que, melhor estudada a questão, não mantém o referido entendimento nos presentes autos.

Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, e, em consequência, manter a sentença recorrida na ordem jurídica.

Sem custas.

Registe e notifique.

Lisboa, 26 de Julho de 2023.


(Lina Costa – relatora)

(Jorge Martins Pelicano – declaração de voto)

(Maria Cardoso)


Declaração de voto
Salvo o devido respeito pela posição contrária, não acompanho a fundamentação do acórdão na parte em que entende que o Recorrente podia ter feito uso de uma acção administrativa acompanhada da interposição do correspondente processo cautelar, por entender que, em face da concreta causa de pedir e do pedido deduzidos e ainda no disposto no art.º 77.º, n.º 1, alíneas b) a j), e n.º 2 e art.º 88.º, n.º 2, ambos da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 18/2022, de 25 de Agosto, o Recorrente não podia obter a tutela provisória dos direitos que invoca através do decretamento de uma providência cautelar.
Conforme melhor explicito no acórdão proferido na presente data, no âmbito do processo n.º 554/23.3BELSB, o Tribunal não poderia, no âmbito de um processo cautelar, formular qualquer juízo sobre o preenchimento do requisito relativo ao fumus boni iuris a que se refere o n.º 1 do art.º 120.º do CPTA, uma vez que não possuiria os elementos de facto necessários para poder concluir se é ou não provável a procedência da pretensão deduzida na acção principal.
Para além de que estaria a permitir que o Recorrente, na pendência da acção principal, exercesse um direito que não lhe pode vir a ser reconhecido nessa acção, uma vez que a decisão de atribuição de autorização de residência se encontra pendente da actividade instrutória a desenvolver pelo Recorrido, pelo que na acção principal apenas seria admissível a condenação do Recorrido a instruir e decidir o procedimento.

Apenas voto o sentido da decisão por o Recorrente não ter alegado factos demonstrativos da urgência em interpor a presente acção, contrariamente ao que lhe impõe o n.º 1 do art.º 109.º, n.º 1 do CPTA.
Jorge Pelicano