Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1560/19.8BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:01/16/2020
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:ASILO, AUDIÊNCIA PRÉVIA
Sumário:I. O relatório previsto no artigo 17.º da Lei n.º 27/2008, de 30/06, é exigível no âmbito do procedimento comum para a aferição da proteção internacional, ainda que sob tramitação abreviada, pois não deixa de existir uma análise das condições a preencher pelo requerente para beneficiar do estatuto de proteção internacional.

II. Este relatório não se pode assumir a um resumo da entrevista realizada ao requerente.

III. Não sendo transmitido ao entrevistado, em nenhum momento da entrevista, qual o sentido provável da decisão que iria ser proferida, nem as suas respetivas razões, por o auto de declarações que lhe foi notificado ser totalmente omisso em relação aos fundamentos em que se baseou a decisão impugnada, existe a preterição da audiência do requerente, em violação do artigo 17.º, n.ºs 1 e 2 da Lei do Asilo.

IV. O requerente do pedido de proteção internacional tem direito a ser ouvido sobre as informações essenciais ao seu pedido, as quais, no caso em apreço, respeitam às alíneas do artigo 19.º, n.º 1 da Lei do Asilo, que fundamentam o entendimento de o pedido de asilo e o pedido de autorização de residência por proteção subsidiária, serem infundados, as quais devem constar de um relatório escrito que as indique, assim se assegurando a audiência do interessado.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – RELATÓRIO

Q......, devidamente identificado nos autos de ação administrativa urgente instaurada contra o Ministério da Administração Interna, Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida em 08/10/2019, pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, que julgou a ação improcedente, relativa ao pedido de impugnação da decisão que considerou o pedido de proteção internacional infundado e de condenação da Entidade Demandada a prosseguir com a instrução do procedimento.


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Formula o Recorrente, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“I- A Lei do Asilo (no seu art.º 17.º) e o Regulamento Dublin (no seu art.º 5.º prevêem expressamente o dever de realizar-se uma audiência prévia “antes de ser adoptada qualquer decisão de transferência do requerente para o Estado­ Membro responsável. …”.

II- Esta regra é igualmente suportada pela jurisprudência europeia, a qual, reiteradamente e de forma bem assente, tem afirmado a exigência “[d]o direito a ser ouvido antes de qualquer decisão que afecte desfavoravelmente os interesses dos particulares ...”.

III- Ainda que assim não fosse, é igualmente jurisprudência assente no STA e no TJUE que a interpretação da legislação europeia não deve contender com os princípios fundamentais da União e/ou dos seus Estados-Membros.

IV- Sendo que, encontra-se violado o artigo 41.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia quando não é conferido ao interessado visado de decisão que afecte os seus direitos e interesses a possibilidade de este apresentar a sua defesa antes da tomada de tal decisão administrativa.

V- A Constituição da República Portuguesa igualmente consagra como princípio fundamental a participação dos cidadãos no procedimento administrativo nos actos que lhes afectem os seus direitos e interesses, nomeadamente garantindo a sua participação na formação de decisões administrativas antes de estas serem tomadas (art.º 267.º n.º 5, 2.ª parte, da CRP).

VI- Acrescendo igualmente que, ainda que não houvesse previsão nos diplomas legais específicos referidos supra, os artigos 121.º e 122.º do CPA são aplicáveis subsidiariamente aos procedimentos administrativos especiais ex vi art.º 2.º, n.º 5 do mesmo diploma legal.

VII- Sendo que, o Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a assentar jurisprudência no sentido de se verificar a obrigação de audiência prévia por força do art.º 17.º da Lei do Asilo, sob pena de anulação do acto impugnado (art.º 163.º, n.º 1, do CPA).

VIII- Pelo que, e salvo o devido respeito, não assiste razão na Sentença ora recorrida.

IX- As declarações do requerente de asilo não podem, nem devem, ser confundidas com o relatório (respectivamente, art.ºs 16.º e 17.º da Lei de Asilo) onde conste, nomeadamente, o projecto de decisão da Directora do S.E.F. quanto ao pedido de asilo em apreço, com vista a que o requerente possa pronunciar-se sobre o mesmo.

X- Não podendo pretender-se imiscuir a Administração de realizar o devido Relatório por notificar com tentativa de aplicação errónea da lei o requerente das suas declarações, pretendendo fazê-las passar por aquele Relatório, onde nem sequer consta o parecer de decisão do S.E.F.

XI- Devendo assim o presente Recurso ser considerado procedente por provado, devendo revogar-se em consequência a Sentença e substituir por outra onde a pretensão do Autor ora Recorrente proceda.”.

Pede que o recurso seja julgado procedente e a sentença recorrida seja revogada.


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O Recorrido não contra-alegou o recurso, nada tendo dito ou requerido.

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O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Defende que o Recorrente confunde as diversas situações de audição dos requerentes, previstas na Lei do Asilo.

No caso, não chegou a iniciar-se a fase de instrução porque o pedido não foi admitido, tendo sido considerado infundado nos termos do artigo 19.º da Lei de Asilo, pelo que, não faz sentido a invocação do artigo 29.º, por não ser aplicável à fase inicial do procedimento.

Em relação ao cumprimento do artigo 17.º da Lei n.º 27/2008, entende que o mesmo foi inteiramente respeitado.


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O processo vai sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, por se tratar de processo urgente, indo à Conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

A questão suscitada resume-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento, com fundamento em violação do direito de audiência prévia do requerente de proteção internacional, por as declarações do requerente de asilo não poderem ser confundidas com o relatório onde conste o projeto de decisão.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

A sentença recorrida considerou assentes os seguintes factos:

A. Em 26/06/2019, o Autor formulou pedido de proteção internacional junto do Gabinete de Asilo e Refugiados do SEF - cfr. fls. 1 a 11 e 13 e do PA;

B. Em 18/07/2019, o Autor prestou declarações no Gabinete de Asilo e Refugiados, nos termos do instrumento de fls. 21 a 30 do PA, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual se extrai, nomeadamente, o seguinte:

“(…).

P. Quando?

R. Em finais de 2013 e comecei a trabalhar na Líbia.

(…).

(…)

C. Pela instrutora do Gabinete de Asilo e Refugiados do SEF, A……, foi elaborada a Informação …………… cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – cfr. fls. 39 a 51 do PA;

D. Em 06/08/2019, a Diretora Nacional Adjunta do SEF, com base na informação referida na alínea antecedente, proferiu decisão a considerar infundado quer o pedido de asilo, quer o pedido de proteção subsidiária apresentado pelo Autor – cfr. fls. 54 do PA;

E. A decisão referida na alínea antecedente foi comunicada ao Autor em 08/08/2019 – cfr. fls. 56 do PA.


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Não se apuraram quaisquer outros factos com relevância para a decisão a proferir.

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Fundamentação da matéria de facto:

A convicção do Tribunal assentou no teor dos documentos do Processo Administrativo (PA), a que se fez referência em cada uma das alíneas dos Factos Provados, os quais não foram impugnados e mereceram a credibilidade do Tribunal.”.

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise do fundamento do recurso jurisdicional.

Erro de julgamento, em violação do direito de audiência prévia do requerente de proteção internacional, por as declarações do requerente de asilo não poderem ser confundidas com o relatório onde conste o projeto de decisão

Vem o Recorrente impugnar a sentença recorrida com o fundamento de incorrer em erro de julgamento, por violação do direito de audiência prévia do requerente de proteção internacional.

Sustenta que o Recorrente apresentou o pedido de proteção internacional por motivos religiosos e tendo sido notificado para a realização da entrevista pessoal, nos termos e para os efeitos do artigo 16.º da Lei de Asilo, as suas declarações foram transcritas, tendo-lhe sido entregue cópia do auto de declarações e notificado de que, em conformidade com o artigo 17.º, n.º 2 da Lei 27/08, de 30/06 pode, no prazo de cinco dias, pronunciar-se, por escrito sobre o conteúdo do auto.

Defende que a jurisprudência maioritária defende o dever de a Administração facultar ao interessado informação sobre o sentido provável da decisão, sendo essa proposta de decisão apenas comunicada à Diretora do SEF e não ao CPR e ao Autor, como devia, de forma a permitir o exercício do direito de audiência prévia.

Não foi elaborado o relatório contemplado no artigo 17.º da Lei do Asilo, o que determina que não tenha sido possível ao Requerente pronunciar-se, nos termos do artigo 17.º, n.º 2.

Vejamos.

A decisão administrativa impugnada traduziu-se em considerar o pedido de asilo apresentado pelo Requerente infundado, por não se enquadrar nas alíneas c), d) e e), do n.º 1 do artigo 19.º da Lei de Asilo, aprovada pela Lei n.º 27/08, de 30/06, na sua redação dada pela Lei n.º 26/14, de 05/05, baseada na circunstância de o requerente não ter apresentado quaisquer factos relacionados com as condições para beneficiar de proteção internacional, além de não ter indicado qualquer ato persecutório ou ameaças que configurem terem existido situações sistemáticas de violação dos direitos humanos ou se encontrar em risco de sofrer ofensa grave, que tornariam a sua vida intolerável no seu país de origem.

Atendendo à factualidade demonstrada em juízo resulta que a decisão impugnada, da Diretora Nacional Adjunta do SEF, de 06/08/2019, que considerou infundado o pedido de proteção internacional formulado pelo ora Recorrente, foi tomada no âmbito do procedimento sujeito a tramitação acelerada, sendo o pedido considerado infundado por a Entidade Demandada entender que se verificam as alíneas c), d) e e), do n.º 1 do artigo 19.º da Lei do Asilo, a saber:

c) O requerente fez declarações claramente incoerentes e contraditórias, manifestamente falsas ou obviamente inverosímeis que contradigam informações suficientemente verificadas sobre o país de origem, retirando credibilidade à alegação quanto aos motivos para preencher os requisitos para beneficiar de proteção;

d) O requerente entrou ou permaneceu ilegalmente em território nacional e não tenha apresentado o pedido de proteção internacional logo que possível, sem motivos válidos;

e) Ao apresentar o pedido e ao expor os factos, o requerente invoca apenas questões não pertinentes ou de relevância mínima para analisar o cumprimento das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para proteção subsidiária;”.

No presente recurso, o ora Recorrente mais do que por em crise os pressupostos de facto e de direito da decisão impugnada, invoca como único fundamento a falta de audiência do requerente de proteção internacional.

Compulsando a matéria de facto assente extrai-se da alínea B) do julgamento de facto que após a prestação de declarações pelo requerente foi-lhe entregue uma cópia autenticada do auto de declarações e que o mesmo foi notificado de que, nos termos do artigo 17.º, n.º 2 da Lei n.º 27/08, de 30/06, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 26/14, de 05/05, pode pronunciar-se por escrito, no prazo de cinco dias sobre o seu respetivo conteúdo.

Por outro lado, do teor da Informação que consta da alínea C) do julgamento de facto, pode ler-se que “5. Aos 10.07.2019, foi dado conhecimento ao Conselho Português para os Refugiados (CPR) das declarações do requerente nos termos n.º 2 do artigo 17.º da Lei n.º 27/08, de 30.06, alterada pela Lei 26/14 de 05.06 que não se pronunciou.”.

Da matéria de facto assente nada mais consta a respeito da notificação do requerente para se pronunciar sobre o teor da citada Informação ou sequer da elaboração do relatório escrito, a que alude o disposto no artigo 17.º, n.º 1 da Lei do Asilo e, consequentemente, da sua notificação ao requerente.

O que consta é a notificação ao requerente do auto relativo à Entrevista, no qual consta, além das questões que foram formuladas e das suas respetivas respostas, também o que foi informado ao requerente, nos termos que constam do facto dado como assente na alínea B) do probatório.

Pelo que a questão decidenda, tal como posta no presente recurso, respeita unicamente a decidir sobre a necessidade de audiência prévia do requerente de proteção internacional para além da notificação da “cópia autenticada do auto de declarações”, no âmbito de um procedimento sujeito a tramitação acelerada e se o mesmo traduz o cumprimento do disposto no artigo 17.º, n.º 1 da Lei do Asilo, ao prescrever a elaboração de um relatório escrito do qual constam as informações essenciais relativas ao pedido.

No caso em apreço o pedido de proteção internacional foi considerado infundado, pelo que existe uma decisão do SEF a pronunciar-se sobre o mérito da pretensão do Requerente.

No artigo 17.º, n.º 1 da Lei do Asilo a lei refere-se à elaboração do relatório, sendo o mesmo uma formalidade obrigatória no procedimento comum para a aferição da proteção internacional.

Assim, o relatório previsto no artigo 17.º da Lei n.º 27/2008, de 30/06, é exigível no âmbito do procedimento comum para a aferição da proteção internacional, ainda que sob tramitação abreviada, pois não deixa de existir uma análise das condições a preencher pelo requerente para beneficiar do estatuto de proteção internacional.

No caso, há lugar a diligências e ao relatório indicados nos artigos 16.º e 17.º da Lei n.º 27/2008, de 30/06, relativos à análise das condições a preencher para o deferimento do pedido.

Este relatório não se pode assumir como um resumo da entrevista realizada ao requerente como no caso do procedimento especial de determinação do Estado responsável, segundo o artigo 5º do Regulamento (UE) n.º 604/2013, de 26/06, pois a lei fala num relatório que contenha as informações essenciais.

Considerando que no presente caso não foi elaborado o relatório que se encontra previsto no artigo 17.º, n.º 1 da Lei do Asilo, não tendo o mesmo sido notificado ao requerente, por apenas lhe ter sido “entregue cópia autenticada do presente auto de declarações”, é de concluir no sentido de assistir razão ao Recorrente ao defender ter ocorrido a violação do artigo 17.º da Lei de Asilo, incorrendo a sentença recorrida em erro de julgamento.

A efetivação do direito de audiência ou participação do Requerente de proteção internacional ocorreu apenas por via da entrevista que lhe foi feita e nada mais, por não ter sido elaborado o relatório previsto no artigo 17.º, n.º 1, nem ter sido dada a conhecer ao requerente de proteção internacional o projeto de decisão sobre o seu pedido, de modo a que sobre ela pudesse apresentar elementos adicionais.

Em nenhum momento da entrevista foi transmitido ao entrevistado qual o sentido provável da decisão que iria ser proferida, nem as suas respetivas razões, pelo que o teor do auto de declarações que lhe foi notificado é totalmente omisso em relação aos fundamentos em que se baseou a decisão impugnada.

O requerente do pedido de proteção internacional tem direito a ser ouvido sobre as informações essenciais ao seu pedido, as quais, no caso em apreço, respeitam às alíneas do artigo 19.º, n.º 1 da Lei do Asilo, que fundamentam o entendimento de o pedido de asilo e o pedido de autorização de residência por proteção subsidiária, serem infundados, as quais devem constar de um relatório escrito que as indique, assim se assegurando a audiência do interessado.

O procedimento administrativo seguido, descrito nos factos provados, revela que não foi elaborado o relatório previsto no artigo 17.º, n.º 1 da Lei n.º 27/2008, sobre o qual o requerente se pudesse ter pronunciado, não podendo as declarações do próprio requerente considerar-se como “relatório”.

A falta da elaboração desse relatório tem que ser considerada como preterição de uma formalidade essencial que a lei prescreve, que determina que não tenha sido possível ao requerente pronunciar-se nos termos do artigo 17.º, n.º 2.

Configura-se que no caso dos autos, o direito à audiência prévia e à defesa do Requerente de proteção internacional não foi assegurado, por preterição das formalidades aplicáveis ao procedimento, não sendo, in casu, suficiente a realização da entrevista a informar o requerente das razões da decisão que considera o seu pedido infundado.

Nestes casos, esta diligência procedimental é insuficiente para o cumprimento do direito de audiência do Requerente e para o exercício da sua defesa, direitos estes que se consideram, por isso, violados, por ser aplicável a necessidade de elaboração do relatório previsto no artigo 17.º, n.º 1 da Lei de Asilo e a sua consequente notificação ao Requerente e autoridades nacionais.

Deste modo, forçoso se tem de concluir por ter sido preterido o direito de audiência prévia do requerente de proteção internacional, por não ter sido elaborado o relatório, nem o mesmo ter sido notificado ao requerente para o poder contraditar, não tendo sido cumpridas as exigências procedimentais legalmente previstas no âmbito da análise do pedido de proteção internacional.

Neste sentido, vide o Acórdão do STA, de 28/03/2019, Proc. n.º 01143/18.0BELSB, segundo o qual:

I – Os beneficiários de protecção internacional podem ter direito de asilo (cfr. art. 3º), que lhes confere o estatuto de refugiado (art. 4º), ou ser-lhes concedida autorização de residência por protecção subsidiária (art. 7º), sendo único o procedimento desses pedidos, estando a respectiva tramitação prevista nos arts. 10º a 22º, se o pedido de protecção internacional foi formulado junto do Gabinete de Asilo e Refugiados do SEF.

II - O art. 17º, nº 1 da Lei nº 27/2008, de 30/6, prevê expressamente que após a realização das diligências cabíveis, no caso houve lugar às declarações previstas no art. 16º, o SEF elabora um relatório escrito do qual constam as informações essenciais ao processo, sendo sobre este relatório que ao requerente é facultada a possibilidade de se pronunciar, no prazo de 5 dias, sendo ainda esse relatório comunicado ao representante do ACNUR e ao CRP (nºs 2 e 3).

III - A falta da elaboração desse relatório, tem que ser considerada como preterição de uma formalidade essencial que a lei prescreve, e que determina, consequentemente, que não tenha sido possível ao requerente pronunciar-se nos termos do nº 2 do referido art. 17º, havendo, como tal, preterição da audição do interessado.”.

Assim, com base nas razões antecedentes, entende-se que no procedimento de apreciação do pedido de proteção internacional de asilo e de proteção subsidiária tem aplicação o disposto no artigo 17.º da Lei n.º 27/2008, de 30/06, sendo exigível a elaboração do relatório aí indicado, de forma a serem assegurados os direitos de audiência e de defesa do Requerente de proteção internacional, o que no presente caso não se verifica por via da entrevista que lhe foi feita.

Termos em que, em face de todo o exposto, procedem as conclusões do recurso em apreço, por violação do artigo 17.º, n.ºs 1 e 2 da Lei de Asilo, enfermando a sentença recorrida de erro de julgamento.


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Termos em que será de conceder provimento ao recurso interposto pelo Recorrente, por provados os seus fundamentos.

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Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. O relatório previsto no artigo 17.º da Lei n.º 27/2008, de 30/06, é exigível no âmbito do procedimento comum para a aferição da proteção internacional, ainda que sob tramitação abreviada, pois não deixa de existir uma análise das condições a preencher pelo requerente para beneficiar do estatuto de proteção internacional.

II. Este relatório não se pode assumir a um resumo da entrevista realizada ao requerente.

III. Não sendo transmitido ao entrevistado, em nenhum momento da entrevista, qual o sentido provável da decisão que iria ser proferida, nem as suas respetivas razões, por o auto de declarações que lhe foi notificado ser totalmente omisso em relação aos fundamentos em que se baseou a decisão impugnada, existe a preterição da audiência do requerente, em violação do artigo 17.º, n.ºs 1 e 2 da Lei do Asilo.

IV. O requerente do pedido de proteção internacional tem direito a ser ouvido sobre as informações essenciais ao seu pedido, as quais, no caso em apreço, respeitam às alíneas do artigo 19.º, n.º 1 da Lei do Asilo, que fundamentam o entendimento de o pedido de asilo e o pedido de autorização de residência por proteção subsidiária, serem infundados, as quais devem constar de um relatório escrito que as indique, assim se assegurando a audiência do interessado.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, em revogar a sentença recorrida e julgar a ação procedente, anulando-se o ato impugnado e condenando o SEF a retomar o procedimento.

Sem custas.

Registe e Notifique.

(Ana Celeste Carvalho - Relatora)





(Pedro Marchão Marques)





(Alda Nunes)