Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:132/14.8BEALM
Secção:CA
Data do Acordão:03/21/2019
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:LIMITE TEMPORAL DA INDICAÇÃO DO VALOR DA CAUSA
CONSELHO SUPERIOR DA ORDEM DOS ADVOGADOS
CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO
NÃO CONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
Sumário:I) - O prazo fixado para a dedução da acção, porque aparece como extintivo do respectivo direito (subjectivo) potestativo de pedir judicialmente o reconhecimento de um certo direito, é um prazo de caducidade.

II) - E a caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade do acto administrativo) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (art. 333° do CC) e determina o indeferimento liminar da petição. É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos dos artºs 576º nº 3 e 579º do CPC, consistindo na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor, o não conhecimento de meritis pela existência de obstáculos que o impeçam na disponibilidade do recorrente, importando a absolvição oficiosa do pedido.

III) - Mesmo que se considere que se trata de uma excepção dilatória por assim ser qualificada especialmente no CPTA (cfr. artº 89º nºs 1, 2 e 4 al. k), tal implicaria que o tribunal não conhecesse do mérito da causa e se absolvesse o réu da instância, o que, em termos práticos, implicava que a apreciação da questão de fundo ficasse prejudicada pela verificação daquela excepção, pelo que, de todo em todo, não existe a pretendida omissão de pronúncia, pois, segundo essa conceituação, verifica-se uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso e a qual obsta ao conhecimento do objecto do processo.

IV) - Existem as chamadas “condições de fundo da acção” que são as condições necessárias para a procedência da acção, para uma sentença favorável e se distinguem dos “pressupostos processuais” que são os elementos de cuja verificação depende o dever de o juiz proferir decisão sobre o pedido formulado, concedendo ou indeferindo a providência requerida, trata-se das condições mínimas consideradas indispensáveis para, à partida, garantir uma decisão idónea e uma decisão útil da causa. Não se confundem, pois, com as referidas condições da acção, que são os requisitos indispensáveis para que a acção proceda. A distinção entre ambos assenta, portanto, na diferença entre os requisitos necessários para que a acção (cível, penal, administrativa ou fiscal), baseada no direito substantivo possa considerar-se fundada (procedente) e as condições de admissibilidade do processo (ou instância). Os pressupostos, como condições necessárias para o Tribunal se ocupar do mérito da causa, podem ser positivos (são os requisitos cuja existência é essencial para que o juiz se deva pronunciar sobre a procedência ou improcedência da acção) ou negativos (são os factos cuja verificação impede o juiz de entrar na apreciação do mérito do pedido).

V) - Fazendo os recorrentes tábua rasa destas questões fundamentais, persistindo em que, mesmo que ocorra a caucidade do direito de acção, tem o tribunal de conhecer da questão da prescrição por ser prioritária, o certo é que inexiste instância válida que o permita nem mesmo por apelo ao principio pro actione consagrado no art°7º do CPTA, também denominado como "prevalência da decisão de mérito" em desfavor da decisão de forma, à luz do qual teoricamente se permitiria a prolação de decisão de mérito mesmo que, por subsistir uma excepção dilatória, coubesse antes declarar a absolvição da instância nos sobreditos termos pois haveria, prioritariamente, que averiguar em que condições o Tribunal se poderia pronunciar sobre esse mérito, se faltar – como falta - um pressuposto processual geral.

VI) - O critério continua a ser, dado o abandono da apreciação prévia dos pressupostos processuais estabelecido no antigo art° 278°, nº 3, 2a parte, do CPC, o de averiguar se a decisão sobre o mérito é favorável à parte que seria beneficiada com o preenchimento do pressuposto que (eventualmente) falta.

VII) – Encarando a aplicabilidade do dito princípio ao caso vertente, impõe-se considerar que não se pode conhecer das questões de mérito, preterindo o conhecimento de pressuposto processual quando este contende manifestamente com a procedência daquelas isto porque a aplicação do falado princípio não significa, porém, que a tutela jurisdicional seja de todo alheia à observância de um número mais ou menos apertado de regras instrumentais adequadas a esse fim.

VIII) – É que tal inovação não teve porém o propósito de subverter a "normalidade" legal antes visando alcançar uma adequação ou racionalização dos meios de tutela processual aos fins a atingir, em consonância com o art. 2, nº 2 do CPC por forma a estabelecer um elo de correspondência entre o direito a defender e o meio processual a utilizar para o efeito sendo neste ponto de considerar que o "pro actione" postula, além do mais, uma interpretação da situação em análise, por forma a privilegiar, sempre que tal seja processualmente possível, o conhecimento da questão de fundo, assim se assegurando a tutela jurisdicional efectiva, possibilitando o exame do mérito das pretensões deduzidas em juízo.

IX) - Em tal desiderato não deverão as questões de fundo (prescrição e as demais que ultrapassam o objecto da acção) ser conhecidas, pois há um prius que não permite ao tribunal «ad quem» dirimir definitivamente a questão, por muito respeito e homenagem que devotemos ao princípio «pro actione» ou «pró-recurso», consubstanciado no velho brocardo latino «favorabilia amplianda, odiosa restringenda», de que constitui evidente erupção todos os citados normativos.

X) - E não obsta a essa conclusão – antes a reforça- o facto de na reclamação os Autores e ora Recorrentes assaquem ao acto impugnado os vícios de desvio de poder, violação do caso julgado e ofensa do conteúdo essencial de direitos fundamentais, pois, como bem se afirma na decisão recorrida tais vícios não foram concretizados na petição inicial, tendo sido meramente invocados conclusivamente e sem que tenham sido alegados quaisquer factos que pudessem ser subsumidos nas nulidades plasmadas no artigo 133.º do CPA.

XI) - Não obstante no artigo 613.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, se estatuir que uma vez proferida a sentença fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional quanto à matéria da causa, verifica-se uma das excepções a essa regra estabelecida no artigo 614.º do mesmo Código, que consente que a sentença seja rectificada, oficiosamente ou a requerimento das partes, nos casos aí expressamente previstos mormente quando se trate de omissão ou lapso manifesto.

XII) - Tendo sido ao agasalho do disposto no artigo 614.º do CPC, aplicável por força do artigo 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), que o Tribunal a quo rectificou a sentença, suprindo uma omissão aí verificada, qual seja, a fixação do valor da causa, não se verifica em tal caso a violação do disposto no artigo 613.º, n.º 1 do CPC.

XIII) - Pontifica ainda a respeito o comando ínsito no artº 306.º do CPC, aplicável ex vi do artº 1º do CPTA, de acordo com o qual, se for interposto recurso antes da fixação do valor da causa pelo juiz, deve este fixá-lo no despacho que admita o recurso, pelo que sempre seria admissível a posterior fixação do valor da causa e, assim, na concatenação do disposto nos artigos 31.º, n.º 1 e 34.º, n.º 1 do CPTA, o valor a fixar à acção era o de €30.000,01, não incorrendo o tribunal recorrido em qualquer nulidade ao assim determinar até porque objectivam os autos que na sentença proferida nos autos, e em fase de saneamento, nenhuma referência foi feita ao valor da causa, o que traduz uma omissão de decisão sobre o valor da causa e não uma modificação do valor atribuído na petição inicial e que, segundo os recorrentes, não podia ser alterado.

XIX) - E, por força do disposto no artigo 31.º, n.º 1 do CPTA, a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, e é ao juiz que compete fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes, nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 306.º, do CPC, aplicável ex vi artigo 31.º, n.º 4, do CPTA pelo que, tendo corrido que o Réu, na sua contestação, indicou um valor à acção diverso do indicado pelos Autores e ora Recorrentes, sendo que, como não houve lugar a despacho saneador e foi proferida sentença, era imperioso que nesta fosse fixado o valor da causa por imposição normativa do n.º 2, do artigo 306.º, do CPC.

XX) - Por assim ser, face à omissão da fixação do valor da causa na sentença, a mesma pode ser corrigida por simples despacho, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 614.º, do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º, do CPTA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


I- RELATÓRIO

António ............................ e Maria ....................................., Autores melhor identificados nos autos, não se conformando com o acórdão que, por via de reclamação para a conferência de sentença antes proferida, julgou procedente a excepção de caducidade do direito da presente acção administrativa especial que intentaram contra a Ordem dos Advogados, pedindo a anulação do Acórdão do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, proferido em 12/07/2013, que manteve o Acórdão de 07/10/2011, que aplicou ao Autor a pena de suspensão pelo período de três anos e à Autora a pena de suspensão pelo período de dois anos e seis meses e em que indicaram como Contrainteressados, Maria ................................, Desembargador Dr. A............................, Desembargador Dr. R......................., Mmo. Juiz Dr. L......................., Mmo. Juiz Dr. B............................, Mmo. Juiz Dr. R............................, Dr. J.M. ............................ e os Magistrados do Ministério Público, Dr. M........................., Dr. J....................... e Dr. D......................., todos melhor identificados a fls. 4 dos autos vêm interpor recurso para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões:

“PRIMEIRA
Reiteram-se as 10 conclusões e o pedido final transcrito nas páginas 2 a 4 do Acórdão do TAF de Almada proferido em 21-09-2018, a fls…, às quais não foi dada pronúncia judicial “máxime” quanto à questão constitucional suscitada de modo processualmente adequado perante o Tribunal que proferiu a decisão recorrida e entretanto reclamada por convolação.

SEGUNDA
Contudo, os autores apresentam ainda conclusões complementares em contraponto ao Acórdão do TAF de Almada ora impugnado.

TERCEIRA
O despacho proferido em 04-07-2018, de convolação é uma decisão de mero expediente e, como tal, irrecorrível nos termos do artº 630º, nº1 do NCPC/13.

QUARTA
Para além da factualidade renovada nas páginas 4, 5 e 6 do Acórdão em crise é da máxima pertinência ponderar toda a factualidade disciplinar, que não foi aditada e que deve ser ali integrada para que a decisão seja proferida mediante processo equitativo.

QUINTA
Nos autos e no processo administrativo apenso, cujo teor o Acórdão ora impugnado deu por integralmente reproduzido estão demonstradas cabalmente o desvio de poder, o caso julgado e a ofensa do conteúdo essencial dos direitos fundamentais, motivo por que deve ser proferida, na oportunidade, decisão de fundo em detrimento das decisões formais que entretanto têm sido prolatadas.

SEXTA
Mas, o Acórdão recorrido omitiu pronúncia sobre a viciação disciplinar, pelo que é nulo - artº 615º, nº1, do NCPC/13.

SÉTIMA
Esta ação administrativa instaurada em 05-02-2014 tem andado de mão em mão de vários juízes, com violação manifesta do princípio do Juiz Legal ou natural, mas a sentença de 25-06-2015, de fls. 202 a 208, foi proferida pela Exma. Doutora Juíza Ilda Coco, que agora não interveio.
O programa informático na prática não funciona devido à arbitrariedade do manuseamento subsequente.

OITAVA
A situação reiterada e mantida pelo Acórdão recorrido é irresignável, porquanto é necessário que o julgador proceda à ponderação de volume total da prova recolhida nos autos e no processo administrativo apenso, de forma que o direito de recurso ou reclamação seja condigno e efetivo, mas não virtual, cumprindo-se assim a constituição - arts. 20º, 32º e 269º

NONA
O Acórdão recorrido tal como a decisão reclamada, no concernente à fixação do valor da causa na petição inicial e que foi objeto de correção desconsideram a norma do artº 142º, nº3, alínea b) de ambos os CPTA /2002 e 2015.

DÉCIMA
Alguns dos contrainteressados nesta ação administrativa sofrem de há uns tempos a esta parte as agruras da comunicação social, as quais justificam e fundamentam as críticas certeiras que constam do processo administrativo apenso.

DÉCIMA PRIMEIRA
O cenário processual global constituído pelo processo disciplinar + cautelar + acção rompe indubitavelmente com o mito da caducidade do direito de ação e das referidas reiterações ou repetições desnecessárias, mas as razões formais são sempre curtas, limitadas e de pouca sagacidade.

DÉCIMA SEGUNDA
Verificando-se que a prescrição absoluta já tinha sido invocada e gerada em sede disciplinar, contrariamente à caducidade, então o Acórdão recorrido devia confirmar essa prescrição disciplinar, sendo incorrecto inverter a ordem processual e dos protagonistas na acção a ponto de ter sido analisado o texto do Réu e preterido o argumentário dos autores.

DÉCIMA TERCEIRA
O Acórdão recorrido sofre de uma interpretação ilegal e inconstitucional na aplicação das normas citadas, impondo-se a sua desaplicação - artº 20º e 204º do CRP.

DÉCIMA QUARTA
O procedimento cautelar não é um vazio temporal ou alçapão legal nocivo à ação administrativa, motivo por que esta é tempestiva, na medida em que foi suspenso ou interrompido o prazo de impugnação dos atos administrativos.
XI. Por fim e na decorrência do exposto, e com o douto suprimento de V.V. Exas. devem as vertentes conclusões proceder e, por via disso, deve este recurso em apreço ser admitido e obter procedência, revogando-se ou anulando-se o Acórdão recorrido.
Impõe-se decisão diversa quanto à prescrição absoluta há muito operada, com conhecimento também das ilegalidades e inconstitucionalidades invocadas.
CONTUDO, em melhor critério, V.V. Exas decidirão de forma sã, serena e objetiva.

O Réu Conselho Superior da Ordem dos Advogados, apresentou as suas contra-alegações de recurso que ostentam as seguintes conclusões:

“A. O facto de a Juíza relatora do acórdão proferido em reclamação para a conferência não ser a mesma Juíza que proferiu a sentença reclamada não viola o princípio do juiz natural, consubstanciando, este caso, um limite a tal princípio, que não é absoluto, tal como decidiu o acórdão de 12-12-2012 do Supremo Tribunal Administrativo, processo 01152/11, relator Ascensão Lopes (disponível em www.dgsi.pt).
B. A sentença reclamada, mantida pelo acórdão recorrido, não procedeu à fixação do valor da causa, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 31.º, n.ºs 1 e 4, do CPTA, e 306.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, pelo que o despacho proferido em 29-06- 2015, que corrige tal omissão ao abrigo do disposto no artigo 614.º, do CPC, não padece de qualquer vício.
C. A caducidade do direito de acção configura uma excepção dilatória, que obsta ao prosseguimento do processo, tal como prevê o artigo 89.º, n.º 1, alínea h), do CPTA, pelo que a sua apreciação pode ser feita em sede de saneamento, nos termos do disposto no artigo 87.º, n.º 1, alínea a), do CPTA, devendo, bem assim, a sua apreciação ser prévia à da questão da prescrição do procedimento disciplinar, que configura apreciação do mérito da causa.
D. Os artigos 5.º, 17.º e 20.º, da petição inicial limitam-se, relativamente a uma pluralidade de actos que não o impugnado, a invocar desvio de poder e nulidades de forma genérica e conclusiva, sem alegação de quaisquer factos que os suportem, na verdade, na petição inicial os Recorrentes não alegam factos susceptíveis de determinar a nulidade do acórdão impugnado.
E. Os vícios assacados ao acórdão impugnado na petição inicial reconduzem-se à inobservância de formalidades legais e falta de fundamentação, ilegalidades que não envolvem a violação de qualquer comando constitucional em termos da ofensa do seu conteúdo essencial ou seu núcleo duro, pelo que importam mera anulabilidade.
F. O acórdão recorrido reiterou o disposto na sentença reclamada, julgando que os Recorrentes não imputaram ao ato impugnado qualquer vício gerador da sua nulidade, pelo que o mesmo não omitiu pronúncia sobre a viciação disciplinar, não sendo, por isso, nulo.
G. O articulado superveniente constante no requerimento dos Recorrentes de fls. 94 a 98 dos autos, não foi admitido por despacho proferido em 19-11-2014, que considerou ainda como não escritos os artigos 8.º a 11.º por configurarem resposta inadmissível à contestação, pelo que tal matéria não pode ser apreciada.
H. O acórdão recorrido interpretou a aplicou correctamente a Lei, não procedendo a qualquer interpretação violadora dos artigos 20.º e 204.º da CRP, não merecendo, por isso, qualquer reparo.
TERMOS EM QUE, e nos mais de Direito aplicáveis, devem Vs. Ex.as julgar o presente recurso jurisdicional totalmente improcedente e, em consequência, manter na íntegra o acórdão recorrido, com todas as consequências legais.”

O DMMP junto deste tribunal notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146º, nº1 do CPTA, não emitiu parecer.

*

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida e com interesse para a decisão da reclamação para a conferência, foi declarada a renovação da factualidade assente no despacho saneador, resultante dos autos e do processo administrativo apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido:
A) Por Acórdão da 2.ª Secção do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, de 07/10/2011, foi aplicada ao Autor ANTÓNIO ............................ a pena de suspensão pelo período de três anos e à Autora MARIA ..................................... a pena de suspensão pelo período de dois anos e seis meses (cfr. documento de fls. 27 dos autos – processo físico);
B) Em Acórdão de 12/07/2013, a 2.ª Secção do Conselho Superior da Ordem dos Advogados deliberou manter integralmente o Acórdão referido em A) (documento de fls. 28 e 29 dos autos - processo físico);
C) Os Autores foram notificados do Acórdão referido em B) no dia 29/07/2013 (confissão – cfr. intróito da petição inicial e pedido deduzido a final);
D) Os Autores intentaram processo cautelar contra a Ordem dos Advogados e os Contrainteressados, cujo requerimento inicial deu entrada no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa no dia 14/08/2013, pedindo que fosse decretada a suspensão de eficácia do Acórdão referido em B) (informação disponível no SITAF).
E) A presente ação deu entrada neste Tribunal, através do SITAF, no dia 05/02/2014 (informação disponível no SITAF);
Mais resulta provado o seguinte:
F) Na respetiva petição inicial, os Autores indicaram o valor da ação como correspondendo a € 2.000,00 (cfr. fls. 1 a 63 dos autos);
G) Em 25/06/2018, foi proferido despacho saneador nos presentes autos que julgou verificada a exceção de caducidade do direito de ação e absolveu a Entidade Demandada e os Contrainteressados da Instância (cfr. fls. 202 a 208 dos autos numeração SITAF);
H) Em 29/06/2018, foi proferido despacho, com o seguinte teor:
«Verificando-se que na decisão que antecede não foi fixado o valor da causa, quando deveria tê-lo sido, ao abrigo do disposto no artigo 614.º, n.º 1 do CPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, corrige-se, agora, a referida omissão.
Assim, fixa-se à causa o valor de € 30.000,01 (artigo 34.º, n.º 2 do CPTA). Notifique, juntamente com a decisão que antecede.»
(cfr. fls. 211 a 212 dos autos).

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Nada mais resultou provado com interesse para a decisão da presente reclamação.
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3.2. Do Direito:

Como resulta do disposto nos artigos 635º nº 4 e 639º nº 1 do NCPC- sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso- as conclusões da alegação do recorrente servem para colocar as questões que devem ser conhecidas no recurso e assim delimitam o seu âmbito.
Como é elementar, há que apreciar as questões que prioritariamente se imponham e cuja verificação impeça o conhecimento de quaisquer outras.
Na verdade, impõe-se ao tribunal o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, donde que urge apreciar a questão colocada pelos Recorrentes sobre se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento por ter decretado a caducidade do direito de acção e, consoante a resposta, deve ou não conhecer-se das demais questões, designadamente, a nulidade por omissão de pronúncia e do erro sobre o julgamento de facto e de direito – errada fixação da factualidade relevante e errada interpretação e aplicação do direito, incluso da decisão sobre o valor da causa e a nulidade processual consistente em a Juíza relatora do acórdão proferido em reclamação para a conferência não ser a mesma Juíza que proferiu a sentença reclamada violando-se assim o princípio do juiz natural.
Assim, importa solver a questão prévia suscitada atinente à caducidade do direito de presente acção, excepção cujo conhecimento é de ordem oficiosa tanto mais que, segundo um critério de precedência lógica, a sua procedência importará, antecipe-se, o não conhecimento da matéria da prescrição do processo invocada como fundamento da acção.
Quid juris?
Como bem se assinala na muito bem elaborada fundamentação do acórdão sob censura que, com a devida vénia acolhemos na íntegra:
“ (…)
3.2. Da Ordem de Apreciação das Exceções de Caducidade do Direito de Ação e Prescrição do Processo disciplinar
Prosseguem os Reclamantes invocando que a sentença violou o disposto nos artigos 87.º e 88.º a 92.º do CPTA, por ter apreciado e decidido em primeiro lugar a caducidade do direito de ação, em vez da invocada prescrição do processo disciplinar.
Neste particular, redarguiu a Entidade Demandada que a caducidade do direito de ação configura exceção dilatória, cujo conhecimento obsta ao mérito da ação, diferentemente da prescrição que se reporta à apreciação do mérito da causa.
Vejamos.
Nos termos previstos no artigo 87.º, n.º 1, alínea a) do CPTA, findos os articulados deve ser proferido despacho saneador que conheça obrigatoriamente de todas as questões que obstem ao conhecimento do objeto do processo.
Ora, a caducidade do direito de ação configura exceção dilatória, de conhecimento oficioso, que obsta ao conhecimento do mérito da causa e importa a absolvição da entidade demandada da instância, nos termos conjugados dos artigos 89.º, n.º 1, alínea h) do CPTA e artigos 278.º, n.º 1, alínea e), 576.º, n.ºs 1 e 2 e 578.º do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA.
Diferentemente, a prescrição do processo disciplinar constitui uma exceção perentória de direito material, que, sendo procedente, acarreta, in casu, a procedência da ação, visto que o seu beneficiário passa a ter a faculdade de recusar o cumprimento da prestação ou de se opor, por qualquer modo, ao exercício do direito prescrito (artigos 493º, nºs 1 e 3 do CPC, e 304º, nº 1, do Cód. Civil). Acresce que a prescrição não é de conhecimento oficioso, devendo, portanto, ser invocada pela parte a que beneficia – v., inter alia, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, no processo n.º 03508/08, de 10/01/2013.
Resulta, pois, com meridiana clareza do que antecede, que deve ser conhecida em primeiro lugar, no despacho saneador, a exceção dilatória de caducidade do direito de ação, que obsta ao prosseguimento do processo, nos termos dos normativos legais acima melhor referidos.
Apenas na eventualidade de inexistirem ou serem improcedentes as exceções dilatórias ou perentórias invocadas pelo Réu, procede o Tribunal à apreciação do mérito da causa, com conhecimento dos fundamentos invocados pelo autor.
Reitera-se, portanto, que tendo sido invocada e sendo procedente, como foi, a exceção dilatória de caducidade do direito de ação, não há lugar ao conhecimento dos fundamentos e vícios assacados pelos Autores ao ato impugnado e processos disciplinares que os precederam, mormente a referida prescrição.
Termos em que não padece a sentença proferida de qualquer invalidade ou erro de julgamento, improcedendo, também, este fundamento da reclamação.”
Na verdade e como flui preclaro da fundamentação supra transcrita, há que distinguir entre pressupostos processuais da acção, dos seus fundamentos substantivos ou de mérito.
A violação das regras próprias do processo de acção administrativa especial conexa com actos administrativos interposta darão origem a eventuais nulidades (excepções) que deverão ser arguidas, naquele processo pelo que, sendo extemporânea tal acção, não se conhecerá do seu mérito.
A intempestividade da acção verificada é da completa responsabilidade dos Autores, ora recorrentes, e só a estes inteiramente imputável. E o atraso próprio no estudo de uma questão (como a da prescrição do processo disciplinar) não é facto juridicamente atendível, do qual alguém devesse do seu atraso ainda tirar proveito, como parecem pretender os recorrentes.
Concluímos, portanto — e em resposta ao thema decidendum -, que se a presente acção não estiver em prazo, a decisão recorrida que, por ter laborado essencialmente neste entendimento, não conheceu do mérito da causa, deve ser confirmada.”
Ou seja:- a alegada prescrição não pode haver-se como “facto” para os pretendidos efeitos em plena louvação da fundamentação do douto acórdão recorrido.
Em face de todo o antecedentemente exposto e em concordância com o determinado na decisão recorrida, deve concluir-se que se a acção foi deduzida a destempo, tal prejudica a apreciação da prescrição.
E será que se verifica mesma a caducidade do direito de acção no caso concreto?
Vejamos o que se diz a respeito na decisão recorrida:
“3.3. Da caducidade do direito de acção
Por último, os Autores argumentam que o estado do processo não permitia a apreciação e decisão da exceção de caducidade do direito de ação, que deveria ter sido relegada para final.
Apreciando e decidindo.
Compulsado o teor da petição inicial, verifica-se que os Autores assacam ao ato impugnado o vício de violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto e o vício de forma, por falta de fundamentação. Mais argumentaram que foram preteridas formalidades legais e que a suspensão/afastamento do exercício da advocacia pelo período de três anos são abusivas, nos termos do artigo 334.º do Código Civil e artigo 374.º, n.º 1, alínea a) do Código de Trabalho.
Em articulado superveniente, arguiram, ainda, os Autores a prescrição do processo disciplinar.
Pese embora em sede de reclamação, os Autores concluam invocando o desvio de poder, caso julgado e ofensa do conteúdo essencial de direitos fundamentais, tais vícios não foram concretizados na petição inicial, tendo sido meramente invocados conclusivamente e sem que tenham sido alegados quaisquer factos que pudessem ser subsumidos nas nulidades plasmadas no artigo 133.º do CPA.
Reiterando o disposto na decisão ora reclamada, julga-se que os Autores não imputaram ao ato impugnado, o acórdão do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, datado de 12/07/2013 e notificado em 29/07/2013 (alíneas B) e C) supra), qualquer vício gerador da sua nulidade.
Ora, tendo presente o que antecede e considerando que o prazo de impugnação de atos meramente anuláveis é de três meses, nos termos previstos no artigo 58.º, n.º 2, alínea b) do CPTA, é forçoso concluir pela caducidade do direito de ação, dado que a presente ação apenas foi intentada em 05/02/2014, muito após o decurso daquele prazo (alínea E) supra).
A circunstância de os Autores terem proposto, em 14/08/2013, um processo cautelar onde pediram a suspensão de eficácia do ato impugnado não teve a virtualidade de suspender ou interromper o prazo de impugnação do ato, sendo certo que, nos termos do artigo 59.º, n.º4 do CPTA, apenas a utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do ato administrativo e que a sua interrupção apenas tem lugar na situação prevista no artigo 60.º, n.º3 do mesmo Código.
É certo que os Autores, na respetiva petição inicial tentam fundamentar a tempestividade da presente ação, para o que apelam aos artigos 46.º, 58.º, 59.º, 60.º, 69.º e 191.º do CPTA e, ainda, artigos 385.º e 389.º do anterior CPC e artigos 373.º e 369.º do atual CPC (artigo 45.º da petição inicial).
Sucede que dos artigos 46.º, 58.º, 59.º, 60.º, 69.º e 191.º do CPTA não resulta que o prazo de impugnação dos atos administrativos se suspende ou interrompe com o pedido de decretamento da providência cautelar de suspensão de eficácia do ato, sendo que as normas sobre processos cautelares constantes do CPTA também nada dispõem nesse sentido.
Quanto às normas do CPC, cumpre referir, em primeiro lugar, que os artigos 373.º e 369.º do CPC, aprovado pela Lei n.º41/2013, de 26 de Junho, não são aplicáveis ao processo cautelar intentado pelos autores, uma vez que este foi instaurado antes da entrada em vigor do referido código (artigo 7.º, n.º2 da Lei n.º41/2013, de 26 de Junho), sendo certo, em qualquer caso, que a norma sobre a inversão do contencioso não é aplicável ao processo administrativo, uma vez que o CPTA contém uma norma sobre a antecipação da decisão da causa principal e a aplicação da lei processual civil ao processo administrativo é supletiva.
Por seu turno, o artigo 385.º do CPC, aprovado pelo Decreto-lei n.º44129, de 28 de Dezembro de 1961, designadamente o seu n.º7 – “Se acção for proposta depois de o réu ter sido citado no procedimento cautelar, a proposição produz efeitos contra ele desde a apresentação da petição inicial”, não tem o alcance que os Autores parecem atribuir-lhe.
De facto, a referida norma não faz retroagir os efeitos da propositura da ação principal à data em que foi requerido o procedimento cautelar, mas apenas, e ao contrário do que é a regra, determina a produção dos efeitos da propositura da ação desde a data da apresentação da petição inicial da ação principal, quando, senão fosse esta norma, tais efeitos apenas se produziriam com a citação do réu (artigo 267.º, n.º2 do CPC, aprovado pelo Decreto-lei n.º44129, de 28 de Dezembro de 1961).
Por fim, a norma do artigo 389.º do CPC, aprovado pelo Decreto-lei n.º44129, de 28 de Dezembro, apenas estabelece o regime da caducidade das providências, nada dispondo que permita concluir que a propositura do processo cautelar interrompe ou suspende o prazo de que o autor dispõe para intentar a ação principal.
Destarte, reitera-se que a propositura do processo cautelar não suspendeu ou interrompeu o prazo de impugnação do ato impugnado, o qual teve início em 01/09/2013, devido ao período das férias judiciais, e terminou em 29/11/2013.
Em suma, considerando que a presente ação deu entrada no dia 05/02/2014, ou seja, quando já tinha terminado o prazo de impugnação previsto no artigo 58.º, n.º2, alínea a) do CPTA, verifica-se a exceção de caducidade do direito de ação, o que obsta ao conhecimento do mérito da causa e determina a absolvição da entidade demandada e dos Contrainteressados da instância (artigo 89.º, n.º1, alínea h) do CPTA e 278.º, n.º1, alínea e) do CPC, aprovado pela Lei n.º41/2013, de 26 de Junho).”
Também nesta vertente se acolhe, de pleno, a bem elaborada fundamentação vertida no acórdão sob censura pois nele se evidencia que os vícios assacados ao acórdão impugnado na petição inicial, tal como bem acentua o recorrido na sua contra-alegação, se reconduzem à inobservância de formalidades legais e falta de fundamentação, ilegalidades que não envolvem a violação de qualquer comando constitucional em termos da ofensa do seu conteúdo essencial ou seu núcleo duro, pelo que importam mera anulabilidade.
Assim, o prazo para interpor a acção teve o seu termo a quo em 01/09/2013 e, atento o prazo fixado no artigo 58.º, n.º2, alínea a) do CPTA, terminava em 29/11/2013 pelo que o mesmo foi largamente ultrapassado pois a presente acção deu entrada no dia 05/02/2014.
O prazo fixado para a dedução da acção, porque aparece como extintivo do respectivo direito (subjectivo) potestativo de pedir judicialmente o reconhecimento de um certo direito, é um prazo de caducidade.
E a caducidade do direito de acção é de conhecimento oficioso, porque estabelecida em matéria (prazos para o exercício do direito de sindicar judicialmente a legalidade do acto administrativo) que se encontra excluída da disponibilidade das partes (art. 333° do CC) e determina o indeferimento liminar da petição. É, pois, um pressuposto processual negativo, em rigor, uma excepção peremptória que, nos termos dos artºs 576º nº 3 e 579º do CPC, consistindo na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor, o não conhecimento de meritis pela existência de obstáculos que o impeçam na disponibilidade do recorrente, importando a absolvição oficiosa do pedido.
Note-se que, mesmo que se considere que se trata de uma excepção dilatória por assim ser qualificada especialmente no CPTA (cfr. artº 89º nºs 1, 2 e 4 al. k), tal implicaria que o tribunal não conhecesse do mérito da causa e se absolvesse o réu da instância, o que, em termos práticos, implicava que a apreciação da questão de fundo ficasse prejudicada pela verificação daquela excepção, pelo que, de todo em todo, não existe a pretendida omissão de pronúncia e improcedem as demais conclusões das alegações.
É que, segundo essa conceituação, dúvidas não se levantam de que se verifica uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso e a qual obsta ao conhecimento do objecto do processo.
Existem as chamadas “condições de fundo da acção”, que, em processo civil e segundo a teorização de Anselmo de Castro, Dir. Processual Civ. Declaratório ed. 1982-9, são as condições necessárias para a procedência da acção, para uma sentença favorável.
E, tal como expende A. Varela, Man. Proc. Civ., 1ª ed.-98 e ss), os pressupostos processuais são os elementos de cuja verificação depende o dever de o juiz proferir decisão sobre o pedido formulado, concedendo ou indeferindo a providência requerida, trata-se das condições mínimas consideradas indispensáveis para, à partida, garantir uma decisão idónea e uma decisão útil da causa. Não se confundem, pois, com as referidas condições da acção, que são os requisitos indispensáveis para que a acção proceda. A distinção entre ambos assenta, portanto, na diferença entre os requisitos necessários para que a acção (cível, penal, administrativa ou fiscal), baseada no direito substantivo possa considerar-se fundada (procedente) e as condições de admissibilidade do processo (ou instância). Os pressupostos, como condições necessárias para o Tribunal se ocupar do mérito da causa -cfr. Castro Mendes, Dir. Proc. Civil, 1980,1º-118), podem ser positivos (são os requisitos cuja existência é essencial para que o juiz se deva pronunciar sobre a procedência ou improcedência da acção) ou negativos (são os factos cuja verificação impede o juiz de entrar na apreciação do mérito do pedido).
Ora, a falta de interposição da acção no prazo fixado, porque aparece como impeditiva do conhecimento do mérito de, «in casu», pedir judicialmente, além do mais, o decretamento da prescrição do processo disciplinar é uma excepção dilatória (se se considerar como peremptória, a consequência é aquela que também deixamos explicitada).
Ora, os recorrentes fazem tábua rasa destas questões fundamentais, peristindo em que, mesmo que ocorra a caucidade do direito de acção, tem o tribunal de conhecer da questão da prescrição por ser prioritária.
É certo que vigora o principio pro actione consagrado no art°7º do CPTA, também denominado como "prevalência da decisão de mérito" em desfavor da decisão de forma, à luz do qual se permitiria a prolação de decisão de mérito mesmo que, por subsistir uma excepção dilatória, coubesse antes declarar a absolvição da instância nos sobreditos termos.
E o princípio pro actione, é aplicável ex vi art° 1° do CPTA até porque inexiste norma especial que inviabilize a sua transposição para a situação concreta, tendo hoje acolhimento expresso nos art°s. 7° e 12° n° 3 do CPTA - cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (Contencioso Administrativo) de 06/01/2005, Recurso nº 12301/03).
Haveria, pois, prioritariamente, que averiguar em que condições o Tribunal se poderia pronunciar sobre esse mérito, se faltar – como falta - um pressuposto processual geral.
O critério continua a ser, dado o abandono da apreciação prévia dos pressupostos processuais estabelecido no antigo art° 278°, nº 3, 2a parte, do CPC, o de averiguar se a decisão sobre o mérito é favorável à parte que seria beneficiada com o preenchimento do pressuposto que (eventualmente) falta.
Ora, o princípio pro actione (também chamado anti-formalista) aponta para a ultrapassagem de escolhos de cariz adjectivo e processual em ordem à resolução do dissídio para cuja tutela o meio processual fora utilizado.
A finalidade de tal princípio é a de conferir uma maior eficácia e estabilidade à tutela jurisdicional dos interesses do ofendido, impondo que, em regra, de entre os vícios que conduzam à declaração de invalidade, o juiz conhecerá prioritariamente daqueles que, em seu prudente critério, determinam uma mais estável e eficaz tutela dos interesses ofendidos.
Aplicando tal princípio ao caso vertente, impõe-se considerar que não se pode conhecer das questões de mérito, preterindo o conhecimento de pressuposto processual quando este contende manifestamente com a procedência daquelas isto porque a aplicação do falado princípio não significa, porém, que a tutela jurisdicional seja de todo alheia à observância de um número mais ou menos apertado de regras instrumentais adequadas a esse fim.
Foi o nº. 5 do art. 268 da Constituição da República Portuguesa, introduzido pela Lei Constitucional n. 1/89 (após a revisão constitucional operada pela Lei Constitucional 1/97 de 20/9, é o nº 4 desse preceito), que veio reforçar o princípio "pro actione" ou da accionabilidade, com a institucionalização da viabilidade de acções jurisdicionais administrativas a título principal, que não apenas para mero suprimento ou colmatação das lacunas ou insuficiências da protecção proporcionada pelo recurso contencioso de anulação.
É claro que, como se salienta no Ac. do STA de 31/03/98, Recurso nº 038367 (Contencioso Administrativo), tal inovação abrangente ínsita no preceito não teve porém o propósito de subverter a "normalidade" legal antes visando alcançar uma adequação ou racionalização dos meios de tutela processual aos fins a atingir, em consonância com o art. 2, nº 2 do CPC por forma a estabelecer um elo de correspondência entre o direito a defender e o meio processual a utilizar para o efeito.
Neste ponto, há a considerar que o "pro actione" postula, além do mais, uma interpretação da situação em análise, por forma a privilegiar, sempre que tal seja processualmente possível, o conhecimento da questão de fundo, assim se assegurando a tutela jurisdicional efectiva, possibilitando o exame do mérito das pretensões deduzidas em juízo.
Para esse efeito, é mister fazer-se uma apreciação casuística das situações para se aquilatar da racionalidade e da funcionalidade da cognição das arguidas situações em que os recorrentes ancoram a pretensão de que seja apreciada e decidida o mérito da questão d prescrição colocada no processo.
Em princípio, e segundo um critério de normalidade, perante a existência de uma decisão que prejudica o interesse dos recorrentes a interposição da acção e/ou recurso que seja julgado improcedente de fundo, com a consequente execução de sentença, assegurará uma eficaz tutela jurisdicional dos direitos ou interesses afectados mas, surgirá como totalmente justificado o não conhecimento do mérito se a instância se mostrar inválida para o efeito.
Em suma: nem mesmo por mor do princípio pro actione, também denominado como “prevalência da decisão de mérito" em desfavor da decisão de forma, se permite a prolação de decisão de mérito no caso do presente incidente pois o Tribunal não deve ocupar-se da hipotisada prescrição pois a decisão sobre o mérito não pode ser conhecida.
Tal não constitui um excesso de exigência quanto ao exacto conteúdo dos direitos que as partes podem exercer pressupondo que estas deverão estar ao corrente, e conhecer com minúcia, todos os meios legais que lhe são facultados.
E tal exigência não é excessiva porquanto se harmoniza com o princípio pro actione ou do direito à justiça plasmado no art. 20º da Constituição o qual, bem vistas as coisas, não é de natureza absolutizada.
E entre a ofensa a um tal direito e o inconveniente de facultar-se às partes, em mais do que um momento, o exercício do direito que lhe compete, não pode duvidar-se que a opção acertada é o do respeito dos normativos que impõem a verificação de dados pressupostos de cognição do mérito das pretensões deduzidas em juízo.
Em tal desiderato não deverão as questões de fundo (prescrição e as demais que ultrapassam o objecto da acção) ser conhecidas, pois há um prius que não permite ao tribunal «ad quem» dirimir definitivamente a questão, por muito respeito e homenagem que devotemos ao princípio «pro actione» ou «pró-recurso», consubstanciado no velho brocardo latino «favorabilia amplianda, odiosa restringenda», de que constitui evidente erupção todos os citados normativos.
E não obsta a essa conclusão – antes a reforça- o facto de na reclamação os Autores e ora Recorrentes assaquem ao acto impugnado os vícios de desvio de poder, violação do caso julgado e ofensa do conteúdo essencial de direitos fundamentais, pois, como bem se afirma na decisão recorrida tais vícios não foram concretizados na petição inicial, tendo sido meramente invocados conclusivamente e sem que tenham sido alegados quaisquer factos que pudessem ser subsumidos nas nulidades plasmadas no artigo 133.º do CPA.
Daí que o Acórdão recorrido não padeça do vício decisório de omissão de pronúncia nos termos do artº 615º, nº1, do NCPC/13.
Igualmente não colhe o argumento de que o facto de a Juíza relatora do acórdão proferido em reclamação para a conferência não ser a mesma Juíza que proferiu a sentença reclamada violar o princípio do juiz natural, pois, como bem denota o recorrido na sua contra-alegação, este caso consubstancia um limite a tal princípio (o da plenitude do juiz), que não é absoluto, isso na senda do decidido no acórdão de 12-12-2012 do Supremo Tribunal Administrativo, processo 01152/11, (disponível em www.dgsi.pt).
Também não procede o recurso no atinente à alegada “fixação” do valor da causa na petição inicial e que, segundo os recorrentes, foi objecto de correcção desconsiderando a norma do artº 142º, nº3, alínea b) de ambos os CPTA /2002 e 2015, ocorrendo, segundo os recorrentes, a nulidade ou inexistência do despacho que fixou o valor da acção, por considerarem que com a prolação da sentença se esgotou o poder jurisdicional.
Mas também neste ponto se sufraga o entendimento consagrado no acórdão no sentido de que, não obstante no artigo 613.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, se estatuir que uma vez proferida a sentença fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional quanto à matéria da causa, se verifica uma das excepções a essa regra estabelecida no artigo 614.º do mesmo Código, que consente que a sentença seja rectificada, oficiosamente ou a requerimento das partes, nos casos aí expressamente previstos mormente quando se trate de omissão ou lapso manifesto.
E não subsiste nenhuma dúvida de que foi ao agasalho do disposto no artigo 614.º do CPC, aplicável por força do artigo 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), que o Tribunal a quo rectificou a sentença, suprindo uma omissão aí verificada, qual seja, a fixação do valor da causa, inverificando-se a violação do disposto no artigo 613.º, n.º 1 do CPC.
Pontifica ainda a respeito o comando ínsito no artº 306.º do CPC, aplicável ex vi do artº 1º do CPTA, de acordo com o qual, se for interposto recurso antes da fixação do valor da causa pelo juiz, deve este fixá-lo no despacho que admita o recurso, pelo que sempre seria admissível a posterior fixação do valor da causa e, assim, na concatenação do disposto nos artigos 31.º, n.º 1 e 34.º, n.º 1 do CPTA, o valor a fixar à acção era o de €30.000,01, não incorrendo o tribunal recorrido em qualquer nulidade ao assim determinar.
É que, objectivam os autos que na sentença proferida nos autos, e em fase de saneamento, nenhuma referência foi feita ao valor da causa, o que traduz uma omissão de decisão sobre o valor da causa e não uma modificação do valor atribuído na petição inicial e que, segundo os recorrentes, não podia ser alterado.
Ora, por força do disposto no artigo 31.º, n.º 1 do CPTA, a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, e é ao juiz que compete fixar o valor da causa, sem prejuízo do dever de indicação que impende sobre as partes, nos termos do disposto no n.º 1, do artigo 306.º, do CPC, aplicável ex vi artigo 31.º, n.º 4, do CPTA.
Ocorreu que o Réu e ora Recorrido, na sua contestação, indicou um valor à acção diverso do indicado pelos Autores e ora Recorrentes, sendo que, como não houve lugar a despacho saneador e foi proferida sentença, era imperioso que nesta fosse fixado o valor da causa por imposição normativa do n.º 2, do artigo 306.º, do CPC.
Por assim ser, face à omissão da fixação do valor da causa na sentença, a mesma pode ser corrigida por simples despacho, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 614.º, do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º, do CPTA pelo que o despacho de 29-06-2015 não padece de qualquer vício e deve ser confirmado na ordem jurídica, como o fez o acórdão sob censura.
O que vale por dizer que improcedem in totum as conclusões recursórias.
*

3.-Decisão:

Assim, atento todo o exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso e confirmar o acórdão recorrido.

Custas pelos recorrentes.

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Lisboa, 21 de Março de 2019
José Gomes Correia
António Vasconcelos
Catarina Jarmela