Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:20023/16.7 BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:01/27/2022
Relator:CRISTINA FLORA
Descritores:OPOSIÇÃO, PRESCRIÇÃO DE JUROS
Sumário:I. De acordo com o disposto na alínea d) do art. 310.º do CC, os juros convencionais ou legais prescrevem no prazo de 5 anos, contados;

II. O prazo de prescrição interrompe-se se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente (art. 323.º, n.º 2, do CC);

III. A interrupção do prazo de prescrição inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo (art. 326.º, n.º 1, do CC), sendo que se a interrupção resultar da citação, notificação ou ato equiparado, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (327.º, n.º 1, do CC).
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO


J. C. S. R. deduziu, no então Tribunal Tributário de 1ª instância de Lisboa, Oposição Judicial à execução fiscal nº3611/93/101543.5 que corre seus termos no Serviço de Finanças da Amadora-3, para cobrança coerciva do remanescente da dívida proveniente de um contrato de mútuo celebrado entre si (e o seu marido) e a C. G. D., S.A., no valor total de €43.176,23, incluindo capital, juros de mora e despesas.

Por sentença do Tribunal Administrativo de Sintra a Oposição Judicial foi julgada procedente.

Inconformados com o assim decidido vieram, quer o MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, quer a Exequente, C. G. D., S.A., dela interpor recurso jurisdicional para o Supremo Tribunal Administrativo.

O MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, termina a sua alegação com as seguintes conclusões:

«I - Recorre o Ministério Público da aliás douta sentença proferida de fls. 129 a 143 dos autos e mediante a qual foi julgada procedente a oposição apresentada por J. C. S. R. relativamente à execução fiscal a correr termos pelo Serviço de Finanças da Amadora-3, para cobrança coerciva de dividas à C. G. D., emergentes de um contrato de mutuo, inicialmente no valor total de 8.023.737$00, incluindo capital, juros de mora e despesas.

II - Para tanto, na sentença em recurso, foram elencadas para apreciação e julgamento quatro questões, e saber:
a) A extemporaneidade da oposição á execução fiscal, que foi julgada improcedente por se ter julgado tempestiva a acção apresentada pela Oponente.
b) A nulidade processual, por falta de citação pessoal da executada, que foi julgada improcedente desde logo por se ter entendido que a mesma não constitui fundamento de oposição á execução mas de requerimento a apresentar junto do órgão da execução fiscal que é a entidade competente para dele conhecer.
c) A ilegalidade de parte do montante da quantia exequenda, igualmente julgada improcedente por se ter entendido que estando em causa um contrato de mútuo, de natureza civil, o contencioso respeitante á respectiva legalidade deveria ser julgado nos tribunais comuns, não integrando o mesmo nenhum dos fundamentos que constam do artigo 204°, do CPPT.
d) A extinção, por prescrição, de todos os juros vencidos até á data de 11.04.1995., que foi julgada procedente em função da argumentação aduzida pela Oponente na medida em que entendeu que tendo aquela apenas sido citada na data de 11.04.2000 estavam prescritos os juros de mora que se venceram antes de 11.04.1995, ou seja nos cinco anos anteriores á citação.

III - Ora sucede que tendo sido, e de resto muito acertadamente, julgadas improcedentes as questões referenciadas sob as alíneas b) e c), do número anterior, que integravam os fundamentos da oposição á execução fiscal invocados pela Oponente nos articulados da acção, não poderia era a Mma. Juiz a quo julgar procedente a oposição pois dessa forma o assim decidido está em contradição com os fundamentos da mesma.

IV - Quando muito, e face á procedência do fundamento atinente á prescrição, na parte referente ao juros de mora vencidos até 11.04.1995, deveria era no segmento decisório julgar-se a oposição apenas parcialmente procedente e tão só quanto a esse item.

V - Ao decidir daquela forma, tal integra o vicio de nulidade da sentença por oposição ou contradição entre os fundamentos e a decisão, atento o disposto no artigo 125°, do CPPT, e no artigo 668°, n°1, alínea c), do CPC, vício esse que, a ser julgado procedente e nos termos do disposto no artigo 731°, n°1, do CPC, poderá ser suprido na instância de recurso e bem assim como o outro fundamento do recurso na parte atinente á condenação em custas.

VI - Assim, e a nosso ver, sendo julgado procedente tal vício da sentença deverá, em consequência, e pelo tribunal recorrido, ser declarado o sentido em que a decisão deverá ser alterada de forma a sanar a apontada contradição.

VII - Por último, a sentença enferma ainda em erro de julgamento na questão da tributação em sede de custas. Com efeito, e neste particular, é certo que a Fazenda Pública está isenta de custas, ao abrigo da disposição do artigo 3°, n°1, alínea a), do Regulamento das Custas dos processos Tributários, aprovado pelo DL 29/98, de 11 de Fevereiro (aplicável ex vi do artigo 14°, n°1, do DL 324/2003, de 27 de Dezembro), mas sucede é que a mesma não assumiu o estatuto de parte processual, qualidade que pertence á C. G. D., a entidade credora da divida exequenda e que não beneficia de igual isenção, pela deveria em matéria de custas ser de repartir as mesmas por ambas as partes em função e na proporção do respectivo decaimento.

VIII - Do que fica exposto resulta pois que a decisão tomada na sentença recorrida, de não condenar em custas por estar a Fazenda Pública isenta enferma de erro de julgamento, por afrontar as disposições do artigo 446°, n°1 e 2, e do próprio artigo 3°, nº1, alínea a), do Regulamento das Custas dos Processos Tributários.

IX - Assim sendo, deverá pois ser revogada a sentença em recurso, e, em consequência, serem supridos os vícios que lhe vêm assacados, quer o de nulidade por contradição entre a decisão e os fundamentos, quer ainda o erro de julgamento quanto a custas, mediante a prolação de acórdão pelo tribunal ad quem nos termos legais supra referidos, e de acordo com o invocado artigo 731°, n°1, do CPC.

Porém, V.Exas., Senhores Juízes Conselheiros, apreciarão e decidirão como for de Direito!»

Por sua vez, a Exequente, C. G. D., S.A., alegou e concluiu da forma seguinte:

«1.ª - A citação "é o acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e se chama ao processo para se defender" ou "ainda para chamar, pela primeira vez, ao processo alguma pessoa interessada na causa" (art°228°, n°1 do CPC) - sendo que a citação só tem lugar uma vez relativamente a cada pessoa e cada processo pelo que, após ser realizada, o demandado é apenas notificado.

2.ª - A realidade factual e jurídica reconhecida pelo Tribunal a quo reproduzida na alínea B) da matéria provada (sic "em 25/03/1997, mediante citação com hora certa, a ora Oponente foi citada de que contra ela, corre o processo de execução") é ontologicamente incompatível com a conclusão factual e jurídica que também enunciou e se reproduz na alínea G) da matéria provada (sic "em 11/04/2000, a Oponente foi citada"), dado que a Execução e a Executada a que se reportam ambas as "citações" é um e o mesmo - o que não é modificado pela expedição de carta precatória para penhora de quotas em sociedade - dado que a "primeira" (e única efectiva) citação não enferma de qualquer vício que determine a sua nulidade.

3.ª - Não tendo a (única e efectiva) citação ocorrido nos cinco dias após ter sido requerida - através do requerimento executivo, entrado a 01.02.1993 - e não tendo sido alegado e provado que tal tenha sucedido por causa imputável à Exequente, o (único e efectivo) prazo prescricional foi interrompido, nos termos do disposto no art°323°, n°2 do CC, no quinto dia posterior àquele em que a execução foi instaurada no Serviço de Finanças de Amadora-3, ou seja, aos 06.02.1993.

4.ª - A interrupção inutiliza, para contagem do prazo de prescrição, todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, salvo quando resultar de citação, notificação ou acto equiparado, caso em que o novo prazo não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (art°326°, n°1 e art°327°, n°1 Código Civil).

5.ª - Através da venda do imóvel penhorado, a CGD recebeu a quantia de €30.629,34, a título de produto da venda, tendo resultado pagos os juros vencidos entre 08.02.1984 e 07.05.1990.

6.ª - Ao julgar prescritos os juros vencidos para além dos cinco anos contados da designada "citação" para uma carta precatória, ocorrida em 11.04.2000, ou seja, aqueles vencidos entre 08.05.1990 a 10.04.1995 - o douto aresto recorrido determinou, em violação da Lei, a perda do direito da Exequente a quatro anos e onze meses de juros, pois, nos termos supra expostos, a prescrição encontrava-se interrompida desde aos 06.02.1993, quinto dia após a única e efectiva "citação" da Executada que teve lugar nos autos.

Nestes termos,
Deve o presente recurso ser julgado procedente e, consequentemente, a douta sentença recorrida ser revogada e alterada, nos termos ora preconizados, com as demais consequências legais, assim se fazendo JUSTIÇA.»

Admitido o recurso jurisdicional e notificadas as partes, somente a Oponente/Executada, enquanto Recorrida, contra-alegou, pugnando pelo improvimento do recurso e pela manutenção do julgado sem, no entanto, formular conclusões.

Por decisão do Juiz Conselheiro Relator, de 25-10-2016, o Supremo Tribunal Administrativo julgou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso, declarando competente para esse efeito este Tribunal Central Administrativo, ao qual o processo foi remetido, a pedido da recorrente CGD.

Neste Tribunal Central, a Exma. Procuradora - Geral Adjunta não se pronunciou sobre o méritos dos recursos, atento o facto de o Ministério Público ser um dos recorrentes.

Colhidos os «Vistos» dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

As questões a decidir são as seguintes:

_ recurso do Magistrado do Ministério Público:

_ recurso da C. G. D. -


Ill – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Em 1ª instância foi fixada - como assente e com relevo para a apreciação do mérito dos autos - a seguinte factualidade:

«A) Em Março de 1993, foi instaurado na Repartição de Finanças de Amadora 3, o processo de execução fiscal n°3611/93/101543.5, em nome de J. H. A. M. S. e Outra, para cobrança de dívidas à C. G. D., no montante de 8.023.737$00, assim apurado:
Capital: 2.324.929$00
Juros de 840208 a 930108: 5 694 373$00
Despesas: 4 435$00 - cfr. fls. 1 a 3 do processo de execução fiscal apenso;

B) Em 25/03/1997, mediante citação com hora certa, a ora Oponente foi citada de que contra ela, corre o processo de execução, referido em A - cfr. fls. 28 a 34;

C) No âmbito do processo de execução, referido em A, em 06/05/1997, foi vendido por meio de propostas em carta fechada, pelo montante de 7.012.000$00, o prédio penhorado: Fracção «V» do prédio sito na R. J. G. F., Lote .. – R., A. - cfr. fls. 89 do processo de execução fiscal apenso;

D) Em 26/10/1999, a C. G. D. requer ao Exmo. Chefe da 3ª Repartição de Finanças da Amadora, o prosseguimento da execução n°3611/93/101543.5 "...para pagamento integral da quantia exequenda ainda em dívida e constante da nota de débito actualizada que se junta, nomeando desde já à penhora o seguinte:
A quota social do valor de 100 000$00 que a executada J. C. S. R. possui na firma E. – E. T. ., Lda., com sede na Z. I. V., R. s., lote.. – Á. – V. C., sendo também sócio..." -cfr. fls. 37;

E) Em 22/10/1999, a C. G. D. emitiu nota de débito, referida em D, da qual destaco o seguinte teor:
J. C. S. R., pelo contrato de empréstimo de 07/09/1933, deve 8.656.056$00, assim desdobrado:
"capital ....23.249.29$00
Juros de 90/05/08 a 99/10/22......6.327.547$00
Despesas.... 3.580$00
Soma.....(8.656.056$00)
A partir da última data acima referida, quanto a juros, o debito agravar-se-á de 2 005$ por dia, encargo correspondente a juros calculados a taxa actualizada de 21,562%, acrescido das despesas extrajudiciais que a C. efectue de responsabilidade do devedor, a liquidar oportunamente, nos termos do mesmo título e das disposições da Lei.
De harmonia com o art.7° do Decreto-Lei n°344/78 de 17 de Novembro, aquela taxa esta agravada da sobretaxa de 2,000% ao ano.
De acordo com o art.17° do Decreto-Lei n°453/80, o capital acima indicado inclui 744.929$00 de juros capitalizados.
Nos juros acima indicados estão incluídos 5 260 190$00 relativos a juros de mora e moratórios a partir de 93/01/08" - cfr. fls. 42;

F) Em 10/11/1999, o Exmo. Chefe da 3ª Repartição de Finanças da Amadora emite carta precatória para execução fiscal administrativa dirigida ao Exmo. Chefe da Repartição de Finanças de Vila do Conde para proceder a todas as diligências, desde a penhora da quota da Executada J. C. S. R. no sentido da dívida à C. G. D., no montante de 8.656.056$00, seja paga - cfr. fls. 45 e 46;

G) Em 11/04/2000, a Oponente foi citada de que contra ela "corre pela Repartição de Finanças de Vila do Conde o Processo Executivo n°99/700/08.8 (Carta Precatória) por dívida de 8. 656.056$00 da C. G. D. - Juros-Dívida Diversos; Que foi efectuada a penhora do bem que consta do Auto de Penhora de hoje, cuja cópia lhe entreguei;
Que, querendo, pode deduzir oposição, requerer o pagamento em prestações ou dação em pagamento, em qualquer dos casos no prazo de 30 dias a contar da citação, e de que, findo tal prazo, sem que nada tenha feito, ou não efectue o pagamento integral da quantia exequenda, acrescido dos juros de mora e custas, se procederá á venda daquele bem. (...)- cfr. fls. 50 cujo teor integral dou aqui por reproduzido;

H) Em 11/04/2000, foi emitido Auto de Penhora, do qual destaco o seguinte teor: "...fizemos penhora e efectiva apreensão nos bens abaixo designados, para pagamento da quantia de oito milhões seiscentos e cinquenta e seis mil e cinquenta e seis escudos proveniente da execução que a Fazenda Nacional move J. C. S. R., morador em Z. I. V., Rua .., Lote .., Á., por dívida de C. G. D. - Juros de Mora - Outras dívidas diversas.
BENS PENHORADOS
Verba única - Uma quota no valor nominal de 100 000$00, que a executada possui na firma E. – E. T. Á., Lda, com sede na Z. I. V., Rua .., Lote .., Á., V. C., com o capital social de 400 000$00, ao qual corresponde 25% por conta desse mesmo capital social. Desconhece-se o valor do último balanço". - cfr. fls. 48 e 49;

I) Em 11/05/2000, foram apresentados os presentes autos de oposição - cfr. carimbo, a fls. 2.».


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Antes de mais, cumpre apreciar o requerimento da Oponente a fls. 214 e ss dos autos, de 20/09/2012, que vem invocar a nulidade processual por apenas ter tomado conhecimento nesse momento de que o Magistrado do Ministério Público interpôs o seu recurso, e não ter sido notificada das respetivas alegações.

Vejamos.

Analisados os autos verifica-se que o Magistrado do Ministério Público veio a 13/12/2011 interpor recurso da sentença proferida nos presentes autos, por requerimento de fls. 149.

Na sequência desse requerimento a Meritíssima Juíza do TAF de Sintra proferiu o despacho de fls. 159, pelo qual admitiu o recurso interposto quer pelo Magistrado do Ministério Público, quer pela Exequente C. G. D., e ordenou a notificação prevista no art. 282.º, n.º 2 do CPPT.

Ora, ao contrário do alegado pela Oponente, esta encontra-se regularmente notificada desse despacho, uma vez que consta de fls. 161 dos autos que o seu mandatário foi notificado pelo ofício datado de 14/03/2012, sob registo n.º RM852385073PT para a morada que consta da procuração de fls. 15, também dos autos.

Ou seja, o despacho que admitiu o recurso do Magistrado do Ministério Público foi devidamente notificado à Recorrida Oponente nos termos do n.º 2, do art. 282.º do CPPT, na redação vigente à data (anterior à redação da Lei n.º 118/2019, de 17/09).

Assim sendo, nos termos do n.º 3, daquele preceito legal, o prazo para a Recorrida contra-alegar começa a correr a partir do termo do prazo para alegações do Recorrente, ou seja, 15 dias a contar da notificação prevista no n.º 2 daquele preceito legal, não se estabelecendo qualquer obrigação do Recorrente ou do tribunal notificar o recorrido para contra-alegar, porque o dies a quo para as contra-alegações decorre diretamente da lei.

Como se sumariou no acórdão do STA de 16/01/2008, proc. n.º 0788/07 “I-O Ministério Público, não sendo mandatário judicial de nenhuma das partes, não está obrigado, enquanto recorrente, a notificar ao recorrido as suas alegações de recurso, nos termos do disposto no artigo 229º-A do Código de Processo Civil.
II - A tal notificação também o tribunal fiscal não está obrigado a proceder, em recurso de sentença por si proferida, por não ser aplicável o disposto no artigo 743º nº 2 do Código de Processo Civil, mas o artigo 283º nº 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que não impõe tal notificação, nem a erige como dies a quo do prazo para as contra-alegações.” – em sentido idêntico, v. ainda acórdão do Pleno do STA de 20/09/2017, proc. n.º 0557/14, e jurisprudência ali citada.

Pelo exposto, e sem mais considerações por manifestamente desnecessárias, não se verifica a invocada nulidade processual invocada pela Recorrida.

Prosseguindo.

O Magistrado do Ministério no seu recurso jurisdicional vem invocar, desde logo, a nulidade da sentença por contradição entre a decisão e os fundamentos (art. 125.º do CPPT), uma vez que a sentença ao ter entendido que não era possível conhecer o pedido da extinção da execução fiscal com fundamento na nulidade da citação, bem como a ilegalidade concreta da dívida exequenda, mais entendendo que não poderia escolher qual o pedido a prosseguir, não poderia ter julgado procedente a Oposição, mas antes deveria ter julgado parcialmente improcedente.

A Meritíssima Juíza do TAF de Sintra manteve a sua decisão por despacho de fls. 196 dos autos.

Apreciando.

Analisando a p.i. verifica-se que o pedido formulado pela Oponente foi o seguinte: “Termos em que deve a presente oposição ser julgada procedente e, consequentemente, ser declarada extinta, por prescrição, parte da dívida exequenda, rectificando-se, de igual modo, a contagem e imputação dos juros, tudo em conformidade com os termos expostos”.


Ou seja, o efeito jurídico pretendido pela Oponente é a extinção do processo de execução fiscal de “parte da dívida exequenda”, o que consubstancia um pedido próprio ao processo de execução fiscal, e assim sendo, ao contrário do que se entendeu na sentença recorrida, não se verifica qualquer erro na forma do processo, mas tão-somente causas de pedir que não constituem fundamento de oposição, o que contende com a procedibilidade da ação.

Na verdade, relativamente ao fundamento de nulidade insanável por falta de citação, a Oponente não formula qualquer pedido correspondente a esta causa de pedir. A sentença confunde causa de pedir com pedido, e por isso vem afirmar que “Na petição dos presentes autos de oposição é alegada a falta de citação da Executada (ora Oponente) e a prescrição de parte da dívida exequenda. A tais pedidos corresponde formas processuais distintas. (…) Nestas situações não pode o juiz substituir-se ao interessado e proceder à eleição de um desses direitos ou pedidos (…)”, mas não existe qualquer outro pedido formulado nos autos.

Por outro lado, no ponto 3 da decisão recorrida intitulada “ilegalidade de parte do montante da quantia exequenda” a sentença recorrida entendeu que estávamos perante uma questão de ilegalidade em concreto da dívida que não poderia ser apreciada em sede de Oposição, por não constituir fundamento da mesma.

Ora, a propriedade ou impropriedade do meio processual afere-se pelo pedido final formulado na p.i., ou seja, pela pretensão que o A. pretende fazer valer com a acção. O pedido formulado deve ser adequado à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual, sob pena de ocorrer erro na forma de processo (cfr. neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STA de 28/3/2012, proc n.º 1145/11, e de 29/2/2012, proc. n.º 1161/2011, de 28/05/2014, proc. 01086/13, de 18/06/2014, proc. n.º 01549/13, de 05/11/2014, proc. n.º 01015/14).

Se as concretas causas de pedir invocadas não são adequadas à forma de processo escolhida pelo A., então estamos perante questões relacionadas com a viabilidade do pedido, e não da propriedade do meio processual, pelo que não haveria erro na forma do processo, mas improcedência da acção (Nesse sentido, Ac. 18/06/2014, proc. n.º 01549/13, Ac. do STA de 17/04/2013, proc. n.º 0484/13, e Ac. do STA de 20/02/2013, proc. n.º 0114/13, de 18/06/2014, proc. n.º 01549/13).

Aqui chegados, importa então concluir que, in casu, apenas foi formulado um pedido, que é o próprio para o presente meio processual, e encontra-se limitado a parte da dívida exequenda. Persistindo um fundamento válido de oposição à execução, a prescrição dos juros de mora, enquadrável na alínea d), do n.º 1, do art. 204.º do CPPT, que foi conhecido na sentença recorrida, e julgando-se esse fundamento de oposição verificado, então, verifica-se, efetivamente a procedência da Oposição, que deve ser entendida relativamente ao pedido formulado, que é de extinção da execução fiscal relativamente a parte da dívida exequenda (e não a toda a dívida exequenda), e assim sendo, não há qualquer nulidade por contradição entre a decisão e os fundamentos (art. 125.º do CPPT), quando muito o que se verifica é uma falta de precisão no decidido.

Efetivamente, a sentença recorrida deveria ter precisado no dispositivo os termos da procedência, considerando que o objeto da Oposição não abrangeu a totalidade da dívida exequenda, evitando-se dúvidas na sua interpretação. Nessa medida, o que deveria ter sido decidido era efetivamente a procedência da Oposição, e em consequência, julgar-se extinta a execução fiscal na parte objeto da ação.

Pelo exposto, nesta parte, improcede o recurso do Magistrado do Ministério Público.




Cumpre ainda conhecer do fundamento do recurso do Magistrado do Ministério Público atinente ao erro de julgamento quanto a custas, entendendo que a parte nos presentes autos é a C. G. D. Neste contexto, invoca o Recorrente que a sentença errou ao decidir-se “Sem custas por a Fazenda Pública estar isenta”, sustentando-se tal decisão no art. 3.º, n.º 1, alínea a) do Regulamento das Custas dos Processos Tributários (RCPT).

Na verdade, está em causa nos autos uma dívida da C. G. D., sendo que esta respondeu à Oposição a fls. 58 e ss dos autos, na sequência da sua notificação pelo então Tribunal Tributário de 1.ª instância de Lisboa.

A Meritíssima Juíza a quo, a final na sentença entendeu não serem devidas custas ao abrigo do art. 3.º, n.º 1, alínea a) do RCPT.

Também relativamente a este fundamento do recurso, a Meritíssima Juíza do TAF de Sintra, pronunciando-se, manteve a sua decisão por despacho de fls. 196 dos autos.

Apreciando.

Está em causa uma oposição à execução fiscal deduzida em 16/05/2000, e, portanto, aplica-se o Regulamento das Custas dos Processos Tributários, aprovado pelo decreto-lei nº 29/98, de 11 de fevereiro, doravante RCPT.

O RCPT revogou o Decretos-Leis n.º 449/71, de 26 de outubro, 217/76 (cf. art. 8.º do decreto-lei nº 29/98, de 11 de fevereiro), e, portanto, a isenção de custas que a C. G. D. beneficiava ao abrigo da alínea a), do n.º 1, do art. 5.º deixou de vigorar.


Efetivamente, sobre a sucessão de regimes de isenção de custas da C. G. D. no acórdão do STA de 17/05/2006, proc. n.º 0160/06 escreveu-se o seguinte:

“Nos termos do disposto no artigo 59º nº 1 da sua lei orgânica, aprovada pelo decreto-lei nº 48953, de 5 de Abril de 1969, a C. G. D. estava «isenta de imposto de justiça, selos e outros encargos».
A mesma isenção é, também, referida no artigo 156º nº 1 do Regulamento da C. G. D. aprovado pelo decreto nº 694/70, de 31 de Dezembro.
Estes diplomas vigoraram até 1 de Setembro de 1993, data em que a C. G. D. passou a ser uma sociedade anónima e a reger-se pelos estatutos aprovados pelo decreto-lei nº 287/93, de 20 de Agosto.
À primeira vista, portanto, a isenção de que gozava a recorrente manteve-se até esta data. A não ser que, entretanto, a legislação referente a custas lhe tenha posto termo – isto porque, até ao momento, apenas considerámos as leis orgânica e estatutária da C. G. D.
Importa, agora, atender ao Regulamento das Custas dos Processos das Contribuições e Impostos, que abreviadamente se passará a designar por RCPCI, aprovado pelo decreto-lei nº 449/71, de 26 de Outubro.
Nos termos do seu artigo 5º nº 1 alíneas a) e d) a C. G. D. gozava de isenção de custas. E isso a dois títulos: enquanto estabelecimento personalizado do Estado (alínea a)) e enquanto entidade a quem a favor de quem a lei (os já referidos artigo 59º nº 1 do decreto-lei nº 48953, de 5 de Abril de 1969, e 156º nº 1 do decreto nº 694/70, de 31 de Dezembro) estabelecia tal benefício (alínea d)).
É verdade que o decreto-lei nº 199/90, de 19 de Junho, eliminou a alínea d) do nº 1 do artigo 5º do RCPCI. Mas manteve a alínea a), que bafejava a C. G. D., instituto público de crédito do Estado.
Ou seja, se antes, como dissemos, a recorrente beneficiava da isenção conferida pelo RCPCI a dois títulos, passou, após as alterações trazidas pelo decreto-lei nº 199/90, a gozar dela a um só – o da alínea a) do nº 1 do artigo 5º.
Nem sempre assim entendeu a jurisprudência deste Tribunal que, inicialmente, cuidou que a C. G. D. deixara de gozar de isenção de custas após a vigência do decreto-lei nº 199/90 – veja-se o acórdão proferido no processo nº 12621 em 24 de Outubro de 1990. Mas esta jurisprudência foi alterada no sentido que acabámos de expor e mantida até ao presente – é ver os arestos apontados no parecer do Exmº. Procurador-Geral Adjunto, e os neles citados.
O RCPI só viria a ser revogado pelo decreto-lei nº 29/98, de 11 de Fevereiro, que aprovou o Regulamento das Custas dos Processos Tributários. Mas o que aqui se dispõe já nos não importa, porquanto, no interim, a recorrente deixara de beneficiar de isenção de custas por força da sua passagem a sociedade anónima determinada pelo decreto-lei nº 287/93, de 20 de Agosto.
Se, no âmbito estrito das disposições sobre custas no processo judicial tributário, a isenção só se extinguiu em 1993, também no das custas judiciais não houve, anteriormente, alteração que importasse essa extinção.
Na redacção inicial do Código das Custas Judiciais a isenção era reconhecida pelo artigo 3º, nº 1, alínea e). Porém, esta norma foi revogada pelo decreto-lei nº 118/85, de 19 de Abril, que limitou a isenção subjectiva de custas aos casos que a lei de futuro viesse a contemplar. Porém, estamos perante uma alteração sem reflexos fora do âmbito do regime de custas do Código das Custas Judiciais, não tendo havido, por parte do legislador, a intenção de eliminar as isenções vigentes no campo dos processos do foro tributário. Tanto assim que o artigo 2º do decreto-lei nº 485/88, de 30 de Dezembro, revogando expressamente benefícios que à C. G. D. eram atribuídos pelo artigo 155º do seu Regulamento, aprovado pelo decreto nº 694/70, de 31 de Dezembro, não mexeu no artigo seguinte, que se referia à isenção de custas. (…)”

Portanto, regressando ao que ora importa para o caso dos autos, a C. G. D. passou a sociedade anónima pelo decreto-lei nº 287/93, de 20 de Agosto, pelo que importa concluir que não é aplicável a isenção da alínea a) do n.º 1, do art. 3.º do RCPT.

Assim sendo, não havendo qualquer disposição que isente a C. G. D. de custas no RCPT, diploma aplicável ao caso dos autos, e não se enquadrando em nenhuma das isenções subjetivas enumeradas no art. 3.º do RCPT, importa concluir que aquela está sujeita a custas.



Pelo exposto, e nesta parte, procede o recuso do Magistrado do Ministério Público, sendo de revogar a sentença na parte em que não condenou a C. G. D. ao pagamento das respetivas custas.

Finalmente, então, quando ao recurso da C. G. D.

A Recorrente C. G. D. invoca erro de julgamento de facto e de direito porquanto o prazo de prescrição dos juros de mora foi interrompido no 06/02/1993, nos termos do disposto mo art. 323.º, n.º 2, do CC, ou seja, no quinto dia posterior àquele em que foi instaurada no serviço de finanças de Amadora-3 (requerimento executivo de 01/02/1993).

Antes de mais, e conhecimento da prescrição dos juros de mora importa aditar oficiosamente à matéria de facto dada como provada na 1.ª instância os seguintes factos:

J) Em 01/02/1993 a C. G. D. requereu junto do serviço de finanças da 3.ª repartição de finanças da Amadora, a instauração da execução referida em A) contra a Oponente (cf. requerimento de fls. 2 e ss do PEF).

Prosseguindo.

Está em causa nos autos dívidas de juros de mora vencidos até 11/04/1995 que a sentença recorrida declarou prescritos pelo decurso do prazo de cinco anos previsto na alínea d), do art. 310.º do Código Civil, considerando que a citação da Oponente apenas ocorreu em 11/04/2000.

Vejamos.



Relativamente ao prazo de prescrição é efetivamente aplicável, in casu, o prazo de cinco anos previsto na alínea d), do art. 310.º do Código Civil, que começa a correr a partir da exigibilidade da obrigação (in casu, 08/04/1984 – cf. alínea A) dos factos provados).

Dispõe art. 323.º, n.º 2, do Código Civil o seguinte: “2. Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.”

In casu, considerando que a data de entrada em juízo do requerimento executivo, 01/02/1993 (cf. alínea J) dos factos aditados), temos então que a citação deveria ter ocorrido até ao dia 06/02/1993. Ora, não resulta provado nos autos que a falta de realização da citação da Oponente nos cinco dias subsequentes à entrada em juízo do requerimento executivo seja imputável à exequente.

Assim sendo, verifica-se a interrupção da prescrição no dia 06/02/1993, por força do disposto no art. 323.º, n.º 2, do Código Civil.

A interrupção do prazo de prescrição inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo (art. 326.º, n.º 1, do CC), sendo que se a interrupção resultar da citação, notificação ou ato equiparado, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (327.º, n.º 1, do CC).

Efetivamente, como se sumariou no acórdão do STA de 07/10/2009, proc. n.º 0316/05 “ (…) III – Em processo de execução fiscal, a AF ou qualquer outra entidade que possa legalmente utilizar esse processo não tem que requerer a citação do executado, podendo até dizer-se que, no sistema legal, o próprio título executivo incorpora, ao menos tacitamente, o pedido ou requerimento de citação do executado.
IV - Assim, será de aplicar o disposto no
artigo 323.º, n.º 2 do Código Civil, considerando-se interrompida a prescrição, findo o prazo de cinco dias, após a autuação do processo executivo, com os efeitos decorrentes do artigo 327.º do mesmo Código.”

Em suma, in casu, considerando que o prazo de prescrição de cinco anos interrompeu-se em 06/02/1993, pelo que apenas se encontram prescritos os juros vencidos até 05/02/1988, nos termos do disposto no art. 310.º, alínea d) do Código Civil.

Refira-se que, ao contrário do que parece entender a Recorrente, a esta conclusão não obsta o pagamento coercivo dos juros efetuado posteriormente ao decurso do prazo de prescrição através da venda do imóvel penhorado no processo de execução fiscal ocorrida em 06/05/1997 (cf. alínea C) dos factos provados).

Na verdade, apenas o pagamento voluntário por parte da Oponente, e já não o coercivo, se subsume ao disposto no art. 304.º, n.º 2, do Código Civil que dispõe “2. Não pode, contudo, ser repetida a prestação realizada espontâneamente em cumprimento de uma obrigação prescrita, ainda quando feita com ignorância da prescrição; este regime é aplicável a quaisquer formas de satisfação do direito prescrito, bem como ao seu reconhecimento ou à prestação de garantias.”

Como se escreveu no acórdão do STA de 19/09/2007, proc. n.º 0194/07: “O pagamento voluntário, feito pelo executado por conta de dívida sob execução fiscal extinta por prescrição da obrigação respectiva, não pode fundamentar a devolução ou “repetição do indevido”, pois esse pagamento corresponde ao cumprimento de uma obrigação natural.”

Por outras palavras, in casu, verificou-se um pagamento coercivo no âmbito do processo de execução fiscal e que ocorreu após o decurso do prazo de prescrição, não se trata de um pagamento voluntário.

Pelo exposto, procede parcialmente o recurso da C. G. D. na medida em que ao contrário do decidido em 1.ª instância, apenas os juros de mora vencidos de 08/04/1984 até 05/02/1988 estão prescritos, e assim sendo, importa revogar parcialmente a sentença recorrida, e consequentemente, julgar parcialmente procedente a Oposição à execução fiscal.

No que se refere à condenação em custas, conforme supra fundamentado, a C. G. D. não se encontra isenta, pelo deverá suportar as custas, quer na 1.ª instância, quer na presente instância, na proporção do decaimento, que aqui se fixa em parte iguais para esta Recorrente e a Oponente.

O Magistrado do Ministério Público encontra-se isento de custas ao abrigo do disposto no art. 3.º, n.º 1, alínea b) do RCPT.

Sumário (art. 663.º, n.º 7 do CPC)

I. De acordo com o disposto na alínea d) do art. 310.º do CC, os juros convencionais ou legais prescrevem no prazo de 5 anos, contados;

II. O prazo de prescrição interrompe-se se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente (art. 323.º, n.º 2, do CC);

III. A interrupção do prazo de prescrição inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo (art. 326.º, n.º 1, do CC), sendo que se a interrupção resultar da citação, notificação ou ato equiparado, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (327.º, n.º 1, do CC).




DECISÃO

Em face do exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção, da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, indeferir a invocação da nulidade processual pela Oponente, conceder provimento ao recurso do Magistrado do Ministério Público, revogando a decisão recorrida quanto a custas, e julgo parcialmente procedente o recurso da C. G. D., e consequentemente, revogo parcialmente a decisão recorrida, e em consequência julgo parcialmente procedente a Oposição à execução fiscal.

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Custas na 1.ª instância e nesta instância de recurso pela C. G. D. e pela Oponente na proporção do decaimento, que se fixa em 50% para cada uma das partes, sendo que o Magistrado do Ministério Público se encontra isento de custas.
D.n.
Lisboa, 27 de janeiro de 2022.


Cristina Flora (Relatora)



Patrícia Manuel Pires (1.ª adjunta)

Vital Lopes (2.º adjunto)