Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 07413/11 |
Secção: | CA - 2.º JUÍZO |
Data do Acordão: | 09/29/2011 |
Relator: | PAULO PEREIRA GOUVEIA |
Descritores: | IMPUGNABILIDADE - ACTOS JURÍDICOS DE EXECUÇÃO – ACTO EXEQUENDO DESCONHECIDO – ANALOGIA - DL Nº 11/2003 |
Sumário: | 1. O regime da execução coactiva de um acto administrativo exige o seguinte: a) existência de um acto administrativo exequendo, que defina rigorosamente a obrigação do destinatário, pois ele contém as balizas da execução, e que seja juridicamente eficaz (arts. 151º-1-3 CPA); b) a execução deve ser feita pelas formas e nos termos previstos na lei (arts. 149º-2 e 155º ss CPA); c) a decisão de executar deve ser notificada previamente ao destinatário (art. 152º-1 CPA); desta notificação devem constar o texto do acto exequendo, o prazo do cumprimento e o aviso coercivo. 2. Os actos jurídicos de execução são actos parcialmente confirmativos do acto exequendo. Pelo que podem ser autonomamente impugnados em certas condições ou situações, designadamente as previstas no art. 151º-3-4 CPA. 3. O CPTA não prevê a situação em que o autor impugna um acto jurídico de execução sem saber licitamente da existência do acto exequendo. Mas, se conhecido o acto exequendo durante a lide, o acto impugnado não se torna imediatamente inimpugnável, até porque podem ter sido alegadas ilegalidades próprias do acto de execução. 4. Nessa situação, integrando a lacuna do CPTA, o autor deve poder beneficiar de uma faculdade análoga à prevista no art. 63º-1-3 CPTA, nos seguintes termos e sob a égide do princípio pro actione: “o objecto do processo pode ser ampliado à impugnação de outros actos, bem como à formulação de novas pretensões cumuláveis, quando o autor tome conhecimento de actos administrativos de cuja validade dependa a existência ou a validade do acto já impugnado. Se este conhecimento ocorrer nos autos, o tribunal convida o autor a exercer essa faculdade”. 5. O que resulta da comparação dos regimes estabelecidos nos arts. 8º (referente às novas instalações previstas nos arts. 5º e 6º) e 15º do DL nº 11/2003, é que só no primeiro há lugar ao deferimento tácito (desde que verificados os condicionalismos nele previstos). |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | S.Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:
I. RELATÓRIO A...- A..., com os sinais dos autos, intentou no T.A.C. de Lisboa uma A.A.Especial contra MUNICIPIO DE LOURES, pedindo em Janeiro/2007 ao tribunal a anulação do acto administrativo do Vereador da Câmara Municipal de Loures, proferido no uso de delegação de competências, que determinou a remoção da infra-estrutura de suporte de telecomunicações que a Autora instalou na Quinta da Caldeira, Montemor, Loures.(1) Por acórdão daquele tribunal, foi a referida acção julgada improcedente, por considerar a decisão administrativa em causa como “irrecorrível”/inimpugnável. Inconformada, vem A...- A... recorrer para este T.C.A.-Sul, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: Não foram apresentadas contra-alegações. * O Exmº representante do Ministério Público junto deste Tribunal foi notificado para, em defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, de interesses públicos especialmente relevantes ou de algum dos valores ou bens referidos no n.º 2 do artigo 9.º do CPTA, se pronunciar sobre o mérito do recurso (art. 146º nº 1 do CPTA). * Após os vistos, importa agora, em conferência, apreciar e decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO II.1. FACTOS PROVADOS A factualidade declarada provada pelo tribunal de 1ª instância foi a seguinte: II.2. APRECIAÇÃO DO RECURSO O âmbito do recurso jurisdicional, cujo objecto é a decisão recorrida, é delimitado pela Recorrente nas conclusões (sintéticas, suficientes, claras e simples, com indicação das normas jurídicas violadas) das suas alegações (sem prejuízo do conhecimento das questões de conhecimento oficioso), apenas podendo incidir sobre questões que tenham sido ou devessem ser anteriormente apreciadas e não podendo confrontar o tribunal ad quem com questões (coisa diversa de considerações, argumentos ou juízos de valor) novas ou cobertas por caso julgado – v. arts. 684º-3-4, 716º e 668º-1-d do CPC. * O acórdão recorrido entendeu: 1 OMISSÃO DE PRONÚNCIA (art. 668º-1-d CPC) Não há omissão de pronúncia pela simples razão de que o tribunal a quo considerou, bem ou mal, o acto de 13-12-2006 como um acto inimpugnável, por ser de mera execução da decisão de 2-6-05 (desconhecida da A. até este processo), e logo, segundo o tribunal a quo, não susceptível de ser apreciado pelo tribunal. Nesta base o tribunal a quo não tinha de apreciar mais nada. Os restantes vícios imputados à decisão recorrida pressupõem a revogação da mesma. É, pois, necessário analisar a inimpugnabilidade detectada no acto administrativo impugnado. 2 INIMPUGNABILIDADE (art. 51º CPTA) O DL 11/2003 regula a autorização municipal inerente à instalação e funcionamento das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, e respectivos acessórios, definidas no Decreto-Lei n.º 151-A/2000, de 20 de Julho, e adopta mecanismos para fixação dos níveis de referência relativos à exposição da população a campos electromagnéticos (0 Hz - 300 GHz). A instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações e respectivos acessórios está sujeita a autorização municipal (art. 4º). Decorrido o prazo referido no n.º 8 do artigo 6.º do presente diploma sem que o presidente da câmara se pronuncie, o requerente pode iniciar a colocação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, mediante a entrega prévia de requerimento em que solicite a emissão da guia de pagamento das taxas devidas (art. 8º). O art. 15º do DL 11/2003 dispõe: Norma transitória 1- O presente diploma aplica-se às infra-estruturas de suporte de radiocomunicações já instaladas sem que tenha havido deliberação ou decisão municipal favorável, devendo os operadores requerer a respectiva autorização municipal no prazo de 180 dias a partir da data da sua entrada em vigor. 2- Para efeitos do disposto no número anterior, devem os operadores apresentar ao presidente da câmara municipal um processo único do qual conste uma lista com a identificação e localização de todas as infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações instaladas no respectivo município, acompanhada dos documentos referidos nas alíneas a), b), e) e f) do n.º 1 e na alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º do presente diploma. 3- O presidente da câmara municipal poderá solicitar complementarmente outros documentos referidos no artigo 5.º do presente diploma. 4- O presidente da câmara municipal profere decisão final no prazo de um ano a contar da entrega do processo, de acordo com as normas do presente diploma que se mostrem aplicáveis. 5- Nos casos em que exista projecto de decisão no sentido de indeferir a pretensão, aplica-se a todo o tipo de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações o regime previsto no artigo 9.º.(4) 6- O indeferimento referido no número anterior só pode ser sustentado em: a) Pareceres vinculativos, autorizações ou aprovações emitidos pelas entidades competentes no sentido desse indeferimento; b) Violação de restrições relativas à instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, estabelecidas em plano municipal de ordenamento do território, plano especial de ordenamento do território, medidas preventivas, área de desenvolvimento urbano prioritário, área de construção prioritária, servidão administrativa, restrição de utilidade pública ou quaisquer outras normas legais ou regulamentares aplicáveis; c) Agressões intoleráveis e desproporcionadas ao ambiente, ao património cultural e à paisagem urbana ou rural; d) Violação dos níveis de referência definidos ao abrigo do n.º 1 do artigo 11.º. Algumas das questões colocadas por estas normas já foram objecto de jurisprudência superior, nomeadamente do STA e deste TCA-Sul: - Ac. STA de 6-6-2007, pr. nº 734/06: I - O DL nº 11/2003, de 18 de Janeiro, veio regular a autorização municipal inerente à instalação e funcionamento das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, e respectivos acessórios, ou seja, o conjunto de elementos que permitem a instalação e funcionamento dos equipamentos de radiocomunicações [nºs 1 e 2, al. a)]. II - Este novo diploma contém uma norma transitória (art. 15º), que prevê a sua aplicação às infra-estruturas já instaladas sem que tenha havido deliberação ou decisão municipal favorável, e que estabelece um procedimento específico de autorização, nos termos do qual devem os operadores requerer a respectiva autorização municipal no prazo de 180 dias a partir da data da sua entrada em vigor, estabelecendo-se nesse preceito os respectivos trâmites do procedimento, designadamente para as situações em que há um projecto de decisão no sentido do indeferimento da pretensão [nºs 2 a 6]. III - Ainda que o procedimento administrativo para remoção de uma antena de radiocomunicações se tivesse iniciado anteriormente à vigência do DL nº 11/2003, a decisão final proferida já na vigência deste diploma, desde que o operador tenha apresentado o requerimento de autorização nos termos e prazo previstos no nº 1 daquele art. 15º, não pode fundamentar-se nas disposições do DL nº 555/99. - Ac. STA de 21-1-10, pr. nº 719/09: I - O art. 15º do Regulamento Municipal da Edificação e Urbanização do Município de Odivelas (RMEU), publicado no D.R. II Série, n° 111, Apêndice n.º 73, de 14 de Maio de 2003, emitido a coberto do disposto no art. 3º do DL 555/99, com a redacção do DL 177/2001, de 4.6, a lei habilitante, justamente porque se refere a licenciamento de obras, é inaplicável a um pedido de autorização municipal para as infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações já instaladas no Concelho de Odivelas, requerimento formulado nos termos do art. 15º do DL 11/2003, de 18.1. II - O art. 15º deste diploma legal prevê um procedimento de autorização para as infra-estruturas de suporte de radiocomunicações já instaladas mas já não para as próprias estações de radiocomunicações cujo licenciamento, e não autorização, está a cargo de outra entidade (art. 5º do DL 151-A/2000, de 20.7 e art. 5º do DL 11/2003). III - Os interesses e valores previstos nesse preceito, que aos Municípios cabe defender, estão relacionados com a localização das estações e já não com as suas eventuais emissões nocivas cuja avaliação cabe a terceiros. - Ac. TCAS de 24.6.10, pr. nº 2474/07: I – Pelo menos desde a entrada em vigor do D.L. nº 11/2003, de 18/1, o R.J.U.E. deixou de ser aplicável à instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações por esta passar a estar sujeita a um regime especial de autorização municipal. II - … III – Enquanto que o art. 15º do D.L. nº 11/2003 se reporta a um procedimento de autorização de instalação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações o art. 15º do referido RMEU trata do licenciamento de obras não sendo aplicável àquela autorização. IV – Enferma de vício de violação de lei, por erro de interpretação e aplicação do mencionado art. 15º do RMEU, o despacho que considera aplicável este preceito a um pedido de autorização formulado ao abrigo do art. 15º do D.L. nº 11/2003. - Ac. TCAS de 19-1-11, pr. nº 3489/08: I – O interessado na autorização municipal para a instalação de infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações tem de instruir o seu pedido com os documentos referidos no artigo 5º do DL nº 11/2003, de 18/1, entre os quais consta, nomeadamente, a “cópia do documento de que conste a autorização expressa dos proprietários dos terrenos para a instalação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações e respectivos acessórios” [cfr. citado artigo 5º, nº 1, alínea f) do DL nº 11/2003, de 18/1]. II – De acordo com o disposto no artigo 6º do citado diploma, “o presidente da câmara municipal profere despacho de rejeição liminar do pedido no prazo de oito dias a contar da respectiva apresentação, sempre que o requerimento não seja instruído com os elementos referidos no artigo anterior…” [nº 1], cabendo-lhe também “…promover, no prazo de 10 dias a contar da data de apresentação do pedido, a consulta às entidades que, nos termos da lei, devem emitir parecer, autorização ou aprovação relativamente à instalação…” [nº 2]. III – O presidente da câmara municipal decide sobre o pedido no prazo de 30 dias a contar da data de recepção do pedido…” [cfr. nº 8 do artigo 6º do DL nº 11/2003]. IV – E, se não for proferida decisão no aludido prazo, forma-se deferimento tácito, de acordo com o disposto no artigo 8º do citado diploma, que dispõe que no “…prazo referido no nº 8 do artigo 6º do presente diploma sem que o presidente da câmara se pronuncie, o requerente pode iniciar a colocação das infra-estruturas de suporte das estações de radiocomunicações, mediante a entrega prévia de requerimento em que solicite a emissão de pagamento das taxas devidas...”. V – Se, na fase de apreciação liminar do pedido, os serviços da CML detectaram várias deficiências, nomeadamente que a morada constante do contrato de arrendamento não correspondia àquela que constava do requerimento que originou o processo e que não tinha sido apresentada a autorização expressa do proprietário do local, que não foram corrigidos pelo interessado na autorização municipal, tal facto obsta ao prosseguimento do pedido formulado. VI – Se o presidente da câmara indeferir a pretensão formulada depois de se ter formado deferimento tácito, tal acto constitui a revogação de um anterior acto constitutivo de direitos, só podendo, portanto, ocorrer com fundamento em ilegalidade e dentro do prazo previsto na lei para o efeito, à semelhança do que sucede com qualquer acto expresso, nos termos do artigo 141º do CPA. - Ac. TCAS de 10-2-11, pr. nº 2595/07: 1. A instalação de infra-estruturas de suporte das instalações de radiocomunicações e respectivos acessórios está excluída da regulamentação específica do RJUE (DL 555/99 de 16.12) por sujeita a um procedimento especial de autorização municipal regulado nos termos do DL 11/03 de 18.01. 2. A presunção legal de concordância atribuída ao silêncio do órgão competente para emitir o parecer, cfr. artº 6º nº 7 DL 11/03, não tem nem efeitos conformativos do sentido da decisão administrativa final do procedimento, nem efeitos preclusivos sobre o exercício das competências dispositivas próprias do órgão decisor por inutilidade superveniente, o que significa, ainda, a natureza não vinculante do mesmo. 3. Na previsão conjugada dos art°s. 6º nº 8 e 8º DL 11/03, a formação (estatuição) do acto silente de autorização de instalação de infra-estruturas de suporte de radiocomunicações tem como pressupostos o esgotamento do prazo legal (artº 6º nº 8) sem emissão de decisão expressa ou implícita sobre a pretensão deduzida perante a Administração (artº 8º, 1ª parte). 4. A lei não estabelece nenhum sentido valorativo ao silêncio atingido o termo ad quem do prazo de um ano consignado no artº 15º nº 4 do DL 11/03, pelo que a referência expressa às “normas do presente diploma que se mostrem aplicáveis” no artº 15º nº 4, in fine, não autoriza o intérprete a aplicar por interpretação extensiva a norma do artº 8º, pois cabe exclusivamente à lei atribuir ao silêncio administrativo no decurso de um prazo, o sentido jurídico de exteriorização declarativa e unilateral de efeitos jurídicos positivos. 5. O disposto no artº 15 nº 6 als. a) a d) DL 11/03 significa que a lei vincula a Administração municipal a indeferir pelos fundamentos constantes da lei e impede-a de indeferir as pretensões de ocupação do solo por infra-estruturas de suporte de estações de radiocomunicações com fundamento em motivos diversos dos constantes das citadas alíneas. 6. Todos os instrumentos de planeamento vinculam as entidades públicas, mas apenas os dotados de eficácia pluri-subjectiva, isto é, os planos municipais e os planos especiais, vinculam os particulares de forma directa e imediata – cfr. art°s. 11 nº 2 da Lei 48/98 (Lei de Bases) e 3º nº 2 do DL 380/99 de 22.09 (RJGIT). 7. Aos planos especiais, como é o caso do Plano de Ordenamento do Parque Natural de Sintra Cascais, compete a identificação dos usos compatíveis com vista à salvaguarda dos recursos e dos valores naturais das áreas sobre que incidem – cfr. artº 42º nº 3 DL 380/99 de 22.09 (RJIGT). É impugnável o acto administrativo (= acto jurídico unilateral praticado no exercício do poder administrativo por um órgão da Administração ou por outra entidade pública ou privada para tal habilitada por lei, e que traduz a decisão de um caso considerado, visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta) com eficácia jurídica externa (= vinculante sobre outras pessoas ou sobre coisas fora do património jurídico da entidade decisora) imediata ou potencialmente lesiva, incluindo alguns actos entre entidades públicas ou praticados em relações inter-orgânicas – arts. 120º CPA e 51º CPTA. O Réu não proferiu qualquer decisão definitiva no âmbito do procedimento administrativo dos autos, para além da ordem de demolição que se impugna na presente acção (art. 7º da p.i.). Como já vimos, isto não é verdade. Verdade é que essa decisão definitiva era desconhecida da A. quando iniciou a acção, ineficaz. Notemos, desde já, que, face ao conhecido da A., não era possível a AAE prevista nos arts. 66º ss CPTA, porque o único acto administrativo que ela conhecia e que nem terá sido de resposta expressa ao requerimento da A., era um acto positivo e não enquadrável nas hipóteses do art. 67º-1 CPTA, o acto de 2006. Pelo que fez bem em intentar uma AAE de impugnação anulatória contra esse acto de 2006, atacando-o por vícios próprios. O art. 70º-3-4 do CPTA(5), invocado pelo tribunal a quo, que dá uma faculdade e não impõe um dever, só parece ser aplicável na AAE de condenação à prática de acto devido, como aliás resulta da sua letra e inserção sistemática (MÁRIO AROSO…, Comentário…, 3ª ed., 2010, anot. 1 ao art. 70º; MÁRIO/RODRIGO E. DE OLIVEIRA, CPTA/ETAF Anot., notas ao art. 70º) e porque se trata de o acto ter sido proferido na pendência da acção. Ora, aqui o que se passa é que o acto que está na origem do acto impugnado tem data anterior à acção, mas só foi conhecido da A. durante a acção. Quanto ao acto impugnado, acto de 13-12-06, que a A. pensou licitamente ser o 1º neste assunto contra si, o tribunal considerou ser um acto de mera execução (da não notificada decisão de 2005). São actos de mera execução os praticados em consequência necessária da definição de situações jurídicas constantes de actos administrativos anteriores e que não contenham outros efeitos jurídicos que não sejam a concretização ou desenvolvimento das estatuições jurídicas contidas neles. Os actos de execução são inimpugnáveis, tanto administrativa, como contenciosamente, a não ser nos casos em que excedam os limites do acto exequendo (art. 151º, nº3, do CPA(6)), ou quando a sua ilegalidade seja intrínseca e autónoma e não mera consequência da ilegalidade do acto que executa (art. 151º, nº4, do cit. dip.); ou seja, em regra, os actos de execução só são passíveis de impugnação contenciosa autónoma por vícios próprios ou na medida em que sejam inovatórios, por alterarem, excederem ou modificarem a situação definida pelo acto executado (cf. D. FREITAS DO AMARAL et al., CPA Anot., 2007, p. 268; MÁRIO AROSO…, Manual…, 2010, p. 283-284). Em suma, os actos de execução são passíveis de impugnação nos seguintes casos: a) execução de actos administrativos contidos em diploma administrativo e regulamentar, conforme previsto no nº 2 do artigo 52º do CPTA; b) caso em que o acto administrativo titulador não individualize os seus destinatários [artigo 52º, nº 3, do CPTA]; c) execução que exceda os limites do título executivo [artigo 151º, nº 3, do CPA]; e, finalmente, d) se se apontar ao acto de execução uma ilegalidade específica, que não seja consequência da ilegalidade do acto exequendo [artigo 151º, nº 4, do CPA]. Assim, não temos dúvida de que o acto impugnado é, na verdade, um acto de mera execução. Mas eis que, durante a AAE, a A. descobre que, afinal, havia prévio acto de indeferimento da sua pretensão, “tornando” o acto impugnado em mero acto de execução do acto de indeferimento, impugnável por vícios próprios além dos casos particulares referidos no art. 52º cit. Ora, estamos assim, nesta AAE impugnatória, num quadro apenas algo semelhante ao que refere o cit. art. 70º CPTA na AAE de condenação à prática de acto legalmente devido (ou ao referido no art. 63º-2 CPTA). E, não sendo o art. 70º CPTA directamente aplicável a este tipo de AAE, impugnatória, não se poderia exigir, como fez o tribunal a quo, que a A., de motu proprio, o utilizasse. Sublinhe-se que o tribunal a quo não considerou o acto de 2006, o impugnado, como de indeferimento, pois não aplicou o nº 4 do art. 51º CPTA(7). FREITAS DO AMARAL (Curso…, II, 2011, p. 523 ss) explica assim o regime da execução coactiva de um acto administrativo: a) existência de um acto administrativo exequendo, que defina rigorosamente a obrigação do destinatário, pois ele contém as balizas da execução, e que seja juridicamente eficaz (arts. 151º-1-3 CPA); b) a execução deve ser feita pelas formas e nos termos previstos na lei (arts. 149º-2 e 155º ss CPA); c) a decisão de executar deve ser notificada previamente ao destinatário (art. 152º-1 CPA); desta notificação devem constar o texto do acto exequendo, o prazo do cumprimento e o aviso coercivo (assim FREITAS DO AMARAL, Curso…, cit., p. 527; CARLA AMADO GOMES, Contributo…, p. 131, e Era uma vez…, in CJA-15, p. 11). Ora, no caso presente, havia, ao início desta AAE, um acto exequendo de 2005 mediatamente constitutivo de deveres para com a A. mas não notificado, além de outros aspectos não invocados na p.i. referentes ao acto jurídico de execução aqui impugnado. Mas o que mais interessa é que o tribunal a quo considerou este acto jurídico de execução como inimpugnável, porque: durante este processo o acto exequendo foi pela 1ª vez conhecido pela A. e esta nada disse ou fez a propósito, formando-se caso resolvido, pois que a A. aceitou o acto exequendo. Portanto, o acto aqui impugnado, que implicou directamente para a A. o dever de retirada da antena, “tornou-se” inimpugnável (v. art. 51º-1 CPTA) durante este processo, porque o acto exequendo foi entretanto conhecido da A. (v. arts. 127º e 132º CPTA) e porque esta nada fez nestes autos (em que prazo?) contra o mesmo (art. 56º CPTA). Será assim? Não. Os actos jurídicos de execução são actos parcialmente confirmativos do acto exequendo (assim MÁRIO AROSO…, Comentário…, 2010, p. 363). Pelo que, tal como já referimos, podem ser autonomamente impugnados em certas condições ou situações (art. 151º-3-4 CPA). Não parece ter sentido aferir a impugnabilidade de um acto jurídico de execução apenas com base em factos ocorridos só após o início da lide. Na p.i. invocam-se os seguintes vícios: Ora, os fundamentos cit. sob os nº 2 a 5 são próprios deste acto de 2006, mesmo visto como acto jurídico de execução do acto de 2005. O nº 2 resolve-se com base no DL 11/2003 e no CPA. O nº 3 fica esclarecido no processo. O nº 4 foi decidido e recorrido. O nº 5 pode ser esclarecido nos autos. Há assim impugnabilidade (art. 151º-4 CPA e art. 51º-1 CPTA). O fundamento sob o nº 1 é condicionado ao facto de se considerar este acto como de indeferimento do pedido de autorização, o que, como vimos, não é o caso. Na verdade, a presente situação é a situação inversa da prevista no art. 70º-3 cit. ou da prevista no art. 63º-2-2º inciso do CPTA(9), ou seja, nesta situação o que faria sentido seria O art. 70º-3-4 utilizado no ac. recorrido (com referência ao seu nº 4) e o art. 63º-2-2º inciso permitem, sim, a cumulação inversa daquela que faria sentido aqui. O art. 45º CPTA(10) não prevê esta situação.(11) Há, portanto, uma lacuna (= incompleição do sistema normativo, que contraria o plano deste) de previsão(12) no CPTA. As lacunas integram-se ou resolvem-se por analogia (= semelhança entre o caso omisso na lei e outro contemplado e regulado no sistema legislativo, estendendo-se as disposições duma lei sobre um certo caso a um outro não contemplado nem na sua letra nem no seu espírito, com base na semelhança referida(13); v. art. 10º CC(14)). A solução deve ser uma faculdade do tipo previsto no CPTA para a AAE destes autos, em vez da do art. 70º CPTA, ou seja, a do art. 63º-1-2 CPTA como segue e sob a égide dos princípios da economia de meios processuais e pro actione (art. 7º CPTA): O objecto do processo pode ser ampliado à impugnação de outros actos, bem como à formulação de novas pretensões cumuláveis, quando o autor tome conhecimento de actos administrativos de cuja validade dependa a existência ou a validade do acto impugnado. Se este conhecimento ocorrer nos autos, o tribunal convida o autor a exercer essa faculdade. 3 DEFERIMENTO TÁCITO O que resulta da comparação dos regimes estabelecidos nos arts. 8º (referente às novas instalações previstas nos arts. 5º e 6º) e 15º do DL nº 11/2003, é que só no primeiro há lugar ao deferimento tácito (desde que verificados os condicionalismos nele previstos). Tratando-se do regime do art. 15º do DL 11/2003, nomeadamente, nos termos do seu nº 4, o presidente da câmara dispõe do prazo de um ano para decidir. E, não se fazendo no art. 15º qualquer remissão para o art. 8º, o regime de deferimento tácito nele previsto não é aplicável aos casos de infra-estruturas instaladas antes da entrada em vigor do diploma (cfr. art. 9º do Código Civil). Ou seja, tratando-se de legalização de infra-estruturas já instaladas não há lugar a deferimento tácito do pedido, não sendo aqui aplicável o disposto no art. 108º do CPA(15), por se tratar de uma construção ilegal, já que, estando sujeita a autorização municipal, esta não havia sido pedida. Não há, portanto, deferimento tácito, como decidiu a 1ª instância. 4 VÍCIO DE VIOLAÇÃO DA AUDIENCIA PRÉVIA Não sendo aqui aplicável o RJUE, esta invocada ilegalidade é por referência ao DL 11/2003 e/ou ao CPA. Mas, como o tribunal a quo não se pronunciou licitamente sobre a mesma, ela não pode ser objecto deste recurso. III. DECISÃO DO RECURSO Pelo que acordam os juizes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar procedente o recurso, revogar o acórdão recorrido na parte em que considerou o acto impugnado como inimpugnável e determinar que o tribunal a quo convide a autora a, em certo prazo, ampliar o objecto do processo à impugnação do acto decisório de 2005, e a formular nova pretensão cumulável, prosseguindo os autos se nada mais a isso obstar. Custas a cargo do recorrente nos termos dos arts. 7º-2 RCP e 446º e 447º-D CPC. Lisboa, 29-9-2011
PAULO PEREIRA GOUVEIA CRISTINA DOS SANTOS ANTÓNIO VASCONCELOS |