Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:235/07.5BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:04/24/2024
Relator:ELIANA CRISTINA DE ALMEIDA PINTO
Sumário:I - sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas que definem o objeto da ação, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, o mesmo deve ser eliminado.
II - É com base em factos concretos que pode sustentar-se o juízo e não a partir de expressões conclusivas que representam conceitos/conclusões que não podem ser objeto de prova.
III - Nestes casos, a intervenção deste Tribunal Central não se dá ao nível da (re)apreciação da prova, mas antes na despistagem (identificação/qualificação/expurgação) dos pontos da matéria de facto em causa, das afirmações genéricas, conclusivas ou que comportem matéria de direito, ao abrigo da previsão constante do n.º 4 do artigo 607.º do CPC, que não estão no âmbito do disposto nos artigo 640.º do CPC (impugnação da decisão relativa à matéria de facto feita pela parte/recorrente) ou 662.º do CPC (modificabilidade da decisão de facto).
IV - Para que a promessa ganhe vinculatividade é necessário que se verifique um conjunto de condições de causalidade que poderão levar à responsabilidade da Administração. A saber:
V - A existência de uma atuação administrativa promissória – a promessa;
VI - A existência de uma situação de confiança justificada, correspondendo à credibilidade que o promissário dá à promessa;
VII - A existência de um investimento de confiança, ou seja, que o promissário pratique atos fundados na promessa.
VIII - A tutela da confiança não se consubstancia num princípio absoluto, somente ocorrendo em situações particulares que a possam justificar no caso concreto, exigindo-se a verificação de quatro pressupostos jurídicos para que a confiança seja tutelada:
a. Que haja uma situação que enseje a confiança, em razão da boa-fé subjetiva ou de crença da pessoa que pretende ter a confiança tutelada;
b. Como segundo pressuposto, que essa confiança seja justificável, segundo elementos objetivos que tornem a crença plausível;
c. O terceiro requisito é que deve ter havido, com base nessa confiança ou crença, atividade jurídica que deverá ser objeto de proteção;
d. Como último pressuposto, a imputação da situação de confiança decorrendo da existência de um autor a quem deve uma relação de confiança ser tutelada.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção SOCIAL
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
I – RELATÓRIO

INSTITUTO NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL, I.P (INAC, I.P), devidamente identificada nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 6 de junho de 2008, que, no âmbito da ação administrativa comum, instaurada por J......, julgou a ação procedente, condenando a entidade demandada a ressarcir o autor, segundo juizos de equidade, os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, no valor global de € 5.000,00.
***
Formula a aqui o Recorrente, nas respetivas alegações de recurso, as seguintes conclusões que infra e na íntegra se reproduzem:
“...
- DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADA
(...)
III. Os depoimentos prestados na audiência de discussão e julgamento foram gravados em sistema sonoro e realizada a audiência de discussão e julgamento, o Tribunal "a quo" fundamentou a prova dos factos constante dos quesitos, somente, na análise dos depoimentos das testemunhas ouvidas, poderá verificar-se que face àqueles se impunha uma decisão sobre os pontos da matéria de facto diversa da aqui recorrida;
IV. Com tais fundamentos, considerou o Tribunal "a quo", como provados os seguintes factos constantes da douta sentença recorrida:
"... S) Em 06/03/2006 o Autor foi sujeito a uma entrevista de selecção, conduzida por Pisco dos Santos (Director do Departamento dos Recursos Humanos do INAC), C...... (Director do FALSEC) e F...... (Subdirector do FALSEC), no âmbito da oferta pública assente em A);
T) P...... disse ao Autor que não havia mais candidatos e que faltava obter a autorização para a contratação por parte do Secretário de Estado da Tutela.
U) Quinze dias depois de o Autor ter requerido a informação assente em D), P...... telefonou ao Autor dizendo-lhe que a informação do Secretário de Estado da Tutela ainda não tinha sido concedida.
X) A conduta do Réu gerou no Autor a convicção de que iria exercer as funções a que se candidatou.
Y) Foi a actuação dos agentes do Réu que provocou que o Autor gerasse confiança na contratação..."
V. É manifesto para o Recorrente que houve erro na apreciação das provas, para além de omissão na apreciação de outras provas, quer testemunhal quer documental;
VI. Tendo em conta toda a prova produzida nos autos e gravada em registo fonográfico, o Recorrente considera incorrectamente julgados os factos dados como provados nos pontos S), T), U), X) e Y) da fundamentação de facto, os quais de modo algum se mostram em consonância com a prova produzida, bem como considera ainda, incorrectamente julgada a resposta de não provado dada aos quesitos 5º. e 6°. da base instrutória;
VII. A testemunha, C......, cujo depoimento curiosamente não foi coerente e em manifesto contraditório com o depoimento das testemunhas F...... e P...... (estes sim coincidentes), ambas testemunhas comuns do Autor e do Réu, e as únicas com conhecimento directo dos factos, uma vez que foram os intervenientes nos mesmos, inquirido sobre diversa matéria, nomeadamente, sobre o quesito 1.° da base instrutória, referiu expressamente, primeiro ao mandatário do Autor e depois à mandatária do Réu, que não assistiu à entrevista, tendo saído;
VIII. A testemunha, tendo prestado juramento legal, e encontrando-se o seu depoimento gravado a volta 1720 até ao fim, lado B, da cassete n°. 2, cujo depoimento foi transcrito nas alegações supra, dada a sua essencialidade para a descoberta da verdade, passando apenas a evidenciar as seguintes passagens: Pergunta a mandatária do Recorrente: "...É ponto assente que o Sr.° Capitão não participou nesta entrevista? Respondeu a testemunha: "Não, os dois momentos em que participei foi no início e no final...";
IX. No que diz respeito à própria "entrevista de selecção" é entendimento do Recorrente que, in casu, não existiu qualquer entrevista de selecção mas somente uma mera "conversa", tal como resulta do depoimento prestado pelas testemunhas F...... e P......, ambas testemunhas comuns do Autor e do Réu, e cujos depoimentos encontram-se transcritos nas alegações supra, dada a sua essencialidade para a descoberta da verdade, passando apenas a evidenciar as seguintes passagens: A testemunha F...... referiu que “... que não tive nenhuma intervenção do decorrer dessa entrevista, confesso que para mim foi uma entrevista um pouco rara, sendo licenciado em gestão de Recursos Humanos achei rara aquela entrevista, mas enfim, não fui eu que a convoquei e portanto não me pronunciei sobre isso..." e "...não houve uma convocatória formal nem foi explicado...limitei-me a estar presente...." (cassete n°. 1, lado B, volta 2000 até ao fim) e " ...a entrevista foi, na minha perspectiva rara porque não houve entrevista propriamente dita, na acepção daquilo que se supõe ser uma entrevista, houve sim uma apresentação por parte do Dr D......, mas não houve intercâmbio, não houve perguntas por parte do INAC...não houve discussão sobre o desenrolar da entrevista, aquilo que houve foi o que falei hoje de manhã, foi que, não sei se foi pelo Capitão C......se foi pelo Dr.° P......referência a que iria ser analisado o processo..." (cassete nº. 3, lado A, volta 1060 até ao fim)...”.
Quanto à testemunha Pedro P......, referiu expressamente: "...Peço desculpa mas não foi nenhuma entrevista, aquilo que me foi pedido, na altura, pelo Capitão C........, julgo que foi na quinta ou na sexta feira, pediu- me se eu podia receber o Dr.° D...... e eu anui no sentido de falarmos de segunda-feira de manhã, que foi quando ocorreu, 6 de Março, uma segunda- feira..." (cassete n°. 2, lado A, volta 2050 até ao fim), e que "...o que ocorreu foi que eu recebi o Dr.° D......, o Dr.° D...... explicou o seu currículo vitae, o seu percurso profissional, e da minha parte não houve qualquer tipo de pergunta relativamente a verificar do ponto de vista curricular e os conhecimentos, neste caso, de Direito Aéreo, ou seja, não houve da minha parte qualquer aferir, até porque não estava constituída nenhuma comissão, para avaliar os conhecimentos..." (cassete n°. 2, lado A, volta 2050 até ao fim). Referiu ainda a testemunha que A" ...Direcção FALSEC precisa de juristas, precisava de alguém especializado em Direito Aéreo e aquilo que entendi quando se abriu na Internet era para procurar alguém que tivesse, ir ao mercado verificar se havia pessoas, ou seja, aquilo que eu decorri era, após verificar se no mercado existia pessoas, abrir-se um procedimento de contratação... procedimento de contratação é, passa-se da seguinte forma: As Unidades Orgânicas elaboram uma informação a dizer temos o currículo desta pessoa, consideramos que esta pessoa vai desempenhar o objecto contratual, são estas as funções e a retribuição a pagar é X.....Aqui o que aconteceu foi que a Direcção FALSEC abriu um procedimento para encontrar um jurista especializado em Direito Aéreo, o Capitão Carvalho pediu-me se eu podia ouvir o Dr. D...... até para eu lhe explicar como é que se passava todo o procedimento e aquilo que aconteceu foi o Dr.° D...... esteve a explicar o currículo dele e eu expliquei quais eram os trâmites, como é que as coisas ocorriam...em caso de o INAC pretender contratar os serviços era proposto à Secretaria de Estado a contratação do jurista, ou seja, os contratos de avença no INAC estão dependentes de autorização prévia da tutela e o procedimento que eu expliquei ao Dr.° D...... foi, em caso de ser escolhido, para exercer funções no INAC, estaria dependente de autorização, que o Conselho de Administração submetesse à consideração da tutela, expliquei isto ao Autor, não foi falado valores..." (cassete n°. 2, lado B, volta 000 a 1720);
X. Assim, e face aos depoimentos prestados, a matéria constante no quesito 1°. da base instrutória, deve ser considerada matéria NÃO PROVADA, e consequentemente, alterado o ponto S da douta sentença recorrida;
XI. Também a matéria constante do quesito 2°. da douta base instrutória deve ser considerada matéria NÃO PROVADA, pois tal como resulta do depoimento prestado pelas testemunhas F...... e P......, ambas testemunhas comuns do Autor e do Réu, e cujos depoimentos encontram-se transcritos nas alegações supra, dada a sua essencialidade para a descoberta da verdade, passando apenas a evidenciar as seguintes passagens:
A testemunha Pedro P...... referiu que "...na oferta pública de emprego o e-mail que está lá não é o e-mail dos Recursos Humanos mas o e-mail da FALSEC, ou seja, o Dr.° D...... deve ter enviado o currículo para o e-mail da FALSEC, por isso eu nunca poderia dizer que não havia mais candidatos que tivessem enviado currículo para o INAC...eu não poderia dar essa informação..." (cassete n°. 2, lado B, volta 000 a 1720), e que "...não disse que o Dr.° D...... tinha sido aprovado, que seria admitido e que não havia mais candidatos, a única coisa que eu expliquei ao Dr. D...... foi quais eram os procedimentos que se tomavam, era preciso uma decisão do Conselho de Administração e que era preciso ir à Tutela tomar uma decisão sobre a contratação como avençado...Aquilo que eu disse ao Dr. D...... disse que a contratação de um avençado passa por fazer uma informação que é remetida ao Conselho de Administração e que é submetida a uma autorização prévia da Secretaria de Estado para podermos contratar, expliquei os passos legais que têm de ser adoptados..." (cassete n°. 2, lado B, volta 000 a 1720).
E quando inquirido pela mandatária do Recorrente sobre esta matéria a testemunha respondeu peremptoriamente à pergunta:
"...Disse ao Autor que faltava apenas obter a autorização para a contratação por parte do Secretário de Estado da Tutela?", respondeu peremptoriamente que: É" falso porque isso depende, como eu já expliquei, de uma informação a propor..." (cassete n°. 3, lado B, rotação 332).
Por outro lado, a testemunha F...... referiu que: "... recordo-me que o Dr.° D...... perguntou qual era o procedimento, aquilo que me lembro foi que foi dito que de facto tinha sido o único candidato a aparecer na entrevista, que agora iria ser analisado o processo e iriam ser tomados os trâmites normais no âmbito da contratação, nestes termos, não me recordo nem tenho memória que lhe tenha sido dito explicitamente que sendo o único candidato portanto a pessoa que vai ocupar o cargo..." (cassete n°. ,1 lado B, volta 2000 até ao fim).
XII. Pelo que, a matéria constante do quesito 2°. deve ser considerada matéria NÃO PROVADA e, consequentemente, alterado o ponto T) da douta sentença recorrida, no sentido de que P...... não disse ao Autor que não havia mais candidatos e que faltava obter a autorização para a contratação por parte do Sr.° Secretário de Estado da Tutela;
XIII. Igual sorte deverá ter a resposta à matéria constante do quesito 3.º da douta base instrutória, devendo ser considerada como NÃO PROVADO ou PROVADO RESTRITIVAMENTE, pois, a testemunha P......, quando inquirida pelo mandatário do Autor: afirmou peremptoriamente que: “... É verdade que eu liguei ao Dr.° D......, porque o Dr.° D...... ligou-me porque eu tenho o meu telefone regista as chamadas, e eu liguei ao Dr. D......, confirmo que liguei ao Dr.° D...... mas agora é manifestamente falso que eu tenha dito que a informação estava na Secretaria de Estado quando não havia ainda uma informação da FALSEC sobre isso, peço desculpa, aquilo que eu voltei a reiterar foi as diligências que eram preciso ser adoptadas..." (cassete n°. 2, lado B, rotação 000 a 1720);
Acrescentou ainda a testemunha que: "..Nunca foi dito ao Dr.° D......, no meu telefonema, que a informação estava na Secretaria de Estado a aguardar o parecer, o parecer não, o despacho do Sr.° Secretário de Estado... Aquilo que eu sei é que o Dr. D...... ligou para o meu telefone, alguém lhe deu o meu número directo e eu retribui a chamada e disse-lhe que não tinha sido tomada nenhuma diligência, só isto, não lhe disse mais nada, ou seja, reiterei aquilo que já lhe tinha sido dito..." (cassete n°. 2, lado B, rotação 000 a 1720);
XIV. Esclareceu ainda a testemunha P...... na sequência da pergunta: "...Quinze dias depois de o Autor ter requerido a informação assente em D), P...... telefonou ao Autor dizendo-lhe que a informação do Secretário de Estado da Tutela ainda não tinha sido concedida?...", respondeu peremptoriamente que: "...De facto eu liguei, porque de facto como já transmiti, tinha uma chamada não atendida de um número, liguei e era o Dr.° D...... e aquilo que eu lhe expliquei é que não tinha havido qualquer alteração desde o dia 6 de Março..." (cassete n°. 3, lado B, volta 610 a 2115);
XV. Assim, a matéria constante do quesito 3°. deve ser considerada matéria NÃO PROVADA ou PROVADA RESTRITIVAMENTE, apenas que "...Quinze dias depois de o Autor ter requerido a informação assente em D), P...... telefonou ao Autor..." e, consequentemente, alterado o ponto U) da douta sentença recorrida, no sentido de que o P...... não disse ao Autor que a informação do Secretário de Estado da Tutela ainda não tinha sido concedida;
XVI. Igual sorte deverá ter a resposta à matéria constante do quesito 8°. da douta base instrutória, devendo ser considerada como NÃO PROVADA, pois tal como resulta do depoimento prestado pela testemunha P......, cujo depoimento encontra-se transcrito nas alegações supra, dada a sua essencialidade para a descoberta da verdade, passando apenas a evidenciar as seguintes passagens:
Pergunta: “... A conduta do Réu gerou no Autor a convicção de que iria exercer as funções a que se candidatou?
A testemunha respondeu:
"...Não, porque ninguém lhe disse que iria ser contratado, nunca lhe foi transmitido por mim ou por qualquer pessoa que o Dr.° D...... iria ser contratado..." (cassete n°. 3, lado B, rotação 610 a 2115) e "...Nunca lhe dei quaisquer expectativas, apenas lhe expliquei como é que as coisas se processam..." (cassete n°. 2, lado B, rotação 000 a 1720);
XVII. Pelo que, a matéria constante do quesito 8º. deve ser considerada matéria NÃO PROVADA, e, consequentemente, alterado o ponto X) da douta sentença recorrida, no sentido de que a conduta do réu não gerou no Autor a convicção de que iria exercer as funções a que se candidatou;
XVIII. O mesmo se defende quanto à resposta da matéria constante do quesito 9.º da douta base instrutória, devendo ser considerada como NÃO PROVADO, pois, a testemunha P......, quando inquirida pela mandatária do Réu à pergunta: "Gerou-se alguma confiança nesta contratação?"
A testemunha disse: "...Não, eu sempre pus a par o Dr. D...... que isto obedecia a um conjunto de diligências e que não lhe transmiti na reunião que tinha sido contratado...no final da entrevista aquilo que foi dito foi apenas, da minha parte, que a contratação de avençados, para exercer funções dependia de uma apreciação da parte do INAC e remeter para a tutela, foi meramente aquilo que eu disse....não Ihe dissemos mais nada..." (cassete n°. 3, lado B, rotação 610 a 2115)
Pergunta da Meritíssima Juiz:
“... O Sr.° Dr.° está a falar e muito bem sobre aquilo que disse, mas outras das duas pessoas presentes, que estiveram presentes...algum dos outros dois presentes transmitiram ao Autor a confiança, a expectativa de Contratação? Resposta da testemunha: "... Nenhuma das pessoas que esteve presente transmitiu ao Dr.° D...... que iria ser contratado, dizer com toda a certeza - Dr.° você vai ser contratado, nós vamos remeter a lista não..." (cassete n°. 3, lado B, rotação 610 a 2115);
XIX. Pelo que, a matéria constante do quesito 9°. deve ser considerada matéria NÃO PROVADA, e, consequentemente, alterado o ponto Y) da douta sentença recorrida, no sentido de que a actuação dos agentes do Réu não provocou que o Autor gerasse confiança na contratação;
XX. Considera ainda o Recorrente, incorrectamente julgada a resposta de não provado dada aos quesitos 5.º e 6. ° da base instrutória, os quais quesitavam, respectivamente:
“... 5. ° O INAC fez uma consulta à Bolsa de Emprego Público para a contratação de M......? 6.° As contratações efectuadas pelo INAC foram precedidas das respectivas autorizações pelo Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações?...”;
XXI. A testemunha P......, Director do Departamento de Recursos Humanos do Réu, portanto pessoa com conhecimento pessoal e directo dos factos, e cujo depoimento encontra-se transcrito nas alegações supra, dada a sua essencialidade para a descoberta da verdade, passa-se apenas a evidenciar as seguintes passagens (volta 610 a 2115, lado B, da cassete n°. 3):
Pergunta a mandatária do Recorrente:
“... O INAC fez uma consulta à Bolsa de Emprego Público para a contratação de M......?...”
Respondeu a testemunha:
"(...) Fez, fez uma consulta na BEP, com a entrada do novo Director da FALSEC e dada a falta de Recursos Humanos que foi transmitida pelo mesmo, aquilo que nós fizemos em termos de racionalização, até porque há aquela Resolução do Conselho de Ministros no sentido de refazer o recrutamento dentro da Administração Pública, aquilo que nós fizemos foi fazer uma busca na BEP de pessoas que estariam disponíveis para trabalhar no INAC e aquilo que nós fizemos foi retirar essas fichas da BEP e dar ao Dr.° T......., que é o novo Director da área de Facilitação e Segurança e o mesmo é que seleccionou as pessoas que queria ouvir e depois indicou aos Recursos Humanos que era a pessoal tal e adoptem os procedimentos para a cedência ou o recrutamento...";
XXII. Face ao depoimento prestado pelo P......, todo ele caracterizado pela simplicidade e autenticidade como relatou os factos, outra alternativa não restava ao Tribunal "a quo" senão dar como PROVADO o quesito 5.º da douta base instrutória, pois, das declarações prestadas foi a própria testemunha que efectuou a consulta à Bolsa de Emprego Público;
XXIII. Já no que diz respeito ao quesito 6. ° igual conclusão terá se retirar, na medida em que a mesma testemunha P......, repita-se, pessoa com conhecimento pessoal e direto dos factos, e cujo depoimento encontra-se transcrito nas alegações supra, dada a sua essencialidade para a descoberta da verdade, passa-se apenas a evidenciar as seguintes passagens (volta 610 a 2115, lado B, da cassete n°. 3):
Pergunta a mandatária do Recorrente:
"...As contratações efectuadas pelo INAC foram precedidas das respectivas autorizações pelo Secretário de Estado Adjunto, das Obras Públicas e das Comunicações?...”
Respondeu a testemunha:
"...Todas as avenças do INAC estão dependentes da autorização prévia do Sr.° Secretário de Estado, ou seja, não há, neste momento, nunca houve, qualquer contrato de avença à revelia do que está na lei..."
Pergunta a mandatária do Recorrente:
"... E este recrutamento do Dr. M...... foi uma cedência ocasional era necessária a autorização do Sr. Secretário de Estado?
Respondeu a testemunha:
"...Não, as cedências ocasionais, como as especiais, a cedência especial, só para precisar, é uma situação quando o funcionário público, não é do contrato individual de Trabalho, estão na livre autonomia dos Institutos, ou seja, não carecem de autorização, é um acordo tipificado, ou seja, entre o funcionário, o cedente e o cessionário...;
XXIV. Deste modo, face ao depoimento prestado por P......, todo ele caracterizado pela simplicidade e autenticidade como relatou os factos, outra alternativa não restava ao Tribunal "a quo" senão dar como PROVADO o quesito 6. ° da douta base instrutória, pois, a testemunha como Director do Departamento de Recursos Humanos do INAC é quem trata das autorizações aqui em causa;
XXV. Face à matéria de facto provada e não provada, conclui-se, obrigatoriamente, que o Recorrente não incorreu em responsabilidade civil extracontratual em relação aos danos patrimoniais e não patrimoniais alegados, decorrentes do procedimento de oferta pública de aquisição de serviços;
XXVI. Deste modo, tendo em conta os FACTOS PROVADOS da douta sentença de fls., bem como aqueles que, erradamente o Tribunal a quo considerou como provados, mas que os Recorrentes, face à reapreciação da prova gravada, cuja sindicância apelam a V. exas., entendem dever ser considerados NÃO PROVADOS, encontra-se demonstrado que não poderá o Recorrente ser condenado por responsabilidade civil extracontratual, na medida em que não estão preenchidos os seus pressupostos;
XXVII. É hoje pacificamente aceite, quer pela doutrina quer pela jurisprudência, designadamente a resultante do Supremo Tribunal Administrativo, que a responsabilidade civil extracontratual do Estado e pessoas colectivas públicas por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos ou agentes assenta nos pressupostos da idêntica responsabilidade prevista na lei civil, que são o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o prejuízo ou dano, e o nexo de causalidade entre este e o facto;
XXVIII. Nos termos do artigo 6. ° do Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967, consideram-se ilícitos os "...actos jurídicos que violem as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis e os actos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração...";
XXIX. Ora, no caso objecto dos presentes autos não se verificam quaisquer dos pressupostos previstos no preceito legal supra enunciado, pelo que não é possível assacar qualquer responsabilidade civil extracontratual do Estado e pessoas colectivas públicas por factos ilícitos, na situação em apreço;
XXX. O Recorrente não praticou um acto ilícito, a única operação material realizada foi a publicação do supramencionado anúncio e a realização de uma reunião, mas tal actuação não confere ao A. qualquer direito, interesse ou expectativa dignos de protecção legal, uma vez que, tal como resulta demonstrado, face aos depoimentos prestados, na medida em que nunca lhe criada qualquer expectativa legítima e a convicção de que iria ser contratado;
XXXI. Como muito bem refere a douta sentença sobre a responsabilidade dos titulares dos órgãos e agentes administrativos do Estado e demais pessoas colectivas públicas, dispõe o n.º 1 do artigo 3. ° do Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967, que estes respondem civilmente perante terceiros pela prática de actos ilícitos que ofendam os direitos destes ou as disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, se tiverem excedido os limites das suas funções ou se, no desempenho destas e por sua causa, tiverem procedido dolosamente;
XXXII. Porém, mal andou o Tribunal a" quo" quando refere que o Recorrente criou a convicção na contratação, através dos seus órgãos e dos respectivos funcionários ou agentes, no exercício de funções públicas e por causa desse exercício;
XXXIII. Bem como quando deu como provado que se realizou uma entrevista de selecção, que essa entrevista foi conduzida por P......, C......e F......, aí sendo dito ao Autor que faltava obter a autorização por parte do Secretário de Estado da tutela para a citada contratação;
XXXIV. A este respeito veja-se as declarações prestadas pela testemunha P...... que inequivocamente declarou que "...a única coisa que eu expliquei ao Dr.° D...... foi quais eram os procedimentos que se tomavam...disse que a contratação de um avençado passa por fazer uma informação que é remetida ao Conselho de Administração e que é submetida a uma autorização prévia da Secretaria de Estado para podermos contratar, expliquei os passos legais que têm de ser adoptados...";
XXXV. E quando inquirido pela mandatária do Recorrente sobre esta matéria a testemunha P...... à pergunta se "...Disse ao Autor que faltava apenas obter a autorização para a contratação por parte do Secretário de Estado da Tutela?...", respondeu peremptoriamente que: "...É falso...";
XXXVI. Por outro lado, considerou o Tribunal que o INAC violou o princípio da boa fé que contra ele é invocado com base na sua conduta que gerou confiança e a forte convicção no Autor na contratação, e que a única formalidade que faltava consistia a autorização ministerial, o que na realidade concreta do INAC, não é compatível com a demora ocorrida;
XXXVII. Considerando ainda que a conduta do Réu gerou no Autor a convicção de que iria exercer as funções a que se candidatou, tendo sido a actuação do Réu que provocou que o Autor gerasse confiança na contratação;
XXXVIII. E que deste modo "...com a sua conduta, a administração criou a legitima expectativa ao Autor na citada contratação ou pelo menos, que não viesse o procedimento a ter tal desfecho, sem que o Autor pudesse prever que a sua candidatura não tinha admitida ou rejeitada ou que não viesse a ser objecto de proposta para autorização ministerial...”, entendendo o Tribunal "a quo" que a administração incorreu na violação do principio da boa-fé nas vertentes positiva e negativa, concretamente na violação do corolário da confiança e da lealdade para com o Autor;
XXXIX. Concluindo-se pela ilicitude, por terem sido violadas, pelo Réu as normas legais e princípios gerais, de natureza legal e de prudência comum aplicáveis à situação jurídica em causa;
XL. Verifica-se assim que o Tribunal "a quo" fundamenta a violação do princípio da boa fé, bem como a ilicitude da conduta do Recorrente nos factos que considerou assentes, que tal como já se encontra amplamente demonstrado, existiu um erro manifesto na apreciação das provas dos autos, nomeadamente, as testemunhais, fazendo tábua rasa das declarações prestadas pelas testemunhas P...... e F......, tudo aliás conforme já se encontra amplamente demonstrado supra e que consta das respectivas gravações áudio;
XLI. Mas, mesmo que assim não fosse entendido, o que por mera hipótese de raciocínio se concebe, e o Recorrente tivesse praticado um acto ilícito, a verdade é que não existiu qualquer culpa na actuação do R.;
XLII. De harmonia com o disposto no n.º 1 do Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967, a "culpa dos titulares do órgão ou dos agentes é apreciada nos termos do artigo 487.0 do Código Civil", em que se estabelece que ela é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso;
XLIII. Segundo defende Antunes Varela, in "Das obrigações em Geral, 6.a edição, página 531, "...Agir com culpa significa actuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é reprovável quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo..."
XLIV. Considerou o Tribunal "a quo" que existe culpa do serviço, por um funcionamento anormal do serviço, quando não procedeu com diligência e zelo exigíveis e a que se achava obrigado, na vertente de culpa de serviço, sob a forma de culpa leve ou negligente, pois era exigível que tivesse actuado doutra maneira em face das circunstâncias do caso;
XLV. Resultando também da douta sentença, que face aos factos provados, deve entender-se decorrer um juízo de censura ético-jurídico se confrontarmos o comportamento lícito apurado com aquele que seria exigível atendendo a um padrão de competência com que se deve conformar a Administração pública, considerando que o recorrente apenas afastaria a ilicitude da sua actuação se tivesse provado qualquer facto de que resultasse uma comunicação clara, fundamentada e atempada ao Autor, quanto ao não pretender prosseguir com o procedimento da oferta pública da aquisição da prestação de serviços;
XLVI. Concluindo que o comportamento constitui facto ilícito gerador dos danos sofridos pelo Autor, é também ele culposo, sendo censurável pelo plano ético, porquanto uma administração zelosa e cumpridora teria actuado em conformidade com as suas normas aplicáveis;
XLVII. Não pode o ora recorrente concordar de forma alguma com a fundamentação jurídica explanada, na medida em que a sua actuação foi sempre pautada pelo cumprimento das normas legais;
XLVIII. De facto, e como resulta da prova produzida, não foi dito ao autor que o mesmo estava aprovado, que seria admitido e que faltava apenas obter a autorização para a contratação por parte do Secretário de Estado, muito pelo contrário, a testemunha P...... e C...... referiram em Tribunal que antes de ser obtida a autorização para a contratação teria de existir uma informação prévia a solicitar a autorização ao Conselho de Administração;
XLIX. Portanto não foram criadas, por parte do Dr. P...... quaisquer expectativas ao Autor, não podendo o mesmo ter gerado a convicção de que iria ser contratado somente pelo facto de a testemunha C...... lhe ter dito que não havia mais candidatos, até porque foi dito ao Autor que o processo iria ser analisado e não que faltava a autorização da Secretaria de Estado;
L. Deste modo, a actuação do recorrente sempre se pautou pelo cumprimento, até porque quando o Autor telefonou à testemunha P......, a mesma informou "...o Dr. D...... que não tinha sido tomada nenhuma diligência, só isto, não lhe disse mais nada, ou seja, reiterei aquilo que já lhe tinha sido dito...", portanto nunca foi transmitido ao autor qualquer confiança ou expectativa na sua contratação e que faltava a autorização do Secretário de Estado, portanto existiu uma comunicação clara ao Autor de que ainda não teria existido quaisquer desenvolvimentos por parte dos serviços do Recorrente para se avançar com a sua contratação, até porque como foi mencionado pela testemunha P......, faltaria sempre uma informação elaborada pela Direcção FALSEC a propor o nome do Autor, que como a testemunha C...... referiu em audiência de julgamento não foi efectuada;
LI. Por outro lado, existiu, por parte do Recorrente uma comunicação fundamentada e atempada ao Autor, quanto ao não pretender prosseguir com o procedimento da oferta pública da aquisição da prestação de serviços, na medida em que entre 06/03/2006 (data da reunião) e 19/06/2006 (data do Ofício enviado pelo recorrente) apenas passaram 3 meses, tempo normal para se proceder aos mecanismos normais de elaboração de informação a propor um candidato, a aceitação desse candidato pelo Conselho Directivo, através de uma deliberação para o efeito;
LII. Acresce que, como se viu também não existiu qualquer prejuízo ou dano na esfera jurídica do Autor, uma vez que o mesmo não realizou quaisquer despesas, não ficou impossibilitado de concorrer a outras entidades, não suportou qualquer risco, e ficou com a disponibilidade para trabalhar durante o prazo de duração do contrato de prestação de serviços;
LIII. Por outro lado, o Autor não apresentou qualquer prova de eventuais danos que alegadamente tenha sofrido, pelo que não se vislumbra o direito à indemnização peticionada nos termos do artigo 2. ° do Decreto-Lei n.º 48051, de 21-11-1967;
LIV. Quanto ao nexo de causalidade entende o Tribunal "a quo" que se encontra verificado o nexo de causalidade, na medida em que entendeu que a personalidade moral do autor foi afectada e encontra-se dentro da noção de "gravidade" inserta no n.º 1do artigo 496. ° do C.C;
LV. A conduta do Recorrente nunca mereceu qualquer reprovação ou censura do direito, pelo contrário, a actuação do Recorrente sempre se pautou pelo respeito ao princípio da legalidade e da prossecução do interesse público, agindo sempre sob os ditames da boa-fé;
LVI. Por todo o supra exposto, e face aos depoimentos supra referidos, encontra-se deste modo, salvo douta opinião em contrário, afastada a responsabilidade civil extracontratual do recorrente, não só por não existir nenhuma conduta ilícita, como tão pouco culpa;
LVII. Face à matéria dada como PROVADA, bem como àquela que o Tribunal "a quo" considerou erradamente como provada e que ora se requer a sua reapreciação, considerando-a como NÃO PROVADA, está afastada a responsabilidade civil do INAC;
LVIII. O que, em conclusão, entende o Recorrente que face à matéria dada como PROVADA e àquela cuja reapreciação se requer afim de os factos dados como provados se considerarem como NÃO PROVADOS, e o erradamente considerado como não Provado se considerar como PROVADO, outra decisão se impunha ao Tribunal "a quo";
LIX. Face a todo o supra exposto, conclui-se que tal decisão não deveria ter sido proferida, por errada apreciação da prova testemunhal;
LX. O que, em conclusão, entende o Recorrente que face à matéria dada como PROVADA e àquela cuja reapreciação se requer afim de os factos dados como provados se considerarem como NÃO PROVADOS, e o erradamente considerado como não Provado se considerar como PROVADO, outra decisão se impunha ao Tribunal "a quo";
LXI. Face a todo o supra exposto, conclui-se que tal decisão não deveria ter sido proferida, por errada apreciação da prova testemunhal.
...”
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J......, notificado, não contra-alegou.

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Notificado o Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não emitiu parecer.
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Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.
Segundo as conclusões do recurso, as questões suscitadas resumem-se, em síntese, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro na apreciação da prova, em resultado de um incorreto julgamento dos “Factos Provados S), T), U), X) e Y)”, que devem ser considerados “Não Provados”, bem como saber se ocorreu erro nos pressupostos de direito, pela não verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por ato ilícito, não habilitando o recorrente a indemnizar o recorrido pelos danos sofridos, pedindo-se a absolvição do recorrente, com a consequente revogação da sentença do Tribunal a quo.
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III – FUNDAMENTOS

III.1. DE FACTO
Na decisão judicial recorrida foi dada por assente, por provada, a seguinte factualidade:

A) Em 01/03/2006 o Réu anunciou no seu sítio oficial na Internet uma oferta pública de aquisição de serviços, pelo prazo de um ano, para o desempenho “de tarefas de assessoria e apoio ao Director da Direcção FALSEC (Facilitação e Segurança da Aviação Civil), na área de regulamentação de facilitação e segurança da aviação civil, designadamente no desenvolvimento de normas, procedimentos, programas e manuais de facilitação e segurança”, situando-se o valor mensal da prestação de serviços entre € 1.500 e € 2.250, acrescido de IVA x 12 prestações anuais, sendo o critério de selecção, a avaliação curricular e entrevista, de acordo com os requisitos e condições preferenciais previstos – Acordo e cfr. doc. de fls. 21-22 dos autos, que ora se considera integralmente reproduzido;

B) O Autor candidatou-se à Oferta pública assente em A) – Acordo;

C) O Autor não mais foi chamado – Acordo;

D) Em 06/05/2006 o Autor requereu ao Presidente do INAC informação acerca do andamento do processo – doc. de fls. 23 e 24 dos autos;

E) Em 06/06/2006 o Autor escreveu ao Secretário de Estado Adjunto, das Obras e das Comunicações, pedindo a sua intervenção – doc. de fls. 25 dos autos;

F) Em 19/06/2006 o Presidente do INAC endereçou ao ora Autor o ofício sob a ref. 285/DRH/PCA/06, do mesmo constando, em súmula: “(...) com a entrada em vigor da Resolução do Conselho de Ministros, no 39/2006, de 21 de Abril, o Governo, no âmbito da reorganização estrutural da Administração, deu início à denominada “fase de execução” do Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado na qual este Instituto se encontra abrangido. (...) no âmbito da reforma do Estado, o INAC irá ser objeto de uma reestruturação orgânica, pelo que o Conselho de Administração procedeu naturalmente a uma reavaliação dos pedidos de contratação de prestadores de serviço para o INAC. Imposta ainda referir que, no caso deste contrato de prestação de serviços, haveria sempre de equacionar o impacto do novo regime legal instituído pelo Decreto-Lei n.º 179/2005, de 2 de Novembro, que altera os artigos 78.º e 79.º do Estatuto da Aposentação (EA) (...) Com efeito, tendo em consideração quer as orientações expressas na resolução do Conselho de Ministros no 39/2006, de 21 de Abril, como as futuras alterações orgânicas de que este Instituto será́ objeto, o INAC entende que, no presente momento, não se encontram reunidas as condições necessárias para a celebração do contrato de prestação de serviços (...) no presente momento, não se afigura oportuno a contratação dos serviços na área do direito aéreo...” – cfr. fls. 26-28 dos autos;

G) Em 30/06/2006 o Autor solicitou ao Presidente do INAC que reveja e altere a sua anterior decisão, convocando o Autor para celebrar o contrato, podendo ler-se no citado documento o seguinte: “(...) 1 – O Concurso a que me apresentei, iniciou-se em 01/Março/06 e terminou no dia 06/Março/06, seguinte, com a Entrevista que me foi feita (...) 2. Logo, tendo terminado o Concurso em 06/Março/06, salvo melhor opinião, não se aplica, no caso concreto, a Resolução do Conselho de Ministros no 39/2006, de 21 de Abril, posterior ao Concurso (...) 3. Também, salvo melhor opinião, não se aplica o DL 179/2005, de 02 de Novembro, que altera os art.º 78.º e 79.º do DL 498/72, de 09 de Dezembro, cujos destinatários são os Subscritores da Caixa Geral de Aposentações e respetivos aposentados, que não é claramente o meu caso, pois sou Reformado da Segurança Social. (...)” – doc. de fls. 30-31 dos autos;

H) Em 17/07/2006 o Réu, INAC celebrou o “Acordo Relativo ao Exercício de Cargos em Regime de Comissão de Serviço” com o Oficial da Polícia de Segurança Pública, o Subintendente L......., para o cargo de Director de Facilitação e Segurança do INAC, em regime de comissão de serviço, com efeitos a partir de 17/07/2006, nos termos do docs. de fls. 106-108 e fls. 111-112 dos autos, que se consideram integralmente reproduzido;

I) O INAC, em 01/08/2006, celebrou “Contrato de Prestação de Serviços” com o técnico de nacionalidade luso-brasileira, R......., para prestação de funções técnicas, discriminadas no contrato, não jurídicas, pelo período de seis meses com início em 01708/2006 – Acordo e doc. de fls. 115-119 dos autos;

J) Em 11/08/2006 o Autor interpôs recurso tutelar da decisão datada de 19/06/2006 para o Secretário de Estado Adjunto, das Obras e das Comunicações, nos termos do doc. de fls. 42-45 dos autos, para que se remete;

K) Em 18/09/2006 o Autor solicitou a passagem de certidão do despacho final que recaiu sobre a reclamação, ora assente em G) – doc. de fls. 33-34 dos autos;

L) E intimou judicialmente o Réu à passagem da certidão requerida – cfr. doc. de fls. 36 dos autos;

M) Em sequência, 24/11/2006 o Presidente do INAC emitiu a certidão negativa, por sobre a exposição apresentada, não ter recaído qualquer decisão – docs. de fls. 37 e 39-40 dos autos;

N) Nos termos do ofício datado de 18/10/2006 foi comunicado ao Autor que o Secretário de Estado Adjunto, das Obras e das Comunicações indeferiu liminarmente o recurso deduzido, por não ter competência para o apreciar – doc. de fls. 47 dos autos;

O) Em 18/01/2007 o INAC celebrou um “Acordo de Cedência Ocasional de Trabalhador”, com P.J......., licenciado em Direito, pertencente aos quadros (Contrato Individual de Trabalho) do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, para exercer funções no INAC, no âmbito da Direcção de Facilitação e Segurança, com as funções correspondentes à categoria de Técnico Superior, Nível 7B, Carreira Técnico Superior, pelo período de um ano, a contar da data da celebração – doc. de fls. 96-103 dos autos, que ora se considera integralmente reproduzido;

P) O contrato assente em I) já não se encontra em vigor – cfr. docs. de fls. 115- 119 dos autos;

Q) O Autor já trabalhou para o Réu, INAC, nas mesmas condições a que se refere o anúncio assente em A), como prestador de serviços – Acordo;
R) O Autor veio a juízo intentar a presente acção administrativa em 24/02/2007 – cfr. fls. dos autos;
S) Em 06/03/2006 o Autor foi sujeito a uma entrevista de selecção, conduzida por P...... (Diretor do Departamento dos Recursos Humanos do INAC), C......(Diretor do FALSEC) e F...... (Subdiretor do FALSEC), no âmbito da oferta pública assente em A) – prova testemunhal;
T) P...... disse ao Autor que não havia mais candidatos e que faltava apenas obter a autorização para a contratação por parte do Secretário de Estado da tutela – prova testemunhal;
U) Quinze dias depois de o Autor ter requerido a informação assente em D), P...... telefonou ao Autor dizendo-lhe que a informação do Secretário de Estado da tutela ainda não tinha sido concedida – prova testemunhal;
V) O INAC veio a admitir para exercer algumas das funções que o Autor iria desempenhar, na direcção do FALSEC, M...... – prova testemunhal;
W) O Autor por não ter sido contratado sofreu ansiedade, vómitos, angústia, insónia, depressão e sentimento de injustiça – prova testemunhal;
X) A conduta do Réu gerou no Autor a convicção de que iria exercer as funções a que se candidatou – prova testemunhal;
Y) Foi a actuação dos agentes do Réu que provocou que o Autor gerasse confiança na contratação – prova testemunhal;
Z) Ao aperceber-se que o Réu não iria concluir o procedimento que despoletou, iniciou-se a afectação do bem-estar do Autor – prova testemunhal;
AA) O que se agravou à medida em que o Réu ia afastando essa possibilidade – prova testemunhal.

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Vejamos.
(Da Reapreciação da Matéria de Facto)
Alega, em síntese, o recorrente que a decisão judicial recorrida fez um incorreto julgamento dos factos dados como provados nos pontos S), T), U), X) e Y).
Recorda-se que a alteração da matéria de facto só deve ser efetuada pelo Tribunal Superior quando o mesmo, depois de proceder à audição da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, não só apontam em direção diversa, como impõem decisão diversa, e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1ª Instância.
Sobre o assunto, alegou que foram dados como provados os seguintes factos:
S) Em 06/03/2006 o Autor foi sujeito a uma entrevista de seleção, conduzida por P...... (Diretor do Departamento dos Recursos Humanos do INAC), C......(Diretor do FALSEC) e F...... (Subdiretor do FALSEC), no âmbito da oferta pública assente em A) – prova testemunhal;
T) P...... disse ao Autor que não havia mais candidatos e que faltava apenas obter a autorização para a contratação por parte do Secretário de Estado da tutela – prova testemunhal;
U) Quinze dias depois de o Autor ter requerido a informação assente em D), P...... telefonou ao Autor dizendo-lhe que a informação do Secretário de Estado da tutela ainda não tinha sido concedida – prova testemunhal;
X) A conduta do Réu gerou no Autor a convicção de que iria exercer as funções a que se candidatou – prova testemunhal;
Y) Foi a atuação dos agentes do Réu que provocou que o Autor gerasse confiança na contratação – prova testemunhal.
Quanto ao “Facto Provado S”, face aos depoimentos de F...... e de P........, tais factos não poderiam ter sido dados como provados, por terem, F........ e P........, respetivamente subdiretor do FALSEC e Diretor do Departamento de Recursos Humanos do INAC, declarado não terem assistido a qualquer entrevista. F........ e P........ declararam, ainda, que não houve qualquer convocatória formal para uma entrevista, esclarecendo que o que houve foi uma apresentação por parte do Dr. D......, mas sem qualquer pergunta curricular por parte do INAC. P........ chega a afirmar “... não foi nenhuma entrevista, aquilo que me foi pedido pelo Capitão C......[foi se podia] receber o Dr. D.........”. Continuou referindo “... recebi o Dr. D...... que explicou o seu curriculum vitae, o seu percurso profissional, e da minha parte não houve qualquer tipo de pergunta relativamente a verificar do ponto de vista curricular os conhecimentos de Direito Aéreo...”.
Na resposta à Base Instrutória, o Tribunal a quo explicitou que ouviu o Capitão C........ – Diretor do FALSEC, que depôs de forma clara, objetiva e convincente. Apresentou conhecimento direto da matéria questionada e autenticidade na forma como depôs, razão pela qual o Tribunal valora as declarações por si prestadas e que foi importante para a juíza de 1.ª instância dar este facto como provado, o mesmo sucedendo com a inquirição de G........ – que depôs de forma clara, objetiva, convincente e de modo imparcial e isento à matéria quesitada – e F...... – Técnico a exercer funções no Réu.
Reapreciada a prova gravada, em especial a inquirição da testemunha C......, Capitão, ficou claro que esta testemunha não assistiu à alegada entrevista, apenas afirmou ter estado no início e no fim.
Sobre o assunto, as testemunhas F........ e P........, que afirmaram, por um lado, não ter havido qualquer convocatória formal para a realização de uma entrevista profissional, e, por outro lado, afirmou a testemunha P........ que apenas houve a apresentação do curriculum vitae pelo próprio Dr. D...... e que apenas recebeu o Dr. D...... a pedido do senhor Capitão C......e que não lhe dirigiu qualquer questão, limitando-se a ouvi-lo.
Pois bem, é inquestionável que, tecnicamente, a reunião que ocorreu a 6 de março de 2006, pode não se chamar entrevista, mas é facto que ocorreu uma reunião cujo objeto todos os intervenientes sabiam dizer respeito à oferta pública de aquisição de serviços, pelo prazo de um ano, para o desempenho “de tarefas de assessoria e apoio ao Diretor da Direção da FALSEC (Facilitação e Segurança da Aviação Civil), na área de regulamentação de facilitação e segurança da aviação civil, situando-se o valor mensal da prestação de serviços entre € 1.500 e € 2.250, acrescido de IVA x 12 prestações anuais, ao qual o recorrido concorreu.
Por isso, considerando o “objeto do litígio”, de saber se a sua não contratação pelo INAC é passível de ressarcimento dos prejuízos sofridos, a título patrimonial e não patrimonial, seja por responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, por violação do princípio da confiança, ou mesmo por factos lícitos, torna-se irrelevante saber se ocorreu tecnicamente uma entrevista ou não, porquanto ninguém discute que o recorrido foi chamado e recebido pelo diretor de Recursos Humanos do INAC, pelo Diretor do FALSEC e pelo Subdiretor do FALSEC, sendo certo, sem contradição, que ali apresentou o seu curriculum.
E isso tanto basta para não ter provimento o pedido de dar como não provado o “Facto S”.
Quanto ao “Facto T”, foi dado como provado que P...... disse ao Autor que não havia mais candidatos e que faltava apenas obter a autorização para a contratação por parte do Secretário de Estado da tutela – prova testemunhal. Para sustentar a sua convicção, o Tribunal a quo explicitou que foram decisivos os depoimentos das testemunhas do Capitão C........, G........, F...... e o próprio P........, sem explicitar em que termos, limitando-se a genericamente afirmar para todos mereceram credibilidade para o Tribunal, por terem sido testemunhas seguras e terem relevado conhecimento direito dos factos.
No caso, de facto, F...... afirmou recordar-se ter sido referido ao Dr. D...... na referida reunião/entrevista que ele tinha sido o único candidato e que iria ser analisado o processo para os tramites normais no âmbito da contratação [cassete 1, lado B]. Mas P........, esse nunca o afirmou efetivamente, explicitando que teria de ser feita informação a propor a contratação, pelo que não assegurou nada de concreto ao Dr. D...... [cassete 3, lado B]. Apesar de não se perceber em que medida o depoimento de G........ e F...... podem ter influenciado a convicção do Tribunal a quo, como referido na resposta à base Instrutória, para se dar como provado que não havia mais candidatos e que faltava apenas obter a autorização para a contratação por parte do Secretário de Estado da tutela, a testemunha P........ não o fez, devendo ser alterada a matéria de facto, nesta parte, passando a constar:
“FACTO PROVADO T:
Na reunião/entrevista realizada de 6 de março de 2006, foi dito ao Autor que seria candidato único e que faltava apenas obter a autorização para a contratação por parte do Secretário de Estado da tutela – prova testemunhal”.
Quanto ao “Facto Provado U” de que quinze dias depois de o Autor ter requerido a informação assente em D) [o Autor requereu ao Presidente do INAC informação acerca do andamento do processo], P...... telefonou ao Autor dizendo-lhe que a informação do Secretário de Estado da tutela ainda não tinha sido concedida, quando consta da inquirição a esta testemunha apenas que contactou efetivamente o Dr. D......, mas nunca lhe disse que estavam a aguardar a autorização do Secretário de Estado, até porque, explicitou que não estavam sequer realizadas as informações da FALSEC sobre o assunto. Mais clarificou que lhe ligou porque alguém deu ao Dr. D...... o seu contacto pessoal e deu conta que tinha uma chamada não atendida, pelo que devolveu a chamada [cassete 2, lado B].
Face ao depoimento em causa, o “Facto Provado U”, não pode manter-se, devendo ser substituído por outro, com o seguinte teor “:
“FACTO PROVADO U:
Quinze dias depois de o Autor ter requerido a informação assente em D), P...... retribuiu uma chamada não atendida do Autor, explicitando-lhe não existir qualquer alteração à situação existente a 6 de março – prova testemunhal”.
Quanto ao “Facto Provado X” e ao “Facto Provado Y” refere que a conduta do Réu gerou no Autor a convicção de que iria exercer as funções a que se candidatou e que foi a atuação dos agentes do Réu que provocou que o Autor gerasse confiança na contratação.
Para a convicção do Tribunal a quo contribuíram os depoimentos das testemunhas Capitão C........, G........, de A........, V........ e P....... Contudo, na fundamentação da Base Instrutória não se percebe em que medida tais depoimentos ajudaram nessa convicção, apenas se referindo que os depoimentos foram credíveis e geraram confiança no Tribunal.
Contudo, P........ afirmou no seu depoimento o oposto, ou seja, negou ter comunicado ao Dr. D...... que iria ser contratado [cassete 2, lado B]. Por outro lado, o facto assim descrito não é, ele próprio um facto, uma ocorrência da vida, mas o produto da valoração de vários factos que levaram a um tal juízo conclusivo. Ou seja, P........ afirmou claramente que sempre foi colocando o Dr. D...... ao corrente dos procedimentos e respetivas diligências. Mais afirmou, ainda, que a contratação de avençados dependia de uma apreciação do INAC e da decisão da tutela [cassete 3, lado B]. concluiu a testemunha P........ que nenhuma das pessoas presentes na reunião/entrevista transmitiram qualquer convicção quanto à eventual contratação do Dr. D...... [cassete 3, lado B].
Daqui resulta que o “Facto Provado X” e “Facto Provado Y” não devem constar, tão pouco, do probatório, porquanto não se tratam de ocorrências da vida, não são factos, mas conclusões valorativas. Na verdade, sempre que um ponto da matéria de facto integre uma afirmação ou valoração de factos que se insira na análise das questões jurídicas que definem o objeto da ação, comportando uma resposta, ou componente de resposta àquelas questões, o mesmo deve ser eliminado. É com base em factos concretos que pode sustentar-se o juízo e não a partir de expressões conclusivas que representam conceitos/conclusões que não podem ser objeto de prova.
Portanto, nestes casos, a intervenção deste Tribunal Central não se dá ao nível da (re)apreciação da prova, mas antes na despistagem (identificação/qualificação/expurgação) dos pontos da matéria de facto em causa, das afirmações genéricas, conclusivas ou que comportem matéria de direito, ao abrigo da previsão constante do n.º 4 do artigo 607.º do CPC, que não estão no âmbito do disposto nos artigo 640.º do CPC (impugnação da decisão relativa à matéria de facto feita pela parte/recorrente) ou 662.º do CPC (modificabilidade da decisão de facto).
Apenas os factos concretos podem integrar a seleção da matéria de facto relevante para a decisão, embora lhe possam ser equiparáveis os conceitos jurídicos geralmente conhecidos e utilizados na linguagem comum, desde que não integrem o objeto do processo.
Assim, altera-se a “Matéria de Facto dada como Provada”, nos termos seguintes:
S) Em 06/03/2006 o Autor foi sujeito a uma reunião conduzida por P...... (Diretor do Departamento dos Recursos Humanos do INAC), C......(Diretor do FALSEC) e F...... (Subdiretor do FALSEC), a pedido do Capitão C........– prova testemunhal;
T) Na reunião/entrevista realizada de 6 de março de 2006, foi dito ao Autor que seria candidato único e que faltava apenas obter a autorização para a contratação por parte do Secretário de Estado da tutela – prova testemunhal;
U) Quinze dias depois de o Autor ter requerido a informação assente em D), P...... retribuiu uma chamada não atendida do Autor, explicitando-lhe não existir qualquer alteração à situação existente a 6 de março – prova testemunhal.

III.2. DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada na sentença, e fixada no Tribunal ad quem, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do recurso, segundo a sua ordem de precedência.
Alega o recorrente, INAC, que face aos factos provados, não ocorreu responsabilidade civil extracontratual, por falta de preenchimento dos seus pressupostos previstos no DL 48 051, de 21 de novembro de 1967.
Sustenta que, desde logo, o recorrente não cometeu qualquer ato ilícito, tendo apenas acedido reunir com o recorrido, o que não lhe confere qualquer direito, interesse ou expectativa dignos de proteção legal, discordando-se que o recorrente tenha criado expectativas quanto à contratação do recorrido e que, por isso, tenha violado o princípio da confiança. E também não ocorreu qualquer culpa do recorrente, medida pela diligência de um bom pai de família, já que nenhum comportamento foi assumido pelos representantes do recorrente que assegurassem um mínimo de confiança na contratação. Pelo contrário, foi sendo explicado que a decisão caberia à tutela, por parte do Secretário de Estado. Finalmente, não existiram prejuízos para o recorrido, uma vez que este não realizou despesas, nem ficou impossibilitado de concorrer a outros procedimentos, bem como trabalhar para outras pessoas jurídicas.
A sentença recorrida, sobre o assunto, depois de dar como provados toda a matéria de facto acima transcrita conclui que “... delimitando o regime jurídico aplicável importa o disposto no D.L. no 48.051/1967 de 21/11, que regula o regime jurídico da responsabilidade civil extracontratual das entidades públicas por actos de gestão pública, prevendo-se no seu artigo 1.º que a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas no domínio dos actos de gestão pública rege-se pelo disposto no presente diploma, em tudo o que não seja previsto em leis especiais. Pelo que, concluindo, estando em causa a responsabilidade civil extracontratual de entidade pública e tendo-se decidido estarmos perante actos de gestão pública, quanto à lei substantiva aplicável, merece aplicação o regime jurídico da responsabilidade civil extracontratual do Estado e dos seus funcionários ou agentes, ou seja, nos termos da lei processual administrativa (artigo 41.º, n.º 1, do CPTA), o regime aprovado pelo Decreto-Lei no 48 051, de 21/11/1967, ficando desde já afastada a disciplina da responsabilidade civil prevista no Código Civil, reservada aos actos de gestão privada...”. Prosseguindo afirma que “... No caso dos autos, está em causa a responsabilidade do INAC decorrente da violação das regras legais aplicáveis quanto ao dever de informar e a violação dos princípios da legalidade e da boa-fé, por com a sua actuação ter criado a expectativa legítima e a convicção no Autor que iria ser contratado. Estabelece o artigo 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei no 48 051 sobre a responsabilidade das entidades públicas, no sentido de as mesmas responderem civilmente perante terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício (sublinhado nosso) [...] Pelo que, in casu, não existem as menores dúvidas de estarmos perante uma actuação da Administração, ora Réu em juízo, pois foi o mesmo que procedeu ao anúncio de uma oferta pública de emprego, dando seguimento ao respectivo procedimento, quanto a aceitar a candidatura do ora Autor, que foi, aliás, a única, ter realizado a entrevista de selecção do Autor, em 06/03/2006 e desde então, não mais ter informado o Autor, tendo criado a convicção na contratação, através dos seus órgãos e dos respectivos funcionários ou agentes, no exercício de funções públicas e por causa desse exercício...”. Ainda explicitou que “... Assim, desde 06/03/2007, data em que se realizou a entrevista de selecção, até aos finais de Maio de 2007, data em que o INAC devolveu o telefonema, informando o Autor que a autorização ministerial ainda não tinha sido concedida, o Réu, INAC, nada mais informou ou disse ao Autor, até 19/06/2007, data do ofício do Presidente do INAC, na sequência da comunicação do Autor datada de 06/06/2007, a comunicar a não celebração do contrato (cfr. alíneas E), F) e U) do probatório)...”. Concluiu explicitando que o autor “...sofreu ansiedade, vómitos, angústia, insónia, depressão e sentimento de injustiça e que a conduta do Réu gerou no Autor a convicção de que iria exercer as funções a que se candidatou, provocando a actuação dos agentes do Réu que o Autor gerasse a confiança na contratação – vide alíneas W), X) e Y) dos Factos Assentes. E ao aperceber-se que o Réu não iria concluir o procedimento que despoletou, iniciou-se a afectação do bem-estar do Autor, o que se agravou à medida que o Réu ia afastando essa possibilidade [cfr. alíneas Z) e AA)]...”.
Apreciando e decidindo.
Desde logo coloca-se a questão de saber se ocorreu, na verdade, uma promessa administrativa ou se ocorreu a criação de um ambiente de confiança suficientemente densificado, capaz de gerar no recorrido a convicção segura da sua contratação.
A promessa administrativa é uma figura que constitui uma auto-vinculação da Administração Pública à prática de um ato, regulamento ou contrato e está inserida na atuação informal da Administração. A promessa é, pois, o ato através do qual um sujeito está adstrito em relação a outro a praticar um ato futuro no interesse deste. O objeto do ato prometido deve ser futuro e não vinculado. A doutrina maioritária portuguesa entende que apesar das atuações informais não possuírem caráter decisório, isto não as impede de terem efetiva juridicidade e de produzirem efeitos jurídicos.
Pois bem, dir-se-á que a forma escrita, conforme dispõe o artigo 122.º do CPA, na redação aplicável, é o meio normal ou típico da revelação dos atos administrativos/normativos, mas não é o único, já que também se admite a prática de atos orais, razão pela qual a promessa administrativa, pelo facto de se situar a montante do ato propriamente dito, e sendo, por regra, dominada por alguma informalidade, admite-se, também, a sua prática oral. De resto, a ausência absoluta de forma legal a que se refere o artigo 133.º/2, alínea f) do CPA aplicável, reporta-se aos casos da exigência expressa de um qualquer modo especial de revelação da vontade administrativa, pelo que só nestes casos também a promessa administrativa teria de ser manifestada por escrito. Daí que a interpretação da promessa administrativa oral tenha de ser feita mediante o seu contexto comunicacional, assumindo relevo nessa interpretação o disposto no artigo 7.º/2 do CPA aplicável, ou seja que a Administração é responsável pelas informações prestadas por escrito aos particulares, ainda que não obrigatórias, dado que isso permite contextualizar a existência de promessas.
Por regra, as promessas administrativas surgem quando o promissário ainda não reúne as condições para ser destinatário do ato prometido, ou surgem porque legalmente ainda não poderia ser praticado o ato prometido naquele momento. Assim sendo, neste último caso estaremos perante uma promessa sob condição suspensiva, e na primeira situação, a promessa sob condição de serem reunidas as condições necessárias ao ato prometido.
E qual foi esse contexto comunicacional?
Que o recorrente publicitou, a 1 de março de 2006, a sua intenção de contratar, em regime de contrato de prestação de serviços, para o desempenho de tarefas de assessoria e apoio ao diretor da direção da FALSEC, pelo prazo de 1 ano, com uma remuneração entre € 1.500 a € 2.250 (facto provado A.) e, ainda, que o recorrido se candidatou (facto provado B.). A 6 de março de 2006 o recorrido foi a uma entrevista/reunião, tendo estado presentes o Diretor do Departamento dos Recursos Humanos do INAC, o Diretor do FALSEC e do Subdiretor do FALSEC (facto provado S.).
Também se enquadra no referido contexto que o recorrido não foi chamado, o que motivou vários contactos seus quer para o Presidente do INAC, quer para o Secretário de Estado Adjunto e das obras e comunicações, em maio e junho de 2006 (factos provados D) e E). A 19 de junho de 2006, portanto, 3 meses depois da publicitação da intenção de contratar, o Presidente do INAC dirige a recorrido ofício onde explica que no âmbito do Programa de Reestruturação da Administração Central – PRACE – o INAC iria ser objeto de uma reestruturação orgânica, tendo o Conselho de Administração procedido a uma reavaliação dessa intenção de contratar, concluindo que o INAC não teria reunidas as condições para a celebração do contrato de prestação de serviço (facto provado F.).
O recorrido a 30 de junho de 2006 reitera o pedido ao Presidente do INAC a concluir o procedimento para contratação da prestação de serviço (facto provado G.).
Pois bem, o dever de indemnizar poderá existir mesmo para o caso de se tratar de promessas apenas baseadas no princípio da confiança gerada no promissário.
Assim, diríamos que podem existir três tipos de causas ressarcitórias: as do Tipo I [João TABORDA DA GAMA, Promessas administrativas, Coimbra, 2008, pp. 119 e segs e 265], quando um particular procura a ante-regulação de uma dada situação e a Administração acede à pretensão do particular em reunir uma série de pressupostos necessários à prática do ato [administrativo ou normativo] prometido, mas sem nunca lhe assegurar a sua prática. Neste caso, a posição subjetiva do particular não tem intensidade relevante.
Depois temos as promessas do Tipo II que são as que são assumidas sem grandes formalidades, tomadas pelos órgãos competentes, assentes na sua legalidade e confiança geradas, criando uma confiança de grau médio.
Finalmente, temos as promessas do Tipo III, ou seja, as que correspondem àquelas que estão legalmente reguladas e às quais estão associadas posições jurídicas subjetivas dos promissários consolidada da lei, assumindo um grau de confiança muito elevado [João TABORDA DA GAMA, Promessas administrativas, Coimbra, 2008, pp. 119 e segs e 265].
Pela apreciação já feita da factualidade provada nos autos, entende o Tribunal ad quem que não houve uma promessa administrativa propriamente dita na reunião denominada de entrevista profissional (facto provado S.). Assim, não ocorreu uma promessa administrativa caracterizada como do Tipo II ou III, ou seja, de forte intensidade. A ter existido uma promessa administrativa ela terá sido do Tipo I, ou seja, o recorrido tem a sua posição subjetiva assegurada com um nível de proteção ténue.
Ora, para que a promessa ganhe vinculatividade é necessário que se verifique um conjunto de condições de causalidade que poderão levar à responsabilidade da Administração. A saber:
a) A existência de uma atuação administrativa promissória – a promessa;
b) A existência de uma situação de confiança justificada, correspondendo à credibilidade que o promissário dá à promessa;
c) A existência de um investimento de confiança, ou seja, que o promissário pratique atos fundados na promessa.
Considerando a factualidade provada, entende o Tribunal ad quem não ter existido uma atuação administrativa promissória forte, nem uma situação de confiança justificada, assim como se desconhece que investimentos o recorrido fez, fundados na referida promessa, pelo que a intensidade da sua proteção é ténue e frágil.
Já quanto à alegada violação do princípio da boa-fé desdobra-se este em dois outros princípios autónomos, quais sejam:
a) a tutela da confiança legítima, e
b) a primazia da materialidade subjacente.
Ora, a tutela da confiança não se consubstancia num princípio absoluto, somente ocorrendo em situações particulares que a possam justificar no caso concreto, exigindo-se a verificação de quatro pressupostos jurídicos para que a confiança seja tutelada:
a) Que haja uma situação que enseje a confiança, em razão da boa-fé subjetiva ou de crença da pessoa que pretende ter a confiança tutelada;
b) Como segundo pressuposto, que essa confiança seja justificável, segundo elementos objetivos que tornem a crença plausível;
c) O terceiro requisito é que deve ter havido, com base nessa confiança ou crença, atividade jurídica que deverá ser objeto de proteção;
d) Como último pressuposto, a imputação da situação de confiança decorrendo da existência de um autor a quem deve uma relação de confiança ser tutelada.
Pois bem, o Tribunal ad quem conclui que a posição subjetiva do particular tem, aqui, também, uma intensidade fraca, na medida em que não foi violado o princípio da confiança porquanto não ocorreu uma afetação arbitrária ou demasiadamente onerosa de expectativas legitimamente fundadas dos cidadãos [Acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 287/90, 303/90, 625/98, 634/98, 186/2009, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt].
Vejamos.
A oferta pública de aquisição de serviços foi publicitada no sítio oficial do recorrente a 1 de março de 2006, mas em 19 de junho de 2006 o Presidente do INAC enviou ofício ao recorrido dando conta que em virtude de uma reestruturação interna do INAC, não estariam reunidas as condições para a celebração do contrato de prestação de serviços (factos provados A.) e F.). Daqui se conclui que a clarificação da perda de interesse em contratar ocorreu 3 meses depois da publicitação da intenção de contratar, pelo que o investimento de confiança durou apenas esses 3 meses. Entretanto, 3 dias depois da citada publicitação da vontade de contratar, o recorrido tem uma reunião no INAC, onde lhe foi explicitado o procedimento de contratação, tendo sido referido que tudo dependeria de um conjunto de procedimentos internos, bem como da autorização da tutela (factos provados S.) e U.).
Não podemos acompanhar, por isso, a conclusão do Tribunal a quo quanto à alegada “clara” violação do princípio da confiança.
É certo que na referida reunião de dia 6 de março de 2006, denominada de “entrevista”, foi referido ao recorrido ter sido ele candidato único ao procedimento (facto provado T.). Tal facto é suscetível de gerar uma confiança segura de que iria ser contratado?
Vejamos.
O nosso legislador apresentou um elenco misto de causas ou fundamentos que conduzem à decisão de não adjudicar. Dado a heterogeneidade das causas de não adjudicação (causas de exclusão de ilicitude) mais difícil se torna de apresentar uma noção de não adjudicação. Assim, a não adjudicação corresponderá a uma “... revogação da decisão de contratar com base em qualquer uma das causas do artigo 57.º do DL 197/99, de 8 de junho de 1999.
Efetivamente, o interesse público pode, em condições especiais, habilitar a entidade adjudicante a reformular a decisão de contratar, havendo a necessária ponderação, entre a possível lesão na esfera jurídica dos concorrentes oriundos da revogação da decisão de contratar; e a eventual lesão do interesse público atenta aos interesses que fundamentaram a decisão de contratar [pura revogação, alteração].
Como iremos ter oportunidade de verificar, o elenco das causas de não adjudicação é limitado, ou seja, o legislador previu as situações que possibilitassem à entidade adjudicante decidir não adjudicar qualquer proposta, fazendo-o depender de uma avaliação atento ao princípio da legalidade administrativa.
Ora, determinava o artigo 57.º do Regime de realização de despesas públicas com locação e aquisição de bens e serviços, bem como da contratação pública relativa à locação e aquisição de bens móveis e serviços – DL 197/99, de 8 de junho de 1999 -, aplicável aos autos, em especial:
“... 1 - Não há lugar à adjudicação nos seguintes casos:
a) Quando todas as propostas apresentadas sejam consideradas inaceitáveis pela entidade competente para autorizar a despesa;
b) Quando houver forte presunção de conluio entre os concorrentes, nos termos do disposto no artigo 53.º;
2 - Na decisão de não adjudicação devem indicar-se as medidas a adoptar em seguida.
3 - Os concorrentes devem ser notificados da decisão de não adjudicação, das medidas a adoptar de seguida e dos respectivos fundamentos...”.
Pois bem, tal significa que apesar de o recorrido ter sabido ter sido o único candidato à oferta pública de aquisição de serviços, tal não lhe consagrava de imediato o direito à celebração de contrato, uma vez que a entidade adjudicante, in casu o INAC, poderia sempre decidir não contratar, como, de resto, sucedeu (facto provado F.).
Tem, pois razão, o recorrente quando defende não estarem reunidos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, já que, como já aqui explicitado, a decisão de não contratar não foi ilícita, até porque existia, ao tempo dos factos, norma legal que permitia a não adjudicação, por um lado, assim como não foi violado o princípio da confiança.
Ora, inexistindo a ilicitude defendida pelo Tribunal a quo, não pode manter-se o decidido.
***
Em consequência, será de conceder provimento ao recurso, por provados os seus fundamentos, revogando-se a sentença recorrida, com a fundamentação antecedente.
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IV – DISPOSITIVO

Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, por provados os fundamentos do recurso, revogando a sentença recorrida, com a fundamentação antecedente, absolvendo-se o recorrente dos pedidos.
Custas pelo recorrido.
Registe e Notifique.
Lisboa, dia 24 de abril de 2024.
(Eliana de Almeida Pinto - Relatora)

(Frederico Branco – 1.º adjunto)

(Julieta França – 2.º adjunto)