Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06750/13
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:02/13/2014
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:BENEFÍCIOS FISCAIS. REVOGAÇÃO. SGII.
Sumário:1. A perda de benefícios fiscais concedidos às Sociedades de Gestão e Investimento Imobiliário (SGII), determinada pela revogação da autorização de constituição, pode operar a partir de datas diversas, inclusive, desde a data de arranque do exercício da atividade, conforme ou em função do evento, da ocorrência justificativa da mandada revogação e dos termos concretos em que esta é publicada, não tendo, necessariamente, de ser estabelecida pela Inspeção-Geral de Finanças (IGF), entidade supervisora.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
I
... – INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, S.A., contribuinte n.º ... e com os demais sinais constantes dos autos, impugnou, além do mais, liquidações adicionais de Imposto Municipal de Sisa e juros compensatórios, efetuadas em 1999 e respeitantes a aquisições dos anos de 1992 e 1995, tendo, a final, no Tribunal Tributário de Lisboa, sido proferida sentença, que decidiu julgar a impugnação improcedente.
Refutando o judiciado, a impugnante interpôs recurso jurisdicional, cuja alegação finaliza com as seguintes conclusões: «
A. Vem o presente recurso interposto da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa de 27.12.2012, proferida após redistribuição dos autos, em 5.11.2012, à equipa de juízes criada ao abrigo da Lei n.º 59/2011, de 28.11, que declarou improcedente a impugnação das liquidações adicionais de Sisa emitidas sobre o valor dos imóveis sitos na freguesia de Campolide, em Lisboa, melhor identificados nos autos, adquiridos pela ora Recorrente entre 27 de Janeiro de 1992 e 27 de Dezembro de 1995.
B. As liquidações adicionais impugnadas foram todas emitidas com fundamento num mesmo relatório de fiscalização da Inspecção-Geral de Finanças que determinou a “perda dos benefícios fiscais que foram concedidos [à ora Recorrente] a partir de 31 de Dezembro de 1995.”
C. Entendeu, porém, a M.a Juiz a quo, por lapso manifesto, que “no âmbito de uma acção de inspecção, a AT propôs a revogação da autorização e perda dos benefícios fiscais adquiridos pela Impugnante (...) Posteriormente, tendo por base o relatório, foi revogada a autorização concedida.”
D. Daí concluiu a M.a Juiz a quo que uma vez “incumpridas desde o início as obrigações legais resultantes do regime legal que lhe conferia a isenção de Sisa, não faz sentido que a caducidade da isenção opere apenas desde 31/12/1995”.
E. Sucede que nem foi o relatório de inspecção tributária que serviu de fundamento à revogação da autorização conferida pela Portaria n.º 330/91, de 24.09, nem tão-pouco foi a AT quem propôs essa revogação.
F. A revogação de autorização de constituição da ora Recorrente como ... e a perda dos seus benefícios fiscais decorreu exclusivamente da proposta do relatório da Inspecção-Geral de Finanças n.º 3.527/IE(NIP)/97, de 27.10.1998 (cf. doc.º n.º 6 junto aos autos com a P.I.), surpreendentemente ignorado, na íntegra, pela sentença recorrida.
G. A lei sujeita as ... à supervisão da Inspecção-Geral de Finanças, e não à supervisão da AT (cfr. artigo 13.º). A proposta de revogação da autorização de constituição de ... e bem assim de consequente perda dos seus benefícios fiscais é da competência exclusiva da mesma Inspecção-Geral de Finanças pelo que jamais poderia decorrer de proposta da AT, muito menos de um qualquer relatório de inspecção tributária (cfr. artigo 9.º).
H. Tendo a Inspecção-Geral de Finanças proposto que a revogação da autorização apenas causasse a perda dos benefícios fiscais concedidos à ora Recorrente “a partir de 31/12/1995”, proposta esta sancionada integralmente e sem reservas pelo despacho do Ministro das Finanças de 16 de Dezembro de 1998 subjacente à Portaria n.º 25/99, de 12.01, não se vislumbra como possa a M.a Juiz a quo afirmar “não faz sentido que a caducidade da isenção opere apenas desde 31/12/1995”.
I. Nem se vislumbra, tão-pouco, razão para interpretar as normas jurídicas em que a ora Recorrente baseou o seu pedido - maxime, os artigos 5.º, 8.º e 9.º, todos do Decreto-Lei n.º 135/91, de 4.04, na redacção dada pela Lei n.º 51/91, de 3 de Agosto - naquele sentido, como retroagindo os efeitos fiscais da revogação a 27 de Janeiro de 1992, em franca oposição com o douto parecer do DMMP junto aos autos.
J. Razões pelas quais a decisão recorrida não se poderá manter, inquinada que está por não ter apreciado convenientemente as questões submetidas a julgamento, quer de facto quer de Direito.
K. Não apreciou convenientemente as questões de facto, uma vez que perante a prova carreada para os autos, a M.a Juiz a quo deveria ter considerado assentes factos que se afiguram de capital importância para a boa solução e compreensão da causa, mas que, ao invés, foram pura e simplesmente desconsiderados, não constando nem da lista dos factos provados, nem dos factos não provados.
L. A insuficiência do Probatório poderá no entanto ser suprida por este Venerando Tribunal Central Administrativo, nos termos do art.º 712.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no art.º 2º, al. f), do Código de Procedimento e Processo Tributário, uma vez que o processo fornece já todos os elementos de prova necessários ao seu aditamento.
M. São 15 os concretos pontos da matéria de facto que a ora Recorrente considera incorrectamente julgados, porque omitidos, os quais se encontram elencados sob alegação 16ª deste recurso e que aqui dá por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos, com a respectiva enunciação dos concretos meios probatórios constantes do processo que impunham decisão diversa da recorrida que os acompanham nessa sede.
N. Ao que acresce a impugnação da alínea F) do Probatório porque falsa, uma vez que a M.a Juiz a quo transcreveu parcialmente o relatório da Inspecção-Geral de Finanças n.º 3.527/IE(NIP)/97, indicando erradamente tratar-se do relatório de inspecção tributária da DGCI.
O. O teor do ponto 4 das conclusões do referido relatório da IGF deverá de resto ser individualizado em alínea autónoma do Probatório atenta a sua capital importância para a resolução do litígio, o que também se requer.
P. Não apreciou convenientemente as questões de Direito, uma vez que interpretou e aplicou erradamente o disposto nos artigos 5.º, 8º e n.º 3 do art.º 9.º, todos do Decreto-Lei n.º 135/91, de 4 de Abril na redacção dada pela Lei n.º 51/91, de 3 de Agosto.
Q. Uma correcta interpretação e aplicação desses comandos normativos levaria necessariamente à conclusão de que os actos de liquidação impugnados são ilegais por violação do disposto na alínea c) do número 1 do artigo 26º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, na redacção dada pela Lei n.º 65/90, de 28 de Dezembro. Por múltiplas razões,
R. Desde logo, porque o Ministro das Finanças revogou a autorização de constituição da ora Recorrente como ... com fundamento na especial gravidade que a violação dos objectivos quantitativos da actividade de arrendamento consignados nos referidos artigos 5º e 8º assumiu no ano de 1996.
S. Logo, dessa revogação não decorre a perda retroactiva das isenções de Sisa de que a ora Recorrente beneficiou em aquisições de imóveis até 31 de Dezembro de 1995.
T. Quer porque pelo menos até essa data a ora Recorrente não se podia considerar em incumprimento dos artigos 5º e 8º do Decreto-Lei n.º 135/91, de 4 de Abril,
U. Quer porque a Portaria n.º 25/99 do Senhor Ministro das Finanças, considerando a situação da ora Recorrente no ano de 1996 como determinante para a decisão de revogação, acolhe favoravelmente a proposta do relatório de fiscalização da Inspecção-Geral de Finanças de “perda de todos os benefícios fiscais adquiridos a partir de 95-12-31”.
V. Finalmente, porque a própria lei não determina, em caso algum, a caducidade dos benefícios fiscais das ... como mera consequência do incumprimento dos critérios impostos pelo Decreto-Lei n.º 135/91, de 4 de Abril.
W. A lei determina coisa diferente: a perda de quaisquer benefícios fiscais concedidos à ... a partir da data em que ocorreu a situação que deu origem à dita revogação (cf. n.º 3 do artigo 9º do Decreto-Lei n.º 135/91, de 4 de Abril).
X. A M.a Juiz a quo decerto não se terá apercebido que a redacção do referido n.º 3 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 135/91, de 4 de Abril, foi alterada pela Lei n.º 51/91, de 3 de Agosto, deste passando a constar que “A revogação da autorização referida no artigo 3.º determina a perda de quaisquer benefícios concedidos à ... a partir da data em que ocorreu a situação que deu origem à citada revogação”, caso contrário não teria transcrito para a sentença a redacção originária da referida norma e nela fundado o discurso legitimador do seu arresto.
Y. A data em que ocorreu a situação que deu origem à dita revogação foi determinada pela Inspecção-Geral de Finanças, na sua qualidade de entidade supervisora da actividade da ora Recorrente, a partir de 31 de Dezembro de 1995.
Z. Isto é, entendeu a Inspecção-Geral de Finanças - e concordou o Ministro das Finanças - que só a partir dessa data se verificou o incumprimento dos critérios quantitativos da actividade consignados nos artigos 5º e 8º que “pela sua frequência ou pelos valores envolvidos, assume especial gravidade”.
AA. Assim, a revogação da autorização da ora Recorrente como ... não determinou a perda de quaisquer benefícios fiscais concedidos antes de 31 de Dezembro de 1995.
BB. Os actos de liquidação impugnados incidem sobre aquisições de imóveis adquiridos pela ora Recorrente, enquanto ... , entre 27 de Janeiro de 1992 e 27 de Dezembro de 1995, os quais à data beneficiaram de isenção de imposto municipal de sisa ao abrigo do artigo 26º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
CC. Não pode por isso proceder a interpretação da M.a Juiz a quo segundo a qual dado o incumprimento dos artigos 5.º e 8.º da Lei das ... “...então, o benefício fiscal que lhe estava associado ficará, de igual modo, sem efeito ab initio” porque isso constitui uma flagrante violação do n.º 3 do art.º 9º da Lei das ... , na redacção em vigor à data dos factos.
DD. Em suma: a M.a Juiz a quo sentenciou a perda dos benefícios fiscais que foram concedidos à ora Recorrente desde 27 de Janeiro de 1992 onde a IGF expressamente determinara a perda dos benefícios fiscais que lhe foram concedidos a partir de 31 de Dezembro de 1995.
EE. Com isso, a M.a Juiz a quo violou frontalmente o disposto nos artigos 5.º, 8º e n.º 3 do art.º 9.º, todos do Decreto-Lei n.º 135/91, de 4 de Abril na redacção dada pela Lei n.º 51/91, de 3 de Agosto.
FF. E os artigos 2.º e 111.º, 202.º e 266.º, todos da Constituição da República, porque fundamentou ex novo os actos tributários impugnados em violação do princípio constitucional da separação de poderes e reserva da Administração (na determinação e definição primárias do conteúdo do ato) na parte em que fez retroagir a 27 de Janeiro de 1992 os efeitos de um ato que expressamente se dirigia no tempo aos dias 31 de Dezembro de 1995 e seguintes.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve ao presente recurso ser dado integral provimento, e consequentemente revogada a douta sentença recorrida, por erro de julgamento de facto e de Direito, e proferido acórdão deste Venerando Tribunal que em substituição do Tribunal a quo julgue a impugnação totalmente provada e procedente, tudo com o mais da lei. »
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Não houve lugar a contra-alegação.
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A Exma. Procuradora-geral-adjunta emitiu parecer, no sentido de que o recurso deve proceder.
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Colhidos os vistos legais, compete conhecer.
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II
Mostra-se consignado, na sentença: «
III. FUNDAMENTAÇÃO
1. Dos Factos
Compulsados os autos e analisada a prova produzida, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os factos infra indicados:
A) A Impugnante é uma sociedade comercial, constituída em 27/01/1992, como Sociedade de Gestão e Investimento Imobiliário (... ), ao abrigo do DL 135/91, e autorizada pela Portaria n.º 330/91, de 24 de Setembro (cfr. fls. 62 do Processo Administrativo).
B) Entre 27/01/1992 e 27/12/1995 a Impugnante adquiriu imóveis situados na freguesia de Campolide, em Lisboa, para neles construir um empreendimento imobiliário, nos termos do seu objecto social e com base no projecto que serviu de base ao seu pedido de autorização de constituição (cfr. fls. 62 e ss do Processo Administrativo).
C) As aquisições mencionadas na alínea anterior ficaram isentas de SISA ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do ar.º 26.º do EBF (cfr. fls. 62 e ss do Processo Administrativo).
D) Em 12/01/1999 a portaria n.º 330/91 foi revogada pelo Ministro das Finanças (cfr. fls. 71 do Processo Administrativo).
E) A impugnante foi objecto de uma acção de inspecção, em sede de SISA, no âmbito da qual foram efectuadas correcções ao montante deste imposto, com fundamento, em síntese, na caducidade do da isenção de que a Impugnante beneficiava ao abrigo do disposto no art. 26.º, n.º 1, al. b) do CPPT (cfr. relatório de inspecção de fls. 62 e ss do Processo de Reclamação Graciosa).
F) As correcções mencionadas na alínea anterior foram efectuadas com o seguinte fundamento, que aqui se transcreve na parte com interesse para a decisão (cfr. relatório de inspecção tributária a fls. 61 e ss do Processo de Reclamação Graciosa, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido):
“VII-CONCLUSÕES
Do anterior exposto, extraem-se as seguintes conclusões essenciais:
1- A ... - Sociedade de Gestão e Investimento Imobiliário SA, Sociedade que se encontra submetida á disciplina do DL. n.º 135/91 na redacção dada pelas leis n.ºs 51/91, de 3 de Agosto e 2/92, de 9 de Março.
2- No âmbito da sua actividade, procedeu à construção própria, em regime de empreitada, no período de 1993/96, de um empreendimento designado “... ”, constituído pelo Lote 2, destinado a habitação, com o valor de construção de cerca de 12 954 805 contos, encontrando-se ainda, em curso de construção, o Lote 1, destinado a escritórios.
Uma vez que o referido Lote 2, representa uma parcela muito relevante do seu património (atingiu 72% e 74% em 1995 e 1996, respectivamente), a ... ao proceder à sua comercialização, violou, de forma continuada, o limite de 15% fixado para o artigo 5° (composição patrimonial e gestão), do D.L. n.º 135/91, de 4 de Abril, pelo que, ocorreu na contra-ordenação prevista e punível pelo artigo 14°, daquele decreto-lei (vd. Fls.11).
3- Por outro lado, nunca destinou ao arrendamento habitacional qualquer parcela do seu património predial, pelo que não respeitou o valor de 45% fixado para o rácio previsto no artigo 8° do Decreto-Lei n.º 135/91, o que configura a prática da contra-ordenação prevista e punível pelo artigo 14° do mesmo diploma legal (vd. fls. 10).
4- Assim, tendo ocorrido violação grave e de forma continuada, do disposto nos artigos 5º e 8° do Decreto-Lei n.º 135/91, de 4 de Abril, na redacção dada pela Lei n.º 51/91, de 3 de Agosto, propomos, que seja revogada, à ... , a autorização para a prática da actividade cometida às ... , com a perda de todos os benefícios fiscais adquiridos a partir de 95-12-31, conforme decorre do disposto no n.º 5 alínea e) do artigo 3.º e no n.º 3 do artigo 9.º, daquele diploma legal (vd fls.11).”
G) Na sequência da acção de inspecção foram emitidas, em 1999, as seguintes liquidações de Sisa (cfr. documentos de fls. 41 a 47 dos autos):
a. No montante de Esc. 357.500.000$00, devida pela aquisição efectuada por escritura notarial de 27/01/1992;
b. No montante de Esc. 7.650.000$00, devida pela aquisição efectuada por escritura notarial de 18/12/1992;
c. No montante de Esc. 1.000.000$00, devida pela aquisição efectuada por escritura notarial de 27/01/1995;
d. No montante de Esc. 1.500.000$00, devida pela aquisição efectuada por escritura notarial de 27/06/1995;
e. No montante de Esc. 26.362.500$00, devida pela aquisição efectuada por escritura notarial de 27/12/1995.
H) Em 04/02/2000 a Impugnante apresentou reclamação graciosa das liquidações mencionadas na alínea anterior (cfr. requerimento a fls. 2 e ss do Processo de Reclamação Graciosa).
I) Em 15/01/2001 foi elaborada uma proposta de decisão da reclamação graciosa, nos termos do disposto no art. 98.º, n.º 2 do CPT, pelo Chefe do serviço de Finanças de Lisboa 10, que em síntese considerou que a reclamação deveria ser atendida na totalidade, com a consequente anulação das liquidações, porquanto só em finais de 1998 estavam reunidas as condições para recomendar a revogação da autorização, e por conseguinte, face ao disposto no n.º 3 do art. 9.º do DL n.º 135/91, de 4 de Abril, a perda dos benefícios concedidos à ... é a partir da data em que ocorreu a situação que deu origem à revogação (cfr. proposta de decisão de fls. 240 e 241, do Processo de Reclamação Graciosa).
J) Em 30/09/2002, foi elaborada proposta de decisão de indeferimento da reclamação graciosa, pela 1.ª Direcção de Finanças de Lisboa, que em síntese entendeu que a Impugnante nunca cumpriu integralmente os requisitos a que se encontrava obrigada, devendo os efeitos da perda dos benefícios fiscais reportar-se à data da constituição da sociedade (cfr. proposta de decisão de fls. 201 e ss do Processo de Reclamação Graciosa).
K) Em 04/10/2002 foi proferido despacho pelo Director de Finanças que ordenou a notificação do parecer mencionado na alínea anterior à Impugnante, enquanto projecto de decisão sobre a reclamação graciosa (cfr. fls. 201 do Processo de Reclamação Graciosa).
L) Na sequência da notificação da Impugnante para o efeito, esta exerceu o seu direito de audiência prévia, invocando, em síntese que “a proposta de indeferimento encontra-se em contradição com a proposta de decisão sobre a mesma reclamação em tempo proferida pelo competente órgão periférico local, sem que o parecer subjacente e a informação anexa ao projecto de decisão ora notificado lhe faça qualquer alusão ou procure ultrapassar o seu sentido ou conteúdo.” (cfr. fls. 234 do Processo de Reclamação Graciosa).
M) Em 04/10/2002 foi proferido despacho que indeferiu a reclamação graciosa, na qual consta, na parte com interesse para a decisão que “a proposta de decisão proferida pelo órgão periférico local, nos termos do n.º 2 do art. 73.º do CPPT, não é vinculativa para a entidade competente para decidir (no caso o dirigente do órgão periférico regional), nem constitutiva de direitos na esfera do contribuinte. Fazenda parte integrante do processo, foi a mesma tida em consideração na apreciação dos factos, encontrando-se subjacente à fundamentação da proposta de decisão proferida pela entidade competente a razão pela qual o sentido dessa decisão foi diferente” (cfr. fls. 242 do Processo de Reclamação Graciosa).
N) Em 06/02/2003 a Impugnante apresentou recurso hierárquico da decisão mencionada na alínea anterior (cfr. requerimento a fls. 255 do Processo de Recurso Hierárquico).
O) Em 16/12/2008 foi proferido despacho que indeferiu o recurso hierárquico (cfr. decisão de fls. 300 e ss do Processo de Recurso Hierárquico).
P) A Impugnação foi apresentada junto do Tribunal Tributário de Lisboa em 16/03/2009 (cfr. fls. dos autos).
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Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos, no processo administrativo em apenso.
Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados. »
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Dentre os motivos de crítica, à sentença, coligidos pela Recorrente/Rte, figura, nitidamente, o apontamento de errado julgamento da matéria de facto (1), aspeto que, por razões de precedência lógica, importa, desde já, solucionar.
Em primeira linha, propõe a adição, à factualidade provada, dos dados, de seguida, transcritos, contendo, ainda, a identificação dos elementos probatórios reputados relevantes; «
1. A administração tributária fundamentou os actos de liquidação impugnados na revogação da autorização concedida pela Portaria n.° 330/91, publicada a 09.10, pela Portaria n.° 25/99, de 12.01.
[P.I. 5° e 149° e ss.; Contestação 91°; prova: Doc.º n.º 1 junto com a P.I., a fls. 81]
2. A Portaria n.° 25/99, de 12.01, decorreu do despacho do Senhor Ministro das Finanças de 16.12.1998 que sancionou integralmente as conclusões do relatório de fiscalização da IGF com n.° 3.527/IE(NIP)/97, de 27.10.1998.
[P.I. 26° e 229°; Contestação 109°; prova: Doc.º n.º 6 junto com a P.I., a fls. 103 e ss.]
3. A Ordem de Serviço n.° 91027, de 08.03.99, emitida pelos serviços de inspecção tributária da Direcção de Finanças de Lisboa e que deu origem ao relatório de inspecção tributária destes autos, teve por base o relatório da Inspecção-Geral de Finanças n.° 3.527/IE(NIP)/97, de 27.10.1998.
[P.I. 151° e ss, prova: confessado a art°s 75° e 89° da Contestação]
4. Esse relatório de fiscalização da IGF propôs “a perda de todos os benefícios fiscais adquiridos a partir de 95-12-31, conforme decorre do disposto no n.° 5 alínea e) e no n.° 3 do artigo 9.º [do Decreto-Lei n.° 135/91, de 4 de Abril, na redação dada pela Lei n.° 51/914, de 3 de Agosto].”
[P.I. 226°, prova: Doc.º n.º 6 junto com a P.I.]
5. O despacho do Senhor Ministro das Finanças de 16.12.1998 e os despachos do Inspector de Finanças-Chefe, da Subinspectora-Geral e do Inspector-Geral que o antecederam, dados sobre o Relatório da IGF e todos com ele concordantes, não fizeram qualquer ressalva nem estabeleceram qualquer limitação à conclusão de que a perda de benefícios fiscais da ora Recorrente produzisse efeitos “a partir de 95-12-31”.
[P.I. 230º; prova: Doc.º n.º 6 junto com a P.I.]
6. A IGF teve conhecimento da evolução da actividade da ora Recorrente e suas vicissitudes através da análise dos seus relatórios de gestão e contas dos exercícios sociais, remetidos regular e pontualmente, nos termos da lei.
[P.I. 234º; prova: o teor dos Relatórios de Gestão juntos com a petição de reclamação graciosa nos autos com o processo instrutor]
7. A IGF teve conhecimento pelo relatório de gestão da ora Recorrente relativo ao exercício de 1994, da celebração dos primeiros “115 contratos promessa de compra e venda de apartamentos, o que corresponde a 44% dos 260 existentes”.
[P.I. 235º; prova: o teor do Relatório de Gestão do Exercício de 1994]
8. A IGF teve conhecimento, pelo mesmo relatório de gestão, ter a ora Recorrente “constatado que a actividade de arrendamento não tem encontrado procura sustentada nos potenciais clientes que visitam o nosso stand de vendas. Esse facto tem condicionado, de forma marcante, a concretização dos objectivos da sociedade quanto a esse tipo de comercialização, dificultando a concretização dos rácios exigidos a uma Sociedade Gestora de Investimento Imobiliário.”
[P.I. 236°; prova: o teor do Relatório de Gestão do Exercício de 1994]
9. A IGF teve conhecimento pelo relatório de gestão da ora Recorrente relativo ao exercício de 1995 do novo saldo de contratos promessa de compra e venda de apartamentos, agora em número de 145, “o que corresponde a 55% dos 262 existentes”.
[P.I. 237°; prova: o teor do Relatório de Gestão do Exercido de 1995]
10. A IGF teve novamente conhecimento, pelo mesmo relatório de gestão, da manutenção de ausência de procura de arrendamento.
[P.I. 238°; prova; o teor do Relatório de Gestão do Exercício de 1995]
11. A IGF teve conhecimento pelo relatório de gestão da ora Recorrente relativo ao exercício de 1996 do novo saldo de contratos promessa de compra e venda de apartamentos, agora de 209, “o que corresponde a cerca de 80% dos 261 existentes”.
[P.I. 239°; prova: o teor do Relatório de Gestão do Exercício de 1996]
12. A ora Recorrente foi concebida pelos seus promotores como o veículo empresarial e jurídico de um projecto imobiliário que viria a ser conhecido por “... ”.
[P.I. 47°; Contestação 79°; prova: Doc.º n.º 6 junto com a P.I., a fls. 105]
13. A construção da urbanização “... ” teve início no ano de 1993 e terminou no ano de 1996.
[P.I. 67° e 79°; prova: Doc.º n.º 6 junto com a P.I., a fls. 109; confessado a art° 80° da Contestação]
14. Nessa altura já estava irremediavelmente comprometida a possibilidade de dar de arredamento qualquer parte da área ou do valor do empreendimento até ao fim do terceiro ano de actividade.
[P.I. 68.°; prova: Doc. n.º 6 junto com PI, a fls. 109]
15. À data dos factos o mercado de arrendamento urbano habitacional era um mercado exíguo, sem uma procura sustentada.
[P.I. 120º e 121°; prova: o teor do Estudo da sociedade consultora de investimento imobiliário, P&I - Propriedade & Investimento, junto com a petição de reclamação graciosa, nos autos com o processo instrutor] »
Ponderada a pretensão da Rte e avaliada a força probatória dos meios de prova referenciados em seu apoio, imediatamente, podemos destrinçar, isolar, três blocos de circunstâncias/ocorrências, merecedores de tratamento diferenciado, quanto à possibilidade de incorporarem matéria de facto, devida e legalmente comprovada, capaz de, julgada assente, revestir interesse para decidir do mérito da causa. Assim, os pontos 1. a 5., sem prejuízo da compatibilização com os factos já julgados provados na sentença e da necessidade de se utilizar uma redação mais objetiva, manifestamente, encerram factualidade interessante, que merece ser acolhida, por este tribunal, no âmbito dos poderes detidos em sede de julgamento da matéria de facto. Ao invés, nos pontos 6. a 11., a Rte pugna por que, nesta sede, se assumam juízos de valor acerca da realidade, conhecida pela Inspeção-Geral de Finanças (IGF), respeitante ao exercício da atividade, pela impugnante, nos anos de 1994 a 1996. Ora, para além de, tecnicamente, se mostrar inviável qualificar e valorar como factos os juízos, as afirmações, em causa, constatamos a impossibilidade (2) de, no limite, assumir que os invocados relatórios de gestão foram os enviados àquele organismo estatal, para cumprimento da obrigação prevista no art. 13.º DL. 135/91 de 4.4. Finalmente, os pontos 12. e 13., encerram factualidade assumida pelo tribunal recorrido, enquanto nos pontos 14. e 15. se avançam, inequívocas, conclusões que, obviamente, não podem ser confundidas e erigidas à condição de factos, entendidos como “ocorrências concretas da vida real, bem como o estado, a qualidade ou situação real das pessoas ou das coisas”, englobando “não apenas os acontecimentos do mundo exterior, mas também os eventos do foro interno, da vida psíquica, sensorial ou emocional do indivíduo” (3).
Quanto à impugnação dirigida à alínea F) dos factos provados e ao requerido na conclusão O., cumpre sustentar a inconsequência de se referir “relatório de inspecção tributária”, perante a evidente consideração, pelo julgador, do documento junto a fls. 61 ss. do, apenso, processo de reclamação graciosa, ou seja, o relatório n.º 3527/IE(NIP)/97, datado de 27 de outubro de 1998, da IGF (4), sendo certo que, para efeitos da factualidade assumida (5), o conteúdo da visada alínea nenhuma alteração justifica, designadamente, a proposta autonomização do teor da transcrita, correta e integralmente, conclusão n.º 4, pois, daí nada resultaria de vantajoso, no que concerne à relevância da factualidade em apreço; por outras palavras, esta vale, representa, o mesmo integrada na alínea F) como se fosse isolada na alínea F1)…
Posto isto, por se mostrar documentalmente comprovado, aos factos provados, acima, elencados, adita-se:
Q) Pela Portaria n.º 25/99, publicada no DR, II Série, de 12.1.1999, mandou o Governo, pelo Ministro das Finanças, revogar a portaria n.º 330/91, identificada em A).
R) Na Inspeção-Geral de Finanças, com data de 27.10.1998, foi elaborado o relatório n.º 3527/IE(NIP)/97, respeitando ao processo n.º 97/NP/1462, de exame à escrita da impugnante, com vista à “verificação do cumprimento do regime jurídico aplicável às sociedades de gestão e investimento imobiliário (... ), previsto no Decreto-Lei nº 135/91, de 4 de Abril, e demais legislação aplicável, tendo incidido, essencialmente, sobre as contas do exercício de 1996.” – cfr. fls. 59 e 59 v.
S) O relatório aludido em R) comporta, além do mais, um capítulo referente a conclusões, cujo conteúdo é o que se encontra transcrito em F) – fls. 65 e verso.
T) Na página inicial do relatório em apreço, encontra-se manuscrito e impresso o seguinte: « Concordo parecendo-me de:
a) Levar ao conhecimento do Senhor Ministro das Finanças para efeitos do nº 5 e 6 do artº 3º do DL. 135/91, de 4/4 e nº 3 do artº 9º do mesmo diploma, com a redacção da Lei nº 51/91, de 3/8.
b) Instaurar os procedimentos contra-ordenacionais …
(…).
Inspector de Finanças Chefe
*
Concordo com o parecer infra.
(…)
Subinspectora-Geral
*
Senhor Ministro das Finanças:
Concordo.
Parece de revogar a autorização à ... para a prática da actividade cometida às ... .
(…).
Em tempo: Junto projecto de portaria.
*
Concordo e assino a respectiva Portaria.
(…).
O MINISTRO DAS FINANÇAS
(António de Sousa Franco) »
U) As liquidações discriminadas em G) surgiram na sequência da emissão, pelo S.P.I.T. - Serviços de Prevenção e Inspeção Tributária - Divisão III (Oriental), da Ordem de Serviço n.º 91 027 de 8.3.1999, para efeitos de inspeção, à impugnante e ao exercício de 1996, cuja abertura teve na base o relatório n.º 3527/IE(NIP)/97, da Inspeção-Geral de Finanças - fls. 46 segs.
***
Estabilizado o cenário factual em que devemos e podemos atuar, importa avaliar se, quanto às questões de direito/jurídicas, a sentença recorrida julgou erradamente, em decorrência de haver interpretado e aplicado mal o disposto nos arts. 5.º, 8.º e 9.º n.º 3 DL. 135/91 de 4.4. (redação da L. 51/91 de 3.8.).
Para suportar a decisão de julgar improcedente a impugnação judicial, na parte visada pela crítica da Rte, o julgador, em síntese, expendeu: «
II. Vício de violação de lei – art.s 5.º, 8.º e 9.º, n.º 3 do DL n.º 135/91, de 4 de Abril.
Conforme resulta dos autos, a Impugnante foi autorizada a constituir-se como Sociedade de Gestão e Investimento Imobiliário (... ) ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 3.º do DL n.º 135/91, de 4 de Abril, por portaria do Ministro das Finanças n.º 330/91, de 20 de Agosto, ficando, deste modo, sujeita ao regime jurídico aplicável às ... .
Conforme estabelece o art. 1.º do referido diploma o objecto principal da Impugnante é o “arrendamento de imóveis próprios adquiridos ou construídos pela sociedade e a prestação de serviços conexos”.
Neste contexto, a Impugnante adquiriu vários imóveis, beneficiando da isenção de SISA, nos termos do disposto no art. 26.º do EBF.
No âmbito de uma acção de inspecção, a AT propôs a revogação da autorização e perda dos benefícios fiscais adquiridos pela Impugnante a violação, com frequência, do limite de 15% fixado no art. 5.º do DL 135/91.
Posteriormente, tendo por base o relatório, foi revogada a autorização concedida.
(…).
Com efeito, a situação que originou a revogação da autorização foi a violação das condições impostas aquando da constituição da sociedade como ... , pois a Impugnante estava obrigada a alcançar determinados objectivos que nunca foram alcançados.
Por outro lado, a isenção de SISA de que beneficiava nos termos do art. 26.º do EBF dependia da qualidade da sociedade enquanto ... , e para a manutenção desse estatuto teria de cumprir as obrigações legais impostas. Trata-se de uma isenção condicionada ao cumprimento de requisitos que apenas se verificariam, não no momento da constituição da sociedade como ... , mas após esse momento, tal como resulta do art. 5.º e 8.º do diploma em causa.
Do disposto no art. 3.º do DL n.º 135/91, de 4 de Abril que dispõe que “[a] revogação da autorização referida no artigo 3.º determina a perda de quaisquer benefícios fiscais”, abrangendo, deste modo, o benefício previsto no art. 26.º do EBF, que fica condicionado à verificação da condição, revestindo esta, a natureza de condição resolutiva.
Por outro lado, nos termos do disposto no art. 12.º, n.º 2 do EBF os benefícios fiscais quando condicionados caducam “pela verificação dos pressupostos da respectiva condição resolutiva ou pela inobservância das obrigações impostas, imputável ao beneficiário”.
Verificando-se a revogação da autorização, com fundamento no incumprimento reiterado das condições legais, nunca se atingindo os objectivos legais, então, o benefício fiscal que lhe estava associado ficará, de igual modo, sem efeito ab initio.
Com efeito, resulta quer do relatório de inspecção, quer da portaria de revogação da autorização que a Impugnante violou com frequência o limite de 15% fixado pelo art. 5.º do DL n.º 135/91, e que nunca destinou ao arrendamento habitacional qualquer parcela do seu património não afecto a uso próprio, não respeitando assim o mínimo de 45% exigido pelo art. 8.º do DL n.º 135/91.
Repare-se que as aquisições em causa nos autos, que beneficiaram de isenção de Sisa, foram efectuadas com o objectivo principal o arrendamento, e independentemente das razões que a Impugnante invoque para o efeito, certo é, que, tal como a própria admite, não se verificou.
Ora, incumprido desde o início as obrigações legais resultantes do regime legal que lhe conferia a isenção de Sisa, não faz sentido que a caducidade da isenção opere apenas desde 31/12/1995.
Por conseguinte, improcede, in totum, a pretensão da Impugnante. »
Segundo a Rte, também, resumidamente, o tribunal recorrido deveria ter assumido que o Ministro das Finanças revogou a autorização da sua constituição como ... com fundamento na especial gravidade que a violação dos objetivos quantitativos da atividade de arrendamento, consignados nos referidos artigos 5.º e 8.º, assumiu no ano de 1996, pelo que, dessa revogação não decorre a perda retroativa das isenções de Sisa de que beneficiou em aquisições de imóveis até 31 de Dezembro de 1995, pois, pelo menos, até essa data, não se podia considerar em incumprimento do estabelecido nesses normativos. Por outro lado, a Portaria n.º 25/99, considerando a sua situação no ano de 1996 como determinante para a decisão de revogação, acolhe favoravelmente a proposta do relatório de fiscalização da Inspecção-Geral de Finanças de “perda de todos os benefícios fiscais adquiridos a partir de 95-12-31”. Acresce que, a própria lei não determina, em caso algum, a caducidade dos benefícios fiscais das ... como mera consequência do incumprimento dos critérios impostos pelo Decreto-Lei n.º 135/91, de 4 de Abril.
Na breve exposição de motivos/preâmbulo do DL. 135/91 de 4.4., é possível colher e identificar o propósito nuclear do legislador: “relançar o mercado de arrendamento para habitação, designadamente através de incentivos à oferta”. Para alcançar, também, se mostra, explicitamente, apontada a fórmula gizada (6), que não deixa dúvidas sobre a importância atribuída ao exercício da atividade societária privilegiando a afetação dos imóveis construídos ao arrendamento habitacional. Em sintonia, todo o complexo normativo do identificado diploma, nas várias cambiantes, espelha e executa tal opção, cumprindo destacar a imposição de um objeto principal, às ... , precisamente, “o arrendamento de imóveis próprios, por elas adquiridos ou construídos …”, enquanto a venda desses “imóveis próprios”, apenas, poderia constituir atividade acessória – cfr. art. 1.º.
O art. 9.º DL. 135/91 de 4 de abril (7), estatuindo sobre a perda de benefícios fiscais a que as ... tenham tido direito, patenteia uma nítida e inequívoca distinção/separação entre a motivada pela infração ao disposto nos arts. 1.º, 5.º, 7.º e 8.º - cfr. n.ºs 1 e 2 - e aquela que é determinada pela revogação da autorização referida no art. 3.º - cfr. n.º 3. Consequência necessária da previsão de duas diferentes origens da perda dos benefícios fiscais usufruídos, o legislador instituiu dois diversos momentos para esta se considerar verificada: no primeiro caso, a perda ocorre a partir da data da notificação, levada a cabo pela IGF, para a ... sanar completamente a infração notada, enquanto, no segundo, opera “a partir da data em que ocorreu a situação que deu origem à citada revogação”. Refira-se, ainda, a particularidade de a perda decorrente da revogação de autorização se estender, por menção expressa, “a quaisquer (grifamos) benefícios concedidos à ... ”.
Na posse destes elementos orientadores, sendo incontestado que o fundamento da perda do benefício de isenção de sisa, colhido, pela impugnante, em aquisições imobiliárias, realizadas nos anos de 1992 e 1995, foi a revogação da Portaria n.º 330/91, que autorizou a sua constituição, em 27.1.1992, como ... , ou seja, uma situação, clara e objetivamente, enquadrável na previsão do art. 9.º n.º 3 DL. 135/91 de 4.4., temos de identificar o momento em que sucedeu a(s) causa(s) dessa revogação.
Podendo a autorização de constituição das ... ser revogada, entre outros, como na situação julganda, no caso de “Ter havido violação do disposto nos artigos 5.º, 7.º e 8.º que, pela sua frequência ou pelos valores envolvidos, assuma especial gravidade” (8), é evidente que qualquer uma dessas violações, só por si, implica, impõe, a sanção revogatória, desde que, se verifique o requisito da “especial gravidade”, em razão da frequência ou dos montantes envolvidos. Assim, quanto à impugnante, havendo sido, relativamente a empreendimento imobiliário edificado no período de 1993 a 1996, detetada e apontada a violação do disposto nos arts. 5.º n.º 1 e 8.º n.º 1 al. a) DL. 135/91 de 4.4., se, objetivamente, esta última estabelece a obediência do requisito imposto (9), somente, “a partir do 3.º ano contado do início da actividade”, a primeira exige que o valor do património próprio não diretamente afeto ao objeto principal das ... “não poderá exceder em cada momento [10] 15% do respectivo valor total”, isto é, configura uma obrigação a respeitar desde o nascimento até à morte, da constituição à extinção de qualquer ... .
A partir desta duplicidade, sem olvidar a circunstância de a IGF ter apontado a violação “de forma continuada” do limite de 15% fixado no aludido art. 5.º n.º 1, por parte da impugnante, somos levados a concluir que uma das situações, relevante isoladamente, provocadora da ocorrida revogação da autorização para se constituir como ... , portanto, enquanto causa direta e suficiente desta, existiu desde sempre, ou, pelo menos, tem de ser repercutida, estendida, ao momento da constituição daquela, concretamente, o dia 27.1.1992, em que o respetivo património inicial se tinha de conformar com a limitação supra mencionada.
Em suma, a impugnante perdeu todos os benefícios fiscais que gozou a partir de 27.1.1992, particularmente, a isenção de sisa concedida pelo art. 26.º n.º 1 al. c) EBF (redação L. 65/90 de 28.12.).
Esta conclusão, orientada no sentido do judiciado em 1.ª instância, registe-se, não se nos apresenta prejudicada ou passível de abandono, pela consideração dos argumentos da Rte, em especial, a defesa do entendimento de que, como concluiu a IGF e o próprio Ministro das Finanças não ressalvou, a perda só podia abranger todos os benefícios fiscais adquiridos a partir de 31.12.1995.
Sendo inquestionável que do relatório da IGF, identificado em R) dos factos provados, consta a proposta, do seu autor, de que se revogue a autorização, dada à impugnante, para a prática da atividade cometida às ... , “com a perda de todos os benefícios fiscais adquiridos a partir de 95-12-31”, a qual, como decorre do teor dos diversos despachos, procedimentais, reproduzidos na alínea T), não foi explicitamente confrontada e arredada, julgamos, contudo, esta circunstância insuficiente para conduzir ao resultado defendido pela Rte.
Efetivamente, em primeiro lugar, compulsado o conteúdo integral da Portaria n.º 25/99, na condição de elemento formal imposto, por lei (11), para a revogação do tipo de autorização em causa, confere-se que, entre os considerandos expressos como apoiantes da decisão revogatória, nenhuma remissão é feita para o precedente relatório da IGF e, sobretudo, em parte alguma se encontra fixada uma data a marcar o momento da inevitável, inerente à revogação da autorização, perda dos benefícios usufruídos. Acresce, em segundo lugar, para além de a invocada menção do autor do relatório da IGF não se mostrar suportada pela indicação das razões justificativas, do ponto de vista legal (12), ser inviável fazer relevar um dado avançado por agente administrativo conflituante com o resultado, para a mesma matéria, suscetível de ser alcançado e defendido, a partir do conteúdo normativo aplicável. Por outras palavras, sendo, como supra assentámos, possível, operando o estatuído nos arts. 5.º n.º 1 e 9.º n.º 3 DL. 135/91 de 4.4., defender a perda de benefícios fiscais, pela impugnante, a partir da data da sua constituição como ... , traduziria uma violação de lei afastar tal resultado através da simples valoração da pronúncia, de interveniente no procedimento administrativo, em sentido, objetivamente, incompatível e inconciliável.
Concluindo, a perda de benefícios fiscais concedidos às ... , determinada pela revogação da autorização de constituição, pode operar a partir de datas diversas, inclusive, desde a data de arranque do exercício da atividade, conforme ou em função do evento, da ocorrência justificativa da mandada revogação e dos termos concretos em que esta é publicada, não tendo, necessariamente, de ser estabelecida pela IGF, entidade supervisora.
Destarte, a sentença recorrida não errou no julgamento dos aspetos jurídicos desta causa e, muito menos, sem prejuízo de mais competente, por especializada, avaliação, afrontou quaisquer normas constitucionais, destacadamente, as mencionadas na conclusão FF.
*******
III
Pelo exposto, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, acorda-se negar provimento ao recurso.
*
Custas a cargo da recorrente.
*
(Elaborado em computador e revisto, com versos em branco)
Lisboa, 13 de fevereiro de 2014

ANÍBAL FERRAZ
JORGE CORTÊS
PEREIRA GAMEIRO




1- Cfr., conclusões M., N. e O.

2- Por ausência de prova bastante, uma vez que somente são disponibilizadas fotocópias (simples) dos relatórios, sem qualquer menção da respetiva entrega à IGF.

3- Cfr. Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2.ª Edição, pág. 406 segs.

4- O mesmo que constitui Doc. n.º 6, junto com a p.i. da impugnação judicial.

5- Tanto mais que o reparo feito, pela Rte, se circunscreve aos elementos probatórios utilizados na formação da convicção.

6- « Encontrando-se as SGII especialmente vocacionadas para actuar nesta área, é apropriado conceder às SGII que venham a ser autorizadas após a entrada em vigor do presente diploma um conjunto de incentivos fiscais que as induza a privilegiar, no desenvolvimento da sua actividade, o arrendamento para habitação. »

7- « 1 – Sem prejuízo das sanções previstas no artigo 14.º, a infracção ao disposto nos artigos 1.º, 5.º, 7.º e 8.º determinará a perda de benefícios fiscais a que a SGII tiver direito se no prazo de 60 dias após notificação da Inspecção-Geral de Finanças a infracção não for completamente sanada.
2 – A perda dos benefícios fiscais referidos no número anterior verifica-se a partir da data da notificação mencionada nesse número.
3 – A revogação da autorização referida no artigo 3.º determina a perda de quaisquer benefícios concedidos à SGII a partir da data em que ocorreu a situação que deu origem à citada revogação. » - redação da L. 51/91 de 3.8.

8- Art. 3.º n.º 5 al. e) DL. 135/91 de 4.4.

9- “…, um mínimo de 45% da área ou do valor correspondente do seu património imobiliário não afecto a uso próprio será constituído por aplicações em imóveis destinados a arrendamento para habitação,”.

10- Sublinhado nosso.

11- Cfr., art. 3.º n.º 6 DL. 135/91 de 4.4.

12- Cogitamos que foi, apenas, motivada pelo facto de, também, ter sido encontrada violação do disposto no art. 8.º n.º 1 al. a) DL. 135/91 de 4.4. e para cumprir/respeitar a exigência temporal feita na sua parte final.