Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:11423/14
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:09/11/2014
Relator:CATARINA JARMELA
Descritores:ACTO PLURAL - COLIGAÇÃO - TAXA DE JUSTIÇA - VALOR DA CAUSA – CUMULAÇÃO DE PEDIDOS - ARTIGO 32º N.º 7 DO CPTA – PEDIDO INSUSCEPTÍVEL DE AVALIAÇÃO ECONÓMICA
Sumário:I - Nos actos plurais, sob a aparência de um único acto administrativo, o que existe, na realidade, são vários actos administrativos, e, portanto, várias relações jurídicas materiais.

II – Num processo cautelar em que é peticionada a suspensão da eficácia de um acto plural, intentado pelos destinatários individuais desse acto, ocorre uma situação de coligação activa.

III – Caso os sujeitos coligados fiquem vencidos, cada um deles é responsável pelo pagamento da respectiva taxa de justiça.

IV – De acordo com o prescrito no art. 32º n.º 7, do CPTA, quando sejam cumulados, na mesma acção, vários pedidos, o valor da causa é a quantia correspondente à soma dos valores de todos os pedidos, critério aplicável no caso de coligação activa, o qual, no entanto, pressupõe que todos os pedidos sejam susceptíveis de avaliação económica.

V - Se forem formulados vários pedidos e alguns deles forem susceptíveis de avaliação económica e outros insusceptíveis de tal avaliação, a causa deverá ter valor indeterminável, o que corresponde ao valor de € 30 000,01, pelo que, por maioria de razão, se todos os pedidos forem insusceptíveis de avaliação económica, a causa deverá ter valor indeterminável.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
*
I - RELATÓRIO
Lucinda …………………., Fernando …………………., Manuela ………., Maria ………………, António ………………., Januário …………….., Abílio …………., Vítor ………………., Maria ………………, Rosa …………….., Manuel …………………, Pascoela ……………, Sérgio …………….., Angelino ……………., Maria …………………., Maria Esmeralda …………………., Jorge ……………….., Maria Elizete ……………….., Fernanda ……………., Maria ……………., Armindo ……………, Mário ………………, Maria do Carmo ……………., Francisco ………….., Leonor …………….., Laura ……………., Maria Clélia ………….. intentaram no TAF de Loulé processo cautelar contra o IHRU - Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana, IP (IHRU, IP), no qual peticionaram a suspensão da eficácia do acto administrativo que “determinou a alteração (o aumento) dos coeficientes das rendas apoiadas (DL 166/93 de 7 de Maio)”, praticado pelo IHRU, IP.

Por sentença de 30 de Maio de 2014 do referido tribunal:
- foi julgado improcedente o presente processo cautelar e, em consequência, indeferida a providência de suspensão da eficácia requerida;
- foram os requerentes condenados no pagamento das custas, em partes iguais, e responsabilizados pelo pagamento de uma única taxa de justiça;
- foi fixado o valor da causa em € 30 000,01.

Inconformada, a entidade requerida interpôs recurso jurisdicional para este TCA Sul dessa sentença, na parte em que decidiu acerca do valor da causa e da responsabilidade dos requerentes quanto a custas, tendo na alegação apresentada formulado as seguintes conclusões:

«(…)».

Os recorridos, notificados, apresentaram contra-alegações, onde pugnaram pela improcedência do recurso, alegando, em síntese, que intentaram o presente processo cautelar em litisconsórcio voluntário activo, estando em causa uma única relação material controvertida.

O Ministério Público junto deste Tribunal notificado para os efeitos do disposto no art. 146º n.º 1, do CPTA, não emitiu parecer.


II - FUNDAMENTAÇÃO
Na sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos:

«(…)»
*
Presente a factualidade antecedente, cumpre entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional.

As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão recorrida:

- enferma de erro julgamento ao ter determinado que os requerentes, ora recorridos, são responsáveis pelo pagamento de uma única taxa de justiça;

- incorreu em erro na fixação do valor da causa (cfr. alegações de recurso e respectivas conclusões, supra transcritas).

Passando à análise da questão respeitante ao invocado erro de julgamento da decisão recorrida na parte em que determinou que os requerentes, ora recorridos, são responsáveis pelo pagamento de uma única taxa de justiça

O recorrente defende que a decisão ora sindicada, ao determinar que os requerentes, ora recorridos, são responsáveis pelo pagamento de uma única taxa de justiça, é ilegal, por violação do n.º 5 do art. 530º, do CPC de 2013, argumentando para tanto que os recorridos intentaram o presente processo cautelar coligados, pelo que nos termos desse normativo legal cada um deles é responsável pelo pagamento da respectiva taxa de justiça.

Passemos, então, à análise do acerto (ou não) da decisão judicial recorrida nesta parte, a qual tem o seguinte teor:

”.

Na decisão recorrida considerou-se, portanto, que, apesar de cada um dos recorridos encabeçar uma relação jurídica própria, os mesmos devem ser responsabilizados pelo pagamento de uma única taxa de justiça, já que pretendem obter um mesmo efeito jurídico: a suspensão da eficácia de um único acto, ainda que de cariz plural, perante os seus destinatários.

Apreciando.

Estatui o art. 527º, do CPC de 2013, o seguinte:

1 - A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.

2 - Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.

(…)”.

Por sua vez prescreve o art. 528º, do mesmo Código, que:

1 – Tendo ficado vencidos, na totalidade, vários autores ou vários réus litisconsortes, estes respondem pelas custas em partes iguais.

(…)

4 – Quando haja coligação de autores ou réus, a responsabilidade por custas é determinada individualmente nos termos gerais fixados no n.º 2 do artigo anterior”.

E estabelece o art. 529º, desse Código, que:

1 – As custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte.

2 – A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa, nos termos do Regulamento das Custas Processuais.

(…)”.

Finalmente dispõe o art. 530º, desse mesmo Código, o seguinte:
1 - A taxa de justiça é paga apenas pela parte que demande na qualidade de autor ou réu, exequente ou executado, requerente ou recorrido, recorrente e recorrido, nos termos do disposto no Regulamento das Custas Processuais.
(…)
4 - Havendo litisconsórcio, o litisconsorte que figurar como parte primeira na petição inicial, reconvenção ou requerimento deve proceder ao pagamento da totalidade da taxa de justiça, salvaguardando-se o direito de regresso sobre os litisconsortes.
5 - No caso de coligação, cada autor, reconvinte, exequente ou requerente é responsável pelo pagamento da respectiva taxa de justiça, sendo o valor desta o fixado nos termos do Regulamento das Custas Processuais.
(…)”.

Dos normativos ora transcritos decorre que, no caso de ficarem vencidos:
- na totalidade, vários requerentes litisconsortes, estes respondem pelas custas (que inclui taxa de justiça, encargos e custas de parte) em partes iguais, devendo a taxa de justiça (única) ser paga na sua totalidade pelo litisconsorte que figurar como parte primeira no requerimento inicial, sem prejuízo do direito de regresso sobre os restantes litisconsortes;
- vários requerentes, quando haja coligação, cada um deles é responsável pelas custas (que inclui taxa de justiça, encargos e custas de parte) na proporção em que fiquem vencidos, bem como pelo pagamento da respectiva taxa de justiça.

Ou dito por outras palavras, e para o que agora nos interessa, no caso de litisconsórcio, os requerentes litisconsortes que fiquem vencidos são responsáveis por uma única taxa de justiça (a ser paga por quem figurar como parte primeira no requerimento inicial) e, no caso de coligação de requerentes, caso estes fiquem vencidos, cada um deles é responsável pelo pagamento da respectiva taxa de justiça - neste sentido, Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais Anotado, 2013, 5ª Edição, págs. 68 a 70, e Ac. da Rel. de Lisboa de 3.11.2011, proc. n.º 825/09.1TBLNH-A.L1-6 (“2. No regime constante do artigo 447º-A do Código de Processo Civil e do Regulamento das Custas Processuais, nos casos de litisconsórcio, seja necessário seja voluntário, ocorrendo ou não a prática conjunta de um mesmo e único acto processual sujeito ao pagamento de taxa de justiça, é devido sempre o valor singular da taxa de justiça, sendo solidária a responsabilidade pelo seu pagamento, tal como o era no âmbito do Código das Custas Judiciais; 3. Nos casos de coligação, porém, cada parte coligada paga, individualmente, o valor da taxa de justiça legalmente estabelecida em função do valor da acção.”).

Assim, cumpre determinar se os requerentes, ora recorridos, se apresentam em situação de litisconsórcio – caso em que o presente recurso tem, nesta parte, de improceder, por se mostrar correcta a decisão recorrida, ao ter condenado os mesmos no pagamento de uma única taxa de justiça - ou de coligação – hipótese em que a decisão recorrida tem, neste segmento, de ser revogada, por enfermar de erro de julgamento.

Os trinta e um requerentes, ora recorridos, intentaram o presente processo cautelar contra o IHRU, IP, no qual peticionaram a suspensão da eficácia do acto administrativo que “determinou a alteração (o aumento) dos coeficientes das rendas apoiadas (DL 166/93 de 7 de Maio)”.

Assim, na presente acção estamos perante um caso de pluralidade de sujeitos no lado activo da relação processual.

Como ensinam Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 1985, págs. 160 e 161, “Muitas vezes (…) a acção tem vários autores ou é proposta contra dois ou mais réus. (…)
Nem sempre a cumulação subjectiva reveste a mesma natureza, procede da mesma fonte ou se constitui no mesmo momento.
No tocante ao primeiro ponto, a lei distingue nos artigos 27.º e seguintes entre o litisconsórcio e a coligação (…).
No litisconsórcio, há pluralidade de partes, mas unicidade da relação material controvertida; na coligação, à pluralidade das partes corresponde a pluralidade das relações materiais litigadas, sendo a cumulação permitida em virtude da unicidade da fonte dessas relações, da dependência entre os pedidos ou da conexão substancial entre os fundamentos destes. (…)” (sublinhados nossos).

Como se afirma no Ac. da Rel. de Lisboa de 24.3.2011, proc. n.º 891/09.0TBLNH.L1-2, “E, como é sabido, o litisconsórcio distingue-se da coligação pela relação material controvertida. No primeiro caso é uma só, ao passo que na coligação, são duas ou mais, e reporta-se, necessariamente, a pretensões objectivamente diferentes (…)” (sublinhados nossos).

E como se sumariou no Ac. do STJ de 30.11.1983, proc. n.º 071232, “II - Exigindo o litisconsórcio necessário, para além da pluralidade de sujeitos, uma única relação jurídica material (…) III - Na coligação, com a pluralidade de partes concorre a diversidade de relações jurídicas materiais, (…)” (sublinhados nossos).

Finalmente e como esclarecem Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª Edição, 2010, págs. 116 e 117, em anotação ao art. 12º, do CPTA, “A coligação é uma situação de pluralidade de partes que assenta numa pluralidade de relações jurídicas, nesse ponto se distinguindo do litisconsórcio, que pressupõe a co-titularidade da relação jurídica entre os litisconsortes e, por isso, também, a existência de uma única relação material. Se a relação material controvertida respeitar a várias pessoas, a acção pode ou deve ser proposta por todos ou contra todos os interessados, corporizando uma situação de litisconsórcio voluntário ou necessário: cfr. artigos 27.° e 28.° do CPC; ao contrário, a coligação visa permitir que vários autores formulem pedidos diferentes contra um ou vários réus (coligação de autores) ou que um autor demande conjuntamente vários réus, por pedidos diferentes (coligação de réus): cfr. artigo 30.° do CPC.
Por outro lado, a coligação, no ponto em que assenta numa pluralidade de pedidos baseados em diferentes relações jurídicas, corresponde a uma forma de cumulação de acções, que se distingue da cumulação de pedidos, que ocorre quando o autor deduz cumulativamente contra o mesmo réu, num só processo, vários pedidos que sejam entre si compatíveis (cfr. artigos 470.° do CPC e 4.° do CPTA)” (sublinhados nossos).

Ora, no presente caso, atendendo à forma como os requerentes, ora recorridos, configuram o presente processo, é possível concluir que está em causa mais do que uma (concretamente tantas quanto o número de recorridos) relação jurídica material controvertida, pelo que nos presentes autos ocorre uma situação de coligação activa, como se passa a demonstrar.

Os requerentes, ora recorridos, formulam mais de que um pedido, concretamente tantos pedidos quanto o seu número (31). Passa-se de seguida a transcrever as considerações consignadas na decisão recorrida a este propósito:









(…)
”.

Do exposto resulta que os requerentes, ora recorridos, pedem a suspensão da eficácia da deliberação do Conselho Directivo do IHRU, IP, de 24.1.2014, que fixou (nomeadamente) os preços técnicos e as rendas apoiadas dos fogos de cada um dos requerentes, o qual é um acto administrativo plural.

Efectivamente, e como ensinam Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, Direito Administrativo Geral, Tomo III, 2ª Edição, 2009, pág. 81, “Os actos plurais são conjuntos de actos que produzem efeitos idênticos em relação a uma pluralidade de pessoas, instrumentalmente unificados numa exteriorização única por razões de economia e de eficiência procedimentais. São actos plurais, por exemplo, o despacho que contém a requisição de vários trabalhadores que integram uma estrutura de missão (art. 28.º, n.º 4 LOADE) e a portaria que fixa preços ou tarifas de venda de água a municípios nela identificados (Ac. STA 10/3/2004, Proc. 025739): um como a outra integram, instrumentalmente unificados no mesmo documento, tantos actos administrativos quantos os trabalhadores requisitados ou os municípios abrangidos pela fixação da tarifa.”.

Nos actos plurais, sob a aparência de um único acto administrativo, o que existe, na realidade, são vários actos administrativos - também neste sentido, Diogo Freitas do Amaral, Direito Administrativo, vol. III, 1989, pág. 91.

Assim, in casu a referida deliberação do Conselho Directivo do IHRU, IP, de 24.1.2014, e sob a aparência de um único acto administrativo, consubstancia-se na realidade em tantos actos administrativos quantos os fogos – entre os quais se incluem os dos requerentes, ora recorridos - cujos preços técnicos e rendas apoiadas foram fixados. Não se trata de um acto de fixação dos preços técnicos e das rendas apoiadas de 60 fogos, mas sim de 60 fixações de preços técnicos e rendas apoiadas de outros tantos fogos, isto é, de 60 actos administrativos (cfr. conceito de acto administrativo constante do art. 120º, do CPA).

Nestes termos, neste processo cada um dos requerentes, ora recorridos, peticiona a suspensão da eficácia da deliberação do Conselho Directivo do IHRU, IP, de 24.1.2014, no segmento em que a mesma fixou o preço técnico e a renda apoiada do respectivo fogo, ou seja, cada um deles formula um pedido distinto, isto é, e ao contrário do afirmado na decisão recorrida, não pretendem obter o mesmo efeito jurídico.

É, assim, possível concluir que está em causa mais do que uma (concretamente tantas quanto o número de recorridos) relação jurídica material controvertida, pelo que nos presentes autos ocorre uma situação de coligação activa.

Com esclarecem Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, cit., pág. 120, em anotação ao art. 12º, do CPTA, “4. O n .° 2 consagra uma regra de cumulação de autores, para a acção de impugnação de acto administrativo, similar à já prevista nas disposições dos n.ºs 1 e 2 do artigo 38 .° da LPTA.
A primeira parte da disposição abrange as situações em que o objecto do processo impugnatório é um único acto: poderá tratar-se de um acto colectivo, tendo como destinatário um conjunto unificado de pessoas (v. g., a decisão de dissolver um órgão colegial); de um acto plural, dirigido a uma pluralidade de pessoas perfeitamente identificáveis mas cujos efeitos se produzem individualmente em relação a cada uma delas (v.g., o despacho de nomeação de vários funcionários); ou de um acto administrativo geral, aplicável a um grupo inorgânico de cidadãos, todos bem determinados, ou determináveis no local (v.g., a ordem de dispersão de uma manifestação) ou que se reporta a uma situação concreta susceptível de envolver uma pluralidade de pessoas que não é imediatamente determinável (v.g., o aviso de abertura de um concurso, o edital de mobilização militar).
A coligação de autores aqui prevista tanto abarca, pois, a hipótese em que há um único acto administrativo de carácter geral, como aquela em que, sob a aparência de um único acto, existem tantos actos administrativos quantos os destinatários individuais a que se dirigem” (sublinhados e sombreado nossos).

Ora, tendo os requerentes, ora recorridos, interposto o presente processo cautelar em coligação, e de acordo com o disposto no art. 530º n.º 5, do CPC de 2013, deveriam os mesmos ter sido responsabilizados pelo pagamento da respectiva taxa de justiça, o que não ocorreu, pelo que deverá ser revogada a decisão recorrida, na parte em que os condenou no pagamento de uma única taxa de justiça (sendo certo que, de acordo com o disposto no art. 607º n.º 6, do CPC 2013, não cumpre ao juiz indicar na sentença o montante concreto da taxa de justiça devida).

Passando à análise da questão relativa ao alegado erro na fixação do valor da causa

O recorrente alega que a sentença recorrida, ao fixar o valor da causa em € 30 000,01, viola o disposto no art. 32º n.º 7, do CPTA, pois, sendo indeterminável o valor de cada pedido – o que conduz à atribuição do valor de € 30 000,01 por pedido -, o valor global da causa corresponderá à multiplicação desse valor por cada um dos recorridos, isto é, a € 930 000,31.

A decisão recorrida, nesta parte, tem o seguinte teor:

”.

Na decisão recorrida fixou-se, portanto, à causa o valor de € 30 000,01, já que, por um lado, os prejuízos que se pretendem evitar são indetermináveis e, por outro lado, o pedido não é distinto em relação a cada um dos requerentes, ora recorridos.

Apreciando.

À fixação do valor do presente processo, o qual é um processo cautelar, é aplicável o estatuído no art. 32º n.º 6, do CPTA, nos termos do qual o “valor dos processos cautelares é determinado pelo valor do prejuízo que se quer evitar, dos bens que se querem conservar ou da prestação pretendida a título provisório”.

Na decisão recorrida considerou-se que os prejuízos que se pretendem evitar são indetermináveis, o que não foi impugnado pelas partes e, aliás, foi expressamente aceite pelo ora recorrente, tanto na contestação apresentada como no recurso jurisdicional que interpôs.

Além disso, e conforme acima se concluiu, no presente processo cautelar são formulados tantos pedidos quanto o número de recorridos (cada recorrido peticiona a suspensão da eficácia da deliberação do Conselho Directivo do IHRU, IP, de 24.1.2014, no segmento em que a mesma fixou o preço técnico e a renda apoiada do respectivo fogo), ou seja, estão em causa tantas relações jurídicas materiais controvertidas quanto o número de recorridos.

Do exposto resulta que o pedido formulado por cada um dos recorridos tem valor indeterminável, o que corresponde ao valor de € 30 000,01 (cfr. arts. 34º n.º 2, do CPTA, 6º n.º 4, do ETAF, 24º n.º 1, da LOTJ, na redacção do DL 303/2007, de 24/8, e 303º n.º 1, do CPC de 2013).

De acordo com o prescrito no art. 32º n.º 7, do CPTA, quando sejam cumulados, na mesma acção, vários pedidos, o valor da causa é a quantia correspondente à soma dos valores de todos os pedidos, critério aplicável no caso de coligação de autores/requerentes – neste sentido, Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, cit., pág. 206 -, o qual, no entanto, pressupõe que todos os pedidos sejam susceptíveis de avaliação económica.

Com efeito, e como explicam Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, cit., págs. 217 e 218, em anotação ao art. 34º, do CPTA, “5. A norma do n.° 4 constitui uma concretização do princípio estabelecido no n.° 7 do artigo 32.° para a cumulação de pedidos. Havendo vários pedidos, o valor da causa é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles, mas cada um deles é considerado em separado para o efeito de determinar se a sentença pode ser objecto de recurso, e de que tipo. Se a cumulação ocorre entre pedidos susceptíveis de avaliação económica, de acordo com os critérios enunciados nos artigos 32.° e 33.°, e outros insusceptíveis de tal avaliação - e que são, por isso, de valor indeterminável -, à causa deverá ser atribuído o valor de € 14 963,94 mais € 0,01 (1), sem embargo de se atender separadamente ao valor de cada um dos restantes pedidos para o efeito de determinar se a parte dispositiva da sentença que sobre eles incide é passível de recurso. Para este efeito, o autor deverá indicar, não apenas o valor global da causareferenciando-o a um valor indeterminável -, mas também os valores parcelares dos pedidos cumulados” (sublinhados nossos).

Conclui-se, assim, que, se forem formulados vários pedidos e alguns deles forem susceptíveis de avaliação económica e outros insusceptíveis de tal avaliação, a causa deverá ter valor indeterminável, o que corresponde ao valor de € 30 000,01, pelo que, por maioria de razão, se todos os pedidos forem insusceptíveis de avaliação económica, como ocorre in casu, a causa deverá ter valor indeterminável, ou seja, o valor de € 30 000,01.

Do exposto decorre que a sentença recorrida não enferma de erro de julgamento ao fixar o valor da causa em € 30 000,01, correspondente ao valor indeterminável (só incorreria em erro de julgamento caso os pedidos formulados fossem susceptíveis de avaliação económica – o que não acontece, como é reconhecido pelo próprio recorrente -, caso em que se somaria o valor de cada um deles para se determinar o valor da causa), pelo que, nesta parte, deverá ser negado provimento ao recurso.



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Uma vez que o recorrente e os recorridos ficaram vencidos no presente recurso jurisdicional deverão suportar as respectivas custas - na proporção de 50% para o recorrente e no remanescente (50%), em partes iguais, para os recorridos -, sendo cada um dos recorridos responsável pelo pagamento da respectiva taxa de justiça (arts. 527 n.ºs 1 e 2, 528º n.º 4 e 530º n.º 5, todos do CPC de 2013, ex vi art. 1º, do CPTA).


III - DECISÃO
Pelo exposto, acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em:

I – Conceder parcial provimento ao presente recurso jurisdicional:

a) Revogando a sentença recorrida na parte em que condenou os requerentes, ora recorridos, no pagamento de uma única taxa de justiça e, em consequência, condenar os mesmos no pagamento da respectiva taxa de justiça.

b) Negando provimento ao pedido de revogação da decisão recorrida na parte em que fixou o valor da causa em € 30 000,01, e assim manter, com os fundamentos acima expressos, esta quantia como valor da causa.

II – Condenar o recorrente e os recorridos nas custas relativas ao presente recurso jurisdicional - na proporção de 50% para o recorrente e no remanescente (50%), em partes iguais, para os recorridos -, sendo cada um dos recorridos responsável pelo pagamento da respectiva taxa de justiça.

III – Registe e notifique.

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Lisboa, 11 de Setembro de 2014


_________________________________________
(Catarina Jarmela)

_________________________________________
(Carlos Araújo)

_________________________________________
(Rui Pereira)

(1) Aos processos instaurados a partir de 1.1.2008 deverá ser atribuído o valor de € 30 000 mais € 0,01 – cfr. arts. 34º n.º 2, do CPTA, 6º n.º 4, do ETAF, 24º n.º 1, da LOTJ, na redacção do DL 303/2007, de 24/8, e 312º n.º 1, do CPC de 1961/303º n.º 1, do CPC de 2013.