Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:167/20.1BEFUN
Secção:CA
Data do Acordão:05/20/2021
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:CONTRATAÇÃO PÚBLICA;
TERMO OU CONDIÇÃO;
CLÁUSULAS TÉCNICAS DO CADERNO DE ENCARGOS;
CORREÇÃO;
ESCLARECIMENTOS.
Sumário:I. Não incorre a sentença recorrida em erro de julgamento de facto, por omissão de factos relevantes, se a matéria de facto que a Recorrente pretende que seja aditada não corresponde a verdadeiros factos, antes a juízos conclusivos, de facto e/ou de direito, extraídos do conjunto da prova produzida em juízo.

II. Estão em causa alegações sem substrato factual para poderem constar do julgamento de facto, antes juízos de facto e de direito a formular no âmbito do julgamento da questão de direito, dizendo, por isso, à questão de direito e não à questão de facto.

III. Verificando-se no confronto entre o estabelecido nas peças do procedimento e o mencionado na proposta da Contrainteressada, que a proposta apresenta um plano de pagamentos em inobservância do disposto nos pontos 3.1.2. e 3.1.4. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, facto que é admitido nas contestações da Contrainteressada e da Entidade Demandada e no âmbito dos recursos jurisdicionais, não existe qualquer controvérsia acerca desse desrespeito pela proposta, o qual não pode ser considerado como um mero lapso, equívoco ou erro, passível de suprimento ou correção nos termos do artigo 72.º do CCP, por se tratar de um termo ou condição que viola o disposto nas Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, isto é, um aspeto da execução do contrato não submetido à concorrência, que determina a exclusão da proposta, nos termos do disposto no artigo 70.º, n.º 2, al. b) do CCP.

IV. Trata-se de um requisito exigido nas peças do procedimento e que, como tal, deve constar da proposta apresentada, ou seja, um elemento integrante da proposta.

V. A Administração definiu nas Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos as condições a que está disposta a contratar, por corresponderem a aspetos essenciais para a correta prossecução do interesse público subjacente à decisão de contratar, pelo que, está em causa um requisito que é imposto e definido pela própria entidade adjudicante e a que não está disponível para renunciar, razão porque se trata de aspeto respeitante à execução do contrato não submetido à concorrência.

VI. Comprovando-se que a proposta não respeita tal aspeto vinculativo das peças do procedimento, não se poderá concluir pela possibilidade de correção, aperfeiçoamento ou sanação, porque tal se traduziria numa alteração do conteúdo da proposta e num desrespeito às vinculações previamente estabelecidas nas peças do procedimento.

VII. A isso não obsta a falta de intencionalidade de inobservância das peças do procedimento por parte da Contrainteressada, por se tratar de um mero lapso, nem tão pouco a circunstância de ter subscrito e apresentado a declaração do Anexo I-M, que aceitou respeitar, obedecer e cumprir com todo o conteúdo do Caderno de Encargos.

VIII. Não se podendo extrair das peças do procedimento ou da lei que as Cláusulas Gerais prevalecem sobre as Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, as regras legais de interpretação conduzem ao entendimento inverso, de as normas especiais prevalecerem, pela sua vocação de regulação específica, sobre as respetivas normas gerais.

IX. Entendendo a concorrente que existia a invocada contradição entre as referidas Cláusulas do Caderno de Encargos, dispunha da faculdade prevista no artigo 50.º, n.º 1 do CCP, de solicitar, no primeiro terço do prazo fixado para a apresentação das propostas, os esclarecimentos necessários à boa compreensão e interpretação das peças do procedimento e, no mesmo prazo, do dever de apresentar uma lista na qual identifiquem, expressa e inequivocamente, os erros e as omissões das peças do procedimento por si detetados.

X. Permitir a correção ou sanação da proposta equivaleria admitir a apresentação de um requisito ou termo ou condição novo, que a proposta antes não previa, ou seja, permitir que a concorrente através de uma alteração à proposta apresentada, se vinculasse a um requisito ou termo ou condição a que anteriormente não se vinculou, no que se traduziria numa modificação ao conteúdo material da proposta e de um seu termo ou condição, com a consequência, não apenas de ferir a legalidade aplicável, como de retirar uma vantagem, em detrimento ou em desigualdade com a outra concorrente que apresentou proposta ao procedimento.

XI. O procedimento pré-contratual é formalizado e submetido a parâmetros de vinculação legal e embora seja legalmente possível, nos termos previstos no artigo 72.º do CCP, em certas situações, respeitante a formalidade não essencial, a sanação ou suprimento de qualquer omissão ou incompletude da proposta, obstando à consequência gravosa e desproporcional da sua imediata exclusão, essa possibilidade não se verifica em situações como a que ora se configura, em que está em causa um termo ou condição da proposta.

XII. A natureza do procedimento, atinente a procedimento de contratação pública, submetido a um quadro normativo preciso e vinculado, fortemente determinado pelo direito da União Europeia, sem qualquer margem para aplicação de critérios de valoração administrativa, que possam ser pautados por juízos de oportunidade ou conveniência, ditam o juízo de inaplicabilidade do princípio da proporcionalidade nos termos defendidos pelas Recorrentes.

XIII. Não sendo o direito da contratação pública insensível à proporcionalidade como princípio fundamental de direito, por estar em causa um critério normativo relevante, a proporcionalidade tem aplicação aos procedimentos de contratação pública no âmbito e termos definidos pelo quadro legal aplicável, ou seja, estritamente segundo as valorações previamente assumidas pelo legislador.

XIV. Não acolhe o ordenamento jurídico a consideração da relativa ou diminuta significância ou impacto financeiro da falta da proposta para obstar à exclusão da proposta num caso como o descrito em juízo, em que está em causa a falta de um elemento essencial da proposta, ainda que o mesmo apresente diminuta repercussão económica no valor global da proposta ou não implique qualquer agravamento dos custos.

XV. Do mesmo modo que a matéria a que respeita o litígio, não consente a aplicação do princípio do aproveitamento do ato, nos termos do disposto no artigo 163.º, n.º 5 do CPA ou ao abrigo de outro regime que, reconhecendo a ilegalidade do ato impugnado, obste à sua invalidação.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – RELATÓRIO

A..........., SA., Contrainteressada, devidamente identificada nos autos e A…………, S.A., Entidade Demandada, inconformadas, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, datada de 18/11/2020, que no âmbito da ação de contencioso pré-contratual instaurada por T..........., S.A. e F…………, S.A., contra a A…….., S.A. e a Contrainteressada, A..........., SA., julgou a ação procedente, anulando o ato de adjudicação da proposta apresentada pela Contrainteressada e condenou a Entidade Demandada a praticar todos os atos necessários à reposição da legalidade do procedimento pré-contratual, excluindo a proposta da Contrainteressada e adjudicando a proposta apresentada pelas Autoras.


*

Formula a Contrainteressada, aqui Recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“I. A douta sentença recorrida enferma de erro no julgamento da matéria de direito, face aos factos dados como provados, quando decidiu pela anulação do acto de adjudicação da “empreitada de reabilitação do molhe principal do porto do Porto Santo” e pela condenação a entidade adjudicante à exclusão da proposta da contrainteressada A..........., ora recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 70 n.º 2 al b) do CCP, com base no fundamento que o Plano de Pagamentos por ela apresentado não cumpre com o disposto nas cláusulas técnicas do caderno de encargos e, por conseguinte, apresenta um termo ou condição que viola aspectos da execução do contrato não submetidos à concorrência, consubstanciando por isso causa de exclusão da proposta.

II. E enferma de erro no julgamento da matéria de direito, desde logo porque, como resulta dos factos provados, o lapso identificado à proposta da recorrente resultou da contradição existente entre peças que compõe o caderno de encargos, a saber, entre o estipulado no ponto 3.1.2 das cláusulas gerais do caderno de encargos (pagamentos segundo periodicidade mensal, determinadas por medições mensais) e o disposto nos pontos 3.2.1 e 3.1.4 das cláusulas técnicas do caderno de encargos (pagamento destes dois artigos em tranches), realidade esta que foi totalmente desconsiderada pelo tribunal, violando os princípios da legalidade, transparência e da igualdade.

III. Além disso a decisão do tribunal recorrido viola o princípio da Proporcionalidade, ao decidir pela anulação do acto de adjudicação, afastando a aplicabilidade do Princípio do aproveitamento do acto administrativo.

IV. Violando ainda o disposto no artigo 72º do CCP, ao entender ainda que tal lacuna não era susceptível de esclarecimentos, suprimentos ou rectificações, o que põe em crise os princípios da concorrência, imparcialidade e legalidade

V. De facto, a desconformidade relativa às condições de pagamento apresentadas pela concorrente, ora reclamante, não consubstancia, por diversas razões, causa de exclusão da sua proposta.

VI. Face ao erro ou lapso da concorrente na apresentação da forma de pagamento de dois artigos, o tribunal recorrido considerou irrelevante o facto desta situação ter resultado da divergência entre dois elementos do próprio caderno de encargos (clausulas gerais e cláusulas técnicas), mas esta não é uma realidade irrelevante na apreciação da causa.

VII. O tribunal conclui, a nosso ver ilicitamente, que por não existirem nas peças de procedimento regras diretas de prevalência em caso de divergência entre as condições gerais e as condições técnicas do caderno de encargos, a prevalência destas normas não era determinável.

VIII. Ora, sendo o caderno de encargos a peça do procedimento que contém as cláusulas a incluir no contrato a celebrar - onde se encontram fixados os aspectos da execução do contrato submetidos à concorrência e os aspectos de execução não submetidos à concorrência, está sujeita às normais regras de interpretação de normas, e de integração de lacunas.

IX. Sendo que caderno de encargos de obra publica é composto por uma parte geral, por cláusulas técnicas especiais e por um projecto de execução e que cada uma dessas – CLAUSULAS GERAIS VS CLAUSULAS TÉCNICAS - tem a sua função específica, uma de natureza jurídica e técnica da execução da empreitada, e outra dedicada às especificações técnicas que definem as características exigidas à própria obra (construção civil e instalações técnicas),

X. Pelo que os concorrentes procurarão adaptar a suas propostas às condições de constantes do caderno de encargos em cada uma das suas “facetas”, procurando nas clausulas gerais as regras com que se têm de conformar a sua proposta em relação a normas jurídicas e técnicas – como é o caso das condições de pagamento dos trabalhos - , e bebendo das clausulas técnicas apenas as normas referentes ás características dos materiais e elementos de construção a empregar na obra e ao processo ou modo de execução dos trabalhos em si.

XI. Tanto mais que o ponto 1.4.2 das cláusulas gerais clarifica qual “a ratio” das normas que justifica a definição da sua prevalência, “gerais” sobre as jurídicas e “técnicas” sobre as características da obra.

XII. Resulta assim claro que a concorrente, ora recorrente, foi induzida em erro pela divergência resultante das diversas partes do caderno de encargos, facto pelo qual não poderá ser penalizada com pena de exclusão da sua proposta, porquanto não lhe era exigível outro comportamento, atente o normal conteúdo dos documentos em apreço e a sua função na formação do contrato.

XIII. Razão pela qual este lapso nunca poderia servir de fundamento à exclusão da proposta da concorrente ao abrigo do disposto no artigo 70 n.º 2 al b) do CCP, como se fosse adequado, proporcional e até licito excluir um concorrente com base num mero lapso ou divergência originária das próprias peças do procedimento.

XIV. E ainda que assim não fosse, de uma cuidada análise do disposto em 3.1.2 e 3.1.4 das clausulas técnicas, estas são desde logo enquadradas como supletivas, já que referem que a forma de pagamento aí prevista se aplica apenas “caso não haja nada indicado em contrário nos restantes elementos do projecto”,

XV. O que, com recuso às regras de interpretação das normas e integração de lacunas, permitiria ao tribunal concluir que a referência a “elementos do projecto” pode aqui ser lida como referência aos restantes elementos do caderno de encargos “não jurídicos”, e não só apenas ao projecto “per si” em sentido restrito.

XVI. Operação interpretativa e aplicativa da lei que salvaguarda os interesses públicos que os princípios da concorrência, da transparência e da igualdade perseguem e resolveria a lacuna que o tribunal recorrido considerou inultrapassável – a de não haver nas peças de procedimento regra direta de prevalência em caso de divergência entre as condições gerais e as condições técnicas do caderno de encargos.

XVII. Assim, desde logo a douta sentença recorrida deveria ter considerando que não releva como causa de exclusão a indicação do mesmo prazo de pagamento mensal para todos os artigos da proposta, quer porque este enquadramento está de acordo com o estabelecido nas cláusulas gerais do caderno de encargos, quer porque as peças de procedimento nos dão as ferramentas para lidar com uma possível divergência.

XVIII. Facto que não é afastado pela previsão de pagamento num só mês do artigo referente às telas finais, porquanto se o trabalho – telas finais – só é realizado no ultimo mês dos trabalhos, então, de acordo com o critério aplicado pela concorrente (o constante das clausulas gerais: ou seja a periodicidade mensal), nunca poderia a sua medição e pagamento ser “dividida” por mais meses que não o último, e não é por isso que deixa de se enquadrar no critério mensal exigido.

XIX. Razões pelas quais a douta sentença recorrida deveria ter considerado que o plano de Pagamentos entregue não apresenta qualquer termo ou condição que viole aspectos de execução não submetidos à concorrência, pelo que a proposta da recorrente jamais poderia ser excluída com este fundamento, errando na interpretação e aplicação do disposto no artigo 70 n.º 2 al b) do CCP.

XX. Sem conceder, e ainda que assim não fosse entendido, a decisão do tribunal recorrido viola o princípio da proporcionalidade, porquanto a aplicação da sanção mais gravosa de exclusão, a qualquer concorrente tem de ser relegada para situações em que não há outra solução e aferida tendo em conta a situação concreta.

XXI. Ora, no caso concreto, devemos ter em linha de conta, por um lado, que a repartição dos referidos encargos de forma mensal proposta pela A........... não representa qualquer agravamento de custos para a entidade adjudicante, encontrando-se dentro dos limites fixados no Caderno de Encargos,

XXII. E, por outro lado, que os aludidos encargos, no valor total de € 1.750,00 (PSS e Telas Finais) representam apenas cerca de 0,2% do valor total da proposta e não correspondem sequer a verdadeiros “trabalhos” da empreitada, mas sim actividades conexas, laterais e ulteriores aos trabalhos a realizar ou deles meramente decorrentes

XXIII. Esta insignificância, tanto quantitativa como qualitativa é, por si só, significativa de que as situações em apreço não são passíveis de determinar a exclusão da proposta da A..........., porque o elemento em falha não tem qualquer relevância para a execução da empreitada e não inviabiliza a análise comparativa das propostas apresentadas, nem interfere na boa execução do contrato,

XXIV. Pelo que não reveste a natureza de elemento essencial determinante da exclusão da proposta, porquanto não prejudica a análise comparativa das propostas (porque não altera o preço, único critério de adjudicação!) e não é susceptível de se repercutir na boa execução do contrato

XXV. Degradando-se a formalidade, à partida essencial, em formalidade não essencial, que não origina a invalidade do acto, mas apenas uma irregularidade que permite “salvar” o acto, sendo a decisão de anulação do acto de adjudicação manifestamente desproporcional, desajustado e desadequado, e não leva em linha de conta a proporcionalidade como um fator de equilíbrio entre a irregularidade e a sanção.

XXVI. Assim, a insignificância, o diminuto impacto financeiro dos 2itens em causa e sua total irrelevância no que respeita à boa execução do contrato de empreitada, por não perigar contra quaisquer questões que possam afetar o seu bom cumprimento e o interesse público não justificam, à luz do princípio da proporcionalidade, a aplicação da pena capital de exclusão da proposta da recorrente

XXVII. Razão pela qual, ainda que se considerasse verificada a irregularidade, esta não se mostra invalidante da proposta da concorrente ora recorrente, nem poderia ser fundamentar a decisão de anulação do acto de adjudicação da proposta à recorrente, pelo que, ao decidir deste modo, o tribunal recorrido violou os artigos 1.º-A/1 e 70º n.º 2 al. b) do CCP, e bem assim os artigos 266.º/2 da CRP, e o artigo 7.º CPA.

XXVIII. A sentença recorrida viola ainda o disposto no artigo 96 n.º 5, ao dele fazer tábua rasa, por o considerar inútil para, em conjunto com os factos provados, e à luz do princípio do aproveitamento do acto administrativo, resolver esta pequeníssima divergência entre o disposto na proposta e o disposto nas clausulas técnicas do caderno de encargos (em contradição já vista com as clausulas gerais)

XXIX. Sendo nestes moldes ilegal o acto de exclusão da proposta da concorrente, ora recorrente, quando na verdade, atente o critério de adjudicação e atente a existência de elementos bastantes na proposta da recorrente para suprir a divergência entre a proposta e o caderno de encargos – o preço unitário desses trabalhos, o plano de trabalhos, o prazo da obra e a declaração de vinculação ao caderno de encargo constante do anexo I-M – impunha-se o aproveitamento do acto.

XXX. Tanto mais que com o suprimento desta divergência não se colocam em causa os princípios da imutabilidade e intangibilidade das propostas, e muito pelo contrário se assegurava a observância dos princípios essenciais da concorrência, imparcialidade e legalidade.

XXXI. Novamente sem abdicar e por cautela ainda se dirá que do mesmo modo, a correcção da proposta, para supressão dessa falta, constitui circunstância que não ofende os princípios a que deve subordinar-se a contratação pública

XXXII.Face a uma antinomia desta natureza, justificava-se que o júri procedesse oficiosamente uma eventual correcção (n.º 4 do artigo 72º do CCP), porque o erro revela-se no próprio conteúdo da proposta – confrontado o preço unitário desses trabalhos, o plano de trabalhos, o prazo da obra e o conteúdo da declaração de aceitação do caderno de encargos - e através das circunstâncias em que é feita, numa proposta cujo único atributo era o preço.

XXXIII.Ou, ainda suprisse o lapso com recurso a um pedido de esclarecimento ao concorrente, nos termos do disposto nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 72º do CCP, porquanto tais esclarecimentos encontram base nos elementos da propostas e não contrariam elementos constantes dos documentos que as constituem – o que, como ficou escrito, não acontece, porque a dúvida ficaria cabalmente esclarecida com recurso aos elementos da própria proposta; não alterem ou completem os respectivos atributos – neste caso o preço como único atributo, mantém-se inalterado; e não haja omissão dos elementos que dela deviam, obrigatoriamente, constar e não constam, o que também não é o caso

XXXIV.Ora, se a opção legislativa vertida no artigo 72º do CCP ambiciona evitar exclusões desproporcionadas e prejudiciais para o interesse público, com o intuito de incentivar a concorrência nos procedimentos pré-contratuais e sinalizar a irrelevância dos vícios formais, se eles forem susceptíveis de sanação e se tal sanação não puser em causa a igualdade e a concorrência no procedimento, então o afastamento desta prerrogativa pelo tribunal recorrido encontra-se ferido de ilegalidade, susceptível até de vir a fundamentar a recusa de visto do Tribunal de Contas ao contrato, porquanto susceptível de alterar o resultado financeiro do procedimento.

XXXV. Mais, sendo o princípio da concorrência a verdadeira trave mestra da contratação pública e considerando que a exclusão de uma proposta reduz a concorrência, as hipóteses de exclusão das propostas devem ser reduzidas ao mínimo necessário, de forma a garantir o mais amplo possível leque de propostas.

XXXVI.Este mínimo necessário traduz-se precisamente em apenas permitir a exclusão nos casos expressos previstos na lei (tipificação dos casos de exclusão) e interpretar estas normas de forma restritiva e não extensiva e, menos ainda, analógica, o que contraria a decisão do tribunal recorrido que “blindou” a exclusão da proposta da recorrente a qualquer uma das diversas soluções que permitiriam o seu aproveitamento,

XXXVII. Especialmente sendo o mais baixo preço o único critério de adjudicação e o próprio caderno de encargos deve ser exaustivo e claro na definição das características dos bens a fornecer. Submetendo-se as propostas, sob compromisso de honra, às exigências do caderno de encargos, sem qualquer hipótese de divergência - artigo 57.º, n.º 1, alínea a) e anexo I do Código dos Contratos Públicos.

XXXVIII. Razão pela qual não podemos afastar a relevância da declaração a que a concorrente se obriga com a assinatura do anexo I-M, já que não é uma questão desta se sobrepor ao conteúdo de documentos que a contrariem, mas sim, no caso concreto, dela, em conjunto com as demais particularidades do caso em apreço, permitir concluir, licitamente, ser esse o real conteúdo da declaração negocial da concorrente, revelando o mero lapso – sanável – em que incorreu aquando da determinação da forma de pagamento destes dois artigo

XXXIX. Degradando-se as “desconformidades” encontradas em meras irregularidades ou formalidades não essenciais.

XL. Em contrário, a decisão do tribunal recorrido, de anulação do acto de adjudicação da proposta da recorrente, consubstancia uma decisão desproporcional, e não esqueçamos que a aplicação do Princípio da Legalidade não pode conduzir a resultados manifestamente desproporcionados, e violadora do Principio da concorrência.”.

Pede que seja concedido provimento ao recurso e, em consequência, revogada a decisão recorrida no que respeita à anulação do ato de adjudicação da proposta apresentada, sendo a mesma substituída por outra que determine que o plano de pagamentos apresentado pela contrainteressada A........... cumpre com o disposto no caderno de encargos e, por conseguinte, não apresenta um termo ou condição que viole aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência, não consubstanciando causa de exclusão da proposta, sendo legal o ato de adjudicação, devendo o mesmo manter-se.


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A Entidade Demandada, igualmente inconformada apresentou recurso, no âmbito do qual formulou as seguintes conclusões:

1) Objeto do recurso

(I) O presente recurso tem por objeto a douta sentença, proferida a 18.11.2020 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, que julgou procedente a ação de contenciosa pré-contratual interposta pelas AA. e, em consequência anulou o ato de adjudicação e condenou a E.D a praticar todos os atos necessários à reposição da legalidade do procedimento pré-contratual em causa, designadamente excluindo a proposta da contrainteressada e adjudicando a proposta apresentada pelas AA., e versa sobre matéria de facto e de direito.

2) Impugnação da matéria de facto

(II) A douta sentença recorrida julgou incorretamente, por omissão, a matéria de facto, porque não considerou provados factos relevantes para a boa decisão da causa que, em função da prova documental carreada para aos autos e que consta do processo administrativo, deveriam ter sido julgados provados.

(III) Os concretos meios probatórios constantes do processo que impõem decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados são os seguintes:

a) CE, junto com o processo Administrativo, mais concretamente: o estipulado no ponto 3.2 da Cláusulas Gerais do CE e o estipulado no ponto 3.1.2 e 3.1.4 da Clausulas Técnicas e o Mapa de Quantidades de Trabalhos que se lhe encontra anexo;

b) Proposta da Contrainteressada, junta com o processo Administrativo, mais concretamente: a Lista de Preços Unitários e o Plano de Pagamentos;

c) Pronúncia da Contrainteressada, junta com o processo Administrativo, mais concretamente o alegado nos pontos 25 a 29;

d) Relatório Final I, junto com o processo Administrativo;

e) Relatório Final II, junto com o processo Administrativo.

(iv) Tendo por base os concretos meios probatórios elencados no ponto (iii) supra, a R. considera que devem ser aditados à matéria de facto provada os seguintes factos:

23) Por equívoco, a Contrainteressada propôs no seu plano de pagamentos que o preço dos itens Implementação do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais fossem tratados como é usual na maioria dos concursos de empreitada, ou seja:

- Os da implementação do PSS, no valor global de € 1.250,00, a pagar mensalmente ao longo do prazo contratual; e

- Os das Telas Finais, no valor global de € 500,00, a pagar integralmente no último mês.

24) O plano de pagamentos apresentado pela Contrainteressada para os itens mencionados no ponto anterior respeitou o critério de medição estabelecido no Caderno de Encargos (Cláusulas Técnicas), ou seja, estabeleceu na sua proposta (lista de preços unitários) que tanto a “Implementação do PSS” como as “Telas Finais” são medidas como valor global (VG).

25) O plano de pagamento dos preços devidos pela implementação do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais, não implica o agravamento de quaisquer custos, respeita os limites percentuais fixados no CE e representada cerca de 0,1969% do preço da proposta e cerca de 0,1777% do preço base.

3) Impugnação da matéria de direito

- Enunciação das questões

(v) A R. considera que são duas as questões essenciais a apreciar no presente recurso, a saber:

1.ª - Se a proposta da Contrainteressada padece de um lapso/equívoco/erro no que respeita às condições de pagamento constantes do seu plano de pagamentos para os itens da implementação do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais e se tal lapso/equivoco ou erro era suscetível de retificação e correção pelo júri;

2.ª - Se o não cumprimento das condições de pagamentos quanto a dois insignificantes e manifestamente diminutos itens acessórios e conexos às diferentes espécies de trabalhados da lista de trabalhos, mais concretamente a implementação do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais, que representam cerca de 0,1969% do preço total da proposta e cerca de 0,1777% do preço base fixado, constitui fundamento de exclusão da proposta, atentos os factos provados, em especial o critério de adjudicação definido do mais baixo preço, se tratar de condições ou termos relativos à execução do contrato não submetidos à concorrência pelo CE e o principio da proporcionalidade e, em última instância da concorrência e do interesse público.

- Matéria de facto relevante

(vi) A síntese da matéria facto relevante para a boa decisão da causa é a seguinte:

a) O preço base do procedimento pré-contratual de empreitada sub judice foi fixado em 989.055,00 €;

b) Apresentaram proposta 2 concorrentes:

- Concorrente n.º 1: T..........., S.A. /F…….., S.A – Preço da proposta: 988.054.00 €;

Concorrente n.º 2: A........... – Engenharia e Construções, S.A – Preço da proposta: 889.000,00 €;

c) A diferença de preço entre as propostas é, por conseguinte, de 99.054,00 €;

d) O critério de adjudicação é da proposta economicamente mais vantajosa na modalidade de avaliação do preço ou custo enquanto único aspeto da execução do contrato;

e) A proposta da Contrainteressada A........... apresenta, por equívoco/lapso e erro, condições de pagamento do Plano de Segurança e Saúde, no montante de 1.250,00 €, escalonado por 8 meses, correspondentes ao prazo de execução da empreitada, em desconformidade com o previsto no ponto 3.1.2 das CTCE, que prevê o pagamento em 3 fases uma de 50% no primeiro auto, 25% a meio do contrato e 25% no último auto;

f) A proposta da Contrainteressada A........... apresenta, igualmente por equívoco/lapso e erro, condições de pagamento da execução do projeto de telas finais, no montante de 500,00 € no último mês da execução do contrato, em desconformidade com o previsto no ponto 3.1.4 das CTCE, que prevê o pagamento em 4 fases, ou seja, 20% a 1/3 do prazo contratual; 30% a 2/3 do referido prazo, 30% no penúltimo auto e 20% no último auto com a aprovação das telas finais;

g) Os referidos itens da lista de trabalhos representam apenas cerca de 0,1969% do preço da proposta e cerca de 0,1777% do preço base, ou seja, menos que 0,2% do valor total da proposta;

h) A proposta da Contrainteressada A........... respeita o critério de medição de valor global (vg) no que respeita aos dois itens supra referidos, apresentando, por equívoco/lapso, somente condições de pagamentos diferentes das fixadas pelas CGCE;

i) Na pronúncia da Contrainteressada, apresentado no âmbito do exercício do direito de audiência prévia, é declarado/confessado e comunicado que a apresentação das condições de pagamento dos itens supra identificados nos moldes da proposta, decorre de um equívoco, causada pelo que é habitual e recorrente dispor a respeito do pagamento das rubricas em causa (o PSS, mensalmente e as telas finais, no final), nos procedimentos concursais de empreitadas públicas.

- Apreciação das questões: primeira questão

(vii) O júri do procedimento efetuou, no Relatório Final I, uma correta e acertada reponderação do alegado fundamento de exclusão da proposta da Contrainteressada relativo à apresentação de condições de pagamento para a implementação do Plano de Segurança e Saúde e execução do projeto de Telas Finais, concluindo que a apontada divergência não constitui fundamento de exclusão da proposta, nos termos e fundamentos melhor descritos no ponto 12 supra das presentes alegações de recurso.

(viii) Posição que foi reforçado no Relatório Final II, nos termos e com os fundamentos reproduzidos no ponto 13 supra das presentes alegações.

(ix) Não corresponde à verdade que a R. não negou estar em causa a apresentação de condições de pagamento dos itens supra referidos, em violação do previsto no CE, na medida em que invocou estar em causa um lapso/equivoco e erro, suscetível de retificação, clarificação e sanação.

(x) Os lapsos/equívocos e erros da proposta podem e devem ser corrigidos ou interpretados, nos termos gerais, previstos nos artigos 236.º, 237.º e n.º 2 do art. 238.º do C.C, sem que a tal obste o disposto nos n.ºs 1 e 3 do art. 72.º do CCP, em especial quando está em causa aspetos subtraídos à concorrência, não essenciais, diminutos/ insignificantes e irrelevantes do ponto de vista adjudicatório e da boa execução do contrato de empreitada.

(xi) Veja-se, a título exemplificativo, o fixado no Ac. do STA, de 07.05.2015, in www.dgsi.pt: “I - A «proposta» apresentada no âmbito de procedimento de contratação pública configura uma declaração negocial, e, enquanto tal, está sujeita à possibilidade de correção de «lapsos e de erros materiais manifestos», rectificáveis a todo o tempo, e está sujeita à «tarefa hermenêutica», como qualquer outra declaração de vontade, sendo-lhe aplicáveis, na falta de norma especial nesta matéria, as regras gerais do Código Civil, ou seja, o disposto no artigo 249º e os critérios interpretativos dos negócios formais que são ditos no artigo 238º desse código;

(xii) Da matéria de facto provada, bem como de todas as circunstâncias do procedimento pré-contratual sub judice não subsistem dúvidas que as condições apresentadas na proposta da Contrainteressada para os insignificantes e não essenciais itens de implementação do Plano de Segurança e Saúde e de execução do projeto de Telas Finais resultam de um equívoco/erro, que permitiu ao júri proceder à respetivas retificação e interpretação da vontade real do declarante, essencialmente pelas seguintes razões:

a) Por a forma de pagamento dos referidos itens normal e habitualmente prevista nas empreitados públicas ser mensal e no final.

b) Porque o concorrente reconheceu e confessou o lapso/erro, no local próprio, ou seja, na pronúncia apresentada ao abrigo do direito de audiência prévia;

c) Porque o concorrente se vinculou e aceitou todas as condições previstas no CE, através da assinatura do Anexo I-M.

d) Porque não existem razões lógicas e de ciência, à luz do critério do bonus pater familiae, do concorrente empreiteiro padrão e médio, atenta a insignificância e irrelevância, quer quantitativa (menos de 0,2% do preço da proposta), quer qualitativa (estão em causa itens acessórios e conexos, que não respeitam a espécies de trabalhos), e o valor da empreitada de cerca de 900.000,00 €, para o concorrente/declarante em causa se desviar do previsto no CE, no que respeita às condições de pagamento dos itens em apreço.

(xiii) Acresce que, efetivamente, o plano de trabalhos, tal como definido no art. 361.º do CCP, tem por escopo, com respeito pelo prazo de execução da empreitada, fixar a sequência dos prazos parciais de execução de cada uma das espécies de trabalhos previstas e de especificar os meios com os quais o empreiteiro se propõe executá-los, bem como a definição do corresponde plano de pagamentos.

(xiv) O que significa, que os itens em causa, não respeitam a espécies de trabalhos de construção civil, podendo, inclusive, deixar de figurar na lista de trabalhos, por estar em causa aspetos acessórios e conexos, apenas indiretamente relacionadas com a execução da empreitada.

(xv) E, nem necessitariam de uma especial vinculação dos concorrentes às respetivas condições de pagamento, as quais já figuravam no CE.

(xvi) Não se pode, igualmente, deixar de reter, na ponderação sobre a irrelevância da divergência, que está em causa um elemento da proposta (plano de trabalhos) que não é regido e imutável e que pode ser objeto de ajustamentos pelo empreiteiro, ainda que dentro de certas condições.

(xvii) Na origem e ponderação do lapso/equívoco, deve ser, também, considerada a contradição entre o estipulado no ponto 3.2 da Cláusulas Gerais do CE, que devem prevalecer sobre as cláusulas técnicas, atenta a ordem definida no ponto 1.2 do PP, que define a periodicidade mensal dos pagamentos, e o estipulado no ponto 3.1.2 e 3.1.4 da Clausulas Técnicas, que preveem condições de pagamento diferentes para os itens que estão na origem da divergência, o que muito provavelmente, também, poderá ter contribuído para o cometimento do lapso/equivoco.

(xviii) Por sua vez, não é absolutamente irrelevante a declaração inequívoca de aceitação do conteúdo do CE, através do Anexo I-M, nem a norma prevista no n.º 5 do art. 96.º do CCP e a sua conjugação com o previsto na al. b) do n.º 2 do art. 70.º do CCP.

(xix) Na doutrina, Gonçalo Guerra Tavares, in “Comentário ao Código dos Contratos Públicos”, 2019, Almedina, pag. 306 e 307, refere que: “Refira-se, no entanto, que esta regra de prevalência de declarações especificas da proposta reveladoras de incumprimento do caderno de encargos não tem caráter absoluto, podendo ceder em determinadas situações, como já se entendeu, por exemplo, em caso de dúvidas sobre aquilo que foi declarado pelo concorrente na proposta”. - remetendo em nota de rodapé para o Ac. do STA, de 18.01.2018, Proc. n.º 0742/17 e para o Ac. do STA de 28.01.2016, Proc. n.º 01371/15.

(xx) No citado Ac. do STA, de 18.01.2018, foi sumariado o seguinte: “I - Devidamente assinada, por quem pode vincular o respectivo concorrente, a «declaração de aceitação do conteúdo do Caderno de Encargos», poderá ser tida como «lapso», atentas as concretas circunstâncias, uma menção, feita na proposta, a «periodicidade mínima mensal de limpeza» diferente da exigida em artigo daquele regulamento;

(xxi) Com mais finco e profundidade, Pedro Costa Gonçalves, in “Direito dos Contratos Públicos”, 2018, 3.ª Ed. Volume I, Almedina, na pag. 900, opina do seguinte modo: “Como ponto de partida, parece de aceitar a sanção da exclusão da proposta que infringe disposições inderrogáveis do caderno de encargos. Sucede, porém, que o CCP contém uma regra que tem precisamente o propósito de resolver antinomias ou divergências entre o disposto na proposta e o disposto no caderno de encargos: referimo-nos ao artigo 96.º, n.º 5, que, em caso de divergência, define a prevalência do caderno de encargos sobre a proposta, isto por relação à ordem definida no n.º 2 do mesmo preceito. Neste contexto afigurando-se desproporcionada a sanção de exclusão de uma proposta especialmente para prevenir um problema que a lei resolve. Revela-se adequado convocar aqui o princípio do aproveitamento dos atos jurídicos (cf. Ponto 132.3) e “salvar” uma proposta que, afinal conte uma patologia que não vai comunicar-se ao contrato.”

(xxii) Regressando à jurisprudência, em especial, a um caso muito, semelhante sobre a indicação na proposta de um prazo de pagamento das faturas divergente do prazo previsto no CE, encontramos o Ac. do Ac. do TCAN, de 28-09-2018, Proc. n.º 00495/17.3BEVIS: “1 – O critério de adjudicação do mais baixo preço significa que, nada mais sendo levado à concorrência que não seja o preço, todos os demais fatores relacionados com a execução do contrato se inserem no domínio dos termos ou condições regulados no caderno de encargos. 2 – O Caderno de Encargos não evidencia qualquer contradição ou incongruência pelo facto de simultaneamente prever que os pagamentos deverão ter uma periodicidade de 30 dias, sendo os pagamentos feitos no prazo máximo de 60 dias após apresentação da respetiva fatura, pois que se referem a realidades diversas. Está bem de ver que o que resulta do Caderno de Encargos é que o primeiro pagamento será feito no prazo de 60 dias, sendo que os sucessivos pagamentos se efetivarão com uma periodicidade mensal, sempre no respeito pelo prazo máximo estabelecido de 60 dias sobre a apresentação da correspondente fatura. 3 – Tendo o concorrente a quem foi adjudicada a empreitada declarado aceitar integralmente todo o conteúdo do Caderno de Encargos, o que tem obviamente por subjacente a aceitação sem reservas de toda e qualquer cláusula, estando em causa fatores não submetidos à concorrência, independentemente de qualquer omissão interpretativa na apresentação da proposta, tal facto não determina a exclusão da candidatura, mormente em concurso cujo único critério de adjudicação é o do preço mais baixo.

(xxiii) Neste aresto, sábia e prudentemente, explicou-se o seguinte: “Um dos princípios basilares nos contratos públicos é o da concorrência. O n.º 4 do artigo 1º do Código dos Contratos Públicos, determina: “À contratação pública são especialmente aplicáveis os princípios da transparência, da igualdade e da concorrência”.

Como se refere no acórdão do Tribunal de Contas n.º 40/2010, no processo n.º 1303/2010, “A mais livre e intensa concorrência possível é indissociável dos “interesses financeiros públicos, já que é em concorrência que se formam as propostas competitivas e que a entidade adjudicante pode escolher aquela que melhor e mais eficientemente satisfaça o fim pretendido.

Donde resulta que para a formação de contratos públicos devem ser usados procedimentos que promovam o mais amplo acesso à contratação dos operadores económicos nela interessados na certeza de essa concorrência permitirá que surja deste jogo concorrencial, as melhores propostas possíveis”.

Como relevância igualmente para a questão aqui em apreciação, e como se discorreu nos acórdãos deste TCAN nº 00475/14.0BEVIS, de 05-06-2015 e nº 00218/16.4BELRA de 09-06-2017, “A exclusão de uma proposta reduz a concorrência.

Logo as hipóteses de exclusão das propostas devem ser reduzidas ao mínimo necessário, de forma a garantir o mais amplo possível leque de propostas.”

(xxiv) Sem prejuízo da alegação de que estamos perante um lapso/equívoco e erro da proposta, que o júri, e bem, considerou ser suscetível de retificação e interpretação da vontade real do declarante, e da prevalência, legalmente estabelecida no n.º 5 do art. 95.º do CCP, do CE sobre a proposta, importa analisar se seria viável o recurso ao regime do pedido de esclarecimentos e/ou suprimento, consoante se entenda estar em causa um equívoco/erro ou uma irregularidade da proposta.

(xxv) O tribunal a quo errou ao concluir pela negativa.

(xxvi) A recorrente entende que não existem obstáculos a aplicação dos mencionados regimes, consoante a posição de adote a respeito da qualificação da divergência, como estando em causa um equívoco/erro ou uma irregularidade.

(xxvii) Na verdade, tratando-se uma equivoco, nada obstava a que o júri, sem prejuízo de se ter dado por esclarecido por força da pronuncia da Contrainteressada, caso fosse necessário, solicitasse um esclarecimento ao concorrente, ao abrigo do disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 72.º do CCP, tendo em conta que:

a) O esclarecimento sobre a forma de pagamento de dois insignificantes itens, devidamente ponderadas todas as circunstâncias, documentos e elementos do procedimento, não implica uma contradição (implica sim uma clarificação) de elementos constantes dos documentos da proposta;

b) Do mesmo modo não implica uma alteração ou completude de atributos e muito menos o suprimento de omissões que determinariam a sua exclusão, nos termos do disposto na al. a) do n.º 2 do art. 70.º do CCP, que tem por objeto apenas a não apresentação (omissão) de alguns atributos ou termos ou condições e não as situações previstas na al. b) do n.º 2 do art. 72.º referentes à apresentação de atributos que violem os parâmeros base ficados no CE ou a apresentação de termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência.

c) A insignificância e irrelevância da divergência, quer qualitativa, quer quantitativa, tanto ao nível adjudicatário, como ao nível de execução do contrato, é de tal modo evidente que não afeta o princípio da imutabilidade das propostas.

(xxviii) Permanecendo no plano da cautela e a título subsidiário, caso se venha a entender que falece tudo o quanto se alegou a respeito do equívoco/lapso e erro da proposta, da prevalência do CE e da viabilidade do esclarecimento do equívoco, resta analisar se, no caso em apreço, seria admissível o suprimento (agora já a coberto do n.º 3 do art. 72.º do CCP, da alegada irregularidade.

(xxix) Não temos duvidas que que a resposta deverá ser positiva, pela seguinte ordem de razões:

a) Primeira: a divergência não corresponde a uma irregularidade essencial que incida sobre atributos por ser óbvio que respeita a termos ou condições referentes a aspetos da execução do contrato subtraídos à concorrência pelo CE que soa manifestamente insignificante e irrelevantes, a todos os níveis.

b) Segunda: está em causa uma insignificante e diminuta divergência no documento plano de pagamentos quanto à forma de pagamento (e não quanto ao critério de medição por VG) de dois itens acessórios e conexos às diferentes espécies de trabalhos, que permite concluir pela sua não essencialidade, quer do ponto de vista adjudicatório, quer do ponto de vista da boa execução do contrato de empreitada.

c) Terceira: trata-se de uma divergência quanto ao modo de pagamento de dois itens que têm um insignificante e diminuto peso/impacto financeiro (inferior a 0,2% do valor total da proposta) e que não respeitam ao critério de adjudicação/atributos da proposta e que, consequentemente, não afeta a sua apreciação e avaliação.

d) Quarta: o suprimento da irregularidade não essencial não afeta a concorrência, antes pelo contrário promove-a.

e) Quinta: O suprimento não viola o princípio da igualdade na sua dupla aceção positiva e negativa de tratar o que é igual de modo igual e o que é diferente de modo diferente.

- Apreciação da segunda questão

(xxx) Importa agora apreciar se o não cumprimento das condições de pagamentos quanto a dois insignificantes e manifestamente diminutos itens acessórios e conexos às diferentes espécies de trabalhados da lista de trabalhos, mais concretamente a implementação do Plano de Segurança e Saúde e execução do projeto de Telas Finais, que representam cerca de 0,1969% do preço total da proposta e cerca de 0,1777% do preço base fixado, constitui fundamento de exclusão da proposta, atentos os factos provados, em especial o critério de adjudicação definido do mais baixo preço, se tratar de condições ou termos relativos à execução do contrato não submetidos à concorrência pelo CE e o principio da proporcionalidade e, em última instância da concorrência e da prossecução do interesse público.

(xxxi) Exmos. Senhores Doutores Juízes Desembargados, admitimos frontalmente, com todo o devido e merecido respeito pelo Tribunal a quo, que é a clamorosa e intolerável ridicularização que a douta sentença faz do princípio constitucional da proporcionalidade e, consequentemente, dos basilares princípios da concorrência e da prossecução do interesse público, traduzido na obtenção da máxima poupança para o erário público, que motivou a apresentação do presente recurso de apelação.

(xxxii) Efetivamente, a irrelevância (adjudicatória e ao nível da execução do contrato) da divergência quanto a forma de pagamento de dois diminutos e insignificantes itens da lista de trabalhos, não justifica a aplicação da pena capital de condenação à morte da proposta da Contrainteressada.

(xxxiii) Chega a ser chocante deixar de poupar ao erário publico cerca de 100.000,00 €, numa empreitada cujo preço base é de cerca de 980.000,00 €, por causa de uma equivoco ou divergência quando ao modo de pagamento de 2 itens que representam menos de 0,2% do valor da proposta, quando é certa que atento o critério de adjudicação o desfecho natural e a proposta vencedora seria a mesma, por ser a que apresenta melhor preço!

(xxxiv) Impõe-se, ainda que fixada num caso diferente, mas que até nos parece mais grave, de omissão de preços de itens da lista de trabalhos, por respeitar a atributos, recorrer, por maioria ou igualdade de razão e similitude material, à jurisprudência do Acórdão Uniformizador do TC n.º 1/2010, publicado no DR, 1.ª Série - N.º 32, de 16 de Fevereiro de 2010:

1 - No domínio do disposto, conjuntamente, nos artigos 73.º, n.º 1, alínea b), 92, n.º 3, e 94, n.º 2, alínea b) do Decreto-Lei n.º 59/99, de 02 de Março, a falta de indicação, na lista de preços unitários, de um preço correspondente a um bem ou a uma actividade, não constitui, necessariamente, a preterição de uma formalidade essencial do procedimento pré-contratual determinante da exclusão da proposta onde ocorreu tal falta. 2 - A omissão referida no número anterior deve ser ponderada, caso a caso, e só constitui a preterição de uma formalidade essencial, determinante da exclusão da respectiva proposta, quando, em função dos factores do critério de avaliação das propostas, for impeditiva da análise comparativa destas, ou seja, susceptível de se repercutir na boa execução do contrato.”

(xxxv) No mesmo sentido, veja-se o Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.º 32/99, de 18 de Agosto, o qual defendeu que a falta parcial de alguns itens subsume-se ao regime das irregularidades e respetivo suprimento.

(xxxvi) Na posição sufragada na invocada jurisprudência o princípio da proporcionalidade teve, como não podia deixar de ser, um peso relevante.

(xxxvii) Com efeito, a manutenção da decisão de exclusão da proposta da Contrainteressada traduzir-se-ia numa decisão desproporcional, sendo inquestionável que a aplicação do princípio da legalidade não pode conduzir a resultados manifestamente desproporcionados.

(xxxviii) Ademais, num caso em que a divergência em relação ao CE é insignificante e irrelevante, nem obsta à análise comparativa das propostas.

(xxxix) Reitera-se que não está em causa uma divergência referente a aspetos fundamentais, a atributos, mas sim e somente quanto às condições de pagamento de dois míseros itens, que são acessórios e conexos por não dizerem respeito a espécies de trabalhos previstos no projeto de execução.

(xl) Como bem foi explanado no citado Ac. Uniformizador n.º 1/2020, do TC:

Efectivamente:

Fica salvaguardado o princípio da igualdade, se for dada, a todos os interessados em contratar, iguais condições e oportunidades de acesso e participação, o que se consegue proporcionando a todos idênticas possibilidades de correção de meras irregularidades, ou falta de elementos não essenciais das propostas;

Fica garantido o princípio da transparência, caso seja assegurado a todos os concorrentes o conhecimento da possibilidade de efectuar o suprimento da falta dos referidos elementos não essenciais e não seja sonegada informação sobre o andamento do procedimento em que sejam interessados;

Fica salvaguardado o princípio da imparcialidade, uma vez garantido que não haverá favorecimento, nem prejuízo, de uns interessados em contratar, relativamente a outros, e que seja mantida a equidistância pela entidade adjudicante;

Fica garantido o princípio da concorrência, sendo salvaguardado o mais amplo acesso, ao procedimento, pelos interessados em contratar e ainda por, em cada procedimento, dever ser considerado o maior número de interessados, no respeito pelo número mínimo que a lei imponha;

Fica garantido o princípio da estabilidade ou da imutabilidade das propostas, uma vez que não é alterada a substancia e a essência destas;

Igualmente, garantido fica o princípio da prossecução do interesse público, já que, com um maior número de propostas, está a entidade adjudicante mais habilitada a efectuar uma melhor escolha entre estas.”

(xli) Na verdade, por a sentença merecer uma censura quando ao excessivo peso que lhe atribuiu, importa clarificar que o princípio da imutabilidade das propostas não é absoluto.

(xlii) No caso sub judice, é perspícuo que tal princípio deve ser relativizado, visto que os princípios da proporcionalidade e, sobretudo, da concorrência e da prossecução do interesse público exigem que se salve a proposta da Contrainteressada, visto que não foram alterados atributos, nem aspetos essenciais e significativos que possam ter repercussões, quer na sua avaliação e comparação, quer na execução do contrato.

(xliii) É óbvio que, quer a retificação, quer a interpretação, quer a clarificação e suprimento de uma divergência ou irregularidade da proposta, quando estão em causa questões de pouca monta ou de pormenor e que sejam irrelevantes, do ponto de vista adjudicatório e da execução do contrato, não violam o princípio da imutabilidade das propostas.

(xliv) Acresce que perante um qualquer conflito entre o princípio da imutabilidade das propostas e os princípios da concorrência e da prossecução do interesse público, devem estes últimos prevalecer por terem, claramente, maior valor, especialmente no Direito Pré-Contratual Público.

(xlv) A sentença recorrido faz uma paupérrima e simplicista apreciação do princípio da proporcionalidade, considerado na sua tripla aceção de adequação, exigibilidade e proporcionalidade em sentido estrito.

(xlvi) Quer na doutrina, quer na jurisprudência é pacifico que este principio deve ser considerado, como “válvula de escape” na valoração das irregularidades das propostas e na adequação das respetivas consequências, maxime de exclusão (Vide na doutrina Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, in “Concursos e Outros procedimentos de Contratação Pública, 2016, Almedina, pag. 228 e na jurisprudência, o Ac. AC. do TCAN, de 20.02.201, Proc. n.º 01606/13.3BEBRG, in www.dgsi.pt)

(xlvii) Por conseguinte, é extremamente chocante e inaceitável a afirmação do Tribunal a quo de que princípio da proporcionalidade não pode derrogar o princípio da legalidade, mais concretamente uma norma imperativa, que determina a exclusão de propostas que apresentem termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo CE, inclusive quando estão em causa uns míseros grãos de areia.

(xlviii) É de bradar a seguinte questão: Então o princípio constitucional da proporcionalidade não constitui um princípio legal basilar e estruturante do Estado de Direito Democrático, ínsito ao próprio princípio da legalidade em sentido amplo, na medida em que a seu acolhimento no Direito Pré-Contratual Público decorre da própria lei?!

(xlix) Em síntese, é clamoroso concluir que o princípio da proporcionalidade não pode derrogar o princípio da legalidade porque tal significa reduzi-lo a zero; esvaziar todo o seu conteúdo material e função, o que equivale a atentar contra a equidade, boa-fé e equilíbrio e compactuar com a subsistência na ordem jurídica de decisões anómalas, injustas e intoleráveis no Estado de Direito Democrático.

(l) Não devera merecer provimento o argumento de que a desconformidade não é irrelevante e de diminuto impacto financeiro porque foi prevista pela Entidade Adjudicante no CE como aspeto da execução do contrato não submetido à concorrência.

(li) Em primeiro lugar, porque a ser assim, então é a entidade adjudicante a quem compete ajuizar o que é ou não irrelevante para si e para a boa execução do contrato.

(lii) Em segundo lugar, porque é óbvio que nem tudo o que se encontra previsto no CE como termos e condições subtraídos à concorrência é ou dever ser considerado essencial.

(liii) É inquestionável que a divergência quanto à forma de pagamento de itens de reduzido e irrelevante impacto financeiro deve ser considerada na ponderação a efetuar sobre a desproporção ou não da sanção de exclusão.

(liv) Por fim, importa refutar, independentemente da inócua e estéril discussão acerca da natureza regulamentar ou não do CE, que, por tudo quando de alegou, a decisão de não exclusão e de adjudicação da proposta da Contrainteressada não viola, o invocado princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos, consagrado no n.º 2 do art. 142.º do CPA, por nenhuma norma ou previsão/estipulação das peças do procedimento ter sido violada.

E) Normas jurídicas violadas:

Do exposto decorre que no entendimento da R., a douta sentença violou, designadamente, as seguintes normas e princípios jurídicos:

- A al. b) do n.º 2 do artigo 70.º, aplicável por remissão da al. o) do n.º 2 do art. 146.º do CCP;

- Os n.ºs 1,2, 3 e 4 (consoante a posição que se adote sobre a qualificação da divergência em causa relativa às condições de pagamento, designadamente equívoco/erro ou irregularidade) do art. 72.º do CCP;

- Os art. 238.º do C.C;

- O n.º 5 do art. 96.º e a al. a) do n.º 1 do art. 57.º do CCP;

- O n.º 2 do art. 142.º do CPA;

- Os princípios da proporcionalidade, concorrência e da prossecução do interesse público e da igualdade, previstos no art. 1.º-A do CCP, e ainda, da boa-fé, da tutela da confiança, da sustentabilidade e da responsabilidade.

- O princípio do equilíbrio como princípio inerente ao Estado de Direito.”.

Pede que o recurso seja julgado procedente, revogando-se e substituindo-se a sentença recorrida por uma outra que declare válido o ato de adjudicação impugnado e absolva a Entidade Demandada dos pedidos de exclusão da proposta da Contrainteressada e de adjudicação da proposta das Autoras.


*

As Autoras, ora Recorridas, notificadas apresentaram contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

A. O Recurso vem interposto pelas Recorrentes da douta Sentença de 18.11.2020, que julgou a ação procedente e, consequentemente, anulou o ato de adjudicação da proposta apresentada pela Contrainteressada e condenou a Entidade Demandada a praticar todos os atos necessários à reposição da legalidade do procedimento pré­contratual em causa, designadamente excluindo a proposta da Contrainteressada e adjudicando a proposta apresentada pelas Autoras.

B. A situação dos autos não podia ser mais clara, dado que a proposta da Contrainteressada violou aspetos não submetidos à concorrência pelo CE, mas a que a Entidade Adjudicante pretendeu que os concorrentes se vinculassem, pelo que foi corretamente excluída.

C. É importante deixar claro que quer a A..........., quer a Contrainteressada não negam que as condições de pagamento apresentadas por esta para a implementação do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais, não respeitam as condições de pagamento fixadas nos pontos 3.1.2 e 3.1.4 das cláusulas técnicas do CE ("CTCE").

D. A Contrainteressada reconheceu e confessou já, por diversas vezes ao longo do procedimento pré-contratual e deste processo judicial que as condições de pagamento apresentadas na sua proposta resultam de um alegado "equivoco/lapso/erro", provocado, alegadamente, pelo que "é usual nas empreitadas públicas no que respeita aos itens em causa".

E. O que é usual nas empreitadas é absolutamente irrelevante para o caso, o que releva era o estabelecido no CE e, mais precisamente, nas CTCE, dado que à Contrainteressada não era admissível apresentar condições de pagamento diferentes das que constavam das peças do procedimento.

F. Sendo que, de acordo com o Plano de Pagamentos apresentado pela Contrainteressada, mais concretamente para (i) o Plano de Segurança e Saúde e (ii) Telas Finais, constata-se que o mesmo não cumpre com os critérios de medição fixados nas CTCE, o que tornou o ato de adjudicação da sua proposta irremediavelmente inválido.

G. O mesmo é dizer que a Contrainteressada não cumpriu com um aspeto não submetido à concorrência pelo CE a que a Entidade Adjudicante pretendeu que os Concorrentes se vinculassem!

H. Esta violação conduz necessariamente à exclusão da proposta, nos termos do art. 70.012, ai. b) do CCP, pelo que bem andou a Sentença recorrida ao excluir a proposta da Contrainteressada.

I. Argumentam as Recorrentes que a contradição existente entre o estipulado no Ponto 3.2 das Cláusulas Gerais do CE e as CTCE conduziu ao "lapso" ou "indução em erro" da Contrainteressada.

J. Tal não justifica a violação das CTCE.

K. Independentemente do argumentário das Recorrentes quanto à qualificação da violação das CTCE, não se pode afastar a consequência legal cominada para a mesma: a exclusão por violação de um aspeto do contrato não submetido à concorrência, mas a que a Entidade Adjudicante pretendeu que os concorrentes se vinculassem.

L. Ao contrário do entendimento da A..........., a audiência prévia não serve para os concorrentes clarificarem lapsos/equívocos/erros, mas antes para que os concorrentes se pronunciem sobre as questões com interesse para a decisão, sem que com isso possam corrigir quaisquer aspetos da sua proposta.

M. É ainda irrelevante que o alegado "lapso" não tenha quaisquer repercussões na apreciação e avaliação da proposta, já que tem sim, consequências bem gravosas a nível da admissão da proposta que deve ser recusada.

N. Assim, o ato de adjudicação padece de vício de violação de lei por inobservância do disposto no artigo 70.0/2, aL. b) do CCP, pelo que o entendimento da Sentença recorrida deve ser confirmado.

O. Por outro lado, o incumprimento do CE constitui fundamento legal de exclusão da proposta que não pode ser afastado pelo princípio da proporcionalidade

P. Se as condições de pagamento se encontram previstas nas cláusulas do CE e constituem um aspeto da execução do contrato a celebrar não submetido à concorrência, cuja sanção para a sua violação é a exclusão, é porque a Entidade Adjudicante pretendia que os concorrentes se vinculassem ao seu cumprimento, motivo pelo qual não se pode concluir pela sua irrelevância, ao contrário do sobejamente alegado pelas Recorrentes.

Q. Improcede ainda o argumento de que se trata de uma desconformidade irrelevante e de diminuto impacto financeiro.

R. Tal irrelevância, ou a poupança que resulta da adjudicação de determinada proposta (ilegal), não pode ser justificação para não exclusão de uma proposta que viole um aspeto da execução do contrato não submetido à concorrência, pois uma norma imperativa - o art. 70.012, ai. b) do CCP -, como diz a Sentença recorrida e bem "não pode ser afastada por motivos meramente economicistas ou financeiros."

S. E muito menos pode a violação das CTCE ser considerada uma “irregularidade relativa à preterição de uma formalidade não essencial”, conforme alega a A............

T. Não se trata de uma mera irregularidade, mas antes um verdadeiro vício substancial, um incumprimento de um aspeto da execução do contrato determinado pela entidade adjudicante que conduz, nos termos da lei, à exclusão da proposta, pelo que a teoria das formalidades relativamente essenciais não tem qualquer cabimento na situação in casu.

U. A consequência legal da exclusão da proposta ser prevista expressamente na lei inquina qualquer invocação da eventual aplicação do princípio da proporcionalidade ao caso, dado que não se pode afastar, por aplicação de tal princípio, aquilo que é uma cominação expressamente prevista na lei.

V. Com efeito, a aplicação do princípio da proporcionalidade não pode derrogar a lei, sendo a poupança ao erário público gerada pela aplicação desse princípio alegada pela A........... absolutamente irrelevante quando perante uma clara ilegalidade.

W. Tal como confirmado pela Sentença recorrida a decisão de exclusão não "se encontr[a] na margem de livre apreciação do órgão adjudicante/júri, resultando, ao invés, de uma norma legal imperativa que vincula o júri a propor a exclusão e o órgão adjudicante a decretá-la, sob pena de violação do principio da legalidade."

X. Em face do exposto, a proposta da Contrainteressada não podia ser admitida com fundamento no princípio da proporcionalidade, sendo que, ao fazê-lo, a decisão de adjudicação violou o regime legal imperativo do artigo 70.º/2, ai. b) do CCP e o princípio da legalidade, pelo que bem andou a Sentença recorrida ao revogar esta decisão com este fundamento.

Y. Por outro lado, ao contrário do invocado pelas Recorrentes, a violação referida não era suscetível de retificação e correção pelo júri.

Z. Tal possibilidade não era admitida ao júri do procedimento, nos termos do art. 72.0/4 do CCP, muito menos à Contrainteressada, uma vez que tal sempre constituiria uma verdadeira alteração da proposta apresentada.

AA. Na presente situação era inadmissível um pedido de esclarecimentos por parte do júri, pois a modificação do plano de pagamentos preconizada pelas Recorrentes traduzir-se­ia numa alteração da proposta apresentada pela Contrainteressada, sem correspondência com o texto ou com os elementos que compõem a sua proposta, e não numa clarificação de um elemento da mesma.

BB. No caso presente, de facto, a proposta da Contrainteressada violou o CE, pelo que qualquer pedido de esclarecimentos seria inviável dado que tal incumprimento gerava exclusão da proposta, assim sendo acertada a Sentença recorrida.

CC. Também não era aceitável uma retificação oficiosa de erros por não ser evidente, do próprio contexto ou através das circunstâncias em que a declaração foi feita, que a proposta contenha um erro, nem de que forma deverá o mesmo ser corrigido.

DD. Considerando que a proposta da Contrainteressada apresentava condições de pagamento que violam o disposto nas CTCE e que é cominado com a exclusão da proposta (nos termos do artigo 70.º/2, al. b) do CCP), conclui-se que o seu suprimento não é admissível (ao abrigo do n.º 3 do artigo 72.º do CCP), pois incidiria, como vimos supra, sobre um vício de natureza substancial e essencial e não sobre uma formalidade não essencial suscetível de suprimento.

EE. Em face do exposto, a proposta da Contrainteressada não era suscetível de esclarecimentos, suprimentos ou retificações ao abrigo do artigo 72.º do CCP, pelo que bem andou a Sentença recorrida ao decidir como decidiu.

FF. Por outro lado, o Anexo I-M não sana a violação pela proposta da contrainteressada das CTCE.

GG. Não é esse o entendimento da jurisprudência portuguesa!

HH. Assim, o facto de a Contrainteressada ter subscrito a declaração de aceitação do conteúdo do CE (Anexo I-M) não afasta os documentos que o contrariam, visto que o importante é o cumprimento rigoroso do estabelecido nas peças do procedimento.

II. Face ao exposto, inexiste outra solução mais correta do que a adotada na Sentença recorrida.

JJ. Por fim, sempre se diga que ao contrário do invocado pelas Recorrentes, o princípio do aproveitamento do ato administrativo não tem aplicação ao caso

KK. Estamos perante um ato ilegal, fundamentado na violação do art. 70.º/2, al. b) do CCP, o que torna errada, por natureza, a invocação do "princípio do aproveitamento do ato administrativo anulável" em qualquer uma das suas formas, neste caso concreto.

LL. Razão pela qual se conclui que a douta Sentença recorrida está devidamente fundamentada, interpreta corretamente a lei e deve ser confirmada.”.

Pedem que o recurso seja julgado improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.


*

O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não emitiu parecer.

*

O processo vai, sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos, à Conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir a questão colocada pelas Recorrentes, sendo o objeto dos recursos delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1, 2 e 3, todos do CPC ex vi artigo 140.º do CPTA, não sendo lícito ao Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.

As questões suscitadas resumem-se, em suma, às seguintes, em relação a cada um dos recursos jurisdicionais.

A. Recurso interposto pela Contrainteressada

1. Erro de julgamento de direito em relação ao artigo 70.º, n.º 2, b) do CCP, ao decidir que o Plano de Pagamentos não cumpre o disposto nas Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos e apresenta um termo ou condição que viola aspetos de execução do contrato não submetidos à concorrência;

2. Erro de julgamento de direito por contradição entre o ponto 3.1.2. das Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos e os pontos 3.2.1. e 3.1.4. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, em violação dos princípios da legalidade, transparência e igualdade;

3. Erro de julgamento de direito por violação do princípio da proporcionalidade e ao não aplicar o princípio do aproveitamento do ato administrativo;

4. Erro de julgamento de direito, em violação do artigo 72.º do CCP ao entender-se não ser aplicável os esclarecimentos, suprimentos e retificações, pondo em causa os princípios da concorrência, imparcialidade e legalidade.

B. Recurso interposto pela Entidade Demandada

1. Erro de julgamento de facto, por omissão de factos relevantes para a decisão da causa;

2. Erro de julgamento de direito, quanto à existência de um erro/lapso da proposta apresentada pela Contrainteressada quanto às condições de pagamento constantes do plano de pagamentos e de o não cumprimento das condições de pagamento constituir fundamento de exclusão da proposta.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:

1) A Entidade Demandada lançou um concurso público para execução da empreitada de reabilitação do molhe principal do porto de Porto Santo (cfr. anúncio de procedimento n.º 4295/2019, publicado no Diário da República, II Série, n.º 82, de 29 de abril de 2019).

2) O concurso mencionado em 1) tem como peças do procedimento as constantes das pastas “8_Procedimento - Peças” e “9_Peças Desenhadas” constantes do processo administrativo, doravante p. a., cujo teor se considera integralmente reproduzido.

3) O preço base do procedimento é de 989 055€ (cfr. ponto 1.6 do programa do procedimento vertido no documento denominado de “8.7_Programa do procedimento.pdf” constante da pasta “8_Procedimento-Peças” que se encontra no p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido)

4) No ponto 3.2 do programa do procedimento prevê-se o seguinte: “(…) 3.2.1. As propostas devem ser constituídas pelos seguintes documentos, sob pena de exclusão:

(…)

e) Programa de trabalhos, incluindo plano de trabalhos, plano de mão-de-obra e plano de equipamento.

f) Memória justificativa e descritiva do modo de execução da obra.

g) Quaisquer outros documentos que o concorrente considera indispensáveis, nos termos do n.º 3 do artigo 57.º do CCP.

(…)

3.2.4. O Plano de Trabalhos referido na alínea e) do 3.2.1 deve apresentar todos os elementos necessários para demonstrar a garantia do cumprimento do prazo global da empreitada e dos prazos parcelares, nomeadamente:

- Instalação do estaleiro;

- Trabalhos preparatórios (fresagens, demolições de pavimentos e de peças de betão, limpeza de infraestruturas e remoção de redes existentes a desativar);

- Pavimentação do Cais por fases, conforme operacionalidade do cais;

- Reabilitação do canal técnico (por duas partes: betão e redes);

- Reparação localizada de peças de betão (escadas, muretes, rampa RO-RO, etc);

- Reparação e colocação de cabeços de amarração;

- Fabrico e colocação de blocos Antifer no manto de proteção (zona localizada do molhe);

- Receção Provisória.

3.2.5. Plano de Trabalhos deve incluir:

a) Memória descritiva e justificativa que incluirá a identificação do número de frentes de trabalho, sua natureza e locais de execução, a caracterização das interdependências e encadeamentos das diferentes atividades.

b) Diagrama de barras, ilustrando o desenvolvimento das atividades a partir da assinatura do contrato, com escala temporal de uma semana, no qual se assinalem, entre outros, os acontecimentos, discriminados por cada conjunto de trabalhos afins.

c) Plano de mão-de-obra com os efetivos mensais, expressos em efetivos x dia de cada categoria profissional, ao longo do prazo da execução da empreitada, repartidos pela execução da construção civil; deve explicitar os rendimentos calculados para os diferentes meses e épocas do ano, face à natureza dos trabalhos em causa;

d) Plano de equipamentos a afetar à empreitada, com a distribuição da utilização dos mesmos equipamentos repartidos pela execução da construção civil, que contenha a relação discriminada das máquinas e equipamentos considerados na proposta, a utilizar na empreitada incluindo marcas, modelos, e especificações técnicas, com indicação daqueles que o concorrente possui e dos que virá a adquirir ou alugar, assim como o seu estado de conservação e funcionamento. Deve explicitar os rendimentos calculados para os diferentes meses e épocas do ano, face à natureza dos trabalhos em causa, às especificidades da obra e as condições meteorológicas.

e) Plano de pagamentos (Cronograma Financeiro), que deve conter a previsão quantificada e escalonada no tempo, do valor dos trabalhos a realizar pelo empreiteiro, na periodicidade definida para os pagamentos a efetuar pelo dono de obra, de acordo com o plano de trabalhos.

3.2.6. No diagrama de barras, para cada atividade, além da respetiva duração e datas previstas de início e conclusão, deve ser indicada a lista das suas relações de sequencialidade com outras atividades e o tipo de cada uma destas e respetivos desvios temporais. A unidade de tempo será o mês e a subunidade a semana.

3.2.7. As atividades a considerar no diagrama de barras devem ter correspondência com os artigos da lista de quantidades de trabalho e de preços (que, para esse efeito, deverão ser agrupadas em conjuntos de espécies de trabalho com rendimentos aproximadamente idênticos) de modo a existir uma correspondência direta entre o diagrama de barras e o plano de pagamentos. Para esse efeito, o diagrama de barras indicará, relativamente a atividades com rendimentos variáveis, a percentagem mensal a realizar.

3.2.8. A Memória Justificativa e Descritiva do Modo de Execução da Obra referido na alínea f) do 3.2.1 deverá incluir:

a) Indicação dos processos construtivos adotados e meios a mobilizar.

b) Os aspetos técnicos, expressando inequivocamente os que considera essenciais à validade da sua proposta e cuja rejeição implica a sua ineficácia.

c) Enumeração dos meios técnicos e humanos, bem como dos meios de estudo e de investigação que se propõe utilizar.

d) Identificação da área do estaleiro necessária e da sua localização e organização funcional, bem como das vias de circulação de equipamentos e respetivo tráfego de pesados, com avaliação do eventual grau de interferência no normal funcionamento do porto e da marina, e tendo em consideração todos os condicionamentos impostos no caderno de encargos.

e) Descrição das medidas e metodologias a adotar para minimizar a interferência com a exploração do porto e marina.

f) Descrição do Sistema de Gestão da Segurança e Saúde no Trabalho que pretende implementar durante a execução da obra.

g) Descrição do Sistema de Gestão da Qualidade que pretende implementar durante a execução da empreitada.

h) Descrição das medidas a tomar para a minimização dos impactos ambientais. (…)” (cfr. documento denominado de “8.7_Programa do procedimento.pdf” constante da pasta “8_Procedimento- Peças” que se encontra no p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

5) E no ponto 3.10.1 do programa do procedimento determina-se que o critério de adjudicação é o da proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante, determinada pela modalidade de avaliação do preço enquanto único aspeto da execução do contrato a celebrar (cfr. documento denominado de “8.7_Programa do procedimento.pdf” constante da pasta “8_Procedimento-Peças” que se encontra no p.a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

6) Nas cláusulas gerais do caderno de encargos estabelece-se o seguinte: “(…) 1.2.2. Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, consideram-se integrados no contrato, sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 96.º do CCP:

a) O clausulado contratual, incluindo os ajustamentos propostos de acordo com o disposto no artigo 99.º do CCP e aceites pelo empreiteiro nos termos do disposto no artigo 101.º desse mesmo Código;

b) Os suprimentos dos erros e das omissões do caderno de encargos identificados pelos concorrentes, desde que tais erros e omissões tenham sido expressamente aceites pelo órgão competente para a decisão de contratar, nos termos do disposto no artigo 50.º do CCP;

c) Os esclarecimentos e as retificações relativos ao caderno de encargos;

d) O caderno de encargos, integrado pelo projeto de execução;

e) A proposta adjudicada;

f) Os esclarecimentos sobre a proposta adjudicada prestados pelo empreiteiro;

g) Todos os outros documentos que sejam referidos no clausulado contratual ou no caderno de encargos.

(…)

1.4.1 No caso de existirem divergências entre os vários documentos referidos nas alíneas b) a f) de 1.2.2, prevalecem os documentos pela ordem em que são aí indicados.

(…)

3.1.2 Os pagamentos a efetuar pelo dono da obra têm uma periodicidade mensal, sendo o seu montante determinado por medições mensais a realizar de acordo com o disposto em 2.3.18. (…)” (cfr. documento denominado “8.1_Cláusulas Gerais.pdf” constante da pasta “8_Procedimento – Peças” que se encontra no p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

7) E nas cláusulas técnicas do caderno de encargos o seguinte: “3.1.2 Implementação do plano de segurança e saúde, incluindo os meios humanos, materiais e equipamentos necessários.

(…)

Caso não haja nada indicado em contrário, nos restantes elementos de projeto, os encargos relativos a esta rúbrica são os que resultam do PSS e não estejam incluídos noutros subcapítulos deste Caderno de Encargos e serão pagos da seguinte forma: 50% no primeiro auto, 25% a meio do contrato e 25% no último auto.

(…)

3.1.4 Execução do projeto de telas finais dos trabalhos realizados, a entregar na receção provisória da obra.

(…)

Caso não haja nada indicado em contrário, nos restantes elementos de projeto, os encargos referentes a este sub-capítulo serão pagos da seguinte forma: 20% a um terço do prazo contratual, 30% a dois terços do prazo contratual, 30% no penúltimo auto e 20% no último auto com a aprovação das telas finais. (…)” (cfr. documento designado de “8.2_Cláusulas Técnicas.pdf” constante da pasta “8_Procedimento – Peças” que se encontra no p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

8) A Autora T…….., S. A. apresentou a lista de erros e omissões constante do documento designado de “10.1 Comprovativo+lista de erros omissões.pdf” que se encontra no p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido.

9) Na sequência do referido em 8), o Conselho de Administração da Entidade Demandada deliberou no sentido constante do documento denominado de “12_Deliberação erros e omissões.pdf” que se encontra no p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido.

10) Apresentaram proposta ao concurso mencionado em 1) as Autoras e a Contrainteressada (cfr. pastas “13.1-Proposta 13-05” e “13.4-Tecnovia” que se encontram na pasta “13_Propostas” constante do p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

11) Com a sua proposta, a Contrainteressada apresentou os seguintes documentos: “3.2.1.a Declaração Anexo I-M.pdf”, “3.2.1.b Proposta de preço.pdf”, “3.2.1.c Lista de Preços unitários.pdf”, “3.2.1.d Preços Parciais.pdf”, “3.2.1.e Cronograma financeiro.pdf”, “3.2.1.e Execução dos Trabalhos em %.pdf” “3.2.1.e Plano de Equipamentos.pdf”, “3.2.1.e Plano de mão de obra.pdf”, “3.2.1.e Plano de Pagamento –Detalhado.pdf”, “3.2.1.e Plano de Trabalhos.pdf”, “3.2.1.e Plano Pagamentos - %.pdf”, “3.2.1.e Plano Pagamentos.pdf”, “3.2.1.f Memória Just. Descritiva.pdf”, “Alvará.pdf”, “Procuração.pdf”, “PT1_OTLCNTNR_257155228_PT1_RPL_2010497.pdf” e “PT1_OTLCNTNR_257155229_PT1_RPL_2010497.pdf” cujo teor se considera integralmente reproduzido.

12) O “3.2.1.e Plano de Trabalhos.pdf” contém o seguinte conteúdo: “(…)


«imagem no original»


(…)” (cfr. documento denominado “3.2.1.ePlano de Trabalhos.pdf” constante da pasta “13.1- Proposta 13-05” que se encontra na pasta “13-Propostas” do p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

13) Também apresentou o documento “3.2.1.e Execução de Trabalhos em %.pdf” com o seguinte teor: “(…)
Item
        DESCRIÇÃO
(…)(…)
    Mês 1
(…)
    01.1
Montagem e desmontagem de Estaleiro, incluindo as instalações provisórias para laboratório e fiscalização, e o arranjo paisagístico da área ocupada após desmontagem.(…)(…)13,00%(…)
    01.2
Implementação do plano de segurança e saúde, incluindo os meios humanos, materiais e equipamentos necessários.(…)(…)13,00%(…)
    01.3
Implementação do plano de gestão e prevenção de resíduos de construção e demolição, incluindo os meios humanos, materiais e equipamentos necessários.(…)(…)13,00%(…)
(…)
(…)
(…)(…)
    (…)
(…)
    01.5
Sinalização temporária de trabalhos, de acordo com projeto elaborado nos termos do Decreto Regulamentar 22/98 de 1 de Outubro, referente a sinalização vertical, horizontal e outros equipamentos necessários, incluindo fornecimento, implantação e colocação.(…)(…)13,00%(…)
    01.6
Montagem e desmontagem de estruturas amovíveis para realização dos trabalhos de reparação e reabilitação.(…)(…)13,00%(…)
(…)
(…)
(…)(…)
    (…)
(…)

    03.1.1
Remoção de todas as tampas em betão ou metálicas, existentes na área de influência do canal.(…)(…)10,00%(…)
(…)
(…)
(…)(…)
    (…)
(…)
    03.1.4
Demolição cuidada dos coroamentos do canal na geometria definida em projeto, preservando as armaduras existentes.(…)(…)10,00%(…)
(…)
(…)
(…)(…)
    (…)
(…)
    03.2.1
Execução de tampas, na geometria definida em projeto, em betão armado da classe C50/60, XC4 + XS3, Cl 0.20, S3. e aço
da classe A500 NR SD, incluindo cofragem, armadura, betonagem, descofragem e todos os materiais e trabalhos acessórios necessários.
(…)(…)13,00%(…)
(…)
(…)
(…)(…)
    (…)
(…)
    03.3.1
Desativação e remoção dos equipamentos, tubagens e acessórios, por nó de rede, conforme definido em projeto, incluindo manutenção provisória da rede e transporte a vazadouro.(…)(…)8,00%(…)
(…)
(…)
(…)(…)
    (…)
(…)
    03.4.3
Manutenção das redes existentes em operação, incluindo execução de ramais provisórios, desvios necessários, substituição de elementos degradados, tais como cabos, abraçadeiras, ligações, pequenos troços de tubagens, etc.(…)(…)8,00%(…)
(…)
(…)
(…)(…)
    (…)
(…)
    04.4
Betonagem e enchimento das aberturas no cais e rampa RO-RO com betão, incluindo envolvimento em geotêxtil, com gramagem mínima de 250 g/m².(…)(…)20,00%(…)
    04.5
Fabrico e colocação de blocos Antifer de 30 ton. com betão simples de classe C40/50 XA2 Cl1,0 S4, incluindo preparação do estaleiro, moldes, betonagem, presa, desmoldagem, cura, transporte e colocação na zona definida em projeto.(…)(…)9,00%(…)

(…)” (cfr. documento denominado “3.2.1.eExecução dos trabalhos em %.pdf” constante da pasta “13.1-Proposta 13-05” que se encontra na pasta “13-Propostas” do p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

14) E o documento “3.2.1.c Lista de Preços Unitários.pdf”, no qual consta o seguinte: “(…)

(…)

(…)

(…)

(…)

(…)

(…)

(…)” (cfr. documento designado de “3.2.1.c Lista de preços unitários.pdf” constante da pasta “13.1-Proposta 13-05” que se encontra na pasta “13-Propostas” do p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

15) O “3.2.1e Cronograma Financeiro.pdf” apresentado pela Contrainteressada com a sua proposta tem o seguinte conteúdo: “(…)

(…)” (cfr. documento denominado “3.2.1.eCronograma Financeiro.pdf” constante da pasta “13.1- Proposta 13-05” que se encontra na pasta “13-Propostas” do p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

16) E o documento “3.2.1.e Plano de Pagamento – Detalhado.pdf” o seguinte teor: “(…)
ID
    Nome da Tarefa
Mês 1Mês 2Mês 3
    Mês 4
Mês 5Mês 6Mês 7Mês 8Mês 9Mês 10
(…)
(…)
(…)(…)
    (…)
(…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
7
Implementação do plano de segurança e saúde (…)
156,21
    161,46
156,25161,46161,46151,04161,46146,63
(…)
(…)
(…)(…)
    (…)
(…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
9
Execução do projeto de telas finais
(…)
500,00
(…)
(…)
(…)(…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
    (…)
(…)” (cfr. documento denominado “3.2.1.e Plano de Pagamento – Detalhado.pdf” constante da pasta “13.1-Proposta 13-05” que se encontra na pasta “13-Propostas” do p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

17) O júri elaborou o relatório preliminar constante do documento designado de “14_Relatório Preliminar I.pdf”, no qual se consigna, entre o mais, o seguinte: “(…) [como] é consabido, tratam-se, pois, de documentos que se encontram interligados, tendo o júri do procedimento verificado que na conjugação das percentagens de trabalhos efetuados mensalmente e Programa de Trabalhos apresentado conjugado com a Lista de Preços Unitários dos Trabalhos, os pagamentos propostos pelo concorrente não coincidem com os trabalhos efetuados.

(…)

No entender do júri do procedimento, trata-se, pois, de uma proposta que não apresenta um grau satisfatório de exatidão, tendo se verificado da análise dos documentos várias imprecisões e incorreções entre os dados constantes nos mesmos, razão pela qual se propõe a exclusão da proposta apresentada pelo Concorrente n.º 2 – A........... – Engenharia e Construções, S. A., nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 70.º, por remissão da alínea o) do n.º 2 do artigo 146.º, uma vez que a documentação apresentada com a proposta, designadamente os documentos “Execução dos trabalhos (em percentagem)”, “Programa de Trabalhos”, “Cronograma Financeiro”, “Plano de Pagamentos Detalhado” e o “Plano de Pagamentos (em percentagem)”, violam aspetos da execução do contrato a celebrar, uma vez que os valores neles apresentados não são coincidentes e, por conseguinte, não estão em conformidade com o solicitado no Programa de Procedimento.

(…)

Da proposta apresentada pelo concorrente, designadamente após análise do documento “Plano de Pagamentos Detalhado”, conjugado com o documento “Execução dos trabalhos (em percentagem)”, constata-se que a forma de pagamento proposto para o Artigo 01.2 da Lista de Preços Unitários “Implementação do plano de segurança e saúde, incluindo os meios humanos, materiais e equipamentos necessários”, é diluída ao longo de todos os meses de execução da empreitada, quando o mesmo teria de prever o pagamento de 50% no primeiro auto, 25% a meio do contrato e 25% no último auto.

(…)

Ora, da proposta apresentada pelo concorrente, designadamente da análise do documento “Plano de Pagamentos Detalhado”, conjugado com o documento “Execução dos trabalhos (em percentagem)”, constata-se que a forma de pagamento proposto para o Artigo 01.4 da Lista de Preço Unitários “Execução do projeto de telas finais dos trabalhos realizados, a entregar na receção provisória da obra”, é proposto como pagamento único no último mês de execução da empreitada quando teria de ser repartido da seguinte forma: 20% a um terço do prazo contratual, 30% a dois terços do prazo contratual, 30% no penúltimo auto e 20% no último auto com a aprovação das telas finais.

Face ao exposto, o júri do procedimento propõe a exclusão da proposta apresentada pelo Concorrente n.º 2 – A........... – Engenharia e Construções, S. A., nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 70.º, por remissão da alínea o) do n.º 2 do art.º 146.º, uma vez que a proposta apresenta termos ou condições, designadamente condições de pagamento que violam aspetos da execução do contrato a celebrar e que se encontram firmados nas peças do procedimento (…)” (cfr. documento designado de “14_Relatório Preliminar I.pdf” constante do p.a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

18) Em face do aludido em 17), a Contrainteressada pronunciou-se nos termos constantes do documento denominado “16_Pronúncia A............pdf” constante do p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido.

19) No seguimento do indicado em 18), o júri elaborou o “Relatório Final I.pdf”, no qual concluiu que: “(…) [em] face do exposto, o júri do procedimento é de entendimento que a exclusão da proposta do Concorrente n.º 2 – A........... -Engenharia e Construções, S. A., com base nos motivos vertidos no Relatório Preliminar, consubstanciará a prática de um ato ilegal por padecer de vício de violação de lei, mais concretamente, por atentar contra o disposto no n.º 1 e 2 do art.º 72.º, al. b) do n.º 2 do art.º 70.º, aplicável ex vi al. o) do n.º 2 do art.º 146.º e contra o princípio da proporcionalidade, consagrado no art.º 1.º-A, todos do CCP, razão pela qual deve a mesma ser readmitida.

Nesta conformidade, o Júri propõe nova ordenação das propostas apresentadas por aplicação do critério de adjudicação do seguinte modo:

1.º Lugar: Concorrente n.º 2 – A........... – Engenharia e Construções, S. A.

2.º Lugar: Concorrente n.º 1 – T..........., S. A./F…….., S. A. (…)” (cfr. documento designado de “18_Relatório Final I.pdf” constante do p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).

20) As Autoras pronunciaram-se nos termos constantes do documento “20_Pronúncia_........ _sign.pdf” constante do p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido.

21) O Júri elaborou o “Relatório Final II.pdf”, nos termos do qual “(…) [deliberou] não dar provimento às reclamações apresentadas pelo Concorrente n.º 1 – T..........., S. A./F…, S. A. na sua pronúncia, por entender ser a decisão que melhor se coaduna com o respeito pelos princípios da legalidade, proporcionalidade, concorrência e prossecução do interesse público, evitando desse modo uma exclusão desproporcionada e contrária ao interesse público.

O Júri mantém, assim, o teor e as conclusões do relatório final I, pelo que propõe a adjudicação da proposta apresentada pelo concorrente n.º 2 – A........... – Engenharia e Construções, S. A., pelo valor global de €889.000,00 (oitocentos e oitenta e nove mil euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor se legalmente devido.

Nada mais tendo a acrescentar, remete-se para os devidos efeitos e ao abrigo do n.º 3 do art.º 148.º do Decreto-lei n.º 18/2008, de 29/01, à superior consideração do Conselho de Administração da A........... – Administração dos Portos da Região Autónoma da Madeira, S. A., o presente relatório final, bem como os demais documentos que compõem o processo de concurso (…)” (cfr. documento denominado “22_Relatório Final II.pdf” constante do p. a. cujo teor ser considera integralmente reproduzido).

22) Em 23 de julho de 2020, o Conselho de Administração da Entidade Demandada deliberou adjudicar o concurso público para execução da empreitada de reabilitação do molhe principal do porto de Porto Santo à Contrainteressada (cfr. documento designado de “27_Deliberação de adjudicação.pdf” constante do p. a. cujo teor se considera integralmente reproduzido).


*

Factos Não Provados:

Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da presente ação.


*

Motivação:

O Tribunal fundou a sua convicção na análise dos documentos constantes do processo administrativo (que se encontra na pen drive junta aos autos), conforme especificado nos vários pontos da factualidade dada como provada, que não foram impugnados e que, pela sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do tribunal, em conjugação com a livre apreciação da prova.

A demais matéria não foi aqui considerada por ser conclusiva, de direito ou não relevar para a decisão da causa.”.

DE DIREITO

Considerada a factualidade fixada, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos de cada um dos recursos jurisdicionais, segundo a sua ordem lógica a prioritária de conhecimento.

Na parte em que os respetivos recursos apresentem fundamentos comuns ou coincidentes, far-se-á uma análise conjunta.

B. Recurso interposto pela Entidade Demandada

1. Erro de julgamento de facto, por omissão de factos relevantes para a decisão da causa

Vem a Entidade Demandada assacar o erro de julgamento de facto à sentença recorrida, com o fundamento de ter omitido o julgamento de factos relevantes para a decisão a proferir, os quais entende deverem ser aditados ao julgamento dos factos provados.

Invoca que atendendo ao conjunto da prova documental carreada para o processo, existem outros factos com interesse para a decisão, nos termos que são identificados na alegação do recurso e nas suas respetivas conclusões, a saber:

“23) Por equívoco, a Contrainteressada propôs no seu plano de pagamentos que o preço dos itens Implementação do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais fossem tratados como é usual na maioria dos concursos de empreitada, ou seja:

- Os da implementação do PSS, no valor global de € 1.250,00, a pagar mensalmente ao longo do prazo contratual; e

- Os das Telas Finais, no valor global de € 500,00, a pagar integralmente no último mês.

24) O plano de pagamentos apresentado pela Contrainteressada para os itens mencionados no ponto anterior respeitou o critério de medição estabelecido no Caderno de Encargos (Cláusulas Técnicas), ou seja, estabeleceu na sua proposta (lista de preços unitários) que tanto a “Implementação do PSS” como as “Telas Finais” são medidas como valor global (VG).

25) O plano de pagamento dos preços devidos pela implementação do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais, não implica o agravamento de quaisquer custos, respeita os limites percentuais fixados no CE e representada cerca de 0,1969% do preço da proposta e cerca de 0,1777% do preço base.”.

Como meios probatórios indica a Recorrente os seguintes:

“a) CE, junto com o processo Administrativo, mais concretamente: o estipulado no ponto 3.2 da Cláusulas Gerais do CE e o estipulado no ponto 3.1.2 e 3.1.4 da Clausulas Técnicas e o Mapa de Quantidades de Trabalhos que se lhe encontra anexo;

b) Proposta da Contrainteressada, junta com o processo Administrativo, mais concretamente: a Lista de Preços Unitários e o Plano de Pagamentos;

c) Pronúncia da Contrainteressada, junta com o processo Administrativo, mais concretamente o alegado nos pontos 25 a 29;

d) Relatório Final I, junto com o processo Administrativo;

e) Relatório Final II, junto com o processo Administrativo.”.

Antes de analisar criticamente a matéria de facto posta em crise pela Recorrente impõe-se proceder ao enquadramento de direito dos termos em que o julgamento de facto pode ser impugnado em sede de recurso e das suas exigências, assim como em que condições está este Tribunal ad quem habilitado a reexaminar a matéria de julgado julgada em primeira instância.

Como anteriormente decidido, entre outros, no Processo 03522/08, de 19/01/2012, deste TCAS, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 640.º do CPC, incumbe ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto “obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição”:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”.

Segundo o n.º 2 do citado artigo 640.º do CPC, no caso previsto na alínea b) do número anterior:

“(…) b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.”.

Nas citadas disposições impõe-se um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, que impende sobre a aqui Recorrente e que a mesma satisfez, como decorre do teor das alegações produzidas em juízo.

Porém, a matéria de facto que a Entidade Demandada, ora Recorrente, pretende que seja aditada ao julgamento da matéria de facto não corresponde a verdadeiros factos, antes a juízos conclusivos extraídos do conjunto da prova produzida em juízo.

Tratam-se de conclusões de facto extraídas do conjunto da prova produzida e, em alguns casos, de meros juízos, não alicerçados em qualquer factualidade que os suporte.

Como decorre do teor do citado facto referido como 23), o mesmo inicia-se com a expressão “Por equívoco…”, constando ainda do seu teor que “é usual na maioria dos concursos”, quando é manifesto que tais expressões não só não traduzem qualquer realidade de facto, antes consistindo em juízos de valoração da prova e não factos em si mesmo, como tais juízos não estão demonstrados por qualquer meio de prova, designadamente, a documental carreada para os autos.

Do mesmo modo não pode ser aceite como facto o teor referido em 24), neste caso, por se tratar de um juízo de direito, quanto a saber se a proposta apresentada pela Contrainteressada “respeitou o critério de medição estabelecido no Caderno de Encargos”.

E também ainda no respeitante ao teor constante em 25) supra, por o mesmo, dizendo respeito a saber se o plano de pagamentos dos preços apresentado implica o agravamento dos custos, respeitar a um juízo de facto ou a uma mera conclusão de facto, não traduzindo um facto que deva constar do probatório assente.

Estão em causa alegações sem substrato factual para poderem constar do julgamento de facto, antes juízos de facto e de direito a formular no âmbito do julgamento da questão de direito, dizendo, por isso, à questão de direito e não à questão de facto.

Além de que, não alicerça a Recorrente tais alegados factos em qualquer dos articulados das partes, não fundamentando o erro de julgamento de facto por omissão de factos relevantes em qualquer dos articulados apresentados.

Assim, em face de todo o exposto, será de negar razão à ora Recorrente quanto ao invocado erro de julgamento de facto.

O que acarreta que se deva manter, integralmente, o julgamento de facto constante da sentença recorrida.

Termos em que, se julga improcedente, por não provado, o erro de julgamento de facto.

A. e B. Recursos interpostos pela Contrainteressada e pela Entidade Demandada

Erro de julgamento de direito, quanto à existência de um erro ou lapso da proposta apresentada pela Contrainteressada quanto às condições de pagamento constantes do plano de pagamentos e que o não cumprimento das condições de pagamento constitua fundamento de exclusão da proposta

No demais, entende a Entidade Demandada que o presente litígio coloca duas questões essenciais: (i) saber se a proposta apresentada pela Contrainteressada padece de um lapso, equívoco ou erro no que respeita às condições de pagamento constantes do seu plano de pagamentos para os itens da implementação do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais e se tal lapso, equívoco ou erro é suscetível de retificação ou correção e (ii) se o não cumprimento das condições de pagamento quanto a dois itens acessórios e conexos às diferentes listas de trabalhos, referentes à implementação do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais, que representa cerca de 0,1969% do preço total da proposta e cerca de 0,1777% do preço base fixado, constitui fundamento de exclusão da proposta, considerando que o critério de adjudicação é o do mais baixo preço, que está em causa uma condição ou termo relativo à execução do contrato não submetido à concorrência pelo Caderno de Encargos e em face do princípio da proporcionalidade, da concorrência e do interesse público.

Sustenta que a proposta apresentada pela Contrainteressada apresenta um equívoco, lapso ou erro quanto às condições de pagamento do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais, no montante de € 1.250,00, escalonado por 8 meses, correspondentes ao prazo de execução da empreitada, em desconformidade com o previsto no ponto 3.1.2. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, que prevê o pagamento em 3 fases, uma de 50% no primeiro ano, 25% a meio do contrato e 25% no último ano e ainda, um equívoco, lapso ou erro quanto às condições de pagamento da execução do projeto de telas finais, no montante de € 500,99 no último mês de execução do contrato, em desconformidade com o ponto 3.1.4. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, que prevê o pagamento em 4 fases, sendo 20% a 1/3 do prazo contratual, 30% a 2/3 desse prazo, 30% no penúltimo auto e 20% no último auto com a aprovação das telas finais.

Segundo a Recorrente, tais itens da lista de trabalhos representam apenas cerca de 0,1969% do preço da proposta e cerca de 0,1777% do preço base, sendo menos de 0,2% do valor total da proposta.

No entanto, alega que a proposta da Contrainteressada respeita o critério de medição de valor global no que respeita aos itens supra referidos, apresentando somente condições de pagamentos diferentes das fixadas no Caderno de Encargos.

Mais invoca que em audiência prévia, a Contrainteressada declarou/confessou que a apresentação das condições de pagamento dos itens supra identificados decorre de um equívoco, que foi causado pelo que é habitual dispor a respeito do pagamento das rubricas em causa.

Por outro lado, nos termos alegados pela Contrainteressada no respetivo recurso jurisdicional interposto, a sentença recorrida incorre em erro de julgamento de direito em relação ao artigo 70.º, n.º 2, b) do CCP, ao decidir que o Plano de Pagamentos não cumpre o disposto nas Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos e apresenta um termo ou condição que viola aspetos de execução do contrato não submetidos à concorrência.

Do mesmo modo que incorre em erro de julgamento de direito, por existir uma contradição entre o ponto 3.1.2. das Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos e os pontos 3.2.1. e 3.1.4. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, em violação dos princípios da legalidade, transparência e igualdade.

Além de a sentença recorrida, pelo diminuto valor envolvido, violar o princípio da proporcionalidade e ainda, errando ao não aplicar o princípio do aproveitamento do ato administrativo.

Mais alega que a sentença incorre em erro de julgamento de direito, por violação do artigo 72.º do CCP, ao entender não ser aplicável a possibilidade de existirem esclarecimentos, suprimentos e retificações, pondo em causa os princípios da concorrência, imparcialidade e legalidade.

Vejamos.

Afim de decidir os fundamentos do recurso invocados por ambas as Recorrentes, importa dilucidar a matéria de facto que se encontra demonstrada em juízo e em relação à qual as partes não dirigem qualquer erro de julgamento.

Nos termos do julgamento da matéria de facto extrai-se que a Entidade Demandada lançou um concurso público para execução da empreitada de reabilitação do molhe principal do porto de Porto Santo (conforme ponto 1) do probatório), sendo o critério de adjudicação o da proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante, determinada pela modalidade de avaliação do preço, enquanto único aspeto da execução do contrato a celebrar (cfr. ponto 3.10.1 do Programa do Procedimento).

No ponto 3.2.1, e) do respetivo Programa do Procedimento determina-se que “[as] propostas devem ser constituídas pelos seguintes documentos, sob pena de exclusão: (…) e) Programa de trabalhos, incluindo plano de trabalhos, plano de mão-de-obra e plano de equipamento. (…)”, encontrando-se o plano de trabalhos densificado nos pontos 3.2.4 e no 3.2.5 da mesma peça do procedimento.

Por sua vez, o ponto 3.1.2. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, sob a epígrafe “[implementação] do plano de segurança e saúde, incluindo os meios humanos, materiais e equipamentos necessários” prevê: “(…) [caso] não haja nada indicado em contrário, nos restantes elementos de projeto, os encargos relativos a esta rúbrica são os que resultam do PSS e não estejam incluídos noutros subcapítulos deste Caderno de Encargos e serão pagos da seguinte forma: 50% no primeiro auto, 25% a meio do contrato e 25% no último auto”.

Já o ponto 3.1.4. da referida peça do procedimento relativo à “[execução] do projeto de telas finais dos trabalhos realizados, a entregar na receção provisória da obra” estabelece: “(…) [caso] não haja nada indicado em contrário, nos restantes elementos de projeto, os encargos referentes a este sub-capítulo serão pagos da seguinte forma: 20% a um terço do prazo contratual, 30% a dois terços do prazo contratual, 30% no penúltimo auto e 20% no último auto com a aprovação das telas finais”.

No confronto entre o estabelecido nas peças do procedimento e o mencionado na proposta da Contrainteressada, no documento “3.2.1.e Plano de Pagamentos – Detalhado.pdf” apresentado pela Contrainteressada, verifica-se que a proposta apresenta um plano de pagamentos, no que concerne à implementação do plano de segurança e saúde, mensal (com início no terceiro mês) e relativamente à execução do projeto de telas finais dos trabalhos realizados, de pagamento único, no último mês, em inobservância do disposto nos pontos 3.1.2. e 3.1.4. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos.

Esta inobservância é assinalada na sentença recorrida, como sendo um facto que não é negado nem pela Contrainteressada, nem pela Entidade Demandadas nas respetivas contestações, do mesmo modo que se trata de factualidade que se mostra admitida pelas ora Recorrentes em ambos os recursos.

Por isso, não existe qualquer controvérsia acerca do desrespeito pela proposta apresentada pela Contrainteressada do plano de pagamentos concernente à implementação do plano de segurança e saúde, mensal (com início no terceiro mês) e relativamente à execução do projeto de telas finais dos trabalhos realizados, de pagamento único, no último mês, em inobservância do disposto nos pontos 3.1.2. e 3.1.4. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos.

Sobre a questão de saber se incorre a sentença recorrida em erro de julgamento ao não entender que se trata de lapso, equívoco ou erro no que respeita às condições de pagamento constantes do seu plano de pagamentos para os itens da implementação do Plano de Segurança e Saúde e Telas Finais e quanto a tal lapso, equívoco ou erro ser suscetível de retificação ou correção, de imediato se nega razão às Recorrentes.

A proposta apresentada pela Contrainteressada apresenta um termo ou condição que viola o disposto no ponto 3.1.4. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, isto é, um aspeto da execução do contrato não submetido à concorrência, pelo que, não está em causa um mero lapso, equívoco ou erro que seja suscetível de retificação ou correção, antes uma causa que determina a exclusão da proposta, nos termos do disposto no artigo 70.º, n.º 2, al. b) do CCP.

Pelo que, ao decidir a Entidade Demandada pela admissão da proposta, ao invés da sua exclusão, incorreu no vício de violação de lei, por inobservância do disposto no artigo 70.º, n.º 2, al. b) do CCP, tal como decidido na sentença recorrida.

Importa assumir que o vertido nas Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos se traduz num termo ou condição da proposta a apresentar, que redunda em determinados aspetos que deixam de estar submetidos à concorrência, razão por que não são objeto de avaliação, isto é, de avaliação comparativa das propostas segundo o critério de adjudicação.

Trata-se de um requisito exigido nas peças do procedimento e que, como tal, deve constar da proposta apresentada, ou seja, um elemento integrante da proposta.

Extrai-se do teor das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos um conjunto de vinculações para os concorrentes, que os mesmos têm de cumprir e respeitar aquando a apresentação da proposta, sendo essas vinculações respeitantes a aspetos da execução do contrato, embora não submetidos à concorrência, por não integrarem o critério de adjudicação e seu fator e subfactores de avaliação.

A exigência colocada no Caderno de Encargos sendo qualificada como um termo ou condição, refere-se a um aspeto da execução do contrato não submetido à concorrência que a entidade adjudicante pretende que os concorrentes se vinculem, ou seja, um aspeto da execução do contrato que se impõe de modo imperativo a todos os interessados em contratar.

A Administração definiu nas Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos as condições a que está disposta a contratar, por corresponderem a aspetos essenciais para a correta prossecução do interesse público subjacente à decisão de contratar.

Donde, estar em causa um requisito que é imposto e definido pela própria entidade adjudicante e a que não está disponível para renunciar, razão porque se trata de aspeto respeitante à execução do contrato não submetido à concorrência.

Por isso, comprovando-se que a proposta apresentada não respeita tal aspeto vinculativo das peças do procedimento, não se poderá concluir pela possibilidade de correção, aperfeiçoamento ou sanação, porque tal se traduziria numa alteração do conteúdo da proposta e num desrespeito às vinculações previamente estabelecidas nas peças do procedimento.

Assim, com base na factualidade julgada provada e inteiramente assumida nos presentes recursos, está em causa uma falta da proposta apresentada pela Contrainteressada, traduzindo uma desconformidade com o definido nas peças do procedimento.

Donde, não existir qualquer razão na invocação de que as desconformidades da proposta incidem sobre aspetos da proposta que poderiam deixar de figurar, por serem aspetos acessórios e conexos com a execução da empreitada, não traduzindo uma especial vinculação.

A isso não obsta a falta de intencionalidade de inobservância das peças do procedimento por parte da Contrainteressada, por se tratar de um mero lapso, nem tão pouco a circunstância de ter subscrito e apresentado a declaração do Anexo I-M, que aceitou respeitar, obedecer e cumprir com todo o conteúdo do Caderno de Encargos.

Tendo a concorrente subscrito a declaração de aceitação do conteúdo do Caderno de Encargos (Anexo I-M), não permite afastar a relevância e o compromisso manifestados através da apresentação de qualquer outro documento que contenha regras técnicas ou outras que contrariem esse mesmo Caderno de Encargos, nem a declaração de aceitação se sobrepõe aos documentos que a contrariam, por ser necessário o cumprimento rigoroso do estabelecido nas peças do procedimento.

Neste sentido, “(…) que, nas situações descritas na alínea b) do artigo 70.º/2 do CCP – como aliás em qualquer outra causa de exclusão onde isso pudesse servir de argumentação –, é irrelevante o facto de o concorrente ter subscrito a declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos do anexo I ao CCP ou o facto de, nos termos do artigo 96.º/5, o caderno de encargos prevalecer sobre a proposta quando haja divergência entre eles: se um atributo violar os parâmetros base ou se um termo ou condição violar um limite máximo ou mínimo, a proposta deve ser excluída, não servindo aquela declaração ou prevalência para a legitimar” (cfr. Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira, “Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública”, Coimbra, Almedina, 2016, pp. 934.

Do mesmo modo que assim tem sido entendido pela jurisprudência, entre outros, nos Acórdãos, deste Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), de 16/03/2017, Proc. n.º 590/16.6 BESNT e do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), de 22/05/2015, Proc. n.º 01199/14.4BEAVR, referidos na sentença recorrida.

No que respeita a apurar se existe uma contradição entre as Cláusulas Gerais e as Cláusulas Técnicas, do Caderno de Encargos, designadamente, entre o estipulado no ponto 3.1.2. das Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos e o previsto nos pontos 3.1.2. e 3.1.4. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, e qual a relação de prevalência entre tais Cláusulas do Caderno de Encargos, importa o seguinte.

Do disposto no ponto 1.2. do Programa do Procedimento não se pode extrair o entendimento que as Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos prevalecem sobre as respetivas Cláusulas Técnicas.

Além de que, prevendo o ponto 1.4.1. das Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos que “[no] caso de existirem divergências entre os vários documentos referidos nas alíneas b) a f) de 1.2.2., prevalecem os documentos pela ordem em que são aí indicados”, aí não se estabelece qualquer ordem de prevalência entre as Cláusulas Gerais e as Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos.

As regras legais de interpretação conduzem ao entendimento inverso, de as normas especiais prevalecerem, pela sua vocação de regulação específica, sobre as respetivas normas gerais.

Interpretar o teor do Caderno de Encargos implica extrair dele a vontade real da Administração, segundo as regras legais de interpretação.

O que, em si mesmo, não põe em crise o princípio da legalidade, transparência ou igualdade, como defende a Contrainteressada, ora Recorrente.

Entendendo a Contrainteressada, ora Recorrente que existia a invocada contradição entre as referidas Cláusulas do Caderno de Encargos, dispunha da faculdade prevista no artigo 50.º, n.º 1 do CCP, de solicitar, no primeiro terço do prazo fixado para a apresentação das propostas, os esclarecimentos necessários à boa compreensão e interpretação das peças do procedimento e, no mesmo prazo, do dever de apresentar uma lista na qual identifiquem, expressa e inequivocamente, os erros e as omissões das peças do procedimento por si detetados.

No demais, extrai-se que o ponto 3.1.2. das Cláusulas Gerais do Caderno de Encargos determina que “[os] pagamentos a efetuar pelo dono da obra têm uma periodicidade mensal, sendo o seu montante determinado por medições mensais a realizar de acordo com o disposto em 2.3.18”.

Pelo que, como constante da fundamentação da sentença recorrida “mesmo que se considerasse que o facto do ponto 3.1.2 das cláusulas gerais do caderno de encargos prever que os pagamentos a efetuar ao dono-de-obra têm uma periodicidade mensal, justificava o proposto no documento “3.2.1.e Plano de Pagamentos – Detalhado.pdf” quanto à implementação do plano de segurança e saúde (plano de pagamento mensal), tal não pode, no entanto, legitimar o plano de pagamentos proposto para a execução do projeto de telas finais dos trabalhos realizados, uma vez que, relativamente a este trabalho, a Contrainteressada previu um pagamento único (e não mensal como disposto no ponto 3.1.2. das cláusulas gerais do caderno de encargos). Nessa medida, atendendo que a proposta apresentada pela Contrainteressada apresenta um termo ou condição que viola o disposto no ponto 3.1.4. das cláusulas técnicas do caderno de encargos, isto é, um aspeto da execução do contrato não submetido à concorrência, devia a mesma ter sido excluída ao abrigo do artigo 70.º, n.º 2, al. b) do CCP.”.

Pelo que, também não tem razão de ser o entendimento assumido pela Contrainteressada de que as Cláusulas 3.1.2. e 3.1.4 do Caderno de Encargos teriam natureza supletiva e, como tal, se poderia entender que as exigências definidas em relação à forma de pagamentos se aplicam apenas caso não haja nada indicado em contrário nos restantes elementos do projeto.

Trata-se de interpretação que não tem qualquer arrumo em face da matéria de facto provada e das regras legais de interpretação da lei ou dos atos jurídicos.

Por isso, aceitando as Recorrentes que os lapsos ou equívocos da proposta devem ser interpretados ou corrigidos nos termos gerais das regras de interpretação, defendem solução que não cabe nas respetivas normas legais, interpretadas à luz das normas do Caderno de Encargos.

O que implica que a proposta apresentada pela Contrainteressada, ora Recorrente, não respeitou o exigido pelas Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, subsumindo-se essa desconformidade ao disposto no artigo 70.º, n.º 2, b) do CCP, que prevê quanto ao regime da análise das propostas, que sejam excluídas as propostas cuja análise revele que não apresentam algum dos termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência.

Tratando-se de um incumprimento do Caderno de Encargos, constitui a violação de um requisito imposto nas peças do procedimento, o que constitui fundamento de exclusão da proposta, por se subsumir no disposto no artigo 146.º, n.º 2, o) do CCP, por cuja análise revele alguma das situações previstas no n.º 2 do artigo 70.º, pelo que, é de o excluir no regime das meras faltas ou irregularidades, passíveis de sanação, mediante convite dirigido ao concorrente.

A proposta apresentada não respeita o termo ou condição imposta pela entidade adjudicante, pelo que, a falta em causa não se pode enquadrar no regime das faltas passíveis de correção ou sanação.

Por isso, ser insuficiente a declaração geral de aceitação do Caderno de Encargos, prevista no artigo 57.º, n.ºs 1, a) do CCP e do seu respetivo Anexo I, porque a mesma não seria apta a dar satisfação à específica condição imposta pela Cláusula Específica do Caderno de Encargos, antes estando em causa o disposto no artigo 57.º, n.º 1, c) do CCP, ou seja, documentos exigidos pelo programa do procedimento que contenham os termos ou condições relativos a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule.

Permitir essa correção ou sanação equivaleria admitir a apresentação de um requisito ou termo ou condição novo, que a proposta antes não previsse, ou seja, permitir que a concorrente através de uma alteração à proposta apresentada, se vinculasse a um requisito ou termo ou condição a que anteriormente não se vinculou, no que se traduziria numa modificação ao conteúdo material da proposta e de um seu termo ou condição, com a consequência, não apenas de ferir a legalidade aplicável, como de retirar uma vantagem, em detrimento ou em desigualdade com a outra concorrente que apresentou proposta ao procedimento, ora Recorrida.

O procedimento pré-contratual é formalizado e submetido a parâmetros de vinculação legal e embora seja legalmente possível, nos termos previstos no artigo 72.º do CCP, em certas situações, respeitante a formalidade não essencial, a sanação ou suprimento de qualquer omissão ou incompletude da proposta, obstando à consequência gravosa e desproporcional da sua imediata exclusão, essa possibilidade não se verifica em situações como a que ora se configura no presente caso, em que está em causa um termo ou condição da proposta.

Daí o disposto no artigo 72.º, n.º 2 do CCP prescrever que “[o]s esclarecimentos prestados pelos respectivos concorrentes fazem parte integrante das mesmas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respectivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º”.

Pelo que, não assiste razão às Recorrentes quando defendem que a sentença recorrida incorre em violação do artigo 72.º do CCP, ao não aceitar a possibilidade de suprimento ou retificação do teor da proposta.

Pelo contrário, admitir essa possibilidade de suprimento da desconformidade da proposta em relação a um seu elemento essencial, é que seria violador dos princípios da concorrência, da imparcialidade e da legalidade.

No demais, a natureza do procedimento, atinente a procedimento de contratação pública, submetido a um quadro normativo preciso e vinculado, fortemente determinado pelo direito da União Europeia, sem qualquer margem para aplicação de critérios de valoração administrativa, que possam ser pautados por juízos de oportunidade ou conveniência, ditam o juízo de inaplicabilidade do princípio da proporcionalidade nos termos defendidos pelas ora Recorrentes.

Não sendo o direito da contratação pública insensível à proporcionalidade como princípio fundamental de direito, por estar em causa um critério normativo relevante, a proporcionalidade tem aplicação aos procedimentos de contratação pública no âmbito e termos definidos pelo quadro legal aplicável, ou seja, estritamente segundo as valorações previamente assumidas pelo legislador.

Por isso se admite, embora em termos limitados ou condicionados, a possibilidade de esclarecimentos, correções ou suprimentos da proposta, ao invés da sua exclusão, por se considerar, segundo valorações que cabe ao legislador fazer, que nos casos em que se verifique a preterição de meras formalidades não essenciais, seria demasiado gravoso ou desproporcional para o conjunto dos direitos e interesses em presença, cominar essa falta da proposta, com a sua imediata exclusão do procedimento.

Porém, não acolhe o ordenamento jurídico a consideração da relativa ou diminuta significância ou impacto financeiro da falta da proposta para obstar à exclusão da proposta num caso como o descrito em juízo, em que está em causa a falta de um elemento essencial da proposta, ainda que o mesmo apresente diminuta repercussão económica no valor global da proposta ou não implique qualquer agravamento dos custos.

Não consente o princípio da proporcionalidade uma dimensão aplicativa que determine o afastamento de normas imperativas, por o mesmo não dispor desse alcance em procedimentos submetidos à concorrência.

Além de que, como vertido na sentença recorrida, “No âmbito do procedimento pré-contratual, o princípio da proporcionalidade impõe que, considerando a função e objetivos do procedimento em causa, o órgão adjudicante não adote medidas restritivas da concorrência sem justificação suficiente e adequada para o efeito.

No plano procedimental, exige-se o mesmo, ou seja, que o órgão adjudicante ou o júri avaliem a adequação e proporcionalidade dos meios utilizados em relação aos fins prosseguidos, designadamente na escolha da medida adequada ao caso.

Cumpre, no entanto, salientar que no caso sub judice não se justifica o recurso ao princípio da proporcionalidade, porquanto não se trata de uma situação em que a cominação aplicável se encontre na margem de livre apreciação do órgão adjudicante/júri, resultando, ao invés, de uma norma legal imperativa que vincula o júri a propor a exclusão e o órgão adjudicante a decretá-la, sob pena de violação do princípio da legalidade.

De todo o modo, sempre se dirá que não procede o argumento de que se trata de uma desconformidade irrelevante e de diminuto impacto financeiro.

Com efeito, se as condições de pagamento se encontram previstas nas cláusulas do caderno de encargos e constituem um aspeto da execução do contrato a celebrar não submetido à concorrência, cuja sanção para a sua violação é a exclusão (cfr. artigo 70.º, n.º 2, al. b) do CCP), é porque a entidade adjudicante pretendia que os concorrentes se vinculassem ao seu cumprimento, motivo pelo qual não se pode concluir pela sua irrelevância.

O reduzido impacto financeiro do termo ou condição ou a poupança que resulta da adjudicação de determinada proposta também não pode ser justificação para não exclusão de uma proposta que viole um aspeto da execução do contrato não submetido à concorrência, na medida em que uma norma imperativa – o artigo 70.º, n.º 2, al. b) do CCP – não pode ser afastada por motivos meramente economicistas ou financeiros. Por outras palavras, não se pode derrogar a solução legal por aplicação do princípio da proporcionalidade.”.

Do mesmo modo que a matéria a que respeita o litígio, nas particularidades concretas do caso, não consente a aplicação do princípio do aproveitamento do ato, nos termos do disposto no artigo 163.º, n.º 5 do CPA ou ao abrigo de outro regime que, reconhecendo a ilegalidade do ato impugnado, obste à sua invalidação.

Não se encontra verificado qualquer dos pressupostos previstos em alguma das alíneas do disposto no n.º 5 do artigo 163.º do CCP, nem de resto, procede a Recorrente à subsunção do caso em qualquer das suas alíneas, não substanciando o fundamento do recurso.

Termos em que, em face de todo o exposto, com base na fundamentação de direito antecedente, será de julgar improcedentes, por não provados, os fundamentos do recurso, mantendo-se a sentença recorrida.


*

Pelo exposto, será de negar provimento aos recursos, por não provados os seus respetivos fundamentos e, em consequência, manter a sentença recorrida.

*

Sumariando, nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. Não incorre a sentença recorrida em erro de julgamento de facto, por omissão de factos relevantes, se a matéria de facto que a Recorrente pretende que seja aditada não corresponde a verdadeiros factos, antes a juízos conclusivos, de facto e/ou de direito, extraídos do conjunto da prova produzida em juízo.

II. Estão em causa alegações sem substrato factual para poderem constar do julgamento de facto, antes juízos de facto e de direito a formular no âmbito do julgamento da questão de direito, dizendo, por isso, à questão de direito e não à questão de facto.

III. Verificando-se no confronto entre o estabelecido nas peças do procedimento e o mencionado na proposta da Contrainteressada, que a proposta apresenta um plano de pagamentos em inobservância do disposto nos pontos 3.1.2. e 3.1.4. das Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, facto que é admitido nas contestações da Contrainteressada e da Entidade Demandada e no âmbito dos recursos jurisdicionais, não existe qualquer controvérsia acerca desse desrespeito pela proposta, o qual não pode ser considerado como um mero lapso, equívoco ou erro, passível de suprimento ou correção nos termos do artigo 72.º do CCP, por se tratar de um termo ou condição que viola o disposto nas Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, isto é, um aspeto da execução do contrato não submetido à concorrência, que determina a exclusão da proposta, nos termos do disposto no artigo 70.º, n.º 2, al. b) do CCP.

IV. Trata-se de um requisito exigido nas peças do procedimento e que, como tal, deve constar da proposta apresentada, ou seja, um elemento integrante da proposta.

V. A Administração definiu nas Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos as condições a que está disposta a contratar, por corresponderem a aspetos essenciais para a correta prossecução do interesse público subjacente à decisão de contratar, pelo que, está em causa um requisito que é imposto e definido pela própria entidade adjudicante e a que não está disponível para renunciar, razão porque se trata de aspeto respeitante à execução do contrato não submetido à concorrência.

VI. Comprovando-se que a proposta não respeita tal aspeto vinculativo das peças do procedimento, não se poderá concluir pela possibilidade de correção, aperfeiçoamento ou sanação, porque tal se traduziria numa alteração do conteúdo da proposta e num desrespeito às vinculações previamente estabelecidas nas peças do procedimento.

VII. A isso não obsta a falta de intencionalidade de inobservância das peças do procedimento por parte da Contrainteressada, por se tratar de um mero lapso, nem tão pouco a circunstância de ter subscrito e apresentado a declaração do Anexo I-M, que aceitou respeitar, obedecer e cumprir com todo o conteúdo do Caderno de Encargos.

VIII. Não se podendo extrair das peças do procedimento ou da lei que as Cláusulas Gerais prevalecem sobre as Cláusulas Técnicas do Caderno de Encargos, as regras legais de interpretação conduzem ao entendimento inverso, de as normas especiais prevalecerem, pela sua vocação de regulação específica, sobre as respetivas normas gerais.

IX. Entendendo a concorrente que existia a invocada contradição entre as referidas Cláusulas do Caderno de Encargos, dispunha da faculdade prevista no artigo 50.º, n.º 1 do CCP, de solicitar, no primeiro terço do prazo fixado para a apresentação das propostas, os esclarecimentos necessários à boa compreensão e interpretação das peças do procedimento e, no mesmo prazo, do dever de apresentar uma lista na qual identifiquem, expressa e inequivocamente, os erros e as omissões das peças do procedimento por si detetados.

X. Permitir a correção ou sanação da proposta equivaleria admitir a apresentação de um requisito ou termo ou condição novo, que a proposta antes não previa, ou seja, permitir que a concorrente através de uma alteração à proposta apresentada, se vinculasse a um requisito ou termo ou condição a que anteriormente não se vinculou, no que se traduziria numa modificação ao conteúdo material da proposta e de um seu termo ou condição, com a consequência, não apenas de ferir a legalidade aplicável, como de retirar uma vantagem, em detrimento ou em desigualdade com a outra concorrente que apresentou proposta ao procedimento.

XI. O procedimento pré-contratual é formalizado e submetido a parâmetros de vinculação legal e embora seja legalmente possível, nos termos previstos no artigo 72.º do CCP, em certas situações, respeitante a formalidade não essencial, a sanação ou suprimento de qualquer omissão ou incompletude da proposta, obstando à consequência gravosa e desproporcional da sua imediata exclusão, essa possibilidade não se verifica em situações como a que ora se configura, em que está em causa um termo ou condição da proposta.

XII. A natureza do procedimento, atinente a procedimento de contratação pública, submetido a um quadro normativo preciso e vinculado, fortemente determinado pelo direito da União Europeia, sem qualquer margem para aplicação de critérios de valoração administrativa, que possam ser pautados por juízos de oportunidade ou conveniência, ditam o juízo de inaplicabilidade do princípio da proporcionalidade nos termos defendidos pelas Recorrentes.

XIII. Não sendo o direito da contratação pública insensível à proporcionalidade como princípio fundamental de direito, por estar em causa um critério normativo relevante, a proporcionalidade tem aplicação aos procedimentos de contratação pública no âmbito e termos definidos pelo quadro legal aplicável, ou seja, estritamente segundo as valorações previamente assumidas pelo legislador.

XIV. Não acolhe o ordenamento jurídico a consideração da relativa ou diminuta significância ou impacto financeiro da falta da proposta para obstar à exclusão da proposta num caso como o descrito em juízo, em que está em causa a falta de um elemento essencial da proposta, ainda que o mesmo apresente diminuta repercussão económica no valor global da proposta ou não implique qualquer agravamento dos custos.

XV. Do mesmo modo que a matéria a que respeita o litígio, não consente a aplicação do princípio do aproveitamento do ato, nos termos do disposto no artigo 163.º, n.º 5 do CPA ou ao abrigo de outro regime que, reconhecendo a ilegalidade do ato impugnado, obste à sua invalidação.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento a ambos os recursos, por não provados os seus respetivos fundamentos e em manter a decisão recorrida.

Custas pelas Recorrentes.

Registe e Notifique.

A Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 01/05, tem voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Juízes integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores, Pedro Marchão Marques e Alda Nunes.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)