Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07413/11
Secção:CA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:09/29/2011
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores:IMPUGNABILIDADE - ACTOS JURÍDICOS DE EXECUÇÃO – ACTO EXEQUENDO DESCONHECIDO – ANALOGIA - DL Nº 11/2003
Sumário:1. O regime da execução coactiva de um acto administrativo exige o seguinte: a) existência de um acto administrativo exequendo, que defina rigorosamente a obrigação do destinatário, pois ele contém as balizas da execução, e que seja juridicamente eficaz (arts. 151º-1-3 CPA); b) a execução deve ser feita pelas formas e nos termos previstos na lei (arts. 149º-2 e 155º ss CPA); c) a decisão de executar deve ser notificada previamente ao destinatário (art. 152º-1 CPA); desta notificação devem constar o texto do acto exequendo, o prazo do cumprimento e o aviso coercivo.
2. Os actos jurídicos de execução são actos parcialmente confirmativos do acto exequendo. Pelo que podem ser autonomamente impugnados em certas condições ou situações, designadamente as previstas no art. 151º-3-4 CPA.
3. O CPTA não prevê a situação em que o autor impugna um acto jurídico de execução sem saber licitamente da existência do acto exequendo. Mas, se conhecido o acto exequendo durante a lide, o acto impugnado não se torna imediatamente inimpugnável, até porque podem ter sido alegadas ilegalidades próprias do acto de execução.
4. Nessa situação, integrando a lacuna do CPTA, o autor deve poder beneficiar de uma faculdade análoga à prevista no art. 63º-1-3 CPTA, nos seguintes termos e sob a égide do princípio pro actione: “o objecto do processo pode ser ampliado à impugnação de outros actos, bem como à formulação de novas pretensões cumuláveis, quando o autor tome conhecimento de actos administrativos de cuja validade dependa a existência ou a validade do acto já impugnado. Se este conhecimento ocorrer nos autos, o tribunal convida o autor a exercer essa faculdade”.
5. O que resulta da comparação dos regimes estabelecidos nos arts. 8º (referente às novas instalações previstas nos arts. 5º e 6º) e 15º do DL nº 11/2003, é que só no primeiro há lugar ao deferimento tácito (desde que verificados os condicionalismos nele previstos).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:S.Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

A...- A..., com os sinais dos autos, intentou no T.A.C. de Lisboa uma A.A.Especial contra

MUNICIPIO DE LOURES,

pedindo em Janeiro/2007 ao tribunal a anulação do acto administrativo do Vereador da Câmara Municipal de Loures, proferido no uso de delegação de competências, que determinou a remoção da infra-estrutura de suporte de telecomunicações que a Autora instalou na Quinta da Caldeira, Montemor, Loures.(1)

Por acórdão daquele tribunal, foi a referida acção julgada improcedente, por considerar a decisão administrativa em causa como “irrecorrível”/inimpugnável.

Inconformada, vem A...- A... recorrer para este T.C.A.-Sul, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES:
1 - A Recorrente, pela presente acção, invocou que o acto impugnado padece do vício de violação do dever de audiência prévia, por violação do art. 106.°, n. 3, do Decreto-Lei n. 555/99, na redacção em vigor, e do art. 100.°, n. 1, do Código do Procedimento Administrativo.
2 - Sucede que a sentença recorrida omite totalmente a apreciação desta questão, o que tem por consequência a sua nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos do art. do art., ó68.o, n. 1, al. d), do C.P.C., como decidido nos Acs. do S.T.A., de 06.03.200S, proferido no Proc. 0439/07, e do TCA do Norte, de 09.10.2009, proferido no Proc. 1160/0S.0BEBRG, disponíveis em www.dgsi.pt, nulidade que expressamente se invoca.
3 - O conhecimento desta questão, em suprimento da nulidade cometida, conduzirá necessariamente à procedência da presente acção uma vez que, como resulta expressamente da matéria de facto assente, a ordem de demolição não foi precedida da audiência prévia imposta pelos preceitos legais acima citados,
4 - Deste modo, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que conheça do vício de violação do dever de audiência prévia da ordem de demolição e, em consequência, anule o acto impugnado nos presentes autos.
5 – Decidiu-se expressamente neste sentido nos acórdãos do T.C.A do Norte, de 13.0.8.2008 proferido no Proc. 879/07.5BECBR - doc. n° 1 -, e de 09.10.2009, proferido no Proc. 1160/0S.0BEBRG - doc. n. 2 -, e do STA, de 06.03.2008, proferido nº 0439/07, disponível em www.dgsi.pt.
6 - O pedido de autorização municipal apresentado pela Autora foi deferido tacitamente, em virtude de ter decorrido o prazo de decisão de 1 ano, fixado no art. 15.°, n. 4, do Decreto-Lei n. 11/2003.
7 - O decurso deste prazo tem como consequência o deferimento tácito, por força do disposto no art. 8.° do mesmo diploma, e ainda porque seria um completo absurdo que só para as antenas a instalar de novo vigorasse o regime do deferimento tácito, uma vez que, tendo em conta o que ficou dito, o regime aplicável à autorização municipal das já instaladas na data da entrada em vigor do mesmo diploma legal tem necessariamente de ser menos restritivo.
8 - O facto de o prazo de decisão fixado no art. 15.0 ser mais amplo do que o que resulta do art. 8.0 justifica-se apenas pela circunstância de, no que respeita às antenas já instaladas, o procedimento de autorização ter por objecto todas as estações em funcionamento em cada Município.
9 - O deferimento tácito da autorização municipal dos autos sempre resultaria, caso não houvesse, como há, disposição especial, do art. 108.°, n. 3, al. a) do Código do Procedimento Administrativo, por maioria de razão, tendo em conta que a instalação de uma antena de telecomunicações nem sequer pode ser considerada como obra de construção civil.
10 - Uma vez deferido o pedido de autorização municipal o particular adquire o direito correspondente à instalação da antena, pelo que o indeferimento posterior constitui violação flagrante deste direito, o que tem por consequência a sua ilegalidade e consequente anulabilidade, nos termos do art. 135.° do Código do Procedimento Administrativo.
11 - No acórdão recorrido decidiu-se não existir deferimento tácito, na medida em que a não decisão no prazo fixado de um ano não teria esta consequência para as antenas já instaladas à data da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 11/2003.
12 - Não pode concordar-se com este entendimento, pelas razões expostas, uma vez que a remissão do nº 4 do art. 15º para «as normas do presente diploma que se mostrem aplicáveis» não pode deixar de ter por alcance a regra do deferimento tácito, prevista no art. 8.° do Decreto-Lei nº 11/2003.
13 - Decidiu-se expressamente neste sentido nos Acórdãos do Tribunal Central Administrativo do Norte de 4.10.2007, proferido no Proc. 1080/045... – doc. nº 3, e de 9.01.2009, proferido no Proc. 15/07.8BEHRG - doc. nº 4 -, e de 07.05.2009, proferido no Proc. 01547/06.0BEPRT, disponível em www.dgsi.pt.
14 - O acórdão recorrido, ao não ter declarado a existência do deferimento tácito do pedido de autorização municipal dos autos, violou o disposto no art. 15.°, n. 4 e 8 do Decreto-Lei n. 11/2003.
15 - Em consequência, deve ser revogado e substituído por outro que declare o mesmo deferimento tácito e, em consequência, condene o Réu à prática do acto de autorização municipal solicitado para a antena dos autos.
16 - Acrescenta-se ainda, no acórdão recorrido, que, para além de não ter ocorrido o deferimento tácito da autorização municipal solicitada pela Autora para a antena de telecomunicações dos autos, esta teria aceitado a decisão de indeferimento, ao não ter procedido à sua impugnação, nos termos do art. 70.°, n. 4, do C.P.T.A, decisão com a qual a Recorrente não pode confirmar-se.
17 - Na perspectiva da recorrente, só por mero lapso pode ser invocado o art. 70.°, n. 1, do CPTA, para se concluir pela necessidade de impugnação do acto de indeferimento, uma vez que o mesmo foi proferido em data anterior à da interposição da presente acção, sendo que o regime do referido preceito legal só é aplicável a actos proferidos na pendência do processo.
18 - Ora, como resulta do facto provado sob o número 3, o indeferimento terá sido proferido pelo Réu em 2.06.2005, logo em data anterior à interposição da presente acção.
19 - Por esta razão, a Autora estava legalmente impedida de lançar mão do incidente processual previsto no mesmo art. 70.0 do CPTA, pelo que, só por esta razão, carece de sentido o decidido no acórdão recorrido, ao dizer-se que a não utilização do mesmo meio valeria como aceitação do acto por parte da Autora.
20 - Ainda que assim não fosse, deve ter-se presente que a utilização do mecanismo processual previsto no art. 70.° do CPT A é uma mera faculdade, como resulta expressamente da letra do seu n. 1 e n. 3 - «pode o autor» e pode ser cumulado», respectivamente, pelo que não podem ser associadas ao seu não exercício quaisquer efeitos preclusivos,
21 - Assim se demonstra que, ao contrário do decidido no acórdão recorrido, nãonão é aplicável, ao caso dos autos, o regime do art. 70.°, n. 4, do CPTA, por não estar em causa uma acto proferido após a interposição da acção, como, ainda que assim não fosse, a não utilização do mecanismo processual aí previsto não implica a aceitação do acto.
22 - Sempre se acrescentará que, não tendo havido notificação do acto, o prazo para a sua impugnação judicial nem sequer se iniciou, nos termos expressos do art. 59, nº 1, do CPTA.
23 - Tratando-se, como se trata, de acto proferido em data anterior à interposição da acção e não notificado à Autora, o seu regime é o da ineficácia, nos termos expressos do art. 132.° do C.P.A.
24 - Em consequência, a decisão de indeferimento, enquanto não for notificada à Autora, não é eficaz, pelo que não lhe é oponível e, em particular, não produz efeitos de revogação do deferimento tácito anterior, como decidido no acórdão do T.C.A. do Sul, de 16.02.2006, proferido no Proc. 01367/06, disponível em www.dgsi.pt.
25 - O acórdão recorrido, ao ter aplicado o art. 70.°, n. 4, do CPT A, a um acto proferido em data anterior à interposição da acção, não notificado à Autora, e ao ter decidido que a não utilização da faculdade ai prevista tem por consequência a aceitação do acto violou este preceito legal
26 - Em consequência, deve ser revogado e substituído por outro que declare ineficaz o acto de indeferimento, por o mesmo não ter sido notificado à Autora, o que implica que o mesmo não produza efeitos de revogação do deferimento tácito anterior.
27 - Mantendo-se, como se mantém, este deferimento, por ser ineficaz o acto de indeferimento, o acto impugnado carece do seu pressuposto legal, o que conduz à sua ilegalidade e consequente anulabilidade.
28 - Sem prejuízo do que fica exposto, nunca se poderia ter concluído pela inimpugnabilidade do acto objecto dos presentes autos, por ter a natureza de acto de execução.
29 - Em primeiro lugar, porque os actos que ordenam a demolição de infra-estruturas são expressa e autonomamente impugnáveis, nos termos do disposto no art. 115.° do Decreto-Lei n. 555/99.
30 - Em segundo lugar, os vícios assacados ao acto objecto dos autos, em particular o vício de violação do dever de audiência prévia, não é consequência da ilegalidade do acto exequendo, pelo que aquele é susceptível de impugnação, nos termos do art. 151°, n. 4, do C.P.A.
31 - Por esta razão, ao ter decidido que o acto impugnado era inimpugnável, por ter a natureza de acto de execução, o acórdão recorrido violou o art. 51.° do C.P.A., pelo que deve ser revogado e substituído por outro que conheça dos vícios que lhe foram imputados e o anule, por padecer do vício de ausência do seu pressuposto legal em virtude de ter ocorrido o deferimento tácito da autorização municipal e ainda por padecer do vício de violação do dever de audiência prévia, pelos motivos e fundamentos expostos, que aqui se têm por integralmente reproduzidos.

Não foram apresentadas contra-alegações.

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O Exmº representante do Ministério Público junto deste Tribunal foi notificado para, em defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, de interesses públicos especialmente relevantes ou de algum dos valores ou bens referidos no n.º 2 do artigo 9.º do CPTA, se pronunciar sobre o mérito do recurso (art. 146º nº 1 do CPTA).

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Após os vistos, importa agora, em conferência, apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1. FACTOS PROVADOS

A factualidade declarada provada pelo tribunal de 1ª instância foi a seguinte:
1 - A Autora instalou na Quinta da Caldeira, Montemor, Loures, também denominada Vilas do Solar, Santo António dos cavaleiros, uma antena de telecomunicações identificada com o código 98LN019, antes de 23.1.2003 (cfr. Doc. 61-62 dos autos em suporte de papel e admitido pelo R.);
2 - A Autora entregou o pedido de autorização municipal de instalação da estação dos autos ao Presidente da Câmara Municipal de Loures em Junho de 2003, cfr. doc. 61-62 dos autos em suporte de papel;
3 - O Réu indeferiu o pedido de autorização relativo à antena em apreço, por despacho de 2.6.2005, do Senhor Vereador da CMLoures, cfr. fls. 83 dos autos;
4 - Tal despacho de indeferimento foi precedido da informação n. 109/dgu/dgzn/JC, de 28.2.2005, da autoria do arquitecto João Pedro Costa (a fls. 87-89 dos autos), de onde conta que a antena em apreço "conforme informação n. 58/DPM/SPIGF/AC, a referida instalação implanta-se em terrenos municipais, destinados a zona verde de recreio e lazer, com indicação de localização de Centro de Apoio a Dependentes, pelo que não poderá permanecer no local. Devendo ser relocalizada, conforme referida informação da DPM, de 2004-02-09 ( ... )", cfr. fls. 88-89 dos autos;
5 - As decisões administrativas mencionadas nos anteriores pontos n.ºs 3 e 4 foram juntas aos autos (cfr. fls. 81 e segts) na sequência do despacho de fls. 78 dos autos, tendo tais documentos sido notificados à A., cfr. fls. 103-105 dos autos;(2)
6 - A A. não impugnou a decisão referida supra em 3(3) (presunção judicial retirada da conjugação do facto alegado no art. 7.° da p.i. e da não impugnação de tal decisão nos presentes autos, em cumulação com o pedido inicial);
7 - Por despacho de "Concordo", datado de 13.12.2006, da autoria do Senhor Vereador da Câmara Municipal de Loures, proferido no uso de delegação de competências, exarado na informação datada de 5.12.2006, do Proc. n. 93546/SCO/2004, da autoria da Sr. Instrutora Susana Silvestre, foi determinada "a retirada voluntária do executado sem licenciamento, concedendo à arguida um prazo de 30 dias, para o efeito, sob pena de, em caso de incumprimento, aquela incorrer num crime de desobediência". Consta da mesma informação que "Por informação da DGZN, a fls. 41 e seguintes, verifica-se que a dita infra-estrutura encontra-se em terrenos municipais ( ... )", cfr. fls. 57-58 dos autos em suporte de papel; (ACTO IMPUGNADO)
8 - O despacho referido no ponto anterior foi notificado à A. pelo ofício n. 056437, expedido em 21 de Dezembro de 2006, cfr. fls. 57 dos autos.

II.2. APRECIAÇÃO DO RECURSO

O âmbito do recurso jurisdicional, cujo objecto é a decisão recorrida, é delimitado pela Recorrente nas conclusões (sintéticas, suficientes, claras e simples, com indicação das normas jurídicas violadas) das suas alegações (sem prejuízo do conhecimento das questões de conhecimento oficioso), apenas podendo incidir sobre questões que tenham sido ou devessem ser anteriormente apreciadas e não podendo confrontar o tribunal ad quem com questões (coisa diversa de considerações, argumentos ou juízos de valor) novas ou cobertas por caso julgado – v. arts. 684º-3-4, 716º e 668º-1-d do CPC.

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O acórdão recorrido entendeu:
Começa-se por apreciar se neste caso se formou o deferimento tácito do pedido de autorização formulado pela A., em Junho de 2003.
Ao contrário daquilo que vem defendido pela A., entende-se que o art. 8º prevê o deferimento tácito apenas para os casos previstos no art. 6. °, ou seja, para os procedimentos autorizativos de antenas a instalar, sendo omisso, quanto aos efeitos do decurso do prazo de um ano previsto no n. 4 do art. 15º.
Ora os casos de deferimento tácito têm de tratar-se de casos legalmente previstos como sendo de deferimento tácito através de disposição específica da lei, bem como nos casos taxativos previstos nas diferentes alíneas do n. 3 do art. 108 do CPA.
Não o sendo, há-de valer o silêncio administrativo, decorrido que esteja o prazo legal, como indeferimento de acordo com a regra prevista no n. 1 do art. o 109 do CP A ou hoje (a partir da entrada em vigor do CPTA) como omissão do dever de decidir consagrado no art. o 9. do CP A, o qual constitui pressuposto processual da acção administrativa especial de condenação à prática de acto devido (art. 67, 1, a) CPTA).
Com efeito, tratando-se de processo de regularização de antenas instaladas e em funcionamento, não seria adequado que o legislador impusesse às entidades públicas o dever de verificar em relação a todo o universo de antenas instalado no território, quais as que se encontravam em locais proibidos nos instrumentos de gestão territorial (sejam espaços RAN, REN ou PDM) no prazo de um ano, sob pena de se formarem actos constitutivos de direitos nulos, sempre que se verificasse uma das referidas situações.
Considera-se, por isso, mais ajustado e até mais consentâneo aplicar nestes caso, o entendimento do STA relativamente ao valor do silêncio nos procedimentos de legalização de oras. Cita-se, entre outros, como exemplo o Ac. do STA (3.a Subsecção), de 2.5.2002, proferido no proc. 01005/02, disponível in www.dgsi.pt e jurisprudência aí citada.
Na verdade, quem pede a autorização de instalação de antena já em funcionamento não pretende uma autorização para exercer o direito de a instalar, mas uma autorização para manter o ilegalmente realizado por falta de prévio licenciamento. A pretensão material da A. nessa circunstância coloca-se fora do âmbito traçado pelo art. 6° do DL 11/03 e, portanto, da valoração positiva do silêncio administrativo cominada pelo respectivo art. 8.°.
Aplica-se-lhe o regime de legalização decorrente do art. 15.
O argumento teleológico de interpretação concorre no mesmo sentido.
O particular que submete a sua intenção de instalar a pedido de autorização não deve ver a sua iniciativa sujeita à inércia administrativa no desempenho das competências que condicionam essa iniciativa.
Mas já não pode reclamar a mesma protecção, quem se coloca em infracção ao sistema de licenciamento e portanto fora do âmbito de protecção contra a inércia administrativa que o caracteriza, concretizando a iniciativa de instalar antes de a sujeitar a licenciamento.
Perante as antenas já instaladas, a atribuição de valor positivo ao silêncio nunca poderia ter como justificação material a necessidade de não fazer suportar ao particular as consequências da demora na decisão administrativa na instalação da antena pela simples razão de que a mesma já está instalada e em funcionamento há vários anos.
É que contrariamente ao que diz a A. a actividade não era livre. Repare-se que já o legislador do Dec.-Lei nº 150-A/2000 se referia à necessidade de autorização municipal para a instalação de antenas.
Acresce ainda que, o vazio legislativo assumido pelo legislador no preâmbulo do Dec.-Lei n. 11/03 deve entender-se restritivamente, como querendo referir-se à inexistência de normas de trâmite próprias, específicas destes procedimentos.
Não se dando por verificada a formação de deferimento tácito do pedido de autorização da A., passemos à apreciação da falta do acto pressuposto do acto ora impugnado.
Há que ter presente que, na sequência de despacho judicial solicitando informação sobre se o pedido de autorização da antena em apreço fora ou não decidido, veio o R. juntar prova do indeferimento proferido em 2.6.2005 (cfr. fls. 83 dos autos).
Não fez a entidade pública demandada prova de que tal acto tivesse sido antes notificado à A. Contudo a A. foi notificada da sua junção aos autos, cfr. fls. 103-105. E nada disse, nem impugnou tal acto, mantendo inalterado o pedido inicial e respectivos fundamentos nas alegações de direito.
Ora mesmo que a A. não tivesse tido conhecimento anterior do acto pressuposto do acto ora impugnado, podia ter reagido contra o mesmo, a partir da data em que o conheceu através dos presentes autos (cfr. art. 70.°, n. 4 do CPTA).
Assim sendo, o acto impugnado não padece de erro nos pressupostos por falta de decisão anterior quanto ao licenciamento.
Porém, demonstrada a existência do acto de indeferimento do pedido de autorização para a manutenção da instalação da antena no local em apreço e a sua não impugnação pela A., dentro do prazo legal de impugnação de actos, formou-se caso resolvido quanto ao mesmo.
Daqui decorre que o acto impugnado na presente acção constitui acto de execução do referido acto, sendo por isso irrecorrível fora dos casos previstos nos n. 3 e 4 do art. ° 151.° do CPA.
Ora a A. notificada da existência do acto exequendo, nem sequer veio sustentar que o acto impugnado excedia ou contrariava o acto exequendo ou que as ilegalidades de que padecia não são consequência do mesmo acto.
Considera-se, assim, que o acto impugnado é irrecorrível em face da aceitação pela A. do acto exequendo do qual depende, pelo que se considera prejudicado o conhecimento das ilegalidades que lhe vêm imputadas.
Em face do exposto, julga-se totalmente improcedente a presente acção, absolvendo o R. dos pedidos.

1

OMISSÃO DE PRONÚNCIA (art. 668º-1-d CPC)

Não há omissão de pronúncia pela simples razão de que o tribunal a quo considerou, bem ou mal, o acto de 13-12-2006 como um acto inimpugnável, por ser de mera execução da decisão de 2-6-05 (desconhecida da A. até este processo), e logo, segundo o tribunal a quo, não susceptível de ser apreciado pelo tribunal. Nesta base o tribunal a quo não tinha de apreciar mais nada.

Os restantes vícios imputados à decisão recorrida pressupõem a revogação da mesma.

É, pois, necessário analisar a inimpugnabilidade detectada no acto administrativo impugnado.

2

INIMPUGNABILIDADE (art. 51º CPTA)

O DL 11/2003 regula a autorização municipal inerente à instalação e funcionamento das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, e respectivos acessórios, definidas no Decreto-Lei n.º 151-A/2000, de 20 de Julho, e adopta mecanismos para fixação dos níveis de referência relativos à exposição da população a campos electromagnéticos (0 Hz - 300 GHz).

A instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações e respectivos acessórios está sujeita a autorização municipal (art. 4º).

Decorrido o prazo referido no n.º 8 do artigo 6.º do presente diploma sem que o presidente da câmara se pronuncie, o requerente pode iniciar a colocação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, mediante a entrega prévia de requerimento em que solicite a emissão da guia de pagamento das taxas devidas (art. 8º).

O art. 15º do DL 11/2003 dispõe:

Norma transitória

1- O presente diploma aplica-se às infra-estruturas de suporte de radiocomunicações já instaladas sem que tenha havido deliberação ou decisão municipal favorável, devendo os operadores requerer a respectiva autorização municipal no prazo de 180 dias a partir da data da sua entrada em vigor.

2- Para efeitos do disposto no número anterior, devem os operadores apresentar ao presidente da câmara municipal um processo único do qual conste uma lista com a identificação e localização de todas as infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações instaladas no respectivo município, acompanhada dos documentos referidos nas alíneas a), b), e) e f) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º do presente diploma.

3- O presidente da câmara municipal poderá solicitar complementarmente outros documentos referidos no artigo 5.º do presente diploma.

4- O presidente da câmara municipal profere decisão final no prazo de um ano a contar da entrega do processo, de acordo com as normas do presente diploma que se mostrem aplicáveis.

5- Nos casos em que exista projecto de decisão no sentido de indeferir a pretensão, aplica-se a todo o tipo de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações o regime previsto no artigo 9.º.(4)

6- O indeferimento referido no número anterior só pode ser sustentado em:

a) Pareceres vinculativos, autorizações ou aprovações emitidos pelas entidades competentes no sentido desse indeferimento;

b) Violação de restrições relativas à instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, estabelecidas em plano municipal de ordenamento do território, plano especial de ordenamento do território, medidas preventivas, área de desenvolvimento urbano prioritário, área de construção prioritária, servidão administrativa, restrição de utilidade pública ou quaisquer outras normas legais ou regulamentares aplicáveis;

c) Agressões intoleráveis e desproporcionadas ao ambiente, ao património cultural e à paisagem urbana ou rural;

d) Violação dos níveis de referência definidos ao abrigo do n.º 1 do artigo 11.º.

Algumas das questões colocadas por estas normas já foram objecto de jurisprudência superior, nomeadamente do STA e deste TCA-Sul:

- Ac. STA de 6-6-2007, pr. nº 734/06:

I - O DL nº 11/2003, de 18 de Janeiro, veio regular a autorização municipal inerente à instalação e funcionamento das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, e respectivos acessórios, ou seja, o conjunto de elementos que permitem a instalação e funcionamento dos equipamentos de radiocomunicações [nºs 1 e 2, al. a)].

II - Este novo diploma contém uma norma transitória (art. 15º), que prevê a sua aplicação às infra-estruturas já instaladas sem que tenha havido deliberação ou decisão municipal favorável, e que estabelece um procedimento específico de autorização, nos termos do qual devem os operadores requerer a respectiva autorização municipal no prazo de 180 dias a partir da data da sua entrada em vigor, estabelecendo-se nesse preceito os respectivos trâmites do procedimento, designadamente para as situações em que há um projecto de decisão no sentido do indeferimento da pretensão [nºs 2 a 6].

III - Ainda que o procedimento administrativo para remoção de uma antena de radiocomunicações se tivesse iniciado anteriormente à vigência do DL nº 11/2003, a decisão final proferida já na vigência deste diploma, desde que o operador tenha apresentado o requerimento de autorização nos termos e prazo previstos no nº 1 daquele art. 15º, não pode fundamentar-se nas disposições do DL nº 555/99.

- Ac. STA de 21-1-10, pr. nº 719/09:

I - O art. 15º do Regulamento Municipal da Edificação e Urbanização do Município de Odivelas (RMEU), publicado no D.R. II Série, n° 111, Apêndice n.º 73, de 14 de Maio de 2003, emitido a coberto do disposto no art. 3º do DL 555/99, com a redacção do DL 177/2001, de 4.6, a lei habilitante, justamente porque se refere a licenciamento de obras, é inaplicável a um pedido de autorização municipal para as infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações já instaladas no Concelho de Odivelas, requerimento formulado nos termos do art. 15º do DL 11/2003, de 18.1.

II - O art. 15º deste diploma legal prevê um procedimento de autorização para as infra-estruturas de suporte de radiocomunicações já instaladas mas já não para as próprias estações de radiocomunicações cujo licenciamento, e não autorização, está a cargo de outra entidade (art. 5º do DL 151-A/2000, de 20.7 e art. 5º do DL 11/2003).

III - Os interesses e valores previstos nesse preceito, que aos Municípios cabe defender, estão relacionados com a localização das estações e já não com as suas eventuais emissões nocivas cuja avaliação cabe a terceiros.

- Ac. TCAS de 24.6.10, pr. nº 2474/07:

I – Pelo menos desde a entrada em vigor do D.L. nº 11/2003, de 18/1, o R.J.U.E. deixou de ser aplicável à instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações por esta passar a estar sujeita a um regime especial de autorização municipal.

II - …

III – Enquanto que o art. 15º do D.L. nº 11/2003 se reporta a um procedimento de autorização de instalação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações o art. 15º do referido RMEU trata do licenciamento de obras não sendo aplicável àquela autorização.

IV – Enferma de vício de violação de lei, por erro de interpretação e aplicação do mencionado art. 15º do RMEU, o despacho que considera aplicável este preceito a um pedido de autorização formulado ao abrigo do art. 15º do D.L. nº 11/2003.

- Ac. TCAS de 19-1-11, pr. nº 3489/08:

I – O interessado na autorização municipal para a instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações tem de instruir o seu pedido com os documentos referidos no artigo 5º do DL nº 11/2003, de 18/1, entre os quais consta, nomeadamente, a “cópia do documento de que conste a autorização expressa dos proprietários dos terrenos para a instalação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações e respectivos acessórios” [cfr. citado artigo 5º, nº 1, alínea f) do DL nº 11/2003, de 18/1].

II – De acordo com o disposto no artigo 6º do citado diploma, “o presidente da câmara municipal profere despacho de rejeição liminar do pedido no prazo de oito dias a contar da respectiva apresentação, sempre que o requerimento não seja instruído com os elementos referidos no artigo anterior…” [nº 1], cabendo-lhe também “…promover, no prazo de 10 dias a contar da data de apresentação do pedido, a consulta às entidades que, nos termos da lei, devem emitir parecer, autorização ou aprovação relativamente à instalação…” [nº 2].

III – O presidente da câmara municipal decide sobre o pedido no prazo de 30 dias a contar da data de recepção do pedido…” [cfr. nº 8 do artigo 6º do DL nº 11/2003].

IV – E, se não for proferida decisão no aludido prazo, forma-se deferimento tácito, de acordo com o disposto no artigo 8º do citado diploma, que dispõe que no “…prazo referido no nº 8 do artigo 6º do presente diploma sem que o presidente da câmara se pronuncie, o requerente pode iniciar a colocação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, mediante a entrega prévia de requerimento em que solicite a emissão de pagamento das taxas devidas...”.

V – Se, na fase de apreciação liminar do pedido, os serviços da CML detectaram várias deficiências, nomeadamente que a morada constante do contrato de arrendamento não correspondia àquela que constava do requerimento que originou o processo e que não tinha sido apresentada a autorização expressa do proprietário do local, que não foram corrigidos pelo interessado na autorização municipal, tal facto obsta ao prosseguimento do pedido formulado.

VI – Se o presidente da câmara indeferir a pretensão formulada depois de se ter formado deferimento tácito, tal acto constitui a revogação de um anterior acto constitutivo de direitos, só podendo, portanto, ocorrer com fundamento em ilegalidade e dentro do prazo previsto na lei para o efeito, à semelhança do que sucede com qualquer acto expresso, nos termos do artigo 141º do CPA.

- Ac. TCAS de 10-2-11, pr. nº 2595/07:

1. A instalação de infra-estruturas de suporte das instalações de radiocomunicações e respectivos acessórios está excluída da regulamentação específica do RJUE (DL 555/99 de 16.12) por sujeita a um procedimento especial de autorização municipal regulado nos termos do DL 11/03 de 18.01.

2. A presunção legal de concordância atribuída ao silêncio do órgão competente para emitir o parecer, cfr. artº 6º nº 7 DL 11/03, não tem nem efeitos conformativos do sentido da decisão administrativa final do procedimento, nem efeitos preclusivos sobre o exercício das competências dispositivas próprias do órgão decisor por inutilidade superveniente, o que significa, ainda, a natureza não vinculante do mesmo.

3. Na previsão conjugada dos art°s. 6º nº 8 e 8º DL 11/03, a formação (estatuição) do acto silente de autorização de instalação de infra-estruturas de suporte de radiocomunicações tem como pressupostos o esgotamento do prazo legal (artº 6º nº 8) sem emissão de decisão expressa ou implícita sobre a pretensão deduzida perante a Administração (artº 8º, 1ª parte).

4. A lei não estabelece nenhum sentido valorativo ao silêncio atingido o termo ad quem do prazo de um ano consignado no artº 15º nº 4 do DL 11/03, pelo que a referência expressa às “normas do presente diploma que se mostrem aplicáveis” no artº 15º nº 4, in fine, não autoriza o intérprete a aplicar por interpretação extensiva a norma do artº 8º, pois cabe exclusivamente à lei atribuir ao silêncio administrativo no decurso de um prazo, o sentido jurídico de exteriorização declarativa e unilateral de efeitos jurídicos positivos.

5. O disposto no artº 15 nº 6 als. a) a d) DL 11/03 significa que a lei vincula a Administração municipal a indeferir pelos fundamentos constantes da lei e impede-a de indeferir as pretensões de ocupação do solo por infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações com fundamento em motivos diversos dos constantes das citadas alíneas.

6. Todos os instrumentos de planeamento vinculam as entidades públicas, mas apenas os dotados de eficácia pluri-subjectiva, isto é, os planos municipais e os planos especiais, vinculam os particulares de forma directa e imediata – cfr. art°s. 11 nº 2 da Lei 48/98 (Lei de Bases) e 3º nº 2 do DL 380/99 de 22.09 (RJGIT).

7. Aos planos especiais, como é o caso do Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra Cascais, compete a identificação dos usos compatíveis com vista à salvaguarda dos recursos e dos valores naturais das áreas sobre que incidem – cfr. artº 42º nº 3 DL 380/99 de 22.09 (RJIGT).

É impugnável o acto administrativo (= acto jurídico unilateral praticado no exercício do poder administrativo por um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada para tal habilitada por lei, e que traduz a decisão de um caso considerado, visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta) com eficácia jurídica externa (= vinculante sobre outras pessoas ou sobre coisas fora do património jurídico da entidade decisora) imediata ou potencialmente lesiva, incluindo alguns actos entre entidades públicas ou praticados em relações inter-orgânicas – arts. 120º CPA e 51º CPTA.

O Réu não proferiu qualquer decisão definitiva no âmbito do procedimento administrativo dos autos, para além da ordem de demolição que se impugna na presente acção (art. 7º da p.i.).

Como já vimos, isto não é verdade. Verdade é que essa decisão definitiva era desconhecida da A. quando iniciou a acção, ineficaz.

Notemos, desde já, que, face ao conhecido da A., não era possível a AAE prevista nos arts. 66º ss CPTA, porque o único acto administrativo que ela conhecia e que nem terá sido de resposta expressa ao requerimento da A., era um acto positivo e não enquadrável nas hipóteses do art. 67º-1 CPTA, o acto de 2006.

Pelo que fez bem em intentar uma AAE de impugnação anulatória contra esse acto de 2006, atacando-o por vícios próprios.

O art. 70º-3-4 do CPTA(5), invocado pelo tribunal a quo, que dá uma faculdade e não impõe um dever, só parece ser aplicável na AAE de condenação à prática de acto devido, como aliás resulta da sua letra e inserção sistemática (MÁRIO AROSO…, Comentário…, 3ª ed., 2010, anot. 1 ao art. 70º; MÁRIO/RODRIGO E. DE OLIVEIRA, CPTA/ETAF Anot., notas ao art. 70º) e porque se trata de o acto ter sido proferido na pendência da acção. Ora, aqui o que se passa é que o acto que está na origem do acto impugnado tem data anterior à acção, mas só foi conhecido da A. durante a acção.

Quanto ao acto impugnado, acto de 13-12-06, que a A. pensou licitamente ser o 1º neste assunto contra si, o tribunal considerou ser um acto de mera execução (da não notificada decisão de 2005).

São actos de mera execução os praticados em consequência necessária da definição de situações jurídicas constantes de actos administrativos anteriores e que não contenham outros efeitos jurídicos que não sejam a concretização ou desenvolvimento das estatuições jurídicas contidas neles.

Os actos de execução são inimpugnáveis, tanto administrativa, como contenciosamente, a não ser nos casos em que excedam os limites do acto exequendo (art. 151º, nº3, do CPA(6)), ou quando a sua ilegalidade seja intrínseca e autónoma e não mera consequência da ilegalidade do acto que executa (art. 151º, nº4, do cit. dip.); ou seja, em regra, os actos de execução só são passíveis de impugnação contenciosa autónoma por vícios próprios ou na medida em que sejam inovatórios, por alterarem, excederem ou modificarem a situação definida pelo acto executado (cf. D. FREITAS DO AMARAL et al., CPA Anot., 2007, p. 268; MÁRIO AROSO…, Manual…, 2010, p. 283-284).

Em suma, os actos de execução são passíveis de impugnação nos seguintes casos:

a) execução de actos administrativos contidos em diploma administrativo e regulamentar, conforme previsto no nº 2 do artigo 52º do CPTA;

b) caso em que o acto administrativo titulador não individualize os seus destinatários [artigo 52º, nº 3, do CPTA];

c) execução que exceda os limites do título executivo [artigo 151º, nº 3, do CPA]; e, finalmente,

d) se se apontar ao acto de execução uma ilegalidade específica, que não seja consequência da ilegalidade do acto exequendo [artigo 151º, nº 4, do CPA].

Assim, não temos dúvida de que o acto impugnado é, na verdade, um acto de mera execução. Mas eis que, durante a AAE, a A. descobre que, afinal, havia prévio acto de indeferimento da sua pretensão, “tornando” o acto impugnado em mero acto de execução do acto de indeferimento, impugnável por vícios próprios além dos casos particulares referidos no art. 52º cit.

Ora, estamos assim, nesta AAE impugnatória, num quadro apenas algo semelhante ao que refere o cit. art. 70º CPTA na AAE de condenação à prática de acto legalmente devido (ou ao referido no art. 63º-2 CPTA). E, não sendo o art. 70º CPTA directamente aplicável a este tipo de AAE, impugnatória, não se poderia exigir, como fez o tribunal a quo, que a A., de motu proprio, o utilizasse.

Sublinhe-se que o tribunal a quo não considerou o acto de 2006, o impugnado, como de indeferimento, pois não aplicou o nº 4 do art. 51º CPTA(7).

FREITAS DO AMARAL (Curso…, II, 2011, p. 523 ss) explica assim o regime da execução coactiva de um acto administrativo:

a) existência de um acto administrativo exequendo, que defina rigorosamente a obrigação do destinatário, pois ele contém as balizas da execução, e que seja juridicamente eficaz (arts. 151º-1-3 CPA);

b) a execução deve ser feita pelas formas e nos termos previstos na lei (arts. 149º-2 e 155º ss CPA);

c) a decisão de executar deve ser notificada previamente ao destinatário (art. 152º-1 CPA); desta notificação devem constar o texto do acto exequendo, o prazo do cumprimento e o aviso coercivo (assim FREITAS DO AMARAL, Curso…, cit., p. 527; CARLA AMADO GOMES, Contributo…, p. 131, e Era uma vez…, in CJA-15, p. 11).

Ora, no caso presente, havia, ao início desta AAE, um acto exequendo de 2005 mediatamente constitutivo de deveres para com a A. mas não notificado, além de outros aspectos não invocados na p.i. referentes ao acto jurídico de execução aqui impugnado.

Mas o que mais interessa é que o tribunal a quo considerou este acto jurídico de execução como inimpugnável, porque:

durante este processo o acto exequendo foi pela 1ª vez conhecido pela A. e esta nada disse ou fez a propósito, formando-se caso resolvido, pois que a A. aceitou o acto exequendo. Portanto, o acto aqui impugnado, que implicou directamente para a A. o dever de retirada da antena, “tornou-se” inimpugnável (v. art. 51º-1 CPTA) durante este processo, porque o acto exequendo foi entretanto conhecido da A. (v. arts. 127º e 132º CPTA) e porque esta nada fez nestes autos (em que prazo?) contra o mesmo (art. 56º CPTA).

Será assim? Não.

Os actos jurídicos de execução são actos parcialmente confirmativos do acto exequendo (assim MÁRIO AROSO…, Comentário…, 2010, p. 363). Pelo que, tal como já referimos, podem ser autonomamente impugnados em certas condições ou situações (art. 151º-3-4 CPA).

Não parece ter sentido aferir a impugnabilidade de um acto jurídico de execução apenas com base em factos ocorridos só após o início da lide.

Na p.i. invocam-se os seguintes vícios:
1) falta de audiência prévia, quer com relação ao RJUE, quer com relação aos arts. 9º e 15º do DL 11/2003;(8)
2) falta de competência legal decisória do presidente da câmara;
3) falta de acto exequendo;
4) ocorrência de um deferimento tácito do pedido de autorização da A.;
5) falta de fundamentação do acto impugnado.

Ora, os fundamentos cit. sob os nº 2 a 5 são próprios deste acto de 2006, mesmo visto como acto jurídico de execução do acto de 2005.

O nº 2 resolve-se com base no DL 11/2003 e no CPA. O nº 3 fica esclarecido no processo. O nº 4 foi decidido e recorrido. O nº 5 pode ser esclarecido nos autos.

Há assim impugnabilidade (art. 151º-4 CPA e art. 51º-1 CPTA).

O fundamento sob o nº 1 é condicionado ao facto de se considerar este acto como de indeferimento do pedido de autorização, o que, como vimos, não é o caso.

Na verdade, a presente situação é a situação inversa da prevista no art. 70º-3 cit. ou da prevista no art. 63º-2-2º inciso do CPTA(9), ou seja, nesta situação o que faria sentido seria
· mudar do pedido previsto nos arts. 50º ss CPTA para o pedido previsto nos arts. 66º ss CPTA contra o acto de 2005 agora conhecido, ou
· cumular o pedido previsto nos arts. 66º ss contra o acto de 2005 ao pedido formulado e previsto nos arts. 50º ss.

O art. 70º-3-4 utilizado no ac. recorrido (com referência ao seu nº 4) e o art. 63º-2-2º inciso permitem, sim, a cumulação inversa daquela que faria sentido aqui.

O art. 45º CPTA(10) não prevê esta situação.(11)

Há, portanto, uma lacuna (= incompleição do sistema normativo, que contraria o plano deste) de previsão(12) no CPTA.

As lacunas integram-se ou resolvem-se por analogia (= semelhança entre o caso omisso na lei e outro contemplado e regulado no sistema legislativo, estendendo-se as disposições duma lei sobre um certo caso a um outro não contemplado nem na sua letra nem no seu espírito, com base na semelhança referida(13); v. art. 10º CC(14)).

A solução deve ser uma faculdade do tipo previsto no CPTA para a AAE destes autos, em vez da do art. 70º CPTA, ou seja, a do art. 63º-1-2 CPTA como segue e sob a égide dos princípios da economia de meios processuais e pro actione (art. 7º CPTA):

O objecto do processo pode ser ampliado à impugnação de outros actos, bem como à formulação de novas pretensões cumuláveis, quando o autor tome conhecimento de actos administrativos de cuja validade dependa a existência ou a validade do acto impugnado. Se este conhecimento ocorrer nos autos, o tribunal convida o autor a exercer essa faculdade.

3

DEFERIMENTO TÁCITO

O que resulta da comparação dos regimes estabelecidos nos arts. 8º (referente às novas instalações previstas nos arts. 5º e 6º) e 15º do DL nº 11/2003, é que só no primeiro há lugar ao deferimento tácito (desde que verificados os condicionalismos nele previstos).

Tratando-se do regime do art. 15º do DL 11/2003, nomeadamente, nos termos do seu nº 4, o presidente da câmara dispõe do prazo de um ano para decidir.

E, não se fazendo no art. 15º qualquer remissão para o art. 8º, o regime de deferimento tácito nele previsto não é aplicável aos casos de infra-estruturas instaladas antes da entrada em vigor do diploma (cfr. art. 9º do Código Civil). Ou seja, tratando-se de legalização de infra-estruturas já instaladas não há lugar a deferimento tácito do pedido, não sendo aqui aplicável o disposto no art. 108º do CPA(15), por se tratar de uma construção ilegal, já que, estando sujeita a autorização municipal, esta não havia sido pedida.

Não há, portanto, deferimento tácito, como decidiu a 1ª instância.

4

VÍCIO DE VIOLAÇÃO DA AUDIENCIA PRÉVIA

Não sendo aqui aplicável o RJUE, esta invocada ilegalidade é por referência ao DL 11/2003 e/ou ao CPA. Mas, como o tribunal a quo não se pronunciou licitamente sobre a mesma, ela não pode ser objecto deste recurso.

III. DECISÃO DO RECURSO

Pelo que acordam os juizes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar procedente o recurso, revogar o acórdão recorrido na parte em que considerou o acto impugnado como inimpugnável e determinar que o tribunal a quo convide a autora a, em certo prazo, ampliar o objecto do processo à impugnação do acto decisório de 2005, e a formular nova pretensão cumulável, prosseguindo os autos se nada mais a isso obstar.

Custas a cargo do recorrente nos termos dos arts. 7º-2 RCP e 446º e 447º-D CPC.

Lisboa, 29-9-2011

PAULO PEREIRA GOUVEIA

CRISTINA DOS SANTOS

ANTÓNIO VASCONCELOS



1-


2- Portanto: após Jan/2007.

3- Parece que aqui o tribunal a quo se quer referir a “impugnação nestes autos”.

4- Artigo 9.º
Audiência prévia
1 - Quando existir projecto de decisão no sentido do indeferimento do pedido de autorização, deve ser realizada uma audiência prévia que tenha por objectivo a criação das condições de minimização do impacte visual e ambiental que possam levar ao deferimento do pedido.
2 - Quando o sentido provável da decisão for o indeferimento do pedido de autorização de instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações em edificações existentes, o presidente da câmara municipal, em sede de audiência prévia, pode definir uma localização alternativa, a encontrar num raio de 75 m.
3 - Caso não seja possível encontrar nova localização nos termos do n.º 2, o presidente da câmara municipal defere o pedido, excepto nos casos em que a isso obste a resposta negativa aos pedidos de pareceres vinculativos, autorizações ou aprovações, emitidos pelas entidades competentes.

5- Artigo 70.º
Alteração da instância
1 - Quando a pretensão do interessado seja indeferida pela Administração na pendência do processo, pode o autor alegar novos fundamentos e oferecer diferentes meios de prova em favor da sua pretensão.
2 - A faculdade conferida pelo número anterior é extensiva aos casos em que o indeferimento seja anterior, mas só tenha sido notificado ao autor após a propositura da acção.
3 -Quando, na pendência do processo, seja proferido um acto administrativo que não satisfaça integralmente a pretensão do interessado, pode ser cumulado o pedido de anulação ou declaração de nulidade ou inexistência deste acto, devendo o novo articulado ser apresentado no prazo de 30 dias.
4 - O prazo referido no número anterior é contado desde o momento da notificação do novo acto, considerando-se como tal, quando não tenha havido notificação, o conhecimento, obtido no processo, do autor, da data, do sentido e dos fundamentos da decisão.

6- Artigo 151.o
Legalidade da execução
1— Salvo em estado de necessidade, os órgãos da Administração Pública não podem praticar nenhum acto ou operação material de que resulte limitação de direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares, sem terem praticado previamente o acto administrativo que legitime tal actuação.
2— Na execução dos actos administrativos devem, na medida do possível, ser utilizados os meios que, garantindo a realização integral dos seus objectivos, envolvam menor prejuízo para os direitos e interesses dos particulares.
3— Os interessados podem impugnar administrativa e contenciosamente os actos ou operações de execução que excedam os limites do acto exequendo.
4— São também susceptíveis de impugnação contenciosa os actos e operações de execução arguidos de ilegalidade, desde que esta não seja consequência da ilegalidade do acto exequendo

7- 4 - Se contra um acto de indeferimento for deduzido um pedido de estrita anulação, o tribunal convida o autor a substituir a petição, para o efeito de formular o adequado pedido de condenação à prática do acto devido, e, se a petição for substituída, a entidade demandada e os contra-interessados são de novo citados para contestar.
Cf. MÁRIO AROSO…, Comentário…, 2010, p. 353-354.

8- Artigo 9.º
Audiência prévia
1 - Quando existir projecto de decisão no sentido do indeferimento do pedido de autorização, deve ser realizada uma audiência prévia que tenha por objectivo a criação das condições de minimização do impacte visual e ambiental que possam levar ao deferimento do pedido.
2 - Quando o sentido provável da decisão for o indeferimento do pedido de autorização de instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações em edificações existentes, o presidente da câmara municipal, em sede de audiência prévia, pode definir uma localização alternativa, a encontrar num raio de 75 m.
3 - Caso não seja possível encontrar nova localização nos termos do n.º 2, o presidente da câmara municipal defere o pedido, excepto nos casos em que a isso obste a resposta negativa aos pedidos de pareceres vinculativos, autorizações ou aprovações, emitidos pelas entidades competentes.
Artigo 15º
Norma transitória
1- O presente diploma aplica-se às infra-estruturas de suporte de radiocomunicações já instaladas sem que tenha havido deliberação ou decisão municipal favorável, devendo os operadores requerer a respectiva autorização municipal no prazo de 180 dias a partir da data da sua entrada em vigor.
2- Para efeitos do disposto no número anterior, devem os operadores apresentar ao presidente da câmara municipal um processo único do qual conste uma lista com a identificação e localização de todas as infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações instaladas no respectivo município, acompanhada dos documentos referidos nas alíneas a), b), e) e f) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º do presente diploma.
3- O presidente da câmara municipal poderá solicitar complementarmente outros documentos referidos no artigo 5.º do presente diploma.
4- O presidente da câmara municipal profere decisão final no prazo de um ano a contar da entrega do processo, de acordo com as normas do presente diploma que se mostrem aplicáveis.
5- Nos casos em que exista projecto de decisão no sentido de indeferir a pretensão, aplica-se a todo o tipo de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações o regime previsto no artigo 9.º.
6- O indeferimento referido no número anterior só pode ser sustentado em:
a) Pareceres vinculativos, autorizações ou aprovações emitidos pelas entidades competentes no sentido desse indeferimento;
b) Violação de restrições relativas à instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, estabelecidas em plano municipal de ordenamento do território, plano especial de ordenamento do território, medidas preventivas, área de desenvolvimento urbano prioritário, área de construção prioritária, servidão administrativa, restrição de utilidade pública ou quaisquer outras normas legais ou regulamentares aplicáveis;
c) Agressões intoleráveis e desproporcionadas ao ambiente, ao património cultural e à paisagem urbana ou rural;
d) Violação dos níveis de referência definidos ao abrigo do n.º 1 do artigo 11.º.

9- Artigo 63.º
Modificação objectiva de instância
1 - Quando por não ter sido decretada, a título cautelar, a suspensão do procedimento em que se insere o acto impugnado, este tenha seguimento na pendência do processo, pode o objecto ser ampliado à impugnação de novos actos que venham a ser praticados no âmbito desse procedimento, bem como à formulação de novas pretensões que com aquela possam ser cumuladas.
2 - O disposto no número anterior é extensivo ao caso de o acto impugnado ser relativo à formação de um contrato e este vir a ser celebrado na pendência do processo, como também às situações em que sobrevenham actos administrativos cuja validade dependa da existência ou validade do acto impugnado, ou cujos efeitos se oponham à utilidade pretendida no processo.
3 - Para o efeito do disposto nos números anteriores, deve a Administração trazer ao processo a informação da existência dos eventuais actos conexos com o acto impugnado que venham a ser praticados na pendência do mesmo.

10- Artigo 45.º
Modificação objectiva da instância
1 -Quando, em processo dirigido contra a Administração, se verifique que à satisfação dos interesses do autor obsta a existência de uma situação de impossibilidade absoluta ou que o cumprimento, por parte da Administração, dos deveres a que seria condenada originaria um excepcional prejuízo para o interesse público, o tribunal julga improcedente o pedido em causa e convida as partes a acordarem, no prazo de 20 dias, no montante da indemnização devida.
2 - O prazo mencionado no número anterior pode ser prorrogado até 60 dias, caso seja previsível que o acordo venha a concretizar-se em momento próximo.
3 - Na falta de acordo, o autor pode requerer a fixação judicial da indemnização devida, devendo o tribunal, nesse caso, ordenar as diligências instrutórias que considere necessárias e determinar a abertura de vista simultânea aos juízes-adjuntos quando se trate de tribunal colegial.
4 - Cumpridos os trâmites previstos no número anterior, o tribunal fixa o montante da indemnização devida.

11- Cf. MÁRIO AROSO…, Manual…, 2010, p. 386 ss e 393 ss.

12- OLIV. ASCENSÃO, O Direito…, 3ª ed., p. 347.

13- CABRAL DE MONCADA, Lições de D. Civil, I, 2ª ed., p. 189; MANUEL DE ANDRADE, Noções Elem…, 1979, p. 35; ANT. VARELA, in RLJ 115º, p. 348

14- ARTIGO 10º
(Integração das lacunas da lei)
1. Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma aplicável aos casos análogos.
2. Há analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei.
3. Na falta de caso análogo, a situação é resolvida segundo a norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema.

15- Artigo 108.o
Deferimento tácito
1— Quando a prática de um acto administrativo ou o exercício de um direito por um particular dependam de aprovação ou autorização de um órgão administrativo, consideram-se estas concedidas, salvo disposição em contrário, se a decisão não for proferida no prazo estabelecido por lei.
2— Quando a lei não fixar prazo especial, o prazo de produção do deferimento tácito será de 90 dias a contar da formulação do pedido ou da apresentação do processo para esse efeito.
3— Para os efeitos do disposto neste artigo, consideram-se dependentes de aprovação ou autorização de órgão administrativo, para além daqueles relativamente aos quais leis especiais prevejam o deferimento tácito, os casos de:
a) Licenciamento de obras particulares;
b) Alvarás de loteamento;
c) Autorizações de trabalho concedidas a estrangeiros;
d) Autorizações de investimento estrangeiro;
e) Autorização para laboração contínua;
f) Autorização de trabalho por turnos;
g) Acumulação de funções públicas e privadas.
4— Para o cômputo dos prazos previstos nos n.ºs 1 e2 considera-se que os mesmos se suspendem sempre queo procedimento estiver parado por motivo imputável ao particular.