Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1124/22.9 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:12/06/2022
Relator:VITAL LOPES
Descritores:GARANTIA
AVALIAÇÃO
QUOTAS SOCIAIS
Sumário:I - Cumpre à AT, perante o caso concreto, averiguar da idoneidade da garantia oferecida em ordem à suspensão da execução fiscal, idoneidade que deve aferir-se pela susceptibilidade de assegurar o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, caso seja necessário executar a garantia (cfr. arts. 169.º, 199.º e 217.º, do CPPT, e art. 52.º, da LGT).
II - Sendo oferecidas para a constituição de penhor a favor da AT quotas que a Executada detém numa sociedade, o método para determinar o valor dessas participações sociais para efeitos de constituição de garantia deve subordinar-se àquele critério, ou seja, deve constituir, tanto quanto possível, um método adequado de aproximação ao valor de realização dessas quotas, ao valor que (em execução da garantia) poderia resultar da venda das mesmas.
III - Assim, não pode a AT, sob a invocação de que «[d]ispondo a ordem jurídica tributária de normas de determinação do valor das participações sociais e de outros títulos de crédito, devem ser essas normas observadas pelos Serviços quando sejam aceites garantias em execução fiscal», em ordem a diminuir os “factores de subjectividade, discricionariedade e conflitualidade com os contribuintes”, erigir em critério para a avaliação dessas participações sociais o estipulado no Código do Imposto de Selo e, assim, considerar o balanço, corrigido, quanto ao valor dos imóveis que integram o activo fixo tangível das sociedades a que respeitam as referidas participações, para o respectivo VPT, tudo nos termos dos arts. 15.º e 31.º daquele Código.
IV - Esse critério apenas se impõe para efeitos da determinação da matéria tributável para efeitos de liquidação do IS – imposto que se enquadra entre os tipos de impostos sobre o consumo ou a despesa, com incidência sobre alguns actos e contratos, previstos na Tabela Geral anexa ao Código – no caso de transmissão de quotas a título gratuito e já não para efeitos da determinação do valor dessas quotas para efeitos de garantia, o qual deve aproximar-se tanto quanto possível do valor real dos bens, i.e., do valor de realização de liquidez.
V - Não pode confundir-se a avaliação quando está em causa aferir da idoneidade da garantia oferecida pelo executado em ordem à suspensão da execução fiscal com a avaliação quando está em causa a determinação da matéria tributável como expressão quantitativa do facto tributário.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1 – RELATÓRIO

A Exma. Representante da Fazenda Pública recorre da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a reclamação apresentada por D… e M…, casados entre si no regime de separação de bens, contra o despacho proferido em 24/05/2022 pelo Exmo. Sr. Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças de Lisboa, “que aceitou a garantia constituída sob a forma de penhor de quotas da sociedade I… – Sociedade Agro-pecuária, Lda., por se mostrar idónea, entendendo, porém, ser a mesma de valor insuficiente para garantir o processo de execução fiscal n.º 3085202201030264, tendo, portanto, determinado a notificação para o seu reforço ou prestação de nova garantia idónea, pelo valor remanescente”.

Com o requerimento de recurso, a Recorrente juntou alegações, que termina com as seguintes e doutas Conclusões:
«
A.
Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou a reclamação do ato do órgão de execução fiscal procedente, anulando anulo o despacho proferido pelo Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa, com data de 24.05.2022, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3085202201030264.
B.
A questão a apreciar e a decidir consiste em aferir se ocorre o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto atenta a desconsideração do aumento de capital realizado no final do ano de 2021.
C.
A Fazenda Pública não se conforma com o doutamente decidido porquanto considera existir erro de julgamento quanto à matéria de facto, por errada valoração dos elementos constantes dos autos, devendo a sentença ser revogada e substituída por douto acórdão que julgue a reclamação totalmente improcedente e, em consequência, mantenha na ordem jurídica o despacho reclamado, com todas as consequências legais.
D.
Atenta a factualidade dada como provada na douta sentença, bem como todas as informações juntas aos autos, é visível que a Autoridade Tributária não só considerou o aumento de capital efetuado no final de 2021, como também fundamentou o porquê de ter recorrido aos valores do ano de 2020, e não do ano de 2021, como pretendiam os reclamantes/recorridos.
E.
O montante da garantia a constituir deve ser determinado em função do montante unitário de cada participação social, sendo que, quando se trate de quotas ou partes em sociedades que não sejam por ações e o dos estabelecimentos comerciais, industriais ou agrícolas com contabilidade organizada, o seu valor determina-se pelo último balanço.
F.
As demonstrações financeiras que serviram de base à avaliação das participações sociais detidas por M… e D…, sobre as quais foi constituído penhor para efeitos de garantia no processo de execução fiscal n.º 3085202201030264, referiram-se ao exercício de 2020, uma vez que, tal como devidamente justificado e fundamentado, eram os que se encontravam refletidos no sistema informático ao dispor da AT, à data.
G.
À data da prolação do despacho reclamado a sociedade não tinha dado cumprimento ao depósito legal das contas do exercício de 2021, pelo que a avaliação da participação social aqui em crise foi efetuada com base no último balanço aprovado cujas contas estão legalmente depositadas, em conformidade com o disposto no artigo 42.º do CRC.
H.
Ao estipular que a fundamentação dada pela Autoridade Tributária para ter utilizado os dados contabilísticos do ano de 2020 não é suficiente para fundamentar a desconsideração do aumento do capital próprio efetuada no final do ano de 2021, a Meritíssima Juiz estava, à contrário, a admitir a hipótese da composição do capital próprio do ano de 2020 ser contabilizada tendo em conta a verba relativa ao capital subscrito no ano de 2021, e não o do ano de 2020, como foi, com todas as particularidades exigidas para a avaliação da participação relativa a cada sócio contidas no n.º 4 do artigo 199º- A do CPPT.
I.
Uma atuação da Autoridade Tributária que considerasse o capital subscrito no ano de 2021, com a inerente avaliação da participação de cada sócio, e os outros componentes, nomeadamente, instrumentos do capital próprio, reservas, resultados transitados e resultado líquido do período, relativos ao ano de 2020, não tinha qualquer suporte, nem do ponto de vista legal, nem contabilístico.
J.
Ao decidir em sentido contrário a douta sentença cometeu erro de julgamento, pelo que deverá ser revogada e substituída por douto acórdão que mantenha o ato reclamado, inexistindo qualquer vício de lei por erro nos pressupostos de facto.
Termos em que, com o douto suprimento, requer a V. Exas se dignem admitir o presente recurso, julgando o mesmo procedente por provado, e, em consequência, revoguem a douta sentença recorrida, substituindo a mesma por douto acórdão que declare a legalidade do despacho reclamado, mantendo-o no ordenamento jurídico, tudo sob as devidas e legais consequências.
Assim decidindo, farão V/ Ex.ªs, aliás, como sempre, a costumada justiça.».

Os Recorridos apresentaram contra-alegações, que culminam com as seguintes e doutas conclusões:
«
A. No âmbito do processo de execução fiscal n.° 3085202201030264, estava em causa a averiguação, pela ora Recorrente, da idoneidade de garantia ali oferecida, com vista à suspensão da execução.
B. Sendo o bem objeto da avaliação o penhor de duas quotas cujo valor nominal, de cada uma, era, à data da constituição do penhor, de €100.00,00 (cem mil euros), conforme certidão permanente já junta aos autos.
C. Tendo sido constituído penhor no valor de € 97.843,71 (noventa e sete mil oitocentos e quarenta e três euros e setenta e um cêntimos) de cada uma das quotas.
D. Perfazendo a garantia o total de € 195.687,41 (cento e noventa e cinco mil seiscentos e oitenta e sete euros e quarenta e um cêntimos), montante suficiente para garantir o pagamento da dívida exequenda e acrescido.
E. Sucede que, finda essa avaliação, a Recorrente entendeu ser de proferir despacho aceitando a garantia constituída pelos Recorrentes, considerando-a, porém, insuficiente para garantir o processo de execução fiscal mencionado.
F. Porquanto, ao apurar o valor do capital próprio da sociedade avaliou as quotas da sociedade como se a uma cada delas correspondesse um valor nominal de € 5.000,00 (cinco mil euros), num total de € 10.000,00 (dez mil euros), ao invés de as avaliar tendo em conta o valor nominal real e atual de cada uma das quotas que, à data, era de € 100.000,00.
G. Pelo que, o processo de avaliação da idoneidade da garantia é um processo inquinado ab initio, na medida em que a Administração Tributária, ora Recorrente, ao avaliar o valor das quotas sobre as quais tinha sido constituído o penhor fê-lo tendo por base um valor errado e desfasado da realidade contabilística corrente e atual da referida sociedade.
H. Donde só se pode concluir que, por conta desse erro, o valor total do capital próprio da sociedade espelhado na informação n.º 734/2022 anexa ao despacho reclamado não demonstra de forma fidedigna (nem de perto) as circunstâncias contabilísticas da sociedade.
I. Assim, por entenderem que seria necessário proceder a nova avaliação, suportada em valores contabilísticos corretos e adequados à data da avaliação das quotas, os Recorrentes deduziram a reclamação que deu impulso aos presentes autos.
J. Tendo sido, em consequência, proferida sentença.
K. E, divergindo do entendimento do douto Tribunal a quo, veio a Recorrente apresentar as suas alegações de recurso da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, em 13/09/2022, por meio da qual decidiu julgar procedente a reclamação, interposta pelos ora Recorridos, e, em consequência, anulou “(...) o despacho proferido pelo Diretor de Finanças adjunto da direção de finanças de Lisboa, em 24.05.2022, no âmbito do processo de execução fiscal n.° 3085202201030264, com as devidas consequências legais”.
L. Sendo que, do recurso ora deduzido não se vislumbra qualquer fundamento atendível aos argumentos aduzidos pela Recorrente, pelo que deverá manter-se a sentença nos exatos termos em que foi proferida pelo Tribunal a quo.
M. Começando a Recorrente por chamar à colação o douto parecer do Ministério Público, proferido nos presentes autos, e aderindo ao entendimento ali emanado8.
N. Ao que entendem os Recorridos ser adequado chamar à colação tudo quanto explanaram aquando do exercício do direito ao contraditório, dando-o aqui por integralmente reproduzido.
O. De seguida, passa a Recorrente a atacar o proferido na douta sentença.
P. Alegando, para tanto, que “(...) não só considerou o aumento de capital efetuado no final de 2021, como também fundamentou o porquê de ter recorrido aos valores do ano de 2020 e não do ano de 2021”0
Q. Entendendo que a consideração e justificação, por ela devidas no procedimento em causa, estão plasmadas no despacho reclamado, designadamente, quando se refere “(...) que foi consultada em 12.05.2022 a certidão permanente da Conservatória do Registo Comercial (CRC) da sociedade I..., aferindo-se que a mesma tinha, à data, um capital social de € 200.000,00 (aumento de capital em 30.12.2021 em €190.000,00)"™.
R. Referindo, ainda, que “(...) para efeitos de análise, foi explicitamente referido que o capital social corresponde ao exercício de 2020, no valor de € 10.000.00’11
S. Ora, aqui chegados, impõe-se recordar à Recorrente que o vício apontado foi o de conscientemente ter desconsiderado a existência do aumento de capital, sem para tal ter apontado qualquer justificação.
T. Não estando, portanto, em causa a justificação apresentada para a escolha dos elementos referentes ao balanço de 2020, pois não foi dessa circunstância que resultou o vício invalidante do despacho reclamado.
U. No mais, é evidente que a Recorrente desconsiderou o referido aumento de capital, na medida em que, para efeitos de avaliação, fez uma utilização errónea do valor nominativo de € 5.000,00, em vez do valor atual de € 100.000,00, resultante desse aumento de capital.
V. Continuando, insiste a Recorrente ter procedido à avaliação da garantia atendendo às disposições do ofício circulado n.° 60.078, de 30.08.2010, da Direção de Serviços de Gestão dos Créditos Tributários, de acordo com as quais o valor das quotas “(...) se determina pelo último balanço” e, assim sendo, apurou “(...) o valor das quotas sobre as quais foi constituído o penhor com base no último balanço”12.
W. Razão pela qual, após o referido procedimento, ao capital próprio foi atribuído o valor de € 79.903,27 (setenta e nove mil novecentos e três euros).
X. No mais, a Recorrente limita-se a expor o que havia sido referido pelo Ministério Público, nomeadamente, quanto aos elementos contabilísticos relativos ao exercício de 2021 de que dispunha no momento da avaliação.
Y. Acabandok, por uma vez mais, invocar que a desconsideração do aumento de capital encontra justificação nas razões que determinaram o uso dos elementos contabilísticos de 2020.
Z. Quer isto dizer que, indiferente à ausência de qualquer respaldo legal, e omitindo-se de qualquer justificação, a Recorrente simplesmente optou por não levar em linha de conta o valor nominativo real das quotas da sociedade, à data da constituição do penhor, para efeitos de correção do total do capital próprio, que, por si só, deturpa, imediatamente, qualquer resultado que tenha sido apresentado.
AA. Considerando, portanto, a Recorrente que, uma vez justificada a utilização dos elementos contabilísticos do exercício de 2020, em detrimento dos elementos de 2021, estaria automática e tacitamente justificada e fundamentada a desconsideração e exclusão do valor do capital social resultante do aumento realizado, em virtude deste aumento ter ocorrido aquando do exercício de 2021.
BB. Evidentemente que os Recorridos discordam deste entendimento e acompanham o exposto na douta sentença.
Mas, vejamos,
CC. Averiguar da idoneidade da garantia para por aferir da sua suscetibilidade em assegurar o pagamento da dívida exequenda e do acrescido, caso se torne necessário executar essa mesma garantia, conforme resulta das disposições conjugadas dos artigos 169.°, 199.° e 217.°, todos do CPPT e artigo 52.° da Lei Geral Tributária (LGT)
DD. Estabelece o artigo 199.°-A, n.os 1 e 2, do CPPT que, para efeitos de avaliação da garantia, “(...) deve atender-se ao valor dos bens ou do património apurado nos termos dos artigos 13° a 17° do Código do Imposto do Selo" e “Sendo o garante uma sociedade, o valor do seu património corresponde ao valor da totalidade dos títulos representativos do seu capital social determinado nos termos do artigo 15° do Código do Imposto do Selo".
EE. Portanto, tendo sido oferecido, in casu, penhor de quotas por uma sociedade, para efeitos de avaliação dessa garantia, o artigo 199.°-A, do CPPT “(...) manda atender ao valor do património (n.° 1) da sociedade garante e faz corresponder este ao valor da totalidade dos títulos representativos do seu capital social, determinado nos termos do art. 15° do CIS(n°2)(...)”13
FF. Assim sendo, conforme estipulado no n.° 1, do artigo 15.°, do Código do Imposto de Selo (CIS), o valor das quotas da sociedade I…SOCIEDADE AGROPECUÁRIA, LDA., NIPC 5…, deve ser aferido pelo último balanço.
GG. Sendo certo que, tendo as referidas quotas um valor nominativo de € 100.000,00, tal valor terá sempre de ser considerado, através de uma compatibilização com os elementos do último balaço, para efeitos de apurar a realidade contabilística da sociedade.
HH. É, aliás, esse o entendimento que resulta do n.° 2, daquele artigo 15.° ao estabelecer que "Se o último balanço referido no número anterior precisar de ser corrigido, o valor do estabelecimento ou das quotas e partes sociais determinar-se-á pelo balanço resultante das correcções feitas".
II. Acresce que, não se olvide, tais disposições legais são acompanhadas pelo próprio ofício circulado n.º 60.078, de 30.08.2010.
JJ. E expostas, também, em sede da informação n.° 734/2022 anexa ao despacho reclamado, designadamente, nas páginas 8, 9 e 11 dessa informação.
KK. E, portanto, para se verificarem cumpridos os termos dispostos nos preceitos identificados, aquando do procedimento de avaliação da garantia, em particular aquando da correção do valor total do capital próprio da sociedade, devia ter-se considerado o aumento do capital social para € 200.000,00 (duzentos mil euros) e promovido as devidas correções.
LL. Facto que não sucedeu.
MM. Pelo que, fazendo corresponder o valor de € 10.000,00 (dez mil euros) à rubrica “Capital subscrito”, indica que o valor nominal de cada quota, tido em conta para efeitos do procedimento de avaliação, foi de € 5.000,00.
NN. E, assim sendo, a única informação que verdadeiramente dali se retira é que o valor ali reportado está desfasado da realidade contabilística atual (bem como no momento da própria avaliação) da sociedade.
OO. Inquinando, evidentemente, todo o procedimento e, bem assim, o valor total do capital próprio da sociedade.
PP. E, por tal razão, impunha-se (e impõe-se) que o total do capital próprio apurado (€ 79.903,27) tivesse sido corrigido de forma a espelhar o aumento do capital de € 190.000,00 (cento e noventa mil euros) subscrito em 07/12/2021.
QQ. Para que, assim, se lograsse demonstrar a exata realidade contabilística atual da sociedade.
RR. Pois, “(...) no caso da garantia, o que se pretende com a avaliação é determinar, o modo mais aproximado possível, o valor dos bens ou direitos oferecidos, a liquidez que os mesmos são susceptíveis de gerar caso seja necessário executar a garantia (.. .)114 Cfr. Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 02/12/2015, processo n.° 01458/15.
SS. Uma vez que, se por hipótese, houvesse ocorrido a operação inversa, isto é, se se tivesse reduzido o capital social de € 200.000,00 para € 10.000,00, e, em consequência, se reduzisse o valor nominativo de cada quota de € 100.000,00 para € 5.000,00, mantendo-se as demais circunstâncias, certamente a Administração Tributária não iria aceitar a garantia tendo por base única e exclusivamente os hipotéticos dados contabilísticos do último balanço sem antes efetuar a devida correção, dado que, evidentemente, esses mesmos dados não reportariam (de forma alguma) a situação contabilística concreta e real da sociedade.
TT. Tendo, ainda assim, optado a Recorrente por não realizar qualquer correção em função do aumento de capital.
UU. Não tendo logrado, até à presente data, evidenciar quaisquer fundamentos e/ou justificações para desconsiderar aquele facto (o aumento do capital social).
VV. Tampouco com as alegações ora refutadas alcançou a Recorrente demonstrar qualquer fundamento para ter desatendido, e intencionalmente ignorado, o valor do capital social efetivamente subscrito à data em que o valor total do capital próprio da sociedade, em maio de 2022.
WW. Porquanto, da mera indicação, alusão ou justificação da preferência pelo balanço de 2020, em detrimento dos dados do exercício de 2021, não se subentende nenhuma justificação para a desconsideração do aumento de capital e inexistência da consequente correção.
XX. Ora, conhecendo a Recorrente da realidade da sociedade e, bem assim, do respetivo dispositivo legal aplicável para apurar o valor real do capital próprio, impunha-se-lhe, indubitavelmente, o ónus de fundamentar devidamente qualquer opção que tomasse, designadamente, através dos métodos e procedimentos utilizados e em que base legal se sustentou.
YY. E, portanto, a mera alusão, tanto aos normativos supra identificados, quanto ao aumento de capital, que faz na informação n.° 734/2022 e, reiteradamente, nas suas alegações de recurso, não é bastante para se aceitar por justificada a desconsideração do aumento de capital.
ZZ. Pois, é notório que o aumento de capital em questão configura uma modificação suscetível de, por si só, provocar alterações significativas do património líquido da sociedade e, nessa medida, é imprescindível a realização de um reajuste ao valor do balanço de 2020.
AAA. Evidentemente, andou mal a Recorrente quando, após determinar o capital próprio da sociedade, para efeitos de avaliar a idoneidade da garantia oferecida, não promoveu a correção que se exigia por conta do aumento de capital subscrito em 07/12/2021.
BBB. E nem fundamentou a desconsideração desse aumento no despacho reclamado.
CCC. Face a todo o exposto, resulta que o valor das quotas, bem como o do capital próprio da sociedade, sobre as quais foi constituído o penhor, foi apurado com base numa situação contabilística errónea, dado que a mesma não reflete (nem refletia, em maio de 2022) a concreta situação contabilística da sociedade.
DDD. E, portanto, não só não restam dúvidas do acerto do decidido pelo Tribunal a quo ao entender que, constituindo o aumento de capital “(...) razão de facto contextuai ao pedido de prestação de garantia e contemporânea à prolação do despacho reclamado, a sua desconsideração, sem mais, constitui vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto, invalidante do despacho objeto de sindicância”.
EEE. Não havendo lugar a outro entendimento que não seja o proferido pela sentença ora recorrida, que merece total acolhimento pelos Recorridos.
FFF. Não se vislumbrando, em consequência, razão ou justificação suscetível de sanar o erro da Recorrente.
GGG. E, por conseguinte, não podem as alegações da Recorrente proceder, devendo, em consequência, manter-se a decisão recorrida.
IV. Pedido:

Nestes termos e nos melhores de Direito, que V. Exas. doutamente suprirão, requer que seja o presente recurso julgado improcedente, por não provado, mantendo-se a decisão recorrida nos exatos termos em que foi proferida pelo Tribunal a quo, tudo com as devidas e necessárias consequências legais.»


O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu mui douto parecer concluindo ser de julgar procedente o recurso, anulando-se a douta sentença recorrida.

Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cf. artigo 278.º, nº5, do CPPT e artigo 657.º, nº4, do CPC), vêm os autos à conferência para decisão.





2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (cf. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), a questão central que se coloca nos presentes autos é a de saber a AT, na apreciação do pedido de prestação de garantia através da constituição de penhor, tendo sido oferecidas para o efeito quotas de uma sociedade, pode erigir como critério de avaliação das mesmas o que está previsto no Cód. Imposto de Selo, que considera ser o critério que lhe é imposto por lei.

3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Em 1ª instância deixou-se consignado em sede factual:
«Com relevância para a presente decisão, relatam-se como provados, os seguintes factos:

1. Em 07.12.2021, os dois sócios, D…, contribuinte fiscal n.º 202 …. e M…, contribuinte fiscal n.º 1…, aqui Reclamantes, titulares da totalidade do capital social da sociedade com a firma “I...– Sociedade Agropecuária, Lda.”, contribuinte fiscal n.º 513 …, deliberaram um aumento do capital social para € 200.000,00 (duzentos mil euros), em numerário, na proporção das respetivas quotas, tendo sido subscritos € 95.000,00, por cada um deles. – cfr. facto não controvertido; certidão permanente junta como documento 11 à petição inicial (p.i.);
2. O aumento de capital aludido em 1) supra foi levado a registo comercial, através da Ap.1/20211230. – cfr. facto não controvertido; certidão permanente junta como documento 11 à p.i.;
3. Em 21.12.2021, os aqui Reclamantes deduziram reclamação graciosa, autuada com o n.º 2046202104000307, contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas
Singulares (IRS), ano de 2017. – cfr. documentos 2 e 3 juntos à p.i.; informação n.º 734/2022 junta como documento n.º 007451994 no Sitaf;
4. Em 05.01.2022, no Serviço de Finanças de Lisboa 3, foi instaurado contra os aqui
Reclamantes o processo de execução fiscal (PEF) n.º 3085202201030264, para cobrança coerciva de dívida exequenda no valor de € 155.041,47 (cento e cinquenta e cinco euros e quarenta e um euros e quarenta e sete cêntimos), proveniente de IRS, ano de 2017. – cfr. informação n.º 734/2022 junta como documento n.º 007451994 no Sitaf;
5. Em 18.01.2022, foi emitida citação pessoal no âmbito do PEF aludido em 4) supra, da qual consta, entre outra, informação para prestação de garantia no valor de € 195.687,41 (cento e noventa e cinco mil, seiscentos e oitenta e sete euros e quarenta e um cêntimos). – cfr. citação junta como documento 4 à p.i.; informação n.º 734/2022 junta como documento n.º 007451994 no Sitaf;
6. Em 15.02.2022, no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º 3085202201030264, os Reclamantes apresentaram, através de mensagem de correio eletrónico, requerimento de prestação de garantia mediante penhores constituídos sobre as participações sociais (quotas) por eles detidas na sociedade comercial com a firma “I...– Sociedade Agropecuária, Lda.”, contribuinte fiscal n.º 513 982 949, tendo aí feito constar, entre o mais, que “são donos e legítimos possuidores das quotas no valor nominal de €100.000,00 da sociedade I...Sociedade Agropecuária Lda, NIF 51..., com o capital social de €200.000,00, e que constituem penhor sobre as duas quotas com o valor de €97.843,71, cada uma, a favor da Direção Geral dos Impostos, por forma a constituir garantia no montante máximo de €195.687,41, no âmbito do processo de execução fiscal 3085202201030264, que corre termos no Serviço de Finanças de Lisboa 3.” – cfr. documento 5 junto à p.i.; informação n.º 893/2022 junta como documento n.º 007451993 no Sitaf;
7. Em 24.05.2022, a Divisão de Gestão da Dívida Executiva da Direção de Finanças de Lisboa elaborou a Informação n.º 734/2022 da qual consta, entre o mais, a seguinte fundamentação:
“(…)
- Da avaliação das quotas representativas do capital social da I...SOCIEDADE AGROPECUARIA LDA, NIF 51..., (doravante designada por I…), para garantia do processo de execução fiscal nº 3085202201030264:
a) Os executados apresentaram no SF Lisboa 3, Termo Constitutivo do “Penhor de Quotas”, lavrado em 15/02/2022, detidas pelos executados na sociedade I…, a favor da Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante AT), de forma a garantir e suspender o processo de execução fiscal acima identificado
b) Deste modo, tendo por objetivo a avaliação da referida participação social (quotas), que os executados detêm na sociedade I…, a qual de acordo com a certidão permanente da Conservatória do Registo Comercial (CRC), consultada em 12/05/2022, tem um capital social de € 200.000,00 (aumento de capital em 30/12/2021 em €190.000,00). Contudo, importa referir que, para efeitos de análise o capital social corresponde ao exercício de 2020, no valor de €10.000,00.
(…)
1. Da análise
a. Da constituição de garantia sobre participações sociais
Tendo em vista uniformizar os procedimentos e as práticas dos Serviços, o ofício circulado n.º 60.078, de 2010-
08-30, da Direção de Serviços de Gestão dos Créditos Tributários, determina que:
· as garantias constituídas em processo de execução fiscal que tenham por objeto participações sociais só devem ser aceites após uma avaliação casuística dos respetivos ativos financeiros, sendo que essa avaliação deverá corresponder ao valor que o Estado receberá se e quando for necessário proceder à sua conversão nos meios financeiros necessários ao pagamento da dívida;
· a avaliação deve ser efetuada em função do tipo de participação social em causa, de acordo com o artigo 15.º do Código do Imposto de Selo (CIS), por este se tratar do único regime legal existente no sistema fiscal que se adequa ao fim em vista.
Face ao preceituado no referido artigo 15.º do CIS, o montante da garantia a constituir deve ser determinado
em função do montante unitário de cada participação social, sendo que, quando se trate de quotas ou partes em
sociedades que não sejam por ações e o dos estabelecimentos comerciais, industriais ou agrícolas com contabilidade organizada, o seu valor se determina pelo último balanço.
Assim, no caso em apreço, assumindo a sociedade em causa a natureza de sociedade por quotas, o valor das quotas sobre as quais foi constituído o Penhor deverá ser apurado com base no último valor do balanço, eventualmente corrigido conforme previsto no n.º 2 do mesmo normativo.
b. Da garantia
A legitimidade para dar em penhor pertence em regra, ao titular dos bens, isto é, quem os pode alienar (n.º 1 do artigo 667º do Código Civil). Tendo por objeto avaliar as quotas da sociedade I… LDA, NIF 5…, sociedade por quotas, das quais são titulares e legítimos possuidores M… e D…, pelo que os mesmos têm legitimidade para sobre ela constituir garantias.
A constituição do penhor produz efeitos pela entrega dos bens empenhados ou de documento que confira a exclusiva disponibilidade dos bens ao credor, podendo a entrega consistir na simples atribuição da composse ao credor, se essa atribuição privar o autor do penhor de dispor materialmente dos bens (nºs 1 e 2 do artigo
669º do CC).
Analisada a certidão permanente do registo comercial em 12/05/2022 conclui-se que o penhor das quotas foi registado na CRC em 15/02/2022, a favor da AT, sendo o montante da quantia garantida de € 195.687,41, não havendo, porém, qualquer referência ao número do processo de execução fiscal que o mesmo visa garantir.
No entanto, dado o valor a garantir, a data de registo do penhor e o nome do credor, e para efeitos desta avaliação, ir-se-á considerar que o penhor registado se refere à garantia aqui em apreço. Sobre as referidas quotas, em 15/02/2022, não se encontram registados quaisquer outros encargos, para além do penhor em análise.

c. Avaliação das participações sociais (quotas) representativas do capital social da sociedade I… LDA, NIF 51…
Dos elementos contabilísticos referentes à I…, foram analisados o balanço, o balancete, a demonstração de resultados, o anexo às demonstrações financeiras (ADF), o Relatório de Gestão, a Ata de Aprovação das Contas, relativos ao exercício de 2020, bem como os demais elementos solicitados, assim como a certidão permanente da CRC.
· Apuramento do valor de Balanço e respetivas correções
Considerando tudo acima exposto, assumindo a sociedade em causa a natureza de sociedade por quotas, o valor de avaliação da sociedade deverá ser apurado com base no último valor do balanço, de acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 15.º do CIS, eventualmente corrigido conforme previsto no n.º 2 do mesmo normativo.
Posteriormente proceder-se-á às deduções previstas no artigo 199-Aº do CPPT.
Com base no referido Balanço, verifica-se que a sociedade apresenta, em 31 de dezembro de 2020, um valor total do capital próprio de € 79.903,27, com a composição que se reproduz no quadro infra:

(IMAGEM, VER NO ORIGINAL)
O n.º 2 do artigo 15.º do CIS prevê que no caso do valor do último balanço precisar de ser corrigido, o valor do estabelecimento ou das quotas e partes sociais determinar-se-á pelo balanço resultante das correções feitas. Compulsado o sistema informático, verifica-se que, a sociedade I...não possui quaisquer imóveis, pelo que, não se irá proceder a quaisquer correções desta natureza.
Da análise dos elementos contabilísticos referentes à I…, relativos ao exercício de 2020, bem como os demais elementos solicitados, não se verifica qualquer correção a efetuar.
Deste modo o valor do capital próprio corrigido da sociedade I...SOCIEDADE AGROPECUARIA LDA, NIF 51..., é de € 79.903,27 (setenta e nove mil, novecentos e três euros e vinte e sete cêntimos).
· Determinação do valor das participações detidas por M...e D..., na sociedade I...SOCIEDADE AGROPECUÁRIA LDA, NIF 51...
Por consulta à certidão permanente da I..., extraída em 12/05/2022, verifica-se que a mesma, em 2020, possui um capital social de € 10.000,00, representado por duas quotas, divididas da seguinte forma:
(IMAGEM, VER NO ORIGINAL)
Para efeitos de garantia, diz o n.º 4 do artigo 199º-A do CPPT que, o valor de avaliação da participação determinado nos termos do nº 1 do mesmo artigo “…deve ser deduzido dos seguintes montantes, quando aplicável (…):
a) Garantias concedidas e outras obrigações extrapatrimoniais assumidas;
b) Passivos Contingentes;
c) Partes de capital do executado, detidas, direta ou indiretamente, na respetiva proporção;
d) Quaisquer créditos sobre o executado.
a) Garantias concedidas e outras obrigações extrapatrimoniais assumidas
Da análise aos elementos contabilísticos e demais documentos fornecidos nomeadamente na declaração emitida pela Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal, foi possível concluir que, não existe qualquer valor a deduzir.
b) Passivos Contingentes
Consoante os elementos facultados, e análise dos mesmos, não se verificaram quaisquer passivos contingentes, pelo que não há lugar a correções.
c) Partes de capital do executado, detidas, direta ou indiretamente, na respetiva proporção
No caso em análise não é aplicável.
d) Quaisquer créditos sobre o executado
Serão ainda de deduzir ao valor do bem apurado nos termos do CIS, os créditos que esta detenha sobre os devedores, como dispõe a alínea d) do n.º 4 do artigo 199.º-A do CPPT. Da análise aos elementos facultados, a sociedade I...não detém créditos sobre os devedores, pelo que não se irá proceder a quaisquer correções desta natureza.
Deste modo, e aplicando o disposto no n.º 4 do artigo 199.º-A do CPPT, o valor atribuído à participação de M..., na I...SOCIEDADE AGROPECUÁRIA LDA, NIF 51..., para efeitos de avaliação de garantia é de € 39.951,635 e o valor atribuído à participação de D....e, na I...SOCIEDADE AGROPECUÁRIA LDA, NIF 51..., para efeitos de avaliação de garantia é de 15, conforme a seguir se demonstra:
(IMAGEM, VER NO ORIGINAL)
Assim, o valor atribuído às participações de M...e D..., na I...SOCIEDADE AGROPECUÁRIA LDA, NIF 51..., para efeitos de avaliação de garantia é de € 79.903,27 (setenta e nove mil, novecentos e três euros e vinte e
sete cêntimos), consoante a seguir se indica:
(IMAGEM, VER NO ORIGINAL)
Deste modo,
Face ao acima exposto, considerando as demonstrações financeiras apresentadas e aplicando as regras previstas no CIS e no artigo 199.º-A do CPPT, para efeitos de avaliação das quotas detidas por M...e D...na sociedade I...SOCIEDADE AGROPECUÁRIA LDA, NIF 51..., oferecidas pelos devedores, a favor da Autoridade Tributária para suspensão do processo executivo n.º 3085202201030264 por dívida de IRS do ano de 2017, avaliam-se as participações no valor de € 79.903,27 (setenta e nove mil, novecentos e três euros e vinte e sete cêntimos).
F) - Da suficiência da garantia
- Atento a referência do valor a garantir, constante da citação pessoal efetuada em 06.02.2022 para a execução fiscal n.º 3085202201030264, no montante de €195.687,41;
- Que o valor total referente às duas quotas representativas do capital social da sociedade I...SOCIEDADE AGROPECUÁRIA LDA, NIF 51..., ascende a € 79.903,27, sendo decomposto da seguinte forma:
a) À quota detida pela sócia M..., o valor de € 39.951,635;
b) À quota detida pelo sócio D....e, o valor de € € 39.951,635.
Desta forma, constata-se, pois, que a garantia aqui em crise, consubstanciada no penhor sobre as duas quotas da sociedade I...SOCIEDADE AGROPECUÁRIA LDA, NIF 51..., no montante total de € 79.903,27, mostra-se ser de valor insuficiente face ao valor a garantir de €195.687,41.
G) – Conclusão
Deste modo, face ao supra exposto, para notificação dos interessados na pessoa do seu mandatário, propõe-se:
- A aceitação da garantia - penhor sobre quotas da sociedade I...SOCIEDADE AGROPECUÁRIA LDA, NIF 51..., para a execução fiscal n.º 3085202201030264. Contudo, a mesma mostra-se ser de valor insuficiente face ao valor a garantir, pelo que deverá ser reforçada nos termos do artigo 199.º do CPPT.” – cfr. informação n.º 734/2022 junta como documento n.º 007451994 no Sitaf;
8. Em 24.05.2022, o Diretor de Finanças Adjunto da Direção de Finanças de Lisboa exarou na informação aludida em 7) supra o seguinte despacho:
“Concordo. Face à informação e pareceres prestados e com os fundamentos neles aduzidos, aceito a garantia
prestada, sob a forma de penhor sobre as quotas da sociedade referida, por se mostrar idónea, porém de valor insuficiente para garantir o processo de execução fiscal n.º 3085202201030264, pelo que e para o efeito, devem os executados ser notificados para o seu reforço ou prestação de nova garantia idónea, pelo valor remanescente. Diligências necessárias.” – cfr. despacho junto como documento n.º 007451994 no Sitaf;
9. Através de ofício, datado de 26.05.2022, remetido por carta registada com aviso de receção – registo dos CTT n.º RH877413230PT – foi emitida a notificação do despacho aludido em 8) supra. – cfr. ofício junto como documento 1 à p.i.; documento n.º 007451992 do Sitaf;
10. Em 27.05.2022, o ofício aludido em 9) supra foi rececionado pelos Reclamantes, na pessoa dos seus ilustres mandatários. – cfr. data e assinatura aposta no aviso de receção junto como documento n.º 007451995 do Sitaf;
11. Em 09.06.2022, os Reclamantes deduziram a presente Reclamação que remeteram à Direção de Finanças de Lisboa, através de correio registado – registo dos CTT n.º RH937077387PT. – cfr. invólucro do correio junto à petição inicial; informação n.º 893/2022 junta como documento n.º 007451993 dos autos Sitaf;
12. À presente petição inicial de Reclamação foram juntos o DUC com a referência n.º
702080082080968, relativo a taxa de justiça e o DUC n.º 702980082112495, respeitante a multas, com os correspondentes comprovativos de pagamento. – cfr. documentação junta à p.i.;
13. À data de 04.02.2022, no registo comercial da sociedade identificada em 1) supra encontra-se mencionado o depósito n.º 249/2021-07-31, respeitante à prestação de contas do ano de 2020. – cfr. facto não controvertido; certidão permanente junta como documento 11 à p.i.;
14. Em 08.06.2022, a sociedade identificada em 1) supra procedeu à substituição da primeira declaração de rendimentos – modelo 22 de IRC – ano de 2021, que havia sido submetida em 03.06.2022. – cfr. informação n.º 893/2022 junta como documento n.º 007451993 ao Sitaf;
15. Em 06.07.2022, a sociedade identificada em 1) supra procedeu à entrega da declaração de Informação Empresarial Simplificada (IES), respeitante ao ano de 2021. – cfr. documento n.º 007461894 no Sitaf;
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III.2) Factos não provados:
Atentas as diversas soluções plausíveis de direito, inexistem factos a fixar como não provados.
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Motivação:
A decisão sobre a matéria de facto assente baseou-se no acervo documental constante dos autos, não impugnado e que, por isso, merece credibilidade e nas informações oficiais, tudo tal como indicado acima por referência a cada concreto ponto da matéria de facto.
Foi a análise crítica de toda a prova enunciada que, em conjugação com as regras da
experiência comum, sedimentou a convicção do Tribunal – cfr. artigos 74º, 76º, n.º 1, ambos, da Lei Geral Tributária (doravante, LGT) e 362º e seguintes do Código Civil (doravante, CCiv).
*
4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Como dissemos, a única questão que se coloca nos presentes autos é a de saber a AT, na apreciação do pedido de prestação de garantia através da constituição de penhor, tendo sido oferecidas para o efeito quotas de uma sociedade, pode erigir como critério de avaliação das mesmas o que está previsto no CIS, que considera ser o critério que lhe é imposto por lei.

A sentença recorrida entendeu que não e, a nosso ver, fez correcto julgamento.

Mostram os autos e o probatório que os dois sócios da “I…– Sociedade Agro-pecuária, Lda.”, aqui Recorridos, deliberaram um aumento de capital social de 10.000 euros para 200.000 euros, levado a registo pela Ap. 1/20211230.

Em 15/02/2022 e no seguimento de citação, apresentaram em garantia penhor de quotas daquela sociedade para suspender a execução que contra eles corre por dívidas de IRS/2017 no valor de 155.041,47 euros, na pendência da reclamação graciosa.


A AT avaliou as participações sociais para efeitos de garantia e seguindo as orientações preconizadas no ofício-circulado n.º 60.078, de 2010/08/30, de acordo com o disposto no art.º 15.º do Código do Imposto de Selo, como se diz na informação que suporta a decisão reclamada, “por este se tratar do único regime legal existente no sistema fiscal português que se adequa ao fim em vista”.

Dispõe aquele preceito no segmento pertinente:
«Artigo 15.º
Valor tributável de participações sociais e títulos de crédito e valores monetários

1 - O valor das quotas ou partes em sociedades que não sejam por acções e o dos estabelecimentos comerciais, industriais ou agrícolas com contabilidade organizada determina-se pelo último balanço, ou pelo valor atribuído em partilha ou liquidação dessas sociedades, salvo se, não continuando as sociedades com o herdeiro, legatário ou donatário do sócio falecido ou doador, o valor das quotas ou partes tiver sido fixado no contrato social.

2 - Se o último balanço referido no número anterior precisar de ser corrigido, o valor do estabelecimento ou das quotas e partes sociais determinar-se-á pelo balanço resultante das correcções feitas.

3 – (…)»


E avaliou a AT as participações sociais, com base no último balanço que considerou ser o de 2020, desconsiderando o aumento de capital social de 10.000 euros para 200.000 euros entretanto efectuado pelos Recorridos e levado a registo pela Ap. 1/20211230, o que redundou na decisão reclamada do insuficiente do valor da garantia apresentada.


Sobre o tema já se debruçou o ac. do STA, de 12/02/2015, tirado no proc.º 01458/15, em que nos revemos e que sempre importará ter em conta nos termos e para efeitos do disposto no art.º 8.º, n.º 3, do Código Civil.

Como ali se refere e, transcrevemos, «Desde logo, quando aquela norma [art.º 52/2 da LGT] se refere à prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias quer dizer que a garantia deve ser prestada nos termos das leis tributárias (designadamente dos arts. 169.º, n.º 1, e 199.º, do CPPT) e não que na aferição da sua idoneidade devam ser utilizados os critérios de avaliação de bens (ou de rendimentos) prescritos nas leis tributárias para efeitos da determinação da matéria tributável em ordem à incidência dos diversos tributos.
Depois, não podemos perder de vista as distintas finalidades prosseguidas pela avaliação quando está em causa aferir da idoneidade da garantia oferecida pelo executado em ordem à suspensão da execução fiscal e pela avaliação quando está em causa a determinação da matéria tributável como expressão quantitativa do facto tributário. Os critérios de determinação do valor são necessariamente definidos de acordo com as finalidades prosseguidas pela avaliação.
No caso da garantia, o que se pretende com a avaliação é determinar, do modo mais aproximado possível, o valor dos bens ou direitos oferecidos, a liquidez que os mesmos são susceptíveis de gerar caso seja necessário executar a garantia; dito de outro modo, os valores que poderão obter se forem postos à venda. Já para efeitos de tributação em IS – imposto sobre o consumo ou a despesa, com incidência sobre alguns actos e contratos, previstos na Tabela Geral anexa ao Código – a avaliação tem como finalidade determinar a matéria tributável para efeitos de incidência daquele imposto.
(…)
Assim, não vemos como sustentar que o valor a considerar para tributação em IS no âmbito das transmissões gratuitas de quotas sociais e no caso de as sociedades terem contabilidade organizada, fixado pelo art. 15.º do CIS, se imponha como o valor a considerar na avaliação das quotas sociais oferecidas como garantia a constituir por penhor. Não só não existe qualquer norma ou princípio legal que o imponha, como nem sequer pode sustentar-se a adequação desse método para o fim prosseguido que, como deixámos já dito, é o de estabelecer o valor de mercado dessas quotas.
(…)
Na verdade, o critério a adoptar deve procurar o valor de mercado, pois será esse, em princípio, o valor que poderá resultar da venda dos bens oferecidos para sobre eles ser constituída a garantia (…)» (fim de cit.).

Neste modo de ver e, independentemente da escolha do método de avaliação que a AT entenda propor, a verdade é que o motivo por que o pedido de apresentação da garantia não encontrou inteira satisfação foi o de que as quotas sociais oferecidas para a constituição do penhor, avaliadas nos termos do CIS, não permitiam concluir pelo suficiente valor da garantia oferecida.

Ora, essa explicação não é válida, como vimos, para se concluir que as quotas sociais oferecidas têm valor insuficiente, antes se devendo procurar o seu valor de mercado.

A sentença recorrida não padece do erro de julgamento que lhe vem assacado, merecendo ser confirmada e negado provimento ao recurso.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes-desembargadores da 2.ª Subsecção deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo da Recorrente em ambas as instâncias.

Lisboa, 06 de Dezembro de 2022


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Vital Lopes




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Luísa Soares




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Tânia Meireles da Cunha