Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1117/09.1BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:09/16/2019
Relator:MÁRIO REBELO
Descritores:TERMO DA INSPEÇÃO;
PODER DE ATRAÇÃO DA CATEGORIA B.
Sumário:1. O acto que assinala o termo da inspeção é a notificação ao Contribuinte do relatório da Inspeção Tributária. O que é diferente da conclusão dos actos de inspeção, que ocorre na data da notificação da nota de diligência emitida pelo funcionário incumbido do procedimento.
2. Para que o contribuinte pudesse ser tributado pela categoria B pelos rendimentos enquadráveis nas categorias F e E seria indispensável que os bens ou valores geradores dos rendimentos fizessem parte do activo da empresa individual do sujeito passivo, ou que estivessem afectos às actividades empresariais por ele desenvolvidas, em consagração do princípio da autonomia ou separação patrimonial assente na distinção entre o património afecto à actividade empresarial e o património pessoal.
3. De acordo com a manifestação do chamado poder de “atracção” da categoria B (cfr. art.º 3º/2,b) do CIRS (na redação aplicável), convertem-se em rendimentos desta categoria aqueles que em virtude da sua substância, preenchiam normas de incidência de outras categorias.
4. Para que essa atração se torne possível, é necessário que haja conexão entre a actividade empresarial e a “fonte atraída”.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

RECORRENTE: A……..
RECORRIDO: Autoridade Tributária e Aduaneira
OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pelo MMº juiz do TAF de Leiria que julgou improcedente a impugnação deduzida contra o indeferimento hierárquico instaurado por indeferimento da reclamação graciosa interposta para anulação da liquidação de IRS e juros compensatórios do ano de 2002 no valor de € 81.070,22.
CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:
1 - O recorrente não se pode conformar com a douta sentença proferida pelo tribunal a quo, a qual incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, devendo, por isso ser revogada, porquanto, como especificadamente se vai passar a defender e a alegar, verificou-se a caducidade do direito à liquidação e, subsidiariamente, mesmo que assim se não se entendesse, a Administração Tributária fundamentou mal as correções, incorrendo em falta de fundamentação substancial do ato tributário, errónea qualificação e quantificação dos rendimentos e preterição de outras formalidades legais.

2 - Em face da prova produzida junta aos presentes autos deveriam ter sido dados por provados os seguintes factos com interesse para apreciação da causa, nomeadamente da questão da caducidade, ADITANDO-SE aos factos provados duas novas alíneas H) e I) com o seguinte teor:

3 - H) A ação de fiscalização terminou no dia 26/04/2007 com a notificação da nota de diligência ND02007…… (facto foi alegado no artigo 7.0 e 13.0 da p.i. não impugnado e resulta do teor do RIT - pág. 6 e fls. 70 e 390 do processo de reclamação graciosa).

4 - l) A liquidação de IRS do ano de 2002 foi notificada ao impugnante no dia 13 de Junho de 2007 (facto foi alegado no artigo 6.0 da p.i, não foi impugnado, e
resulta confessado do despacho de indeferimento do Recurso Hierárquico, pág. 5, cfr. fls. 76 do Recurso Hierárquico que se encontra junto aos autos).

DA CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO

5 - Com o devido respeito, o meritíssimo juiz a quo não apreciou corretamente a questão da caducidade do direito à liquidação. não fazendo uma aplicação correta do direito sobre os factos, nomeadamente dos artigos 45.º e 46.º da LGT e artigo 57.º da Lei n.º 60-A/2005 de 30 de Dezembro.
6 - perante os factos que foram dados por provados, (Cfr. Factos A). B) e C)) e os que se pretendem ver aditados, à data da notificação da liquidação do IRS de 2002 (13/06/2007), já haviam sido ultrapassados os 4 anos da caducidade do direito à liquidação, porquanto:
i. A ação de fiscalização, de que o sujeito passivo foi alvo, teve o seu início em 28/11/2006 e término em 26 /04/2007;
ii. a caducidade do direito à liquidação, que deveria de operar no dia 31-12-2006, SUSPENDEU-SE no dia 28/11/2006, faltando 34 dias para se verificar a caducidade;
iii. A contagem do restante prazo de 34 dias reiniciou-se no dia seguinte ao do término da inspeção, ou seja, no dia 27/04/2007, como resulta do disposto nos artigos 45.º e 46.º da L.G.T.
iv. Entre a data de 28/11/2006 e 31/12/2006, verificou-se a suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação pelo período de 34 dias.
v. Assim, uma vez terminada a ação de fiscalização em 26 /04 /2007, a liquidação do tributo deveria ter sido validamente notificada ao impugnante nos 34 dias seguintes, isto é, até ao dia 30 de Maio de 2007, sob pena de, assim se não verificando, operar a caducidade do direito à liquidação.
vi. Tendo a liquidação de IRS do ano 2002 sido notificada ao impugnante no dia 13 de Junho de 2007 já havia operado a caducidade do direito à liquidação no dia 30/05/2007.
7- O que releva para efeitos de suspensão do prazo de caducidade é a inspeção propriamente dita (os atos de inspeção externa), ou seja, a data em que a mesma efetivamente cessou e não, como parece ser o entendimento vertido na douta sentença, o prazo de 6 meses da inspeção.
8- Por aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 45.º da LGT, o direito de liquidar IRS referente ao ano de 2002 não foi validamente notificada ao recorrente no prazo de 4 anos.
9- Por outro lado, também considera a douta sentença recorrida que, tendo em conta que foi INSTAURADO PROCEDIMENTO CRIMINAL por factos que resultaram desta inspeção, é de aplicar o disposto no n.º 5 do artigo 45.º da LGT, na nova alteração introduzida pelo artigo 57.º n.º 1 e 2 da Lei n.º 60-A/2005 de 30 de Dezembro.
10- Na verdade, resulta dos factos assentes (Cfr. facto D)) que corre termos nos serviços do Ministério Público de Almeirim o PROCESSO DE INQUÉRITO N.º 323/09.3TAALR, processo esse que terá sido instaurado e autuado em 2009.
11- Não se aplica no caso sub iudice o disposto no n.º 5 do artigo 45.º da LGT e n.º 2 do artigo 57.º da Lei n.º 60-A/2005 que dispõe que "O disposto no n.º5 do artigo 45.º da lei geral tributária é aplicável aos prazos de caducidade em curso à data da entrada em vigor da presente lei”; uma vez no período do decurso do prazo de caducidade (compreendido entre 31/12/2002 e 30/05/2007) ainda não havia sido instaurado processo crime pelos factos constantes do relatório de inspeção tributária sub iudice.
12- I.é, à data da entrada em vigor da Lei n.º 60-A/2005 de 30 de Dezembro, ainda não estava verificada a condição para aplicação do disposto no n.º 5 do artigo 45.º da LGT (nova redação) uma vez que ainda não havia sido instaurado processo crime pelos factos decorrentes da inspeção tributária (que tem a natureza de processo administrativo).
13- Em face do que, por aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 45.º da LGT, à data da notificação da liquidação do IRS do ano de 2002 (13/06/2007) já havia CADUCADO o direito à liquidação do IRS do ano de 2002.
14- Quanto a esta questão, a douta sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito, porquanto, em face dos factos que ficaram provados e os que deveriam ter sido dados por provados, aplicou mal o direito, nomeadamente o disposto no artigo 45.º n.º 1e 5 e artigo 57.º n.º 1e 2 da Lei n.º 60-A/2005 de 30 de Dezembro, e deveria ter declarado a caducidade do direito à liquidação, devendo ser revogada.

ERRO DE JULGAMENTO

15- Subsidiariamente, sempre se dirá, que a determinação da matéria coletável enquadrada na CATEGORIA E (juros) é ilegal por falta de fundamentação, erro de quantificação e qualificação e, ainda, violação de lei, seja por se imputar factos tributários ao impugnante com os quais nada teve a ver, seja por se ter violado, entre outros, o disposto nos artigos 3°, nº 2, alínea b,) e artigo 5°nº 1 (parte final) todos do CIRS.
16- Por outro lado, também é ilegal a determinação da matéria colectável enquadrada na CATEGORIA F (rendas) também por falta de fundamentação, erro de quantificação e qualificação e, ainda, violação de lei, seja por se imputar factos tributários (rendimentos) ao impugnante com os quais o mesmo nada teve a ver, seja por se ter violado, entre outros, o disposto nos artigos 3°, nº 2, alínea a) do ORS.
17- De todos os factos descritos no relatório, resulta, DE FORMA INEQUÍVOCA, o exercício, pelo impugnante, de atividade empresarial, donde que os rendimentos que foram enquadrados nas categoria E e F, deveriam ser tributados em sede de IRS, categoria B.
18- Conforme resulta do Relatório de Inspeção Tributária (Cfr. facto aL B)), o recorrente foi objeto de um procedimento de inspeção tributária ao exercício de 2002 da qual resultaram correções à matéria tributável do impugnante com fundamento nos seguintes factos apurados pela AT. que se enumeram:
i. No ano de 2002 o recorrente auferiu rendimentos provenientes de JUROS de algumas dezenas de empréstimos que efetuou a terceiros, bem como rendimentos prediais relativos a RENDAS auferidas de diversos imóveis arrendados;
ii. O recorrente auferiu, ainda, rendimentos do sector imobiliário (venda de imóveis) para o que foi coletado, oficiosamente, pela Administração Tributária, no regime simplificado.
iii. O recorrente tem como estrutura empresarial um escritório aberto ao público em Almeirim, onde contactava com os clientes, fazendo empréstimos, recebendo juros e o capital mutuado, arrendando e vendendo imóveis.
iv. Nos termos do relatório o valor dos juros auferidos pelo recorrente, em 2002, ascendeu a 68.596,63 €, por via da concessão de 22 empréstimos.
v. Ainda nos termos do relatório, o valor das rendas auferido em 2002 ascendeu a 132.606,06 €, por via de dezenas de arrendamentos celebrados e/ou em curso.
vi. O negócio/atividade exercida pelo recorrente dos empréstimos, compra e venda de imóveis e arrendamento dos mesmos, era exercido no escritório.
19- Com base nos factos descritos, a administração tributária veio a tributar o recorrente, em sede de IRS, pela categoria E (relativamente aos rendimentos de capitais) e pela categoria F (no que respeita aos rendimentos prediais), qualificação e enquadramento que a douta sentença recorrida veio a confirmar estar correta.
20- Todavia, em face do que ficou demonstrado, e pelo teor do Relatório de inspeção tributária e do teor do depoimento das testemunhas (Cfr. Motivação da decisão de facto - pág. 16 e 17 da douta sentença recorrida), deveriam os rendimentos prediais e de capitais serem qualificados como rendimento da categoria B, i.é., como rendimentos empresariais.
21- A douta sentença recorrida assenta na fundamentação de que o recorrente não detinha requisitos substanciais e formais /legais que o poderiam habilitar a desenvolver duma forma empresarial as atividades de locação financeira, outras atividades de crédito não especificadas ou arrendamento de bens imobiliários.
22- Esta conclusão não reflete o que a Administração Tributária apurou, aquando da inspeção tributária ao recorrente, nomeadamente quanto à atividade real, de facto, exercida, e de forma empresarial.
23- O recorrente está coletado para a atividade de comissionista e de compra e venda de bens imobiliários, com início de atividade a 02/01/2002, porque foi a própria AT, no seguimento da inspeção, que deu início de atividade oficiosamente, quando concluiu o procedimento em 2006 isto porque, segundo se descreve no ponto 1.1.1 do Relatório de inspeção Tributária (Or. Facto B) - pág. 5 da douta sentença), o recorrente havia vendido um lote de terreno, no dia 18 de Abril de 2002.
24- Daqui não se pode presumir, como o faz a douta sentença recorrida, que esta fosse uma atividade que o recorrente exercia a título principal e com carácter de regularidade, entre dezenas de empréstimos ou arrendamentos que também apuraram (Cfr. Facto B) da decisão de facto.).
25- A interpretação que o meritíssimo juiz a quo faz da lei fiscal, no que se refere ao enquadramento e incidência do IRS é demasiado formalista, preterindo os princípios da igualdade, proporcionalidade e da prevalência da substância sobre a forma.
26- Ora, se se conclui que o recorrente não tinha habilitações formais para fazer empréstimos ou "locação financeira” também se deveria concluir que o recorrente também não preenche os requisitos formais/legais para exercer a atividade de imobiliária (não tem fundamento apontar-se o facto de não ter contabilidade, urna vez que não tinha nem para uma nem para outra atividade).
27- E na própria sentença recorrida é reconhecido que "Apesar do impugnante demonstrar que tinha um estabelecimento aberto ao público e que a sua atividade se consubstancia numa prática reiterada e previsível de atos que constituem uma atividade comercial, a ausência dos mencionados requisitos formais de índole legal... "(cfr.pág. 26).
28- Vejamos o que ficou apurado pela Administração Tributária:

a) No ano de 2002, resulta do relatório de inspeção, o impugnante auferiu rendimentos diversos, nomeadamente resultantes de trabalho dependente, de arrendamento de imóveis, de concessão de empréstimos em dinheiro e outros rendimentos.
b) Esta ação de fiscalização foi efetuada na sequência da apreensão pelo "S.E.F. - Serviços de Estrangeiros e Fronteiras" de várias pastas de documentos e livros de recibos relacionados com a atividade do impugnante (arrendamentos e empréstimos), que se encontravam no seu escritório.
c) De acordo com o Relatório de inspeção, o apuramento das rendas de 2002 teve por base os seguintes documentos:
i. O mapa de " Rendas a partir de Setembro de 2002" incluso no Apenso 1 da 2 ª apreensão do SEF, que inclui o mês de Agosto, elaborado pelo sr. A…….;
ii. O registo constante no apenso 2 da 2ª apreensão do SEF relacionado no n/ mapa de Registos Dispersos de Rendas e Declarações de Recebimentos de Rendas;
iii. O Apuramento das cobranças de rendas efetuadas por P……… em 2002 (XXXIX.A 1) ...;
iv. Os Recibos emitidos, comprovados pela existência dos canhotos dos respetivos livros de recibo com o registo da identificação específica do nome e valor da renda e período de tempo;
v. Os Registos diversos constantes no mapa de recibos emitidos pelo sr. A……….! C...... (XXXIX.A7), originários de vários livros.
29- A administração tributária também imputa ao impugnante rendimentos da categoria F, provenientes de rendas recebidas por via de contratos de arrendamento celebrados sobre prédios rústicos e urbanos, corrigindo-se os rendimentos do Sujeito Passivo, no exercício de 2002, pelo montante de 106.962,55 euros.

30- Também estes rendimentos a serem-lhe imputados deveriam de o ter sido em sede de IRS categoria B e não categoria F, como, por erro e em clara violação da lei a administração fiscal o fez, confirmado pela douta sentença recorrida.
31- A fls. 11 do relatório, descreve-se que se detetou a existência de recibos de renda que dizem respeito a diversos locais, que serão pertença ou não do Sr. A….., mas que sobre os mesmos exerce uma gestão efetiva.
32- Ora, a gestão ou administração, por parte do impugnante, de prédios de terceiros (RECONHECIDA NO RELATÓRIO), celebrando contratos de arrendamento e recebendo rendas, consubstancia uma atividade empresarial, tributada em sede de IRS categoria B, nos termos do disposto no nº 2, alínea a) do artigo 3º do CIRS.
33- A administração fiscal fundamentou mal e violou a lei, ao tributar o impugnante, imputando- lhe rendimentos em sede de IRS, categoria F, uma vez que, em face do disposto no artigo 8º do CIRS, nesta categoria (F) só se enquadram os rendimentos prediais colocados à disposição dos titulares (proprietários) dos prédios arrendados, e, ainda assim, se os não auferiram no exercício de uma atividade empresarial.
34- Na verdade, os locais (prédios) descritos no relatório como tendo sido objeto de arrendamento, são todos propriedade de terceiros, são propriedade das senhoras I………… e M……….. como ficou assente.
35- Assim, nunca o impugnante poderia ser tributado em IRS, na categoria F por não ser o titular dos rendimentos.
36-A titularidade das rendas e a incidência do imposto sobre tal rendimento afere-se pelo direito de propriedade sobre um imóvel, não pode ser alterada pela vontade dos particulares, nomeadamente pela vontade de um pai em beneficiar as filhas.
37- Podemos, então concluir, que a administração tributária enquadrou mal os rendimentos do impugnante na categoria F do imposto, na justa medida em que, ou os imputava ao impugnante em sede de categoria B (rendimentos provenientes da atividade empresarial traduzida na gestão de imóveis), ou os imputava às TITULARES (proprietárias) dos imóveis, em sede de categoria B ou F, consoante tais rendimentos fossem ou não imputáveis ao exercício de uma atividade empresarial.
38- Tais rendimentos devem ser imputáveis ao impugnante, como consequência do desempenho de uma atividade económica ou empresarial mais vasta.
39 – A douta sentença recorrida incorreu, deste modo, face aos factos apurados no Relatório de inspeção tributária quanto à atividade real do recorrente, em erro de interpretação e aplicação do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 3.º do Código do IRS segundo o qual, consideram-se rendimentos empresariais e profissionais, da categoria B do IRS, os seguintes:
a. Os rendimentos prediais imputáveis a atividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais;
b. Rendimentos de capitais imputáveis a atividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais.
40- Está assente que os atos praticados pelo recorrente, embora não declarados fiscalmente, são atos de comércio na medida em que a atividade praticada pelo recorrente visa o lucro.
41- Atenta a atividade reiterada de arrendamento, concessão de empréstimos com vista a obtenção de um lucro pode-se concluir com a mais CLARA CERTEZA E SEGURANÇA JURÍDICA que não se tratam de atos isolados, donde se conclui que são rendimentos que resultam de uma atividade empresarial, um comércio, no sentido económico do termos.
42- Como aliás, se conclui no venerando Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 17/06/2008, in www.dgsi.pt/jtca


43- Em face a todo o exposto, a douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento, de facto e de direito, na medida em que faz uma errada aplicação do direito fiscal aos factos e incorre em erro de interpretação e aplicação do artigo 3.º n.º 2 alíneas a) e b) do CIRS, porquanto os rendimentos auferidos pelo recorrente a título de rendas e de juros de empréstimos concedidos, deveria ter sido enquadrados para efeito de IRS na categoria B de rendimentos, porquanto são rendimentos empresariais e profissionais.
44- Reitera-se, a liquidação de IRS do ano de 2002 é ilegal, sendo também ilegais os indeferimentos que recaíram sobre a reclamação graciosa e o recurso hierárquico, na justa medida em que houve falta de fundamentação e violação de lei na determinação, qualificação e quantificação da matéria coletável.
45- Nesta medida, deve a douta sentença ser revogada.

NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, com o douto suprimento de V/Exas, Venerandos senhores Doutores Juízes desembargadores, deve o presente Recurso ser julgado procedente, por provado e, por consequência, revogar-se a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que julgue totalmente procedente a impugnação relativa à liquidação do IRS de 2002, aditando-se novos factos à matéria de facto, declarando-se a caducidade do direito à liquidação e, subsidiariamente a errónea quantificação e qualificação da matéria tributável.
Só assim se fará a VENERANDA JUSTIÇA!

CONTRA ALEGAÇÕES.
Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.

II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou, no julgamento da matéria de facto de direito ao julgar improcedente a impugnação, designadamente ao julgar improcedente a exceção de caducidade do direito à liquidação e bem assim dos erros de subsunção, imputação e quantificação da matéria coletável.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:

Em 27-11-2006 o Diretor de Finanças de Leiria, através da OI 20060….., determinou ação de inspeção externa, de âmbito parcial ao IRS, do ano de 2002, aos sujeitos passivos A……… e M…….., da qual tomaram conhecimento em 28 - 11-2006. - (cfr. f ls. 69 do processo de reclamação graciosa em apenso).


B)

Em 23-05-2007, os serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças de Leiria concluíram a ação de inspeção referida na alínea anterior, aos ora impugnantes, em cujo relatório consta, além do mais, o seguinte:
“2- Descrição sucinta das correções da ação inspetiva

Os valores constantes do quadro apresentado na página anterior tem por base as seguintes correções:

I - IRS

1.1- ANO 2002

€ 187.108,18, sendo € 10.000,00 respeitante a rendimento da categoria B, € 70.145,63 a rendimentos da Categoria E e € 106.962,55 a rendimentos da Categoria F (Capitulo IlI ponto 1.1.1, 1.1.2 e 1.1.3 deste relatório)
(…)

Capitulo II – Objetivos, âmbito e extensão da ação de inspeção

1. Credencial e período em que decorreu a ação


O procedimento de inspeção interno ao Sujeito Passivo «A…….» NIF 10470…., foi efetuado ao abrigo da ordem de serviço no OI2006….. e OI2006…., desta Direção de Finanças, para os anos de 2002 e 2003,2004 e 2005.
A ação de fiscalização teve o início em 28-11-2006 para o ano de 2002 e o início em 12-03-2007 para os anos de 2003, 2004 e 2005 e o seu termo em 26-04-2007.

2. Motivo, âmbito e incidência temporal

A presente ação foi efetuada na sequência da apreensão dos documentos pelo ”SEF (Serviços de Estrangeiros e Fronteiras)” de várias pastas de documentos e livros de recibos, que se encontravam no escritório do sujeito passivo relacionados com a atividade por si exercida.
É uma ação de âmbito parcial a IRS e Imposto de Selo (IS), aos exercícios de 2002, 2003, 2004 e 2005.


3. Outras situações

3.1 Enquadramento fiscal do Sujeito Passivo


O Sujeito passivo A, declarou nos anos em análise rendimentos nas s eguintes Categorias: - Categoria E, referente a dividendos de ações no ano de 2003, 2004 e juros no ano de 2005: - Categoria F - nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005: - Categoria B - no ano de 2003, pelo serviço prestado de avaliador ao Ministério das Finanças.

O sujeito passivo B, declarou rendimentos da Categoria A no ano de 2004 e 2005.


Da análise aos documentos apreendidos verifica-se que o sujeito passivo, obtêm rendimentos derivados dos empréstimos concedidos em dinheiro com garantias reais e sem garantia, sendo as garantias escrituras de Mutuo com Hipoteca, procurações com poderes irrevogáveis, cheques pré-datados dos cliente relativamente ao valor da divida e Letras de Cambio assinadas pelo cliente em branco, elaborando declarações de divida de mutuo acordo e compromisso de pagamento. Além das declarações de divida por vezes pela antecipação da data de pagamento de cheques pré datados, também cobrava juros.
Nos anos em análise vendeu um lote de terreno, fazendo ainda parte do seu património alguns lotes de terrenos e recebeu comissões pela venda de carros.

O sujeito passivo também obtém rendimentos do arrendamento/locação de imóveis rústicos e urbanos inscritos em seu nome, em nome das suas filhas ou de outrem.

Pela atividade exercida de comissionista e de compra e venda de bens imobiliários, vamos dar o seu início, preenchendo para o efeito o BAO (Boletim de Alteração Oficioso) com data de inicio da atividade em 02-01-2002, e enquadrá-lo para efeitos de IVA no regime de isenção artigo 53.º do CIVA) e para efeitos e IRS, enquadrá-lo no regime simplificado nos termos do artigo 31.º do CIRS.

Capitulo III – Descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas á matéria tributável

1 - I.R.S

1.1 - ANO 2002

1.1.1 - Rendimento Categoria B

O sujeito passivo neste exercício, no dia 18 de Abril, por escritura de compra e venda realizada no Cartório Notarial de A…….., vendeu um prédio urbano sito na Rua 1.º de M….., no Lugar de F…. de B…. - designado lote de terreno n.º 1, inscrito na matriz sob o artigo 60…. pelo valor de € 10.000,00.
A venda de lotes de terreno é considerada uma atividade comercial prevista no artigo 3.º do Código do IRS.
O valor das vendas é no montante de € 10.000,00.

1.1.2 - Rendimentos Categoria E

Introdução
Nos empréstimos concedidos, por vezes para o mesmo cliente as declarações de divida ou eram nome do sujeito passivo ou eram em nome da sua filha a senhora I………, havendo cheques emitidos pela sua filha para declarações de divida de clientes do sujeito passivo e cheques do sujeito para declarações de divida da sua filha.

Por vezes as declarações de divida são em nome do sujeito passivo, passando depois o valor da divida por garantia real através de hipoteca de mutuo para nome de sua filha e nalgumas situações os imóveis que serviam de garantia nos mútuos com hipoteca a favor de sua filha vinham para a posse do sujeito passivo e vice-versa.

Perante esta situação, inquirimos o sujeito passivo sobre:

1- Os empréstimos de Mutuo com Hipoteca e as declarações de divida de Mutuo Acordo e Compromisso de Pagamento realizadas pela sua Filha a diversos clientes nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005, quem é que emprestava o dinheiro mencionado nos referidos empréstimos.
2- Relativamente aos juros dos empréstimos celebrados pela sua filha a quem devem ser imputados esses rendimentos.
O sujeito passivo declarou: - que o dinheiro dos empréstimos era seu visto que a conta bancária ser conjunta e que os juros dos empréstimos devem ser-lhe imputados conforme termo de declarações que se junta em anexo I.

No sentido de se confirmar as declarações do sujeito passivo, inquirimos a senhora I...... sobre os empréstimos concedidos através de mutuo com hipoteca, através de declarações de divida por Mutuo Acordo e termo de responsabilidade de pagamento entre outras, realizados por si a diversos clientes nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005, quem é que emprestava o dinheiro mencionado nos referidos empréstimos, assim como relativamente aos juros pelos empréstimos por si celebrados a quem se deve imputar esses rendimentos. Respondeu ditando que: - os empréstimos de Mutuo com Hipoteca e as declarações de divida de Mutuo Acordo e termo de responsabilidade de pagamento entre outras, o dinheiro emprestado era do seu pai, ou da sua responsabilidade, quanto aos juros dos empréstimos por si celebrados devem ser imputados ao seu pai, pois era ele que emprestava o dinheiro, conforme termo de declarações que se junta em anexo II.

A fim de se comprovar os valores constantes das declarações de divida, solicitamos a alguns clientes, toda a documentação relacionada com os empréstimos obtidos, verificamos que os clientes, não possuíam qualquer documentação pois as declarações de divida eram assinadas, nunca ficando os mesmos com cópia dessas declarações de divida, somente recebiam por vezes correspondência. Também verificamos por vezes não saberem qual a taxa de juro praticada relativamente aos empréstimos obtidos, e que os empréstimos obtidos tinham sido concedidos pelo senhor A….., apesar de assinarem declarações de divida e escrituras de mutuo e hipoteca em nome da sua filha.
A taxa de juro praticada relativamente aos empréstimos é variável entre 1% a 5% ao mês, os juros eram calculados à cabeça, motivo pelo qual as declarações de divida nunca fazem referência a juros/despesas de manutenção, os juros são calculados mensalmente.

Os juros referentes aos empréstimos concedidos pelo sujeito passivo, são considerados nos termos do artigo 5.º e artigo 7.º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares – Rendimentos da Categoria E.

Uma vez que os documentos estão dispersos por várias pastas efetuamos uma análise pasta a pasta e por cliente efetuando uma informação por cliente que se juntam em anexo III ao Anexo XXXV III.
As informações constantes em anexo tiveram por base os documentos apreendidos pelo SEF, relativamente aos quais foram tiradas cópias dos documentos que serviram de base para a informação deste relatório e que ficam a constar no processo do sujeito passivo.

O valor dos juros neste ano é de € 68.596,63, de acordo com as informações em anexo cuja relação se menciona no quadro seguinte:

CLIENTE
ANEXO N.º
    VALOR €
João ………Anexo III – 2.ª Apreensão
      1.004,75
José ……….Anexo IV – Apenso/Pasta 11
      1.730,73
Maria ………Anexo V – Apenso/Pasta 12
      1.386,58
Arlindo ……..Anexo VI – Apenso/Pasta 15
    13.164,30
Dionísio …..Anexo VII – Apenso/Pasta 17
      6.967,51
Mário …….Anexo VIII – Apenso/Pasta 19 e 25
      3.591,36
Vítor………Anexo IX - Apenso/Pasta 20
      1.154,00
Pedro …….. Anexo X – Apenso/Pasta 21
    13.130,98
Rui …………Anexo XI – Apenso/Pasta 22 e 27
      9.098,24
Jaime ……….Anexo XII – Apenso/Pasta 30
      2.687,56
Ildefonso …………Anexo XIII – Apenso/Pasta 34
      700,00
Sandra ……………Anexo XIV – Apenso/Pasta 36
      2.683,30
João ………Anexo XV – Apenso/Pasta 41
      652,00
Idilson ……..Anexo XVI – Apenso/Pasta 42
      750,00
C…….., Lda.Anexo XVI – Apenso/Pasta 42
      400,00
Euclides ………Anexo XVII – Apenso/Pasta 51
      172,74
João ………Anexo XVIII – Apenso/Pasta 53
      2.500,00
Manuel ………..Anexo XVIII – Apenso/Pasta 53
      571,59
Arnaldo ………..Anexo XVIII – Apenso/Pasta 53
      119,84
José ……………Anexo XVIII – Apenso/Pasta 53
      429,40
António ………..Anexo XIX – Apenso/Pasta 41
      5.307,75
Carlos ………..Anexo XXXXIII – Apenso/Pasta 66
      394,00
TOTAL
    68.596,63


Da consulta ao sistema informático, anexo J/Modelo 10 verifica-se que o sujeito passivo, obteve os seguintes rendimentos respeitante a dividendos:

Entidade
Valor
    Retenção
Banco …..
    1.414,00
      212,00
Banco ….
    135,00
20,00
Total
    1.549,00
      232,00

O sujeito passivo não declarou qualquer rendimento relativamente a esta categoria, o rendimento proposto é de € 70.145,63 (68.596,63+1.549,00) e o valor da retenção de IRS é de € 232,00.

1.1. 3 – Categoria F Introdução

Na análise aos documentos apreendidos pelo SEF, detetou-se a existência de recibos de arrendamento que dizem respeito a diversos locais pertença do sr. A…….. (registados ou não em seu nome mas sobre os quais exerce posse e gestão efetiva), contratos de arrendamento (outorgados pelo sr. A...... ou filhas), mapas de apuramento e controlo de cobranças, talões de depósitos, mapas, fichas individualizadas e escritos diversos referentes ao registo de recebimento de rendas pelo uso/ocupação por terceiros de terrenos e casas pertença do sr. A….. e filhas. Refira-se a existência de contratos de arrendamento bem como declarações de residência em moradas do sr. A......, outorgadas/emitidas pelo sr. A...... e filhas, para as quais não se detetaram recibos ou registos de cobrança para o período completo, não tendo sido apurados valores para esses hiatos temporais. Constata-se, nalguns casos, a existência de registos de recebimento duplicados, seja em mapas/fichas de controlo e em mapas de apresentação de contas, constando recibos ou não.

Perante estas situações inquirimos o S.P sobre – os prédios rústicos e urbanos constantes do património de suas filhas nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005 relativamente aos quais não foram declaradas rendas pelas mesmas, quando há por vezes contratos de arrendamento em seu nome – as rendas recebidas desses prédios a quem devem serem imputados esses rendimentos. O mesmo declarou que, relativamente aos prédios rústicos e urbanos pertencentes às suas filhas em que não foram declaradas as rendas pelas mesmas, as rendas recebidas devem ser imputadas a si próprio, conforme termo de declarações que se junta em anexo XXXIX.B.1.

No sentido de se confirmar as declarações do sujeito passivo, inquirimos a sua filha a senhora Isabel ………. sobre, os prédios rústicos e urbanos de que é ou foi proprietária nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005 relativamente aos quais houve ou não contratos de arrendamento em nome de seu pai, a quem devem ser imputadas as rendas recebidas e não declaradas por si. A mesma afirmou ditando que as rendas recebidas dos prédios rústicos e urbanos que não foram declaradas por si devem ser imputadas ao seu pai, tanto mais celebrou um contrato de comodato em 18 -12-2005 (XXXIX.B.ll) para entrar em vigor a partir de 1-01-2006, relativamente a vários prédios seus, que as rendas recebidas dos mesmos devem ser declaradas pelo seu pai, conforme termo de declarações em anexo XXXIX.B.4.

Uma vez que alguns prédios estão em nome das duas filhas do S.P., no sentido de se confirmar as declarações do S.P., inquirimos a sua filha Maria ………. sobre, os prédios rústicos e urbanos de que é ou foi proprietária nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005 relativamente aos quais houve ou não contratos de arrendamento em nome de seu pai, a quem devem ser imputadas as rendas recebidas e não declaradas por si. A mesma declarou ditando que as rendas recebidas dos prédios rústicos e urbanos de que é proprietária e que não foram declaradas por ela, devem serem imputadas ao seu pai, pois é ele que gere as rendas recebidas dos seus prédios e da sua irmã, sendo os valores declarados por ela somente referente às importâncias que o seu pai lhe dava relativamente a esses prédios, conforme termo de declarações em anexo XXXIX.B.7, tanto mais os prédios vieram para o seu património e da sua irmã através do seu pai pois foi ele quem pagou aos antigos proprietários.

Constataram-se também, casos em que valores recebidos, que inicialmente seriam considerados juros de empréstimos concedidos, decorrentes da atividade mutuária do sr. A......, se transformaram em rendas fruto de alteração de condições contratuais e também, situações em que não constando recibos ou comprovativos se confirmou a existência de rendas recebidas, ambas as situações apuradas com a colaboração do sr. A...... mediante esclarecimentos prestados em auto de declarações, perante situações em que os imóveis estão ou estiveram ocupados.

É de referir que, o sr. C...... aluga as suas instalações em situações muito díspares como seja, por períodos longos, curtos ou mesmo de uma só noite, com contrato de arrendamento ou sem ele, havendo mudança de ocupação dos espaços pela mesma pessoa. O sr. C...... possui alguns registos desses valores recebidos e datas de entrada e saída para seu próprio controlo, mas sem estrutura tipificada e uniforme ou coerente para apresentação externa a terceiros. Muitos dos inquilinos do Sr. C...... aparecem designados por nomes incompletos e cognomes identificativos, cujo objetivo é precisamente a sua identificação simples, em vez de nomes próprios (ex. Sorin da Raposa e Sorin Dorox – in relação de 1/12/2004, não deixando por isso de serem casos diferentes. Em mapas de controlo interno está assumido como notação interna, para procedimento, a declaração em sede de IRS de montantes inferiores ao recebido com ou sem recibo.


Os imóveis que originam os rendimentos prediais – rendas – são geridos e explorados pelo sr. A......, independentemente de estarem registados em seu nome ou de suas filhas (constam, no apenso 69 do SEF, procurações de Isabel …....... a conferir o poder, entre outros, de arrendar imóveis seus a A...... C...... – XXXIX.B. 11, 12 e 13), situação reiterada pelo sr. A...... conforme anexo XXXIX, pelas suas filhas Isabel ……. e Maria …… conforme autos de declarações constantes dos anexos XXXIX.B.4 e B.7, recebendo/cobrando o sr. C...... pessoalmente, no escritório, ou através de terceiros (ex. o acordo comercial com P…. D….. posterior a serviços de cobrança prestados), os correspondentes valores, conforme se comprova pelos seus registos pessoais constantes dos documentos apreendidos, não constando nestes documentos recibos para muitas das importâncias registadas como “recebidas” pelo sr. A.......

Com base nos elementos documentais supra referidos procedeu-se à recolha dos valores recebidos enquadráveis na categoria F de IRS (art.º 8.º) e à conferência com os valores declarados em sede de IRS pelo sr. A...... C...... e suas filhas, Maria ..... e Isabel ……., atendendo-se ás situações de duplicação de registos e destes com recibo emitido. Por outro lado, atendeu-se às situações em que no valor recebido (no caso de alguns recibos) está expressamente indicado um valor de água e luz, o qual não se considerou no apuro da renda.

Para todos os valores recolhidos e apurados estão explicitadas as suas fontes nas observações constantes mapas de apuramento dos anexos XXXIX.A 1 a 12, constando também nesses anexos os respetivos mapas de apuramento de rendimentos da categoria F por ano e locais.
Não foram consideradas neste apuramento as rendas de prédios situados na Rua da F….. n.º 21, Rua dos C……. e Rua 5 de O……, n.º 68, em que o sujeito passivo era responsável pelo recebimento das rendas ou procedia à sublocação dos mesmos.

a) Procedeu-se ao apuramento das rendas neste ano com base no: - mapa de “Rendas a partir de Setembro de 2002” incluso no apenso 1 da 2.ª apreensão do SEF, que inclui o mês de Agosto de 2002, elaborado pelo sr. A......; - registo constante no apenso 2 da 2.ª apreensão do SEF relacionado no n/ mapa de Registos Dispersos de Rendas e Declarações de Recebimento de Rendas; - apuramento das cobranças de rendas efetuadas por P….. D….. em 2002 (XXXIX.A 1), mapa este elaborado para apuro de contas de recebimentos e despesas efetuadas por P...... D........, relativo aos recebimentos efetivos de rendas de diversas pessoas, inquilinas do sr. C...... nas casas, espaços ou quartos, situados na Rua da E………., Infante D. H…….. e casa de M……, não constando para a maioria destes casos recibos emitidos nos documentos apreendidos pelo SEF (constantes nos apensos 54 e 57 da 1. ª apreensão e apenso 24 da 2.ª apreensão do SEF); - recibos emitidos, comprovados pela existência dos canhotos dos respetivos livros de recibos com o registo da identificação específica de nome e valor da renda, local e período de tempo; - registos diversos constantes no n/ mapa de recibos emitidos pelo sr. A...... C...... (XXXIX.A.7), originários de vários livros.
Apuramos o valor da correção conforme mapa em anexo XXXl X-C2, sendo os seguintes valores:


                RENDIMENTOS DA CATEGORIA F DE IRS/2002
1 - DECLARADO
    2 - CORREÇÃO
3 – APURADO
(2+1)
    A…..
    I……
    M…….
    TOTAL
    24.708,51
    935,00
-
    25.643,51
    106.962,55
    132.606,06

RENDIMENTOS DA CATEGORIA F DE IRS/2002


b) Da análise aos documentos constantes das pastas apreendidas, não constatámos qualquer documento emitido sob a forma legal em nome do sujeito passivo relativamente a despesas de manutenção e conservação elegíveis para este ano. Por sua vez o SP não declarou qualquer importância na dec. Mod. 3 de IRS deste ano.

c) Contribuição autárquica/IMI, apuramos o valor do Imposto Municipal sobre Imóveis e da Contribuição Autárquica relativo aos imóveis geradores de rendimentos nos diversos anos, liquidado ao sr. A...... ou ás suas filhas, considerando-se o imposto das diversas frações correspondentes ao mesmo n.º de porta na ausência de registo exato e que indique a fração do artigo matricial. Excetuou-se o valor das contribuições relativas aos prédios declarados pelas filhas do sr. A...... em cada ano para não haver duplicação do abatimento.

Deste modo de acordo com o mapa em anexo XXXIX-D2, apuraram-se os seguintes valores:

CA
Ano
2002
      Valor Declarado
280,80
      Valor Corrigido
799,48
Valor Total
1.080,28

e) Das rendas recebidas foi efetuada a retenção na fonte do valor de € 763,16 pela empresa João S…….., Lda., referente ao arrendamento do imóvel denominado “casa de M……”, sito na Rua V……. – M….., no ano de 2002.

1.1.4-IMPOSTO DE SELO.

(…)

Capitulo IX – Direito de audição


O sujeito passivo exerceu o direito de audição nos termos do artigo 60.º da LGT e do artigo 60.º do RCPIT, com as seguintes alegações, as quais passamos a analisar uma a uma.
Ponto 1 – O sujeito passivo alega que foi enquadrado oficiosamente na categoria B do IRS, obtendo ainda rendimentos de outras categorias de rendimento.

Relativamente a este ponto como é mencionado no Capitulo III, ponto 3.1 deste relatório foi enquadrado oficiosamente na Categoria B o sujeito passivo pela atividade exercida de comissionista na venda de carros e na compra e venda de bens imobiliários, visto o mesmo ter rendimentos nestas atividades.

Ponto 2 - O sujeito passivo alega que ao analisar o projeto de relatório de que foi notificado, vê -se impossibilitado de, no prazo de dez dias, poder pronunciar-se sobre cada um dos factos que lhe são imputados, por falta de notificação dos documentos que no relatório se mencionam e cuja notificação ao sujeito passivo foi omitida.

Relativamente a este ponto foi o sujeito passivo notificado do projeto de relatório no dia 3-05-2007, de todos os documentos que fazem parte do referido projeto.

Foi concedida, por despacho de dia 2007-05-15, do Chefe de Divisão da Divisão de Inspeção Tributária I, a prorrogação por mais cinco dias, a contar dessa data, do prazo da audição prévia (artigo 60.º da LGT e do RCPIT) perfazendo o prazo máximo permitido por Lei, quinze dias, que terminou no dia 21-05-2007, cuja notificação foi efetuada na pessoa do Mandatário do S. P. (Dr. J. L……. Reis) em 2007-05-15.

Esteve disponível nestes Serviços, para consulta, toda a documentação constante do processo individual que serviu de base à quantificação constante do projeto de relatório, conforme cópia da notificação do mandatário relativamente a este despacho de que se junta em anexo XLIX, situação esta, da qual o S.P. não quis usufruir.

Ponto 3 - Alega o sujeito passivo que para se exercer o direito de audição com rigor e certeza é necessário analisar e examinar os documentos comprovativos de cada uma das situações tributárias descritas nos anexos I a XLVIII ao projeto de relatório de Inspeção Tributária e controlar a quantificação dos rendimentos que os inspetores apuraram e enquadraram em 2002, 2003, 2004 e 2005, na categorias B, E e F, análise e quantificação essas impossíveis de efetuar sem estar na posse dos documentos e dos cálculos que originaram os montantes apurados para cada uma das Categorias de Rendimento.

A presente alegação já foi abordada na parte final do ponto anterior.


O sujeito passivo participou no apuramento dos factos conforme se comprova quer pelos autos de declarações prestadas quer por elementos novos apresentados de que são exemplo as cópias de diversos recibos de rendas recebidas relativos ao 2.º semestre do ano 2005.

Constam nos anexos do projeto mapas e informações, em que são devidamente relacionados, explanados e quantificados os factos tributários e todos os valores apurados.

Ponto 4 - Neste ponto o sujeito passivo transcreve somente as correções efetuadas relativamente aos rendimentos da Categoria E, nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005, não contrariando nem os factos nem os valores apurados.

Ponto 5 e 6 – Alega o sujeito passivo não dispor dos documentos que serviram de base ao apuramento dos rendimentos quantificados e enquadrados na Categoria E, pois, como refere o Projeto de Relatório os mesmos foram apreendidos pelo SEF e as cópias que serviram de base para informação do relatório ficaram no processo do sujeito passivo e não acompanharam o Projeto de Relatório.
Sem documentos e sem menção dos cálculos no Projeto de Relatório, toma-se impossível exercer o direito de audição sobre os valores determinados e enquadrados como rendimentos da Categoria E.

A presente alegação já foi abordada na parte final do ponto 2.


Ponto 7 - Neste ponto o sujeito passivo transcreve as correções a rendimentos da Categoria F mencionadas no projeto de relatório, nos anos de 2002, 2003 e 2005, não contrariando os valores apurados.

Ponto 8 - Alega o sujeito passivo não dispor dos documentos que serviram de base ao apuramento dos rendimentos quantificados e enquadrados na Categoria F, pois, como refere o Projeto de Relatório os mesmos foram apreendidos pelo SEF e não acompanharam o Projeto de Relatório.

Relativamente a este ponto, o projeto de relatório foi elaborado tendo por base os documentos apreendidos que serviram de base ao apuramento dos rendimentos quantificados nesta Categoria.

Os documentos não acompanharam o projeto de relatório pois os mesmos fazem parte dos documentos de trabalho e que ficam a constar no processo do sujeito passivo.

Ponto 9 - Alega o sujeito passivo que sem documentos e sem uma explicita quantificação no Projeto de relatório dos valores e métodos seguidos para determinação dos rendimentos enquadrados na Categoria F torna-se impossível exercer o direito de audição.

Os valores apurados constam em mapas e quadros onde são inventariados, especificados e discriminados exaustivamente os valores recebidos e os considerados, locais ocupados, os inquilinos, períodos temporais e fonte documental. Nestes apuramentos participou também o sujeito passivo, quer pela confirmação de ocupantes/inquilinos, quer pela entrega de cópias de recibos relativamente ao 2.° semestre do ano 2005, no decorrer do procedimento inspetivo.

Também relativamente a este ponto, a quantificação tem por base os documentos de trabalho que ficam a constar no processo do sujeito passivo e a documentação esteve disponível para consulta conforme já se referiu na parte final do ponto 2.

Ponto 10 - Alega o sujeito passivo que a administração tributária deverá notificar os sujeitos passivos de todos os documentos e elementos omitidos, que tiveram na base de todos os cálculos e conclusões insertas no relatório de fiscalização, após o que se deve facultar ao sujeito passivo o direito de audição, sob pena de, caso assim se não proceda, se verificar a nulidade de todos os atos posteriores.

Relativamente a este ponto, foi o sujeito passivo notificado do projeto de relatório, no dia 2007-05-03 de todos os documentos integrantes do referido projeto, ficando a fazer parte dos documentos de trabalho constantes do processo do sujeito passivo os documentos de onde foi retirada informação, cuja consulta foi autorizada conforme já se referiu na parte final do ponto 2.

No dia 21 de maio o sujeito passivo através do seu mandatário, apresentou o requerimento que se junta em anexo L, veio requerer ao abrigo do art.º 37.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) a certidão de todos os documentos nos quais se baseou a administração tributária para fazer prova e quantificar todas as correções à matéria tributável nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005.

Sobre este requerimento, recaiu despacho de 22/05/2007, do Chefe de Divisão da Divisão de Inspeção Tributária I, no âmbito da delegação de competências, cujo teor consta em anexo LI.

Pelo anteriormente exposto relativamente à análise dos fundamentos alegados pelo sujeito passivo no direito de audição, conclui-se não terem sido contestados ou contrariados os valores da correção, nem terem sido apresentados elementos adicionais que pudessem pôr em causa os rendimentos apurados no projeto de correções, razão pela qual se mantêm os valores propostos no capitulo III deste relatório, apesar da administração tributária ter concedido ao S. P. (como já foi referido) a prorrogação do prazo inicialmente concedido de dez dias e o ter transformado em 15 dias, e, ainda, ter disponibilizado a consulta de todos os elementos constantes do processo, possibilidade essa que o sujeito passivo desperdiçou.

Para os devidos efeitos vão ser elaborados os documentos de Correção os DC e o auto de noticia pelas infrações praticadas. - (cfr. f ls. 86 a 126 do processo de reclamação graciosa apenso).


C)

Em 31-05-2005, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de IRS n.º 2007 5000…….. em nome da ora impugnante, relativa ao ano de 2002, com o montante a pagar de € 81.070,22, com os respetivos juros compensatórios. - (cfr. doc. de f ls. 34 do processo de reclamação graciosa apenso).

D)

Em 05-11-2007 os ora impugnantes apresentaram no Serviço de Finanças de Almeirim reclamação graciosa da liquidação de IRS referida na alínea anterior, na qual, em 08-05-2008, foi pelo Diretor de Finanças de Leiria proferido despacho de indeferimento. – (cfr. carimbo aposto a f ls. 2 e f ls. 406 do processo de reclamação graciosa em apenso).

E)

Em 24-06-2008 os impugnantes intentaram recurso hierárquico da decisão mencionada na alínea anterior, o qual foi indeferido por despacho do Subdiretor Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira de 26-03-2009. – (cfr. processo de recurso hierárquico em apenso).

F)

Corre termos nos Serviços do Ministério Público de Almeirim o processo de inquérito n.º 323/09.3TAALR, em que é arguido o aqui impugnante. – (cfr. f ls. 193 dos autos).
G)

Em 03-07-2009 deu entrada neste tribunal a petição inicial da presente impugnação judicial.

– (cfr. f ls. 2 destes autos).

**

Factos não provados

Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes dos presentes autos, todos objecto de análise concreta, não se provaram quaisquer outros passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito e que importe registar como não provados.


**

Motivação da Decisão de Facto

A decisão da matéria de facto efetuou-se com base no exame dos documentos constantes destes autos e dos processos administrativos apensos, bem como no depoimento das testemunhas arroladas, conforme se refere em cada alínea do probatório.
Foi ponderado o depoimento de João ……., que conhece o impugnante há 30 anos, foi seu rendeiro e fez com ele alguns negócios. Afirmou, em síntese, saber que o impugnante tem um escritório com porta aberta em Almeirim, onde arrenda casas e terreno s e empresta dinheiro a pessoas, tendo-lhe emprestado também a si. Explicitou que quando era comerciante de tratores recebia cheques pré datados e o A...... trocava-lhe os cheques, mediante a entrega do dinheiro e a cobrança de alguns juros. Disse que na zona toda a gente sabia que o impugnante emprestava dinheiro a juros e que arrendava casas, tendo placards nos vidros do escritório a publicitar esses arrendamentos. Sabe que alguns imóveis são das filhas mas ele é que trata de tudo. Chegou a ver lá as filhas e os genros mas só se falava com o C.......
Foi ponderado o depoimento de David …….., comerciante, que conhece o A...... de negócios, desde há 15/20 anos. Prestou depoimento na linha do afirmado pela anterior testemunha.
Foi ponderado o depoimento de Manuel ……., carpinteiro, que afirmou conhecer o impugnante dos negócios, que emprestou dinheiro ao depoente, no escritório em Almeirim, ao pé dos correios e que lhe pagou juros do empréstimo. Afirmou que o impugnante é conhecido na zona por emprestar dinheiro.
Foi ponderado o depoimento de Isabel ………., filha do impugnante. Afirmou que o pai arrendava prédios urbanos e rústicos, sendo ele que faz a administração dos prédios, recebe as rendas, pagas as despesas de manutenção, faz tudo. Disse que os seus pais é que puseram os prédios em seu nome e de sua irmã. Esclareceu que o dinheiro das rendas é dele, que faz tudo com plena autonomia e no fim do ano retribui alguma coisa às filhas. Disse que passa pelo escritório todas as semanas e escreve no computador os contratos de arrendamento e passa recibos em nome do pai.
Foi ponderado o depoimento de José ……, inspetor tributário que realizou a ação de inspeção questionada nos autos que confirmou o teor do relatório, não relevando para a prova de qualquer facto autónomo, para além dos já comprovados documentalmente.
Foi ponderado o depoimento de Maria ……….., filha do impugnante, professora, que afirmou saber que o pai arrendava casas, umas dele e outras de outras pessoas, algumas das filhas mas ele é que as geria. Sabe que emprestava dinheiro mas não sabe a quem.
Foi ponderado o depoimento de Vítor ………, comerciante, que conhece o impugnante desde pequeno, sendo seu amigo e a quem pediu dinheiro que lhe emprestava sem juros por serem pequenas quantias, por pouco tempo e porque também lhe fazia trabalhos. Recorda-se que tinha uma hipoteca ao banco e pediu-lhe para pagar a hipoteca à Caixa A……., o que fez e cobrou-lhe juros. O depoente não conseguiu pagar e o impugnante ficou-lhe com a casa, tendo-lhe, após, arrendado uma casa para viver. Tinha um escritório em Almeirim, onde lhe pagava a renda.
Foi ponderado o depoimento de Dionísio …….., motorista, que afirmou conhecer o impugnante desde que era negociante de fruta, que precisou de dinheiro e pediu dinheiro ao impugnante, tendo-lhe pago o empréstimo. Disse que a filha Isabel também tratava das coisas, no escritório ou às vezes em casa. Afirmou que inicialmente pensava que o seu caso com o impugnante era pontual mas posteriormente apercebeu-se que havia mais pessoas na sua situação.

No que respeita a estas testemunhas, arroladas pelo impugnante e pela Fazenda Pública, tratam-se por um lado, de pessoas envolvidas diretamente nos negócios do impugnante e, por outro lado, as suas filhas, com interesse na causa, as quais não prestaram depoimentos por forma a concluir-se estarem imbuídos do distanciamento necessário e serem isentos, não logrando convencer o tribunal da sua veracidade. Por outro lado dos seus depoimentos não resulta a prova de qualquer outro facto autónomo para além dos já apurados em sede de inspeção e por isso não relevando para a prova de qualquer factualidade que não estivesse já apurada e assente.

Quanto ao aditamento de Factos.
O RECORRENTE defende que a sentença errou no julgamento da matéria de facto e que deverão ser aditados ao probatório factos que se encontram provados não só por acordo mas também por terem sido referidos pela AT no processo de reclamação graciosa e no despacho de indeferimento do Recurso hierárquico.
Tais factos são os seguintes:
A ação de fiscalização terminou no dia 26/4/2007 com a notificação da nota de diligência NDO2007….. .
A liquidação de IRS do ano de 2002 foi notificada ao impugnante no dia 13 de junho de 2007.

Efetivamente consta dos autos de reclamação graciosa apenso (fls. 390) que “em 26.04.2007, o reclamante foi notificado da nota de diligência NDO2007…….. e que em 13.06.2007 foram os sujeitos passivos devidamente notificados da liquidação reclamada.

A nota de diligência NDO2007…. consta dos autos de reclamação graciosa a fls. 70 e dá conta de que a inspeção foi iniciada em 2006/11/28 e concluída em 2007/04/26.

Todavia, a nota de conclusão dos atos de inspeção não é o mesmo que conclusão do procedimento de inspeção como resulta claro do disposto nos artigos 61º /1 e 62º/1 RCPIT.

Por isso, quando o RECORRENTE pretende que a ação de fiscalização terminou no dia 26/4/2007 com a notificação da nota de diligência NDO2007…..” para efeitos da contagem do prazo de caducidade, não lhe assiste razão uma vez que o procedimento de fiscalização só termina, efetivamente, com a notificação do RIT.
E só o termo do procedimento de fiscalização releva para cálculo do prazo de caducidade.
Por conseguinte, o aditamento deste facto não tem a mínima pertinência para os autos.

Mas é certo que a notificação da liquidação ocorreu em 13/6/2007.
Tal facto não se encontra autonomizado na matéria de facto provada embora tenha sido tomado em consideração pelo MMº juiz na fundamentação da improcedência do pedido de caducidade do direito à liquidação (fls. 18 da sentença).

Mas em benefício da clarificação factual, adita-se o facto C1 com a seguinte redação:

A notificação da liquidação referida na alínea anterior ocorreu em 13/6/2007.

Para além disso, corrige-se o facto provado constante da alínea C) na parte em que refere “Em 31-05-2005, a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu a liquidação de IRS n.º 2007 5000058...”. Trata-se de mero lapso, pois a liquidação em causa foi efetuada em 31/5/2007, como resulta de fls. 34 do apenso de reclamação graciosa.

Assim, corrige-se a alínea C) na parte respeitante à data da emissão da liquidação.


IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Nas conclusões 1 a 8 defende o RECORRENTE que a sentença errou ao decidir não se verificar a caducidade do direito à liquidação porque a ação de inspeção iniciou-se em 28/11/2006 e teve o seu termo em 26/4/2007. Sendo a liquidação relativa a IRS de 2002, a caducidade deveria operar no dia 31/12/2006, suspendeu-se no dia 28/11/2006 faltando então 34 dias para se verificar.
A contagem do prazo de 34 dias reiniciou-se no dia seguinte ao termo da inspeção ou seja, no dia 27/4/2007, pelo que a liquidação deveria ter sido notificada até 30/5/2007. Como só foi notificada em 13/6/2007, já se tinha concretizado a caducidade do direito à liquidação.

Sdr, afigura-se-nos que o RECORRENTE não tem razão.
O direito de liquidar tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro (art. 45º/1 LGT), prazo que se conta, nos impostos periódicos, como são os impostos sobre o rendimento, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (Art.º 45º/4 LGT).

O prazo de caducidade suspende-se com a notificação da ordem de serviço ou despacho do início da inspeção externa, cessando esse efeito, contando-se o prazo do seu início caso a duração da inspeção tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação (art.º 46º/1, na redação aplicável, LGT).

A inspeção não durou mais de seis meses, pois tendo sido iniciada em 28/11/2006, foi concluída 26/4/2007. Ou seja, durou menos de cinco meses.

Saliente-se que o acto que assinala o termo da inspeção não é a conclusão dos actos de inspeção, que ocorre na data da notificação da nota de diligência emitida pelo funcionário incumbido do procedimento (26/4/2007) como resulta do art.º 61º/1 RCPIT, mas sim com a notificação do relatório da Inspeção Tributária. Relatório final, em 23/5/2007 (não basta o projecto de conclusões, como decidiu ao c. do Pleno da Secção do CT de 21/9/2016, processo n.º 01475/15[1]).

Depois, como segundo fundamento para a improcedência da exceção de caducidade do direito à liquidação o MMº juiz "a quo" considerou que estando em curso inquérito crime com o n.º 323/09.3 TAALR instaurado contra o Impugnante, nos termos do art.º 45º/5, a redação da Lei n.º 60-A/2005, de 30/12, o prazo de caducidade alarga-se até ao arquivamento dou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.

O RECORRENTE contrapõe que esta suspensão é inaplicável ao caso uma vez que no período correspondente ao prazo de caducidade ainda não tinha sido instaurado processo crime pelos factos constantes do relatório.

Em rigor não conhecemos a data da instauração inquérito crime. Mas sabemos que o mesmo tem a numeração de 2009 (323/09.3TAALR), de onde podemos concluir que o mesmo foi instaurado no decurso do ano de 2009. Assim sendo, em 2009 já não estava em curso o prazo de caducidade do direito à liquidação porque a notificação tempestiva da liquidação fez cessar a aplicação daquele prazo e do respetivo regime.

Por conseguinte, tendo presente que a notificação da liquidação ocorreu em 13/6/2007, e que o inquérito crime foi instaurado em 2009, consideramos inaplicável a suspensão do prazo de caducidade previsto no n.º 5 do art. 45º LGT, não acompanhando nesta parte, a fundamentação da douta sentença.

Contas feitas, temos que:
Sendo a liquidação relativa a 2002, a caducidade do direito à liquidação expirava em 31/12/2006;
A fiscalização teve início em 28/11/2006 e terminou em 23/52007;
A marcha do prazo de caducidade esteve suspensa durante 34 dias;
A contagem do prazo foi retomada em 24/5/2007;
O que levaria à caducidades em 28/6/2007 = (23/5/2007+34D);
Tendo a liquidação sido notificada em 13/6/2007 é manifesta a improcedência da exceção de caducidade.

Prosseguindo, vejamos agora a alegada errónea qualificação e quantificação dos rendimentos.
No âmbito da inspeção que lhe foi efetuada, a AT corrigiu os valores da matéria tributável de IRS para os montantes de € 187.108,18 sendo € 10.000,00 respeitantes a rendimento da categoria B, € 70.145,63 da categoria E € 106.962,55 da categoria F.
A ação de fiscalização foi efetuada na sequência de apreensão pelo “SEF” de várias pastas de documentos e livros de recibos que se encontravam no escritório do Sujeito Passivo relacionados com a actividade por si exercida.

Da análise de tais documentos a AT verificou que o Sujeito Passivo obtém rendimentos derivados de empréstimos concedidos em dinheiro com garantias reais e sem garantias, sendo as garantias escrituras de mútuo com hipoteca, procurações com poderes irrevogáveis cheques pré datados dos clientes relativamente ao valor da dívida e letras de câmbio assinados pelo cliente em branco, elaborando declarações de dívida e mútuo acordo e compromisso de pagamento.
Além das declarações de dívida por vezes pela antecipação da data de pagamento de cheques pré- datados também cobrava juros.

O Contribuinte vendeu em 2002 o lote de terreno U-60…. pelo valor de € 10.000,00, o que levou à integração oficiosa na categoria B, por ser uma atividade comercial prevista no art. 3º do CIRS, fazendo ainda parte do seu património alguns lotes de terreno e recebeu comissões pela venda de carros.
Também obtém rendimentos do arrendamento de imóveis rústicos e urbanos inscritos em seu nome, em nome das suas filhas ou de outrem.

Em relação aos empréstimos que concedia por vezes para o mesmo cliente as declarações de divida ou eram em nome do sujeito passivo ou eram em nome da sua filha a senhora Isabel ………., havendo cheques emitidos pela sua filha para declarações de divida de clientes do sujeito passivo e cheques do sujeito para declarações de divida da sua filha.

Por vezes as declarações de divida são em nome do sujeito passivo, passando depois o valor da divida por garantia real através de hipoteca de mútuo para nome de sua filha e nalgumas situações os imóveis que serviam de garantia nos mútuos com hipoteca a favor de sua filha vinham para a posse do sujeito passivo e vice-versa.

Perante esta situação, a AT inquiriu o sujeito passivo em relação aos empréstimos realizados pela sua filha, indagando quem é que o emprestava na realidade e quanto aos juros cobrados em nome da sua filha, a quem eram imputados esses rendimentos.

O sujeito passivo declarou que o dinheiro dos empréstimos era seu visto a conta bancária ser conjunta e que os juros dos empréstimos devem ser-lhe imputados

No sentido de se confirmar as declarações do sujeito passivo, foi inquirida a Sra. Isabel ……… sobre as mesmas questões, filha do Impugnante, tendo respondido que “...os empréstimos de Mutuo com Hipoteca e as declarações de divida de Mutuo Acordo e termo de responsabilidade de pagamento entre outras, o dinheiro emprestado era do seu pai, ou da sua responsabilidade, quanto aos juros dos empréstimos por si celebrados devem ser imputados ao seu pai, pois era ele que emprestava o dinheiro.”

Visando comprovar os valores constantes das declarações de divida, a AT solicitou a alguns clientes toda a documentação relacionada com os empréstimos obtidos, verificando-se que os clientes não possuíam qualquer documentação pois as declarações de divida eram assinadas nunca ficando os mesmos com cópia dessas declarações de divida, somente recebiam por vezes correspondência.

Por vezes também não sabiam qual a taxa de juro praticada relativamente aos empréstimos obtidos, e que os empréstimos obtidos tinham sido concedidos pelo senhor A......, apesar de assinarem declarações de divida e escrituras de mútuo e hipoteca em nome da sua filha.


A taxa de juro praticada relativamente aos empréstimos variava entre 1% a 5% ao mês.
Os juros eram calculados à cabeça, motivo pelo qual as declarações de dívida nunca fazem referência a juros/despesas de manutenção, os juros são calculados mensalmente.

Em face do exposto, decidiu a AT que os juros referentes aos empréstimos concedidos pelo sujeito passivo são considerados nos termos do artigo 5.º e artigo 7.º do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares – Rendimentos da Categoria E, ascendendo ao montante de € 68.596,63.

Para além disso, da consulta ao sistema informático, verificou-se que o sujeito passivo, obteve os seguintes rendimentos respeitante a dividendos:

Entidade
Valor
    Retenção
Banco ……
    1.414,00
      212,00
Banco …………
    135,00
20,00
Total
    1.549,00
      232,00

Contudo, não declarou qualquer rendimento relativamente a esta categoria. Por conseguinte, o rendimento proposto é de € 70.145,63 (68.596,63+1.549,00) e o valor da retenção de IRS é de € 232,00.

Prosseguindo a análise aos documentos apreendidos pelo SEF, detetou-se a existência de recibos de arrendamento que dizem respeito a diversos locais pertença do sr. A...... (registados ou não em seu nome mas sobre os quais exerce posse e gestão efetiva), contratos de arrendamento (outorgados pelo sr. A...... ou filhas), mapas de apuramento e controlo de cobranças, talões de depósitos, mapas, fichas individualizadas e escritos diversos referentes ao registo de recebimento de rendas pelo uso/ocupação por terceiros de terrenos e casas pertença do sr. A...... e filhas.

De referir a existência de contratos de arrendamento bem como declarações de residência em moradas do sr. A......, outorgadas/emitidas pelo sr. A...... e filhas, para as quais não se detetaram recibos ou registos de cobrança para o período completo, não tendo sido apurados valores para esses hiatos temporais. Constata-se, nalguns casos, a existência de registos de recebimento duplicados, seja em mapas/fichas de controlo e em mapas de apresentação de contas, constando recibos ou não.

Perante estas situações foi inquirido o S.P sobre – os prédios rústicos e urbanos constantes do património de suas filhas nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005 relativamente aos quais não foram declaradas rendas pelas mesmas, quando há por vezes contratos de arrendamento em seu nome – as rendas recebidas desses prédios a quem devem serem imputados esses rendimentos. O mesmo declarou que, relativamente aos prédios rústicos e urbanos pertencentes às suas filhas em que não foram declaradas as rendas pelas mesmas, as rendas recebidas devem ser imputadas a si próprio.

No sentido de se confirmar as declarações do sujeito passivo, foi inquirida a sua filha a Sra. Isabel ……… sobre, os prédios rústicos e urbanos de que é ou foi proprietária nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005 relativamente aos quais houve ou não contratos de arrendamento em nome de seu pai, a quem devem ser imputadas as rendas recebidas e não declaradas por si.

A mesma afirmou que as rendas recebidas dos prédios rústicos e urbanos que não foram declaradas por si devem ser imputadas ao seu pai, tanto mais que celebrou um contrato de comodato em 18 -12-2005 para entrar em vigor a partir de 1-01-2006, relativamente a vários prédios seus, que as rendas recebidas dos mesmos devem ser declaradas pelo seu pai.

Uma vez que alguns prédios estão em nome das duas filhas do S.P., no sentido de se confirmar as declarações do S.P., inquiriu-se a sua filha Maria ........ sobre os prédios rústicos e urbanos de que é ou foi proprietária nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005 relativamente aos quais houve ou não contratos de arrendamento em nome de seu pai, a quem devem ser imputadas as rendas recebidas e não declaradas por si.

A mesma declarou que as rendas recebidas dos prédios rústicos e urbanos de que é proprietária e que não foram declaradas por ela, devem serem imputadas ao seu pai, pois é ele que gere as rendas recebidas dos seus prédios e da sua irmã, sendo os valores declarados por ela somente referente às importâncias que o seu pai lhe dava relativamente a esses prédios, tanto mais que os prédios vieram para o seu património e da sua irmã através do seu pai pois foi ele quem pagou aos antigos proprietários.

Constataram-se também casos em que valores recebidos, que inicialmente seriam considerados juros de empréstimos concedidos, decorrentes da atividade mutuária do sr. A......, se transformaram em rendas fruto de alteração de condições contratuais e também, situações em que não constando recibos ou comprovativos se confirmou a existência de rendas recebidas, ambas as situações apuradas com a colaboração do sr. A...... mediante esclarecimentos prestados em auto de declarações, perante situações em que os imóveis estão ou estiveram ocupados.

O sr. A...... C...... aluga as suas instalações em situações muito díspares como seja, por períodos longos, curtos ou mesmo de uma só noite, com contrato de arrendamento ou sem ele, havendo mudança de ocupação dos espaços pela mesma pessoa.

O sr. C...... possui alguns registos desses valores recebidos e datas de entrada e saída para seu próprio controlo, mas sem estrutura tipificada e uniforme ou coerente para apresentação externa a terceiros.

Muitos dos inquilinos do Sr. C...... aparecem designados por nomes incompletos e cognomes identificativos, cujo objetivo é precisamente a sua identificação simples, em vez de nomes próprios (ex. Sorin da Raposa e Sorin Dorox – in relação de 1/12/2004, não deixando por isso de serem casos diferentes. Em mapas de controlo interno está assumido como notação interna, para procedimento, a declaração em sede de IRS de montantes inferiores ao recebido com ou sem recibo.

Assim, a AT considerou que os imóveis que originaram os rendimentos prediais – rendas – são geridos e explorados pelo sr. A......, independentemente de estarem registados em seu nome ou de suas filhas, situação reiterada pelo sr. A...... pelas suas filhas Isabel ….. e Maria ……., recebendo/cobrando o sr. C...... pessoalmente, no escritório, ou através de terceiros (ex. o acordo comercial com P...... D........ posterior a serviços de cobrança prestados), os correspondentes valores, conforme se comprova pelos seus registos pessoais constantes dos documentos apreendidos, não constando nestes documentos recibos para muitas das importâncias registadas como “recebidas” pelo sr. A.......

Com base nos elementos documentais supra referidos procedeu-se à recolha dos valores recebidos enquadráveis na categoria F de IRS (art.º 8.º) e à conferência com os valores declarados em sede de IRS pelo sr. A...... C...... e suas filhas, Maria ..... e Isabel ……, atendendo-se às situações de duplicação de registos e destes com recibo emitido. Por outro lado, atendeu-se às situações em que no valor recebido (no caso de alguns recibos) está expressamente indicado um valor de água e luz, o qual não se considerou no apuro da renda.

Não foram consideradas neste apuramento as rendas de prédios situados na Rua da F….. n.º 21, Rua dos C….. e Rua 5 de O………., n.º 68, em que o sujeito passivo era responsável pelo recebimento das rendas ou procedia à sublocação dos mesmos.

Procedeu-se ao apuramento das rendas neste ano com base no mapa de “Rendas a partir de Setembro de 2002” o que implicou uma correção no montante de € 106.962,55 aos valores declarados, perfazendo uma colecta de € 132.606,06.

                RENDIMENTOS DA CATEGORIA F DE IRS/2002
1 – DECLARADO
    2 - CORREÇÃO
3 – APURADO
(2+1)
    A……
    I…….
    M……
    TOTAL
    24.708,51
    935,00
-
    25.643,51
    106.962,55
    132.606,06

Na douta petição inicial, o IMPUGNANTE/RECORRENTE alega em síntese que

- As correções efetuadas são ilegais uma vez que alguns juros/despesas de manutenção respeitam a créditos concedidos pela empresa de Isabel ……… para aquisição de um tractor agrícola ou venda de Ford Transit matrícula …-29-86. São rendimentos que constituem proveitos da categoria B e são proveito da empresa Isabel ……….., e não do Impugnante.

- Os juros pagos relativos a capital em dívida titulado por letras que foram objecto de sucessivas amortizações e reformas, provenientes de transações comerciais são rendimentos da categoria B.
- Do mesmo modo, os juros decorrentes de contratos de mútuo que proporcionem, a título oneroso, a disponibilidade temporária de dinheiro ou outras coisas fungíveis são tributados em IRS pela categoria B.

Para além disso, deteta outros erros na liquidação, assim:

- A AT considerou como juros de empréstimo a totalidade do valor mensal recebido, que incluía a amortização de capital e juros.

- Foram apurados juros relativos a 2002 e 2003 quando o empréstimo ocorreu em 2003 (16/7/2003 – cliente Vítor …..).

- Imputam-se rendimentos ao Impugnante em resultado de contratos que não outorgou (cliente Pedro ……..);

E no que respeita à tributação pela categoria F foram cometidas ilegalidades resultantes da falta de fundamentação e de erro sobre a titularidade dos rendimentos.
Assim, a AT declara ter detetado a existência de recibos de renda que dizem respeito a diversos locais que serão, ou não pertença do Sr. A......, mas que sobre os mesmos exerce uma gestão efetiva.

- Contudo, a gestão ou administração por parte do Impugnante de prédios de terceiros, celebrando contratos de arrendamento e recebendo rendas, consubstancia uma actividade empresarial, tributada em sede de IRS na categoria B e não pela categoria F, uma vez que não é titular dos rendimentos.

- A titularidade das rendas e a incidência do imposto sobre tal rendimento afere-se pelo direito de propriedade sobre um imóvel e não pode ser alterada pela vontade dos particulares, nomeadamente pela vontade de um pai em beneficiar as filhas.

O MMº juiz refletiu assim sobre as questões enunciadas:

“O impugnante defende a existência de erro e violação de lei no enquadramento, quantificação e qualificação dos factos tributários e dos rendimentos nas diversas categorias do imposto e a sua subsunção às normas que os regulam e tributam, uma vez que, no que respeita ao enquadramento de rendimentos na categoria E, este é ilegal por falta de fundamentação, erro de quantificação e qualificação e violação de lei dado que deveriam ter sido objeto de tributação na categoria B, ou imputados a terceiros e não ao ora impugnante.
Quanto ao enquadramento dos rendimentos na categoria F considera que este é errado na justa medida em que, ou a AT os imputava ao impugnante em sede de categoria B (rendimentos provenientes da atividade empresarial traduzida na gestão de imóveis) ou os imputava às titulares (proprietárias) dos imóveis, em sede de categoria B ou F, consoante tais rendimentos fossem ou não imputáveis ao exercício de uma atividade empresarial. Com efeito, face do disposto no art.º 8.° do CIRS, na categoria F só se enquadram os rendimentos prediais colocados à disposição dos titulares (proprietários) dos prédios arrendados, e desde que não sejam auferidos no exercício de uma atividade empresarial, o que não foi o caso. Por isso, impunha-se uma tributação diferente.
Atentemos nestas questões.


Dispõe o art.º 1.º do Código do IRS que “1 - O imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) incide sobre o valor anual dos rendimentos das categorias seguintes, mesmo quando provenientes de atos ilícitos, depois de efetuadas as correspondentes deduções e abatimentos:
Categoria A - Rendimentos do trabalho dependente; Categoria B - Rendimentos empresariais e profissionais; Categoria E - Rendimentos de capitais;
Categoria F - Rendimentos prediais (…).”.


O art.º 3.º, n.º 1 deste código, estabelece quais os rendimentos que devem ser considerados de natureza empresarial ou profissional, a saber:
a) Os decorrentes do exercício de qualquer atividade comercial, industrial, agrícola, silvícola ou pecuária;
b) Os auferidos no exercício, por conta própria, de qualquer atividade de prestação de serviços, incluindo as de carácter científico, artístico ou técnico, qualquer que seja a sua natureza, ainda que conexa com atividades mencionadas na alínea anterior;
c) Os provenientes da propriedade intelectual ou industrial ou da prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico, quando auferidos pelo seu titular originário.”.
O n.º 2 deste normativo considera ainda rendimentos desta categoria “a) Os rendimentos prediais imputáveis a atividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais;
b) Os rendimentos de capitais imputáveis a atividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais.”.

Por seu turno, o art.º 5.º do código em presença, enquadra os r endimentos da categoria E da seguinte forma: “1 - Consideram-se rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sejam pecuniários ou em espécie, procedentes, direta ou indiretamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, bem como da respetiva modificação, transmissão ou cessação, com exceção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias.

2 - Os frutos e vantagens económicas referidas no número anterior compreendem, designadamente:
a) Os juros e outras formas de remuneração decorrentes de contratos de mútuo, abertura de crédito, reporte e outros que proporcionem, a título oneroso, a disponibilidade temporária de dinheiro ou outras coisas fungíveis;
b) Os juros e outras formas de remuneração derivadas de depósitos à ordem ou a prazo em instituições financeiras, bem como de certificados de depósitos;
c) Os juros, os prémios de amortização ou de reembolso e as outras formas de remuneração de títulos da dívida pública, obrigações, títulos de participação, certificados de consignação, obrigações de caixa ou outros títulos análogos, emitidos por entidades públicas ou privadas, e demais instrumentos de aplicação financeira, designadamente letras, livranças e outros títulos de crédito negociáveis, enquanto utilizados como tais;
d) Os juros e outras formas de remuneração de suprimentos, abonos ou adiantamentos de capital feitos pelos sócios à sociedade;
e) Os juros e outras formas de remuneração devidos pelo facto de os sócios não levantarem os lucros ou remunerações colocados à sua disposição;
f) O saldo dos juros apurado em contrato de conta corrente;

g) Os juros ou quaisquer acréscimos de crédito pecuniário resultantes da dilação do respetivo vencimento ou de mora no seu pagamento, sejam legais sejam contratuais, com exceção dos juros devidos ao Estado ou a outros entes públicos por atraso na liquidação ou mora no pagamento de quaisquer contribuições, impostos ou taxas;
h) Os lucros das entidades sujeitas a IRC colocados à disposição dos respetivos associados ou titulares, incluindo adiantamentos por conta de lucros, com exclusão daqueles a que se refere o artigo 20.º;
i) O valor atribuído aos associados em resultado da partilha que, nos termos do artigo 75.º do Código do IRC, seja considerado rendimento de aplicação de capitais, bem como o valor atribuído aos associados na amortização de partes sociais sem redução de capital;
j) Os rendimentos das unidades de participação em fundos de investimento;

l) Os rendimentos auferidos pelo associado na associação em participação e na associação à quota, bem como, nesta última, os rendimentos referidos nas alíneas h) e i) auferidos pelo associante depois de descontada a prestação por si devida ao associado;
m) Os rendimentos provenientes de contratos que tenham por objeto a cessão ou utilização temporária de direitos da propriedade intelectual ou industrial ou a prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico, quando não auferidos pelo respetivo autor ou titular originário, bem como os derivados de assistência técnica;
n) Os rendimentos decorrentes do uso ou da concessão do uso de equipamento agrícola e industrial, comercial ou científico, quando não constituam rendimentos prediais, bem como os provenientes da cedência, esporádica ou continuada, de equipamentos e redes informáticas, incluindo transmissão de dados ou disponibilização de capacidade informática instalada em qualquer das suas formas possíveis;
o) Os juros que não se incluam em outras alíneas deste artigo lançados em quaisquer contas correntes;
p) Quaisquer outros rendimentos derivados da simples aplicação de capitais;

q) O ganho decorrente de operações de swaps cambiais, swaps de taxa de juro, swaps de taxa de juro e divisas e de operações cambiais a prazo.
r) A remuneração decorrente de certificados que garantam ao titular o direito a receber um valor mínimo superior ao valor de subscrição.”

Quanto a esta ultima categoria de rendimentos importa referir que com a alteração ao Código do IRS introduzida pela Lei n.º 30-G/2000, de 29 de dezembro, foi criado um conceito amplo do que se entende por rendimentos de capitais, passando a ser considerados rendimentos desta categoria e, portanto, sujeitos a IRS, todos os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, pecuniários ou em espécie, procedentes, direta ou indiretamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natu reza mobiliária.
Ou seja, a redação do n.º 1 do artigo 5.º do CIRS, na redação vigente no ano de 2002, em causa nestes autos, representa um alargamento substancial da incidência de imposto, sendo agora suscetível de ter aqui enquadramento qualquer situação relacionada com valores mobiliários não tributada noutra categoria.
Nesta categoria passaram a ser tributados os rendimentos derivados da aplicação de capitais neles se compreendendo as situações previstas na incidência real das secções A e B do antigo Código do Imposto de Capitais, agora globalmente incluídas nas diversas alíneas do referido art.º 5.º do CIRS.
A distinção entre as duas secções, cuja justificação na anterior reforma decorria da aplicação ou não do método de retenção na fonte, deixou nesta altura de ser relevante, não só devido à generalização deste método de pagamento do imposto, quer face à preocupação do legislador de uniformidade sistemática do tratamento dos rendimentos da mesma natureza.

Exemplo claro dessa preocupação legislativa foi a consagração na al. p) do n.º 2 do artigo em presença, de uma regra com uma vocação mais abrangente, por forma a absorver como rendimento desta categoria “quaisquer outros rendimentos derivados da simples aplicação de capitais”. Visou-se desta forma sujeitar à tributação por esta categoria de rendimentos todas aquelas novas realidades jurídico-económicas criadas pela constante evolução dos variados instrumentos financeiros ou permitidas pelo princípio de autonomia da vontade ou de liberdade contratual, no âmbito dos mercados financeiros e de capitais que, não obstante a dificuldade assumida pelo legislador na sua tipificação, sejam suscetíveis de serem reconduzidos à noção de aplicação de capitais.

No caso em apreço, defende o impugnante que por ter estabelecimento aberto ao público e por consistir a sua atividade no arrendamento de imóveis e no recebimento das respetivas rendas e no empréstimos de valores monetários, obtendo como rendimentos os juros estabelecidos, trata -se de uma atividade comercial e, nessa medida, não obstante se tratarem de rendimentos ilícitos, cai no âmbito da exceção prevista na parte final do art.º 5.º, n.º 1 do CIRS, concluindo que os rendimentos se enquadram na categoria B.
Não tem razão como demonstraremos de seguida.

Desde logo, para o efeito, impunha-se a demonstração de que tais rendimentos seriam “imputáveis a atividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais ”, o que não sucedeu e por várias ordens de razões.
Em primeiro lugar, conforme demonstrou a entidade impugnada, o impugnante carecia em absoluto de requisitos substanciais e legais que o poderiam habilitar a desenvolver duma forma empresarial as atividades de locação financeira, outras atividades de crédito não especificadas ou arrendamento de bens imobiliários, como sejam o registo, inscrição e autorizações prévias juntos das entidades competentes e o respetivo enquadramento jurídico-fiscal, o que, como ele próprio reconhece, não se verificou.
Depois, essa deslocação de rendimentos por regra subsumíveis à categoria E para a categoria B de rendimentos, apenas à possível por aplicação do designado "princípio da atração", através do qual rendimentos que, por regra, se encontram no campo de incidência da categoria E são deslocados para a categoria B e aqui tributados. No entanto, para tal suceder é necessário que exista uma atividade profissional e empresarial principal à qual, a título acessório, possam ser imputados esses rendimentos, o que in casu não se verifica.

Com efeito, a única atividade que o impugnante parecia exercer a titulo principal seria de comissionista e de compra e venda de bens imobiliários.
O mencionado principio da atração funciona, por exemplo, quanto ao juro obtido por um comerciante em nome individual pelo diferimento no tempo do pagamento que lhe é devido por outrem de um crédito gerado no exercício da sua atividade comercial.
Este rendimento, apesar de compreendido na alínea g) do n.º 2 do artigo 5.º (categoria E), é deslocado para a categoria B, dada a relação de dependência daquele rendimento com a atividade comercial do seu titular.
Precisamente porque tais valores conservam a natureza de rendimentos de aplicação de capitais, muito embora a sua proximidade ou dependência face a uma atividade geradora de rendimentos empresariais e profissionais, a sua atração para a categoria B para efeitos de englobamento não prejudica a aplicabilidade, àqueles rendimentos, das taxas especiais liberatórias por retenção na fonte previstas nas alíneas a) e b) do n.º 3 do artigo 71.º, pois que, embora englobados na categoria B, derivam de juros de depósitos a ordem ou a prazo e de quaisquer títulos nominativos ou ao portador.

Assim, apesar do impugnante demonstrar que tinha um estabelecimento aberto ao público e que a sua atividade se consubstancia numa prática reiterada e previsível de atos que constituem uma atividade comercial, a ausência dos mencionados requisitos formais de índole legal que o poderiam habilitar a desenvolver uma atividade profissional ou empresarial de locação financeira, ou outras atividades de crédito não especificadas, impedem que a sua atividade possa ser enquadrada na categoria B de rendimentos para efeitos de IRS.
Ademais, o impugnante, de acordo com os elementos constantes dos autos, não possuía qualquer estrutura empresarial nem possuía contabilidade, exercendo uma atividade suscetível de atrair juros e outros rendimentos de capitais auferidos, através de formas atípicas, mantendo assim estes rendimentos uma natureza principal e autónoma, devendo por isso serem tributados em sede de categoria E, por se encontrarem enquadrados na al. p) do n.º 2 do artigo em presença.

Quanto aos rendimentos prediais, o impugnante invoca que a AT errou no enquadramento dos rendimentos na categoria F uma vez que ou os imputava ao recorrente em sede de categoria B (rendimentos provenientes da atividade empresarial traduzida na gestão de imóveis) ou os imputava às titulares (proprietárias) dos imóveis, em sede de categoria B ou F, consoante tais rendimentos fossem ou não imputáveis ao exercício de uma atividade empresarial.

Entende o impugnante que, face ao disposto no art.º 8.º do CIRS, na categoria F só se enquadram os rendimentos prediais colocados à disposição dos titulares (proprietários) dos prédios arrendados, e desde que não sejam auferidos no exercício de uma atividade empresarial, o que não foi o caso.
E defende também que a gestão ou administração de prédios de terceiros consubstancia uma atividade empresarial.
Vejamos então.

O art.º 8.º do CIRS, sob a epígrafe “rendimentos da categoria F”, estabelece que “1 - Consideram-se rendimentos prediais as rendas dos prédios rústicos, urbanos e mistos pagas ou colocadas à disposição dos respetivos titulares.
2 - São havidas como rendas:

a) As importâncias relativas à cedência do uso do prédio ou de parte dele e aos serviços relacionados com aquela cedência;
b) As importâncias relativas ao aluguer de maquinismos e mobiliários instalados no imóvel locado;

c) A diferença, auferida pelo sublocador, entre a renda recebida do subarrendatário e a pag a ao senhorio;
d) As importâncias relativas à cedência do uso, total ou parcial, de bens imóveis, para quaisquer fins especiais, designadamente publicidade;
e) As importâncias relativas à cedência do uso de partes comuns de prédios em regime de propriedade horizontal;
f) As importâncias relativas à constituição, a título oneroso, de direitos reais de gozo temporários, ainda que vitalícios, sobre prédios rústicos, urbanos ou mistos.
3 - Para efeitos de IRS, considera-se prédio rústico uma parte delimitada do solo e as construções nele existentes que não tenham autonomia económica, prédio urbano qualquer edifício incorporado no solo e os terrenos que lhe sirvam de logradouro e prédio misto o que comporte parte rústica e parte urbana.”.

Decorre deste normativo que são englobados na categoria F do IRS, os rendimentos prediais, considerando como tal as rendas dos prédios rústicos, urbanos ou mistos, que estarão sujeitas apenas e sempre que forem pagas ou colocadas à disposição dos seus titulares, regra que expressa o principio geral da tributação de rendimentos reais e efetivos .
A renda, para efeitos civis, enquanto elemento constitutivo do contrato de arrendamento, é uma prestação retributiva, periódica, pela qual o arrendatário executa o cumprimento da obrigação em que fica constituído por força do referido contrato e que consiste no pagamento ao senhorio de um preço pelo direito temporário de uso e fruição da coisa imóvel arrendada.
No entanto, à semelhança do que ocorre com outras situações de índole tributária, o legislador fiscal acolheu para efeitos de IRS um conceito de renda mais amplo, considerando rendimentos prediais, não só as rendas propriamente ditas, como são as resultantes de um contrato de arrendamento, mas também outras realidades económicas que não se enquadram na referida noção de renda, ainda que algumas delas possam ser também relativas à cedência do uso de um prédio ou de parte dele.
É neste sentido que são também havidas como rendas, as importâncias recebidas pela prestação de serviços relacionados com a cedência do uso do prédio ou de parte dele, pelo aluguer de maquinismos e mobiliários instalados no prédio arrendado ou pela cedência de imóveis para fins especiais, como a publicidade.
Portanto, estes rendimentos são tributados pela categooria F de IRS. Só assim não será quando, existindo uma existindo uma atividade principal profissional ou empresarial, estes rendimentos prediais possam ser acessoriamente imputáveis a atividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais, quando estes rendimentos prediais estejam em conexão com uma atividade geradora de rendimentos desta natureza, caso em que são imputáveis ao exercício daquela, realizando-se desta forma a tributação dessa universalidade num módulo único, a categoria B.

No caso vertente, as importâncias auferidas pelo impugnante não decorrem da prestação de serviços relativa à gestão dos prédios, decorrente da relação entre as proprietárias dos imóveis e o impugnante, mas do recebimento efetivo das rendas por parte dos seus beneficiários, sejam dos prédios cuja propriedade está em seu nome, em nome de suas filhas ou em nome de terceiros, provindo as rendas de arrendamentos urbanos e rústicos e de origem muito diversa, conforme se explana no relatório inspetivo.
A sua origem, de acordo com a factualidade apurada, é muito diversificada, encontrando-se suportadas por vários tipos de documentos, que vão desde recibos de modelo e forma legais, passando por um "acordo de exploração", ou listagens recapitulativas manuscritas onde se discriminam os montantes que seriam de declarar para efeitos de IRS, daqueles que deveriam ser omitidos. Tratam-se de rendimentos provenientes de cedência de uso de imóveis, com ou sem contrato, com limites temporais variáveis desde um dia a meses e para diversos fins.

Importa ainda reafirmar que o art.º 8.º do CIRS considera rendas prediais as rendas de prédios pagas ou colocadas à disposição dos respetivos titulares e não dos seus proprietários como defende o impugnante, porquanto, para efeitos de IRS, a obtenção de rendimentos prediais não está dependente do exercício do direito de propriedade sobre os imóveis que gera dores das rendas, bastando a mera titularidade de facto. Veja-se que a tributação incide sobre rendimentos prediais que abrangem realidades que são havidas como rendas, como as prestações de serviços relacionadas com a cedência do uso do prédio, como previsto no n.º 2, aI. a) sobredito artigo.

Para além disso foi o próprio impugnante que declarou perante a AT ser o único beneficiário dos valores das rendas apurada em sede inspetiva, o que foi confirmado pelas suas filhas perante este Tribunal.
Acresce ainda, que o impugnante declarou rendimentos da categoria F na declaração de rendimentos apresentada para o ano de 2002, da mesma natureza que aqueloutros apurados pela AT e que nesta sede os rejeita ou pretende que sejam enquadrados na categoria B.

Conforme refere o Digno Magistrado do Ministério Público no seu parecer “(…) , para vingar a tese do impugnante e ver-se integrados os rendimentos de capitais e prediais no art.º 3.º, n.º 2, al.s a) e b) do CIRS deveria, ele, demonstrar que os mesmos seriam “imputáveis a atividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais”, o que não sucedeu.
Ao invés, tal como foi comprovado pela AT, o impugnante carecia em absoluto de requisitos substanciais e legais que o poderiam habilitar a desenvolver duma forma empresarial as atividades de locação financeira, outras atividades de crédito não especificadas ou arrendamento de bens imobiliários, como seja, registo, inscrição e autorizações prévias juntos das entidades competentes, enquadramento jurídico-fiscal.
Donde, se, por outro lado, incumbe à administração tributária o ónus da prova da existência dos pressupostos de facto e de direito do ato de liquidação oficiosa, sobre a verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua atuação, ou dos requisitos que lhe permitiram efetuar a correção técnica e alterar o rendimento coletável declarado, cabe, por outro, ao contribuinte fazer prova que deu cumprimento às obrigações de natureza contabilística, impostas pela lei comercial e fiscal e refutar os resultados a que chegou a AF.”.

Os rendimentos de capitais e os rendimentos prediais obtidos pelo impugnante e omitidos à declaração de rendimentos do ano de 2002, não são, assim, subsumíveis à previsão das als. a) e b) do n.º 2 do art.º 3º do Código do IRS.

Não resulta da prova efetuada nos autos que tais rendimentos possam ser, de alguma forma, imputáveis a atividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais, pois apesar do impugnante basear a sua tese no facto de ter estabelecimento aberto ao público e que praticava atos geradores de rendimentos de capitais e de rendas com caráter de habitualidade, tal facto não basta para se concluir como pretende.
Inversamente, encontrando-se provado que o impugnante não detinha os requisitos formais e substanciais para o exercício de uma atividade, acima identificados, resta -nos concluir que estamos perante rendimentos obtidos de forma autónoma e não conexionados com uma outra atividade principal. Conclusão que sai reforçada por o impugnante não ter qualquer espécie de estrutura empresarial e a forma atípica como tais rendimentos eram obtidos.

Por outro lado, em termos de incidência subjetiva do IRS, apenas que ficam sujeitos a imposto as pessoas singulares residentes em Portugal pela totalidade dos rendimentos obtidos (art.º 13°, n.º 1 e 15.º, n.º 1 do CIRS), estando a neutralidade tributária visada com estes normativos reforçada com as regras anti-abuso previstas nos artigos 10.º, 38.º e 39.º da LGT, cujo objetivo é a tributação das realidades económicas independentemente da sua regularidade e conformidade jurídicas.
Face ao contexto supra exposto, é seguro que estamos perante rendimentos obtidos de forma autónoma e não conexionados com uma outra atividade principal e, nessa medida, devem ser tributados autonomamente nas categorias E e F do IRS, improcedendo, por isso, nesta parte a presente impugnação.”

O RECORRENTE discorda do decidido. Reitera ser ilegal a determinação da matéria colectável enquadrada nas categorias E (juros) e F (rendas) por falta de fundamentação e erro de quantificação e qualificação e ainda violação de lei por se imputar ao Impugnante factos tributários com os quais nada teve a ver.
E que a sentença confirmou o enquadramento efetuado pela AT, mas em face do teor do RIT e do depoimento das testemunhas, deveriam os rendimentos prediais e de capitais serem qualificados como rendimentos da categoria B – rendimentos empresariais (Conclusões 15ª a 20ª).

Por outro lado, a sentença assenta na fundamentação de que o recorrente não detinha os requisitos substanciais ou formais/legais que o poderiam habilitar a desenvolver de forma empresarial as actividades de locação financeira e outras actividades de crédito não especificadas ou arrendamento de imóveis

Mas o Recorrente está coletado para a actividade de comissionista de compra e venda de bens imobiliários com início de actividade a 2/1/2002 porque foi a própria AT que deu início de actividade oficiosamente quando concluiu o procedimento em 2006, por ter vendido um lote de terreno no dia 18 de abril de 2002.

O que não significa ser esta a actividade a título principal do Recorrente, entre dezenas de empréstimos ou arrendamentos que também apuraram.

Acrescenta que a interpretação que o MMº juiz faz da lei fiscal é demasiado formalista.

Pois se não tinha habilitações formais para fazer empréstimos ou locação financeira, também não preenchia os requisitos formais para a actividade imobiliária (Conclusões 21º a 28º).

Também os rendimentos provenientes de rendas recebidas por via de contratos de arrendamento deveriam ter sido tributados pela categoria B e não pela categoria F.

Por outro lado, os prédios descritos no Relatório como tendo sido objecto de arrendamento são todos propriedade de terceiros

A gestão ou administração por parte do Impugnante de prédios de terceiros consubstancia uma actividade empresarial tributada na categoria B. (Conclusões 29 e segs.)

Sumariadas as questões e argumentos suscitados no recurso quanto a estes segmentos da sentença, podemos desde já antecipar que o Recorrente não tem razão.

A sentença apreciou bem a questão da tributação pelas categorias E e F e também fundamentou bem as razões pelas quais o RECORRENTE não poderia ser tributado pela categoria B por todos os rendimentos gerados nas diversas actividades que leva a cabo.

Concordamos com a fundamentação desenvolvida na sentença que nos dispensamos de repetir, não se verificando qualquer falta de fundamentação substancial ou formal, na qualificação e quantificação dos factos que serviram de apuramento à matéria tributável, ao contrário do que alega o RECORRENTE.

Acrescentamos apenas que para poder ser tributado pela categoria B pelos rendimentos gerados enquadráveis nas categorias F seria indispensável que os bens ou valores geradores dos rendimentos fizessem parte do activo da empresa individual do sujeito passivo, ou que estivessem afectos às actividades empresariais por ele desenvolvidas (art.º 29º/1 CIRS, na redação aplicável).

Tal afetação poderia ser detetada “...designadamente, com base no tratamento contabilístico conferido aos bens em apreço – a reconhecer como activos enquanto se encontrarem afectos à actividade empresarial ou profissional – ou através do controlo dos encargos relativos aos mesmos – conforme sejam suportados pelo sujeito passivo a título particular ou reconhecidos no âmbito da sua actividade empresarial ou profissional[2]

Mas não consta dos autos que o RECORRENTE tenha efetuado qualquer afetação dos bens em causa à actividade empresarial, pelo que, também por esta razão, as conclusões do recurso não podem proceder.

A circunstância de os prédios geradores da fonte de rendimentos se encontrarem em nome de terceiros (filhas do RECORRENTE), não implica o afastamento do Impugnante desta tributação, uma vez que o próprio declarou ser o beneficiário de tais rendimentos, o que foi confirmado pelas suas filhas. Sabendo-se que o Art.º 8º/1 do CIRS considera rendimentos prediais as rendas dos prédios rústicos, urbanos e mistos pagas ou colocadas à disposição dos respetivos titulares (o que é diferente de proprietários) facilmente se conclui que não há qualquer ilegalidade na tributação destes rendimentos na esfera jurídica do RECORRENTE/IMPUGNANTE.

E quanto aos rendimentos da categoria E, a distinção entre estes rendimentos e rendimentos de outras categorias, nem sempre é simples. Mas a doutrina delineia a necessária fronteira com o recurso ao critério de que os rendimentos integradores da categoria E tendem a ser “rendimentos passivos”, que o seu titular aufere sem recorrer a uma actividade destinada à sua obtenção, enquanto os rendimentos da categoria “B” são por natureza rendimentos “activos” derivados do exercício de uma actividade empresarial ou profissional destinada à respetiva obtenção.

Os rendimentos de capitais apenas exigem a titularidade de um activo mobiliário, de cuja cessão temporária ou aplicação resultam os rendimentos, sem apelar para qualquer engenho ou ordenação por conta própria.

Em contrapartida, entende-se que se os rendimentos previstos no art.º 5º forem obtidos no âmbito de uma actividade empresarial e profissional, estes serão considerados como rendimentos da categoria B e já não da categoria E, como resulta do art.º 2º/b) do CIRS.
Trata-se de uma manifestação do chamado poder de “atracção” da categoria B, que converte em rendimentos desta categoria aqueles que em virtude da sua substância, preenchiam normas de incidência de outras categorias[3].

Contudo, embora o Impugnante efetuasse empréstimos e recebesse juros, não tinha, como bem salientou o MMº juiz, os requisitos legais e substanciais para desenvolver de forma empresarial as atividades de locação financeira e de crédito.

Com efeito, o art.º 3º/2,b) do CIRS (na redação aplicável) permite integrar na categoria B os rendimentos de capitais imputáveis a actividades geradoras de rendimentos empresariais e profissionais. Mas também nesta sede não se pode ignorar a exigência a que alude o art.º 29º/1 do CIRS supra mencionado.

Ou seja, para poder ser tributado pela categoria B em relação a rendimentos provenientes da categoria E, seria necessário que os respetivos valores fizessem parte do activo da empresa ou estivessem afectos à actividade empresarial do IMPUGNANTE/RECORRENTE, em consagração do princípio da autonomia ou separação patrimonial assente na distinção entre o património afecto à actividade empresarial e o património pessoal.

E não consta que o Contribuinte tivesse, de algum modo, realizado tal distinção, pelo que não podemos considerar ter efetuado de forma empresarial a actividade geradora de rendimentos integrados na categoria E.
Como tal, os respetivos rendimentos também não poderiam ser sujeitos a tributação pela categoria B.

E também não poderia ser tributado pela categoria B em função do “poder de atração” desta categoria. Para tal suceder, seria necessário que os rendimentos provenientes de fonte integrada noutra categoria (E) estivessem em conexão com a actividade de natureza empresarial exercida a título principal.
A doutrina exemplifica com o caso dos juros recebidos por advogado em razão dos saldos das contas bancárias onde movimenta as quantias recebidas dos clientes[4], e o STA considerou rendimento da categoria B a indemnização recebida pelo arrendatário de uma loja, na qual exerce uma actividade comercial, paga pelo proprietário da mesma, com o intuito de por fim ao contrato de arrendamento[5].

Como se vê dos exemplos apontados, para que a categoria B “atraia” rendimentos provenientes de outras fontes, é necessário que haja uma conexão entre a actividade empresarial e a “fonte atraída”, o que no caso em apreço de modo nenhum verifica.

Por conseguinte, também neste segmento improcedem as conclusões do RECORRENTE.

E assim, improcedendo todas as conclusões do recurso, incluindo a alegada, mas não substanciada[6], preterição dos princípios da igualdade, proporcionalidade e da prevalência da substância sobre a forma, a sentença deverá ser confirmada com todas as consequências legais.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCA em negar provimento ao recurso e com a presente fundamentação, confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 16 de setembro de 2019.



(Mário Rebelo)


(Patrícia Manuel Pires)


(​José Vital Brito Lopes)



--------------------------------------------------------------------------------------
[1] Sumário:
IV - O prazo de caducidade do direito à liquidação suspende-se com a notificação ao contribuinte de início de acção inspectiva externa, mas esse efeito suspensivo cessa, e o prazo conta-se do seu início, caso a inspecção ultrapasse seis meses contados a partir daquela notificação.
V - Nos casos em que a inspecção externa tem uma duração inferior a seis meses, o efeito suspensivo do prazo de caducidade, previsto no artigo 46º, nº 1, da LGT, mantém-se até à notificação ao contribuinte da conclusão do procedimento inspectivo, pela elaboração do relatório final.
[2] IRS anotado, Lexit, anotação ao artigo 29º por Sandra Videira e Victor Duarte, pp. 122.
[3] Seguimos de perto a doutrina de Paula Rosado Pereira in “Manual de IRS”, Almedina, 2018, pp. 104.
[4] Assim, Rui Duarte Morais, “Sobre o IRS”, 2ª edição, Almedina, pp. 86.
[5] Ac. do STA n.º 339/10, de 8/9/2010.
[6] Cfr. ac. do TCAS n.º 00137/04 de 21-09-2004 Relator:Eugénio Sequeira
Sumário: 6.Se o impugnante invocar como causa de pedir, vícios em abstracto imputados ao acto de liquidação, mas os não substanciar, não pode o tribunal deles conhecer, por não poder conhecer de factos não alegados, ainda que subsumíveis a cada uma dessas categorias de vícios, salvo se de conhecimento oficioso.