Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07241/13
Secção:CT
Data do Acordão:06/09/2016
Relator:BÁRBARA TAVARES TELES
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA; CONTRADIÇÃO ENTRE FUNDAMENTOS E DECISÃO; PRESCRIÇÃO; GERÊNCIA CULPA
Sumário:1. Embora configurado como omissão de pronuncia não está em causa a referida nulidade mas antes erro de julgamento da matéria de facto, uma vez que a livre apreciação dos vários elementos probatórios existentes nos autos e a eventual posição sobre eles tomada pelo juiz não diz respeito à pronúncia sobre as causas de pedir invocadas, mas antes o julgamento que o julgador faz da matéria de facto que entende relevante. Ora, segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor e consignar se a considera provada ou não provada.
2. Um lapso isolado no uso de uma palavra ou expressão na fundamentação de direito da sentença não pode, neste contexto, ser encarado como uma nulidade da sentença, que não é contraditória, nem ambígua, uma vez que com a leitura da restante fundamentação de direito e da decisão, facilmente se repõe.
3. Resulta da interpretação e aplicação conjugada do disposto nos artigos 48º e 49º da LGT que a citação de cada um dos devedores, principal ou subsidiário, ocorrida no âmbito do processo de execução fiscal, interrompe a prescrição, cfr. artigo 49º, n.º 1 -constitui uma causa interruptiva própria e singular-, e só pode ocorrer uma vez relativamente a cada um deles, no entanto, as causas de interrupção da prescrição ocorridas relativamente ao devedor principal são oponíveis ao devedor subsidiário, cfr. artigo 48º, n.º 2, a não ser que a citação deste (devedor subsidiário) ocorra mais de 5 anos após a liquidação do imposto, cfr. artigo 48º, n.º 3. Em suma, quando a citação do responsável subsidiário ocorre após ao 5.º ano a que se refere o n.º 3 do art. 48.º da LGT, a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos relativamente àquele, e se na data da citação do responsável subsidiário a dívida ainda não se encontrava prescrita, por não se ter completado o prazo de 8 anos (art. 48.º, n.º 1 da LGT), verifica-se a interrupção da prescrição com a sua própria citação “uma única vez” nos termos do disposto no n.º 3 do art. 49.º da LGT.
4. Exercendo o Recorrente funções de gerência o regime no qual se poderia fundar a sua responsabilidade subsidiária pelas dívidas sociais é o previsto no artº.24, nº.1, al.b), da LGT, o qual faz impender o ónus da prova sobre o gerente revertido, sendo ele quem tem de provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento da dívida exequenda revertida, conforme examinado supra (na alínea b), do nº.1, do artº.24, da LGT, consagra-se, portanto, uma presunção de culpa, que onera o revertido, a aferir pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso concreto).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:António …, inconformado com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a oposição à execução nº e apensos, instaurada no serviço de finanças de contra a sociedade António, Lda., por dividas de IVA relativas aos anos 2002, 2003 e 2004 e IRS relativo ao ano 2002, e contra si revertida, veio dela interpor o presente recurso jurisdicional, terminando as suas alegações formulando as seguintes conclusões:
“CONCLUSÕES:
a) Consideramos que a douta sentença proferida nos presentes autos padece de vários vícios, sendo que, desde logo, violou a disposição contida no art. 48.º, n.º 3 do CPPT, ao não considerar como verificada a prescrição das dívidas tributárias em causa nos autos.
b) Com efeito, sendo o recorrente executado por reversão, na qualidade de responsável subsidiário, a sua citação no âmbito do processo executivo, deveria ter tido lugar até ao 5.º ano posterior à liquidação, o que não sucedeu, atenta a sua citação no dia 4 de Novembro de 2010, pelo que, deveriam as dívidas tributárias ser consideradas prescritas, extinguindo-se as obrigações tributárias em apreço no que respeita à pessoa do oponente, com a consequente procedência da oposição e extinção do processo executivo.
c) O segundo fundamento da oposição apresentada foi o da ilegitimidade do exequente, por considerar o oponente que, não se encontravam preenchidos os requisitos da alínea b) do n.º 1 art. 24.º da LGT, sendo que, a douta sentença considerou a improcedência do mesmo, por julgar que o oponente não logrou ilidir a presunção de culpa que sobre ele impendia, no que respeita à insuficiência do património da executada para satisfação do pagamento dos tributos.
d) Também nesta sede consideramos que, mal andou a douta sentença recorrida, quer por, contradição entre os fundamentos e a decisão tomada, quer por omissão de pronúncia, quer ainda por não ter considerado factos que, na nossa modesta opinião, resultaram do depoimento das testemunhas inquiridas nos autos.
e) Da omissão de pronúncia:
No que respeita aos factos alegados nos arts. 17.º, 21.º a 27.º da oposição, consideramos que existiu omissão de pronúncia da douta sentença, o que constitui causa de nulidade da mesma (cf. art. 125.º, ex vide art. 211.º, ambos do CPPT), conforme detalhadamente se expôs nos arts. 21.º a 25.º das presentes alegações.
f) Da contradição entre os fundamentos invocados e a decisão proferida:
A mesma é patente quando na fundamentação da sentença recorrida se refere “sucede, porém, que a prova produzida nos presentes autos permite concluir que o oponente não teve culpa pela falta de entrega de IVA respeitante períodos de 1.º e 3.º trimestre de 2002, 2.º, 3.º e 4.º trimestre de 2003 e 1.º e 3.º trimestre de 2004”, e posteriormente, se adopta decisão em contrário, o que, constitui igualmente causa de nulidade da sentença (cf. art. 125.º do CPPT).
g) Tendo em consideração o já invocado quanto ao vício de omissão de pronúncia da sentença, consideramos que, os factos constantes dos arts. 17.º, 21.º a 27.º da oposição, teriam de constar como factos provados, na medida em que, os mesmos resultaram do depoimento das testemunhas inquiridas nos autos, com maior acuidade do depoimento da 1.ª e da 3.ª testemunha, respectivamente, Maria e Hugo , os quais, apesar da relação de parentesco e profissional com o oponente se afiguraram inclusivamente credíveis ao Tribunal (cf. se expôs supra n nos arts.30.º a 35.º).
h) E, tais factos, em conjugação com os factos dados como provados na douta sentença nas alíneas G) a M), teriam necessariamente de conduzir à prova pelo ora oponente de que, não lhe é imputável qualquer culpa no que ao não pagamento das dividas tributárias em causa diz respeito, o que em consequência, determina a sua ilegitimidade e procedência da oposição.
i)Por último, na nossa modesta opinião, mesmo tendo em consideração os factos dados como provados na douta sentença ora recorrida, a valoração dos mesmos sempre conduziria a uma decisão de procedência da oposição, não podendo descurar que,
j) Estamos perante a prova de factos negativos, onde necessariamente, a acrescida dificuldade de tal prova, “deverá ter como corolário, por força do princípio constitucional da proporcionalidade, uma menor exigência probatória por parte do aplicador do direito, dando relevo a provas menos relevantes e convincentes que as que seriam exigíveis se tal dificuldade não existisse, aplicando a máxima latina «iis quae difficilioris sunt probationis leviores probationes admittuntur»” (neste sentido Acórdão do STA, proferido no proc. n.º 0327/08, de 17/12/2008, disponível in www.dgsi.pt) .
l) Com efeito, ao considerar como provada a existência de uma divida de tão elevado montante (facto provado sob a alínea H) e I)), que não foi possível recuperar, mesmo que a dita divida não coincida com o ano das dividas de IVA em causa, reporta-se ao ano de 1999, ano antecedente e próximo dos anos em causa, o que, a acrescer com o facto constante da alínea L) e com a actuação do oponente que mesmo assim, ia sempre pagando aos fornecedores (facto provado sob a aliena M)), seria o suficiente, para que se considerasse como provado que o oponente, ora recorrente, não teve culpa na insuficiência do património da devedora originária e no não pagamento dos impostos em causa nos autos.
m) Assim, ao não decidir em tal sentido, a douta sentença, violou as disposições legais aplicáveis, nomeadamente o art. 24.º, n.º 1, al. b) da LGT e art. 204.º, n.º 1, al. b) do CPPT.
Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, e em consequência ser revogada a douta sentença, e substituída por outra que considere procedente a oposição à execução fiscal apresentada nos autos, com todas as consequências legais daí advenientes.”
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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Neste Tribunal, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer, defendendo a improcedência do recurso, por a decisão não padecer de quaisquer vícios.
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Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.
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Objecto do recurso - Questão a apreciar e decidir:
Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pela Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
As questões suscitadas pelo Recorrente consistem em apreciar se a sentença a quo errou ao considerar que as dívidas exequendas não estão prescritas e se errou ao considerar o Recorrente parte legítima para a reversão.

II.FUNDAMENTAÇÃO
II. 1. Da Matéria de Facto
A sentença recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto:
Da prova produzida nos presentes autos, ficou apurada com interesse para a decisão da causa, a factualidade que se passa a subordinar por alíneas:
A) O Oponente foi sócio e gerente da sociedade denominada «ANTÓNIO , LDA» , no período das divida exequendas. (cfr. artigo 9º da p.i.)

B) Corre termos no Serviço de Finanças de , contra a sociedade «ANTÓNIO, LDA» o processo de execução fiscal n.º e ap. Para cobrança coerciva de dívidas de IRS ( 2002) e IVA ( 2002, 2003 e 2004), no montante de € 57.242,73. (Doc. fls do processo de execução fiscal apenso)
C) No dia 06.08.2010, no âmbito do processo de execução fiscal a que alude a al.B) do probatório foi emitida informação da qua se destaca: “ (…) o executado nos presentes autos ANTÓNIO, LDA (…), não possui bens suficientes para garantir as dívidas e não são conhecidos quaisquer bens susceptíveis de serem penhorados, conforme se verifica através das impressões do sistema informático a fls. 11 a 16 e 31 dos presentes autos, pelo que se mostram reunidas as circunstancias referidas e previstas no n.º2 do Art. 153º do CPPT.” ( Doc. fls.32 do processo de execução fiscal apenso)

D) Em 03.09.2007, o Oponente na sequência da notificação para o exercício do direito de audição prévia para efeitos de avaliação da prossecução ou não da reversão, arguiu a nulidade das certidões de divida por falta de elementos essenciais, bem como dos elementos essenciais da liquidação. (Doc. fls.32/33 do processo de execução fiscal apenso)

E) Por despacho datado de 23.09.2010, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, o Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de acolhendo a informação a que alude a al. C) do probatório determinou a reversão da referida execução fiscal contra o Oponente. (Doc.fls 41/42 do processo de execução fiscal apenso)

F) No dia 04.11.2010, o Oponente foi citado no âmbito da execução fiscal. (Doc. fls.51 do processo de execução fiscal apenso)

G) A devedora originária intentou contra a “Sociedade, Lda” ação declarativa de condenação, para pagamento de quantia de 19.398.310$00, a qual correu termos sob o n.º /99, junto do Tribunal Judicial da Comarca de Elvas.(Doc. n.º1 junto á p.i.)

H) Em 08.08.2001, por sentença no Proc. n.º /99, foi a “ Sociedade Lda” condenada a pagar á devedora originária a quantia de 19.398.310$00. (Doc. n.º1 junto á p.i.)

I) Sob o n.º /1999, corre termos no 2º Juízo do Tribunal de Elvas autos de execução nos quais é exequente a devedora originária e executada a “Sociedade, Lda” para cobrança da quantia de € 117.672,61. (Doc. n.º1 junto á p.i.)

J) Dá-se como integralmente reproduzido o “Auto de Penhora” lavrado em 21.12.2004, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Alenquer, nele figurando como executado a “ Sociedade , Lda”. (Doc. n.º1 junto á p.i.)

L) Alguns clientes não pagaram os serviços prestados pela devedora originária. (Depoimento da 1ª e 3º testemunha)

M) A sociedade pagava aos fornecedores. (Depoimento da 1ª testemunha)

N) No dia 07.10.2010, deu entrada no Serviço de Finanças de – a petição inicial que originou os presentes autos. (Cfr. carimbo aposto a fls.2 dos autos)

FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provaram quaisquer outros factos, com relevância para a decisão da causa mormente quanto à ausência de culpa do oponente pelo não pagamento dos tributos dados á execução, eliminando-se, para além do mais, as asserções dos articulados que integram conclusões de facto ou de direito ou meras considerações pessoais do oponente.

MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO

A decisão da matéria de facto provada quanto aos pontos A a N resultou do exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.

No que concerne à decisão do facto dado como provado nas alíneas L) e M) do probatório, resultou dos depoimentos das testemunhas Maria e Hugo, que não obstante as relações profissionais e de parentesco com o Oponente lograram convencer o tribunal quanto aos factos referenciados. “


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DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
O Recorrente, nas suas alegações, impugna os factos vertidos na sentença a quo dizendo o seguinte: “consideramos que, os factos constantes dos arts. 17.º, 21.º a 27.º da oposição, teriam de constar como factos provados, na medida em que, os mesmos resultaram do depoimento das testemunhas inquiridas nos autos, com maior acuidade do depoimento da 1.ª e da 3.ª testemunha, respectivamente, Maria e Hugo, os quais, apesar da relação de parentesco e profissional com o oponente se afiguraram inclusivamente credíveis ao Tribunal”
Vejamos:
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607º, nºs.2 a 4, do CPC, e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123º, nº.2, do CPPT).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida. Tal ónus rigoroso deve considerar-se mais vincado no actual art.640º, nº.1, do CPC que dispõe o seguinte:

Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”:
1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2- No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa -se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; (…)

Ora, após leitura atenta das alegações e das conclusões de recurso verifica-se que o ónus a que o Recorrente está obrigado se mostra integralmente cumprido. O Recorrente tem obrigatoriamente de especificar, nas alegações de recurso os pontos de facto que considera incorrectamente julgados. Deve fazê-lo enunciando quais os factos concretos constantes da PI que não foram dados como provados e que deveriam, em ser entender., ter sido. Tudo isso está feito. O Recorrente indica ainda quais as testemunhas ouvidas que depõem sobre os factos em questão.
Cumpre agora reapreciar a matéria de facto impugnada.

Os factos que o Recorrente considerou incorrectamente julgados e que em seu entender deveriam ter sido levado ao probatório são os seguintes:
17º
A empresa em apreço não derem actualmente qualquer actividade comercial, só não tendo ainda conseguido encerrar a sua actividade e proceder à sua liquidação em virtude da existência das presentes dividas
21º
A verdade é que, por vicissitudes processuais e pela demora existente no Tribunal deprecado, a sociedade executada não conseguiu até à presente data recuperar tal credito, apesar dos diversos esforços empreendidos.
22º
A falta de recuperação do montante supra referido, assim como, de outros devedores da empresa, levaram a que, desde tal data e face a uma situação que pela demora processual alheia à executada e ao ora oponente, se tem arrastado no tempo, num espiral descendente que levou a que fosse impossível recuperar a empresa, sendo que
23º
Tal valor, que por si só é claramente superior às dividas em apreço conduziria, a uma solvabilidade de pagamentos eu assim foi inexistente.
24º
Face ao exposto, constatamos que foram factores exógenos ao ora oponente que condicionaram, a situação económica da empresa ora devedora originária, e nessa medida a insuficiência do património da mesma.
25º
O ora oponente tudo fez para tentar recuperar de tal embate, nunca esperando que o legal representante de tal empresa (Sr. Mário ) pessoa que considerava séria e honesta por já ter tratado com o mesmo em anteriores negociações, o conduzisse a tal situação, tanto mais que é do seu conhecimento que o mesmo foi constituindo novas empresas, para as quais foi transferido o seu património (nomeadamente empresas agrícolas)
26º
Não tendo no entanto logrado obter sucesso, sendo que,
27º
Sempre se dedicou, de alma e coração, gastando e desgastando-se em trabalho, e empenhando-se o máximo no seu trabalho.”

Ouvida a prova indicada, nomeadamente o depoimento das 1ª e 3ª testemunhas, esposa e filho do oponente respectivamente, ambos funcionários da sociedade em causa, a primeira funcionaria á data dos factos e o segundo funcionário apenas nos anos de 1997, 1998, 1999 e 2001 verifica-se que a matéria constante do teor dos artigos 17º e 21º a 27º da pi não se mostra totalmente provada.
Para o que agora interessa, a testemunha Maria revelou conhecimento sobre as dificuldades da sociedade executada originária em recuperar da espiral descendente que levou a que fosse impossível salvar a empresa, após a divida do seu principal cliente “Sociedade, Lda.”, no valor de 19.398.310$00 e das dívidas de outros devedores da empresa.
A testemunha Hugo reconhece que à data era muito novo e não tinha a exacta noção do que se estava a passar na sociedade em causa, tudo que sabia foi o que ouviu de seu pai. Tinha conhecimento da divida e das dificuldades em recuperar o credito apesar da acção intentada.
Á data das dívidas em causa já não trabalhava na sociedade executada originária.
Assim sendo, importa aditar à matéria de facto assente.

Ao abrigo do disposto no artigo 662º, nº 1, do CPC, adita-se ao probatório o seguinte facto:
O) Após a divida referida em G) a sociedade executada originária apresentou enumeras dificuldades financeiras, cf. depoimento de testemunha.
Altera-se ainda o facto constante da alínea N):
N) No dia 07.12.2010, deu entrada no Serviço de Finanças de – a petição inicial que originou os presentes autos. (cfr. carimbo aposto a fls.2 dos autos)


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Estabilizada a matéria de facto, avancemos para as questões que nos vêm colocadas.

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II.2. Do Direito

O que importa agora nesta sede averiguar é se a sentença a quo é nula e se incorreu em erro de julgamento de direito quando julgou improcedente a oposição por entender que as dívidas em causa não se mostram prescritas e que o Recorrente é parte legítima para a execução.
Começa o Recorrente por assacar nulidades á sentença, por omissão de pronúncia e por contradição entre os fundamento e a decisão. Comecemos, então, por aqui.
Nos termos do preceituado no citado art. 615º, nº.1, al. d), do CPC, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no art.125º, nº.1, do CPPT, no penúltimo segmento da norma.
A referida nulidade reconduz-se a um incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no art.608º, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente).
Por outras palavras, e em síntese, ocorre nulidade da sentença por omissão de pronúncia quando esta deixe de decidir alguma questão colocada pelas partes, salvo se a decisão dessa questão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra (art.608.º, n.º2 e 615.º, n.º1 alínea d), do CPC);
Conforme é jurisprudência constante dos Tribunais Superiores, quando o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia (cf. Ac. TCAS de 30/1/2014 - proc.6995/13; ac. TCAS de 27/2/2014 - proc.7343/14; ac. TCAS de 26/6/2014 - proc.7784/14).
No caso concreto, diz o Recorrente, embora de forma pouco clara, que o Tribunal a quo não podia deixar de se pronunciar e tomar posição sobre os factos constantes dos artigos 17º, 21º e 27º da p.i dizendo, mais adiante, que esses factos deveriam ter sido dados como provados.
Do que vem dito pelo Recorrente fácil é concluir que o que assaca á sentença não configura omissão de pronúncia, mas antes erro de julgamento da matéria de facto, uma vez que a livre apreciação dos vários elementos probatórios existentes nos autos e a eventual posição sobre eles tomada pelo juiz não diz respeito à pronúncia sobre as causas de pedir invocadas, mas antes o julgamento que o julgador faz da matéria de facto que entende relevante.
Ora, segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor e consignar se a considera provada ou não provada.
A sentença a quo considerou como relevantes e provados os factos que constam da matéria assente e é sobre esses que importa agora apreciar o recurso.

Relativamente à contradição entre os fundamentos e a decisão, diz o Recorrente que: “A mesma é patente quando na fundamentação da sentença recorrida se refere “sucede, porém, que a prova produzida nos presentes autos permite concluir que o oponente não teve culpa pela falta de entrega de IVA respeitante períodos de 1.º e 3.º trimestre de 2002, 2.º, 3.º e 4.º trimestre de 2003 e 1.º e 3.º trimestre de 2004”, e posteriormente, se adopta decisão em contrário, o que, constitui igualmente causa de nulidade da sentença (cf. art. 125.º do CPPT).

Vejamos:
Nos termos do preceituado art.615º, nº.1, al. c), do CPC, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no art.154, nº.1, do CPC.
O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada.
No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do CPPT.
De facto, na sentença a quo, a certo ponto pode ler-se que: “sucede, porém, que a prova produzida nos presentes autos permite concluir que o oponente não teve culpa pela falta de entrega de IVA respeitante períodos de 1.º e 3.º trimestre de 2002, 2.º, 3.º e 4.º trimestre de 2003 e 1.º e 3.º trimestre de 2004”, no entanto não se trata de uma verdadeira contradição mas apenas de um mero lapso que, com a leitura da restante fundamentação de direito e da decisão, facilmente se repõe. A fundamentação de direito da sentença a quo é a seguinte:
No caso dos autos, ficou assente que o Oponente intentou acção declarativa de condenação pedindo que a “ Sociedade , Lda” fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 19.398.310$00, correspondendo ao montante de materiais e serviços prestados durante o ano de 1999. Mais ficou assente, que corre termos ação executiva na sequencia da procedência da acção.
Sucede, porém, que a prova produzida nos presentes autos permite concluir que o Oponente não teve culpa pela falta de entrega do IVA respeitante períodos de 1º a 3º trimestre de 2002, 2º, 3º e 4º trimestre de 2003 e 1º e 3º trimestre de 2004.

Com efeito, trata-se de imposto não referente ao ano de 1999, mas sim 2002, 2003.

Note-se que a prova no caso sub judice deveria ser particularmente exigente porquanto nos situamos perante dívidas de IVA que foi apurado pela própria sociedade originária devedora.

É certo que ficou provado, que alguns clientes não pagaram os serviços prestados pela devedora originária, (cfr. al.I) do probatório) contudo, embora o não recebimento do IVA dos clientes não justifique que o mesmo não haja de ser entregue ao Estado (ao sujeito passivo de IVA compete, em conformidade com o Código daquele imposto, entregar o IVA resultante da diferença entre o imposto liquidado e o imposto dedutível, independentemente de o ter recebido ou não do cliente, é facto que pode e deve ser ponderado na avaliação da culpa do gerente pela falta de entrega do imposto ao Estado, designadamente se puder estabelecer-se uma conexão entre a falta de fundos da empresa e o não recebimento dos clientes.

Acontece, que para ilidir a culpa, o Oponente teria de fazer uma prova positiva de que não existiu qualquer relação causal entre a sua actuação e a insuficiência patrimonial da empresa. E tal só será alcançado se o Oponente alegar factos, por exemplo, respeitantes, a qualquer sua actuação que pudesse ter como objectivo evitar uma situação de incumprimento da sociedade, como veio a acontecer

De igual modo e relativamente ao IRS que foi retido na fonte e não foi entregue o montante do imposto retido ao Estado.

No caso sub judice, o Oponente não logrou provar qualquer facto para se saber porque é que se tornou impossível à originária devedora efectuar o pagamento dos impostos exequendos.

Aqui chegados, é de concluir, que o Oponente não logrou ilidir a presunção de culpa que sobre ele impendia, motivo por que a oposição não pode proceder.

V.SEGMENTO DECISÓRIO

Termos em que se decide julgar improcedente a oposição à execução fiscal. “

Ora, da leitura integral de toda a fundamentação utilizada na decisão fácil é concluir que a palavra “não” empregue no trecho posto agora em causa, encontra-se a mais, não é senão um lapso uma vez que toda a restante argumentação veio em sentido contrário, e não apenas a decisão. Este lapso não pode, neste contexto, ser encarado como uma nulidade da sentença, que não é contraditória, nem ambígua.
Face ao exposto, improcede mais esta fundamentação de recurso.

Avançando importa agora averiguar a prescrição das dívidas exequendas.
Sustenta o Recorrente que as dívidas de IVA relativas aos períodos de 1º e 3º trimestre de 2002, 2º, 3º e 4º trimestre de 2003 e 1º e 3º trimestre de 2004 e IRS relativas ao ano 2002, estão prescritas pois deve aplicar-se o disposto no artigo 48º, n.º3 da LGT.
No recente acórdão do STA de 26/08/2015, proc. N.º 01012/15 decidiu-se no sentido de que:

“[r]esulta da interpretação e aplicação conjugada do disposto nos artigos 48º e 49º da LGT que a citação de cada um dos devedores, principal ou subsidiário, ocorrida no âmbito do processo de execução fiscal, interrompe a prescrição, cfr. artigo 49º, n.º 1 -constitui uma causa interruptiva própria e singular-, e só pode ocorrer uma vez relativamente a cada um deles, no entanto, as causas de interrupção da prescrição ocorridas relativamente ao devedor principal são oponíveis ao devedor subsidiário, cfr. artigo 48º, n.º 2, a não ser que a citação deste (devedor subsidiário) ocorra mais de 5 anos após a liquidação do imposto, cfr. artigo 48º, n.º 3.”.
Com efeito, na parte com interesse para a decisão do presente recurso, o discurso fundamentador daquele acórdão é o seguinte:
“A questão aqui colocada já não é nova e já mereceu resposta contrária por parte deste Supremo Tribunal, entre outros, nos acórdãos datados de 15/01/2014 e 06/03/2014, respectivamente, recursos n.ºs. 01670/13 e 0601/13.
No primeiro daqueles acórdãos escreveu-se com interesse para a resolução da questão:
“De acordo com o disposto no nº 3 do art. 48º da LGT, a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efectuada após o 5º ano posterior ao da liquidação.
Ora, atentando nos autos, constata-se que a liquidação de que emerge a presente dívida exequenda foi operada no ano de 2003…. E assim sendo, logo se vê que a citação … do oponente/recorrido, na qualidade de responsável subsidiário pela dívida exequenda, ocorreu depois do 5º ano posterior ao ano da liquidação, pelo que a interrupção da prescrição relativamente à sociedade devedora principal … não produz efeitos quanto a ele (responsável subsidiário), nos termos do mencionado nº 3 do art. 48º da LGT.
Não obstante, e de todo o modo, sempre seria de considerar, como salienta o Cons. Jorge Lopes de Sousa, (Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, 2ª ed., 2010, p. 119.) que mesmo «no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao 5° ano, se ele for citado até ao fim do 8° ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele (e também em relação ao devedor originário, por força da regra do n° 2 do art. 48°). O efeito daquele nº 3 do art. 48° é apenas de tornar irrelevante em relação ao responsável subsidiário as causas de interrupção que se verifiquem em relação ao devedor originário», sendo que esta interpretação é a que melhor se adequa à teleologia global do art. 48º da LGT, permitindo, aliás, a conjugação do estatuído nos seus nºs 2 e 3.
Ou seja, não fica afastada a necessidade de aferir se a citação do responsável subsidiário ocorre antes do termo do prazo de prescrição, aferindo esta (prescrição) também em função da causa interruptiva que é a própria citação do responsável subsidiário.
E o sentido e alcance deste preceito não podem ser fixados de forma isolada, mas atendendo a outros preceitos do próprio artigo 48º da LGT, em especial, o seu nº 2, que é inequívoco no sentido de que o prazo de prescrição é de 8 anos tanto em relação ao devedor originário como ao responsável subsidiário, sendo que, «a subordinação do efeito das causas interruptivas em relação aos responsáveis subsidiários não é um prazo especial de prescrição em relação ao responsável subsidiário». (Ibidem.)”.
Efectivamente, o regime legal consagrado no artigo 48º, n.º 3 da LGT determina um regime mais favorável no que toca ao devedor subsidiário que, tal como refere o Ministério Público junto deste Supremo Tribunal, não implica que se interprete o disposto no artigo 49º, n.º 3 da mesma LGT em contrário das regras de interpretação das leis consagradas no artigo 9º do Código Civil, isto é, sem respeito pelo próprio texto da lei e em contrário do pensamento legislativo.
Ou seja, o que resulta da interpretação e aplicação conjugada do disposto naqueles preceitos legais é que a citação de cada um dos devedores, principal ou subsidiário, ocorrida no âmbito do processo de execução fiscal, interrompe a prescrição, cfr. artigo 49º, n.º 1, e só pode ocorrer uma vez relativamente a cada um deles, no entanto, as causas de interrupção da prescrição ocorridas relativamente ao devedor principal são oponíveis ao devedor subsidiário, cfr. artigo 48º, n.º 2, a não ser que a citação deste (devedor subsidiário) ocorra mais de 5 anos após a liquidação do imposto, cfr. artigo 48º, n.º 3.
Ou seja, e como resulta da matéria de facto levada ao probatório da sentença recorrida, a liquidação do imposto ocorreu no ano de 2003 e o devedor subsidiário, aqui recorrente, foi citado para os termos da execução em 28/10/2009, ou seja, mais de 5 anos após a liquidação do imposto, mas menos de 8 anos após a ocorrência de tal liquidação (cfr. artigo 48º, n.º 1) pelo que ocorreu dentro do prazo de prescrição legalmente previsto,
Tendo decorrido mais de 5 anos após a liquidação, sendo certo que o prazo prescricional terminaria sempre em data posterior à da citação do recorrente, aplica-se à situação concreta dos autos o disposto no artigo 48º, n.º 3, ou seja, tudo se passa relativamente ao responsável subsidiário como se nunca tivesse havido qualquer outra citação no processo com virtualidade interruptiva do prazo de prescrição, isto é, o prazo de prescrição só se interrompe com a sua própria citação e por uma única vez, cfr. artigo 49º, n.º 3 da LGT (também no acórdão deste Supremo Tribunal datado de 02/07/2014, rec. n.º 0423/14, se entendeu neste sentido, tendo-se aí sumariado: I - O disposto no artº 48º, nº 3 da Lei Geral Tributária estabelece apenas uma condição de extensão dos efeitos da interrupção da prescrição da dívida tributária relativamente ao devedor originário ao devedor subsidiário e não um novo e mais curto prazo de prescrição em benefício do responsável subsidiário. II - Sendo este citado depois do 5º ano posterior ao da liquidação mas antes de completado o prazo de oito anos contabilizados nos termos do disposto no nº 1 do art. 48º da Lei Geral Tributária não se completou, ainda, qualquer prazo de prescrição).
Portanto, ao contrário do que pretende o recorrente, a aplicação conjugada das regras constantes do disposto nos artigos 48º, n.º 3 e 49º, n.º 3, ambos da LGT, não implica que a interrupção da prescrição só possa ocorrer uma única vez relativamente ao conjunto de todos os devedores, originais, solidários e subsidiários, antes pelo contrário, a citação de cada um deles para o processo de execução constitui uma causa interruptiva própria e singular, que se repercute de forma negativa na sua esfera jurídica, iniciando-se novo prazo apenas nos termos do disposto no artigo 327º, n.º 1 do CC.”

Tomando por referencia o que em dito no acórdão citado e regressando ao caso dos autos verifica-se que as dívidas exequendas dizem respeito a IVA de 2002 2003 e 2004 e IRS de 2002 pelo que aplica-se o regime da Lei Geral Tributária (LGT) que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1999, estabelecendo o prazo de prescrição de oito anos (art. 48.º da LGT).

Estando em causa dívidas de IVA e sendo este imposto de obrigação única o termo inicial do prazo de prescrição (de 8 anos) que se contava, à luz da inicial redacção do n.º 1 do art. 48.º da LGT, a partir da data da ocorrência dos respectivos factos tributários, e não a partir do início do ano civil seguinte, passou a contar-se, por via da alteração que o art. 40.º da Lei nº 55-B/2004 introduziu neste n.º 1, a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto (cfr. Ac. do STA de 14/01/2015, proc. n.º 01684/13). O mesmo se passa com o IRS.

Por conseguinte, in casu, o início do prazo de prescrição é o dia 01/01/2003, 01/01/2004 e 01/01/2005 e o término os dias 31/12/2011, 31/12/2012 e 31/12/2013.

Nos termos do disposto no art. 49.º, n.º 1 da LGT a citação interrompe a prescrição, e por conseguinte a citação do Oponente/Recorrente em 04/11/2010 interrompeu a prescrição, inutilizando o prazo até então decorrido.

Sucede que, a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste for efectuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação (cfr. n.º 3 do art. 48.º da LGT), o que sucedeu no caso em apreço.

Com efeito, considerando as liquidações em causa e que o Recorrente foi citado em 2010 é manifesto que a citação ocorre após o 5.º ano a que se refere o n.º 3 do art. 48.º da LGT, e portanto, a interrupção da prescrição com a citação do devedor principal, não produz efeitos relativamente em relação a ele.

Por outro lado, considerando que o Recorrente foi citado para os termos da execução fiscal na qualidade de responsável subsidiário em 04/11/2010 e que nessa data as dívidas ainda não se encontravam prescritas (conforme supra exposto, o início do prazo de prescrição são os dias 01/01/2003, 01/01/2004 e 01/01/2005 e o término o dia 31/12/2011, 2012 e 2013), verifica-se a interrupção da prescrição com a sua própria citação (por uma única vez conforme dispõe o n.º 3 do art. 49.º da LGT, na redacção dada pela Lei n.º 53.º-A/2006, de 29 de Dezembro).

Interrompido o prazo de prescrição pela citação fica inutilizado todo prazo decorrido anteriormente (art. 326.º, n.º 1 do Código Civil) sendo que o novo prazo de prescrição de 8 anos previsto no n.º 1 do art. 48.º da LGT não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (art. 327.º, n.º 1 do Código Civil) [Ac. do STA de 19/09/2012, proc. n.º 0883/12, Ac. do STA de 20/05/2015, proc. n.º 01500/14, Ac. do TCAS de 19/03/2015, proc. n.º 08542/15, Ac. do TCAS de 18/06/2015, proc. n.º 06446/13], pelo que, in casu, as dívidas não se encontram prescritas.

Na verdade, de acordo com a jurisprudência supra citada, com a qual concordamos, importa entender que “aplica-se à situação concreta dos autos o disposto no artigo 48º, n.º 3, ou seja, tudo se passa relativamente ao responsável subsidiário como se nunca tivesse havido qualquer outra citação no processo com virtualidade interruptiva do prazo de prescrição, isto é, o prazo de prescrição só se interrompe com a sua própria citação e por uma única vez, cfr. artigo 49º, n.º 3 da LGT”.

Ou seja, “a aplicação conjugada das regras constantes do disposto nos artigos 48º, n.º 3 e 49º, n.º 3, ambos da LGT, não implica que a interrupção da prescrição só possa ocorrer uma única vez relativamente ao conjunto de todos os devedores, originais, solidários e subsidiários, antes pelo contrário, a citação de cada um deles para o processo de execução constitui uma causa interruptiva própria e singular”.

Em suma, quando a citação do responsável subsidiário ocorre após ao 5.º ano a que se refere o n.º 3 do art. 48.º da LGT, a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos relativamente àquele, e se na data da citação do responsável subsidiário a dívida ainda não se encontrava prescrita, por não se ter completado o prazo de 8 anos (art. 48.º, n.º 1 da LGT), verifica-se a interrupção da prescrição com a sua própria citação “uma única vez” nos termos do disposto no n.º 3 do art. 49.º da LGT.

Por conseguinte, não assiste razão ao Recorrente quando entende que a sua citação já não pode interromper a prescrição, na medida em que, in casu, é com a sua própria citação que se verifica, pela primeira vez, a interrupção da prescrição relativamente a si próprio (causa interruptiva própria e singular), e portanto, encontra-se respeitado o disposto no n.º 3 do art. 43.º da LGT (na redacção dada pela Lei nº 53º-A/2006, de 29 de Dezembro), e consequentemente as dívidas exequendas não se encontram prescritas, e deste modo o recurso não merece provimento sendo de confirmar a sentença recorrida, também nesta parte, com a presente fundamentação.

Finalmente importa agora saber se o Recorrente conseguiu afastar a sua culpa na dissipação do património societário para o pagamento das dívidas exequendas.
Já vimos o que decidiu, a este respeito, a sentença em análise.
No processo vertente, a eventual responsabilidade subsidiária do Recorrente deve ser analisada à luz do regime previsto no artº.24 da LGT, diploma que entrou em vigor em 1/1/1999 levando em consideração os anos de 2002, 2003 e 2004 uma vez que as dividas aqui em causa são relativas a esse período temporal.
A responsabilidade do gerente pela violação das normas que impõem o cumprimento da obrigação fiscal radica no instituto da responsabilidade por facto ilícito assente em culpa funcional, isto é, em responsabilidade civil extracontratual. O estatuto do gerente/administrador advém-lhe por virtude da sua relação negocial com a sociedade, iniciada com a sua nomeação para o exercício do cargo de gerente e consequente aceitação do mesmo, em virtude do que assume uma situação de garante das dívidas sociais, embora com direito à prévia excussão dos bens da empresa (cfr.art.146º, do CPCI; art.239º, nº.2, do CPT; art.153º, nº.2, do CPPT).
Analisemos agora os regimes que aqui nos importam e que estão consagrados nos art.24º da LGT
“Artigo. 24º da LGT
Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”.

Na previsão da al. a), do normativo em análise pretendem-se isolar as situações em que o gerente/administrador culpado pela diminuição do património societário será responsável pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado depois deste, competindo à Administração Fiscal fazer a prova de que foi por culpa sua que o património se tornou insuficiente.
Já na al. b), do preceito o gerente é responsável pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, recaindo sobre o mesmo o ónus da prova de que não foi por culpa sua que o pagamento não se efectuou.
Por outras palavras, nas situações em que o gestor exerce, efectivamente, as suas funções e é no decurso desse exercício que se forma o facto tributário ou se inicia o prazo para o pagamento, mas antes que tal prazo se esgote, o gestor cessa as suas funções, o ónus da prova, de que o património da sociedade se tornou insuficiente para a satisfação da dívida por acto culposo do gestor, corre por conta da Fazenda Pública (cfr. alínea a), do nº.1, do artigo 24, da L.G.T.). Se é no decurso do exercício efectivo do cargo societário de gerente que se esgota o prazo para o pagamento do imposto, não vindo ele a acontecer (o pagamento não se efectuou no prazo devido), o ónus da prova inverte-se contra o gerente, sendo ele quem tem de provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento (o gestor está obrigado a fazer prova de um facto negativo, poupando-se a Fazenda Pública a qualquer esforço probatório - cfr.al. b), do normativo em exame).
Na alínea b), do nº.1, do artº.24, da LGT, consagra-se uma presunção de culpa, pelo que a Administração Fiscal está dispensada de a provar. Concluindo, se a gestão real ou de facto cessa antes de verificado o momento em que se esgota o prazo para pagamento do imposto, o ónus da prova recai sobre a Fazenda Pública, se a gestão coincide com ele, o ónus volta-se contra o gestor.
A diferença de regimes, em termos de repartição do ónus da prova, prevista nas als. a) e b), do artº.24, da LGT, decorre da distinção entre “dívidas tributárias vencidas” no período do exercício do cargo e “dívidas tributárias vencidas” posteriormente (cfr.al. c) do nº.15, do artº.2, da Lei 41/98, de 4/8 - autorização legislativa ao abrigo da qual foi aprovada a L.G.T.
Aqui chegados, não pode o aplicador do direito esquecer que é pressuposto da responsabilidade subsidiária o exercício de facto da gerência, cuja prova impende sobre a Fazenda Pública, enquanto entidade que ordena a reversão da execução fiscal - cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 27/11/2012, proc.5979/12; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 18/6/2013, proc.6565/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13.

Estando assente que o Recorrente exerceu de facto a gerência da sociedade responsável originária, que o próprio confessa, encontra-se preenchido o primeiro pressuposto da responsabilidade subsidiária.
Atento o acabado de mencionar, exercendo o Recorrente funções de gerência o regime no qual se poderia fundar a sua responsabilidade subsidiária pelas dívidas sociais é o previsto no artº.24, nº.1, al.b), da LGT, o qual faz impender o ónus da prova sobre o gerente revertido, sendo ele quem tem de provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento da dívida exequenda revertida, conforme examinado supra (na alínea b), do nº.1, do artº.24, da LGT, consagra-se, portanto, uma presunção de culpa, que onera o revertido, a aferir pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso concreto.
Concluindo que a sociedade não teria possibilidade de cumprir as suas obrigações tributárias, deveria o Recorrente ter tomado medidas no sentido de obviar a esta situação, maxime, pedindo a declaração de insolvência da empresa atempadamente. Esta forma de actuação era imposta pelo citado critério do bom pai de família, do gerente competente e criterioso.

Percorrendo todo o probatório não podemos concluir como na sentença recorrida.
A divida constante da alínea G) do probatório foi, tal como demonstraram as testemunhas, o inicio de enumeras dificuldades financeiras na sociedade executada originária e o facto de o Recorrente ter intentado uma acção declarativa de condenação pedindo que a “Sociedade, Lda.” fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 19.398.310$00, embora relativa a dividas de 1999, ou seja muito anterior ao período aqui em causa, demonstra que aquele agiu de forma diligente no sentido de resolver a situação financeira. Tendo em seguida intentado a respectiva acção executiva embora a penhora de bens da sociedade devedora “, Lda. apenas tenha ocorrido em 2004, muito tarde para a recuperação da executada originária.
Também ficou provado, que alguns clientes não pagaram os serviços prestados pela devedora originária, sendo certo que o não recebimento do IVA dos clientes, em certa medida, justifica a dificuldade que o mesmo seja entregue ao Estado, designadamente por se mostrar estabelecida a conexão entre a falta de fundos da empresa e o não recebimento dos clientes.
Do probatório resulta efectivamente demonstrado que não existiu qualquer relação causal entre a actuação do Recorrente e a insuficiência patrimonial da empresa, pelo contrário, este tomou medidas para resolver a situação, mas que foram infrutíferas.
Pode, pois, considerar-se que o Recorrente logrou ilidir a presunção de culpa pelo não pagamento da dívida exequenda que sobre si impendia.
Fazendo tal prova, deve considerar-se procedente este fundamento do recurso e, consequentemente, julgar parte ilegítima para a execução fiscal quanto a tais dívidas, devendo extinguir, quanto a si, a citada execução enquanto responsável subsidiário.
Concluindo, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se procedente o presente recurso.

III.DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida e julgar procedente a oposição.
Custas pela Recorrida.
Lisboa, 09 de Junho de 2016.


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(Barbara Tavares Teles)



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(Pereira Gameiro)


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(Anabela Russo)