Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1088/13.0BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:01/11/2023
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:REVERSÃO
AUDIÇÃO
NOTIFICAÇÃO
Sumário:I - A reversão é precedida de audição do revertido.

II – A notificação para tal exercício deve ser feita por carta registada.

III - No caso, a Administração Tributária optou voluntariamente por uma forma de notificação mais exigente, recorrendo ao correio registado com aviso de receção (AR). Apesar de o AR não ser, neste caso, legalmente exigido, nada obsta à sua utilização, a qual se traduz em garantias acrescidas na comunicação, para além das que o simples registo já encerra.

IV - Tendo sido remetido o primeiro (e único) ofício para notificação do projeto de despacho de reversão através de carta registada com AR, teremos que convocar as normas legais aplicáveis a esta forma de notificação.

V - Não pode ter-se como notificado o projeto de reversão remetido através de correio registado com AR, por inexistir evidência de tal aviso devidamente assinado e datado, nem se demonstrar, por qualquer outro meio, que o seu destinatário teve conhecimento da comunicação destinada ao exercício do direito de audição prévia à reversão.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

A Fazenda Pública dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Almada que considerou procedente a oposição deduzida por C ………………………, enquanto revertido, no âmbito da execução fiscal nº …………………..196 e apensos, originariamente instaurada contra a sociedade “P ........................... Construção e Reparação, Lda.”, para a cobrança coerciva de dívidas de IRC (2010) e IRS (2011), no montante total de €34.171,23, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional.

Alegou e, subsequentemente, formulou as seguintes conclusões:

«I. Sempre com ressalva do merecido respeito, que muito é, desde logo não se pode deixar de referir factualidade levada ao ponto 8 do probatório, não se mostra correta, pois que, como se deixou dito em sede de contestação, e consta provado nos autos, a notificação para audição prévia, foi remetida para o domicílio fiscal do Oponente por carta registada;

II. Consta dos autos de execução fiscal, cópia do talão de aceitação de registo dos CTT com referência alfanumérica RD …………….PT (também foi junto com a contestação).

III. A cópia do talão de aceitação de registo dos CTT tem aposto o carimbo da Estação dos correios de A........... em que consta a data 2013.01.29.

IV. Assim sendo, como é, a Administração Tributária (AT), nunca poderia juntar aos autos o aviso de receção referente ao ofício, remetido ao oponente, notificando-o para exercer o seu direito de audição antes da reversão por o mesmo nunca ter existido.

V. Das normas conjugadas do nº4 do art.º23º e nº 4 do art. 60º, ambos da LGT, resulta que a notificação para o exercício do direito de audição deve ser efetuada por carta registada enviada para o domicílio fiscal do contribuinte direto, substituto ou responsável subsidiário, atento o disposto no n.º 3 do art. 18º da LGT.

VI. A notificação para exercício do direito de audição prévia à decisão de reversão da execução fiscal foi remetida para o domicílio fiscal do Oponente, com o formalismo legalmente exigido: carta registada.

VII. A carta registada, pela qual foi efetuada a notificação para o exercício do direito de audição prévia, não foi devolvida.

VIII. Ressalvado o devido respeito por diverso entendimento e melhor opinião, entendemos não ser de aplicar, in casu, o n.º5 do art. 39º do CPPT, não sendo de notificação, ainda que se perfilhe o entendimento perfilhado pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA), no acórdão de 2012.01.31, no recurso 17/12, citado na sentença ora recorrida.

IX. Sendo esse, também, o entendimento do STA, que se entende ser o vertido no Acórdão de 16/05/2012, proferido no Recurso nº 01181/11, quando refere que não tendo sido devolvida a carta, o nº 1 do artigo 39º do CPPT presume que a notificação se efetuou no 3º dia posterior ao registo;

X. Está provado nos autos que a notificação para o exercício do direito de audição prévia foi remetida para o domicílio fiscal do Oponente, ora Recorrido, por carta registada mostrando-se junto aos autos o respetivo talão de aceitação, pelo que nos termos dos n.os 1 e 2 do art.º 39º do CPPT, a notificação presume-se efetuada no 3º dia posterior ao do registo, competindo ao oponente provar que a recebeu em data posterior ou que não a recebeu.

XI. O Oponente limita-se a alegar não ter sido notificado para o exercício do direito de audição, não desenvolvendo qualquer esforço probatório nesse sentido, nomeadamente requerendo à AT ou ao Tribunal que fosse requerida informação sobre a data de receção (ou impossibilidade de entrega da mesma).

XII. Ao decidir como o fez, o douto Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento da matéria de facto ao ter dado como provado que a notificação para exercício da audição prévia foi realizada por carta registada com aviso de receção, quando o foi por carta registada simples, e em erro na interpretação e aplicação do direito violando os n.os 1 e 2 do artigo 39º do CPPT e n.º 4 do art. 60º da LGT.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, com o douto suprimento judicial, requer-se a V.as Ex.as se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e, em consequência, ser a douta Sentença ora recorrida, revogada e substituída por douto Acórdão que julgue a presente oposição IMPROCEDENTE, tudo com as devidas e legais consequências.»


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O Recorrido, devidamente notificado para o efeito, optou por não contra-alegar.

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Neste TCA, o Exmo. Magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.

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Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«1. A sociedade anonima sob a firma “P……….– ………………………. e Reparação, S.A..” tinha nomeados como membros do Conselho de Administração, desde a sua constituição, o oponente e dois vogais, sendo que nos actos de mero expediente bastava a assinatura de um administrador e nos restantes actos de dois administradores, de um administrador e de um procurador ou de dois procuradores (cfr. certidão da Conservatória do Registo Comercial de A..........., a fls. 9 a 16 do processo de execução fiscal junto aos presentes autos);

2. Em 18/12/2009 foi alterada a forma de obrigar a sociedade passando a ser apenas necessária a assinatura de um administrador ou de dois procuradores mandatados para o efeito, continuando o oponente a fazer parte do conselho de Administração (cfr. certidão da Conservatória do Registo Comercial de A……………., a fls. 9 a 16 do processo de execução fiscal junto aos presentes autos);

3. Em 30/04/2011, foi instaurado no Serviço de Finanças de A……………, contra a sociedade comercial anonima sob a firma “P …………………….. e Reparação, S.A..”, o processo de execução fiscal nº …………………….196, para cobrança coerciva de IRS de 2011 cujo prazo de pagamento voluntario ocorreu em 20/03/2011, no montante de €15.966,00 (cfr. fls. 1 e 2 do processo executivo junto aos autos);

4. Ao processo de execução fiscal identificado no ponto anterior foram apensos os processos de execução fiscal nºs ……………….272, ……………………612 e ………………..872, referentes a dívidas de IRC de 2010 cujo prazo de pagamento voluntario ocorreu em 31/08/2011 e IRS de 2011 cujos prazos de pagamento voluntário ocorreram em 20/05/2011 e 20/06/2011, ficando a dívida a valer por € 34.171,93 (cfr. docs. juntos a fls.7, verso, do processo executivo junto aos autos);

5. Por ofício de 23/05/2011 do Tribunal de Comércio de Lisboa – 2º Juízo, foram avocados os processos executivos para processo nº………/11.0TYLSB – Insolvência pessoa colectiva da sociedade identificada no ponto 1 (cfr. doc. de fls. 3 do processo executivo junto aos autos);

6. Em 18/05/2011 foi proferida sentença de declaração de insolvência da sociedade identificada nos pontos anteriores, a qual foi registada, provisória por natureza em 25/05/2011, tendo sido nomeado administrador da insolvência J ………………………… (cfr. certidão da Conservatória do Registo Comercial de A..........., a fls. 9 a 16 e 4 a 6 do processo de execução fiscal junto aos presentes autos);

7. Em 21/01/2013 foi proferido despacho pelo do Chefe do Serviço de Finanças de A..........., no sentido de ser ouvido o oponente sobre a intenção de reversão relativamente aos processos de execução fiscal melhor identificado nos pontos 3 e 4 (cfr. doc. junto a fls. 19 do processo de execução fiscal junto aos autos);

8. Ao oponente foi remetido oficio notificando-o do despacho identificado no ponto anterior, através de carta registada com aviso de recepção (cfr. doc. de fls. 26 a 27 e uma fl. agrafada não numerada, do processo executivo junto aos autos);

9. Em 07/05/2012 foi proferido despacho revertendo as dívidas contra o oponente, do qual consta o seguinte: “Através da análise de instrução do presente processo, constata-se a insuficiência de bens pertencentes à executada e originária devedora “P……….. -………………… e Reparação, S.A..” (…). As informações oficiais prestadas referem o seguinte, relativamente à mesma firma: 1. A sociedade encontra-se devidamente matriculada na Conservatória do Registo Comercial de A........... e iniciou a sua actividade, para efeitos fiscais e para o exercício de pre-fabricação de elementos de betão armado e pré-esforçado, construção industrializadas, reparação de estruturas e produção e comercialização de betão pronto, CAE 23610-R3, em 1989-05-05, tendo passado por tal facto a ser Sujeito Passivo do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectiva (IRC) e Sujeito Passivo do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), enquadrado no regime de periodicidade mensal; 2. A sociedade ainda não foi cessada. 3. A dívida exequenda nos presentes autos é de € 34.171,93 (…) 4. A sociedade foi declarada insolvente a 23/05/2011 pelo Tribunal de Comércio de Lisboa – 2º Juízo no âmbito do processo ………../11.0TYLSB. 5. À data da constituição das dívidas, era gerente, de direito e de facto, da executada e devedora originária: (…) ii. C ……………………….. (…), gerente desde 1998/05/05; a forma de obrigar a sociedade é com a assinatura de dois administradores; Toda a informação antes relatada fundamenta-se no seguinte: - Informações/averiguações que antecede, conclui-se que eram sócios-gerentes, de direito, presumindo-se também de facto*, nos termos do artigo 11º do Código do Registo Comercial, da executada e devedora originária, funções que exerciam efectivamente, traduzindo-se estas, na prática de actos reveladores da administração da originária devedora, pelo que, nos termos dos artigos 23º e 24º nº 1 b) da Lei Geral Tributária (LGT), a eles devem ser imputadas as responsabilidades de cariz subsidiário, pelo não pagamento dos impostos em falta, cujo facto constitutivo e/ou prazo legal de pagamento tenham ocorrido no período de exercício do seu cargo, foram e são responsáveis pelos actos decorrentes da actividade da devedora originária, nomeadamente no que diz respeito ao período de origem das dívidas, bem como ao tempo da liquidação e/ou cobrança das mesmas. Projectado esse sentido de decisão, foi, por despacho de 25 de Janeiro de 2013, determinado que se desse cumprimento ao disposto nos nºs 4 a 6 do art.º 60º da LGT, tendo em vista a observância do nº 4 do artigo 23º da mesma Lei (LGT). Assim se cumpriu. Foi remetida, para a morada constante do cadastro, a notificação para audição prévia, em 29/01/2013, através de carta registada (…) Os virtuais responsáveis subsidiários não exerceram o direito de audição. Face ao exposto, constatada a insuficiência de bens da originária devedora e tendo como fundamento legal o disposto na alínea a) do nº2 do artigo 153º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), ORDENO A REVERSÃO DA EXECUÇÃO, contra os responsáveis subsidiários E ………………., NIF ………………… e E ………………….., NIF ………………….., nos termos dos artigos 23º e alínea b) do nº1 do 24º da Lei Geral Tributária (LGT), por toda a quantia exequenda em dívida nos autos. A decisão agora produzida funda-se na presunção legal de culpa, do gerente acima identificado, baseada nas informações oficiais e provas documentais inclusas nos autos. Os períodos de vigência da legislação invocada, e que antes se expressaram, vigoram não só para o período a que respeita a dívida, como também para aquele e que decorreu o respectivo prazo legal de pagamento. (…)” (cfr. doc. de fls. 28 e 29 do processo executivo junto aos autos);

10. Ao oponente foi remetido ofício de citada datado de 19/09/2013 e cujo aviso de recepção foi assinado por Maria ………………….. em 27/09/2013 (cfr. docs. de fls. 35 a 38 do processo executivo junto aos autos);

11. O oponente era administrador da devedora originária (depoimento das duas testemunhas arroladas e ouvidas);

12. A partir de 2010 começou a haver problemas de pagamentos por parte dos seus clientes (depoimento das testemunhas arroladas);

13. Os bens foram vendidos no âmbito da insolvência depois do administrador da insolvência ter encerrado a fábrica (depoimento das testemunhas arroladas).


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B) DOS FACTOS NÃO PROVADOS

Dos autos não consta o aviso de recepção referente ao ofício de 24/01/2013, notificando o oponente para exercer o seu direito de audição antes da reversão.

Dos processos executivo não consta qualquer diligência no sentido de apurar se existem bens da devedora originária.

Dos factos constantes da oposição, todos objectos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.


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A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, bem como no depoimento das testemunhas ouvidas pelo Tribunal. A testemunha F …………………., trabalhou na devedora originária desde 2000 até ao momento da insolvência em 2011. A empresa tinha vários funcionários, tendo alguns deles sido contratados em regime de subcontratos. Era o tesoureiro da devedora originária. Afirmou que o grande cliente a RPP Solar Energia, na zona de Abrantes, era uma obra grande, com valores de cerca de 3/4 milhões de euros. Esta empresa não pagou nada. Foram emitidos cheques pré-datados e esses cheques não são pagos. Quando os cheques foram entregues ao Banco foram devolvidos. A obra já estava praticamente concluída mas tiveram de a suspender para pressionar o pagamento e também porque os parceiros da obra também não podiam continuar a trabalhar. A obra parou em Fevereiro/Março e cerca de três meses depois foi declarada a insolvência. Também outros dois ou três clientes que tinham deixaram de pagar. Quando foi declarada a insolvência o administrador da insolvência deslocou-se à fábrica e declarou que a fábrica ia ser encerrada. De seguida os bens foram vendidos no âmbito da insolvência. O depoimento desta testemunha foi claro, seguro e coerente. Demonstrou ter conhecimento directo dos factos a que depôs pelo que o seu depoimento foi relevado pelo Tribunal.
C …………………………….., era engenheiro na fábrica e também trabalhou na devedora originária de 2007 até à insolvência. O depoimento foi seguro, coerente e demonstrou ter conhecimento directo dos factos sobre que depôs pelo que o seu depoimento foi relevado por este Tribunal.
Ambos reconheceram o Oponente como tendo sido a sua entidade patronal juntamente com o outro administrador.»

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- De Direito





Como se percebe pelas conclusões da alegação de recurso, a oposição foi julgada procedente com fundamento no não cumprimento da exigência legal de notificação prévia à reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário.


Efetivamente, a sentença considerou, a propósito deste primeiro vício (entre outros alegados), o seguinte: “Desde decorre do probatório supra que a AT procedeu ao envio de carta regista com aviso de recepção para o domicílio do oponente em 29/01/2013 (cfr. ponto 8 do probatório supra). Acontece que ao processo executivo não foi junto, nem aos presentes autos, qualquer documento comprovativo pela AT em como o ofício em referência chegou ao seu destinatário”.


A Recorrente, Fazenda Pública, insurge-se contra o assim decidido, começando por pôr em causa a matéria de facto, em concreto o ponto 8 do probatório, na parte em que aí se deixou consignado que a comunicação para o exercício do direito de audição foi feita através de carta registada com aviso de receção e não (apenas) através de correio registado. Por seu turno, e face ao apontado erro de julgamento de facto, a Recorrente imputa à sentença o erro de direito consubstanciado na errada conclusão quanto à não efetivação da notificação para o exercício do direito de audição prévia à reversão.


Vejamos, então, começando pelo erro de julgamento de facto, concretamente pelo apontado número 8 do probatório, do qual consta o seguinte:


“8. Ao oponente foi remetido ofício notificando-o do despacho identificado no ponto anterior, através de carta registada com aviso de recepção (cfr. doc. de fls. 26 a 27 e uma fl. agrafada não numerada, do processo executivo junto aos autos)”.


Com efeito, vistas as apontadas “fls. 26 a 27 e uma fl. agrafada não numerada, do processo executivo junto aos autos”, há que concluir que a comunicação para o exercício do direito de audição foi efetuada através de correio registado em mão e com aviso de receção, conforme quadrículas assinaladas no próprio talão de aceitação respeitante ao correio registado com o código RD ………………PT. O tão de aceitação em causa corresponde precisamente ao documento não numerado e que se mostra agrafado a fls. 27 do PEF apenso.


Nesta medida, contrariamente ao pretendido, não há que alterar o teor do número 8, na parte em que aí se se faz referência ao aviso de receção, já que – repete-se – esse serviço especial (AR) mostra-se concretamente assinalado no talão de aceitação em causa.


Ainda assim, e para que melhor se perceba o circunstancialismo em causa, aditam-se ao probatório os seguintes factos:


8.1 O ofício referido em 8 foi emitido em 24 de janeiro de 2013, pelo Serviço de Finanças de A..........., no âmbito dos processos de execução fiscal m.i em 3 e 4, tendo sido dirigido a C …………………. (cfr. fls. 26 e 27 do PEF apenso);


8.2. Em 29 de janeiro de 2013, o ofício referido em 8 e 8.1) foi enviado para o Oponente, mediante carta registada, em mão, e com aviso de receção, com a referência postal RD………………PT, remetido para a Avenida …………, 35-2ºesquerdo, ……..-228 …………., constando do canto inferior esquerdo aposição manuscrita do respetivo número do processo executivo e da sociedade devedora originária, nos termos seguintes: “……………….196 P………….” (Cfr. fls. 26, 27 e talão de aceitação agrafado, em especial as quadriculas assinaladas quanto ao serviço postal contratado, tudo junto ao PEF apenso).


Impõe-se, igualmente, uma palavra relativamente à matéria de facto não provada, concretamente à asserção correspondente ao seguinte: “Dos autos não consta o aviso de recepção referente ao ofício de 24/01/2013, notificando o oponente para exercer o seu direito de audição antes da reversão”. Trata-se de uma asserção que, contrariamente ao pretendido, é de manter.


Realce-se que, tal como resulta dos autos, após promoção do EMMP em 1ª instância, o Tribunal oficiou o SF de A........... no sentido de ser remetido aos autos “comprovativo de ter sido efetuada a notificação para o exercício do direito de audição prévia, designadamente documento proveniente dos CTT que comprove ter sido a carta registada expedida entregue ao contribuinte”.


Em resposta a tal, o SF informou, naquilo que para aqui importa, que não dispunha de “acesso ao comprovativo de entrega do projecto de reversão”, mais dizendo que os elementos disponíveis no SF correspondem aos que se encontram junto do PEF remetido ao Tribunal.


Assim sendo, há que manter o que foi consignado nos factos não provados.


Estabilizada a matéria de facto, avancemos para o erro de direito.


Lê-se na sentença, a este propósito, o seguinte:


“Desde decorre do probatório supra que a AT procedeu ao envio de carta registada com aviso de recepção para o domicílio do oponente em 29/01/2013 (cfr. ponto 8 do probatório supra).


Acontece que ao processo executivo não foi junto, nem aos presentes autos, qualquer documento comprovativo pela AT em como o ofício em referência chegou ao seu destinatário.


Como se decidiu no STA, no Acórdão de 16/05/2012, no processo nº01181/11, com o qual se concorda pelo que se transcreve o seu sumário na parte relevante: “I – É a administração tributária que tem o ónus de demonstrar que efectuou a notificação de forma correcta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais. II – O «recibo de aceitação» e o «recibo de entrega» da carta registada pelos serviços postais, previstos nos n°s 2 e 4 do artigo 28° do Regulamento do Serviço Público de Correios são documentos idóneos para provar que a carta foi registada, remetida e colocada ao alcance do destinatário. III – Trata-se, porém, de uma formalidade simplesmente probatória ou «ad probationem», cuja falta pode ser substituída por outros meios de prova. IV – O registo informático dos mesmos dados de facto existente em entidades diferentes, o emissor (Administração Tributária) e o distribuidor da carta (CTT), é uma circunstância concreta que, num sistema de livre apreciação das provas, ainda que limitado pelo princípio da persuasão racional, justifica suficientemente que se dê como provado que o registo foi efectivamente realizado. (…)”


Acresce que o Serviço de Finanças de A........... foi notificado para juntar aos autos comprovativo da notificação do oponente para exercício do direito de audição prévia, designadamente documento proveniente dos CTT que comprove ter sido a carta registada expedida entregue ao oponente, tendo respondido que não possui tais elementos invocando que o procedimento de reversão foi efectuado centralmente e de forma automática, não tendo o serviço acesso ao comprovativo de entrega do projecto de reversão.


Ora, não se encontrando efectuada a prova necessária pela AT da notificação do oponente, o que conduzirá à necessária procedência da presente oposição.


Assim sendo, sempre se julgaria procedente a presente oposição”.


A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, sustentando, no essencial, que “Está provado nos autos que a notificação para o exercício do direito de audição prévia foi remetida para o domicílio fiscal do Oponente, ora Recorrido, por carta registada mostrando-se junto aos autos o respetivo talão de aceitação, pelo que nos termos dos n.os 1 e 2 do art.º 39º do CPPT, a notificação presume-se efetuada no 3º dia posterior ao do registo, competindo ao oponente provar que a recebeu em data posterior ou que não a recebeu”.


Comecemos por esclarecer um equívoco que é patente nos autos. É que, sem prejuízo da forma legalmente exigida para efeitos de notificação do exercício do direito de audição prévia à reversão ser a carta registada, a verdade é que, no caso, e contrariamente ao que afirma a Recorrente, o SF competente optou por uma forma de notificação mais exigente, ou seja, a carta registada com aviso de receção. Isso mesmo se mostra patente no julgamento da matéria de facto.


Com isto dito, avancemos.


Dispõe o nº 4 do artigo 23º da LGT que “a reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação”.


Por seu turno, o artigo 60º, nº 4 da LGT preceitua que “o direito de audição deve ser exercido no prazo a fixar pela administração tributária em carta registada a enviar para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte”.


Temos, pois, que a reversão é precedida de audição do revertido e, bem assim, que a notificação para tal exercício deve ser feita por carta registada.


No caso - não oferece dúvidas – a Administração Tributária (AT) optou voluntariamente por uma forma de notificação mais exigente, isto é, recorreu ao correio registado com aviso de receção (AR), quando apenas lhe era exigido o recurso ao correio registado. Apesar de o AR não ser, neste caso, legalmente exigido, nada obsta à sua utilização, a qual se traduz em garantias acrescidas na comunicação, para além das que o simples registo já encerra.


Assim, tendo sido remetido o primeiro (e único) ofício para notificação do projeto de despacho de reversão através de carta registada com AR, teremos que convocar as normas legais aplicáveis a esta forma de notificação.


E aqui rege o disposto no artigo 39º, nºs 3 a 6 do CPPT, nos termos dos quais:


“3 - Havendo aviso de recepção, a notificação considera-se efectuada na data em que ele for assinado e tem-se por efectuada na própria pessoa do notificando, mesmo quando o aviso de recepção haja sido assinado por terceiro presente no domicílio do contribuinte, presumindo-se neste caso que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário.


4 - O distribuidor do serviço postal procederá à notificação das pessoas referidas no número anterior por anotação do bilhete de identidade ou de outro documento oficial.


5 - Em caso de o aviso de recepção ser devolvido ou não vier assinado por o destinatário se ter recusado a recebê-lo ou não o ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal, a notificação será efectuada nos 15 dias seguintes à devolução por nova carta registada com aviso de recepção, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada, sem prejuízo de o notificando poder provar justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação da mudança de residência no prazo legal.


6 - No caso da recusa de recebimento ou não levantamento da carta, previstos no número anterior, a notificação presume-se feita no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil.”


No caso, temos que o revertido, ora Recorrido, afirma desde a p.i que não foi notificado para exercer o direito de audição, ou seja, não lhe foi entregue a comunicação para tal.


Os autos não evidenciam que a carta tenha sido devolvida ou que não tenha sido remetida para o endereço correto. Apesar disso, o aviso de receção não foi exibido (apesar de pedido pelo Tribunal), como se impunha caso o mesmo tivesse sido devolvido ao remetente (SF), devidamente assinado e datado por quem recebesse o objeto postal.


Relembre-se, nos termos do regime legal transcrito, que “havendo aviso de receção, a notificação considera-se efetuada na data em que ele for assinado e tem-se por efetuada na própria pessoa do notificando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro presente no domicílio do contribuinte, presumindo-se neste caso que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário”.


Na situação em apreciação, não se demonstra (seja pela falta de exibição do AR, ou por qualquer outro meio) que a carta chegou efetivamente ao seu destinatário (a justificação do aviso de receção também se prende com a segurança probatória, traduzindo-se, aliás, numa formalidade “ad probationem”, cuja falta pode ser substituída por outros meios de prova) e essa prova pertencia à Fazenda Pública.


Conforme escreve Jorge Lopes de Sousa (referindo-se à não satisfação do requisito da notificação que é a identificação da pessoa que assina, com anotação do número de um seu documento de identificação, aqui aplicável com as necessárias adaptações que a situação concreta reclama) “a notificação é irregular e inválida, se não se demonstrar, por qualquer meio, que a carta chegou efectivamente aos seus destinatários. Na verdade, como vem sendo jurisprudência do STA, as formalidades procedimentais previstas na lei são essenciais, apenas se degradando em não essenciais se, apesar delas, for atingido o fim que a lei visava alcançar com a sua imposição. Não se cumprindo todas as formalidades da notificação e não se provando, que apesar de elas não terem sido cumpridas, foi atingido o objectivo que se visava alcançar com a notificação, esta é inválida. Neste caso, sendo sobre a administração tributária que recai o ónus da prova dos pressupostos de que depende o seu direito de exigir a obrigação tributária (art. 342º, nº 1, do CC), designadamente que houve uma notificação validamente efectuada ou foi atingido o fim por ela visado de transmitir aos destinatários o teor da liquidação, tem de se valorar processualmente a favor dos destinatários da notificação a dúvida sobre estes pontos, o que se reconduz que tudo se passe, para efeitos do processo, como se tal notificação não tivesse ocorrido”. – cfr. Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição 2011, Vol. I, anotação 5 ao art. 39º, p. 384.


Temos, pois, tal como concluiu a sentença, que não pode ter-se como notificado o projeto de reversão remetido através de correio registado com AR, por inexistir evidência de tal aviso devidamente assinado e datado, nem se demonstrar, por qualquer outro meio, que o seu destinatário teve conhecimento da comunicação destinada ao exercício do direito de audição prévia à reversão.


Ora, cabendo à FP, aqui Recorrente, a prova da concretização da notificação do ato em questão e não tendo, nos termos expostos, logrado demonstrar tal notificação, tal só pode levar-nos a concluir, como decidido, pela preterição do direito de audição prévia à reversão, em violação dos artigos 23º, nº4 (“A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação”) e 60º da LGT, preceito onde se regula o exercício do princípio da participação.


A audição prévia do responsável subsidiário concretiza o direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe digam respeito, consagrado no artigo 267.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa (CRP), sendo que, no procedimento de reversão, a audição prévia do contribuinte permite contrapor ao projeto de decisão, que foi notificado ao revertido, as razões de discordância e a apresentação de meios de prova (artigos 23.º, n.º 4 e 60.º da LGT).


Tudo isto, no caso, ficou comprometido, pois – repete-se – não está demonstrado que C ………………… tenha sido notificado para exercer o direito de audição prévia à concretização da reversão da dívida, a título de responsável subsidiário.


Portanto, e sem necessidade de mais delongas, há que julgar improcedentes todas as conclusões atinentes à questão que vimos de analisar, mantendo o sentido decisório da sentença recorrida.


Há, pois, que negar provimento ao recurso jurisdicional, o que aqui se determina.



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III - Decisão


Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso.


Custas pela Recorrente.


Registe e notifique.


Lisboa, 11/01/23


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(Catarina Almeida e Sousa)


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(Isabel Fernandes)


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(Lurdes Toscano)