Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:10573/13
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:03/20/2014
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores:CONTENCIOSO CONTRATUAL, COMPETÊNCIA TERRITORIAL
Sumário:Se o preço em causa no contrato público deve ser pago no lugar da entrega da coisa à entidade adjudicante, estando em litígio o pagamento desse preço, então o tribunal territorialmente competente determina-se de acordo com o artigo 19º do CPTA.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO (1)

· G……..– Companhia ……………, SA, com sede na Rua da ……, n° 10, em ………, intentou

acção administrativa comum contra

· CENTRO HOSPITALAR ……………, EPE, com sede na Av. Maria ………….., Ap. 118, …...

Pediu ao tribunal da 1ª instância (T.A.C. de SINTRA) o seguinte:

- Condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de € 168.996,92, relativa às facturas:
a) N° 9311025512, emitida em 31.5.2009, com data de vencimento em 29.8.2009, no valor de €: 62.412,29, sendo que apenas €: 60.618,04 se encontra em dívida;
b) N° 9311025567, emitida em 31.5.2009, com data de vencimento em 29.8.2009, no valor de €: 58.875,45;
c) N° 9311026407, emitida em 30.6.2009, com data de vencimento em 28.9.2009, no valor de €: 49.503,43.

*

Por saneador-sentença de 4-1-2013, o referido tribunal decidiu, i.a., julgar-se competente em razão do território e condenar o réu no pedido.

*

Inconformado, o r. recorre para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:

»(…)».

*

O recorrido concluiu assim as suas contra-alegações:

«(…)».

*

O Exmº representante do Ministério Público junto deste Tribunal foi notificado para se pronunciar como previsto na lei de processo.

Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência.

*

II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1. FACTOS RELEVANTES PROVADOS segundo o tribunal recorrido

«(…)».

*

II.2. APRECIAÇÃO DO RECURSO

A decisão recorrida entendeu o seguinte:

«…

Ou seja, a regra de competência territorial a aplicar no caso, atenta a configuração da petição inicial, é sem dúvida a prevista no art 19° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

O que significa que a pretensão da Autora tinha de ser deduzida no Tribunal convencionado ou, na falta de convenção, no Tribunal do lugar de cumprimento do contrato.

Ora, se lermos os contratos de prestação de serviços de alimentação juntos pelo Réu, no art 76°, n° 3, al a), consta que as questões que se suscitem sobre interpretação, validade ou execução dos contratos, que não sejam dirimidas pelos meios graciosos, serão submetidos aos Tribunais administrativos, nos termos da lei.

Já quanto ao acordo invocado pela Autora, no art 39° da réplica, a mesma apenas alega terem sido acordados o prego e as demais características do fornecimento. Nada mais sendo concretizado.

Pelo que a conclusão a retirar é a de que inexiste qualquer convenção quanto ao Tribunal competente para conhecer dos litígios sobre incumprimento do contrato.

Assim sendo, resta-nos lançar mão da última parte do art 19° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Isto é, o Tribunal competente para conhecer da causa é o do lugar do cumprimento do contrato.

E, neste sentido, assiste razão à Autora, nos termos do art 885°, n° 2 do Código Civil, o lugar onde a obrigação de pagamento das facturas devia ter sido cumprida era o do domicílio que o credor, aqui Autora, tinha ao tempo do cumprimento, ou seja, em Carnaxide, concelho de Oeiras.

O concelho de Oeiras cabe na área de jurisdição do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra – cfr mapa anexo ao DL n° 325/2003, de 29.12.

Improcedendo, em consequência, a excepção de incompetência territorial do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.

…».

O MÉRITO DO RECURSO

Aqui chegados, há melhores condições para se compreender melhor o recurso e para, de modo facilmente sindicável pelas partes e eventualmente pelo STA, apreciarmos o seu mérito, preocupados com a aceitabilidade racional da decisão e tendo presente o direito como uma ordem fundada na auto-pressuposição axiológica dos cidadãos enquanto pessoas de certa comunidade política.

Vejamos, pois.

Erro de direito. A questão da competência em razão do território (cf. artigos 19º CPTA e 885º CC; e factos D e E)

A primeira questão a resolver é a da competência territorial (cf. artigo 13º CPTA).

Resulta dos factos provados sob D) e E) que o que aqui se discute, com base na p.i. apresentada no TAC de Sintra (área da sede da A.), é a execução e o cumprimento de um contrato (público e administrativo) (cf. artigos 37º/2-h) CPTA e 1º/6 CCP) de fornecimento de refeições entre as partes, nos hospitais de Torres Novas, Tomar e Abrantes, zonas estas incluídas na jurisdição territorial do TAC de Leiria. O R. estaria em falta no pagamento de tal fornecimento ao A.

É, pois, claro que se aplica aqui o artigo 19º CPTA. E não o residual artigo 16º.

Donde se conclui, ante a factualidade provada, que esta acção deve ser julgada no território dos lugares do cumprimento do contrato descrito na p.i. de acordo com o artigo 885º/1 CC («O preço deve ser pago … no lugar da entrega da coisa vendida»), lugares aqueles (Torres Novas, Tomar e Abrantes) integrados, pelo DL 325/2003, no território da jurisdição do TAC de Leiria.

Fica, assim, prejudicado o conhecimento das restantes questões.

*

III. DECISÃO

Por tudo quanto vem de ser exposto e de harmonia com o disposto nos arts. 202º, nº 1 e 2, e 205º, nº 2, da CRP, acordam os Juizes da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em:

A) Conceder provimento ao recurso,

B) Anular o processo desde a prolação do despacho ora recorrido, por incompetência territorial do tribunal recorrido, e julgar competente em razão do território o TAC de Leiria.

Custas a cargo do recorrido.

(Acórdão processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pelo relator)

Lisboa, 20-3-2014

Paulo Pereira Gouveia

Carlos Araújo

Fonseca da Paz



(1) Nos relatórios, apesar da sua lógica brevidade, tenta-se facilitar a compreensão do ocorrido e a sindicabilidade em geral do nosso acórdão; sobretudo quando se não transcreva a factualidade apurada no tribunal recorrido.