Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 657/07.1 BELSB |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 02/16/2023 |
| Relator: | ISABEL FERNANDES |
| Descritores: | IRC PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA PROVISÕES; CUSTOS NULIDADE DA SENTENÇA. |
| Sumário: | I – Nos termos do preceituado no nº1 do artigo 125º do CPPT constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer. |
| Aditamento: |
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| Decisão Texto Integral: | I – RELATÓRIO
A FAZENDA PÚBLICA e J… – GESTÃO DE EMPRESAS DE RETALHO SGPS. S.A., interpuseram recurso jurisdicional da decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, de 31 de Dezembro de 2012, nos termos da qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação deduzida pela segunda, relativamente às liquidações adicionais de IRC n.ºs 2006 8510038096 e 2006 8500040518, e acertos referentes ao exercício de 2002. A Fazenda Pública, nas suas alegações recursivas, formulou as seguintes conclusões: «Posto tudo o que já foi dito, extrairemos as seguintes conclusões: I – A questão controvertida prende-se com o facto do Tribunal “a quo” ter decidido pela procedência parcial, relativamente à liquidação n.ºs 2006 8510038096 e 2006 8500040518 do IRC impugnada nos autos, e com a qual não concordamos. II – No que respeita à desconsideração fiscal do valor contabilizado como custo a título de rendas e despesas do condomínio, entende a FP que dos documentos apresentados, os mesmos não evidenciam de forma clara e consistente o pagamento das rendas. III – No que concerne à desconsideração fiscal das provisões para fazer face a créditos incobráveis de fornecedores, importa concluir que tais provisões não se enquadram em créditos de cobrança duvidosa, nos termos legalmente estipulados. IV – Relativamente à desconsideração como ganhos e perdas extraordinárias decorrentes dos ganhos ou perdas obtidas pela I..., decorrente da alienação de bens do activo imobilizado corpóreo, ficou demonstrada a inexistência de indícios ou prova de que os imóveis em causa tenham tido alguma função produtiva na actividade da empresa. V – Quanto à não aceitação de Retenção na Fonte sobre rendimentos prediais, tais retenções não ficaram devidamente demonstrados pelos documentos apresentados em face do desvalor contabilístico e fiscal que as listagens evidenciam. VI – Assim, a douta sentença ora recorrida, a manter-se na ordem jurídica, é convencimento da Fazenda Pública que incorreu em erro de julgamento. Nestes termos, em face da motivação e das conclusões atrás enunciadas, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se, em consequência a douta sentença ora recorrida, com as legais consequências, assim se fazendo por Vossas Excelências a costumada Justiça.» * A Impugnante, J… – Gestão de Empresas de Retalho, SGPS notificada do recurso interposto, apresentou as suas contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: «A. Inconformada com a decisão — na parte relativa à desconsideração fiscal do montante contabilizado como custo pela P... a título de rendas e despesas de condomínio, à desconsideração fiscal das provisões constituídas pela F... e P... para fazer face a créditos incobráveis de fornecedores, à desconsideração como ganhos ou perdas extraordinárias, sujeitos ao regime de tributação previsto nos arts. 42º a 45º do CIRC, dos ganhos ou perdas obtidos pela I... em virtude da alienação de bens do seu imobilizado corpóreo (imóveis) e à correcção ao nível das importâncias deduzidas pelas sociedades F...e P…, relativa a retenções na fonte sobre rendimentos prediais auferidos - a Fazenda Pública interpôs o presente recurso, a cujas alegações se apresenta agora resposta. B. Com efeito, a respeito da desconsideração fiscal do montante contabilizado como custo pela P... a título de rendas e despesas de condomínio, a Fazenda Pública expressamente reconhece que a mesma vem fundada 11a alegada “inexistência de documentos externos, in casu, recibos de quitação, que permitam comprovar e demonstrar a veracidade da operação subjacente ao respectivo lançamento contabilístico”. Contudo, numa inesperada inversão do iter cognoscitivo da sua argumentação, a Fazenda Pública acaba por defender que os “valores de €413.749,20 e 331.609,08 foram contabilizados por contrapartida da conta de Acréscimos de Custos, não se encontrando os mesmos devidamente liquidados”, do que retira que “no ano de 2002 não foram pagas as rendas [dessas] lojas às sociedades C… e I...”. C. É, de todo, intolerável esta argumentação já que não só os documentos internos são susceptíveis de comprovar, idónea e suficientemente, os custos e perdas efectivamente incorridos por determinado sujeito passivo, tendo em vista a realização dos seus proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da respectiva fonte produtora, como, no caso em apreço, não há dúvida de que os documentos que titulam a operação negocial em causa e, bem assim, que dão suporte aos custos ou perdas registados pela sociedade P…, no exercício em referência, são suficientes para afastar quaisquer das dúvidas suscitadas pela aqui recorrente: D. Eles são de molde a demonstrar, em primeiro lugar, que tratamos de custos ou perdas efectivas, ocorridos no exercício em que foram registados (em cumprimento do princípio da especialização dos exercícios), pelos montantes inscritos na contabilidade - a exibição (a) dos documentos internos, (b) da correspondência trocada com as contrapartes nas operações em causa (designadamente para efeitos da actualização dos montantes cobrados a título de rendas), (c) das declarações emitidas pela sociedade P... atestando o rendimento colocado à disposição daquelas e, bem assim, o montante retido a título de IRC e, finalmente, (d) dos extractos bancários que identificam os pagamentos efectuados, o momento e os montantes dos mesmos, é prova suficiente, cabal e idónea da efectividade dos custos em causa (cfr. doc. nº 6 e doc n° 7) E. e a demonstrar, em segundo lugar, que se trata de custos ou perdas indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora da sociedade P... - a exibição dos contratos de arrendamento e, bem assim, dos contratos de promessa de arrendamento e subarrendamento celebrados com terceiros, ao abrigo dos quais são suportados os encargos em causa, e prova suficiente, cabal e idónea da imprescindibilidade dos mesmos, porquanto tratamos de contrapartidas pela utilização (arrendamento ou subarrendamento) de espaços destinados à ocupação de lojas e ao desenvolvimento da respectiva actividade (cfr. doc. nº 6 e doc. nº 7, juntos com a petição inicial). F. Contra esta prova, feita documentalmente e atestada testemunhalmente, não deve a Fazenda Pública insurgir-se, a não ser que a impugne ou que a contradite, o que não aconteceu nem, em rigor, podia ter acontecido. G. Os pagamentos das rendas e despesas de condomínios estão individualizadamente reflectidos nos documentos - das declarações emitidas pela sociedade P... atestando o rendimento colocado à disposição daquelas e, bem assim, o montante retido a titulo de IRC e, finalmente, (d) dos extractos bancários que identificam os pagamentos efectuados, o momento e os montantes dos mesmos (cfr. doc. n° 6 e doc. 11o 7, juntos com a petição inicial) — e não poderiam ter sido provados por outra forma. H. A utilização efectiva (tradição) dos imóveis arrendados é um facto notório, evidente, do conhecimento público (refira-se que em causa estão lojas sob a insígnia P…, abertas ao público no exercício de 2002), que a própria Administração fiscal conseguiria atestar através de uma simples pesquisa informática ou de uma verificação das inúmeras declarações a que teve acesso por referência ao período em causa que atestam a realidade das vendas nelas operadas. I. A enormidade da falta de rigor argumentativo da Fazenda Pública é de tal forma que nada do que aduz - forma de pagamento/colocação à disposição das rendas e não verificação efectiva das operações em crise — é coerente com a circunstância de a Administração fiscal não ter colocado em crise, nem os proveitos do lado das sociedades que deles beneficiaram no exercício em referência, nem as retenções na fonte realizadas pela sociedade P… no momento da disponibilização do rendimento ao respectivo e efectivo beneficiário. J. Bem esteve, neste ponto, o Tribunal a quo. K. Seja como for - e sem prescindir do que vem de ser dito não bastaria nunca à Administração fiscal, para efeitos da desconsideração fiscal dos custos em referência a invocação pura e simples da necessidade da comprovação dos mesmos sob a forma exclusiva da exibição de documentos externos. L. Por outro lado, em relação à correção consubstanciada na desconsideração fiscal das provisões constituídas pela F...e P...para fazer face a créditos incobráveis de fornecedores, a Fazenda Pública insurge-se contra a decisão do Tribunal a quo, defendendo que “ não faz sentido que se provisione débitos sobre fornecedores a favor da F...e P…, por não respeitar o requisito essencial – tratar-se de um crédito de cobrança duvidosa, atendendo à sua natureza (resultante de uma relação comercial vinculada por um contrato)”. M. A lei e a especificidade do enquadramento factual do caso concreto, não estão, porém, do seu lado. N. É que, como foi dito já em outros momentos dos presentes autos, e o Tribunal Tributário de Lisboa corroborou, não há dúvidas de que a decisão contabilística de constituir as provisões em causa foi precedida de um juízo (subjectivo — feito por quem o poderia fazer) fundado de incobrabilidade do crédito, baseado no tempo de permanência do mesmo (cfr. documento demonstrativo da evolução dos saldos da conta corrente dos fornecedores objecto de provisão, no espaço temporal decorrido entre 2000 e 2002 - doc. n° 10) e na frustração das diligências levadas a cabo pelas sociedades F...e P...no sentido da sua cobrança (vide documentos comprovativos das diligências efectuadas no sentido do recebimentos dos créditos sobre fornecedores, juntos como doc. n° 12 e o depoimento das testemunhas inquiridas). O. No caso em apreço, também não restam dúvidas — deste aspecto nem a Fazenda Pública parece duvidar - de que as provisões constituídas são fiscalmente dedutíveis, dado incidirem sobre créditos que inequivocamente resultam da actividade normal das sociedades F...e P...e que como tal se encontram evidenciados na contabilidade (cfr. cópia dos balancetes de cada uma das sociedades, F...e P…, a 31.12.2002, evidenciando que os saldos das contas 221 e 288 ascendiam, naquela data, aos montantes evidenciados — doc. nº9). P. Ora, esta é a demonstração que basta para que os créditos em causa possam ser deduzidos para efeitos fiscais, nos termos das disposições supra referenciadas. Q. Contudo, mesmo que assim não fosse, sempre, seriam errados — completamente errados — os pressupostos de que se prevalece a Fazenda Pública nas suas alegações, para contrariar o sentido da sentença contra que recorre, o que se mostrou nesta resposta às alegações de recurso da Fazenda. R. É, pois, errónea a interpretação que a Administração fiscal faz dos factos em causa e errónea a aplicação legal que faz dos mesmos, devendo, por esse motivo, ser anulada a liquidação em crise, conforme se propugna na sentença recorrida, a qual, quanto a esta matéria, não nos merece qualquer tipo de censura. S. No que se refere à correcção relativa à desconsideração como ganhos ou perdas extraordinárias, sujeitos ao regime de tributação previsto nos arts. 42° a 45° do CIRC, dos ganhos ou perdas obtidos pela I... em virtude da alienação de bens do seu imobilizado corpóreo (imóveis), a Fazenda Pública diz discordar da posição adoptada pelo Tribunal a quo, porquanto “ da análise efectuada a esta situação, não foram encontrados quaisquer indícios ou provas de que tais imóveis tenham tido alguma função produtiva na actividade da empresa, ou que a empresa os utilizasse na sua actividade operacional, nem foi demonstrado no âmbito da acção inspectiva, nem agora no presente processo, que os mesmos tivessem sido a causa de qualquer proveito ou ganho financeiro, nomeadamente através de rendimentos deles provenientes”. T. Esta tese não faz qualquer sentido, conforme o Tribunal a quo bem fez notar. U. Atenta a prova produzida nos autos, não pode aceitar-se como legal a correcção pela qual a Administração fiscal qualifica como ACTIVO PERMUTÁVEL - e não como ACTIVO IMOBILIZADO - os bens imóveis adquiridos pela sociedade I... em vista da sua prossecução do seu objecto social, dado nele se encontrar prevista a actividade de compra e venda de imóveis. V. Está em causa a reclassificação contabilística de bens que a I... afectou ao respectivo activo imobilizado de acordo com aquela que considerou ser a boa aplicação dos princípios e regras da sã contabilidade, e cujo relevo fiscal é aqui particularmente significativo — e penalizador na perspectiva da impugnante —, dado o diferente tratamento que a lei tributária confere aos custos ou perdas decorrentes da aquisição de imobilizações e de existências — ou de bens do activo imobilizado e bens do activo permutável — e, bem assim, aos proveitos ou ganhos decorrentes da sua alienação. W. Ora, não é aceitável que o destino dos bens — critério que, como se sabe, apela à realidade empresarial, à função concreta dos bens — possa ser aferido com segurança a partir de parte de uma cláusula estatutária que define o objecto social. X. A Autoridade Tributária ajuíza, pois, com erro e sem a indispensável independência, a opção da I... de inscrever no respectivo activo imobilizado determinados imóveis atento o seu destino e a sua funcionalidade (esperada) — que só ela competia conhecer — no contexto da empresa, único critério válido — atendendo ao supra exposto — de classificação dos referidos bens como bens do activo imobilizado da sociedade, e, em consequência, a sujeição dos ganhos provenientes da alienação dos mesmos ao regime especial de tributação das mais-valias previsto no art. 45° do CIRC. Y. Bem andou, nesta matéria, o Tribunal, que, demarcando-se da Administração fiscal no que diz respeito à classificação dos imóveis em causa, sempre cuidou de atestar que “ não se pode concluir, como fez a AT, que estamos perante um ativo permutável, considerando unicamente que o objecto da sociedade I... é o da compra e venda de imóveis, e desde logo porque, este não é o objecto desta sociedade, o objecto estatutário inclui, também, actividades de outra natureza como seja a actividade de gestão, incluindo a locação, sublocação, exploração ou cessão, total ou parcial, de imóveis, destinados à actividade de supermercados ou hipermercados e outras formas de distribuição.” Z. Por fim, sobre a correcção ao nível das importâncias deduzidas pelas sociedades F...e P…, relativa a retenções na fonte sobre rendimentos prediais auferidos, a Fazenda Pública insiste que “a prova de que o valor deduzido à colecta de IRC do ano de 2002 foi efectivamente objecto de retenção na fonte pelos substitutos tributários na qualidade de entidades pagadoras de rendimentos prediais só poderá ser concretizada através de documentos emitidos pelos lojistas que comprovem a rentenção por estes efectuada”. AA. A correcção realizada nesta matéria é particularmente chocante porque flagrantemente violadora de todos os valores ínsitos no principio da tributação do rendimento real e da capacidade contributiva, como sejam os valores da legalidade, da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé, em obediência a uma exigência de ordem formal, cujo incumprimento é, no caso, exclusivamente imputável às entidades devedoras dos rendimentos objecto de retenção, na qualidade de substitutos tributários. BB. Não pode seriamente questionar-se — desde logo, por respeito aos princípios constitucionais da tributação do rendimento real e da capacidade contributiva — a dedução relativa a retenções na fonte de que as sociedades F...e P...foram efectivamente alvo, apenas com base no facto de as mesmas não se encontrarem suportadas pelo documento a que se refere a al. b) do n° 1 do art. 119° do CIRS, por remissão do art. 120º do CIRC, cuja obrigação — como vimos — nem sequer lhes pertence. CC. Se, por um lado, a certeza quanto à efectividade das retenções na fonte — o que a Administração fiscal não contesta, nem poderia contestar já que é ela a depositária das mesmas — é suficiente para justificar o direito (adquirido) à dedução a que faz referência a al. f) do nº 2 do art. 83° do CIRC, não pode a sua comprovação ficar dependente da emissão de um documento de determinado tipo com exclusão de todos os outros. DD. O sujeito passivo tem sempre que ser admitido a demonstrar, por quaisquer outros meios, que as retenções na fonte que deduz à respectiva colecta foram efectivamente efectuadas por quem a lei define como seu substituto tributário para esse efeito, EE. Ora, essa demonstração foi feita nos presentes autos pela impugnante através da exibição dos docs. n° 47 a nº 49, lidos, analisados, interpretados e admitidos como prova idónea pelo Tribunal recorrido. FF. Permite a prova efectuada, não podem restar dúvidas de que as sociedades F... e P... foram efectivamente sujeitas a retenção na fonte de imposto, tendo o mesmo incidido sobre a totalidade dos rendimentos de natureza predial por si auferidos, assim como não pode ser questionado o seu direito à dedução prevista na al. f) do n° 2 do art. 83º do CIRC. GG. É, pois, inegável a ilegalidade da correcção efectuada pela DSIT nesta matéria, consubstanciada em duplicação de colecta e em violação dos princípios constitucionais de tributação pelo lucro real e de capacidade contributiva. TERMOS EM QUE DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO IMPROCEDENTE, POR NÃO PROVADO, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, DESIGNADAMENTE A MANUTENÇÃO, NESTA PARTE, DA SENTENÇA RECORRIDA.» * A Impugnante apresentou, igualmente, recurso da sentença proferida pelo TT de Lisboa, no qual formulou as seguintes conclusões: «1ª O presente recurso vem interposto da parte da Sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida pela J… - GESTÃO DE EMPRESAS DE RETALHO, SGPS, S.A. (doravante simplesmente J… , Recorrente ou Impugnante) contra a liquidação de IRC que lhe foi dirigida, com respeito ao exercício de 2002. 2ª A Sentença em causa julgou improcedente a fundamentação aduzida pela Recorrente, e, em consequência, determinou a manutenção da correcção ao lucro tributável do grupo de sociedades tributado de acordo com o regime especial de tributação dos grupos (RETGS) consubstanciada na desconsideração fiscal dos custos suportados pela F...e P...com o pagamento de royalties pela utilização das marcas F...e P…, respectivamente, no valor total de €9.603.392,00. 3ª Tendo por base a fundamentação da decisão recorrida acabada de mostrar, defende a Recorrente que a Sentença está ferida de nulidade. 4ª Esta resulta, em primeiro lugar, de uma apreciação errada da matéria de facto provada. 5ª Com efeito, entende a Recorrente que grande parte dos factos de que o Tribunal se serviu para fundamentar a sua decisão não são verdadeiramente factos susceptíveis de influenciar as opções de direito, mas antes conclusões e afirmações descontextualizadas retiradas do corpo do Relatório de Inspecção Tributária que esteve na base da liquidação impugnada. Em muitos casos, eles configuram mesmo puras especulações e observações tendenciosas, apenas compreensíveis num contexto de defesa parcial de um interesse de arrecadação tributária, mais próprio da actuação das autoridades com competências inspectivas de natureza fiscal do que de um Tribunal fiscal. 6ª Interessa registar que é impossível não conceder que a consideração desses factos era relevante para a solução da lide, no sentido em que, conforme a Recorrente sempre defendeu — e independentemente da decisão acerca da sua prova eles são susceptíveis de destruir os indícios de que se prevalecem a AT e o Tribunal para concluir que “o montante dos royalties contratados não corresponde [a] condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis, designadamente o indício de que “quer a F… e o P...detêm, na sua esfera, os custos associados à gestão e desenvolvimento das respectivas marcas, bem como todos os riscos a estas inerentes”; e, bem assim, o que que “não exist[irem] custos contabilizados relativos à gestão das marcas em causa, nas contas da sociedade do grupo que adquiriu as marcas”. 7ª Assim sendo, perante a relevância dos factos aduzidos, que têm a capacidade de refutar os alegados ‘‘indícios” da AT, deveria a Sentença recorrida ter-lhes feito uma referência e dedicado uma apreciação expressas. 8ª Se o Tribunal deu por integralmente provados os factos do Relatório, e se os tratou como “indícios” suficientes, então teria necessariamente de fazer constar do rol da matéria não provada os factos que a Recorrente defendeu serem idóneos à demonstração do contrário, de que aquela natureza indiciária seria de afastar, explicando, com suficiente rigor, o porquê de os não ter considerado credíveis. Se o Tribunal achou que a matéria em causa não resultou provada, devia tê-lo dito claramente, assim como deveria ter desenvolvido circunstanciadamente as razões pelas quais ficou com essa convicção. 9ª Depois, a verdade é que os factos dados como provados pelo mesmo Tribunal, não tendo sido sujeitos a uma apreciação crítica — o que, de resto, impede a ora Recorrente de sindicar o decidido —, não são de molde a suportar a decisão por ele tomada, mostrando-se mesmo frontalmente contrários ao seu sentido e conteúdo. 10ª Além disso, e sem prescindir, entende a Recorrente que o Tribunal fez uma interpretação e aplicação inidóneas do Direito consequentemente aplicável, em termos de se poder mesmo alegar a violação de princípios constitucionalmente consagrados, como sejam o princípio da legalidade fiscal, o princípio da liberdade económica e o princípio da tributação pelo lucro real: o Tribunal não captou adequadamente a sua razão de ser das normas e o tipo de casos que as mesmas pretendem abranger, para o que terá contribuído uma aplicação insuficiente da doutrina disponível e uma submissão forçada dos dispositivos legais aos fundamentos tendenciosos do Relatório produzido na sequência da acção inspectiva, o qual, além de utilizar pressupostos errados e meramente especulativos, formula juízos conclusivos absolutamente incompatíveis com o dever de defesa dos primados da legalidade e justiça que lhe é conferido por lei. 11ª Saliente-se, em primeiro lugar, que o Tribunal a quo aceita - muito embora não o dê como provado no capítulo que dedica à factualidade e à prova — que foi efectiva e validamente celebrado o contrato entre a J…, de um lado, e a F...e P…, de outro lado, por via do qual — é forçoso admitir — a primeira se tomou a legítima detentora das marcas que as segundas utilizam na sua actividade comercial. 12ª Depois, o Tribunal igualmente não contesta — como, de resto, a AT nunca o fez — o facto indesmentível de as marcas em referência serem marcas valiosas e absolutamente indispensáveis à actividade da F... e da P… . 13.ª Aliás, note-se, que a Sentença recorrida não põe em dúvida o valor que as partes atribuíram às referidas marcas, aquando da sua alienação em beneficio da J… — esse valor foi, de resto, conforme resulta da prova realizada, certificado por instituições especializadas, e, além disso, nunca foi escrutinado pelas autoridades fiscais, que o admitiram como bom para efeitos da validação dos seus efeitos fiscais na esfera das sociedades alienantes (F...e P…). 14ª O problema parece residir, afinal e bem vistas as coisas, na conclusão que o Tribunal recorrido retira da concessão que faz à fundamentação aduzida pela AT baseada na existência de uma alegada desconformidade entre o preço efectivamente contratado e aquele a que presumivelmente chegariam entidades independentes. 15ª Não se nega que, nos termos do IRC, é possível questionar a indispensabilidade de um certo custo (cfr. o artigo 23° do CIRC); e, igualmente no nosso sistema, é possível também não aceitar uma certa forma jurídica, porque ela não se adequa à correspondente substância económica (cfr. o nº 2 do artigo 38º da LGT); o que é certo, contudo, é que não é possível, para este efeito, lançar mão do artigo 58° do CIRC, 16ª Acresce ao que vem de ser dito que, ao contrário do que pretende o Tribunal, os termos e condições contratados entre as sociedades F...e P...e a sociedade J… correspondem àqueles que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis, não sendo própria a aplicação ao caso do artigo 58° do CIRC. 17ª Com efeito, nada no elenco factual supra exposto ou nos argumentos invocados, quer pelo Tribunal Tributário de Lisboa, quer pela AT, conduz à conclusão de que, entre as sociedades F...e P...e a sociedade J… , foram estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes, e que, do estabelecimento daquelas condições, resultaram lucros tributários diversos dos que seriam apurados na sua ausência. 18ª A propósito dos indícios convocados pelo Tribunal Tributário de Lisboa foi esclarecido, em primeiro lugar, que o Tribunal parece deixar-se impressionar pelo argumento, se bem o entendemos, de que não é crível que partes independentes estivessem dispostas a realizar um negócio pelo qual uma das partes aceita adquirir um activo intangível, que pode amortizar por um período limitado de tempo (cinco anos), e, em virtude dessa aquisição, passar a auferir proveitos decorrentes da cedência da sua utilização a terceiro, por um período de tempo substancialmente superior (30 anos). Ou então, ponderando a possibilidade de o raciocínio ter sido outro, o Tribunal parece não acreditar que partes independentes quisessem fazer parte de um negócio em que uma entidade (no caso, duas sociedades) troca um activo que já estava integralmente amortizado, por um custo operativo certo, de duração não inferior a 30 anos. 19ª Considerando que o indício de que o Tribunal quis tratar é o primeiro, deve ser tornado claro que o mesmo não faz sentido, porquanto assenta em pressupostos irreais. 20.ª Em segundo lugar, o Tribunal diz estar convencido que, quer a F... quer o P… , detêm, na sua esfera, os custos associados à gestão e desenvolvimento das respectivas marcas, bem como todos os riscos a estas inerentes. 21.ª A argumentação da douta decisão é, também quanto a este aspecto, irremediavelmente falaciosa: revisitada a factualidade convocada pela ora Recorrente, provada testemunhalmente, fica clara a ideia de que foi mal percepcionada a realidade e mal interpretada a verdade contabilística dos custos associados à promoção das marcas em causa na esfera das sociedades F...e P… . 22ª Nestas sociedades, disseram-no as testemunhas inquiridas, os custos com publicidade não respeitam apenas — não podem respeitar — à obrigação contraída contratualmente nos Licence Agreements: os lançamentos relativos à rubrica contabilística “Publicidade e propaganda” são outros e mais abrangentes do que estes. E são de tal forma relevantes que deles depende forçosamente a manutenção da fonte produtiva da Recorrente. É que, na verdade, ninguém razoavelmente atento à realidade do sector do comércio a retalho nacional questiona que, além do fenómeno de promoção da marca, stricto sensu, existe o fenómeno da promoção do produto sem marca de comercialização exclusiva. 23ª Finalmente, a Juiz que profere a decisão recorrida diz-se convencida que “não existem custos contabilizados relativos à gestão das marcas em causa, nas contas da sociedade do grupo que adquiriu as marcas”. 24ª Ora, por incrível que possa parecer, isto não é dito assim em nenhum lado, e muito menos é de alguma forma demonstrado ou comprovada. A AT insinua, é certo. Insinua com uma confiança certamente excessiva face ao conhecimento directo que tinha e tem dos factos. Mas de um Tribunal espera-se um sentido equidistante de justiça e rigor que não pode compadecer-se com meras especulações ou afirmações levianas e irresponsáveis. À AT teria sido possível saber, com certeza, se existem custos contabilizados relativos à gestão das marcas em causa, nas contas da sociedade do grupo que adquiriu as marcas, bastaria, para o efeito, que usasse os instrumentos de troca de informações entre as Administrações fiscais portuguesa e suíça. Isso nunca aconteceu, porém. 25ª Perpassa por toda a matéria factual que as operações de cessão onerosa das marcas F...e P...tiveram na sua origem razões de índole estratégica e económica perfeitamente identificadas (a satisfação imediata de determinadas necessidades de tesouraria e a facilitação da gestão profissionalizada, integrada e contextualizada daquelas marcas, por uma sociedade apenas dedicada a esse fim e melhor posicionada para a sua promoção institucional internacional), explicadas no contexto da época em que ocorreram e no contexto do desenvolvimento estrutural das sociedades do Grupo em causa. Em virtude da realização das referidas operações, as sociedades F...e P...transferiram para a J… todos os direitos, obrigações e riscos inerentes à detenção da propriedade daquele activo incorpóreo. 26ª Por outro lado, os termos e condições praticados no âmbito das referidas operações corresponderam àqueles que entidades independentes teriam contratado e praticado em operações comparáveis, o que acabou por ser corroborado pelo estudo de avaliação externa solicitado pelas sociedades F...e P...à sociedade T… & L… Associates, Inc. 27ª Além disso, os termos e condições praticados no âmbito das referidas operações foram, por diversas vezes, objecto de análise e exame por parte das Administração fiscal portuguesa, nunca os mesmos tendo sido por ela questionados. 28ª Diferentemente, as operações de licenciamento para a utilização das marcas F...e P...— tituladas pelos Licence Agreements — foram motivadas pela necessidade de prossecução da actividade de comércio a retalho sob aquela designação e elemento distintivo, factor de diferenciação essencial para aquelas sociedades. 29ª Por força da celebração daqueles acordos, a sociedade J… compromete-se a licenciar a utilização das marcas de que é legítima proprietária em benefício das sociedades F...e P… , estabelecendo-se como contrapartidas: (a) o pagamento de uma taxa de licenciamento equivalente a 0,6% do total das vendas registados por estas últimas em território português; e (b) o investimento, na proporção de 0,15% da respectiva facturação, na promoção da marca cuja utilização lhes foi cedida, através da criação de campanhas publicitárias institucionais e de outras iniciativas promocionais especiais. 30.ª Acresce que estes e os demais termos e condições contratados no âmbito das referidas operações corresponderam àqueles que a entidade independente T… & L… Associates, Inc. concluiu como sendo os termos e condições de mercado em operações comparáveis. Aliás, aqueles são também os termos e condições que, desde 1994, data da celebração dos referidos acordos, têm vindo a ser objecto de análise e exame por parte da Administração fiscal portuguesa, sem nunca terem sido por ela questionados. 31ª Não sendo verdade que dos contratos em análise não resultam quaisquer ónus ou responsabilidades para a J… — da celebração dos referidos acordos resulta, para aquela sociedade, a impossibilidade de controlo directo da susceptibilidade de valorização ou desvalorização dos activos cuja utilização licencia e ainda o ónus da sua conservação no activo não obstante a existência de eventuais ofertas do mercado no sentido da sua aquisição — ou que dos mesmos não resultam quaisquer benefícios para as sociedades F...e P...— da celebração dos referidos acordos resulta a vantagem económica inequívoca de prossecução das respectivas actividades sem alteração das respectivas insígnias — não pode a Administração fiscal corrigir o resultado económico das referidas operações com base na suspeita de que o mesmo não corresponde àquele que entidades independentes apurariam em idênticas circunstâncias, atentos os termos e condições estabelecidos pelas partes no gozo da sua liberdade de gestão. 32ª Aliás, o estudo realizado pela empresa de consultadoria independente E… & Y… é, a este nível, francamente elucidativo. Se, por um lado, o referido estudo conclui pela existência de, pelo menos, quatro acordos de licenciamentos potencialmente comparáveis com os contratos de licenciamento em análise, através da utilização das bases de dados P… e R…; por outro lado, conclui pela adequação da taxa de royalties de 0,6% e pela adequação da transacção em análise dentro dos parâmetros de mercado. 33ª Além disso, sem conceder quanto ao vício de violação de lei invocado, traduzido no erro sobre os pressupostos de aplicação do artigo 58° do CIRC, não pode aceitar-se que outro motivo, para além do puro equívoco, tenha estado na origem da aceitação da opção da AT pelo Método do Fraccionamento do Lucro, para efeitos da correcção do preço da operação em apreço. 34ª Na verdade, o Tribunal concede na utilização de um método que implica o maior (em vez do menor) ajustamento para efeitos de eliminar as diferenças existentes entre os factos e as situações comparáveis e por aquele que fornece a pior (em vez da melhor) e a menos fiável (em vez da mais fiável) estimativa dos termos e condições que seriam normalmente acordados, aceites ou praticados numa situação de plena concorrência. 35ª De resto, o erro quanto aos pressupostos de aplicação dos métodos de determinação do preço de plena concorrência é, no presente caso, sobretudo realçado quando considerado o resultado da análise efectuada pela AT — é nulo o valor de plena concorrência para os royalties em causa e, bem assim, quando considerada a disparidade dos resultados decorrentes das análises efectuadas pela Administração fiscal — através do recurso ao Método do Fraccionamento do Lucro — e pela empresa de consultadoria independente E… & Y… — através do recurso ao Método do Preço Comparável de Mercado-. 36ª A um resultado muito próximo daquele a que se chegam nos estudos realizados no caso concreto, chega ainda o Centro de Arbitragem Administrativa e Fiscal no acórdão proferido no Processo n.º 10/2012 — CAAD, sobre a ilegalidade de uma correcção idêntica à que vem de ser analisada, numa situação de contornos factuais muito idênticos aos aqui tratados. Nos termos do referido acórdão, «o carácter não exagerado terá sido provado, pelo senso comum, isto é, por um juízo empírico de normalidade e causalidade sem recurso a conhecimentos técnicos. Tendo em conta que se trata de marcas antigas com história e reconhecidas, é natural que, numa sociedade como a de hoje, em que a marca tem um carácter cada vez mais distintivo do produto, aquelas valham muito, independentemente da forma como foram adquiridas. A remuneração não pode, por conseguinte, ser aquilatada em função do suposto valor de aquisição, que pode até ser zero, porque esses produtos em datas próximas da sua formação têm por regra um valor incomensuravelmente menor. Depois, o valor de 4% das vendas para cálculo dos royalties, comum em outras situações em que há licenciamentos de marcas, não deixa de estar em sintonia com o dossier de preços de transferencia apresentado pela Requerente e que não mereceu quaisquer objecções por parte da A.T que não os contraditou, nem afirmou que estivessem errados os pressupostos e o relevo que lhes foi conferido. Na ausência de qualquer oposição por parte da AT sobre essa matéria, não vê o Tribunal Arbitral razões para por em causa a bondade desse dossier. Procede, assim, a pretensão de que os royalities pagos pela QVB à TFYL sejam considerados como custos dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável da sociedade QVB, nos termos do artigo 59. ° do CIRC». 37ª Por tudo o que ficou exposto, e por todas as razões que confinam na evidente injustiça do resultado proposto pela Administração fiscal nesta matéria, é ilegal a correcção por ela produzida a este nível e, bem assim, ilegal a decisão do Tribunal que sobre ela versou, nos termos expostos. 38ª Não obstante, e ainda sem prescindir, a injustiça do resultado proposto pela Administração fiscal nesta matéria é ainda mais visível se atendermos à circunstância de uma correcção de tal natureza provocar uma flagrante distorção quer do montante do imposto devido pelas empresas associadas quer das receitas fiscais dos países envolvidos nas operações. TERMOS EM QUE DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, POR PROVADO, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, DESIGNADAMENTE A ANULAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA.» * A Fazenda Pública não apresentou contra-alegações relativamente ao recurso interposto pela impugnante. * * Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência desta 1ª Sub-Secção do Contencioso Tributário para decisão. * II – FUNDAMENTAÇÃO - De facto A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: «A) A impugnante está sujeita ao Regime Especial de Tributação dos Grupos de Sociedades desde 2001 (cfr. relatório de inspecção de fls. 191 e ss do Processo Administrativo). B) A impugnante foi objecto de uma acção de inspecção externa, em sede de IRC, no âmbito da qual foram efectuadas correcções à matéria colectável, de natureza meramente aritmética resultante de imposição legal, ao exercício de 2002, no montante de 27.211.190,37€ e ajustamentos de prejuízos fiscais no montante de - 25.053.416,70 (cfr. relatório de inspecção de fls. 191 e ss do Processo Administrativo). C) As correcções mencionadas na alínea anterior foram efectuadas com o seguinte fundamento, que aqui se transcreve na parte com interesse para a decisão (cfr. relatório de inspecção tributária a fls. 192 e ss dos autos): “I – 3. DESCRIÇÃO SUCINTA DAS CONCLUSÕES DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO
IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS D) Na sequência das correcções efectuadas, foi emitida a liquidação de IRC n.º 2006 8510038096 e 2006 8500040518, referente ao exercício de 2002, e demonstração de acerto de contas n.º 2006 00001396634 e 200600001453189 (cfr. documento n.º 3 dos autos) E) Em 15/06/2009 foi proferido despacho pelo substituto do Director-Geral dos Impostos que sancionou, em síntese, o entendimento de que a demonstração das quebras de mercadorias nas grandes superfícies assentará numa análise das circunstâncias concretas de cada empresa, verificação da existência de sistemas de controlo implementados para a minimização dos furtos, bem como a existência de um sistema devidamente organizado de registo informático de quebras de existências e de controlo interno, e não com base numa percentagem previamente definida, nem é de exigir participações à polícia, nem de apólices de seguros, (cfr. documento de fls. 8586 a 8588 dos autos, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido). F) Em Junho de 2007 a Impugnante remeteu à Direcção de Finanças de Lisboa, Divisão de Justiça Contenciosa o extracto da conta 24 - Estado e outros entes públicos, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido, onde se encontram registadas as retenções na fonte das sociedades "F...- Hipermercados, S.A." e "P...- Distribuição Alimentar, S.A.", no exercício de 2002, e cuja dedução foi desconsiderada pela Administração Tributária (cfr. documentos de fls. 8292 a 8365 dos autos). G) A Impugnação foi remetida por fax ao tribunal tributário de Lisboa em 09/03/2007 (cfr. fls. 3 dos autos). * Motivação da decisão de facto «Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos, no processo administrativo em apenso. Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.» * - De Direito Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer. Como supra vimos, ambas as partes interpuseram recurso da sentença proferida pelo TT de Lisboa. Começaremos a nossa análise pelo recurso interposto pela Impugnante. Entende a Recorrente que a sentença recorrida padece de: i) nulidade resultante de falta de especificação da matéria de facto provada e não provada e por ausência de exame crítico da prova produzida; ii) erro de julgamento na interpretação e aplicação do Direito o que implicou a violação dos princípios constitucionalmente consagrados da legalidade fiscal, da liberdade económica e da tributação pelo lucro real; iii) erro de julgamento quanto aos pressupostos de aplicação do artigo 58º do CIRC; Comecemos por apreciar a invocada nulidade da sentença. Vejamos, então. A sentença recorrida deu como provados os factos que supra se reproduziram, tendo referido que inexistiam quaisquer outros factos não provados. Alega a Recorrente que a especificação da matéria de facto é, em grande parte conclusiva, não constituindo verdadeiros factos. Entende, por outro lado, que é insuficiente. Para tanto, refere que, nas alegações finais efectuou uma análise da prova produzida e concluiu pela demonstração de um conjunto vasto de factos que, apreciados em conjunto, implicam necessariamente que aos constantes do RIT não possa ser atribuída a natureza de indícios ou prova. Refere, elencando-os, que deveriam ter sido dados como provados os factos relevantes relacionados com a actividade das empresas envolvidas, com os contratos celebrados, os estudos de comparabilidade entre empresas não relacionadas, ou independentes. Ou, pelo menos, deveria ter a sentença referido as razões para os considerar não provados, o que não sucedeu. Mais refere, relativamente à motivação da matéria de facto, ser esta inócua e tautológica, pois que, em rigor, não revela motivação nenhuma. Nem justifica as razões para não terem sido levados em consideração os depoimentos das testemunhas inquiridas. Compulsados os autos, verifica-se que foi realizada a inquirição de algumas das testemunhas arroladas (cfr. actas a fls. 9036 e 9043) e que, relativamente às restantes, foi aproveitada a prova testemunhal realizada num outro processo (nº 137/08), em que estava em causa o mesmo RIT e as mesmas correcções, embora no que respeita ao exercício de 2003 (cfr. despacho a fls. 8997). Mais se constata, do teor das actas das inquirições das testemunhas realizadas nos presentes autos, que estas responderem quanto à matéria constante dos pontos 130 a 169 e 716 a 719 da p.i.. E, quanto à prova aproveitada do processo nº 137/08, as testemunhas ali inquiridas responderam quanto à matéria identificada no requerimento de fls. 8994 dos autos. Ora, da leitura atenta da sentença recorrida é possível constatar que do probatório nenhuma referência consta aos depoimentos das testemunhas inquiridas. Nem sequer se menciona que foram inquiridas as testemunhas, não se referindo, de igual modo, as razões para não se considerarem os respectivos depoimentos. Ao acabado de referir acresce a circunstância de a sentença mencionar, na apreciação do direito, que a Impugnante juntou aos autos diversos documentos referentes às despesas em análise, que afirma suportarem a efectivação das despesas em causa. Contudo, do elenco constante do probatório não se vislumbra qualquer referência a estes documentos e factos nos quais se suportariam. Mais refere a sentença que a documentação for corroborada pela prova testemunhal. Mais à frente, a sentença menciona que as testemunhas inquiridas demonstraram ter um conhecimento da forma de operar da Impugnante, tendo destacado alguns depoimentos em concreto. Acresce que, ainda na apreciação do direito, a sentença assenta o seu entendimento em documentos cuja existência não deu como provada, de que é exemplo, entre outros, o contrato de cessão das marcas, o Licence Agreement e o estudo que estabelece a comparação com entidades independentes. As vicissitudes que descrevemos levam este Tribunal a concluir que, efectivamente, a sentença recorrida padece da nulidade que lhe vem assacada. Por forma a enquadrarmos esta questão, atentemos no que se escreveu no Acórdão do TCAN, de 28/05/2015, proferido no âmbito do processo nº 667/07, nos seguintes termos: “(…)No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, norma onde estão consagrados todos os vícios (e não quaisquer outros) susceptíveis de ferir de nulidade a sentença proferida em processo judicial tributário (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.357 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.871/10; ac.S.T.A-2ª.Secção, 13/10/2010, rec.218/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/5/2013, proc.6406/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.6871/13; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 15/5/2014, proc.7508/14). Como é sabido a exigência de fundamentação é justificada pela necessidade de permitir que as partes conheçam as razões em que se apoiou o veredicto do tribunal a fim de as poderem impugnar e para que o tribunal superior exerça sobre elas a censura que se impuser. Dito de forma diversa, a fundamentação, para além de visar persuadir os interessados sobre a correcção da solução legal encontrada pelo Estado, através do seu órgão jurisdicional, tem como finalidade elucidar as partes sobre as razões por que não obtiveram ganho de causa, para as poderem impugnar perante o tribunal superior, desde que a sentença admita recurso, e também para este tribunal poder apreciar essas razões no momento do julgamento. Logo, o julgamento da matéria de facto é um momento essencial da realização da justiça constitucionalmente cometida aos tribunais. De acordo com o disposto no artigo 205º da Constituição da República Portuguesa, as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei. O juiz tem, por isso, o dever de se pronunciar sobre a factualidade alegada e sobre a que lhe seja lícito conhecer oficiosamente e que se apresente relevante para a decisão, discriminando também a matéria provada da não provada e fundamentando as suas decisões, procedendo à apreciação crítica dos elementos de prova e especificando os fundamentos decisivos para a convicção formada - cfr. artigos 123.º, n.º 2, do CPPT. Exige-se assim, por um lado, a análise crítica dos meios de prova produzidos e, por outro, a especificação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz, expressa na resposta positiva ou negativa dada à matéria de facto controvertida. “Não se trata, por conseguinte, de um mero juízo arbitrário ou de intuição sobre a realidade ou não de um facto, mas de uma convicção adquirida através de um processo racional, alicerçado - e, de certa maneira, objectivado e transparente - na análise criticamente comparativa dos diversos dados trazidos através das provas e na ponderação e maturação dos fundamentos e motivações essencialmente determinantes da opção feita e cuja enunciação, por exigência legal, representa o assumir das responsabilidades do julgador inerentes ao carácter público da administração da Justiça” – cfr. J. Pereira Baptista, in Reforma do Processo Civil, 1997, pags 90 e ss. O exame crítico da prova deve consistir, pois, na indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz e na sua apreciação crítica, de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu no sentido decidido e não noutro. O julgador não se deve limitar a uma simples e genérica indicação dos meios de prova produzidos (v.g. “prova testemunhal” ou “prova por documentos”), impondo-se-lhe que analise criticamente essa prova produzida. O tribunal deve justificar os motivos da sua decisão quanto à matéria de facto, declarando por que razão deu mais credibilidade a uns depoimentos e não a outros, julgou relevantes ou irrelevantes certas conclusões dos peritos, achou satisfatória ou não a prova resultante de documentos particulares, etc. Não basta, pois, apresentar, como fundamentação, os simples meios de prova, v.g., “os depoimentos prestados pelas testemunhas e a inspecção ao local”, sendo necessária a indicação das razões ou motivos porque relevaram no espírito do julgador - cf. António Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, II Volume, 2ª, edição, a págs. 253 a 256. Em suma, a fundamentação de facto não se deve limitar à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cogniscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre os pontos da matéria de facto - assim, Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado, 6ª edição, 2011, Vol. II, pág. 321. Também neste preciso sentido, entre outros, vide o Acordão do TCAN, desta Sessão de 27 de Fevereiro de 2014, no processo 409/06.6BEPNF. Relativamente à falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito, fazemos ainda apelo aos doutos ensinamentos de Jorge Lopes de Sousa vertidos in CPPT anotado e comentado, 2006, volume I, págs. 906 e 907, segundo o qual :”(…) Relativamente à matéria de facto, esta nulidade abrange não só a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo nº2 do artigo 123º desde Código, como a falta de exame crítico das provas , previsto no nº3 do art.659º do CPC . Com efeito, esta falta não pode deixar de reportar-se à fundamentação de facto exigida por este Código e nele, ao contrário do que sucede com o CPC (…), exige-se não só a indicação dos factos provados, mas também dos não provados. Trata-se, de uma exigência suplementar de fundamento de facto, não prevista no Código Civil, que é a discriminação da matéria de facto não provada, cumulativamente com a provada. Na previsão desta norma , a indicação da matéria de facto não provada deve ser feita indissociavelmente da indicação da matéria de facto provada , como se depreende da expressão «o juiz discriminará também a matéria provada da não provada », o que supõe que essa discriminação seja feita concomitantemente. Sendo assim, a falta de discriminação da matéria de facto não provada, no domínio do contencioso tributário, será equiparável à falta de indicação da matéria de facto provada para efeitos de nulidade prevista no art.° 125.° n.° 1 Por isso, só existirá nulidade da sentença por falta de indicação dos factos não provados relativamente a factos alegados que não tenham sido dados como provados nem não provados e que possam relevar para a decisão da causa. Porém, mesmo que assim não se entenda, tal falta poderá em certos casos , implicar insuficiência de fundamentação de facto da sentença, susceptível de conduzir à necessidade de uma ampliação da matéria de facto, com consequente anulação da decisão. Sobre esta matéria, vide, ainda, o douto Acórdão do STA de 10/03/2011, lavrado no recurso 0716/10) , onde se escreve que «O Tribunal de 1ª instância deve determinar a matéria de facto que considera provada e não provada em ordem à solução de direito que considera aplicável, e se o não fizer, justifica-se a anulação oficiosa da sentença…»
Relativamente à nulidade que vimos apreciando pronunciou-se o Acórdão do TCAN de 03/08/2012, proferido no âmbito do processo nº 329/05, com o qual concordamos, e do qual nos permitimos recuperar o seguinte segmento: “(…) No que toca à falta de especificação dos fundamentos de facto da sentença, tem-se entendido que esta nulidade abarca não apenas a falta de discriminação dos factos provados e não provados, a que se refere o artigo 123º, nº 2 do CPPT, mas também a falta de exame crítico das provas, previsto no artigo 659º, nº 3 do CPC (actual 607º). Como aponta Jorge Lopes de Sousa Vide, Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, vol. II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 358 Note-se que esta nulidade - falta de especificação dos fundamentos de facto da sentença – corresponde, a montante, à exigência de fundamentação da sentença, no que respeita à fixação da matéria de facto, tal como prevê o artº 123º, nº2 do CPPT -“O juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões”. Assim sendo, “a fundamentação de facto não deve limitar-se à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre todos os pontos da matéria de facto. Mas, quando se tratar de meios de prova susceptíveis de avaliação subjectiva (como sucede com a prova testemunhal) será indispensável, para atingir tal objectivo de revelação das razões da decisão, que seja efectuada uma apreciação crítica da prova, traduzida na indicação das razões por que se deu ou não valor probatório a determinados elementos de prova ou se deu preferência probatória a determinados elementos em prejuízo de outros, relativamente a cada um dos factos relativamente aos quais essa apreciação seja necessária”. Vide, Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, vol. II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 321 e 322. Como ensina M. Teixeira de Sousa “… o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente …” Vide, Estudos sobre o novo Processo Civil, Lex, Lx 1997, pág. 348. Ora, como se deixou dito no acórdão deste TCAN, de 18/01/12 (processo nº 191/04), “E ficando nós sem saber qual a razão da não consideração de tal matéria de facto e respectivos depoimentos testemunhais, podemos concluir que a decisão recorrida infringe o disposto no art. 653º, n.º 2 do CPC, o que se reconduz à nulidade a que alude o art. 668º, n.º 1, al. b) do CPC. É que ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no art. 712.º, n.º 1 do CPC (actual 662º), incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos...” Retomando o que supra fomos referindo sobre a amplitude dos poderes de cognição do tribunal de recurso sobre a matéria de facto temos que os mesmos não implicam um novo julgamento de facto, porquanto, por um lado, tal possibilidade de conhecimento está confinada aos pontos de facto que o recorrente considere incorrectamente julgados e desde que cumpra os pressupostos fixados no art. 690.º-A nºs 1 e 2 do CPC, e, por outro lado, o controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade (vide sobre esta problemática A.S. Abrantes Geraldes in: “Temas da Reforma do Processo Civil”, vol. II, págs. 250 e segs.)”. Portanto, face ao exposto, há que, acompanhando a Recorrente, reconhecer que a sentença recorrida padece da nulidade consubstanciada na não especificação dos fundamentos de facto da decisão (artigo 125º, nº1 do CPPT), pois não discrimina os factos provados dos não provados, omitindo o exame crítico da prova testemunhal realizada. Vimos já que, com o presente recurso, a Recorrente pretende que o Tribunal, além do mais, aprecie e decida os eventuais erros de julgamento respeitantes, por um lado, à verificação dos pressupostos para o recurso à avaliação indirecta e, bem assim, no que toca à quantificação da matéria tributável assim apurada. Porém, no caso, tal não se afigura possível. Como se disse no já citado acórdão do TCAN, de 18/01/12, “A fundamentação da matéria de facto provada e não provada em primeira instância, a explicação crítica por parte do julgador de tal matéria, é essencial para que o Tribunal de recurso se possa pronunciar sobre a mesma, caso venha a ser posta em causa em sede de recurso. Inexistindo nesta decisão recorrida tais razões, fica, de modo inexorável, este Tribunal de recurso coarctado e impedido de exercer plenamente os seus poderes, não podendo decidir, de facto e de direito, como lhe compete”. É certo, e o Tribunal não desconsidera, que o artigo 712º (actual 662º) do CPC fixa parâmetros e orientações para o julgamento, em sede de recurso, da decisão sobre a matéria de facto proferida em 1ª instância, podendo, com vista à sua alteração, reapreciar ou reexaminar a decisão do tribunal recorrido sobre a matéria de facto. Contudo, “não lhe compete ( leia-se, ao tribunal de recurso) efectivar o julgamento de facto sem que na 1ª instância o mesmo haja tido lugar” – cfr. acórdão do TCAN, de 09/11/06 (processo nº 00345/06). Assim, podemos concluir que, efectivamente, a sentença recorrida incorre na nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto da decisão, a que se referem os artigos 125º, nº1 do CPPT e 668º (actual 615º), n.º 1, al. b) do CPC.(…)” Regressando ao caso dos autos e acolhendo o supra transcrito, também aqui entendemos verificada a nulidade da sentença recorrida por falta de especificação dos fundamentos de facto da decisão, a que se referem os artigos 125º, nº1 do CPPT e 615º, n.º 1, al. b) do CPC. Analisada a sentença recorrida, e como supra demos conta, não só não foram indicados os factos não provados, e as razões para que assim se concluísse, como, ao longo da apreciação de direito, foram feitas referências ao conteúdo de documentos cuja existência não foi dada como provada, bem como referências ao depoimento das testemunhas inquiridas, quando, na matéria de facto provada, nem sequer se deu nota de ter sido realizada a diligência de inquirição de testemunhas ou ao facto de ter sido aproveitada a prova realizada no âmbito de outro processo em que estava em causa o mesmo RIT. Muito menos se deu como provada (ou não provada) qualquer factualidade com base no que disseram as testemunhas. Procede, nessa medida, a arguição de nulidade da sentença efectuada pela Impugnante, ora Recorrente. Por essa razão fica prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas no recurso, bem como prejudicado fica o conhecimento do recurso interposto pela Fazenda Pública. III- Decisão Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso interposto pela Impugnante e, em consequência: - Declarar a nulidade da sentença recorrida por falta de especificação dos fundamentos de facto da decisão; - Julgar prejudicado o conhecimento do recurso interposto pela Fazenda Pública; - Determinar a baixa dos autos ao Tribunal a quo para que aí seja proferida nova decisão que inclua os fundamentos de facto, provados e não provados, bem como uma análise da prova produzida. Registe e Notifique. Lisboa, 16 de Fevereiro de 2023 (Isabel Fernandes) (Catarina Almeida e Sousa) (Maria Cardoso) |