Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 146/22.4 BELLE |
| Secção: | CT |
| Data do Acordão: | 06/22/2023 |
| Relator: | CATARINA ALMEIDA E SOUSA |
| Descritores: | OPOSIÇÃO DÍVIDAS À SEGURANÇA SOCIAL DISCUSSÃO SOBRE A LEGALIDADE DA DÍVIDA |
| Sumário: | I – No caso, toda a argumentação do Oponente, no sentido de que a Segurança Social não deveria ter indeferido o seu pedido de isenção do pagamento das contribuições que lhe estão a ser exigidas coercivamente, reporta-se à legalidade concreta (e não abstrata) da dívida exequenda.
II - Nem toda a ilegalidade da liquidação é admissível como fundamento da oposição. III – Como mostra o julgamento de facto, o indeferimento do reconhecimento da isenção foi judicialmente contestado e, como tal, a apreciação da legalidade de tal ato está já sob a alçada dos tribunais, através da apresentação da ação administrativa que está pendente no TAF. IV - Não pode o Oponente pretender que a legalidade do ato tributário seja sindicada judicialmente em sede de oposição, pois que lho não permite a alínea h) do art. 204.º, n.º 1, do CPPT. |
| Votação: | UNANIMIDADE |
| Aditamento: |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul
I – RELATÓRIO S ……………………, deduziu no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Loulé oposição judicial à execução fiscal nº ……………….937 que lhe foi movida pela Secção de Processo Executivo de Faro, do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I,P., com vista à cobrança coerciva de contribuições de trabalhador independente, no valor de €14.629,50. Por sentença do referido Tribunal, datada 21/12/22, a presente oposição foi julgada improcedente. Inconformado com o decidido, o oponente apelou para Tribunal Central Administrativo Sul tendo, na sua alegação, formulado as seguintes conclusões: «A) O tribunal “a quo” julgou improcedente a oposição apresentada pelo Recorrente, com o fundamento de que os argumentos por este invocados não constituem fundamento de oposição e atenta a existência da acção administrativa n.º 32/21.5BELLE que corre termos no tribunal “a quo”, concluindo assim encontrar-se apresentado o meio processual para a assegurar o efeito pretendido pelo Oponente e não poder a oposição prosseguir para conhecer das questões alegadas. B) O Recorrente entende que o tribunal “a quo” laborou em erro na apreciação feita da situação apresentada e fundamentos invocados, que considera estarem abrangidos pelo âmbito de aplicação da alínea h) do n.º 1 do artigo 204º do CPPT. C) Estando em causa contribuições para a segurança social não existe um acto de liquidação propriamente dito – o acto de liquidação consiste no acto de extracção da certidão confirmativa da existência da dívida, configurando este o acto jurídico de aplicação de uma norma tributária material, praticado por uma autoridade administrativa, com força executiva, em relação ao qual não é assegurada qualquer via autónoma de impugnação do acto da entidade emitente do título executivo. D) In casu, verificando que a extracção da certidão de dívida é equipada a acto de liquidação, o Oponente/Recorrente invocou, como fundamento da oposição “a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação”, nos termos da alínea h) do artigo 203º do CPPT, cujo conhecimento se impõe. E) Neste sentido, quer a jurisprudência, quer a doutrina, são unânimes ao defender que no caso das contribuições para a Segurança Social a oposição à execução fiscal será o meio processual adequado para impugnar a legalidade do acto de extracção da certidão confirmativa da dívida, posto que em relação esta dívida não é assegurada ao contribuinte qualquer via autónoma de impugnação e daí que o uso do meio processual de oposição à execução fiscal seja abrangido pelo campo de aplicação da norma constante da alínea h) do artigo 204º, não restando qualquer dúvida de que é o meio adequado para reagir da legalidade em concreto de dívidas exequendas, relativas a contribuições e quotizações devidas à Segurança Social e radicadas em declarações de remunerações apresentadas - e não em mapas de remunerações oficiosamente preenchidos pelo ISS – como é precisamente o caso. F) Caso o tribunal “a quo” entendesse que a oposição não era o meio adequado para o efeito pretendido, o que por mero dever de patrocínio se refere, deve entender-se que o tribunal “a quo” podia e devia ter procedido à convolação da oposição na forma adequada, por exigência expressa do artigo 98º, n.º 4, do CPPT, por razões de celeridade e justiça tributárias, nos termos do artigo 97º, n.º 3, da LGT, como tem vindo a ser unanimemente decidido pelos tribunais superiores. G) Ao contrário do que foi aflorado pelo douto tribunal “a quo” o facto de correr termos a acção administrativa n.º 32/21.5BELLE no mesmo tribunal não pode obstar à consideração de que os fundamentos invocados pelo Recorrente constituem fundamento de oposição e através disso considerar que foi apresentado o meio adequado para conhecer da pretensão do Recorrente e concluir pela improcedência da oposição apresentada. H) Em virtude das diferenças funcionais e estruturas existentes entre os dois tipos de acção tem vindo a entender-se que não pode existir litispendência entre a acção declarativa e executiva. I) Ao ter decidido julgar improcedente a oposição, ao invés de no limite ter decidido suspender a instância executiva por pendência de causa prejudicial anteriormente deduzida, nos termos do disposto no artigo 272º. n.º 1, do CPC, até ao trânsito em julgado da decisão a proferir na acção administrativa, o tribunal “a quo” coloca em risco poderem as questões substantivas levantadas em sede de oposição (e que constituem fundamento para a sua interposição) nunca virem a ser conhecidas. J) Porquanto, o tribunal onde corre termos a acção administrativa pode vir a entender que as questões suscitadas constituem fundamento de oposição judicial e só podem ser conhecidas nesse âmbito, caso em que já não será admitida a convolação da acção administrativa no meio próprio (oposição à execução fiscal), por não se encontrarem reunidos os pressupostos legais exigidos para o efeito, designadamente por se entender que o meio não foi proposto dentro do prazo de 30 dias previsto para a dedução da oposição judicial, o que não se pode admitir, sob pena de violação direito à tutela jurisdicional efectiva com assento constitucional no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, que será frontalmente violado caso o Oponente não possa ver a sua pretensão conhecida e apreciada judicialmente. K) Conclui-se, assim e no limite, que o tribunal “a quo” não podia ter julgado improcedente a oposição deduzida e ao invés disso devia ter conhecido da pretensão do Oponente ou, no limite, deveria ter suspendido a instância executiva até à prolação da decisão no âmbito da acção administrativa que pende no mesmo tribunal. L) Ao ter procedido em sentido diverso, o tribunal “a quo” laborou em erro na aplicação do Direito e violou referidas disposições legais que impunham actuação diversa, designadamente os artigos 204º, n.º 1, h), artigos 98º, n.º 4, do CPPT, artigo 97º, n.º 3, da LGT e 272º, n.º 1, do CPC, bem como os normas-princípio aludidas, constituindo tal fundamento da interposição do presente recurso. Termos em que, deverá o presente recurso ser julgado procedente, com as devidas consequências legais, como é de liminar Justiça!» * Não há registo de contra-alegações. * A Exma. Magistrada do Ministério Público (EMMP) pronunciou-se no sentido de ser negado provimento do recurso. * Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão. * II – FUNDAMENTAÇÃO - De facto A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos: «A) Em 12-10-2019, foi instaurado contra o ora Oponente, pela secção de processo executivo de Faro do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., o processo de execução fiscal n.º ……………..937, para cobrança coerciva de dívida relativa ao não pagamento de contribuições como trabalhador independente, no valor total de € 14.629,50 – cfr. fls. 1 a 4 do registo do sitaf n.º 004690800; B) Em 15-01-2021, o ora Oponente intentou ação administrativa de impugnação da “decisão proferida pela Unidade de Prestações e Contribuições do Centro Distrital de Segurança Social de Faro que indeferiu o pedido de isenção da obrigação de contribuir como trabalhador independente apresentado pelo Autor”, que corre termos neste Tribunal sob o n.º 32/21.5BELLE – facto provado por consulta, na plataforma sitaf, do processo n.º32/21.5BELLE; C) Em 23-02-2021, deu entrada nos serviços da Entidade Exequente a petição inicial relativa aos presentes autos, na qual o Oponente alega, em síntese, que estando cumpridos os requisitos do artigo 157.º do CRC, impunha-se a aplicação da isenção de contribuir como trabalhador independente – cfr. fls. 4-37 do sitaf; * Inexistem factos não provados com interesse para a decisão da causa. * A convicção do Tribunal, quanto aos factos provados, decorreu da análise crítica dos documentos juntos aos autos, tal como se fez referência a propósito de cada uma das alíneas do probatório e cujo conteúdo não foi impugnado pelas partes.» * - De Direito
O ora recorrente deduziu oposição contra a execução fiscal nº ……………….937 que lhe foi movida pela Secção de Processo Executivo de Faro, do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I,P., com vista à cobrança coerciva de contribuições como trabalhador independente, no valor de €14.629,50. Invocou, para tanto, a alínea h) do artigo 204.º, n.º 1, do CPPT, sustentando a ilegalidade da liquidação subjacente à dívida exequenda, com o fundamento na isenção do pagamento das obrigações em causa pelo Oponente, enquanto trabalhador independente, em virtude da aplicação do disposto no artigo 157º, al. a), subalínea iii) do CRC. Subsidiariamente, pediu a extinção parcial da execução fiscal por força da ilegalidade da liquidação da quantia exequenda, decorrente da aplicação da correta base de incidência, nos termos estatuídos no artigo 163º, nº 2 do CIRC. O TAF de Loulé considerou não ter sido “invocado pelo Oponente qualquer fundamento de oposição à execução fiscal”, pelo que julgou improcedente a oposição deduzida. O Recorrente discorda em absoluto do decidido, considerando que “o tribunal “a quo” laborou em erro na apreciação feita da situação apresentada e fundamentos invocados, que considera estarem abrangidos pelo âmbito de aplicação da alínea h) do n.º 1 do artigo 204º do CPPT”. Para o Recorrente, “estando em causa contribuições para a segurança social não existe um acto de liquidação propriamente dito – o acto de liquidação consiste no acto de extracção da certidão confirmativa da existência da dívida, configurando este o acto jurídico de aplicação de uma norma tributária material, praticado por uma autoridade administrativa, com força executiva, em relação ao qual não é assegurada qualquer via autónoma de impugnação do acto da entidade emitente do título executivo”. Portanto, justifica-se a oposição, já que a lei não assegura meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação, nos termos da alínea h) do artigo 204º do CPPT. Vejamos, antes do mais, o discurso fundamentador alinhado na sentença recorrida. Aí se escreveu, no que para aqui releva, o seguinte: “A execução fiscal, por dependência da qual foi deduzida a presente oposição, respeita a dívida relativa ao não pagamento de contribuições como trabalhador independente. Conforme supramencionado, o Oponente, alega, em síntese, que dívida exequenda é ilegal, porquanto se impunha a aplicação da isenção da obrigação de contribuir como trabalhador independente. Apreciando. Estatui o artigo 204.º do CPPT que: “1 - A oposição só poderá ter algum dos seguintes fundamentos: a) Inexistência do imposto, taxa ou contribuição nas leis em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação ou, se for o caso, não estar autorizada a sua cobrança à data em que tiver ocorrido a respectiva liquidação; b) Ilegitimidade da pessoa citada por esta não ser o próprio devedor que figura no título ou seu sucessor ou, sendo o que nele figura, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram, ou por não figurar no título e não ser responsável pelo pagamento da dívida; c) Falsidade do título executivo, quando possa influir nos termos da execução; d) Prescrição da dívida exequenda; e) Falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade; f) Pagamento ou anulação da dívida exequenda; g) Duplicação de colecta; h) Ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação; i) Quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título. 2 - A oposição nos termos da alínea h), que não seja baseada em mera questão de direito, reger-se-á pelas disposições relativas ao processo de impugnação”. Ora, compulsada a petição inicial, e atento o probatório fixado, constata-se que os fundamentos invocados não se subsumem a qualquer das alíneas do citado artigo 204.º do CPPT. Na verdade, os fundamentos invocados prendem-se com a legalidade em concreto do ato administrativo que originou a quantia em cobrança executiva. Nos presentes autos vem invocada a ilegalidade da dívida exequenda, decorrente da obrigação legal de reconhecimento da isenção do pagamento das contribuições ou, subsidiariamente, decorrente da aplicação da correta base de incidência. Decorre ainda do probatório que o Oponente, no âmbito do processo que corre termos neste tribunal sob o número 32/21.5BELLE, impugnou a decisão que determinou o indeferimento da isenção, ora novamente colocada em crise nestes autos. Encontra-se, assim, a correr termos o meio processual adequado a assegurar o efeito jurídico pretendido pelo Oponente. Face ao que antecede, não tendo sido invocado pelo Oponente qualquer fundamento de oposição à execução fiscal, improcede a presente oposição”. Adianta-se, desde já, que decidiu com acerto o Tribunal a quo, uma vez que o alegado pelo Oponente não se enquadra em fundamento algum de oposição à execução fiscal, nos termos contemplados no artigo 204º do CPPT. O invocado contende com a legalidade concreta da liquidação da dívida exequenda, em termos que se apresentam insuscetíveis de ser discutidos em sede de oposição à execução fiscal, o que só não sucederia se a lei não assegurasse meio judicial de impugnação ou recurso contra o ato de liquidação, o que não é o caso (cfr. art. 204.º, n.º 2, alínea h), do CPPT). Com efeito, toda a argumentação do Oponente, no sentido de que a Segurança Social não deveria ter indeferido o seu pedido de isenção do pagamento das contribuições que ora lhe estão a ser exigidas coercivamente, reporta-se, manifestamente, à legalidade concreta (e não abstrata) da dívida exequenda. O Oponente pretende que a liquidação enferma de vício de violação de lei por erro nos pressupostos, pois sustenta que estão reunidas as condições para que beneficie da isenção do pagamento daquelas contribuições. Em situação com semelhanças com a presente, escreveu-se no acórdão do TCA Norte, de 04/05/04, processo nº 00019/04, o seguinte: “Como é jurisprudência assente, nem toda a ilegalidade da liquidação é admissível como fundamento da oposição. É pacífico o entendimento de que constitui fundamento de oposição a ilegalidade em abstracto da dívida exequenda, ou seja, a ilegalidade que decorre da própria norma aplicada e que pode resultar da inexistência de lei em vigor à data dos factos a que respeita a obrigação que preveja a sua liquidação ou da não autorização da sua cobrança à data em que tiver ocorrido a sua liquidação (cfr. art. 204.º, n.º 1, alínea a), do CPT). Já se o fundamento da oposição for a ilegalidade em concreto, isto é, a que resulta da aplicação da norma ao caso concreto, em princípio não será admissível Vide JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., notas 3, 4 e 40 a 42 ao art. 204.º, págs. 872 e 907/908.. E bem se compreende que seja assim. É que a reacção prevista pelo sistema legal contra a ilegalidade da liquidação é a impugnação judicial (cfr. art. 99.º do CPPT). Como dizia ALBERTO XAVIER, o legislador «procurou traçar uma linha de separação entre as duas vias paralelas de reacção ao acto tributário: uma, relativa à apreciação da sua correspondência com a lei no momento em que foi praticado - e é o processo de impugnação; outra, respeitante aos fundamentos supervenientes que possam tornar ilegítima ou injusta a execução por falta de correspondência com a situação material subjacente no momento em que se adoptam as providências de subrogação em que a execução se traduz - e que é a oposição à execução fiscal. Num como noutro processo, o objectivo visado é fazer prevalecer a relação subjacente, a verdade material, sobre a abstracção própria do acto tributário. Mas no caso da impugnação, a abstracção destrói-se pela invocação da ilegalidade do acto; no caso da oposição, pela invocação da ilegitimidade superveniente desse mesmo acto na sua função de título executivo» Conceito e Natureza do Acto Tributário, 1972, pág. 589/590.. O rigor desta linha divisória entre os dois meios de reacção ao acto tributário encontra-se claramente vincado na articulação entre os dois processos. Parafraseando ALBERTO XAVIER Ibidem., note-se que, por um lado, a execução deve conformar-se com a sentença proferida no processo de impugnação e, por outro, que na alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do mesmo código, na qual se admite como fundamento da oposição «quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores», logo se ressalva «desde que não envolvam apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda». A lei admitiu, no entanto, excepções a este princípio da impossibilidade de apreciação da ilegalidade em concreto da liquidação em sede de oposição à execução fiscal, como decorre da alínea h) do n.º 1 do art. 204.º. A alínea h) do art. 204.º do CPPT reproduz a alínea g) do art. 286.º, n.º 1, do Código de Processo Tributário, que foi uma inovação deste código, pois não tinha correspondência em qualquer das alíneas do art. 176.º do Código de Processo das Contribuições e Impostos. Nos termos daquele preceito, é possível discutir a legalidade em concreto da liquidação da dívida exequenda em sede de oposição «sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação». Esta disposição legal surgiu da necessidade de facultar ao executado na oposição os meios de defesa que até aí não tinha tido Esta disposição terá certamente surgido por influência do art. 158.º do Estatuto das Estradas Nacionais, que, permitia que as dívidas provenientes de indemnizações fixadas pelos prejuízos causados nas estradas nacionais e seus pertences fossem cobradas mediante execução fiscal e autorizava o executado a deduzir oposição com fundamento na ilegalidade concreta da dívida. A jurisprudência, apesar de no art. 176.º do Código de Processo das Contribuições e Impostos não se prever a ilegalidade concreta da dívida exequenda como fundamento de oposição, considerou que aquele artigo se mantinha em vigor, sensível ao facto de ao executado não serem facultados pela lei em momento anterior os meios contenciosos para reagir contra a dívida exequenda.. Assim, a discussão da legalidade da liquidação da dívida exequenda em sede de oposição só será possível nas «situações em que seja a própria lei que não prevê meio de impugnação contenciosa», como o são aquelas «aqueles em que se permite a extracção de certidões de dívida perante a mera constatação de omissão de um pagamento sem que haja um acto administrativo ou tributário prévio definidor da situação» JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., nota 41 ao art. 204.º, pág. 907.. Na verdade, o direito de recurso contencioso contra quaisquer actos administrativos, independentemente da sua forma, desde que lesivos de direitos ou interesses legalmente protegidos está hoje constitucionalmente consagrado (art. 268.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP)) e a garantia do recurso contencioso configura-se, de acordo com o entendimento unânime, como tendo a natureza de um direito fundamental, análogo aos “direitos, liberdades e garantias” Cfr., entre outros, o acórdão do Tribunal Constitucional de 15 de Junho de 1989, publicado no Diário de República, II Série, de 21 de Setembro de 1989.. Assim, a discussão da legalidade da liquidação da dívida exequenda na oposição à execução só é permitida nos casos em que, por via do “âmbito da execução fiscal” definido no art. 148.º do CPPT, são cobradas dívidas, através de tal processo, que não foram criadas por acto administrativo. Só em relação a estas se pode afirmar que o executado não teve anteriormente a possibilidade de utilizar meio judicial de impugnação ou recurso para sindicar a respectiva legalidade. Não é, manifestamente, o caso dos presentes autos, em que está em causa a liquidação de contribuições para a Segurança Social, sabido que é que os actos administrativo-tributários são contenciosamente impugnáveis. A Oponente, como ela própria reconhece poderia ter reagido contenciosamente contra a decisão que lhe indeferiu o pedido de concessão dos benefícios e que deu origem à liquidação das contribuições em execução através do meio processual próprio: o recurso contencioso. Não pode é a Oponente pretender que a legalidade daquele acto tributário seja sindicada judicialmente em sede de oposição, pois que lho não permite a citada alínea h) do art. 204.º, n.º 1, do CPPT. Não se verifica a condição prevista neste preceito legal que o autorizaria, ou seja, «que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação». A oposição não pode, pois, ser julgada procedente”. Ora, no caso concreto é o que sucede também. O indeferimento do reconhecimento da isenção foi judicialmente contestado e, como tal, a apreciação da legalidade de tal ato está já sob a alçada dos tribunais, através da apresentação da ação administrativa que está pendente no TAF de Loulé - cfr. alínea B) dos fatos provados: “Em 15-01-2021, o ora Oponente intentou ação administrativa de impugnação da “decisão proferida pela Unidade de Prestações e Contribuições do Centro Distrital de Segurança Social de Faro que indeferiu o pedido de isenção da obrigação de contribuir como trabalhador independente apresentado pelo Autor”, que corre termos neste Tribunal sob o n.º 32/21.5BELLE”. Nesta conformidade, e sem necessidade de maiores desenvolvimentos, conclui-se que o Tribunal a quo decidiu com acerto ao concluir que, in casu, não foi invocado qualquer fundamento de oposição. Não se desconsidera que o Recorrente defende, ainda, que caso o tribunal “a quo” entendesse que a oposição não era o meio adequado para o efeito pretendido, então podia e devia ter procedido à convolação da oposição na forma adequada, por exigência expressa do artigo 98º, n.º 4, do CPPT, por razões de celeridade e justiça tributárias, nos termos do artigo 97º, n.º 3, da LGT, como tem vindo a ser unanimemente decidido pelos tribunais superiores. Também aqui não tem razão. O erro na forma do processo, nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo, afere-se pelo pedido e não pela causa de pedir. No caso, o efeito pretendido pelo Recorrente na p.i apresentada é adequado ao meio processual por si deduzido, pois o que vem pedido é extinção da execução fiscal com base na ilegalidade subjacente à dívida exequenda. Este pedido – de extinção da execução fiscal – é, aliás, o pedido paradigmático da oposição à execução fiscal. Por conseguinte, não é de erro na forma de processo que se trata, nem, como tal, se impunha equacionar a convolação do processo na espécie adequada. A questão – repete-se – é de outra ordem, como já dissemos. Daquilo que se trata é, de facto, da falta de alegação de matéria subsumível a fundamento próprio de oposição e de as questão sobre a concreta legalidade da liquidação da dívida exequenda deverem ser apreciadas noutra sede, sempre que a lei assegure meio processual para tanto. É o caso, conforme exposto. Improcedem, pois, as conclusões da alegação de recurso, negando-se provimento ao recurso e mantendo-se a sentença.
III - Decisão
Termos em que acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso. Custas pelo Recorrente. Registe e Notifique. Lisboa, 22/06/23. (Catarina Almeida e Sousa) (Isabel Fernandes) (Lurdes Toscano) |