Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:26/23.6 BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:07/13/2023
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:RECLAMAÇÃO 276CPPT
PRESCRIÇÃO
SEGURANÇA SOCIAL
CITAÇÃO
Sumário:I. São factos interruptivos do prazo de prescrição de dívidas por contribuições à segurança social a notificação do potencial revertido para audiência prévia, bem como a citação deste para a execução fiscal, sendo que este segundo facto interruptivo tem eficácia duradoura, mantendo-se o efeito interruptivo até ao termo do PEF.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I. RELATÓRIO

N. P. (doravante Recorrente ou Reclamante) veio recorrer da sentença proferida a 22.03.2023, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Castelo Branco, na qual foi julgada improcedente a reclamação de ato do órgão de execução fiscal (OEF) por si apresentada, que teve por objeto o ato de indeferimento de reconhecimento da prescrição da dívida exequenda atinente ao processo de execução fiscal (PEF) n.º …337 e apensos.

Apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos:

“A) Dá-se como inteiramente reproduzido o teor da matéria de facto provada, assim como o requerimento apresentado pelo Reclamante ora recorrente em sede de pronúncia quanto ao processo administrativo instrutor;

B) Resultou provado na Douta Sentença recorrida que foi praticado um acto formal e substancialmente unitário de citação, referente a todas as execuções por dívida à segurança social da sociedade comercial de que o Reclamante foi gerente, até porque, aliás, estas estavam todas apensas ao processo de execução …072, tendo também resultado provado que foi o acto de citação, independentemente do alcance que foi dado, a ser revogado, e não o despacho de reversão, e subsequente certidão de dívida, que lhe deu origem e lhe serviu de fundamento, como resulta dos pontos 4 e 5 da matéria provada da douta Sentença recorrida;

C)- Não obstante, veio o Tribunal a quo, nos considerados de direito que a esse respeito formulou, em suma defender que tendo sido iniciado um efeito suspensivo duradouro da prescrição aquando da citação do Revertido, no que respeita ao acto revogatório referido em 5 da matéria assente “(…) ao contrário do defendido pelo Reclamante, não ocorreu uma revogação, na totalidade, do acto de citação, este manteve-se válido para o processo n.º …337 e respectivos apensos – na prática, com esta revogação parcial, o órgão de execução fiscal, produziu os mesmos efeitos que resultariam de um despacho que determinasse a extinção dos processos relativamente ao revertido. Como o processo principal n.º …072 deixou de constar do elenco dos processos de execução revertidos para o Reclamante, foi o processo de execução fiscal n.º …337 eleito principal e os demais seus apensos. (…)” (carregado e sublinhado nosso)

D) Estando-se perante dívidas ao IGFSS, revertidas contra o ora Recorrente, é aplicável o regime previsto no CPPT, ex vi art.º 6.º do DL n.º 42/2001, de 9 de fevereiro, aplicando-se pois o Regime do Processo de Execução Fiscal (PEF), que é um processo de natureza judicial [cfr. art.º 103.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT)], “sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos atos que não tenham natureza jurisdicional”.

E) Assim, desde logo, há uma distinção entre processo de execução fiscal e procedimento administrativo tributário, definindo-se o PEF, como qualquer processo, como uma sucessão ordenada de atos visando a obtenção de um determinado fim, no caso a cobrança coerciva de determinadas dívidas (cfr. o art.º 148.º do CPPT);

F) Atenta a circunscrição constante do art.º 103.º da LGT, caberá aos Tribunais Tributários a prática, no âmbito destes processos, dos atos de natureza jurisdicional, cabendo aos órgãos da administração tributária os demais - art.º 3.º, n.º 3, al. d), do DL n.º 84/2012, de 30 de março (que aprovou a orgânica do IGFSS), nos termos do qual “… são atribuições do IGFSS, I. P., na área da gestão da dívida à segurança social: (…) d) Assegurar a instauração e instrução de processos de execução de dívidas à segurança social, através das secções de processo executivo da segurança social” e art.º 3.º-A do DL n.º 42/2001, de 9 de fevereiro, nos termos de cujo n.º 1: “ compete ao Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I. P., a instauração e instrução do processo de execução de dívidas à segurança social através da secção de processo executivo do distrito da sede ou da área de residência”-.

G) O legislador optou por atribuir a “um órgão administrativo competência funcional para agir como agente ou operador auxiliar do juiz na realização da função executiva, praticando todos os actos inscritos nesse meio processual, tendo em vista a agilização do processo e a obtenção da maior eficácia na arrecadação de receitas do Estado, libertando o juiz de todos os actos que não envolvam uma função materialmente jurisdicional” podendo, neste contexto, os órgãos da administração tributária (tida em sentido amplo, onde se inclui o IGFSS) praticar, no âmbito da execução fiscal, atos de natureza processual, podendo, estes últimos, consubstanciar-se em meras operações materiais ou em atos processuais de natureza não jurisdicional -v.g. citação, venda-), ou actos materialmente administrativos;

H) Entende pois, o Recorrente, que há que distinguir entre o acto materialmente administrativo/tributário que consiste na decisão de reversão da dívida fiscal, e o acto materialmente judicial/tramitário da citação, que concretiza aquela decisão perante o revertido pelo que,, ao revogar o acto materialmente judicial de citação, e não o acto materialmente administrativo/tributário de decisão de reversão, o Exequente inutilizou os efeitos e formalidades da citação, como previstos nos artºs 189º e 190º do CPPT, aqui aplicáveis ex vi do artº 6º do DecLei nº 42/2001, isto independentemente da intenção, que tinha, de apenas revogar parcialmente essa decisão de reversão.

I) Por essa razão, sempre salvo o devido respeito e melhor opinião, em face da revogação da citação -única- feita ao Reclamante no processo, deveria, a sua revogação, impor uma nova citação em reversão da quantia remanescente, resultando claro, dos autos, que tal não sucedeu até à presente data, isto porque, tendo o efeito interruptivo duradouro ocasionado pela citação em reversão sido revogado por efeito da revogação do próprio acto de citação, o seu último acto interruptivo terá ocorrido, na mais complacente das hipóteses, no terceiro dia útil posterior a 16.02.2015, aquando da remessa postal ao então I. Mandatário do Executado ora recorrente da decisão de revogação da citação – ponto 16 da matéria de facto provada-, isto partindo do princípio que a notificação ao mandatário é suficiente para interromper a prescrição nos termos do disposto no artº 187º 2 do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social (doravante CRPSPSS), o que não será pacífico;

J) Nem, aliás, chegou sequer a ocorrer qualquer efeito suspensivo do prazo prescricional, uma vez que, se efectivamente em 23.02.2015, a Senhora Coordenadora da Secção do Processo Executivo de Castelo Branco deferiu o pedido de dispensa de caução que havia sido apresentado pelo I. Mandatário do Executado agora recorrente (fls 153 do PEF integrado a fls 102 a 732 do processo em suporte electrónico) como resulta de 11 e 12 da matéria provada, sendo que tal despacho de dispensa de caução era necessário para que o procedimento de pagamento em prestações iniciasse a sua produção de efeitos;

L) O que é certo é que, como resulta do PEF integrado a fls 102 a 732 dos autos, esse despacho nunca foi notificado nem ao Executado ora recorrente, nem ao seu então I. Mandatário pelo que, e muito bem, também tal notificação não foi fixada como provada na Douta Sentença recorrida, razão porque nunca chegou a produzir efeitos, como aliás o demonstram as penhoras feitas a partir de junho de 2015 à sociedade devedora principal -fls 155 e ss do referido PEF)-, pelo que também nunca ocorreu qualquer efeito suspensivo por força do disposto no artº 189º/2 do CRPSPSS.

M) Assim, a prescrição da totalidade da dívida exequenda ocorreu entre 16 e 23 de Fevereiro de 2020 ( note-se que a primeira suspensão de prazos por efeito da Pandemia se iniciou em 09 de Março de 2020 -Decs-Lei nºs 1-A/2020 , de 19.03, e 4-A/2020, de 06.04-), quando se completou o prazo de cinco anos após notificação feita ao então I. Mandatário do Revertido ora recorrente -pontos 10 e 11 da matéria de facto provada-, razão porque, aquando da prolação do despacho de declaração em falhas, pela Exmª Senhora Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do IGFSS, em 31.05.2021 (ponto 13 da matéria provada) já há muito havia prescrito a dívida exequenda, pelo menos em relação ao Revertido (agora recorrente).

N)- Mas mesmo esse despacho não foi sequer notificado ao Executado/Revertido ora recorrente, o que aliás não ficou dado como provado na Douta Sentença recorrida, nem resulta do PEF integrado a fls 102 a 732 dos autos, pelo que não poderia ter o efeito interruptivo pretendido na douta Sentença recorrida, já que dele não foi dado conhecimento ao Devedor, assim se não cumprindo o correspondente requisito, previsto no artº 187º/2, do CRPSPSS.

O) Ao considerar que a citação do Revertido, ora recorrente, referenciada em 5 dos factos provados, manteve efeitos mesmo após a revogação decidida, violou, a douta Sentença recorrida, o disposto nos artºs artºs 189º e 190º do CPPT, aqui aplicáveis ex vi do artº 6º do Dec-Lei nº 42/2001, e ao considerar que a dívida exequenda não se encontra prescrita, além de incorrer em erro quanto aos pressupostos de facto que ela própria fixou, violou o disposto no artº 187º, nº 1, do CRPSPSS, sendo certo que se impunha decisão diversa, a de deferir a reclamação fiscal que deu origem aos autos e, em consequência, fixar a prescrição da dívida exequenda e a extinção definitiva da execução, o que não sucedeu.

P)- Deverá, pois, a douta Sentença recorrida ser revogada e substituída por douto Acórdão que assim o fixe, o que desde já expressamente se requer a Vªs Exªs Senhores Desembargadores.

Termos em que se requer a Vªs Exªs Senhores Desembargadores que seja dado provimento ao presente recurso, e a douta sentença agora recorrida seja revogada e substituída por Douto Acórdão que fixe o valor da acção e fixe a nulidade da sentença, tudo nos termos acima melhor definidos em sede de conclusões”.

O Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP (doravante Recorrido ou IGFSS) não apresentou contra-alegações.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Foram os autos com vista à Ilustre Magistrada do Ministério Público, nos termos do art.º 288.º, n.º 1, do CPPT, que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Com dispensa dos vistos legais, atenta a sua natureza urgente (art.º 657.º, n.º 4, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT), vem o processo à conferência.

É a seguinte a questão a decidir:

a) Verifica-se erro de julgamento, estando a dívida exequenda prescrita?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“1. Em 17.03.2014 foi autuado, na Secção de Processo Executivo do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., o processo de execução fiscal n.º ….337, no qual é executada a sociedade “B. – C. U., Lda” – cfr. autuação de fls. 62 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

2. Em 16.07.2014 foi assinado o aviso de recepção do ofício, elaborado no âmbito do processo de execução fiscal n.º …337 e apensos (doravante, PEF) destinado a citar a “B. – C. U., Lda” para o pagamento da quantia exequenda no valor de EUR 19.762,77 e acrescidos – cfr. ofício de citação e aviso de recepção de fls. 67 e 68 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

3. Em 04.11.2014 foi enviado, em correio postal registado, o ofício elaborado no âmbito do processo de execução fiscal n.º ….072 e apensos, destinado a notificar o Reclamante, entre o mais, de que serão encetadas diligências para a preparação do processo para efeitos de reversão da execução fiscal na qualidade de responsável subsidiário, sendo a quantia exequenda no valor de EUR 103.216,14 – cfr. projecto de reversão, ofício, selo do registo postal e detalhe de dívida de fls. 107 a 111 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

4. Em 26.11.2014 foi assinado o aviso de recepção do ofício destinado a citar o Reclamante, na qualidade de responsável subsidiário por reversão, no âmbito do processo de execução fiscal n.º …072 e apensos, que corre termos na Secção de Processo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., para pagamento da quantia exequenda no valor de EUR 103.216,14 e acrescidos no valor de EUR 11.640,72 – cfr. ofício de citação e aviso de recepção de fls. 129 a 131 do processo de execução fiscal processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

5. A dívida exequenda tem a seguinte proveniência:

Imagens: originais nos autos

- fls. 132 a 133 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

6. Em 16.12.2014, na sequência da citação do despacho de reclamação, o Reclamante apresentou um requerimento pelo qual requer, em suma, seja corrigido o período da dívida que é da sua responsabilidade e o pagamento dessa dívida, já corrigida, em prestações – cfr. requerimento de fls. 134 a 135 do processo de execução fiscal processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

7. Em 12.02.2015 a Coordenadora da Secção de Processo Executivo do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. exarou o seguinte despacho sob a informação n.º 5/2015:

“Revogo o ato de citação em reversão de N. P. nos processos n.s ….072, …080. …900, …919, ….032, …040, …067. …075, …814, …822, …491, …505, …681 e …690;

Elabore-se plano de pagamento em prestações nos termos solicitados pelo responsável subsidiário N. P.; (…)” – cfr. informação e despacho de fls. 141 e 142 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

8. Em 12.02.2015 a Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. elaborou o detalhe de dívida da responsabilidade do revertido Reclamante, que aqui se reproduz:

Imagens. Originais nos autos

- cfr. detalhe de dívida de fls. 143 e 144 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

9. Em 12.02.2015 a Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. elaborou o ofício de “Notificação de deferimento de plano prestacional (reversão)”, destinado a notificar o Reclamante, além do mais, de que foi deferido o pagamento em prestações da dívida exequenda no valor de EUR 23.897,49, em 150 prestações, no valor de EUR 155,92 cada, com início em 02-2015, a que acrescem juros de mora e da necessidade de constituir garantia ou requerer a isenção – cfr. ofício de fls. 145 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

10. Em 16.02.2015 foi enviado, em correio postal, o ofício elaborado pela Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. destinado a notificar o Reclamante, na pessoa do seu Ilustre Advogado, do despacho que antecede, o qual foi acompanhado de cópia da notificação de deferimento do plano de pagamento em prestações que antecede – cfr. ofício de fls. 147 do processo de execução fiscal processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

11. Em 20.02.2015 deu entrada na Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. um requerimento apresentado pelo Reclamante, pelo qual requer a dispensa da prestação de garantia – cfr. requerimento de fls. 153 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

12. Em 23.02.2014 a Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. exarou despacho de deferimento sob o requerimento que antecede – cfr. despacho exarado a fls. 153 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

13. Em 31.05.2021 a Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. exarou o seguinte despacho no âmbito do processo de execução fiscal n.º …072 e apensos: “Assente na Informação / Parecer infra, Declaro em Falhas, a execução nos autos infra indicados no montante referenciado, a este Parecer do qual são parte integrante nos termos do artigo 272.º al. a) do CPPT, sem prejuízo do prosseguimento dos autos, nos termos do artigo 274.º do mesmo diploma. (…)” – cfr. informação e despacho de fls. 183 a 185 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

14. Em 21.10.2022 o Reclamante apresentou, via correio electrónico, na Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., um requerimento dirigido aos processos de execução fiscal n.º …337 e apensos e n.º …274 e apensos, pelo qual requer, em suma, seja declarada a prescrição da dívida exequenda – cfr. mensagem de correio electrónico e requerimento de fls. 195 a 197 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

15. Em 14.11.2022 a Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. elaborou o ofício destinado a notificar o Reclamante do indeferimento do requerimento que antecede com a seguinte fundamentação:

Imagens. Originais nos autos

(…) - cfr. ofício de fls. 198 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

16. Em 16.11.2022 a Coordenadora da Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P. exarou o seguinte despacho no âmbito do processo de execução fiscal n.º …337 e apensos e n.º …274 e apenso: “Assente na Informação / Parecer infra, DECLARE-SE EM FALHAS a execução da quantia exequenda, juros de mora e custas, de harmonia com o disposto no n.º 6 deste mesmo preceito, conjugado com o determinado no artigo 272º al. a) do CPPT, sem prejuízo do prosseguimento dos autos, nos termos do artigo 274.º do mesmo diploma. (…)” – cfr. informação e despacho de fls. 202 e 203 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico.

17. Em 23.11.2022 foi emitido o documento único de cobrança, no âmbito do processo n.º 0501201400023337 e apensos, em nome do Reclamante, para pagamento da dívida exequenda no valor de EUR 29.589,02 – cfr. documento único de cobrança de fls. 71 a 73 do processo em suporte electrónico.

18. Em 09.12.2022 foi enviada, para a Secção de Processo Executivo de Castelo Branco do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., por correio electrónico, a petição inicial dos presentes autos – cfr. mensagem de correio electrónico de fls. 216 do processo de execução fiscal integrado a fls. 102 a 732 do processo em suporte electrónico”.

II.B. Refere-se ainda na sentença recorrida:

“Não existem quaisquer outros factos com relevo que importe fixar como não provados”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“A convicção do tribunal quanto à matéria de facto provada assentou na análise do processo de execução fiscal junto aos autos conforme discriminado supra no probatório”.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Do erro de julgamento, quanto à prescrição da dívida exequenda

Considera o Recorrente que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, porquanto o ato de citação foi revogado, devendo ter sido praticada nova citação, e considerando que não ocorreu qualquer efeito suspensivo da prescrição.

Vejamos então.

In casu, a dívida exequenda respeita aos PEF …337 e apensos, identificados em 8) do probatório, relativos a contribuições e cotizações atinentes aos meses compreendidos entre agosto de 2013 e junho de 2014.

Logo, em matéria de prescrição da dívida exequenda, há que apelar, num primeiro momento, à disciplina contida no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (CRCSPSS), aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro.

Assim, nos termos do art.º 187.º do CRCSPSS, o prazo de prescrição das dívidas atinentes a contribuições e cotizações é de cinco anos (n.º 1).

Mais prevê esta disposição legal, nos seus n.ºs 2 e 3, que:

“2 - O prazo de prescrição interrompe-se pela ocorrência de qualquer diligência administrativa realizada, da qual tenha sido dado conhecimento ao responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida e pela apresentação de requerimento de procedimento extrajudicial de conciliação.

3 - O prazo de prescrição suspende-se nos termos previstos no presente Código e na lei geral”.

Desta disciplina resulta, desde logo, que, quanto às causas de interrupção da prescrição, abrangem as mesmas, designadamente, a notificação para efeitos de exercício do direito de audição prévia em sede de reversão e a citação.

As lacunas existentes neste regime são integradas pela aplicação subsidiária da Lei Geral Tributária (LGT) e, no caso da citação, também do Código Civil.

A este respeito, chama-se à colação o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 12.05.2021 (Processo: 0212/18.0BEMDL), no qual se refere:

“Importa também ter presente que as lacunas do regime de prescrição dos créditos para a Segurança Social são integradas por aplicação das causas gerais de interrupção e de suspensão do prazo constantes dos artigos 48.º e 49.º da Lei Geral Tributária. Atualmente, a aplicação subsidiária da Lei Geral Tributária à relação jurídica contributiva está consagrada no artigo 3.º, alínea a), do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.

E ainda que o regime de interrupção da prescrição foi alterado no sentido de a interrupção ter lugar uma única vez, com o facto interruptivo que se verificar primeiro (artigo 49.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária, redação da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro). No entanto, esta norma deve ser interpretada em conjugação com os factos interruptivos duradouros constantes do artigo 49.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária, com o sentido de que a limitação a uma das interrupções apenas vale para os que tenham efeito duradouro. Deste modo, não fica abrangida a causa de interrupção aplicável às obrigações de pagamento de cotizações e contribuições para a segurança social, consistente em diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida, em virtude do seu efeito instantâneo – cf. acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 29/01/2014 proferido no processo 01941/13; de 20/05/2015 proferido no processo 01500/14; de 29/09/2016 proferido no processo 0956/16; de 12/10/2016 proferido no processo 0984/16; e de 12/02/2020 proferido no processo 0440/10.7BECBR”.

Revertendo para o caso dos autos, o que se verifica é que:

a) Houve uma primeira causa de interrupção, consubstanciada na citação da sociedade devedora originária, ocorrida em 2014, que interrompeu o prazo de prescrição;

b) Em relação especificamente ao Reclamante, ocorreu uma outra causa de interrupção, consubstanciada da notificação do projeto de reversão;

c) Ocorreu ainda uma outra situação interruptiva, consubstanciada na citação pessoal do próprio Reclamante (dado ter sido feita via correio postal registado com aviso de receção – cfr. facto 4), que se efetivou a 26.11.2014, quando ainda estava em curso o prazo de 5 anos aplicável.

A interrupção por força da citação tem o efeito instantâneo de inutilizar todo o prazo decorrido até ao momento da sua ocorrência e o efeito duradouro decorrente da aplicação do disposto no art.º 327.º, n.º 1, do Código Civil [cfr., designadamente, o já citado Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 12.05.2021 (Processo: 0212/18.0BEMDL)], mantendo-se, pois, tal efeito até ao termo do PEF.

Pretende o Recorrente que se considere que o ato de citação foi integralmente revogado em 2015.

No entanto, tal não corresponde ao ocorrido, na medida em que tal ato de revogação, que nunca foi posto em causa, foi parcial e expressamente identifica os PEF abrangidos (cfr. facto 7), sendo que nenhum deles é um dos ora em apreciação.

Aliás, da própria notificação do plano prestacional resultava todo este circunstancialismo, plano esse que foi do conhecimento do Reclamante, tanto assim que o seu mandatário no PEF, constituído logo após a citação, veio requerer a dispensa de prestação de garantia na sequência de tal notificação (cfr. facto 11).

Se o Reclamante entendia que a citação padecia de alguma nulidade, deveria tê-lo suscitado nos termos prescritos no art.º 191.º do CPC ex vi art.º 2.º, al. e) do CPPT ex vi art.º 6.º do DL n.º 42/2001, de 9 de fevereiro (no prazo para a apresentação da oposição ou na primeira intervenção do citado no processo), o que não sucedeu, tendo, aliás, como referido, havido intervenção ulterior no PEF por parte do Recorrente, através do mandatário que aí constituiu e nada tendo sido referido a esse respeito (cfr. facto 11).

Assim, concordamos com o Tribunal a quo ao afirmar que ocorreu a referida causa interruptiva da prescrição, decorrente da citação do Recorrente, com o efeito instantâneo e o efeito duradouro já referidos.

Este efeito duradouro decorrente da citação implica que seja irrelevante apreciar a existência de eventuais causas de suspensão, na medida em que tal efeito duradouro as consome, carecendo, pois, de relevância o alegado a este respeito.

Posto este enquadramento factual conclui-se que, no momento em que foi proferido o ato reclamado, em 14.11.2022, ainda estava a decorrer o efeito duradouro da interrupção da prescrição, por força da citação do Recorrente, motivo pelo qual não decorreu o prazo de prescrição das dívidas exequendas, circunstância que não se altera com o facto de o PEF ter sido ulteriormente declarado em falhas, porquanto não decorreu ainda o prazo de 5 anos cuja contagem se retoma nessas situações.

Uma palavra final se impõe para referir que, não obstante nas suas conclusões, o Recorrente tenha terminado pedindo a fixação da nulidade da sentença e a fixação do valor da causa, não foi invocada qualquer situação de nulidade e não foi igualmente posto em causa o valor da causa fixado na sentença, carecendo, pois, de materialidade o referido pelo Recorrente.

Como tal, carece de razão o Recorrente.

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

a) Negar provimento ao recurso;

b) Custas pelo Recorrente, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido;

c) Registe e notifique.


Lisboa, 13 de julho de 2023

(Tânia Meireles da Cunha)

(Luísa Soares)

(Jorge Cortês)