Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06951/13
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:10/03/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO. EXCEPÇÃO PEREMPTÓRIA DE CONHECIMENTO OFICIOSO.
PRAZO PARA DEDUZIR RECLAMAÇÃO DA DECISÃO DO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL É UM PRAZO JUDICIAL.
Sumário:1. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).

2. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

3. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.

4. O prazo fixado para a dedução da acção, porque aparece como extintivo do respectivo direito (subjectivo) potestativo de pedir judicialmente o reconhecimento de uma certa pretensão, é um prazo de caducidade. E a caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade do acto tributário) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (cfr.artº.333, do C.Civil). É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos do artº.576, nº.3, do C.P.Civil, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos articulados pelo autor, assim sobrevindo o não conhecimento “de meritis” e a consequente absolvição oficiosa do pedido.

5. O prazo para deduzir reclamação da decisão do órgão de execução fiscal é um prazo judicial, atento o disposto no artº.20, nº.2, do C.P.P.Tributário. Com efeito, o processo de execução fiscal tem natureza judicial, na sua globalidade, apesar de haver uma parte do mesmo que é processada perante órgãos da Administração Tributária (artº.103, nº.1, da L.G.T.). Tratando-se de prazo de natureza judicial, aplica-se-lhe o regime do C.P.Civil (cfr.art.20, nº.2, do C.P.P.Tributário), pelo que ele corre continuamente, mas suspende-se em férias judiciais, mais se transferindo o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia em que os Tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto (cfr.artº.138, nºs.1, 2 e 3, do C.P.C.).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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FREDERICO ................, com os demais sinais dos autos, deduziu salvatério dirigido a este Tribunal tendo por objecto despacho de indeferimento liminar proferido pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Sintra, exarado a fls.72 a 74 do presente processo, através da qual julgou extemporânea a reclamação de acto do órgão de execução fiscal deduzida pelo reclamante/recorrente enquanto executado por reversão no âmbito do processo de execução fiscal nº................... e apensos que corre seus termos no 4º. Serviço de Finanças de ..............., visando despacho que ordenou a venda judicial de imóvel no espaço da mencionada execução.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.99 a 116 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Tendo o ora recorrente tido conhecimento da venda e convocação de credores marcada para dia 27/11/2012 e 11/12/2011, do imóvel de sua propriedade, por penhora realizada sobre a fracção autónoma "A", sita na Rua .........., 55, R/C Dto., A.........., pelo 4º. Serviço de Finanças de ....... (SFS4), para imputação à dívida de I.V.A. e coimas do sujeito passivo “W............. P........ C.......... A........ LDA.”, por a venda judicial a ser realizada pelo SFS4 ser ilegal e violar a lei, o recorrente apresentou, nos termos dos arts.276, 277 e 278, nº.3, al.a), do C.P.P.T., reclamação judicial;
2-Reiteramos, por ser relevante que a referida reclamação judicial foi apresentada quando o recorrente tomou conhecimento da venda e convocação de credores marcada para dia 27/11/2012 e 11/12/2011, do imóvel de sua propriedade e não antes por não lhe ser possível reclamar de um facto que desconhecia;
3-Na reclamação em apreço o recorrente suscitou várias questões cuja materialidade se reconduziu, mormente, a questões de Direito, pelo que, a argumentação ali apresentada, não obstante, ter sido carreada aos autos pelo recorrente, por ser matéria de Direito é de conhecimento oficioso, podendo e devendo ser alvo de apreciação judicial, mesmo sem necessidade de alegação pelas partes;
4-Ora, o acto posto em causa nos presentes autos visa a venda de um imóvel, casa de morada de família do recorrente, sendo, também, por isso, de primordial relevância a plena observância de todos os requisitos de legalidade prescritos por lei, o que, malogradamente, não se verificou nos autos em apreço;
5-A reclamação apresentada fundamentou-se num prejuízo irreparável para o recorrente causado pela ilegalidade da venda do imóvel penhorado nos autos de execução acima identificados, imóvel onde o executado reside, ou seja, a casa de morada de família, sem que a mesma tivesse sido notificada pelo SFS4;
6-Ponderada a ausência de notificação da venda, bem como, dos respectivos termos, estamos perante um vício de nulidade do acto reclamado (venda judicial do bem imóvel), o qual deve ser analisado pelo Tribunal, por ser insanável e de conhecimento oficioso;
7-Na reclamação apresentada, foi suscitado a título de questão prévia o prejuízo irreparável para o então reclamante causado pela ilegalidade da venda do imóvel penhorado, sem que o Serviço de Finanças procedesse à notificação da mesma ao recorrente, facto gerador de nulidade por omissão de notificação da venda, que sendo insanável, prejudicou a defesa do recorrente e violou os arts.165, nº.1, al.b), nº.2 e nº.4 e 189, nº.1, do C.P.P.T., pelo que, de imediato emergem fundamentos legais atendíveis para atacar o acto administrativo em apreço;
8-A notificação é o acto pelo qual se leva um facto ao conhecimento de uma pessoa ou se procede ao seu chamamento aos autos, artº.35, nº.1, do C.P.P.T., sendo condição de eficácia do referido acto, artº.36, nºs.1 e 2, C.P.P.T., pois que, apenas com o oportuno conhecimento do facto pode o interessado reagir ao mesmo, o que não ocorreu “in casu”, por omissão da competente notificação para o efeito;
9-A nulidade acima referida advém do facto da notificação omitida dever ter sido realizada ao recorrente, para querendo poder pronunciar-se, opondo-se e juntando prova relevante aos autos, designadamente, da ilegalidade da venda judicial do bem imóvel penhorado, sendo certo que, considerando que o recorrente reside no imóvel penhorado, é de fulcral relevância que se proceda à imediata suspensão da venda judicial.
10-Não é, de todo, admissível que o recorrente, sendo o principal interessado e o principal visado com o acto em apreço, seja prejudicado nos seus direitos de defesa, pela omissão de notificação, que a lei prevê como obrigatória, não pode a Autoridade Tributária proceder à venda da residência dos contribuintes, por seu livre arbítrio, para pagamento de tributos devidos por terceiros, sem, oportunamente, comunicar e facultar os meios de defesa legais aos visados pelo acto de cobrança judicial e pagamento coercivo;
11-Acresce que, mesmo à data da penhora a favor do SFS, não provou o interesse social desta prestação a favor de uma sociedade terceira, sem qualquer relação com o recorrente, cfr. artº.6, do C.S.C., aplicável “ex vi” do artº.2, do C.P.P.T., e 77, da L.G.T.;
12-Na reclamação apresentada foi requerida a imediata suspensão da venda judicial, porquanto, não pode ser admissível a afectação das quantias obtidas com a venda judicial para amortização da dívida de I.V.A. e coimas devidas por uma terceira entidade, com a qual o recorrente não tem qualquer relação, pois que este acto potencia a ocorrência de prejuízo irreparável para o recorrente, face à ilegalidade do mesmo, cfr. disposto nos arts. 276 e 278, nº.3, al.a), do C.P.P.T.;
13-A nulidade supra descrita não é o único vício que inquina a legalidade destes autos, pois que, àquela nulidade acresce a circunstância, igualmente ponderosa, da ilegitimidade do ora recorrente para os autos em apreço, pois que, foi o recorrente executado por reversão de dívidas parafiscais ao ISS, IP, pela sociedade “W.......... P.........C......A.......LDA.”;
14-A execução por reversão é manifestamente inaplicável “in casu”, porque os pressupostos da factualidade em que assenta não se verificam, o que sempre acarretará mais uma nulidade insanável, da qual não se prescinde sendo a mesma de conhecimento oficioso;
15-O recorrente nunca exerceu o cargo de gerente na sociedade “W...... P........ C... A........ , LDA.”, inexistindo título que permita operar a reversão da dívida fiscal e procurar a satisfação de créditos da Fazenda Pública à custa do património deste contribuinte, ora recorrente;
16-De resto, tal facto não se encontra bastante e suficientemente provado nos autos, uma vez que, apenas foi deduzida execução, em termos extremamente ligeiros de mera presunção, ou seja, se houve tributos retidos e não entregues ao credor tributário, então presume-se que ilicitamente se apropriaram dessas quantias os gerentes da empresa;
17-Nunca foi efectuada nos autos qualquer tipo de prova substantiva em como o recorrente se apropriou ilicitamente das referidas quantias pecuniárias, ficou-se sempre e só pela mera presunção formal, aliás, característica da prova "prima facie" ou de primeira aparência;
18-O que em processo de execução fiscal é extremamente perigoso e redutor da certeza e segurança na descoberta da verdade material dos factos que possam consubstanciar a prática de um ilícito tributário, uma vez que os meios de defesa são circunscritos ao artº.204, C.P.P.T.;
19-Assim, ainda que fosse legalmente possível a procedência da reversão no vertente caso, o que não é, nunca esta poderia ser deduzida contra o recorrente, que nunca exerceu, de facto, a administração da sociedade, nem sequer no plano nominal ou de direito;
20-Portanto, as alegadas dívidas da "W..... P............... C............ A ............. LDA.", não podem ser imputadas ao recorrente que não tinha qualquer cargo ou poder dentro da empresa, para ordenar o não pagamento das alegadas dívidas fiscais;
21-A responsabilidade subsidiária pelas dívidas fiscais, emergentes da retenção e falta de pagamento e/ou declaração das mesmas, tem carácter pessoal e só pode recair sobre administradores ou gerentes que praticaram, efectivamente, os actos de administração ou gerência na sociedade, o que não se aplica "in casu" ao recorrente;
22-Sopesados os argumentos supra indicados resulta que a Autoridade Tributária vem procurar a satisfação de um crédito à custa do património de um terceiro relativamente à relação fiscal que originou o referido crédito, pois que, não tem o ora recorrente e, de resto, não teve, qualquer responsabilidade na gestão, organização e direcção da sociedade, executada originária, sendo alheio às dívidas daquela, sendo ilícito, qualquer acto que venha assacar responsabilidades ao recorrente relativamente a dívidas da executada originária, facto de extrema relevância, que deverá merecer acolhimento por parte do Tribunal “ad quem”;
23-Às nulidades e excepção de ilegitimidade existentes nos presentes autos, acresce ainda que a venda judicial em apreço encontra-se ainda inquinada de outro vício, na verdade, foi já deduzida oposição pelo recorrente no processo de execução fiscal, oposição na qual, foram aduzidos os argumentos supra referidos;
24-A suspensão da execução obsta à realização dos termos de processo executivo e diligências processuais subsequentes, nomeadamente, a convocação de credores e posterior venda judicial, Devendo, em data imediatamente posterior da apresentação da oposição, ser declaradas nulas todas as demais diligências subsequentemente processadas, “in casu”, a convocação de credores para posterior venda judicial;
25-Considerando os múltiplos vícios existentes nos presentes autos, não pode prosseguir o petitório da recorrida, pois que, recordemos que em causa está a possibilidade do recorrente perder, por acto administrativo envidado nos duvidosos termos já explanados, a casa de morada de família, sendo tal facto de extrema gravidade e importância, pelo que, não podem, num procedimento com tal desiderato, ser preteridas as mais básicas garantias de defesa e tutela dos direitos do principal interessado e potencial lesado;
26-Sendo que, na douta sentença ora sob recurso, foram obliteradas questões de direito cuja pronúncia não poderia ter sido omitida, atendendo à argumentação carreada aos autos pelo recorrente, impõe-se a prolação de decisão judicial que reconheça os vícios legais e respectivos efeitos, acautelando os direitos do recorrente de molde a obstaculizar os potenciais danos irreparáveis perpetrados pelo acto administrativo ilegal;
27-Não poderia o recorrente reclamar de um despacho cuja existência desconhecia, por ausência de notificação, facto que suscitámos, “ab initio”, e ora reiteramos, de resto, logo que tomou conhecimento do mesmo efectivou a reclamação do acto, como não poderia deixar de ser, tanto mais que, o recorrente sempre rejeitou qualquer responsabilidade sobre a dívida ora sob cobrança;
28-Na reclamação apresentada, foi suscitado a título de questão prévia o prejuízo irreparável para o então reclamante causado pela ilegalidade da venda do imóvel penhorado, sem que o Serviço de Finanças procedesse à notificação da mesma ao recorrente, facto gerador de nulidade por omissão de notificação da venda, que sendo insanável, prejudicou a defesa do recorrente e violou os arts.165, nº.1, al.a) e b), nº.2 e 4, do C.P.P.T., com repercussão ao nível da eficácia do acto, cfr. artº.35, nº.1, e 36, nºs.1 e 2. do C.P.P.T., pelo que, de imediato emergem fundamentos legais atendíveis para atacar o acto administrativo em apreço;
29-Refere o Tribunal “a quo” que na data de 4/10/2012 "data em que foi assinado o aviso de recepção referente ao ofício remetido para notificação", todavia, sem indicar a que fls. ... dos autos se encontra junto o referido aviso de recepção;
30-Considerando que o recorrente sempre referiu nunca ter sido alvo de notificação da venda, a qual indicou apenas ter sido notificada apenas à executada originária, importa pois clarificar a existência, bem como, quem assinou o referido aviso de recepção, pois que, aqui reside o cerne da questão suscitada nos autos, sendo certo que, alega o recorrente, que nunca tal venda lhe foi notificada;
31-Aliás, desde que tomou conhecimento da existência dos autos o recorrente reclamou da venda, bem como, no âmbito do proc. nº...................., referido no despacho de fls. ..., apresentou oposição, na qual, igualmente, referiu a sua ilegitimidade para os presentes autos;
32-Prevê o artº.277, do C.P.P.T., que o prazo de reclamação conta-se após a notificação da decisão, ocorrência que o recorrente alegou não se ter verificado, sem ter sido suficientemente demonstrado o inverso, nos autos em apreço;
33-Nesta medida resulta que a sentença recorrida não se encontra suficientemente fundamentada, pois que, a insuficiência de fundamentação equivale como falta de fundamentação, sendo que, o direito à fundamentação, relativamente aos actos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos, tem hoje consagração constitucional de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias consagrados na C.R.P. (artº. 268), não sendo suficiente remeter-se, em abstracto, para documentos sem nada se explicar quanto ao conteúdo dos mesmos;
34-Ora, discordamos da decisão do Tribunal, pois que, conforme supra referimos os presentes autos estão norteados por vícios e nulidades de conhecimento oficioso, cuja gravidade impõe uma pronúncia de mérito, em benefício do recorrente, não podendo o Tribunal alhear-se a tal facto;
35-Não sendo admissível que através da prolação de decisão que vem coarctar o direito de acção do recorrente, o Tribunal oblitere a existência de nulidades e excepções dilatórias que obstam à procedência da acção nos termos em que o recorrido a configurou, cuja arguição se realizou na reclamação e na oposição, concomitantemente;
36-Pelo que, ainda que a reclamação fosse intempestiva, o que não se admite, considerando que o recorrente reagiu ao acto da venda logo que dele tomou conhecimento, o petitório dos presentes autos sempre teria de soçobrar face à existência dos vícios indicados;
37-Não pode o Tribunal ancorar a sua decisão alegando a intempestividade de um acto, quando se trata de julgar um caso concreto que padece de vícios de gravidade tão substancial como os presentes autos, pois assim se procede à denegação de justiça e efectivação de ponderosos e substanciais prejuízos na esfera jurídica do recorrente, que desde o início dos presentes autos sempre alegou em sua defesa questões que obstam à procedência da acção tal como foi configurada;
38-Face à existências das várias nulidades supra indicadas, bem como da excepção dilatória de ilegitimidade do recorrente para os presentes autos, deverão os mesmos soçobrar assim realizando a necessária justiça e se defendendo os valores do Estado de Direito;
39-Nestes termos e no mais de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deverá o Tribunal “ad quem” proferir douto Acórdão que ordene a revogação da decisão do Tribunal “a quo” e a substitua por outra que reconheça e declare, nos termos e para todos os efeitos legais, as nulidades existentes nos presentes autos, designadamente, omissão de notificação da decisão de venda judicial, inexistência de pressupostos que justifiquem a cobrança por reversão e ilegitimidade do recorrente para os presentes autos, bem como que, aceite por tempestiva a reclamação apresentada pelo recorrente, o que fez mesmo sem ter sido notificado para o efeito, assim se realizando a justiça e concretizando os valores do Estado de Direito.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr.fls.176 a 179 dos autos) no sentido de se negar provimento ao recurso com as legais consequências.
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Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.657, nº.4, do C.P.Civil; artº. 278, nº.5, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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O despacho recorrido julgou documentalmente provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.72 e 73 dos autos):
1-No 4º. Serviço de Finanças de ............. corre termos o processo de execução fiscal nº. ................... e apensos, por dívidas de I.V.A. e coimas fiscais, em que o reclamante figura como executado por reversão (cfr.cópia do processo de execução fiscal apensa aos presentes autos);
2-O reclamante Frederico ................... foi citado para a presente execução fiscal, na sequência de despacho de reversão, no dia 12/05/2010 (cfr.documentos juntos a fls.20 a 23 do processo de execução apenso; informação constante de fls.62 a 64 dos presentes autos);
3-Na citada execução fiscal, foi efectuada uma penhora automática ao imóvel com o artigo 1348, fracção "A", da freguesia de ........., em nome do reclamante, tendo-se tornado definitiva em 27/01/2011 (cfr.documentos juntos a fls.64 a 68 do processo de execução apenso; informação constante de fls.62 a 64 dos presentes autos);
4-A penhora do imóvel foi notificada ao reclamante no dia 14/02/2011 (cfr.documento junto a fls.73 do processo de execução apenso);
5-Mediante despacho proferido pelo Chefe do 4º. Serviço de Finanças de ............ em 14/09/2012, foi designada a venda do imóvel para o dia 12/12/2012 (cfr.documentos juntos a fls.96 e verso do processo de execução apenso; informação constante de fls.62 a 64 dos presentes autos);
6-O despacho do Chefe do 4º. Serviço de Finanças de ......... proferido em 14/09/2012 foi notificado ao reclamante em 4/10/2012 (data em que foi assinado o aviso de recepção referente ao ofício remetido para notificação - cfr.documentos juntos a fls.97 e 98 do processo de execução apenso);
7-A petição inicial dos presentes autos deu entrada no 4º. Serviço de Finanças de Sintra no dia 23/10/2012 (cfr.data de envio de fax aposta nos documentos juntos a fls.5 e 6 dos presentes autos).
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Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso e que o recorrente impugna parcialmente a mesma, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
8-O aviso de recepção mencionado no nº.6 do probatório foi assinado pelo reclamante/recorrente, Frederico ............ (cfr.assinaturas de avisos de recepção cujas cópias se encontram juntas a fls.21, 73 e 98 do processo de execução apenso).
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, o despacho recorrido ponderou, em síntese, rejeitar liminarmente a reclamação que originou os presentes autos, em virtude da procedência da excepção peremptória de caducidade do direito de acção, a qual é de conhecimento oficioso.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar e como supra se alude, que refere o Tribunal “a quo” que na data de 4/10/2012 "data em que foi assinado o aviso de recepção referente ao ofício remetido para notificação", todavia, sem indicar a que fls. ... dos autos se encontra junto o referido aviso de recepção. Que o recorrente sempre referiu nunca ter sido alvo de notificação da venda, o qual indicou apenas ter sido notificada à executada originária, importa pois clarificar a existência, bem como, quem assinou o referido aviso de recepção, pois que, aqui reside o cerne da questão suscitada nos autos, sendo certo que, alega o recorrente, que nunca tal venda lhe foi notificada (cfr.conclusões 29 e 30 do recurso), com base em tal alegação pretendendo, segundo percebemos, consubstanciar erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr. 607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
“In casu”, conforme se retira da matéria de facto aditada ao probatório (cfr.nº.8 do probatório), o recorrente foi efectivamente notificado, de forma pessoal, do despacho a designar a data da venda do imóvel penhorado nos autos no pretérito dia 4/10/2012, pelo que não se verifica qualquer erro de julgamento de facto da decisão recorrida, assim devendo este Tribunal confirmar a mesma neste segmento.
Em consequência de tal factualidade, ora confirmada por este Tribunal, deve passar-se ao exame da excepção de caducidade do direito de acção, matéria impugnada pelo recorrente, nomeadamente nas conclusões 27 e 32 do recurso.
O prazo fixado para a dedução da acção, porque aparece como extintivo do respectivo direito (subjectivo) potestativo de pedir judicialmente o reconhecimento de uma certa pretensão, é um prazo de caducidade. E a caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade do acto tributário) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (cfr.artº.333, do C.Civil). É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos do artº.576, nº.3, do C.P.Civil, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos articulados pelo autor, assim sobrevindo o não conhecimento “de meritis” e a consequente absolvição oficiosa do pedido (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/1/2013, proc.6038/12).
Concretamente, o prazo para deduzir reclamação da decisão do órgão de execução fiscal é um prazo judicial, atento o disposto no artº.20, nº.2, do C.P.P.Tributário. Com efeito, o processo de execução fiscal tem natureza judicial, na sua globalidade, apesar de haver uma parte do mesmo que é processada perante órgãos da Administração Tributária (artº.103, nº.1, da L.G.T.). Tratando-se de prazo de natureza judicial, aplica-se-lhe o regime do C.P.Civil (cfr.art.20, nº.2, do C.P.P.Tributário), pelo que ele corre continuamente, mas suspende-se em férias judiciais, mais se transferindo o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia em que os Tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto (cfr.artº.138, nºs.1, 2 e 3, do C.P.C.).
Mais se dirá que o prazo para dedução da reclamação da decisão do órgão de execução fiscal é de dez dias computado da data em que o interessado tiver sido notificado da decisão reclamada, conforme decorre do artº.277, nº.1, do C.P.P.T. (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 15/7/2009, rec.608/09; Jorge Lopes de Sousa, Código do Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, IV Volume, Áreas Editora, 2011, pág.292).
No caso “sub judice”, resulta do probatório que o recorrente foi notificado do despacho a designar data para a venda judicial do imóvel penhorado no processo de execução fiscal nº.3166-2004/156518.4 e apensos em 4/10/2012, sendo que a reclamação pelo mesmo deduzida somente deu entrada no 4º. Serviço de Finanças de Sintra no dia 23/10/2012, através de fax (cfr.nºs.6 a 8 do probatório).
O termo inicial do prazo de dez dias em causa fixou-se em 5/10/2012. O termo final ocorre a 15/10/2012 (dado que o dia 14/10/2012 é um domingo). Tendo em conta a possibilidade de praticar o acto em qualquer um dos três dias úteis imediatamente seguintes, a reclamação poderia ter sido apresentada até 18/10/2012, ficando a validade do acto dependente do pagamento de multa (cfr.artº.145, nº.5, do C.P.C.). Daí que, tendo a reclamação sido oferecida a 23/10/2012, nesta data, já há muito se havia esgotado o prazo de 10 dias de que o reclamante dispunha para apresentação da mesma peça processual, contrariamente ao defendido pelo recorrente.
Finalizando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente também este fundamento do recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, prejudicado ficando o exame dos restantes esteios da apelação, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o reclamante/recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 3 de Outubro de 2013


(Joaquim Condesso - Relator)
(Eugénio Sequeira - 1º. Adjunto)

(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)