Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:453/11.1BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:03/25/2021
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:EMBARGOS DE TERCEIRO
CÔNJUGE DO EXECUTADO/ TERCEIRO/ CO-EXECUTADO
CITAÇÃO
Sumário:I - No caso sub judice, contrariamente ao que foi assumido na sentença, a citação efectuada foi--o ao abrigo do disposto no artigo 220º do CPPT, pelo que a Recorrente não se assume aqui como co-executada mas antes como terceiro. Nessa medida, podia ter deduzido embargos, como deduziu.
II - Face ao probatório, não suscita controvérsia que à data em que foi penhorado o imóvel, o mesmo constituía um bem comum do casal, sendo que a Embargante e o executado eram casados. Perante a citação efetuada ao abrigo do 220º do CPPT, a Recorrente requereu a separação de bens, tendo-lhe sido adjudicada a nua propriedade da fracção penhorada, a qual constitui a casa de morada de família. Assim sendo, a penhora ordenada na execução fiscal ofende o direito da embargante, tal como alegado.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

A..., inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada que julgou improcedentes os embargos de terceiro deduzidos contra a penhora do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de S. Julião, concelho de Setúbal, sob o artigo 2... e registado sob o nº 5..., para garantia da dívida exequenda do processo nº 3... e apensos, instaurado contra a sociedade M... C..., Lda., por dívida de coimas, IVA e IRC no montante total de € 41.897,25, dívida que foi revertida contra M... na qualidade de responsável subsidiário, veio dela recorrer.

O recurso jurisdicional apresenta as seguintes conclusões:

Ao recurso deve ser atribuído efeito suspensivo por aplicação do disposto na última parte do n.º 2 do art.º 282º do CPPT e na parte final da alínea b) do n.º 3 do art.º 647º do NCPC, uma vez que o imóvel é – e sempre foi – a casa de morada de família da recorrente.

A douta sentença recorrida julgou a acção improcedente por considerar que “não pode a cônjuge mulher deduzir embargos de terceiro, porquanto não detém a qualidade de terceiro”

3ª. Contudo não lhe assiste razão.

Porquanto,

4ª. Foi instaurado no Serviço de Finanças Setúbal 2, um processo de execução fiscal contra a sociedade “M... C..., Lda.”, tendo posteriormente sido proferido despacho de reversão da execução contra M... na qualidade de responsável subsidiário pela dívida da sociedade.

5ª. A responsabilidade subsidiária dos gerentes das sociedades de responsabilidade limitada incide apenas sobre o gerente e não sobre o seu cônjuge, respondendo por essas dívidas os seus bens próprios e, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns.

6ª. Não sendo a recorrente executada, na execução poderão existir dois tipos de citação:

- Para conceder ao cônjuge a faculdade de requerer a separação judicial de bens, nos termos do art.º 220º do CPPT, não lhe conferindo a qualidade de parte no processo executivo;

- Nos termos do art.º 239º do CPPT, de que foi efectuada a penhora de um imóvel, passando o cônjuge a ter a qualidade de executado.

7ª. Na qualidade de cônjuge do executado M..., a recorrente foi citada para, nos termos do disposto no art.º 220º do CPPT, requerer a separação judicial de bens, direito que exerceu no processo que correu termos pelo 3º juízo cível do Tribunal judicial de Setúbal sob o n.º 2166/10.2TBSTB, tendo-lhe sido adjudicada a nua propriedade do imóvel cuja penhora foi ordenada nos autos de execução fiscal, ficando assim afastada a possibilidade de se defender na execução fiscal por não ser executada.

8ª. A citação efectuada ao cônjuge, fora da finalidade específica do art.º 220º o CPPT, confere-lhe a qualidade de co-executado, com a possibilidade de exercer, a partir da citação, todos os direitos processuais que são atribuídos a este.

9ª. A recorrente nunca foi citada nos termos do art.º 239º do CPPT, não figura na execução fiscal e nos respectivos títulos, não é executada nem devedora, nem nunca foi alegada a comunicabilidade da dívida exequenda pelo que nunca poderia assumir a posição de parte no processo executivo.

10ª. “A penhora de um bem que faz parte de património comum sem que todos os titulares sejam executados é ilegal, podendo os restantes cotitulares reagir para defesa dos seus direitos através dos adequados meios de resistência legal, por ocorrer uma indevida apreensão do bem comum para satisfação de obrigação que pertence a um só co-titular.” Ac. STA de 18/05/2011

11ª. Por todo o exposto, entendemos que a recorrente ao contrário do decidido na sentença recorrida, possui e tem a qualidade de terceiro para deduzir os embargos interpostos e que se verificam todos os demais pressupostos legais para a sua dedução e procedência.

12ª Violou, assim, a douta sentença recorrida o disposto nos art.ºs 167º, 237º do CPPT, o art.º 1696º do CC, o art.º 615º n.º 1 d) do CPC e os art.ºs 20.º, n.º 5 e 268.º, n.º 4 da CRP.

Nestes termos e demais de direito, julgando-se procedente o recurso interposto, revogando-se a douta sentença recorrida, farão a costumada

JUSTIÇA.


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Não foram apresentadas contra-alegações.

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A Exma. Magistrada do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser revogada a sentença, por existirem razões para julgar procedentes os embargos.

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Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para decisão.

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2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida:

“Compulsados os autos e vista a prova produzida, apuraram-se os seguintes factos:

A. Em 01/08/2004 foi instaurado no Serviço de Finanças de Setúbal 2 o processo de execução fiscal nº 3... e apensos em nome da sociedade M... C..., Lda., por dív ida de coimas, IVA e IRC no montante total de € 41.897,25 (cfr. fls 1/32 do processo de execução fiscal em apenso).

B. Em 25/03/2009 foi proferido despacho de reversão da execução contra M... na qualidade de responsável subsidiário pela dívida da sociedade mencionada na alínea anterior (cfr. fls. 46/47 do apenso).

C. Em 25/03/2009 foi emitida a citação por reversão de M... tendo o aviso de recepção sido assinado em 27/03/2009 (cfr. fls. 50/51 do apenso).

D. Em 13/07/2009 foi registada na 1ª Conservatória do Registo Predial de Setúbal a penhora efectuada a favor da Fazenda Nacional do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de S. Julião, concelho de Setúbal, sob o artigo 2... e registado sob o nº 5... para garantia da dívida exequenda do processo nº 3... (cfr. fls. 63 do apenso).

E. Em 09/02/2010 foi emitida a citação de A... com o seguinte teor “Por se encontrarem a correr termos neste Serviço de Finanças os processos de execução fiscal identificados em epígrafe, em que é executado(a) ora) seu(sua) marido (esposa) M..., nif 1..., por Reversão no(s) da firma M... C… LDA, NIPC 5…, por dívida de IRC, Coimas, IVA, na quantia de 52.675,93€ (cinquenta e dois mil, seiscentos e setenta e cinco euros e noventa e três cêntimos), foi em 13/07/2009 efectuada penhora do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de S. Julião, concelho de Setúbal, sob o nº 2..., sito em AV D…, SETÚBAL, nos termos do art. 231.° do CPPT (Código de Procedimento e de Processo Tributário). Temos em que, fica V. Exa. citado(a) para, no prazo de 30 dias a contar da assinatura do aviso de recepção da presente carta, requerer, querendo, a separação judicial de bens, ou juntar certidão comprovativa de a ter já requerido, para efeitos do consignado no art. 220.° do CPPT e nº 1 do art.825.° do Código do Processo Civil.” (como resulta do teor de fls. 99 do apenso).

F. A citação mencionada na alínea anterior foi enviada através de carta registada com aviso de recepção tendo este sido devolvido ao remetente (cfr. fls. 100).

G. Em 09/03/2010 foi emitida a certidão de citação de A... (cfr. fls. 124/125 do apenso).

H. Em 07/04/2010 deu entrada no Tribunal Judicial de Setúbal – 3º Juízo Cível autos de inventário/partilha de bens em casos especiais (separação de bens) com o nº 2166/10.2TBSTB em que é requerente A... (cfr. fls. 131 do apenso).

I. Em 16/11/2010 transitou a sentença proferida nos autos mencionados na alínea anterior tendo sido homologada a transação nos termos da ual foi adjudicada à ora embargante a nua propriedade da fracção que constitui a casa de morada de família (cfr. fls. 44/48).

J. Em 15/12/2010 foi apresentada junto do Serviço de Finanças a petição de fls. 3/5.

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A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos juntos ao processo acima expressamente referidos em cada um dos pontos do probatório.

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Não existem factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados”.


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2.2. De direito

Antes do mais, importa fixar o efeito do recurso jurisdicional, atenta a conclusão 1ª da alegação – “Ao recurso deve ser atribuído efeito suspensivo por aplicação do disposto na última parte do n.º 2 do art.º 282º do CPPT e na parte final da alínea b) do n.º 3 do art.º 647º do NCPC, uma vez que o imóvel é – e sempre foi – a casa de morada de família da recorrente”.

À data que aqui importa considerar, atenta a interposição do recurso, dispunha o artigo 286º, nº 2 do CPPT que “Os recursos têm efeito meramente devolutivo, salvo se for prestada garantia nos termos do presente Código ou o efeito devolutivo afectar o efeito útil dos recursos”.

No caso não há justificação para nos afastarmos do efeito-regra. Neste sentido, em processo de embargos, o TCA SUL, no acórdão de 10/07/15, processo nº 7383/14, remetendo para anterior aresto com o nº 02791/08, de 18/03/09, tomou posição no sentido de que “1.No âmbito do CPT, as acções judiciais, como os embargos de terceiro, que tivessem por objecto a propriedade ou posse de bens penhorados, determinava a suspensão do processo executivo quanto a esses bens (art.° 256.°);

2. Nessa medida, o efeito devolutivo atribuído ao recurso interposto da decisão final de 1.a instância e desfavorável ao embargante, não provoca a perda do seu efeito útil;”

Ora, o assim decidido mantém-se inteiramente válido, considerando que o actual artigo 172º do CPPT tem redação idêntica ao citado 256º do CPT.

Improcede esta primeira pretensão de fixar efeito suspensivo ao recurso.


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Avancemos, deixando esclarecido que não vem impugnada a matéria de facto, pelo que a mesma mostra-se estabilizada, tal como resulta da sentença.

Vejamos, então, a questão que aqui nos ocupa e que, no essencial, se reconduz a saber se a sentença errou ao considerar que a ora Recorrente não detém a qualidade de terceiro e, nessa medida, não podia embargar.

Lê-se na sentença, além do mais, o seguinte:

“Do probatório resultou que a ora embargante é casada com o executado e que a dívida exequenda resulta de responsabilidade subsidiária deste decorrente da reversão da execução (cfr. alíneas B) e C) do probatório). Mais ficou provado que foi efectuada a penhora de imóvel em 13/07/2009 (alínea D) do probatório) tendo sido efectuada a citação da ora embargante em 09/03/2010 (cfr. alínea G) com o teor transcrito na alínea E) do probatório).

(…)

Nos presentes autos ficou provado que na data da penhora do imóvel, a embargante e o executado são casados, pelo que, estando em causa execução fiscal por responsabilidade subsidiária do cônjuge marido, e tendo sido penhorado um bem comum do casal, e efectuada a citação da cônjuge não pode a cônjuge mulher deduzir embargos de terceiro, porquanto não detém a qualidade de terceiro como resulta da jurisprudência acima enunciada.

Detendo a qualidade de co-executada o meio processual adequado para reagir contra a penhora do imóvel é a reclamação prevista no art. 276º e seguintes do CPPT.

Vejamos se é possível a convolação no meio processual correcto.

De acordo com o nº 1 do art. 277º do CPPT a reclamação contra o acto do órgão de execução fiscal deve ser apresentada no prazo de 10 dias a contar da notificação.

No caso em apreço a ora embargante foi citada da penhora em 09/03/2010 e a petição foi apresentada em 15/12/2010 (cfr. alíneas G) e J) do probatório), pelo que não é possível efectuar a convolação da petição no meio processual correcto face à sua intempestividade”.

Para a Recorrente a sentença errou, já que “Na qualidade de cônjuge do executado M..., a recorrente foi citada para, nos termos do disposto no art.º 220º do CPPT, requerer a separação judicial de bens, direito que exerceu no processo que correu termos pelo 3º juízo cível do Tribunal judicial de Setúbal sob o n.º 2166/10.2TBSTB, tendo-lhe sido adjudicada a nua propriedade do imóvel cuja penhora foi ordenada nos autos de execução fiscal, ficando assim afastada a possibilidade de se defender na execução fiscal por não ser executada”. Reitera que “nunca foi citada nos termos do art.º 239º do CPPT, não figura na execução fiscal e nos respectivos títulos, não é executada nem devedora, nem nunca foi alegada a comunicabilidade da dívida exequenda pelo que nunca poderia assumir a posição de parte no processo executivo”.

No caso, a execução fiscal foi revertida contra o cônjuge da embargante, com fundamento na sua qualidade de responsável subsidiário pela dívida exequenda da sociedade originária devedora.

Fazendo apelo a jurisprudência do STA com vista ao enquadramento inicial da questão que nos ocupa, temos que a “As dívidas do responsável subsidiário, gerente de uma sociedade comercial, não resultam do exercício da sua própria actividade comercial, antes da actividade da sociedade, pelo que não podem ser consideradas da responsabilidade de ambos os cônjuges, com fundamento na presunção de proveito comum das dívidas contraídas (art.1691º nº1 al.d) CCivil)

A responsabilidade subsidiária do gerente de sociedade comercial tem a natureza de responsabilidade civil extracontratual, recortando-se as dívidas emergentes no conceito de indemnizações, sendo da exclusiva responsabilidade do cônjuge a que respeitam (art.1692º al.b) CCivil; acórdão STA Pleno SCT 5.12.2001 processo nº 21 438; Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 5ª edição pp.604/606).

Sendo a dívida exequenda da responsabilidade exclusiva de um dos cônjuges de natureza tributária, podem ser imediatamente penhorados bens comuns; neste caso, é imperativa a citação do outro cônjuge para requerer a separação judicial dos bens, prosseguindo a execução sobre os bens penhorados se a separação não for requerida no prazo de 30 dias ou se for suspensa a instância por inércia ou negligência do cônjuge requerente na promoção dos termos processuais (art.220º CPPT)

No regime civilístico pelas dívidas da exclusiva responsabilidade de um dos cônjuges respondem os bens próprios de cada cônjuge devedor e, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns (art.1696º nº1 CCivil)

A diferença de soluções plasmada nas normas em confronto radica na estrutura simplificada do processo de execução fiscal, privilegiando a celeridade na cobrança da quantia exequenda, justificada pela finalidade de interesse público da receita a obter; a qual seria entorpecida pela morosidade de diligências prévias da administração tributária para identificação dos bens próprios do cônjuge exclusivamente responsável no conglomerado do património conjugal comum”. – cfr. acórdão do STA, nº 0172/17.5BEVIS, de 19-02-2020

Na execução fiscal podem ser imediatamente penhorados bens comuns do casal desde que seja citado o cônjuge do executado para requerer a separação judicial de bens, como resulta do artigo 220º do CPPT, segundo o qual “Na execução para cobrança de coima fiscal ou com fundamento em responsabilidade tributária exclusiva de um dos cônjuges, podem ser imediatamente penhorados bens comuns, devendo, neste caso, citar-se o outro cônjuge para requerer a separação judicial de bens, prosseguindo a execução sobre os bens penhorados se a separação não for requerida no prazo de 30 dias ou se se suspender a instância por inércia ou negligência do requerente em promover os seus termos processuais”.

No caso, como bem notou a EMMP, face ao que consta da alínea E) dos factos provados, dúvidas não restam que a citação da ora Recorrente foi feita nos termos e para os efeitos do artigo 220º do CPPT. De acordo com a alínea G) do probatório, a Recorrente foi citada em 09/03/2010 e, repete-se, para efeitos do artigo 220º do CPPT.

Prossegue a EMMP, em parecer que seguimos de perto, evidenciando que “a dívida é da exclusiva responsabilidade do executado marido e foi penhorado um bem comum do casal, tornou-se imperioso que o cônjuge fosse chamado após a penhora e antes da fase da venda, para defender os seus interesses patrimoniais nos termos previstos no artigo 220º do CCPT, ou seja, para exercer o poder legal de promover a separação de bens, sabido que no caso de ele exercer esse direito a execução ter de ficar suspensa até à partilha e se o bem não for atribuído ao executado há que levantar a sua penhora e efectuar nova penhora sobre bens que lhe tenham cabido (cfr. artº 740, nº 2 do CPC).

Na verdade, face ao teor daqueles dois preceitos, verifica-se que podem existir dois tipos de citações do cônjuge, com diversos alcances e distintas finalidades:

- a prevista no art. 220º do CPPT, feita com a finalidade de conceder ao cônjuge a faculdade de requerer a separação de bens, não lhe conferindo a qualidade de parte no processo executivo;

- a prevista o art. 239º do CPPT, feita obrigatoriamente quando são penhorados bens imóveis ou móveis sujeitos a registo e que visa conferir ao cônjuge a qualidade de executado, com possibilidade de exercer, a +artir daí, todos os direitos processuais que são atribuídos ao executado”.

Nas palavras de Lopes de Sousa, “Estas citações do cônjuge não têm, porém, o mesmo alcance, nem lhe conferem as mesmas possibilidades de intervenção processual.

Na verdade, nos casos previstos no art. 220.º do CPPT, a citação visa apenas possibilitar ao cônjuge do executado requerer a separação de bens, como deriva do próprio texto destas normas. (…)

Por seu turno, nos caos em que o cônjuge é citado sem essa finalidade especifica, a citação confere-lhe a qualidade de co-executado, com possibilidade de exercer, a partir da citação, todos os direitos processuais que são atribuídos a este. Isso mesmo está expressamente referido no artº 864º-A do CPC, em que se esclarece que o cônjuge do executado é admitido a deduzir, no prazo de 10 dias, ou até ao termo do prazo concedido ao executado, se terminar depois daquele, oposição à execução ou à penhora e a exercer no apenso de verificação e graduação de créditos e na fase do pagamento, todos os direitos que a lei processual confere ao executado (para além de poder também pode requerer a separação dos bens do casal, nos termos do n.º 5 do artigo 825.º, quando a penhora recaia sobre bens comuns.

Assim, nas situações em que há lugar à citação do cônjuge prevista no n.º 1 do presente art-239.º do CPPT deverá entender-se que, também no processo de execução fiscal, a citação tem o alcance aí indicado de colocar o cônjuge na situação de co-executado, com todos os direitos processuais atribuídos ao executado originário.)

Esta atribuição ao cônjuge da posição de executado e a obrigatoriedade da sua citação nos casos de penhora de bens imóveis ou móveis sujeitos a registo, implica que ele nestes casos, não tenha a possibilidade de embargar de terceiro, devendo reagir contra actos ilegais que afectem os seus direitos através dos meios processuais concedidos ao executado, se já tiver sido citado, ou arguindo a nulidade insanável da falta da citação indevidamente omitida, nos termos do art. 165.º, n.º1, alínea a), do CPPT, usando em seguida das referidas faculdades processuais” – cfr. CPPT, anotado e comentado, 6ª edição, IV volume, Áreas Editora pág. 29.

Ora, no caso, contrariamente ao que foi assumido na sentença, a citação efectuada foi efectuada ao abrigo do disposto no artigo 220º do CPPT, pelo que a Recorrente não se assume aqui como co-executada mas antes como terceiro. Nessa medida, podia ter deduzido embargos, como deduziu.

Ora, não suscita controvérsia que à data em que foi penhorado o imóvel (cfr. alínea D) dos factos provados), o mesmo constituía um bem comum do casal, sendo que a Embargante (ora Recorrente) e o executado eram casados. Perante a citação efetuada ao abrigo do 220º do CPPT, a Recorrente requereu a separação de bens, tendo-lhe sido adjudicada a nua propriedade da fracção penhorada, a qual constitui a casa de morada de família – cfr. alíneas H) e I) dos factos provados.

Assim sendo, a penhora ordenada na execução fiscal ofende o direito da embargante, tal como alegado.

Em suma, e sem necessidade de mais delongas, há que julgar procedentes as conclusões da alegação de recurso e conceder provimento ao mesmo, revogando a sentença recorrida, julgando procedentes os embargos deduzidos e ordenando-se o levantamento da penhora.


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3 - DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença, julgar procedentes os embargos deduzidos e ordenar o levantamento da penhora incidente sobre o imóvel m.i em D) do probatório.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 25 de Março de 2021.

[A Relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Senhoras Desembargadoras Hélia Gameiro e Ana Cristina Carvalho]


(Catarina Almeida e Sousa)