Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:244/09.0BEFUN
Secção:CA
Data do Acordão:06/23/2022
Relator:DORA LUCAS NETO
Descritores:CONCURSO DE PESSOAL
AUDIÊNCIA PRÉVIA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
(NÃO) APROVEITAMENTO DO ATO ADMINISTRATIVO
Sumário: I - O princípio do aproveitamento do ato administrativo tem de ser interpretado em conformidade com os princípios que regem o exercício da atividade jurisprudencial, maxime, o princípio da separação dos poderes, do qual deflui, indubitavelmente, que aos Tribunais está vedada a possibilidade de decidir em substituição da Administração
II – Por essa razão, não se pode aplicar no caso em apreço o invocado princípio, em qualquer uma das suas três vertentes, em virtude de, e concluindo, (i) não estarmos perante um ato praticado ao abrigo de poderes vinculados e nem a discricionariedade administrativa ter sido reduzida a zero no procedimento em apreço; (ii) não se ter comprovado, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo, (iii) assim como não resultou dos autos, antes pelo contrário, que o fim visado pela exigência de fundamentação do ato tenha sido alcançado por outra via.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

V…, contrainteressado na ação, e a Secretaria Regional da Saúde/Região Autónoma da Madeira, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, de 13.07.2015, que julgou procedente a ação intentada contra ambos por M…, anulando o despacho de 18.06.2009 do então Secretário Regional dos Assuntos Sociais, proferido em sede de recurso hierárquico, que havia homologado a lista de classificação final do Concurso de Provimento Interno Geral para Chefe de Serviço de Pneumologia da Carreira Médica Hospitalar do quadro do Centro Hospitalar do Funchal, por omissão de uma formalidade essencial, consubstanciada na falta de audiência prévia, e vício de falta de fundamentação.

O primeiro Recorrente, nas alegações de recurso que apresentou, concluiu da seguinte forma – cfr. fls. 564 e ss. e fls. 698 e ss., ref. SITAF:

«A. A audiência prévia, no caso “sub judicio” é dispensável nos termos da alínea a) do n.° 2 do artigo 103.° do CPA, porquanto a Recorrida já se pronunciou no procedimento sobre as questões que importam à decisão e sobre as provas produzidas, uma vez que tanto o Recorrente como a Recorrida, foram chamados para defender o seu currículo, tendo assim oportunidade de se pronunciarem sobre todas as questões que foram relevantes para a deliberação final, o que consubstancia a realização da audiência prévia. A sentença recorrida violou, pois, o disposto no art 103.°, n.° 2, a) do CPA.

B. Mesmo que assim não se entendesse, a falta de audiência prévia, no presente caso, não passaria de uma formalidade não essencial, por a mesma ser dispensável e tendo tal qualidade, vigoraria o princípio do aproveitamento do ato administrativo, princípio que a sentença recorrida violou.

C. Mesmo que se tivesse assistido à audição prévia da ora Recorrida, o resultado final seria o mesmo, i.e., a Recorrida seria sempre colocada em 2.° lugar e o Recorrente em 1.°, pelo que esse vício seria irrelevante, pelo que não daria lugar à anulação do ato administrativo praticado na sequência da omissão da audiência prévia.

D. O Tribunal a quo entendeu que o ato impugnado não está fundamentado por inexistirem documentos que comprovem que o Recorrente foi chefe de equipa de urgência, que exerceu funções de docência e que foi chefe das unidades médicas funcionais e bem assim porque o júri não fundamenta a valoração e os critérios aplicados à lista de classificação final, o que viola o regime de direito probatório aplicável no nosso ordenamento jurídico.

E. A prova documental é uma das muitas provas admissíveis em Direito, cfr. n.° 1 do artigo 87.° do CPA e a verdade é que o júri poderia, se assim o entendesse, ao abrigo do n.° 43.1 do Regulamento do Concurso e do artigo 89.° do CPA, exigir que o Recorrente apresentasse documentos comprovativos dos elementos referidos no seu currículo,

F. Tal corresponde a uma mera faculdade que a lei atribui ao júri, que a exerce de acordo com o seu poder discricionário, sendo que o não exercício dessa faculdade não consubstancia qualquer vício do procedimento concursal que culmine no alegado vício de falta de fundamentação.

G. O júri fundamentou a valoração da classificação atribuída, constando a mesma do anexo à ata n.° 8, valorações essas que foram realizadas de acordo com os critérios previamente estabelecidos e conhecidos da Recorrida pelo que, também aqui, se tem que concluir que não há vício por falta de fundamentação - cfr. artigo 124.° CPA; Ao entender o contrário, a sentença recorrida violou o disposto no artigo 124.° do CPA.

H. No presente processo, a Recorrida conhece perfeitamente os fundamentos da deliberação do júri, conhece os critérios adotados e bem assim foi ouvida por diversas vezes, só que apenas e simplesmente não aceita o facto de o seu currículo ser menos competitivo que o do Recorrente; o que só por si afasta a existência do vício de falta de fundamentação.

I. Mais, mesmo que se entenda que o ato ora em crise não está fundamentado, o que apenas se concede por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que, caso assim fosse, vigoraria o princípio do aproveitamento do ato administrativo, princípio jurídico que o Tribunal recorrido violou pois é de aproveitar o ato não fundamentado, quando o seu conteúdo não pudesse ou não devesse ser outro, o que ocorre neste caso, pois, independentemente de todos os vícios alegados, o resultado final do concurso seria sempre o mesmo, ou seja, mesmo que esses vícios não existissem o Recorrente ficaria sempre em primeiro lugar.

J. Salvo o devido respeito, andou mal o douto Tribunal ao considerar que o ato administrativo ora em crise era anulável, porque o não era.

K. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou a alínea a) do a° 2 do artigo 103.° do CP A, o n.° 1 do artigo 87.° do CP A, o n.° 43.1 do Regulamento do Concurso, o artigo 89.° do CPA e o artigo 124.° CPA. (…)».

Também a Recorrente Secretaria Regional apresentou alegações de recurso, tendo ali concluído como se segue – cfr. fls. 592 e ss. e fls. 698 e ss., ref. SITAF:

«(…)

A) O douto Tribunal a quo proferiu Acórdão que decidiu pela anulação do despacho de 18/06/2009 do então Secretário Regional dos Assuntos Sociais, que indeferiu o Recurso Hierárquico interposto em 27/03/2009, da homologação da lista de classificação final do Concurso de Provimento Interno Geral para Chefe de Serviço de Pneumologia da Carreira Médica Hospitalar do quadro do Centro Hospitalar do Funchal, por vício de violação de lei por omissão de uma formalidade essencial (falta de audiência prévia); e vício de falta de fundamentação;

B) É desta decisão, que se reputa ilegal e contrária aos princípios de direito aplicáveis, que vem a Entidade Demandada recorrer;

C) Em matéria de direito, entendeu o Tribunal a quo, no seu douto Acórdão, que a Audiência Prévia, para cumprimento do estabelecido no art. 63.° da Portaria (que remete para o art. 100.° do CPA, hoje art.s 121.° e 122.° do CPA de 2015) no caso foi omitida, atendendo a que a anterior audiência prévia efetuada no âmbito do concurso tinha como suporte a classificação final com critérios diversos e uma determinada fundamentação, sendo certo que a lista de classificação final anexa à acta n° 8, tem fundamentação diversa, e assim o acto praticado também, desde logo uma outra valoração, sendo de entender que a Audiência Prévia era, no caso, uma formalidade essencial;

D) Julgou, assim, pela anulabilidade do acto impugnado, por vício de violação de lei, por omissão de uma formalidade essencial, uma vez que não foi dado à Autora oportunidade de exercer o direito de audiência prévia;

E) No entanto, quanto a nós, julgou erradamente, e em violação da lei, porquanto consta dos factos considerados provados (ponto Q) no douto Acórdão do qual ora se recorre, aquando do recurso hierárquico apresentado pela Autora, ora Recorrida, em outubro de 2006, que a mesma reclamou que o Júri procedera em violação da Portaria n.° 177/97, de 11 de março, ao estabelecer como critérios de avaliação a contagem exclusiva do tempo prestado na categoria de assistente graduado, quando a lei manda considerar o tempo prestado na categoria de assistente e assistente graduado; e a consideração do regime de dedicação exclusiva (regime de horário de trabalho específico na carreira médica);

F) O referido Recurso Hierárquico da A. mereceu provimento, tendo o Despacho da Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de março de 2007, determinado a revogação do ato de homologação da lista de classificação final do concurso, ordenando-se a repetição das operações concursais a partir da ata de definição dos critérios (pontos R e A dos factos provados);

G) Na sequência de tal Despacho, e para cumprimento do mesmo, o Júri deliberou por unanimidade proceder em conformidade e decidiu alterar os critérios de avaliação curricular (cfr. ponto F. dos factos provados), corrigindo o Júri os critérios de classificação apenas e tão-somente quanto a estes aspectos, em conformidade com o que reclamara a Autora, ora Recorrida, e em seu próprio benefício;

H) O artigo 103.°, n.° 2, al. b) do CP A, para o qual remete o seu artigo 100.°, n.° 1, determina que o órgão instrutor pode dispensar a audiência dos interessados se os elementos constantes do procedimento conduzirem a uma decisão favorável aos interessados:

I) Tendo em conta que os critérios de classificação, reclamados pela Autora, ora Recorrida, foram alterados e conduziram a uma decisão favorável à própria, sendo certo que os demais critérios não foram alterados, e a A., ora recorrida, já se tinha pronunciado sobre os mesmos;

J) A audiência dos interessados, neste caso, era dispensável, ao abrigo do disposto na al. b), n.° 2, do artigo 103.° do CPA;

K) Mal andou o Tribunal a quo, ao anular o acto impugnado por considerar haver vício de violação de lei, por omissão da audiência prévia, pois, além de a classificação final com critérios diversos e uma determinada fundamentação só terem beneficiado a Autora, ora Recorrida, não atendeu ao preceituado no artigo 103.° do CPA;

L) Mas mesmo que assim não se entendesse, sempre se dirá que a audiência prévia deveria, no caso, ser degradada em formalidade não essencial;

M) Como se referiu, a alteração dos critérios de classificação incidiu apenas em dois aspetos (a contagem exclusiva do tempo prestado na categoria de assistente graduado; e a consideração do regime de dedicação exclusiva), com vista à reposição da legalidade, aspetos esses que o Júri alterou;

N) E que beneficiou exclusivamente a A., ora Recorrida, que aumentou a sua classificação final (de 14,8 valores para 15 valores), enquanto que a classificação do Contra-Interessado manteve-se inalterada (16,86 valores);

O) Ainda que fosse praticada a audiência prévia dos interessados, por causa dos tais critérios diversos e fundamentação diversa, como veio julgar o Tribunal a quo, a realidade é que estariam em causa apenas 0,2 valores; ou seja, sendo realizada a audiência prévia dos interessados, não estavam em causa critérios de tal forma diferentes que pudessem originar qualquer posição final diferente da Autora na lista de classificação final;

P) O que significa que a Autora ficaria sempre em segundo lugar, pois nunca esteve em causa a atribuição à Autora, ora Recorrida, ou a retirada ao Contra-Interessado, de 1,86 valores (diferença da pontuação final entre os dois candidatos), significando que a realização da audiência prévia dos interessados não traduziria uma modificação da posição da Autora, ora Recorrida, na classificação final;

Q) O princípio do aproveitamento dos atos administrativos é um princípio geral do Direito Administrativo, aplicável pela Jurisprudência, que tem subjacente a ideia de preterição de formalidades essenciais, as quais ditam a anulabilidade do ato;

R) O princípio em causa opera quando seja permitido concluir pela irrelevância das formalidades essenciais no conteúdo do ato, ou seja, ainda que as formalidades essenciais tivessem sido cumpridas, o sentido e conteúdo do ato seria exatamente o mesmo;

S) Assim entendeu o Acórdão do Venerando Tribunal Central Administrativo Norte, proferido a 22 de junho de 2011, no âmbito do Processo n.° 00462/2000-Coimbra, cuja parte do sumário se transcreve: III. Comprovado e demonstrado que as ilegalidades cometidas não influenciam os resultados do concurso, por não darem lugar à alteração da ordenação dos candidatos a ponto da recorrente ficar posicionada em lugar que a habilite a ser admitida. tornam-se as mesmas irrelevantes ou inoperantes para efeitos de anulação do acto recorrido. ” (in www.dgsi.pt):

T) Também o Acórdão proferido por este Venerando Tribunal Central Administrativo Sul, a 26 de fevereiro de 2015, no âmbito do Processo n.° 11865/15, cuja parte do respetivo sumário, por interesse ao presente Recurso, se transcreve: “ii) O princípio do aproveitamento do acto tem aplicação quando seja legítimo concluir que, embora se admita que o acto padece de algum vício, outra decisão não poderia ser tomada pela Administração.” (in www.dgsi.pt);

U) É também jurisprudência constante do Egrégio Supremo Tribunal Administrativo a adoção do princípio do aproveitamento dos actos administrativos, ou teoria dos vícios inoperantes, segundo o qual a anulação de um acto viciado não será pronunciada quando seja seguro que o novo ato a emitir, isento desse vício, não poderá deixar de ter o mesmo conteúdo decisório que tinha o ato impugnado (vide, a título de exemplo, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo proferidos no âmbito do Processo n.° 0805/03, de 22-06-2006; do Processo n.° 0779/07, de 2905-2008; do Processo n.° 01129/08, de 05-03-2009 — in www.dgsi.pt):

V) Dos elementos constantes do probatório, no caso dos presentes autos, e considerando o princípio do aproveitamento do ato administrativo, o Tribunal a quo podia e devia antever, com toda a segurança, que o acto expurgado do vício que inquinou o acto impugnado (omissão de audiência prévia), seria em todo idêntico ao acto impugnado, pelo que devia degradar a omissão da audiência prévia numa formalidade essencial em não essencial e, consequentemente, não deveria ter decretado a anulabilidade do acto impugnado;

W) Com o devido respeito que é sempre merecido, procedeu o Tribunal a quo em erro de julgamento de direito, violando o princípio do aproveitamento dos atos administrativos;

X) No que respeita à questão da falta de fundamentação, entendeu o Tribunal a quo que: “Atendendo a que não é possível estabelecer o iter cognoscitivo da posição tomada pelo júri do concurso o acto impugnado é também anulável por vício de falta de fundamentação. ”;

Y) Sendo que, e de acordo com que se extrai do douto Acórdão, a falta de fundamentação reside no facto de “...que o júri do concurso não fundamenta a classificação obtida no item chefia de equipa de urgência por inexistência no processo de documento de certificação..."; “...que não resulta dos documentos apresentados pelo candidato V… qualquer outro documento que comprove as funções docentes em curso de pós graduação. Bem como ocorre falta de fundamentação no item Chefia de Unidade Médicas Funcionais, sendo que dos documentos não resulta que o candidato opositor da A, neste item tenha sido responsável pela "Tira B e "por uma outra Tira" para além daquela única responsabilidade, e ainda que tenha sido valorada - a outra "Tira" - pelo tempo, não está fundamentado, pois o que se consegue retirar do acto é que o contra interessado é responsável pelo "Tira B" e tendo- se depois valorado o tempo nessa mesma "Tira" desde 1999 até à data de abertura do concurso, não atingiria 5 anos.”;

Z) De acordo com o previsto no Ponto n.° 43.1 da Portaria n.° 177/97, de 11 de março, o júri pode exigir aos candidatos a apresentação de documentos comprovativos de factos ou elementos referidos no seu currículo que possam relevar para a apreciação do seu mérito, sob pena de os mesmos não serem considerados;

AA) Conclui-se, pois, forçosamente, que se o Júri tiver dúvidas sobre um determinado facto ou elemento constante do currículo do respetivo candidato, tem a opção de exigir ao mesmo a apresentação de documentos comprovativos desses factos ou elementos, mas não a obrigação:

BB) O Contra-Interessado demonstrou e provou, no seu curriculum, a chefia de equipas médico-cirúrgicas no Serviço de Urgência do CHF; o exercício de funções docentes na área da saúde (área profissional); a Chefia de Unidade Médicas Funcionais e o tempo superior a 5 anos de chefia;

CC) O Júri aceitou como verdadeiros tais factos, tendo pontuado o ora Contra- Interessado, na classificação final, com 0.5 valores no item de Chefia de Equipas de Urgência; com 0.1 valores no item de funções docentes; e 0.5, no tempo de chefia de unidades médicas funcionais, não tendo o Tribunal que aferir se havia ou não necessidade de comprovar documentalmente tal;

DD) Porém, quanto a estes aspetos, julgou o Tribunal a quo infundamentadas a atribuição destes valores, substituindo-se ao Júri e efetuando um controlo jurisdicional da sua atuação, ingerindo-se num poder discricionário do mesmo, discricionariedade esta que resulta do Ponto 43.1 da Portaria n.° 177/97, de 11 de março;

EE) Como decidiu o Egrégio Supremo Tribunal Administrativo, no seu Acórdão proferido a 9 de fevereiro de 2006, no âmbito do processo n.° 0840/05: “I - O controlo jurisdicional da actuação dos júris dos concursos inserida na margem de discricionariedade de que goza a Administração só é possível quanto aos seus aspectos vinculados, ou em caso de erro manifesto ou de adopção de critérios manifestamente desajustados (in www.dgsi.pt):

FF) Não sendo, manifestamente, um aspeto vinculado a opção do Júri solicitar documentos para provar algo descrito num curriculum, quando esse mesmo currículo, ainda por cima, foi alvo de discussão em prova pública (Ponto 58 da Portaria 177/97);

GG) Mal andou o Tribunal a quo ao considerar infundamentada as pontuações de 0,5 e 0,1 valores obtidas pelo Contra-Interessado, respetivamente, no item Chefia de Equipa de Urgência, Chefia de unidades médicas funcionais e Funções docentes, pelos fundamentos por si utilizados, nomeadamente, a falta de comprovação documental;

HH) Uma vez que se percebe o porquê do Contra-interessado ter obtido tais pontuações, isto é, percebe-se perfeitamente o iter cognoscitivo da posição tomada pelo Júri do concurso, nestes itens;

II) Cai em erro o Tribunal a quo ao considerar que a Portaria n.° 177/97 determina que os candidatos ao concurso de chefe de serviço têm que apresentar documentos comprovativos de todos os factos ou elementos constantes nos seus currículos quando, na realidade, assim não o é;

JJ) Sendo este, como já referimos, um poder discricionário do júri que, se quiser e tiver dúvidas sobre a veracidade dos factos narrados pelos candidatos, pode exigir documentos comprovativos;

KK) Uma vez mais, entende-se que mal andou o Tribunal a quo, ao anular o acto impugnado por considerar haver vício de violação de lei, por falta de fundamentação, na medida em que se consegue, face aos fatos considerados provados, estabelecer perfeitamente o iter cognoscitivo da posição tomada pelo júri do concurso;

LL) Pelo que o Acórdão de que ora se recorre padece de erro de julgamento de direito, também nesta questão;

MM) Mas mesmo que se considerasse (o que não se considera) haver vício de violação de lei, por falta de fundamentação, e expurgando tal vício do acto ora impugnado;

NN) E ainda que se retirassem os valores atribuídos ao Contra-Interessado, nos aspetos considerados não fundamentados (0,5 do tempo de chefia; 0,5 da Chefia de Urgência; e 0,1 das funções docentes), feitas as contas, o Contra-Interessado perderia 1,1 valores;

OO) Considerando que o Contra-Interessado obteve uma classificação final de 16,86v;

PP) E a Autora, ora Recorrida, obteve uma classificação final de 15 valores;

QQ) Tal significa que, perdendo 1,1 valores (atinentes aos aspetos não fundamentados), o Contra-Interessado ficaria com uma classificação final de 15,76 valores, ou seja, o Contra-Interessado ficaria sempre colocado à frente da Autora, ora Recorrida;

RR) O mesmo é dizer que, expurgados os vícios imputados ao ato, nenhuma alteração haveria ao conteúdo do ato ora impugnado, pois não implicaria modificação da posição da Autora, ora Recorrida, na classificação final;

SS) Como se referiu em relação à preterição da audiência prévia [cfr. supra, Conclusões L e seguintes, as quais se consideram aqui reproduzidas], o princípio do aproveitamento dos atos administrativos é um princípio geral do Direito Administrativo, aplicável pela Jurisprudência, que tem subjacente a ideia de preterição de formalidades essenciais, as quais ditam a anulabilidade do ato;

TT) O princípio em causa opera quando seja permitido concluir pela irrelevância das formalidades essenciais no conteúdo do ato, como era o caso patente dos presentes autos;

UU) Na medida em que é mais do que seguro afirmar que o novo ato a emitir, isento deste vício em causa, não poderia deixar de ter o mesmo conteúdo decisório que tinha o ato impugnado;

VV) Assim sendo, padece o Acórdão recorrido de nulidade e de ilegalidade, por erro de julgamento, com os fundamentos supra, pelo que se impõe a sua revogação e a consequente não anulação do acto administrativo constante do despacho de 18/06/2009 do então Secretário Regional dos Assuntos Sociais, que indeferiu o Recurso Hierárquico interposto em 27/03/2009, da homologação da lista de classificação final do Concurso de Provimento Interno Geral para Chefe de Serviço de Pneumologia da Carreira Médica Hospitalar do quadro do Centro Hospitalar do Funchal. (…).»

A Recorrida, por seu turno, contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões – cfr. fls. 652 e ss., ref. SITAF:
«(…)
1. Como resulta do Acórdão e supra se sustentou não assiste razão aos recorrentes no recurso interposto.
2. No Acórdão ponderou-se e avaliou-se os fundamentos de facto e de direito expostos e, correcta e fundadamente, decidiu-se conceder provimento à acção, anulando-se o acto impugnando e condenando- se a Entidade Demandada a praticar dos actos e operações necessárias de forma a expurgar os vícios de falta de audiência prévia e falta de fundamentação omitidos.
3. O despacho de revogação - da senhora Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12/3/2007 -, obrigava o júri à repetição do procedimento expurgado das ilegalidades detectadas porém o júri não o cumpriu permanecendo as ilegalidades expostas, acrescidas da violação do despacho de revogação.
4. A Ré/Recorrente pretende sustentar a legalidade do acto considerando que o procedimento cumpriu todos os requisitos legais e que a pontuação final não alterava a ordenação final só que lendo a acta 8 e a grelha final verifica-se que nada foi corrigido ou reponderado mantendo-se, salvo na valoração com 0,2 pontos do sub-item exclusividade, tudo na mesma sem qualquer fundamentação atendível como decorre da lei e havia sido determinado no despacho.
5. Como resulta da lei - e da jurisprudência administrativa, na actuação administrativa - devendo a administração obediência á lei, as formalidades definidas na lei são havidas por essenciais, só se degradando em acidentais e negligenciáveis quando for absolutamente certo que os fins por elas visados foram atingidos por uma qualquer outra via.
6. O princípio da legalidade na actuação administrativa impõe-lhe desde logo o ónus de demonstrar que o não cumprimento de determinada formalidade não lesou os interesses do particular e o próprio interesse público subjacente a tal imposição legal, por maioria de razão quanto tal imposição é a concretização de normas constitucionais (atente-se, nomeadamente no disposto no artigo 267° n°5 da CRP relativamente á audiência prévia, e aos artigos 13°, 47° n°2, 268° e 266° n°2 da CRP relativamente aos princípios de actuação referidos nestas alegações).
7. O Júri proferiu uma decisão definitiva em 16 de Janeiro de 2009 sem dar aos candidatos a possibilidade de se pronunciarem sobre um projecto de decisão e sobre os fundamentos que o Júri poderia ter para a mesma.
8. Pelo que violou o disposto nos artigos 100° e seguintes do CPA, o ponto 63 da Port. 177/99 e o artigo 267° n°5 da CRP.
9. Tal actuação impediu que a autora exercesse o seu direito legal e constitucionalmente consagrado (art. 267° n°5 da CRP e 8° do CPA) a participar no procedimento e ser ouvida antes da decisão final sendo previamente informada do sentido provável desta.
10. O júri manteve na íntegra o que já havia sido alvo de apreciação nos referidos pontos, pelo que não só o júri violou os art°.s 124° e 125° do CPA e 268 n°. 3 da CRP como, ao não proceder de acordo com o determinado no despacho de revogação violou tal despacho que havia considerado procedente o recurso interposto pela Autora e definido que aquelas concretas situações eram ilegais e como tal deviam ser corrigidas.
11. Na valoração do elemento Chefia de Unidades Médicas Funcionais é manifesta a violação do despacho de revogação.
12. O júri estava obrigado a retirar a valoração de 1 ponto, neste sub-item, ao candidato opositor
13. O Júri violou o princípio do inquisitório previsto nos artigos 87° n°1 do CPA, do qual resulta (por maioria de razão após prescrito no despacho de revogação) que o artigo 43.1 da Portaria 177/97 é um poder dever quando a verdade dos documentos apresentados e dos respectivos factos é, tal como foi no presente procedimento, colocada em causa.
14. A desproporção entre a valoração e a factualidade subjacente é manifesta, não tendo sido invocado qualquer fundamento que justifique a atribuição da mesma pontuação perante uma tão ostensiva desproporção ao nível dos elementos curriculares
15. As grelhas de avaliação evidenciam que quando o critério quantitativo beneficiava o candidato contra- interessado era esse o aplicado, porém quando os critérios quantitativos resultavam numa clara superioridade da Autora, as grelhas evidenciam uma valoração afastada desses critérios quantitativos, tendo o júri, a posteriori, feito apelo a um "critério subjectivo, de valorização da qualidade das funções prestadas em cursos da área médica; de valorização da qualidade das publicações e dos trabalhos, do relevo científico das publicações etc.". (…)».

Neste Tribunal Central, o DMMP não emitiu parecer.

Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.

I. 1. Questões a apreciar e decidir

As questões suscitadas pelos Recorrentes, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito ao ter anulado o ato impugnado, que indeferiu o recurso hierárquico que foi interposto do ato de homologação da lista de classificação final do Concurso de Provimento Interno Geral para Chefe de Serviço de Pneumologia da Carreira Médica Hospitalar do quadro do Centro Hospitalar do Funchal, por vício de violação de lei por omissão de uma formalidade essencial, por falta de audiência prévia, e vício de falta de fundamentação, ao abrigo das disposições conjugadas da alínea a) do n.º 2 do art. 103.° e n.° 1 do art. 87.°, ambos do CPA1991 (atuais art.s 124.º e 115.º, n.º 1), assim como do n.° 43.1 do Regulamento do Concurso e dos art. 89.° e 124.° e 125.º, todos do CPA1991 (atuais art.s 117.º e 152.º e 153.º).

II. Fundamentação

II.1. De facto

A matéria de facto constante do acórdão recorrido é aqui se transcrita ipsis verbis:
«(…)
A) Por aviso publicado no DR 2a série, n° 61, de 13/03/2003 foi aberto Concurso de Provimento para Chefe do Serviço de Pneumologia da Carreira Médica Hospitalar do Quadro do Centro Hospitalar do Funchal, onde consta, nomeadamente (doc n° 3, junto com a PI):
(...).
2 — O concurso é interno geral, aberto a todos os médicos possuidores dos requisitos gerais e especiais, já vinculados à função pública.
2.1 — Prazo de validade — o prazo é fixado em seis meses contados da data da publicação da respectiva lista de classificação final.
3 — Requisitos de admissão:
3.1 — São requisitos gerais:
a) Ter nacionalidade portuguesa, salvo nos casos exceptuados por lei especial ou convenção internacional;
b) Ter cumprido os deveres militares ou de serviço cívico, quando obrigatório;
c) Não estar inibido do exercício de funções públicas ou interdito para o exercício das funções a que se candidata;
d) Possuir a robustez física necessária ao exercício da função e ter cumprido as leis de vacinação obrigatória.
3.2 — São requisitos especiais:
a) Possuir o grau de consultor na área de pneumologia;
b) Ter a categoria de assistente graduado na área de pneumologia há, pelo menos, três anos ou beneficiar do alargamento de área de recrutamento previsto no n,° 2 do artigo 23,° do Decreto-Lei n.° 73/90, de 6 de Março, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 210/91, de 12 de Junho.
3.3 — Exigências particulares técnico-profissionais — não são requeridas exigências particulares.
(…)
7 — Método de selecção — prova pública, que consiste na discussão do currículo do candidato de acordo com a secção vi do capítulo u da Portaria n.° 177/97, de 11 de Março.
8 - A lista dos candidatos admitidos e excluídos ao concurso, prevista no n.º 54 da Portaria n.° 177/97, de 11 de Março, será afixada no átrio do Hospital da Cruz de Carvalho.
9 — Constituição do júri:
Presidente — Dr. J…, chefe de serviço de pneumologia do Hospital de Pulido Valente.
Vogais efectivos:
Dr. J…, chefe de serviço de pneumologia do Hospital de São Marcos.
Dr. Jo…, chefe de serviço de pneumologia do Centro Hospitalar de Coimbra.
Dr. A…, chefe de serviço de pneumologia do Hospital de Nossa Senhora do Rosário.
Dr. L…, chefe de serviço de pneumologia do Hospital de Pulido Valente.
().

B) M… apresentou o seu curriculum, conforme exigido no regulamento concursal, tendo sido admitida;

C) Conforme acta n° 1, de 28-03-2003 o júri do concurso definiu os critérios a utilizar na avaliação dos factores mencionados no art° 59° da Portaria n° 177/97, tendo elaborado uma grelha que anexou e onde consta (doc n° 4, junto com a PI):
Factores a serem considerados na discussão curricular
Alínea a) - 0 a 12 valores
Exercício das funções de assistente e assistente graduado - 0 a 7
Competência técnico-profissional- 0 a 1
Chefia de unidades orgânicas — 0 a 2
Participação em equipas de urgência interna e externa - 0 a 1
Apoio e enquadramento à clínica geral em cuidados de saúde primários - 0 a 1
Alínea b) - 0 a 2,5 valores
Actividades de formação nos internatos médicos - 0 a 1,5
Acções de formação e de educação médica continuada frequentadas - 0 a 0.5
Acções de formação e de educação médica continuada ministradas - 0 a 0,5 
Alinea c) - 0 a 2,5 valores
Capacidade e aptidão para gestão e organização de serviços hospitalares -- 0 a 1,5
Desempenho de cargos médicos — 0 a 1
Alínea d) - 0 a 2 valores
Trabalhos publicados - 0 a 1
Trabalhos comunicados - 0 a 1
Alínea c) - 0 a 0,5 valores
Actvidades docentes — 0 a 0,3
Actividades de investigação clínica — 0 a 0,2
Alínea f) – 0 a 0,5 valores
Títulos profissionais - 0 a 0.3
Sociedades científicas 0 a 0,05
Júris de concursos médicos — 0 a 0.1 5
().

D) Por ofício datado de 30-06-2003 a A foi notificada para se pronunciar, nos termos do art° 100° do CPA sobre a definição dos critérios de classificação e da sua aplicação assim como a classificação final, relativa ao concurso referido em A) que se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais e onde consta, nomeadamente (doc n° 5, junto com a PI):
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(…)

E) Em 14-07-2003 a A exerceu o direito de audição invocando vícios de fundamentação e procedimentais no concurso e da classificação proposta (doc n° 6, junto com a PI);

F) Por carta datada de 28-07-2003 a A foi notificada da manutenção da classificação e que os vícios que foram invocados não foram aceites (doc n° 7, junto com a PI):
(...).
Em resposta ao documento de alegações respeitando a lista de classificação do concurso de provimento para Chefe de Serviço de Pneumologia da carreira médica hospitalar do quadro do Centro Hospitalar do Funchal, o Júri tem a dizer o seguinte:
Na elaboração da “grelha” classificativa nada determina que sejam subdivididas as alíneas constantes do n° 59 do Regulamento do Concurso de Provimento para Chefe de Serviço da Carreira Médica Hospitalar; no entanto, o Júri entendeu criar subdivisões a que atribuiu valores parcelares.
No que toca às observações efectuadas por V.Exa, não é verdade que tenha sido omitida a apreciação das funções de Assistente e Assistente Graduada na área profissional respectiva, uma vez que na Acta consta “ por 12 anos de funções de Assistente e Assistente Graduado com bom desempenho”.
Do mesmo modo o Júri não omitiu a referência ao apoio e enquadramento à clínica geral, uma vez que na Acta vem expressamente referido “ pela colaboração com os Centros de Saúde da Madeira e Porto Santo e com o Centro de Diagnóstico Pneumológico do Funchal”.
Nada no legislado obriga a que o Júri atribua a um dos candidatos cotação máxima num determinado item, e na ponderação dos dois candidatos, obviamente foi tida em conta a discussão efectuada durante a prova pública.
No que toca à classificação da competência técnico-profissional, tratou-se de um lapso de escrita, uma vez que ao referido parâmetro foi atibuida a classificação de 0,5 valores (conforme se pode verificar pela nota final e somatório das parcelares).
No tocante à alínea d), o Regulamento apenas ressalva o destaque a dar aos trabalhos “...que reflictam a produtividade e eficácia dos cuidados de saúde prestados, os níveis de rendimento assistencial e a pesquisa de modalidades terapêuticas menos onerosas e mais eficazes”. O Júri reconheceu a existência de um trabalho publicado e um póster premiados atribuindo a nota máxima à reclamante.
Em relação à alínea e), no que diz respeito à actividade docente, o Júri estabeleceu uma diferença nítida entre os dois candidatos (0,25 à reclamante, 0,05 ao outro candidato). No que diz respeito à actividade científica, a requerente colaborou em 9 linhas de investigação do INIC, com o qual o Serviço de Pneumologia dos H.U.C. estava articulado. O outro candidato, apesar de só ter colaborado em 2 linhas de investigação do INIC, elaborou um trabalho de investigação sobre a Epidemiologia da Asma em Porto Santo que, no entender do Júri, mereceu ser destacado.
Deste modo, o Júri decide manter as classificações atribuídas aos dois candidatos.

G) Em 13-09-2003 foi publicada no DR a lista de classificação final homologada por despacho de 20-08-2003 do Conselho de Administração do Serviço Regional de Saúde, EPE, tendo sido aprovados dois candidatos (doc n° 8, dos autos):
- V… - 17,78 valores;
- M… - 17,30 valores

H) A Autora interpôs recurso hierárquico para a Secretária dos Assuntos Sociais do despacho de homologação de 20-08-2003 (doc n° 9, junto com PI);

I) Por despacho de 04-12-2003 a Secretária Regional dos Assuntos Sociais declarou a nulidade dos actos constantes da acta n° 1 e revogados os actos anuláveis mantendo a validade e procedência dos respectivos actos de autorização de abertura do concurso, avisos de abertura e lista de candidatos admitidos e excluídos, tendo determinado a nomeação de novo do júri do concurso, seguindo-se os ulteriores termos do concurso até final (doc n° 9, junto da PI);

J) Por aviso n° 9622/2004, publicado no DR 2a série de 22-10-2004 é constituído um novo júri para o concurso identificado em A) (doc n° 10, junto com a PI):

K) Em 22-11-2005 a A é notificada para se pronunciar nos termos do art° 100° do CPA, com remessa da acta de definição dos critérios de classificação e sua aplicação, nos termos da acta n° 1 de 02-05-2005 e acta n° 3 de 21-11-2005 com ficha da sua avaliação e lista de classificação, bem com a sua ordem e classificação, onde consta nomeadamente (doc n° 11, junta à PI):
(...).

Mapa individual justificativo de Classificação
Concurso institucional interno na categoria de Chefe de Serviço de Pneumologta
Aberto por aviso publicado no Diário da República II série de 29 de Outubro de 2004






L) Da acta número três consta o seguinte (doc n° 11, junto à PI):
(…)
«Imagem no original»
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M) Da Lista de Classificação Final consta o seguinte (don n° 11, junto à PI):






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***

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(…)
N) Em 09-12-2005 a A pronunciou-se tendo invocado estar o júri impedido de alterar as regras previstas no n° 59 do Regulamento, erros manifestos, falta de proporcionalidade e imparcialidade (doc n° 12, junto à PI);

O) Por carta datada de 17-05-2005 a A foi notificada da decisão do júri de não aceitar as reclamações apresentadas pela A e mantendo a classificação final proposta (doc n° 13, junto à PI);
P) Em 26-09-2006 foi publicada no DR 2a série, por aviso 10565/2006, a lista de classificação final depois de homologada por despacho do Conselho de Administração do Serviço de Saúde, EPE, de 08-07-2006 (doc n° 14 da PI);
Q) Em 11-10-2006 a A interpôs Recurso Hierárquico para a Secretária Regional dos Assuntos Sociais (doc n° 15 junto à PI);
R) A Inspecção Regional dos Assuntos Sociais lavrou Informação, cujo teor se dá por inteiramente reproduzida para todos os efeitos legais e, onde consta, nomeadamente (doc n° 16, junto à PI):
(...).
Da questão de fundo ou material:
12. Analisemos a bondade material das alegações de recurso. Em face da jurisprudência invocada pelo SRS EPE e da matéria de facto constante dos autos de processo concursal, não assiste razão à requerente quando afirma que os curricula dos candidatos eram conhecidos ou seriam pelo menos cognoscíveis à data em que o júri estabeleceu os critérios de apreciação curricular ou que a este não caberia estabelecê-los de novo. Vejam-se os art°. 4 a 12 da resposta do SRS EPE, com os quais se concorda.
13. Assiste já inteira razão à recorrente quando alega que o júri viola a lei ao estabelecer, nos critérios de selecção do concurso, a contagem exclusiva do tempo prestado na categoria de assistente graduado em contravenção com o disposto no n°. 59 al.a) da Portaria 177/99, que manda atender obrigatoriamente ao tempo de serviço prestado quer nas funções de assistente quer nas de assistente graduado. Sob pena de gritante vício de violação de lei, não pode o júri alterar os critérios que estão legalmente previstos.
14. O mesmo se diga, com o que temos de concordar com a recorrente, da circunstância de o júri ter incluído o regime de dedicação exclusiva, num item que se refere exclusivamente ao tempo de serviço, independentemente do regime de trabalho em que este foi obtido. Fazer relevar uma noção de “tempo de funções” acrescido pelo maior número de horas de trabalho semanal prestado naquele regime, é sofismar e subverter o critério legal de tempo de serviço para efeitos da al, a) do n°. 59 da Portaria, que deve aferir-se exclusivamente em dias, meses e anos e não a horas de trabalho.
15. Relativamente à chefia de equipa de urgência, questionada pela recorrente, e ao contrário do que afirma o júri, não existe no processo ou no curriculum do candidato qualquer documento de certificação emitido pelo Director do Serviço de Pneumologia e ainda que existisse, a natureza da função e do serviço fariam deste entidade incompetente para a certificação. Acresce que o documento designado por n°. 12 no curriculum do candidato, é uma cópia sem referência ao organismo ou entidade emissores, sem data e assinatura. A imprecisão do documento deveria ter suscitado ao júri a exigência da sua comprovação, demandando se para tanto o candidato ou suscitando-se a sua confirmação ex officio aos serviços, para poder valorizar e pontuar com segurança a referida chefia, sob pena de manifesta falta de fundamentação, violando-se os art°.s 124 e 125 do CPA e 268 n°. 3 da CRP.
16. O mesmo se diga das funções docentes em cursos de pós-graduação em medicina cuja comprovação não resulta de qualquer documento constante do curriculum do candidato.
17. Relativamente às restantes alegações de recurso da candidata, maxime as constantes dos art°.s 35 a 38 e relativas aos trabalhos apresentados, alguns até premiados, é indiscutível que estamos no âmbito da discricionariedade técnica do júri. No entanto,
18. Na acta de subsunção da matéria curricular aos critérios estabelecidos em acta anterior, limitou-se o júri a designar o número de actívidades, publicações e trabalhos desenvolvidos, atribuindo-lhes a correspondente valoração quantitava. Ora, se o critério erigido fosse o da apresentação meramente quantitativa, a avaliar pelo número de trabalhos e actividades, nada haveria a opor ao caminho trilhado pelo júri porquanto seria fácil e simples deduzir a respectiva classificação e a forma como foi apurada.
19 Sucede, porém, que o próprio júri em sede de audiência prévia vem dizer que o critério adoptado foi um critério subjectivo, de valorização da qualidade das funções prestadas em cursos da área médica; de valorização da qualidade das publicações e dos trabalhos, do relevo científico das publicações, etc. Deste modo, ao socorrer-se de critérios subjectivos, cuja legitimidade é indiscutível em sede de discricionariedade técnica, uma matéria tão específica como é a ciência médica, o júri tinha obrigação legal de proceder à fundamentação completa e rigorosa das suas opções de classificação, para que fosse visível e os destinatários o pudessem perceber, o iter cognoscitivo e valorativo por si prosseguido, sem o que tem de se entender que há manifesta falta de fundamentação, violando-se o art° 124° e 125°do CPA e 268°n° 3 da CRP.
Conclusão:
20. Nos termos sobreditos, deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se o acto de homologação da lista de classificação final do concurso praticado pelo CA do SRS, EPE, ordenando-se a repetição das operações concursais a partir da acta de definição dos critérios, devendo o júri de concurso conformar a sua actividade de acordo com os critérios definidos na Portaria 177/97 e proceder à adequada fundamentação da aplicação dos critérios adoptados à matéria curricular, com as legais consequências.
().

A) A 12-03-2007 a Secretária Regional dos Assuntos Sociais proferiu despacho de concordância com as conclusões da informação referida no ponto anterior e “a revogação do acto de homologação da lista de classificação do júri devendo o mesmo proceder com o ponto 20” da informação (doc n° 16, junto à PI);
B) A 14-04-2008 foi marcada a prova de selecção dos candidatos;
C) Conforme consta da acta n° 7 de 14-04-2008, prévia à prova pública de discussão dos currículos, o júri reuniu com a seguinte ordem de trabalhos (doc n° 17 junto à PI):
«(...).
Ponto Único: Proceder à prova pública de discussão do currículo dos candidatos Dr.ª M… e Dr. V….
Aberta a sessão, e preliminarmente ao início efectivo da ordem de trabalhos, o júri apreciou o Despacho de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de Março de 2007, que revogou o acto de homologação da lista de classificação final, e que se fundamenta na Informação emitida pelo Exmo. lnspector Regional dos Assuntos Sociais. De acordo com a conclusão desta Informação (v. ponto 20), ordenou-se a repetição das operações concursais a partir da acta da definição dos critérios, devendo o júri conformar a sua actividade de acordo com os critérios definidos na Portaria 177/97 e proceder à adequada fundamentação da aplicação dos critérios adoptados à matéria curricular”. De acordo com aquela Informação, o júri teria, designadamente, que atender ao tempo de serviço prestado quer nas funções de assistente quer nas de assistente graduado (v. ponto 13), e não apenas nas funções de assistente graduado, e teria que desatender ao regime de dedicação exclusiva (v. ponto 14). Posteriormente, o Exmo. Presidente do Conselho de Administração do Serviço Regional de Saúde, EPE, solicitou informação adicional a Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais no sentido de saber se a repetição a que se refere o ponto 20 daquela Informação implicaria a prestação de nova prova pública de discussão do currículo dos candidatos ou se o júri deveria apenas reelaborar os documentos atinentes à avaliação dos candidatos, ao que Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais, por Despacho de 9 de Abril de 2007, sufragada em Parecer do Exmo. Inspector Regional dos Assuntos Sociais, refere, grosso modo, que deve ser feita nova prova pública que consista na discussão do currículo dos candidatos, na qual devem ser obrigatoriamente considerados o exercício das funções de assistente e de assistente graduado, referindo ainda que “o júri não considerou na discussão do currículo o exercício das funções de assistente, factor que, aliás, omitiu na acta de definição de critérios”.
Em face do exposto, e salvo melhor opinião, parece ao júri que o objectivo pugnado pelo Despacho de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de Março de 2007 só se alcança com a alteração da acta n.° 1, de 3 de Maio de 2005, que definiu os critérios de avaliação dos currículos dos candidatos e a sua ponderação. Ora, o júri manifesta dúvidas acerca da oportunidade e da possibilidade legal de se efectuar, neste momento, uma nova discussão do currículo dos candidatos, uma vez que a alteração daqueles critérios de avaliação e respectiva ponderação, estando o júri na posse dos currículos dos candidatos, poderá eventualmente ser entendida como violadora do princípio da imparcialidade. Por outro lado, o júri manifesta desconhecimento sobre a forma como poderá conciliar os Despachos de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de Março de 2007 e de 9 de Abril de 2007 com o cumprimento dos princípios subjacentes ao concurso em causa, designadamente aquele princípio da imparcialidade.
Em face do referido, o júri propôs a convocação dos dois candidatos para saber se aceitavam declarar aceitar, ou não, que o júri alterasse de imediato os critérios de valorização exigido pelo Despacho de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de Março de 2007, por forma a que a dedicação exclusiva deixasse de ser critério de ponderação e que os 0,2 valores que lhe estavam destinados fossem antes atribuídos ao tempo de exercício das funções como assistente hospitalar, sendo aqueles 0,2 valores assim distribuídos. < 5 anos: 0,1 valores, = > 5 anos: 0,2 valores, uma vez que estas alterações cumprem as determinações exigidas por aquele Despacho e respeitam o espírito e a proporcionalidade que esteve na base da elaboração da acta n.° 1.
Posta desde já à votação a proposta de convocar de imediato os dois candidatos nos termos supra exarados, foi a proposta votada e aprovada por unanimidade.
De seguida, foram os dois candidatos convocados para a Biblioteca do Hospital Central do Funchal, tendo a candidata Dr.a M… declarado não aceitar a alteração dos critérios de acordo com a proposta do júri, e tendo o candidato Dr. V… aceitado tal proposta.
Uma vez que a candidata Dr.ª M… não aceitou declarar o pretendido, o júri propôs que a sessão fosse suspensa e que fosse enviada a Sua Excelência o (actual) Secretário Regional dos Assuntos Sociais pedido de parecer com o objectivo de elucidar sobre a forma como poderá o júri cumprir as conclusões dos citados Despachos de 12 de Março de 2007 e de 9 de Abril de 2007 e, ao mesmo tempo, alterar os critérios de ponderação, nos termos da Informação do Exmo. Inspector Regional dos Assuntos Sociais, que manda atender não apenas ao tempo de serviço prestado como assistente graduado (conforme consta da acta n.° 1), mas também ao tempo prestado como assistente (que não consta da acta n ° 1) e ainda que ordena que se desconsidere o regime de dedicação exclusiva (que consta da acta n.° 1).
Tendo em conta o princípio da prossecução do interesse público a que o júri está obrigado, os concomitantes princípios da economia processual e da proporcionalidade, o dever de celeridade, o princípio do aproveitamento dos actos administrativos e ainda que a candidata Dr.ª M… não alcançará o efeito jurídico pretendido com o seu recurso, o júri propôs ainda que Sua Excelência o Secretário Regional dos Assuntos Sociais seja informado, para os fins que tiver por convenientes, de que mesmo que todas as alterações exigidas pelo citado Despacho de 12 de Março de 2007 sejam efectuadas, a candidata Dr.ª M… continuará sempre classificada em 2o lugar, uma vez que o diferencial actual (antes das alterações exigidas) entre ambos os candidatos é de 2,06 valores e, por força daquele Despacho, passará a encontrar-se em disputa apenas 0,8 valores (i e, mesmo que o júri atendesse, e não quer dizer que o atendesse efectivamente, a todos os reparos do Despacho de 12 de Março de 2007, o candidato Dr. V… perderia 0,1 valores na docência e 0,5 valores na chefia de equipa, a candidata Drª M… ganharia 0,2 valores no tempo de exercício como assistente).
O júri propôs ainda que a sessão seja retomada logo que o júri esteja na posse do parecer em causa e que o pedido de parecer seja feito através do envio da presente acta.
Postas à votação dos membros do júri as propostas acima exaradas, foram as mesmas votadas e aprovadas por unanimidade.
(...).»
D) Foi comunicado ao júri por ofício datado de 19-05-2008 o despacho datado de 23-04-2008 cujo teor é o seguinte (docs n°s 19 e 20, junto à PI):
1 - Os actos a praticar no âmbito do Concurso competem ao júri;
2 - Os candidatos são ouvidos no âmbito da audiência prévia;
3 - Nestes termos determino que o SRS/EPE dê cumprimento ao despacho da SRAS de 12/3/07.

E) Por ofício datado de 30-12-2008 a Autora foi notificada para comparecer na prova pública de discussão curricular, a 16-01-2009, às 10,00h;
F) Consta da acta n° 8, extraída da reunião de 16-01-2009 o seguinte (doc n° 22, junto à PI):
«(…).
Ponto Único: Retomar os trabalhos suspensos na reunião de 14 de Abril de 2008, a que se refere a acta n.° 7, procedendo à prova pública de discussão do currículo dos candidatos Dr.ª M… e Dr. V…, por determinação dos Despachos de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de Março de 2007 e de 9 de Abril de 2007, que mandou repetir as operações concursais a partir da acta da definição dos critérios, de acordo com os critérios definidos na Portaria 177/97, de 11 de Março.
Reiniciada a sessão, e para cumprimento dos Despachos de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de Março de 2007 e de 9 de Abril de 2007, a presidente do júri notou que será necessário atender ao tempo de serviço prestado quer nas funções de assistente quer nas de assistente graduado, e não apenas nas funções de assistente graduado, e será necessário desatender ao regime de dedicação exclusiva.
Após discussão entre todos os membros do júri, a presidente do júri propôs que o regime de dedicação exclusiva, a que estava atribuída a valorização de 0,2 valores, seja desatendido, desconsiderando-se tal factor e valorização.
Após a discussão da questão da dedicação exclusiva, os membros do júri discutiram entre si a necessidade de se atender ao tempo de serviço prestado nas funções de assistente, e a forma como proceder a essa avaliação, todos se pondo de acordo quanto à necessidade de ter em conta os critérios de avaliação e as regras da proporcionalidade subjacentes à acta n.° 1. Dessa forma, a presidente do júri propôs que, como única forma de se proceder em conformidade com os Despachos de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de Março de 2007 e de 9 de Abril de 2007, respeitando o espírito e a proporcionalidade que esteve na base da elaboração da acta n.° 1, sejam atribuídos os 0,2 valores que estavam destinados à dedicação exclusiva ao tempo de exercício das funções como assistente hospitalar, sendo aqueles 0,2 valores assim distribuídos: < 5 anos: 0,1 valores; = > 5 anos: 0,2 valores.
Posteriormente, os membros do júri discutiram entre si as demais questões levantadas pela candidata Dr.ª M…, referidas também no Despacho de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de Março de 2007, tendo a presidente do júri proposto que as mesmas não fossem alteradas, por entender que esta candidata não tem razão nos argumentos que aduziu.
Postas desde já à votação as propostas anteriormente referidas, foram as propostas votadas e aprovadas por unanimidade.
De seguida, e em conformidade com o acima já deliberado, procedeu-se à prova pública de avaliação curricular dos candidatos Dr.ª M… e Dr. V….
Após a realização da prova pública de avaliação curricular dos candidatos Dr.ª M… e Dr. V… a presidente do júri propôs que fossem de imediato atribuídas as classificações finais aos candidatos, devendo as mesmas ficar a constar dos Anexos que se juntam a esta acta e que, depois de assinados e rubricados por todos os membros do júri, dela ficam a fazer parte integrante.
Posta à votação dos membros do júri a proposta acima exarada, foi a proposta votada e aprovada por unanimidade.
Nada mais havendo a tratar, foi pelas 12.00 horas encerrada a reunião e foi exarada a presente acta que, depois de lida e aprovada, foi assinada por todos os membros do júri, em sinal de total concordância com o seu teor.»

G) Anexa à acta n° 8 consta a lista de classificação final, que, com interesse para a decisão da causa se reproduz (doc n° 23, junto à PI):
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H) Em 16-01-2009 o Conselho de Administração do Serviço Regional de Saúde, EPE, homologou a lista de classificação final (doc n° 23, junto à PI);

I) Por aviso (extracto) n° 17/2009/M, de 06-03-2009 foi publicada no DR, 2a série, n° 51, de 13-03-2009 a lista de classificação final referida em Z) (doc n° 24, junto à PI);

J) Em 16-03-2009 a Autora foi notificada através de carta com A/R, datada de 16-03-2009 da lista de classificação final onde foi junto o aviso do DR referido no ponto anterior (doc n° 25, junto à PI);

K) O A/R da carta referida no ponto anterior foi assinado pela A, a 17-03-2009;
L) Em 25-03-2009 a Autora solicitou cópia certificada das actas n° 7 e n° 8, das grelhas classificativas e dos documentos produzidos a partir de 1203-2009 (doc n° 21, junto à PI);

M) Em 07-04-2009 a Autora recebeu as cópias referidas no ponto anterior bem como dos documentos juntos e produzidos a partir de 12-03-2009 (doc n° 22, junto à PI);

N) Em 27-03-2009 a Autora recorreu do despacho de homologação da lista de classificação final para o Secretário Regional dos Assuntos Sociais (doc n° 2, junto à PI);

O) Em 18-06-2009 o Secretário Regional dos Assuntos Sociais indeferiu o recurso hierárquico interposto pela Autora, o qual tem o seguinte teor (doc n° 1 junto à PI):
«(…)
MATÉRIA DE FACTO
1. No âmbito do concurso de provimento para uma vaga de chefe de serviço de Pneumologia, da carreira médica hospitalar, aberto por aviso publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.° 61 de 13 de Março de 2003, a candidata Dr.ª M… interpôs recurso do despacho de homologação da lista de classificação final, de 10 de Fevereiro de 2009, requerendo para tanto a anulação da lista de classificação final e a revogação do despacho recorrido nos termos e com os seguintes fundamentos:
a) Falta de audiência prévia, com violação dos artigos 100.° e seguintes do Código do Procedimento Administrativo (CPA) e n.° 63 do Regulamento dos Concursos de Habilitação ao Grau de Consultor e de Provimento na Categoria de Chefe de Serviço da Carreira Médica Hospitalar, aprovado pela Portaria n.° 177/97, de .11 de Março;
b) Falta de notificação do texto integral do acto administrativo, com violação do n.° 1 do artigo 68.° do CPA;
c) Erros no critério valorativo e na fundamentação, omissão de factos e ainda erro nos pressupostos, desigualdade.
2. Nesta sequência e dando cumprimento ao disposto no n.° 67.1 do referido Regulamento, o presente recurso foi enviado ao Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira E.P.E., o qual se pronunciou sobre os seus termos.
3. Quanto ao recurso propriamente dito, verificamos que o mesmo é tempestivo e a parte é legítima.
4. Relativamente às questões materiais ou de fundo, constatamos o seguinte:
I - Quanto à alegada falta de audiência prévia com violação dos artigos 100,° e seguintes do CPA e n.° 63 do Regulamento
a) Na sequência de anterior recurso interposto pela ora recorrente, no âmbito deste concurso, por despacho de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais, de 12 de Março de 2006, foi determinado a revogação do anterior acto de homologação da lista de classificação final, bem como a repetição das operações concursais a partir da acta da definição dos critérios;
b) Neste sentido, em conformidade com o n.° 63 do referido Regulamento, concluída a elaboração da nova lista de classificação, o júri deveria ter procedido à audiência dos interessados;
c) Constatamos porém que, por forma a dar cumprimento ao despacho de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais, o júri ouviu os dois candidatos relativamente às questões suscitadas no referido despacho, tal como resulta das actas n.ºs 7e 8, elaboradas na sequência da discussão da prova pública dos candidatos;
d) Assim, atendendo que os candidatos já haviam se pronunciado relativamente a todas as questões que importam à decisão, o júri, poderia, em acta, ter dispensada a audiência prévia, nos termos da alínea a) do n.° 2 do artigo 103.° do CPA;
e) Por outro lado, verificamos que o júri mesmo que tivesse procedido à audiência prévia, este não iria alterar o sentido da sua decisão, porquanto já conhecia a opinião da recorrente, tendo-a informado sobre a sua decisão, conforme resulta das actas n.ºs 7 e 8, pelo que a realização da referida audiência não traria qualquer efeito útil à decisão;
f) Nesta senda, o Acórdão do Tribunal Administrativo do Sul, de 20/03/2003, processo n.° 10864/01, refere que “II - Mesmo no domínio dos actos discricionários o tribunal pode negar relevância anulatória ao incumprimento do art. 100° do CPA quando, pelo conteúdo do acto e peia incidência da sindicação que foi chamado a fazer possa afirmar com inteira segurança que o cumprimento de tal formalidade em nada modificaria o conteúdo do acto.”

II - Quanto à alegada falta de notificação do texto integral do acto administrativo, com violação do n.° 1 do artigo 68.° do CPA
a) Após a homologação da lista de classificação final dos candidatos pelo Conselho de Administração do Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira, E.P.E., em 10 de Fevereiro de 2009, a recorrente foi notificada da referida lista, através da cópia da publicação da mesma em Diário da República;
b) Nos termos do disposto na alínea a) do n.° 1 do artigo 68.° do CPA, aplicável por força do n.° 1 do mesmo Regulamento, a notificação deve conter o texto integral do acto administrativo, ou seja, para além da lista de classificação final o júri deveria ter enviado, desde logo, os fundamentos da sua decisão, de modo a que a recorrente disponha de todos os elementos necessários à defesa da sua posição;
c) Salientamos contudo que, nos termos do n.° 2 do artigo do 60.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos "quando a notificação ou a publicação do acto administrativo não contenham a indicação do autor, da data ou dos fundamentos da decisão, tem o interessado a faculdade de requerer à entidade que proferiu o acto a notificação das indicações em falta ou a passagem de certidão que as contenha, bem como, se necessário, de pedir a correspondente intimação judicial, nos termos previstos nos artigos 104° e seguintes deste Código
d) Neste sentido, vem o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 2002/07/04, processo n.° 10889/01, referir que " / - A notificação deve conter o texto integrai do acto administrativo. II - Se a notificação de um acto não contiver todos os requisitos enumerados no n° 1 do art° 68° do C.P.A., a consequência a retirar não é a da respectiva nulidade, mas sim a de o interessado poder fazer uso da faculdade prevista no art° 31° da LPTA (notificação insuficiente).”]
d) Neste sentido, vem o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 2002/07/04, processo n.° 10889/01, referir que " / - A notificação deve conter o texto integraI do acto administrativo. II - Se a notificação de um acto não contiver todos os requisitos enumerados no n° 1 do art° 68° do C.P.A., a consequência a retirar não é a da respectiva nulidade, mas sim a de o interessado poder fazer uso da faculdade prevista no art° 31° da LPTA (notificação insuficiente).”]

III - Erro no critério valorativo, erro de fundamentação, omissão de factos e ainda erro nos pressupostos, desigualdade.
a) No que concerne aos critérios valorativos, verificamos que o júri procedeu à alteração da acta da definição dos critérios, eliminando o item dedicação exclusiva e relevando o tempo de serviço prestado nas funções de assistente hospitalar, passando os 0,2 valores que lhe estavam atribuídos para este último, actuando deste modo no estrito cumprimento do referido Despacho de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais, de 12 de Março de 2006, com a consequente reposição da legalidade;
b) Por outro lado, no que concerne à atribuição, ao candidato Dr. V…, da pontuação nos itens actividades docentes {0,1 valores) e chefia de equipa de urgência {0,5 valores), pontuação essa objecto de reparos no referido Despacho, verificamos que o júri, deliberou manter a mesma pontuação, como resulta das actas n.ºs 7 e 8;
c) Salientamos, contudo, de acordo com o princípio do aproveitamento do acto administrativo, mesmo que o júri devesse retirar a pontuação nos itens actividades docentes (0,1 valores) e chefia de equipa de urgência (0,5 valores), a ordem da lista de classificação final mantinha-se, permanecendo o candidato Dr. V… em 1.° lugar, com a classificação de 16.26 valores, e a recorrente em 2.° lugar, com a classificação de 15,00 valores;
d) Neste sentido, vem o acórdão do Supremo do Tribunal Administrativo, de 4 de Dezembro de 2002, processo n.° 0627/02, referir que “ IV - Torna-se irrelevante para efeitos de anulação do acto recorrido, o vício decorrente de errada autonomização de determinado factor de qualificação quando se pode concluir com segurança que o acréscimo de pontuação máxima que, sem tal ilegalidade, poderia ser atribuída ao recorrente não alterava a sua posição relativa na lista de classificação final.”.
CONCLUSÃO
Nesta sequência, somos do entendimento que o recurso interposto pela Dr.ª M… não merece provimento pelas razões supra expostas.
Mais se informa V. Ex.a que concordamos com o entendimento perfilhado pelo Serviço de Saúde da Região Autónoma da Madeira E.P.E. no âmbito da pronúncia efectuada em 8 de Maio de 2009, nos termos do n.° 67.2 do Regulamento dos Concursos de Habilitação ao Grau de Consultor e de Provimento na Categoria de Chefe de Serviço da Carreira Médica Hospitalar, aprovado pela Portaria n.° 177/97, de 11 de Março.
(...).
P) Em 29-06-2009 a A, foi notificada do despacho de indeferimento do recurso hierárquico, por ofício datado de 23-06-2009;
Q) A presente acção deu entrada em 27-09-2009 (fls 1, dos autos).
A convicção do tribunal formou-se no teor dos documentos identificados em cada ponto dos factos provados. (…)».

II.2. De direito

i) Do erro de julgamento de direito em que incorreu a decisão recorrida ao ter anulado o ato impugnado – cfr. alínea O (2.ª) da matéria de facto -, que indeferiu o recurso hierárquico que foi interposto do ato de homologação da lista de classificação final do Concurso de Provimento Interno Geral para Chefe de Serviço de Pneumologia da Carreira Médica Hospitalar do quadro do Centro Hospitalar do Funchal, por omissão de uma formalidade essencial, por falta de audiência prévia, ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do art. 103.° (atual art. 124.º, do CPA) e n.º 43.1 do Regulamento do Concurso.

Sobre esta questão, e pese embora se conheça, e se tenha presente, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, que decorre, designadamente, dos seguintes arestos:

Acórdão STA de 15.05.2004, P. 037/14):

«(…) VII - Pode ser dispensada a audiência, nos termos do previsto no art. 103º, nº 2, alínea a), do CPA, se, no âmbito de um concurso, os concorrentes são chamados a defender o seu currículo precisamente para disporem de oportunidade de se pronunciarem sobre as questões que importem à decisão que outras não são afinal senão o seu próprio entendimento sobre os pontos marcantes do mesmo».

Acórdão STA de 16.03.2017, P.038/14:

«(…) II – Justifica-se a dispensa de audiência, nos termos do art. 103º, nº 2, alínea a), do CPA, por ter sido assegurada a participação no procedimento administrativo de todos os candidatos através da defesa pública do respectivo currículo com a apresentação dos elementos curriculares que os candidatos entendem relevantes, à luz dos factores de graduação legalmente previstos e constantes do aviso do concurso».

E, mais recentemente, no acórdão STA de 15.010.2020, P. 079/19.1BALSB, e no qual se sumariou também que «(…) VI - Ainda que possa ter-se por insuficientemente fundamentada a dispensa da audiência dos interessados por invocada “urgência na decisão” (nos termos do art. 124º nºs 1 a) e 2 do CPA), a fundamentação cumulativa dessa dispensa atenta “a qualidade dos concorrentes, a natureza curricular do concurso e a respetiva tramitação, designadamente a defesa pública do currículo” (nos termos da alínea e) do nº 1 do citado art. 124º) é suficiente para afastar vício formal de preterição de audiência dos interessados

No caso em apreço, e tal como decidiu o tribunal a quo, «a acta n° 7, que tinha como proceder à prova pública de discussão do currículos dos candidatos decidiu também definir os critérios de valorização, no que respeita ao item/critério exclusividade, e assim obter a anuência dos candidatos à alteração do critério, tendo a A se oposto.

Se, por um lado o art° 63° da Portaria determina a obrigatoriedade de audição após a elaboração da lista de classificação por outro lado, a acta n° 7 não tem esse “condão”, porquanto não apenas não estavam definidos todos os critérios, como determinava o art° 59° da Portaria (conforme ordenado no despacho revogatório), como também a lista de classificação só foi elaborada posteriormente, sendo também sobre a lista de classificação final que recairia o dever de ouvir os candidatos em sede de audiência prévia.

Efectivamente através da reunião de 14 de Abril de 2008 o direito que foi dado à A foi o de se pronunciar sobre a alteração ao critério de valorização exclusividade, por forma a que a dedicação exclusiva deixasse de ser critério de ponderação e que os 0,2 valores que lhe estavam destinados fossem antes atribuídos ao tempo de exercício de funções como assistente hospitalar.»

De onde resulta que, aquando a discussão pública dos currículos dos candidatos, alguns dos fatores de graduação legalmente previstos e constantes do aviso do concurso estavam controvertidos, pelo que não pode este tribunal concluir, como pretendem os Recorrentes, que a Recorrida, A. na ação, teria tido, nesse momento – transcrito na ata n.º 7, por referência a alínea C (2.ª) da matéria de facto – oportunidade de se pronunciar sobre as questões que importem à decisão a proferir e seguramente não sobre o sentido da decisão, pois que não resulta dos autos que o mesmo lhe tenha sido efetivamente comunicado.

Acresce que, no caso em apreço, em causa estava a repetição de uma apreciação levada a acabo por um júri, repetição essa que havia sido motivada pela verificação de falta de fundamentação do ato anterior, como resulta da informação/fundamentação do despacho de revogação de 12.03.2007 – cfr. alínea A (2.ª) da matéria de facto – sendo que, efetivamente, a lista de classificação final anexa à ata n° 8 – cfr. alínea F (2.ª) da matéria de facto -, tem fundamentação diversa do ato anterior, fundamentação diversa essa onde repousa o ato impugnado, pelo que imperioso se torna concluir que foi preterida uma formalidade essencial ao não se ter dado cumprimento ao direito de audiência prévia da Recorrida, A. na ação, antes de ser tomada a decisão ora impugnada.

Razão pela qual, improcede este fundamento dos recursos.

Invoca ainda a Recorrida Secretaria Regional que «(…) Tendo em conta que os critérios de classificação, reclamados pela Autora, ora Recorrida, foram alterados e conduziram a uma decisão favorável à própria, sendo certo que os demais critérios não foram alterados, e a A., ora recorrida, já se tinha pronunciado sobre os mesmos (…) A audiência dos interessados, neste caso, era dispensável, ao abrigo do disposto na al. b), n.° 2, do artigo 103.° do CPA; (…) Mal andou o Tribunal a quo, ao anular o acto impugnado por considerar haver vício de violação de lei, por omissão da audiência prévia, pois, além de a classificação final com critérios diversos e uma determinada fundamentação só terem beneficiado a Autora, ora Recorrida, não atendeu ao preceituado no artigo 103.° do CPA » - cfr. conclusões de recurso constantes das alíneas H) a K). Mas sem razão.

A natureza favorável do ato para o efeito pretendido, é aferida globalmente, ou seja, se com a prática do novo ato, e não obstante a falta de audiência prévia, a Recorrida, A. na ação, tivesse ficado em 1.º lugar, o que não sucedeu no caso em apreço. Acresce que, na verdade, e pese embora «(…) a presidente do júri propôs que, como única forma de se proceder em conformidade com os Despachos de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de Março de 2007 e de 9 de Abril de 2007, respeitando o espírito e a proporcionalidade que esteve na base da elaboração da acta n.° 1, sejam atribuídos os 0,2 valores que estavam destinados à dedicação exclusiva ao tempo de exercício das funções como assistente hospitalar, sendo aqueles 0,2 valores assim distribuídos: < 5 anos: 0,1 valores; = > 5 anos: 0,2 valores.» , conforme resulta da at n.º 8, constante da alínea F (2.ª) da matéria de facto, na mesma ata, e em decisão imediatamente seguinte, o mesmo júri decidiu, após discutirem «entre si as demais questões levantadas pela candidata Dr.ª M…, referidas também no Despacho de Sua Excelência a Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de Março de 2007, tendo a presidente do júri proposto que as mesmas não fossem alteradas, por entender que esta candidata não tem razão nos argumentos que aduziu.» - idem.

Razão pela qual imperioso se torna concluir que o ato impugnado foi desfavorável à Recorrida, conforme melhor explicitaremos também infra, falecendo, também por este motivo o imputado erro de julgamento à sentença recorrida.

ii) Do erro de julgamento em que incorreu a sentença recorrida ao ter anulado o ato impugnado, por falta de fundamentação, ao abrigo dos art.s 89.° e 124.° e 125.º, todos do CPA1991 (atuais art.s 117.º e 152.º e 153.º, do CPA).

O discurso fundamentador do acórdão recorrido, quanto a este aspeto, foi o seguinte:

«(…) A Autora defende na sua petição inicial que o acto impugnando sofre dos mesmos vícios que o anterior, pois na acta n° 8 nada foi corrigido ou reponderado, salvo no tocante ao sub item exclusividade, com valoração 0,2.

Com efeito, considerando os fundamentos da lista de classificação final levada ao probatório no ponto K) e a lista de classificação final levada ao probatório no ponto Y) assiste razão à Autora.

Vejamos as questões colocadas pela Autora nesta parte:

«Imagem no original»

«Imagem no original»

(…)

Observa-se, pois, que a fundamentação da lista de classificação final que está subjacente ao despacho impugnado, mantém-se incólume, no que respeita ao vício de falta de fundamentação e que o despacho de 12 de Março de 2006, já nitidamente apontava. Basta verificar o quadro que se reproduziu supra.(…)». (sublinhados nossos).

Desde já se adianta que o assim decidido é para manter. Vejamos porquê.

Decorre da simples leitura da informação em cujos termos e conclusão se escudou o despacho de 12.03.2007, que revogou o anterior ato de homologação da graduação dos candidatos em apreço – cfr. alíneas R) e A) (2.ª) da matéria de facto – por confronto com o teor do ato impugnado, que este último ato apenas deu cumprimento aos pontos n.º 13 e 14 daqueloutro ato, que aqui se transcrevem: «(…) 13. Assiste já inteira razão à recorrente quando alega que o júri viola a lei ao estabelecer, nos critérios de selecção do concurso, a contagem exclusiva do tempo prestado na categoria de assistente graduado em contravenção com o disposto no n°. 59 al.a) da Portaria 177/99, que manda atender obrigatoriamente ao tempo de serviço prestado quer nas funções de assistente quer nas de assistente graduado. Sob pena de gritante vício de violação de lei, não pode o júri alterar os critérios que estão legalmente previstos.

14. O mesmo se diga, com o que temos de concordar com a recorrente, da circunstância de o júri ter incluído o regime de dedicação exclusiva, num item que se refere exclusivamente ao tempo de serviço, independentemente do regime de trabalho em que este foi obtido. Fazer relevar uma noção de “tempo de funções” acrescido pelo maior número de horas de trabalho semanal prestado naquele regime, é sofismar e subverter o critério legal de tempo de serviço para efeitos da al, a) do n°. 59 da Portaria, que deve aferir-se exclusivamente em dias, meses e anos e não a horas de trabalho.»

Deixando por cumprir o que resultava dos respetivos pontos n.º 15 e ss., e que aqui se transcrevem também para maior facilidade de exposição:

«(…) 15. Relativamente à chefia de equipa de urgência, questionada pela recorrente, e ao contrário do que afirma o júri, não existe no processo ou no curriculum do candidato qualquer documento de certificação emitido pelo Director do Serviço de Pneumologia e ainda que existisse, a natureza da função e do serviço fariam deste entidade incompetente para a certificação. Acresce que o documento designado por n°. 12 no curriculum do candidato, é uma cópia sem referência ao organismo ou entidade emissores, sem data e assinatura. A imprecisão do documento deveria ter suscitado ao júri a exigência da sua comprovação, demandando se para tanto o candidato ou suscitando-se a sua confirmação ex officio aos serviços, para poder valorizar e pontuar com segurança a referida chefia, sob pena de manifesta falta de fundamentação, violando-se os art°.s 124 e 125 do CPA e 268 n°. 3 da CRP.

16. O mesmo se diga das funções docentes em cursos de pós-graduação em medicina cuja comprovação não resulta de qualquer documento constante do curriculum do candidato.»

Isto, sem deixar de assinalar ainda que: «17. Relativamente às restantes alegações de recurso da candidata, maxime as constantes dos art°.s 35 a 38 e relativas aos trabalhos apresentados, alguns até premiados, é indiscutível que estamos no âmbito da discricionariedade técnica do júri. No entanto,

18. Na acta de subsunção da matéria curricular aos critérios estabelecidos em acta anterior, limitou-se o júri a designar o número de actividades, publicações e trabalhos desenvolvidos, atribuindo-lhes a correspondente valoração quantitava. Ora, se o critério erigido fosse o da apresentação meramente quantitativa, a avaliar pelo número de trabalhos e actividades, nada haveria a opor ao caminho trilhado pelo júri porquanto seria fácil e simples deduzir a respectiva classificação e a forma como foi apurada.

19 Sucede, porém, que o próprio júri em sede de audiência prévia vem dizer que o critério adoptado foi um critério subjectivo, de valorização da qualidade das funções prestadas em cursos da área médica; de valorização da qualidade das publicações e dos trabalhos, do relevo científico das publicações, etc. Deste modo, ao socorrer-se de critérios subjectivos, cuja legitimidade é indiscutível em sede de discricionariedade técnica, uma matéria tão específica como é a ciência médica, o júri tinha obrigação legal de proceder à fundamentação completa e rigorosa das suas opções de classificação, para que fosse visível e os destinatários o pudessem perceber, o iter cognoscitivo e valorativo por si prosseguido, sem o que tem de se entender que há manifesta falta de fundamentação, violando-se o art° 124° e 125°do CPA e 268°n° 3 da CRP.»

Razões pelas quais ali se havia concluído que «deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se o acto de homologação da lista de classificação final do concurso praticado pelo CA do SRS, EPE, ordenando-se a repetição das operações concursais a partir da acta de definição dos critérios, devendo o júri de concurso conformar a sua actividade de acordo com os critérios definidos na Portaria 177/97 e proceder à adequada fundamentação da aplicação dos critérios adoptados à matéria curricular, com as legais consequências.» - cfr. alíneas R) e A), (2.ª) da matéria de facto.

De onde decorre que o 2.º ato de homologação da graduação final do concurso em apreço – cfr. alínea P) da matéria de facto –, revogado que foi pelo citado despacho de 12.03.2007 – cfr. alíneas R e A (2.ª) da matéria de facto -, para além de ter ponderado fatores de graduação legalmente inadmissíveis – o exercício de funções em exclusividade e a contagem de tempo de serviço apenas como assistente graduado – padecia de falta de fundamentação – por falta de comprovação dos fatores referentes ao exercício de funções de chefia e de funções docentes em cursos de pós-graduação em medicina - e, bem assim, em sede de avaliação dos trabalhos publicados e/ou comunicados, também por falta de fundamentação, ao ter elegido, à margem de uma mera quantificação do número de trabalhos ou funções exercidas, aparentemente suficiente, mas que não foi seguida pelo júri, pois que optou por levar a cabo uma avaliação subjetiva destas, sem a fundamentar o juízo subjetivo que levou a cabo, e cuja distinção se depreende, apenas, pela diferente valoração de cada item, por candidato.

Ora, em sede de novo ato de homologação – cfr. alíneas F (2.ª), G (2.ª e H (2.ª) da matéria de facto – e tal como resulta da decisão recorrida, pouco ou nada foi alterado, pelo menos nos seus aspetos essenciais, pois que o Recorrente CI mantém a avaliação nos fatores referentes ao exercício de funções de chefia e de funções docentes em cursos de pós-graduação em medicina - e, bem assim, em sede de avaliação dos trabalhos publicados e/ou comunicados, sem a Recorrente Secretaria Regional ter solicitado a junção, ou promovido ela própria, dos respetivos documentos comprovativos e não aduzindo qualquer fundamentação sobre a valoração dos trabalhos ou comunicações ou sobre o exercício de funções docentes, alegando esta que se trata de questão integrada na sua margem de livre apreciação, mas sem razão.

Assim sendo, a repetição da decisão do júri, cuja homologação foi mantida pelo ato impugnado nos autos, não foi suficiente para afastar a anulabilidade deste, pois que se mantém os anteriores vícios de falta de fundamentação.

Repare-se que a avaliação dos trabalhos se insere, de facto, na margem de livre apreciação da Administração, mas o exercício dos seus poderes, dentro dessa margem, mantem a exigência, até acrescida, de fundamentação.

É insofismável o entendimento doutrinal e jurisprudencial no sentido de que os atos praticados no âmbito da chamada discricionariedade administrativa, exigem particular esforço de fundamentação , pois que, só assim, os tribunais poderão validar eventuais casos de erro manifesto, inadmissibilidade ostensiva dos critérios usados, ou patente desproporcionalidade ou de violação de outros princípios gerais da atividade administrava que possam, devam, justificar a sua invalidade e subsequente controlo jurisdicional.

Por seu turno, a exigência de documentos comprovativos de factos invocados nos currículos dos candidatos, quando tais elementos resultam controvertidos, está fora dessa mesma margem de livre apreciação, pois que entendimento contrário seria conceder à Administração o livre arbítrio na decisão, pois que se permitiria que decidisse segundo perceções, relações de confiança ou outras, em matérias em que regem princípios importantes da atividade administrativa, como sejam, os da boa-fé, justiça e imparcialidade.

Valorar o exercício de funções de chefia sem existir no procedimento prova documental de tal exercício, a requerimento do interessado ou junto oficiosamente pela Administração, é um erro procedimental que gera a invalidade do ato. Questionado que foi esse exercício, e bem assim, o exercício de funções docentes, pelos mesmos motivos, impunha-se à Administração ora Recorrente Secretaria Regional que tivesse diligenciado pela sua junção. O que não sucedeu, ao arrepio do disposto no art. 89.° do CPA1991 (atual art. 117.º do CPA).

Ora, tais circunstâncias conduzem a que se considere, indubitavelmente, que a fundamentação do ato impugnado é obscura e insuficiente, o que redunda no vício de falta de fundamentação, nos termos dos art.s 124.° e 125.º, todos do CPA1991 (atuais art.s 152.º e 153.º, do CPA) tal como decidiu o tribunal a quo, e que, nos termos supra expostos, será de manter.

Aqui chegados, e tendo mantido a decisão recorrida no que toca à verificação de vícios – preterição de audiência prévia e falta de fundamentação – que determinam a anulabilidade do ato impugnado, resta apreciar os invocados erros de julgamento imputados à decisão recorrida pelos Recorrentes, de que, no caso, o tribunal a quo não devia, ainda assim, ter mantido a decisão de anulação, fazendo apelo ao princípio do aproveitamento do ato administrativo.

Desde já se adianta que também aqui não têm os Recorrentes razão. Vejamos porquê.

Na vigência do CPA1991, em vigor à data da decisão recorrida, constituía jurisprudência reiterada e pacífica do Supremo Tribunal Administrativo que «(…) por força do princípio do aproveitamento do ato e da inoperância dos vícios, a constatação de que um ato administrativo enferma de um vício nem sempre justifica que ele seja anulado, não se justificando a anulação, designadamente, quando a existência do vício de forma não afetou, no caso concreto, a sua decisão nem lesou os interessados» (1) e que «o juiz administrativo pode negar relevância anulatória ao erro da Administração, mesmo no domínio dos atos proferidos no exercício de um poder discricionário, quando, pelo conteúdo do ato e pela incidência da sindicação que foi chamado a fazer, possa afirmar, com inteira segurança, que a representação errónea dos factos ou do direito aplicável não interferiu com o conteúdo da decisão administrativa porque não afetou as ponderações ou as opções compreendidas (efetuadas ou potenciais) nesse espaço discricionário»(2), assim se relevando que, nestas circunstâncias estava em causa, «no fundo, (…) uma decorrência do princípio da preponderância do conteúdo sobre as formas, que aponta para a não invalidação de um ato administrativo quando, embora enfermando de ilegalidade formal ou externa, se possa afirmar, de forma inequívoca, que o ato só podia ter o conteúdo que teve em concreto.
Nestas situações, após análise casuística das circunstâncias particulares e concretas de cada caso, concluindo-se que a repetição do procedimento iria conduzir necessariamente à prática do ato com o mesmo conteúdo, impõe-se não anular o ato em causa
.» (3)

Razão pela qual, e de acordo com aquele Colendo Supremo Tribunal, o aproveitamento do ato administrativo só poderia ocorrer relativamente a atos praticados ao abrigo de poderes vinculados ou quando nenhuma outra decisão se impusesse ao caso concreto, ou seja, nas denominadas situações em que tivesse ocorrido uma «redução da discricionariedade a zero». (4)

Este princípio, na sua tríplice identidade, passou a ter consagração positiva com a alteração do Código de Procedimento Administrativo, levada a acabo por via do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 07.01., mais concretamente, no nº 5 do atual art. 163.º do CPA, que passou a dispor, expressamente, o seguinte: «Não se produz o efeito anulatório quando:

a) O conteúdo do ato anulável não possa ser outro, por o ato ser de conteúdo vinculado ou a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma solução como legalmente possível;

b) O fim visado pela exigência procedimental ou formal preterida tenha sido alcançado por outra via;

c) Se comprove, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo.»

Com particular acuidade para a situação vertida no caso em apreço, e já à luz do disposto no citado art. 163.º, n.º 5, do CPA, o Supremo Tribunal Administrativo teve já ocasião de dizer, por acórdão de 14.01.2021, proferido no processo n.º 0195/20.7BEPRT que:

«(…) O princípio do aproveitamento do acto com fundamento na alínea c) do n.º 5 do artigo 163.º do CPA tem de ser interpretado em conformidade com os princípios que regem o exercício da actividade jurisprudencial, maxime, o princípio da separação dos poderes, do qual deflui, indubitavelmente, que aos Tribunais está vedada a possibilidade de decidir em substituição da Administração: Julgar não é administrar.

Por essa razão, ou seja, tendo presente aquela linha de fronteira, tem de interpretar-se o disposto no referido artigo 163.º, n.º 5, al. c) do CPA em conformidade com este princípio fundamental, o que significa que a comprovação que o tribunal pode fazer “sem margem para dúvida, que mesmo sem o vício, o acto teria sido praticado com o mesmo conteúdo” não abrange casos, como o presente, em que existe um défice de fundamentação da decisão administrativa negativa. Em outras palavras, ainda que o Tribunal depreenda dos elementos trazidos ao processo, em especial do processo administrativo, que é muito provável que a decisão que não foi devida ou correctamente fundamentada venha a ser renovada pela Administração, ainda assim ele não pode neutralizar os efeitos anulatórios daquele vício quando daí resulte um obstáculo ao conhecimento efectivo pelo destinatário do acto da sua concreta motivação ou uma motivação da decisão assente na sentença judicial. Não pode quando essa motivação não resulta evidente do enunciado das disposições legais ou regulamentares, incluindo os casos em que a decisão tenha de ser verbalizada para que o destinatário conheça as razões da subsunção dos factos ao direito e o preenchimento dos espaços de valoração próprios da administração, mesmo que seja perceptível e provável o enquadramento que a entidade administrativa fará da situação à luz daqueles enunciados. E não pode – repita-se – porque o Tribunal não pode substituir-se à Administração nessa verbalização, mesmo que seja para remeter para elementos que já constam do processo, mas que não constam da fundamentação do acto impugnado. (…)» (sublinhados nossos).

Antes, e sob uma outra perspetiva, mas que se revela também relevante para o caso em apreço, já aquele Colendo Tribunal, num processo em que também se discutia a atuação de um júri num concurso, aduziu cristalinamente que «a avaliação é tarefa própria da entidade demandada, não se apresentando, no caso, como mera subsunção matemática, pelo que o tribunal não poderá substituir-se ao juízo valorativo a efectuar por ela. Assim, não era e não é possível ao tribunal concluir pela alegada irrelevância», pese embora o ali recorrente tivesse sustentado que «(…) «outra avaliação não poderia ser dada à Autora, mesmo que a segunda Pós Graduação por si realizada constasse do parecer».

Aderindo inteiramente à doutrina que dimana dos arestos supra citados, imperioso se torna concluir pela inaplicabilidade do princípio do aproveitamento do ato administrativo, hoje positivado no já citado e supra transcrito n.º 5 do art. 163.º do CPA.

E isto porque decorre de todo o exposto, que estamos perante um ato que padece do vício de falta de fundamentação, sendo certo que o princípio do aproveitamento do ato não comporta uma tal amplitude que permita que o tribunal se substitua à Administração na fundamentação da valoração aplicada pelo júri, quando a respetiva discricionariedade não esteja, como não está no caso em apreço, reduzida a zero.

Por seu turno, a alternativa defendida pelos Recorrentes, de se retirarem as pontuações atribuídas nos questionados itens também não releva para este efeito, por forma a concluir-se que o ato impugnado não poderia ser outro que não fosse a atribuição de maior valoração ao currículo do Recorrente CI, pois que não basta atentarmos apenas na valoração atribuída nos itens correspondentes ao tempo de chefia, à chefia de Urgência e ao exercício de funções docentes, pois que o vicio de falta de fundamentação também afeta, como vimos, a avaliação dos trabalhos publicados e/ou comunicados, tendo sido os candidatos avaliados, neste item, com uma diferença de valores.

Assim, e considerando que o Recorrente CI obteve uma classificação final de 16,86 valores e que a Recorrida, A. na ação, uma classificação final de 15 valores, o resultado da subtração de todas as avaliações que padecem do aludido vício, como exercício teórico para se aferir da possibilidade de aproveitamento do ato, cairia por terra, pois que sem o reexercício do poder de avaliação a levar a cabo pelo júri, um desconto cego da avaliação de tais itens redundaria numa classificação final de [16, 86 – (1,0 – chefia de “tira” de enfermagem desde 1999”+ 0,5 – chefia de urgência + 0,1- atividade docente + 1,25 publicações e/ou comunicações) = 14,01] ou seja, abaixo da classificação de 15 valores atribuída à A., ora Recorrida.

Resultando, assim, e ao contrário do que pugnam os Recorrentes, expurgadas que fossem as avaliações afetadas pelo vício de falta de fundamentação, tal importaria uma efetiva alteração do conteúdo do ato impugnado, pelo que, também por este motivo, não se poderia aplicar ao caso o invocado princípio do aproveitamento do ato administrativo em qualquer uma das suas três vertentes, em virtude de, e concluindo, (i) não estarmos perante um ato praticado ao abrigo de poderes vinculados e nem a discricionariedade administrativa ter sido reduzida a zero no procedimento em apreço; (ii) não se comprovou, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo, (iii) assim como não resulta dos autos, antes pelo contrário, face a todo o exposto, que o fim visado pela exigência de fundamentação do ato tenha sido alcançado por outra via.

III. Decisão

Nestes termos e por todos os fundamentos expostos, acordam os juízes da secção do contencioso administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e em manter a decisão recorrida.

Custas pelos Recorrentes em partes iguais.

Lisboa, 23.06.2022

Dora Lucas Neto

Pedro Nuno Figueiredo

Ana Cristina Lameira