Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07981/14
Secção:CT - 2º JUÍZO
Data do Acordão:01/22/2015
Relator:PEREIRA GAMEIRO
Descritores: FINALIDADE DO RECURSO;
IRS – RETENÇÃO NA FONTE NÃO ENTREGUE;
IRS - NOTIFICAÇÃO PARA PAGAMENTO DAS QUANTIAS RETIDAS E NÃO ENTREGUES;
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO;
PRESCRIÇÃO
Sumário:1 – É da finalidade do recurso reapreciar a decisão recorrida e não proferir decisão sobre matéria não suscitada na instância inferior e que não seja de conhecimento oficioso.
2 – Em caso de substituição tributária a entidade obrigada à retenção é responsável pelas importâncias retidas e não entregues nos cofres do Estado (art. 28 da LGT), constituindo retenção na fonte as entregas pecuniárias efectuadas por dedução nos rendimentos pagos ou postos à disposição do titular pelo substituto (art. 34 da LGT).
3 – No caso do IRS, a natureza de pagamentos por conta da retenção na fonte está genericamente prevista no nº 1 do art. 98 do CIRS, apenas não tendo tal natureza os rendimentos sujeitos a taxas liberatórias especiais (art. 71 CIRS), mas mesmo estes passarão a ter tal natureza se o contribuinte optar pelo seu englobamento.
4 – Face a retenções na fonte sobre rendimentos sem que se tenha procedido à entrega dessas quantias retidas, a AF, in casu, limitou-se a apurar esses montantes que notificou para pagamento, não se procedendo, nesse apuramento, a verdadeira liquidação.
5 – Na situação em apreço, não há, assim, por falta de verdadeira liquidação, lugar à aplicação do instituto da caducidade, mas, unicamente, da prescrição.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I – ............................ – ......................................., Lda., recorre da sentença de fls. 70 a 81 que julgou improcedente a oposição quanto ao peticionado valor de € 43933,25 e extinta a instância por inutilidade superveniente da lide quanto ao restante, pretendendo a sua revogação na parte em que julgou improcedente a oposição quanto ao peticionado valor de € 43933,25 e respectivos juros compensatórios e de mora, por ter violado o art. 45 da LGT, absolvendo-se a recorrente daquele pagamento.

Nas suas alegações de recurso formula as conclusões seguintes:

3.1 - A presente execução teve por base as liquidações adicionais com os úmeros ....................................e ..................................., referentes respectivamente ao ano de 2002 e de 2003.

3.2 - A liquidação referente ao exercício de 2002 abrange factos tributários ocorridos antes daquele exercício, ou seja, actos que terão ocorrido em exercícios anteriores a 2002, não se sabendo, no entanto, de que actos se tratam e quando os mesmos terão ocorrido, por a Administração tributária não ter feito qualquer prova sobre os mesmos.

3.3 - De acordo com o Relatório de inspecção junto aos autos, o montante dos factos tributários referente a anos anteriores ao de 2002 é de € 43 933,25.

3.4 - Na liquidação referente ao ano de 2002, que está na base desta execução, estão incluídos juros compensatórios, para além das importâncias relativas ao "saldo' anterior ao ano de 2002 e das retenções de IRS não entregues durante o ano de 2002.

3.5 - A notificação da liquidação adicional com o n.° ............................................ foi feita à ora recorrente em 27 de Dezembro de 2006.

3.6 - Trata-se efectivamente de uma liquidação tributária e não de uma mera interpelação para pagamento, que tem impacto na situação tributária da recorrente, como a liquidação de juros compensatórlos comprova e que estava por isso sujeita ao prazo de caducidade previsto no art.° 45.° da LGT.

3.7 - Releva-se que mesmo que estejam em causa retenções na fonte de IRS, no caso do "saldo" referido no relatório de inspecção, estas retenções não podem ser vistas nem como uma autoliquidação, nem como uma liquidação feita pela recorrente, como resulta do Acórdão n.° 464/07 do STA, publicado em www.dasi.pt.. sendo, por isso, como já se concluiu, a liquidação adicional n.° ............................................., uma efectiva liquidação que tinha de cumprir com o prazo do art.° 45.o da LGT.

3.8 - A liquidação adicional referente a factos tributários anteriores ao ano de 2002, como acontece com aqueles a que se reporta o "saldo" de € 43 993,25, teriam de ter sucedido dentro dos 4 anos posteriores à ocorrência dos mesmos, ou seja, no máximo até 31 de Dezembro de 2005, se todos, por hipótese, tivessem ocorrido durante o ano de 2001.

3.9 - Não tendo isso sucedido a sentença recorrida deve ser revogada na parte em que julgou improcedente a oposição quanto ao peticionado valor de C 43 933,25 e respectivos juros compensatórios e de mora, por ter violado o art.° 45.° da LGT, absolvendo-se a recorrente daquele pagamento.

Não foram apresentadas contra alegações.

O MP, neste Tribunal, emitiu o douto parecer de fls. 113 e 114, no sentido do não provimento do recurso aderindo ao explicitado no Ac. do STA citado na sentença onde se explica bem, no seu entender, a razão porque não se pode falar na caducidade do direito à liquidação em casos como o dos autos.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
*******

II - NA decisão recorrida deu-se, como assente, a seguinte factualidade:

A) A Administração Fiscal instaurou o processo de execução fiscal n.° ......................................., contra a Oponente para cobrança coerciva de dívidas por IRS de 2002 e 2003, cfr. fls. 32.

B) A Oponente foi citada em 14/03/2007, cfr. fls. 8.

C) A petição deu entrada no Serviço de Finanças em 09/04/2007, cfr. fls. 8.

D) Na Divisão de Justiça Contenciosa foi prestada a informação a que se refere o artigo 208.° do CPPT, que constitui fls. 8 e segs., que aqui se dá por integralmente reproduzida e donde resulta com interesse para a decisão:
Relativamente aos autos de oposição acima identificados cumpre-me informar:
1. A dívida exequenda respeita a IRS retido na fonte e não entregue nos cofres do Estado relativo aos anos de 2002 e 2003 e aos rendimentos da categoria A pagos pela oponente aos seus trabalhadores, conforme fotocópias de parte do relatório da inspecção tributária, por mim extraídas e que juntei a estes autos e que constituem fls. 22 a 27 dos mesmos;
2. A oponente vem alegar, em síntese:
• A falta de notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade relativamente ao montante de € 43.993,25, valor que diz ser respeitante a retenções efectuadas em anos anteriores a 2002 e, que, por isso, já tinha caducado direito à liquidação quando da notificação efectuada em 2006-12-27;
• Duplicação de colecta relativamente ao montante de € 1.222,62, valor das retenções efectuadas em Dezembro de 2002, considerado em falta no apuramento efectuado pela Inspecção Tributária relativo esse ano e também no apuramento relativo ao ano de 2003.
Da falta de notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade.
3 As dívidas objecto da presente oposição respeitam a IRS retido na fonte pela executada ora oponente;
4 Retenções feitas quando do pagamento de rendimentos do trabalho dependente (categoria A de IRS) aos seus trabalhadores,
5 Cujos valores não foram entregues nos cofres do Estado nos prazos fixados na lei conforme foi detectado pelos serviços de inspecção tributária:
6. As retenções na fonte foram efectuadas pela sociedade ora oponente, através dos seus representantes legais, em cumprimento do disposto na última parte do nº l do art. ° 101º do CIRS;
7. Os valores das ditas retenções foram, assim, calculados, quantificados ou apurados p. ora oponente;
8. Que ficou obrigada a os entregar nos cofres do Estado até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que foram retidos — n. ° 3 do art. °98. ° do CIRS;
9. Estava a ora oponente obrigada por lei a entregar ao Estado uma quantia certa, liquida e exigível;
10. Estava, pois, liquidado o imposto devido;
l 1. Liquidado pelo própria contribuinte a quem a lei incumbe de o fazer;
12. Ficando a mesma responsável pelas respectivas importâncias retidas e não entregues, nos termos do disposto no n. ° l do art. ° 15. ° do CPT, n. ° l do art. ° 28. ° da LGT e art. ° 103.° do CIRS;
13. Quer isto dizer que, no caso dos autos, não se verificou a falta de notificação da liquidação no prazo de caducidade, como alega a oponente;
14. Pelo facto de tal direito ter sido exercido no próprio ano em que ocorreram os factos tributários, pelo substituto tributário, a ora oponente;
15. Não carece esse acto de liquidação de qualquer requisito de eficácia dependente da acção da Administração Tributária, designadamente da pretendida notificação da liquidação, o que seria redundante;
16. Sendo o acto de reter o imposto na fonte equivalente à liquidação e notificação a que se refere o n. ° l do art. "45. ° da LGT, isto é, equivalente à prática do acto que consubstancia o exercício do direito e que têm como consequência que não mais venha a ocorrer a caducidade desse direito;
17. Ficou, assim, nessa matéria, fixada a situação tributária do contribuinte que bem a conhecia e conhece;
18. É certo que o n.° 2 do art. ° 108.° do CIRS determina que, nestes casos, o s. p. seja notificado para efectuar o pagamento no prazo de 30 dias;
19. Mas esta notificação, que não tem por base acto ou decisão susceptível de alterar situação tributária do contribuinte, não é requisito de validade ou de eficácia do acto de liquidação do tributo;
20. A situação tributária já se encontrava fixada e dela tinha perfeito conhecimento o contribuinte ora oponente, por ter sido por ela própria a praticar válida e eficazmente o acto de liquidação;
21. Sendo que a notificação configura uma mera interpelação do contribuinte para que cumpra a obrigação de entrega do valor do imposto retido e que está, indevidamente, em seu poder; antes de se iniciar o processo de cobrança coerciva;
22. Notificação que terá de ser feita antes de ocorrer a prescrição da divida tributária, e não antes do fim do prazo de caducidade, uma vez que esta já foi evitada quando da liquidação efectuada pela s. p., na qualidade de substituto tributário;
23. Não fazendo qualquer sentido que o contribuinte que tem em seu poder uma determinada quantia, que lhe não pertence e que está obrigado por lei a entregar ao seu legítimo credor a faça sua, locupletando-se ilicitamente com ela, ao fim do decurso do prazo de caducidade, ao fim de, apenas, quatro anos — art° 45°, n° l da LGT;
24. Se assim se entendesse seria um ostensivo e perverso ataque aos direitos da Fazenda Pública, que o mesmo é dizer, aos direitos de todos os contribuintes cumpridores;
25. Ofensivo dos mais elementares princípios gerais de direito, designadamente, da igualdade e da justiça;
26. O que não cabe no conceito de caducidade do direito à liquidação e que certamente não quer o legislador;
27. Deste modo, os argumentos da executada ora oponente não poderão, nesta parte, proceder.

Da duplicação de colecta relativamente ao montante de € 1.222,62,
28. Haverá duplicação de colecta para efeitos do artigo anterior quando, pago por inteiro um tributo, se exigir da mesma ou de diferente pessoa um outro referente ao mesmo facto tributário e ao mesmo período de tempo. — n.° 1 do art. 205.°do CPPT
29. São, assim, requisitos de existência de duplicação de colecta:
1- Estar pago por inteiro um tributo;
2- Exigência de um outro:
a) De igual natureza;
b) Referente ao mesmo facto tributário;
c) E ao mesmo período de tempo.

30. O imposto relativamente ao qual se alega existir duplicação de colecta não se encontra pago;
31. De onde resulta que se não verifica o primeiro requisito acima referido "Estar pago por inteiro um tributo ", muito embora se verifiquem os restantes requisitos:
32. Daí que, a nosso ver, não existe a invocada duplicação de colecta tal como é definida no citado n. °1 do art. ° 205. ° do CPPT;
Contudo,
33. Da análise às fls. 11 e 12 do relatório da inspecção tributária verifica-se que houve um erro no apuramento do imposto em falta relativo ao ano de 2003 no montante de €237,14;
34. De onde resulta que o devido é de apenas €4.574,96;
35. O valor do imposto entregue pela guia n. ° 41213186420, no total de € 1.970,96 foi imputado aos meses de Dezembro de 2002, €985,48, e Janeiro de 2003, €985.48;
36. No mapa de apuramento do imposto em falta relativo ao ano de 2002 (penúltima linha) foi mencionado como pago, por aquela guia, o montante de imposto de € 985.48 relativo Dezembro de 2002—fls. 25;
37. No mapa de apuramento do imposto em falta relativo ao ano de 2003 (linha do mês Fevereiro) foi mencionado o valor total da mesma guia, € 1.970,96, quando deveria ter sida mencionado apenas o valor relativo ao mês de Janeiro de 2003. €985,48—fls. 26;
38. Deste lapso resulta que a soma dos valores entregues relativos às retenções de 2003 exceda em €985,48 o valor efectivamente entregue que é de apenas €8.873,67 (9.859,15 - 985,48);
39. Abatendo este valor de € 8.873,67 ao valor total das retenções efectuadas em 2003 que é € 13.421,63, obtém-se o valor do imposto retido e não entregue relativa a esse ano de € 4.547,96;
40. No referido documento de fls. 26 dos autos a operação de apuramento do imposto em falta no ano de 2003 deveria ter sido, em vez do que ali consta, o seguinte:
-Valor de imposto retido no ano— 13.421,63
- Pagamentos conforme guias modelo 41 - 8.8 73,6 7
Imposto em falta ano 2003 4.54 7,96
Ou então, segundo o esquema do relatório da inspecção:
- Valor de imposto retido no ano ~ 13.421,63 + 985,48 (Dez. 12002) =
14.407,11
- Pagamentos conforme guias modelo 41 - 9.85915
Imposto em falta ano 2003 4.547,96
41. Existindo, assim, um erro imputável aos serviços no apuramento do imposto em falta relativo ao ano de 2003 que, em vez de ser de € 4.785,10, deveria ser de, apenas, €4.547,96;
42. Existindo erro imputável aos serviços o mesmo poderá ser corrigido oficiosamente, ao abrigo do disposto no n. ° l do art. ° 78. ° da LGT;
43. Correcção que se propõe seja feita pelos serviços competentes.
Conclusão
44. Não se verificando a invocada falta de notificação da liquidação do tributo dentro do prazo de caducidade a presente oposição não poderá, a meu ver, proceder nessa parte;
45. A invocada duplicação de colecta também se não verifica;
46. Contudo, parece existir erro imputável aos serviços no apuramento do valor do imposto em falta relativo ao ano de 2003 que, como se disse em 33. °, o valor apurado excede em € 237,14 o valor devido;
47. Erro que se propõe seja corrigido pelo serviço competente da Administração Tributária.
48. O que fará com que, na parte correspondente ao referido valor de € 237,14, a execução seja extinta (n.° l do artº 270.° do CPPT) e, em consequência, a oposição também seja, na mesma medida, extinta por inutilidade superveniente da lide.
À consideração superior.
Lisboa, 2007-05-29.»

D) Sobre a informação a que se refere a alínea anterior recaiu o seguinte despacho (fls. 31):
«Concordo com o informado
Extraiam-se fotocópias dos documentos de fls. l a 3 e 27 a 31 dos autos e entreguem-se as mesmas à Chefe da Divisão de Justiça Contenciosa desta D. F. para que mande diligenciar no sentido da realização da revisão oficiosa para correcção do erro no apuramento do IRS em falta relativo ao ano de 2003 a que se refere a informação supra.
De seguida remetam-se os autos

E) A Oponente foi notificada das liquidações que serviram de base à extracção dos títulos executivos em 27/12/2005, cfr. fls. 8 e 9.

Aí se consignou que todos os factos têm por base probatória, o exame dos documentos referidos em cada ponto, o processo administrativo, o acordo das partes e as informações oficiais, sendo que para a decisão da causa, sem prejuízo das conclusões ou alegações de matéria de direito produzidas, de relevante, nada mais se provou.

Na al. E) consta a notificação das liquidações em 27.12.2005, mas o ano aí referido deve-se a lapso evidente, pois que pela referência aí feita a fls. 8 e 9 o ano da notificação foi 2006 e não 2005, pelo que se corrige a data da notificação referida nessa al. para 27/12/2006.
********

III – Expostos os factos, vejamos o direito

A oposição foi julgada improcedente quanto ao peticionado valor de €43.933,25 (o valor correto como resulta dos autos é € 43. 993,25) e quanto ao restante foi julgada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, no entendimento (seguindo a doutrina expendida no Ac. do STA de 14.11.2007, rec. 730/07, consultável em www.dgsi.pt) de que quanto à quantia de € 43993,25 (saldo anterior a 2002 de IRS retido e não entregue, trabalho dependente) a AF na acção de fiscalização detetou retenções na fonte efectuadas pela oponente no decurso do ano de 2002 períodos anteriores sobre determinados rendimentos sem que tenha entregue essas quantias retidas nos cofres do estado, como lhe competia e estava obrigada e, perante isso, só se limitou a apurar os montantes retidos e não entregues e a exigir-lhe o cumprimento da obrigação que sobre ela impendia enquanto substituta tributária, não tendo procedido a qualquer liquidação e, assim sendo, não há lugar à aplicação a tal situação do instituto da caducidade, mas unicamente da prescrição que ainda não ocorreu, donde o invocado fundamento da falta de notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade não se verificar e no entendimento de que a parte objeto de correcção pela administração fiscal tem repercussão directa na presente oposição, pois, altera parcialmente o seu objeto quanto à referida correcção e, nessa parte, a presente lide tornou-se parcialmente inútil.

Atentas as conclusões das alegações delimitadoras do objeto do recurso, temos que a recorrente dissente do decidido por a liquidação referente ao exercício de 2002 abranger factos tributários ocorridos antes daquele exercício, ou seja, actos que terão ocorrido em exercícios anteriores a 2002, não se sabendo, no entanto, de que actos se tratam e quando os mesmos terão ocorrido, por a Administração tributária não ter feito qualquer prova sobre os mesmos, sendo que na liquidação referente a 2002 que está na base desta execução estão incluídos juros compensatórios, para além das importâncias relativas ao "saldo' anterior ao ano de 2002 e das retenções de IRS não entregues durante o ano de 2002.
Entende que a notificação da liquidação adicional com o n.° ............................................. que lhe foi feita em 27 de Dezembro de 2006 é efectivamente de uma liquidação tributária e não de uma mera interpelação para pagamento, que tem impacto na situação tributária da recorrente, como a liquidação de juros compensatórios comprova e que estava por isso sujeita ao prazo de caducidade previsto no art.° 45.° da LGT, sendo que a liquidação adicional referente a factos tributários anteriores ao ano de 2002, como acontece com aqueles a que se reporta o "saldo" de € 43 993,25, teriam de ter sucedido dentro dos 4 anos posteriores à ocorrência dos mesmos, ou seja, no máximo até 31 de Dezembro de 2005, se todos, por hipótese, tivessem ocorrido durante o ano de 2001 e daí que a sentença, no seu entendimento, deva ser revogada na parte em que julgou improcedente a oposição quanto ao peticionado valor de € 43 933,25 e respectivos juros compensatórios e de mora, por ter violado o art.° 45.° da LGT, absolvendo-se a recorrente daquele pagamento.

Afigura-se-nos não assistir razão à recorrente.

Como se verifica das conclusões das alegações, nestas não vem questionado o decidido quanto à extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, sendo que o recurso se cinge à improcedência da oposição quanto ao peticionado valor de € 43.933,25 (aliás € 43993,25 como já referido), pretendendo que a oposição proceda quanto a esse valor e respectivos juros compensatórios e de mora.

Importa, desde já, referir que a ora recorrente foi notificada para pagar as quantias em execução referentes ao ano de 2002, nos termos de fls.8 e 9, em 27.12.2006, onde consta a aí denominada liquidação adicional nº .............................. no montante de € 47.794,70 e as diversas notas de juros compensatórios no montante de € 10718,99 relativas a IRS do exercício de 2002. (cfr. fls. 8 e 9).

Na petição de oposição não foi suscitada qualquer questão relativa aos juros compensatórios em cobrança coerciva referentes ao peticionado valor de € 43993,25, pois que só se invocou no art. 12 da pi. que deverá ser deduzida à quantia exequenda relativa ao ano de 2003 a importância de €1222,62, bem como os respectivos juros compensatórios e moratórios, por duplicação de colecta. Assim, a invocação, agora feita, no recurso, sobre os juros compensatórios referentes ao peticionado valor, não poderá ser objeto de conhecimento e abordagem, nesta instância, por se tratar de matéria nova, sendo que o recurso visa a reapreciação da decisão e não proferir decisão sobre matéria que não foi suscitada na 1ª instância e que não é de conhecimento oficioso.

Feita esta abordagem delimitativa, importa, agora, apreciar se se verifica o invocado fundamento de oposição consistente na falta de notificação da liquidação do tributo (€ 43993,25 anterior a 2002) no prazo da caducidade (cfr. art. 204 nº 1 al. e) do CPPT), sendo que a oponente, ora recorrente, só foi notificada para pagar essa quantia, em 27.12.2006.
A este propósito, somos de aderir à posição defendida na decisão ancorada na doutrina expendida no Ac. do STA aí referido a cuja fundamentação também aderimos e que, por isso, seguiremos na situação em apreço. Nesse ac. refere-se, em situação idêntica à dos autos:
Nos termos do n.° 1 do artigo 98.° do CIRS, no acto de pagamento de determinadas quantias previstas na lei, a entidade devedora dos rendimentos sujeitos a retenção na fonte é obrigada a proceder à dedução dos montantes correspondentes à aplicação das taxas devidas, devendo as quantias retidas ser entregues até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que foram deduzidas (n.° 3 do mesmo preceito legal).
Estamos, assim, perante um caso de substituição tributária, prevista no artigo 20.° da LGT, na medida em que a prestação tributária, por imposição legal, é exigida a pessoa diferente do contribuinte, através do mecanismo da retenção na fonte do imposto devido.
E, nos termos do n.° l do artigo 28.° da LGT, em caso de substituição tributária, a entidade obrigada à retenção é responsável pelas importâncias retidas e não entregues nos cofres do Estado, ficando o substituído desonerado de qualquer responsabilidade no seu pagamento.
Assim, as entregas de tributos efectuadas por dedução nos rendimentos pagos ou postos à disposição do seu titular pelo substituto tributário constituem retenção na fonte (artigo 34° LGT).
Em regra, a retenção na fonte é feita por conta do imposto devido a final.
E, no caso do IRS, a natureza de pagamentos por conta da retenção na fonte está genericamente prevista no n.° l do artigo 98.° do CIRS, apenas não tendo tal natureza os rendimentos sujeitos a taxas liberatórias especiais (artigo 71.° CIRS), mas mesmos estes passarão a ter tal natureza se o contribuinte optar pelo seu englobamento no rendimento total.
Daí que nestas situações se não possa falar ainda em liquidação efectuada pela AF nem mesmo em auto liquidação, entendendo-se esta como a liquidação feita pelo sujeito passivo, seja ele o contribuinte directo, o substituto legal ou o responsável legal (artigos 82.°, 84.° e 18.° da LGT), pois o procedimento de liquidação só se há-de instaurar com as declarações dos contribuintes (artigo 59.°CPPT).
Tal não significa, contudo, que, quando detectada pela AF uma situação em que o sujeito passivo não declarou factos tributários ou foi liquidado inicialmente imposto em montante inferior ao devido, a AF não proceda a uma nova liquidação oficiosamente.
E é evidente que nestas circunstâncias só o poderá fazer se não tiver decorrido ainda o prazo previsto no artigo 45.° da LGT, ou seja, se não tiver caducado já o direito de liquidação, e notificando o contribuinte para que este dela possa tomar conhecimento e eventualmente contra ela reagir”.

Na situação em apreço, sucedeu que na acção de fiscalização à ora recorrente foram detectadas retenções na fonte por ela efectuadas no decurso do ano de 2002 períodos anteriores (sendo o saldo anterior de IRS retido e não entregue de €43993,25) sobre determinados rendimentos sem que ela tenha procedido à entrega das quantias retidas nos cofres do Estado, como lhe competia e legalmente estava obrigada e, perante isso, a AF limitou-se a apurar esses montantes como se verifica do relatório da inspecção a fls. 29 (montante total de 47.794,70), montante este que foi notificado como liquidação adicional nº. ................................., em 27.12.2006 (cfr. fls. 8 e 9).
Em situação como a presente, entendeu-se no citado ac. do STA que não se procedeu a verdadeira liquidação, pois que abrangendo esta, em sentido amplo, todas as operações tendentes à determinação do montante do imposto a pagar pelo contribuinte (incidência, determinação da matéria colectável, liquidação em sentido técnico - aplicação da taxa legal do imposto à matéria colectável apurada - e cobrança), efectivamente neste caso não houve a prática de qualquer desses actos do processo de liquidação quer por parte da AF quer do próprio contribuinte.
E não se podendo falar, pois, como se refere no ac. citado, duma verdadeira liquidação, não há lugar à aplicação a tal situação do instituto da caducidade, mas unicamente da prescrição que ainda não ocorreu.
Não se verifica, assim, a invocada falta de notificação da liquidação do tributo no prazo da caducidade como fundamento de oposição à execução.

Entende a recorrente que a execução teve por base as liquidações adicionais com os nºs ..................................... e .................................................., mas nisto não lhe assiste razão, pois que esses nºs são os nºs de ID.DOC.ORIG. que constam das certidões de dívida de fls. 10 e 11 e os nºs das liquidações são os que constam de fls. 8 e 9 (quanto às dividas de 2002) e de fls. 6 quanto às dívidas de 2003, onde vêm discriminadas as liquidações de imposto e as demonstrações de juros compensatórios, sendo que na liquidação de imposto de 2002 não estão incluídos juros compensatórios que foram liquidados à parte. O imposto e os juros compensatórios de 2002, com liquidações separadas e autónomas, só estão a ser cobrados conjuntamente através da mesma certidão de dívida e com o mesmo nº de ID.DOC.ORIG.
Assim, a liquidação nº..................................., notificada em 27.12.2006, onde está incluído o peticionado valor não constitui uma verdadeira liquidação e daí que não tenha aplicação, na situação, o instituto da caducidade, donde a improcedência das conclusões do recurso.

Improcede, pois, o recurso, sendo de manter a decisão recorrida que não nos merece censura.

IV - Termos em que acordam os Juízes deste Tribunal em, negando provimento ao recurso, manter a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 22.01.015
Pereira Gameiro (Relator)
Anabela Russo
Lurdes Toscano