Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05063/09
Secção:CA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:09/23/2010
Relator:CRISTINA DOS SANTOS
Descritores:DOMÍNIO PRIVADO MUNICIPAL
DIREITO DE SUPERFÍCIE EM DOMÍNIO PRIVADO AUTÁRQUICO
AGIR ADMINISTRATIVO EM ESTADO DE NECESSIDADE
Sumário:1. O acto formal expresso em deliberação da Câmara Municipal de desafectação de uma parcela de terreno do domínio público autárquico tem como consequência a cessação da dominialidade por desafectação singular resultante de nova delimitação fundiária, com passagem imediata ao domínio privado do Município.

2. A constituição do direito de superfície está sujeito ser obrigatóriamente o da Lei dos Solos para os casos previstos e o do Código Civil para quaisquer outros casos. – cfr. artºs. 2º, 5º, 19º a 21º, 29º a 31º e 60º do DL 576/70, 24.11, alterado pelos DL 313/80, 19.08 e 400/84, 31.12, artºs. 1524º e ss. C. Civil.

3. Enquanto o superficiário não inicia a obra impende sobre o proprietário do solo uma obrigação de pati; iniciada a obra o superficiário passa a estar incurso no dever jurídico de abstenção de uso e fruição sobre o solo, na medida da posse exclusiva do superficiário em ordem à materialização dos trabalhos de construção – cfr. artº 1532º C. Civil.

4. A norma que confere um poder a um órgão administrativo contém implícito o comando de que tal poder só deve ser exercido quando o reclamem necessidades reais e concretas; uma necessidade colectiva só se torna real quando ocorrem factos que geram o seu aparecimento ou subsistência.

5. Em circunstâncias excepcionais subsumíveis a caso de estado de necessidade, a Administração Pública está autorizada por princípio geral de direito a tomar através de órgãos normalmente incompetentes medidas com conteúdo, forma e em condições “ilegais” do ponto de vista do direito escrito. – cfr. artº 339º C. Civil.

6. A real ocorrência dos pressupostos de facto configura um requisito de validade do acto administrativo, de natureza sempre vinculada quer quando os pressupostos são vinculadamente individualizados na lei, quer quando eles são de livre escolha do órgão administrativo.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:A...– Parque Temático de Diversões, Lda., com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, dela vem recorrer, concluindo como segue:

1. A decisão do Tribunal a quo, de 9 de Fevereiro de 2009, de admitir as substituições de duas das testemunhas arroladas na oposição do Requerido, deve ser revogada, com as legais consequências, por violação da alínea g) do n.° 2 do artigo 114.° e dos n.° 2 e 4 do artigo 118.°, ambos do CPTA, e ainda, subsidiariamente, por violação do artigo 629.° do CPC.
2. Uma vez que o Tribunal a quo não apreciou o pedido de decretamento provisório das providências cautelares requeridas, verifica-se uma situação de omissão de pronúncia, o que inquina a Sentença sub judice de nulidade nos termos da alínea d) do n.° l do artigo 668.° do CPC, aplicável ex vi do artigo 1.° do CPTA.
3. No que respeita à verificação dos requisitos de que dependia a concessão das providências cautelares requeridas ao abrigo da alínea a) do n.° l do artigo 120.° do CPTA, a decisão ora recorrida padece de manifesta falta de fundamento, sendo em alguns casos ininteligível ou acrílico o juízo formulado pelo Tribunal a quo:
a. No âmbito da apreciação da violação do conteúdo essencial do direito à propriedade privada, dificilmente se concebe que a invasão das instalações dadas em superfície à recorrente não seja considerada uma violação do direito de propriedade pelo facto de o invasor permitir que o invadido continue a entrar nas mesmas.
b. O Tribunal recorrido não logrou perceber que a questão da violação do conteúdo essencial do direito à propriedade privada tem directamente que ver com uma ordem de invasão dirigida a um terreno que está legitimamente na posse de um particular ao abrigo de um direito de superfície - e não com o facto de a recorrente poder ou não continuar a aceder ao mesmo.
c. Para apreciar a causa de invalidade em apreço é absolutamente irrelevante a forma como o acto em crise foi sendo executado. I.e., o que estava em causa no presente processo era apenas a aferição da legalidade de uma ordem de entrada e de permanência nas instalações da recorrente sem sua autorização enquanto superfíciária.
d. Por outro lado, a conformação constitucional do direito de propriedade não pode constituir o fundamento de uma situação de coexistência entre invasor e invadido, nem pode o Tribunal recorrido presumir que a presente limitação ao direito de propriedade decorre do "ordenamento jurídico", considerando os interesses da "salubridade e segurança".
e. No âmbito da apreciação da violação do direito de audiência prévia, o juízo formulado pelo Tribunal a quo é absolutamente ininteligível.
f. Desde logo, não se procede à distinção rigorosa entre o conceito de dispensa de audiência e o conceito de inexistência de audiência, ambos regulados no artigo 103.° do CPA.
g. Por outro lado, se o Tribunal a quo reconhece que não se verifica o primeiro argumento invocado pelo Recorrido para justificar a inexistência de audiência (porquanto não existe fundamentação da urgência contemporânea ao acto), já não manteve o mesmo juízo para o segundo argumento, o que não é de todo compreensível. Ora, na verdade, a exigência de fundamentação de uma situação de inexistência de audiência é aplicável a qualquer um dos casos previstos no n.° l do artigo 103.° do CPA.
h. Nesses termos, a apreciação do Tribunal a quo não pode proceder quanto a este aspecto, em razão do erro de julgamento na apreciação da alínea b) do n.° l do artigo 103.° do CPA.
i. Por outro lado, o facto de a verificação da alínea b) em causa também exigir fundamentação torna imperceptível por que razão o Tribunal a quo entendeu “não ser de excluir que não esteja verificado este pressuposto” nem por que motivo essa circunstância permite concluir que "não se afigura manifesto que a preterição da audiência dos interessados tenha efeitos invalidantes do acto suspendendo".
j. Sublinhe-se, por último, que a conclusão do Tribunal recorrido - de que "não é de excluir, sem mais indagação, que não esteja verificado o pressuposto" - não é concebível: ou o acto em crise contém a justificação prevista na alínea b) do n.° l do artigo 103.° do CPA ou não contém, sendo que a este propósito não existe qualquer sumariedade em razão da natureza cautelar do processo.
k. No âmbito da apreciação da falta absoluta de base legal do acto suspendendo, o juízo do Tribunal a quo assenta em factos que não foram - nem sequer indiciariamente -, provados nos presentes autos de processo cautelar (a necessidade da "limpeza de "manta-morta" e das árvores existentes"), pelo que a apreciação efectuada não poderá proceder.
l. No âmbito da análise ao erro sobre os pressupostos de facto, o Tribunal recorrido também incorre em erro de julgamento, uma vez que, como referido, não ficou provada no âmbito dos presentes autos a necessidade de limpeza da "caruma do pinhal, mato, arbustos e ramos e árvores secas".
m. Acresce que o juízo efectuado pelo Tribunal recorrido limitou-se, de forma muito lacunar, à necessidade de proceder a tal limpeza, quando a recorrente havia invocado outros casos de erro sobre os pressupostos de facto (quanto à qualificação do terreno enquanto "espaço público", ao alegado risco de incêndio ou ao alegado estado de abandono das instalações).
n. Nesses termos, a apreciação do Tribunal a quo não pode deixar de ser censurada, porquanto, mesmo que em termos perfunctórios, aquele encontrava-se obrigado a emitir uma pronúncia acerca dos erros invocados pela recorrente.
o. Assim, a apreciação realizada pelo Tribunal recorrido quanto ao erro sobre os pressupostos de facto também padece de erro de julgamento, na medida em que o Tribunal considerou suficiente para os presentes autos a apreciação de apenas um dos erros sobre os pressupostos de facto invocados.
4. No que respeita à verificação dos requisitos de que dependia a concessão das providências cautelares requeridas ao abrigo da alínea b) do n.° l do artigo 120.° do CPTA, a decisão ora recorrida também padece de erro de julgamento, na parte em que se pronuncia acerca da inexistência de periculum in mora.
5. Desde logo, o Tribunal começa por alertar que a existência de facto consumado se afere em relação à esfera jurídica da recorrente e não ao prédio em si, sem que se compreenda o alcance desta observação já que é patente que todas as considerações posteriores se reportam às instalações da recorrente.
6. Por outro lado, o Tribunal a quo incorre em erro de julgamento ao considerar que as circunstâncias referentes ao prédio em si não cabem no conceito de "facto consumado".
7. Por último, a argumentação do Tribunal a quo padece de vícios de raciocínio, ao defender-se que existe sempre a possibilidade de a administração ficar obrigada à reconstituição da situação actual hipotética. Ora, a considerar válido este entendimento, jamais se verificaria uma situação de facto consumado, pois sempre existiria a obrigação posterior de a administração proceder a tal reconstituição.
8. No que respeita à apreciação do pedido de declaração de ineficácia dos actos de execução indevida, o Tribunal a quo não apreciou o pedido da recorrente no que respeita aos actos de execução indevida praticados a partir da data da citação do Recorrido e até à emissão da resolução fundamentada.
9. Nesses termos, e uma vez que segundo o disposto no n.° 2 do artigo 660.° do CPC, "o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação", a falta de decisão constitui uma situação de omissão de pronúncia, inquinando a Sentença sub judice por nulidade nos termos da alínea d) do n.° l do artigo 668.° do CPC, aplicável ex vi do artigo l.° do CPTA.
10. Em segundo lugar, a apreciação dos fundamentos invocados na resolução fundamentada também se encontra inquinada por erro de julgamento.
11. Desde logo, não ficou provada nos presentes autos a existência de acumulação significativa de inertes vegetais - o que prejudica automaticamente a apreciação dos fundamentos da resolução fundamentada relativos ao "perigo de incêndio" e ao "policiamento eficaz".
12. Quanto ao "perigo de incêndio", não foi apreciada por que razão a execução do acto não pôde aguardar pela decisão do processo cautelar. Do mesmo modo, também ficou por julgar se a execução do acto em crise consubstanciava a única forma de garantir que os alegados interesses públicos não eram gravemente prejudicados.
13. Por outro lado, o Tribunal não podia sustentar a sua decisão numa vaga presunção de que a limpeza daquela área "importa por certo" vários meses de trabalho, sem qualquer sustentação em matéria dada como provada.
14. No que respeita à necessidade de garantir um "policiamento eficaz", o Tribunal recorrido absorveu, sem qualquer apreciação própria, o argumento invocado pelo Recorrido, ficando por apreciar a urgência de execução do acto em momento anterior à decisão cautelar e a existência de outros meios de garantir os interesses alegadamente a proteger.
15. Todavia, mais grave que tais falhas é a total desconsideração do carácter privado das instalações em apreço que, nessa medida, não se encontram sujeitas a qualquer vigilância policial - o que torna descabida a conclusão de que os inertes vegetais dificultam o policiamento.
16. Em suma, o Tribunal a quo incorreu em omissão de pronúncia e em erro de julgamento na apreciação dos pedidos formulados pela ora recorrente, violando os preceitos supra identificados e, desde logo, as alíneas a) e b) do n.° l do artigo 120.°, o artigo 128.° e o artigo 131.°, todos do CPTA.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional, revogando-se as decisões recorridas, com todas as legais consequências.

*
O Recorrido Município de Lisboa contra-alegou, concluindo como segue:

a) Pelo presente recurso, argumenta a ora Recorrente que a douta sentença padece de erros de julgamento, invocando, sumariamente, que "a douta sentença recorrida, além de não conter a pronúncia do Tribunal a quo quanto a matérias que deviam ser objecto de apreciação, padece manifestamente de fundamento quanto aos argumentos que fundaram a rejeição das providências cautelares requeridas, bem como quanto ao fundamento para o indeferimento do pedido de declaração de ineficácia", julgamos, no entanto, não assistir qualquer razão à Recorrente, como se passa a demonstrar.
b) Relativamente à impugnação do despacho que admitiu a substituição do rol de testemunhas do requerido, é de determinar, desde já, a diferença de conceitos e regimes entre alteração e substituição.
c) A alteração ao rol de testemunhas, em termos gerais, vem regulada no art.° 512.°-A do CPC, impondo que tal alteração seja possível apenas, e até, 20 dias antes da data determinada para a realização da audiência de julgamento, sendo a parte contrária notificada para, se assim o entender, usar de igual faculdade no prazo de 5 dias.
d) A substituição de testemunhas, por seu lado, vem regulada no art.° 631.° do CPC, possibilitando este normativo que a substituição possa ocorrer em qualquer momento, impondo, isso sim, que o depoimento somente possa ter lugar desde que hajam decorridos cinco dias sobre a data em que foi notificada à parte contrária a substituição pretendida, a menos que a parte contrária prescinda de tal prazo.
e) No caso concreto, o Requerido não suscitou o adiamento da audiência decorrente da substituição de testemunhas requerida, tendo sido apresentadas todas as testemunhas no dia e hora designados para a realização da sua inquirição.
f) Apesar de poder ser avançada uma justificação para que se recorra ao mecanismo da substituição de testemunhas, a verdade é que a lei não a impõe, não obstante ter o Recorrido, já em sede de audiência de inquirição, ter justificado tal substituição, acentuando o valioso contributo que tais testemunhas, posteriormente indicadas, podiam dar na procura e obtenção da verdade dos factos.
g) E o juiz pode ordenar as diligências de prova que considere necessárias, à semelhança do que sucede em processo civil, o juiz não é obrigado a bastar-se com as provas carreadas pelas partes, podendo ordenar a produção de outros meios de prova, se assim o entender. Neste contexto, todos os meios de prova, desde que legítimos, podem ser apresentados, cabendo ao juiz a palavra final na determinação de quais devem ser utilizados no caso concreto.
h) Porque o tribunal e as partes procuram e trabalham na obtenção da verdade e na justeza nas decisões judiciais, as quais só podem ser tomadas com conhecimento claro e global dos factos determinantes da mesma, não se compreende a posição agora assumida pela Recorrente, quando em sede de audiência, na qual foi proferido o douto despacho que admitiu a substituição das testemunhas, a Recorrente declarou apenas não prescindir do prazo de 5 dias que a lei lhe confere, desta feita, a contar daquela audiência.
i) Face ao exposto, não se pode reconhecer razão à Recorrente, devendo o presente recurso nesta matéria, ser julgado totalmente improcedente.
j) Quanto à alegada omissão de pronúncia sobre o pedido de decretamento provisório da providência cautelar, há que atender aos pressupostos para o decretamento provisório da providência. Por um lado, estarmos perante a necessidade de tutelar direitos, liberdades e garantias que de outro modo não possam ser exercidos em tempo útil, encontrando-se, por isso, em risco de sofrer uma lesão iminente e reversível, ou/e, por outro, estarmos perante uma situação de especial urgência que se entenda dever beneficiar do mesmo tratamento da tutela dos direitos, liberdades e garantias.
k) A aplicação deste instrumento ser objecto de algum rigor, de forma a evitar a banalização do mesmo, razão pela qual só deverá ser decretada provisoriamente a providência caso se reconheça estarmos perante uma situação de "especial urgência" e quando os interesses do requerente da providência estejam em sério risco de sofrer uma "lesão iminente e irreversível".
l) No caso concreto, por mais que a Recorrente se esforce por tentar demonstrar a ocorrência de "lesões", a verdade é que se torna difícil, ou mesmo impossível, demonstrar como é que perante a grave situação de insalubridade e insegurança para o espaço e para terceiros do terreno e instalações cedidas em direito de superfície à Recorrente, a vigilância daquelas instalações e a limpeza do terreno, nomeadamente, corte de ramos de árvores e remoção de inertes vegetais, como forma de combater o perigo eminente de incêndio, são actos causadores de lesões iminentes ou irreversíveis, ou qualquer outro tipo de dano, no caso, no direito de superfície, de que era titular, não se encontram preenchidos os pressupostos determinados no art.° 131.° do CPTA.
m) E resulta provado que da execução do despacho do Vereador José Sá Fernandes, de 18 de Novembro de 2008, tão pouco resultou uma privação para a ora Recorrente dos direitos de uso e fruição do terreno, "pois que a requerente continua a ter acesso ao mesmo, coexistindo com os funcionários municipais que aí vêm acedendo e procedendo à limpeza da caruma dos pinheiros, arbustos e ramos das árvores.".
n) Em conformidade, o Meretíssimo Juiz a quo, em sequência de uma apreciação sumária, não considerou estarem reunidos os pressupostos para o decretamento provisório da providência, razão pela qual não o determinou, nem a tal estava obrigado.
o) Noutra vertente, não assiste à Recorrente qualquer direito de propriedade passível de ser violado.
p) Primeiro, porque não executou qualquer construção na parcela objecto do direito de superfície, e segundo porque não cuidou de manter as instalações que já lá se encontravam, propriedade do Recorrido, juntamente com a parcela de terreno, razão pela qual se viu este último na obrigação de intervir, decorridos 10 anos sobre a escritura de constituição do direito de superfície, perante um espaço em total estado de abandono.
q) A aquisição pelo superficiário da "propriedade", como um verdadeiro direito de propriedade, apenas se materializa com o implante, ou seja, o direito do superficiário sobre o implante não é um verdadeiro direito de propriedade, não só porque o direito de superfície, estando dependente da propriedade do fundeiro, não pode ser perspectivado como um direito exclusivo, como também porque apenas o fundeiro tem direito de preferência na alienação do implante, considerando o direito do fundeiro um direito real maior.
r) Para além do direito a receber as rendas respeitantes à contraprestação da concessão do direito de superfície, o Recorrido, tem, nos termos do artigo 1532° do Código Civil, o direito de usar e fruir a superfície, enquanto não se iniciar a construção da obra ou não se fizer a plantação das árvores, sem prejuízo da obrigação que cai sobre o fundeiro de, no exercício dos seus poderes, não impedir nem tornar mais onerosa a obra ou plantação.
s) Também nesta matéria decidiu bem a douta sentença recorrida quando considerou provado que a propriedade das instalações em causa cabe ao Município de Lisboa, "sendo a requerente titular, relativamente ao mesmo terreno, do direito real (menor) de superfície.".
t) Encontrando-se igualmente provado que "da execução do despacho do Vereador da Câmara Municipal de Lisboa de 18 de Novembro de 2008 não resultou uma provação para a requerente dos direitos de uso e fruição do terreno, pois que a requerente continua a ter acesso ao mesmo, coexistindo com os funcionários municipais que aí vêm acedendo e procedendo à limpeza da caruma dos pinheiros, arbustos e ramos de árvores.".
u) Dispõe o art.° 103.° do CPA que, entre outras razões, não há lugar a audiência dos interessados quando a decisão seja urgente ou quando seja razoavelmente de prever que a diligência possa comprometer a execução ou a utilidade da decisão, reportando-se a lei aqui a uma verdadeira dispensa da realização da audiência prévia, que é aquela a que o tribunal a quo se referiu na pronúncia da sentença recorrida.
v) Ao tribunal a quo, em sede de procedimento cautelar, apenas se exige que se pronuncie sobre as questões suscitadas consoante seja ou não manifesta a sua procedência ou improcedência em sede de acção principal.
w) A informação sobre a qual recaiu o despacho suspendendo alude a uma situação eminente de perigo para pessoas e bens existente no local em causa, propiciada pela condição de abandono em que o mesmo local se encontra, com acesso facilitado ao seu interior por parte de pessoas estranhas, em virtude da degradação das redes que circunscrevem o espaço, e condições favoráveis à propagação de um incêndio, atento o material combustível ali existente e a falta de bocas de incêndio em condições de poderem ser accionadas, sendo por demais evidente que a ora Recorrente faria uso de todos os mecanismos ao seu alcance para impedir a entrada dos serviços do Recorrido no espaço objecto do direito de superfície, como o havia feito até ao dia 28 de Novembro de 2008, conforme ficou demonstrado em 1.a instância, e desses factos dá conta a douta sentença recorrida.
x) Mesmo que outros motivos não existissem, que justificassem a intervenção do Recorrido naquele local, este sempre poderia intervir na medida em que as actividades determinadas no despacho suspendendo se enquadram indubitavelmente no conceito de uso e fruição que assiste ao Município de Lisboa, no caso, nos termos do art.° 1532.° do Código Civil.
y) Quanto aos pressupostos de facto em que assentou a decisão do tribunal a quo, decorrem os mesmos da prova carreada para os autos e dada como provada.
z) Constituem pressupostos da sentença proferida:
i. - o facto de se ter sido constatado pelas forças policias que patrulham a área que o actual estado de encerramento e semi-abandono em que se encontra o local aqui em causa é potenciador, não só de insegurança na população residente na zona, como contribui ainda para a degradação do espaço público, impossibilitando um policiamento eficaz, constituindo o furto no interior de viaturas nos estacionamentos periféricos, praticado no período diurno, o crime mais frequente, conforme foi constatado no local;
ii. - o facto do Regimento Sapadores de Bombeiros ter constatado in loco que, muito embora o local se encontre vedado, a verdade é que as circunstâncias ali existentes - tais como, a deterioração da rede existente no local, permitindo o acesso de estranhos ao local, os marcos de águas vandalizados, as bocas-de-incêndio cuja operacionalidade se desconhecia, a grande acumulação de caruma de pinho e arbustos - potenciam o risco de incêndio em toda a zona envolvente;
iii. - a existência, junto ao terreno em causa, de uma zona residencial, um estabelecimento de ensino e de um hospital, com todas as consequências que a deflagração de um fogo naquele espaço, ou a frequência do local por pessoas mal intencionadas, acarrateriam na referida vizinhança.
aa) Como surge manifesto na douta sentença recorrida, na referida informação n.° 0759/DJ/DAJU/2008, sobre a qual assentou o acto administrativo, foram ainda exaustivamente enunciadas e identificadas as normas jurídicas aplicáveis e que sustentam a prolação do mesmo acto.
bb) Também quanto ao incidente de declaração de ineficácia dos actos de execução indevida, a sentença recorrida foi bem esclarecedora quanto à motivação que conduziu o Meretíssimo juiz a quo a reconhecer a inexistência dos designados actos de execução indevida.
cc) Nos termos do n.° 3 do art.° 128.° do CPTA, só estamos perante a execução indevida do acto administrativo numa de duas situações, a saber: quando se execute o acto sem que se profira o despacho de resolução fundamentada, ou quando se execute o acto com base num despacho de resolução fundamentada cujas razões o tribunal venha a considerar improcedentes.
dd) Atendendo a que "a suspensão e diferimento da execução do acto administrativo cuja suspensão vem requerida, é gravemente prejudicial para o interesse público", determinou o Vereador José Sá Fernandes que deveria o despacho suspendendo manter-se na ordem jurídica, "com fundamento na salvaguarda do direito à protecção e defesa da integridade e segurança de pessoas e bens, assim como do direito ao ambiente e à vida urbana sadia e ecologicamente equilibrada, em obediência ao princípio da legalidade a que estão vinculados os órgãos e agentes da Administração Pública, conforme determina o artigo 266° da CRP (Constituição da República Portuguesa)".
ee) Em sequência da apreciação pelo tribunal a quo das razões invocadas no dito despacho de resolução fundamentada, ficou demonstrado procederem, por um lado, "o perigo de incêndio que a existência de caruma acumulada, ervas e arbustos crescidos e secos e árvores secas e ramos de árvores secos em tão vasta área, pela natureza das coisas, propicia", sendo manifesto que a limpeza das matas deverá ocorrer durante o Outono e Inverno.
ff) Mais tendo ficado demonstrada "a existência de uma vasta área de terreno junto de um Hospital, de uma zona residencial e de um colégio, em que existem ervas crescidas e secas, arbustos, ramos de árvores, e árvores secas, afigura-se que manifestamente dificulta a tarefa de vigilância da zona ou, como se refere na resolução fundamentada torna mais difícil um "policiamento eficaz".
gg) lmprocedem, assim, também as alegações deduzidas pela Recorrente quanto à apreciação do pedido de declaração de ineficácia dos actos de execução do despacho do Vereador José Sá Fernandes, de 18 de Novembro de 2008.
hh) Por conseguinte, mostram-se totalmente infundadas as razões que, segundo a Recorrente, deveriam determinar o provimento do presente recurso, devendo, ao invés, ser confirmada a decisão que julgou improcedente o pedido de adopção de providência cautelar de suspensão de eficácia, assim como do incidente de declaração de ineficácia dos actos de execução do acto suspendendo e, nessa conformidade, o presente recurso ser julgado totalmente improcedente.
Termos em que sempre com mui Douto suprimento de V. Exa., Deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, por não provado, e em consequência ser a douta sentença recorrida mantida inalterada na ordem jurídica, com as demais consequências legais, assim se fazendo a costumada Justiça.

*
Com substituição legal de vistos pela entrega das competentes cópias aos Exmos. Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência – artºs. 36º nºs. 1 e 2 CPTA e 707º nº 2 CPC, ex vi artº 140º CPTA.

*
Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade:

A) Na reunião da Câmara Municipal de Lisboa de 7 de Outubro de 1987 foi deliberado "desafectar do domínio público da Câmara para o domínio privado da Câmara a parcela de terreno municipal com cerca de 18 ha integrada no Parque Florestal de Monsanto" e "constituir a favor da Sociedade Aquaparque - Atracções Turísticas, Lda o direito de superfície sobre a parcela de terreno sita no parque Florestal de Monsanto, (...) com a área de 20 ha e confrontando em todo o seu perímetro com a C.M.L. destinada à construção de um Parque de Diversões Aquáticas e Desportivas de Lazer". Cfr. doc. de folhas 42 e 43 dos autos.
B) Em 16 de Junho de 1998 foi celebrada escritura pública entre a Câmara Municipal de Lisboa e a "Aventura em Lisboa" pela qual aquela constituiu a favor desta o direito de superfície sobre 81 200 m2, pelo prazo de 50 anos, destinado à instalação de um Parque de Diversões. Cfr. doc. de folhas 144 a 151 dos autos.
C) A "Aventura em Lisboa" apresentou na Câmara Municipal de Lisboa em Setembro de 1998 "pedido de licenciamento da obra "Alterações - Parque Temático de Diversões, cujo projecto de arquitectura já havia dado entrada na Autarquia através da Direcção Geral de Turismo, o qual formou o processo 1318/PGU/97" que deu origem nos serviços da CML ao procedimento designado por "processo n°3404/PGU/98"Cfr. doc. de folhas 1 52 dos autos.
D) A A...- Parque Temático de Diversões, Lda propôs contra o município de Lisboa acção administrativa comum, pela qual formula o pedido de condenação daquela autarquia no pagamento de uma indemnização com fundamento em responsabilidade civil extracontratual, ao facto de "nunca ter conseguido instalar o parque temático", acção que corre termos do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, com o n°2544/07.4BELSB. Cfr. doc. de folhas 45 a 142 dos autos.
E) Com data de 13 de Dezembro de 2007 foi pelo Gabinete do Vereador da Câmara Municipal de Lisboa José Sá Fernandes enviado ao Administrador da Empresa "Aventuras em Lisboa - Parque Temático de Diversões Lda" ofício com o seguinte teor: "Na sequência das competências que foram atribuídas no despacho de subdelegação de competências n°474/P/2007, de 20 de Agosto de 2007, publicado no Boletim Municipal n°705 de 23 de Agosto do corrente ano e dada a necessidade de acompanhar e monitorizar a gestão de todos os espaços verdes da cidade, vêm-se informar V. Ex" de que o Vereador com o Pelouro do Ambiente e Espaços Verdes, Dr. José Sá Fernandes, deseja efectuar uma visita à parcela de terreno sita no Parque Florestal de Monsanto, onde foi constituído através de escritura celebrada no dia 16 de Junho de 1998 um direito de superfície a favor da vossa empresa, no próximo dia 21 de Dezembro, pelas 15 horas. Solicita-se ainda que sejam efectuadas as necessárias diligências no sentido de ser facilitado o acesso ao respectivo terreno."Cfr. doc. de folhas 163 dos autos.
F) A deslocação do Vereador José Sá Fernandes ao local, ocorreu naquela data com o acordo da requerente. Acordo das partes.
G) Com data de 15 de Janeiro de 2008 foi pelo Gabinete do Vereador da Câmara Municipal de Lisboa José Sá Fernandes enviado ao Administrador da Empresa "Aventuras em Lisboa - Parque Temático de Diversões Lda" ofício com o seguinte teor: "Na sequência da visita efectuada às instalações sitas no Parque Florestal de Monsanto, no âmbito do Pelouro dos Espaços Verdes, e após verificadas as especificas condições e concretas circunstâncias em que foi conferido o direito de superfície e em que aquelas estão a ser, ao parecer, parcialmente ocupadas por V.a Ex", cumpre transmitir que iremos proceder à reabilitação do espaço, ao abrigo das atribuições e direitos que nos estão legalmente conferidas. Nessa conformidade, a partir do próximo dia 21 de Janeiro de 2008, serão iniciados os respectivos procedimentos (projecto) prevendo-se que a partir do próximo dia 15 de Maio possa ser dado início aos trabalhos no local por parte dos serviços municipais."Cfr. doc. de folhas 164 dos autos.
H) Com data de 16 de Janeiro de 2008 foi pelo Vereador da Câmara Municipal de Lisboa José Sá Fernandes enviado ao Administrador da Empresa "Aventuras em Lisboa - Parque Temático de Diversões Lda" ofício com o seguinte teor:"Na sequência da N. Carta n°0008, datada de 15 de Janeiro e no âmbito das competências do Pelouro dos Espaços Verdes, informa-se V. Exª que no próximo dia 21 de Janeiro de 2008, iremos proceder a uma deslocação ao local com vista a iniciar os respectivos procedimentos inerentes à necessidade de reabilitação do espaço ao abrigo das atribuições e direitos que me foram legalmente conferidos."Cfr. doc. de folhas 165 dos autos.
I) Na sequência do que a requerente enviou ao Vereador da Câmara Municipal de Lisboa José Sá Fernandes comunicação, com data de 18 de Janeiro de 2008, com o seguinte teor: "Na sequência da V./ carta n°0009/GVSF/2008, de 16 de Janeiro de 2008, vem a A...- PARQUE TEMÁTICO DE DIVERSÕES, LDA, dizer o seguinte: a) antes de mais, lembrar V. Ex" que o acesso ao terreno em causa só pode ocorrer com a nossa autorização, enquanto legítimos superficiários, sob pena de ser considerado pura e simples invasão; b) depois, comunicar que não autorizamos a pretendida deslocação no dia 21 de Janeiro p.f; c) por fim, informar V. Ex" da nossa disponibilidade para, com tempo, nos reunirmos, em local e data a combinar, a fim de procedermos a uma primeira avaliação das reais intenções do Município de Lisboa relativamente a este espaço."Cfr. doc. de folhas 166 e 167 dos autos.
J) Com data de 19 de Janeiro de 2008 foi pelo Vereador da Câmara Municipal de Lisboa enviado à mandatária da requerente comunicação com o seguinte teor: "Na sequência do seu fax acima identificado vem dizer e solicitar-se o seguinte: a) O art. 1532° do Código Civil refere expressamente "Enquanto não se iniciar a construção da obra ou não se fizer a plantação das árvores, o uso e a fruição da superfície pertencem ao proprietário do solo (...)"; b) Por outro lado, a C.M.L. enquanto proprietária do terreno tem necessidade de verificar as suas actuais condições, ainda para mais porque se verificou, na sequência da visita do passado dia 21 de Dezembro de 2007, a inexistência de qualquer construção no local; c) Acresce que, urge tratar dos terrenos e edificado confinantes, também propriedade da C.M.L. o que terá necessariamente que ser feito no quadro de uma intervenção e visão estrutural da zona em apreço. d) Deste modo, e salvo o devido respeito, não existem quaisquer dúvidas da legitimidade da C.M.L. em proceder às verificações que bem entender no terreno aqui em pauta, mesmo que se considerasse, por mera hipótese, o alegado direito de superfície referido por V. Exa. Assim, vem solicitar-se a V. Exa que reconsidere o teor do fax que enviou. De qualquer modo, vem desde já, em alternativa à data indicada (21 de Janeiro de 2008) indicar-se as seguintes datas alternativas: quarta-feira, dia 23 de Janeiro de 2008, às 9h30; quinta-feira, 24 de Janeiro de 2008, às 14h30 ou sexta-feira, 25 de Janeiro de 2008, à mesma hora, sendo certo que se nada for dito em relação às datas agora referidas até ao próximo dia 22 de Janeiro a deslocação ao local a realizar por mim e pelos serviços da C.M.L. será levado a cabo no dia 25 de Janeiro do corrente ano às 14h30."Cfr. doc. de folhas 168 e 169 dos autos.
K) Com data de 21 de Janeiro de 2008 foi pela mandatária da requerente enviado a Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, comunicação com o seguinte teor: "Em resposta ao V./ fax de 19 de Janeiro de 2008, vem a A...- PARQUE TEMÁTICO DE DIVERSÕES, LDA, dizer o seguinte: Em primeiro lugar, recordar a V. Exa que, na sequência da celebração do contrato de constituição do direito de superfície em 16 de Junho de 1998, a A...tomou desde logo posse efectiva do terreno a qual, para o efeito, lhe foi transmitida pelo anterior possuidor (a sociedade Aquaparque - Atracções Turísticas, Lda) com o pleno conhecimento dos responsáveis máximos da Câmara Municipal de Lisboa. Mais se informa V. Ex" de que a A...executou diversos trabalhos preparatórios das obras de construção, nomeadamente, a remoção de entulho e do inerte vegetal e a desmontagem de estruturas de equipamento não aproveitável, sempre com o pleno conhecimento dos responsáveis máximos da Câmara Municipal de Lisboa que acompanham "in loco" a evolução dos referidos trabalhos. Deste modo, no quadro da sua posição jurídica enquanto superficiária e possuidora do terreno, a A...reitera as posições de princípio manifestadas no fax de 18 de Janeiro p.p., e desde já se disponibiliza para reunir com V. Ex2 até ao dia 25 de Janeiro p.f., com vista ao cabal esclarecimento das concretas pretensões do Município de Lisboa e da habilitação jurídica necessária aos efeitos pretendidos."Cfr. doc. de folhas 170 a 172 dos autos.
L) Pelo Vereador da Câmara Municipal de Lisboa foi, com data de 22 de Janeiro de 2008, enviado à mandatária da requerente comunicação com o seguinte teor: "Venho solicitar a V. Exa que reconsidere novamente a posição assumida no V/ fax datado de 21 de Janeiro de 2008, uma vez que a C.M.L. enquanto proprietária do terreno tem necessidade de verificar as actuais condições dos espaços verdes, promovendo as medidas que considere necessárias para proceder à sua manutenção e gestão. Na visita efectuada no passado dia 21 de Dezembro de 2007, verificou-se a inexistência de qualquer construção no local, aliás facto agora não desmentido por V. Ex3. Reitera-se, deste modo a intenção de proceder à deslocação ao local na data indicada no fax datado de 19 de Janeiro de 2008, nomeadamente: quarta feira, dia 23 de Janeiro de 2008, às 9h30; quinta-feira, 24 de Janeiro de 2008, às 14h30 ou sexta-feira, 25 de Janeiro de 2008, à mesma hora, sendo certo que se nada for dito em relação às datas agora referidas, a deslocação ao local será levada a cabo no dia 25 de Janeiro do corrente ano às 14h30. A realização das deslocações dos serviços da C.M.L. ao local não é inviabilizadora da realização de eventuais reuniões posteriores com V. Exas, a agendar."Cfr. doc. de folhas 173 e 174 dos autos.
M) A mandatária da requerente enviou ao Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, com data de 23 de Janeiro de 2008, comunicação com o seguinte teor: "Uma vez que não foram criadas as condições necessárias para efectuar a visita ao terreno objecto do direito de superfície - atendendo à recusa de realização de uma reunião prévia -, e enquanto não forem prestados suficientes esclarecimentos acerca das intenções do Município de Lisboa, a A...reitera a posição de princípio assumida nas comunicações anteriores, pelo que não autoriza a deslocação pretendida".Cfr. doc. de folhas 175 e 176 dos autos.
N) Pelo Vereador do Pelouro do Ambiente e Espaços Verdes da Câmara Municipal de Lisboa foi enviado ao Administrador da Empresa "A...-Parque Temático de diversão, Lda, com data de 07 de Fevereiro de 2008, comunicação relativa ao assunto "Inspecção de Terreno sito no Parque de Monsanto, Av. Das Descobertas, freguesia da Ajuda", com o seguinte teor:"Vimos por este meio informar V. Exas, de que no próximo dia 1 1 de Fevereiro de 2008, pelas 1 1 horas, a Câmara Municipal de Lisboa fará deslocar uma equipa técnica ao terreno identificado supra, a fim de proceder à realização de urna inspecção, atento o Processo n°3404/PGU/98, nos termos e para os efeitos do disposto no n°l do art. 95° do Decreto-Lei n°555/99, de 16 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n°177/2001, de 4 de Junho - Regime Jurídico da Urbanização e Edificação."Cfr. doc. de folhas 177 dos autos.
O) Pela mandatária da requerente foi enviado ao Vereador da Câmara Municipal de Lisboa José Sá Fernandes, com data de 8 de Fevereiro de 2008, comunicação com o seguinte teor: "Em resposta à V./ Carta N°0027/GVSF/2008 de 07/02/2008, recebida via fax na presente data, vem a A...- PARQUE TEMÁTICO DE DIVERSÕES, LDA, dizer o seguinte: 1. As inspecções previstas no n° l do artigo 95° do Decreto-Lei n° 555/99, de 16 de Dezembro, reconduz-se a actividades de fiscalização no âmbito do regime de licenciamento e autorização de operações urbanísticas. 2. De acordo com o despacho n°474/P/2007, de 20.08.2007, publicado no boletim Municipal da Câmara Municipal de Lisboa, de 23.08.2007, o Senhor Presidente da Câmara Municipal de Lisboa delegou no Vereador do Urbanismo e Planeamento estratégico, Arq° Manuel Salgado, o exercício "das competências previstas no Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação (...), praticando todos os actos administrativos e instrutórios no âmbito dos procedimentos de licenciamento, autorização, informação prévia de operações urbanísticas e aos que respeitem a operações urbanísticas isentas ou dispensadas de licença ou autorização, bem como os actos relativos à execução e fiscalização destas operações e à utilização e conservação do edificado (...)"(sublinhado nosso). 3. Perante este enquadramento legal, a A...só autorizará a entrada de funcionários para efeitos da inspecção prevista no n°l do artigo 95° do Decreto-Lei n°555/99, de 16 de Dezembro, desde que a mesma esteja legitimada por ordem de quem detém a competência legal nesta matéria ou seja, o Vereador do Urbanismo e Planeamento Estratégico, Arq° Manuel Salgado. 4. Mais se informa v. Exa que, nesta mesma data, será requerido ao Senhor Vereador do Urbanismo e planeamento Estratégico, Arq° Manuel Salgado, que, com carácter de urgência, informe a A...quanto à questão de saber se a inspecção em causa será realizada pelos serviços técnicos que estão na sua dependência directa e devidamente autorizados para o efeito. 5. Em qualquer caso, e sem prejuízo do referido no ponto 3., a AVENTURA EM LISBOA, atento o disposto no n°l do artigo 95° do Decreto-lei n° 555/99, de 16 de Dezembro, desde já informa que só autorizará a entrada dos "funcionários municipais responsáveis pela fiscalização de obras" ou seja, no caso concreto, dos funcionários pertencentes à Divisão da Zona Ocidental do Departamento de Gestão Urbanística I da Direcção Municipal de Gestão Urbanística da Câmara Municipal de Lisboa (conforme previsto na Orgânica dos Serviços Municipais, publicada no Diário da República, II série, de 23.11.2002), devidamente identificados e credenciados para o efeito."Cfr. doc. de folhas 178 e 179 dos autos.
P) Na Divisão de Assessoria Jurídica do Urbanismo do Departamento Jurídico da Câmara Municipal de Lisboa, foi com data de 18 de Novembro de 2008 elaborada Informação n° 0759/DJ/ DAJU/2008 com o seguinte teor: "I- Objecto: O Exmo Sr. Vereador José Sá Fernandes, através do ofício n°1058/GVSF/2008 de 16/10/2008, solicitou ao Departamento Jurídico "(..) Face à existência de processos judiciais em curso relativos aos terrenos conhecidos por "Aquaparque", sitos no Restelo, bem como as vicissitudes que se têm registado em torno da utilização destes terrenos, e verificando-se a urgência em dar uma solução aos referidos terrenos, no âmbito da política de gestão dos espaços verdes da cidade (...) que se pronuncie sobre se ocorreu ou não a extinção do direito de superfície constituído a favor da Sociedade "A...- Parque Temático de Diversões, Lda" e em caso positivo, qual a melhor solução jurídica a dar a este assunto, tendo igualmente em consideração os elementos e informações que se anexam". Sem prejuízo de uma análise mais detalhada sobre a questão jurídica colocada pelo Senhor Vereador José Sá Fernandes, face às informações e restante documentação ora junta, cumpre pronunciarmo -os sobre as mesmas, atendendo ao seu teor e à eventual necessidade urgente da Câmara Municipal de Lisboa intervir no local em causa. Para o efeito, importa proceder a um breve enquadramento histórico e factual, o que fazemos de seguida.
DOS FACTOS
1) Em 07/10/1987 foi aprovada em Reunião de Câmara a Proposta n°326/87, no sentido de desafectar do domínio público para o domínio privado a parcela de terreno municipal com cerca de 18 hectares integrada no Parque Florestal de Monsanto (publicada no Diário Municipal de 03/11/1987). Resultou da mesma proposta que seria constituído um direito de superfície sobre a parcela de terreno sita no Parque Florestal de Monsanto, orlada com cor vermelha na cópia da planta n°249/87 com a área de 20 hectares, a favor da Sociedade AQUAP ARQUE por vinte e cinco anos, destinada à construção de um parque de diversões aquáticas e desportivas de lazer. Na sequência da deliberação supra, foi a Sociedade AQUAP ARQUE investida da posse da parcela, nela construindo diversas infra-estruturas que resultaram no parque aquático de diversões.
2) Em 27/08/1997 a Câmara Municipal de Lisboa aprovou a proposta n°519/97, através da qual revogou os direitos da Sociedade AQUAPARQUE sobre a parcela de terreno supra identificada, obrigando-se a constituir a favor da nova sociedade "Aventura em Lisboa" o direito de superfície sobre 81 200 m2 daquela parcela, tendo a escritura sido celebrada em 16/06/1998. Para os devidos efeitos, resultava do teor da escritura pública que a Câmara Municipal de Lisboa - constituiu a favor da "Aventura em Lisboa" o direito de superfície sobre a parcela de terreno para construção, com a área de 81 200 m2 pelo prazo de cinquenta anos e nas condições estabelecidas, a saber: • O terreno destinava-se à instalação do parque temático, conforme o ponto sexto da escritura pública, devendo o projecto dar entrada na Câmara Municipal de Lisboa no decurso dos três meses seguintes (16/09/1998), conforme o ponto terceiro da escritura. • As obras de instalação do parque temático deveriam ficar concluídas dezoito meses após a entrega do projecto na Câmara Municipal de Lisboa, conforme o ponto quinto da escritura.
3) Em 11/09/1998 a A...solicitou à Câmara Municipal de Lisboa a aprovação do pedido de licenciamento da obra de alteração do parque temático, dando origem ao Processo n°3404/PGU/98.
4) Já 04/04/1997 havia dado entrada nos serviços da CML um pedido de parecer - Ofício DSE/DPIT/1997/1053, Processo n° EA-D-38-1.3 - sobre a localização e projecto referente ao empreendimento de animação desportiva em Lisboa "A...- Parque Temático de Diversões Lda" - Processo n°1318/PGU/1997. Através desse pedido era solicitado à CML, pela Direcção Geral de Turismo, a emissão de parecer no cumprimento do disposto no Decreto-Lei n° 328/86, de 30/09 - Regulamentação dos Empreendimentos Turísticos - tendo esta entidade junto as respectivas peças desenhadas e outros elementos essenciais à apreciação do projecto em causa. Na verdade, ao abrigo do n°l do art. 24° do diploma legal acima referido, competia, à data, à DGT solicitar parecer à CML quanto á aprovação da localização, do anteprojecto e projecto deste tipo de empreendimentos, nomeadamente, no que respeita ao cumprimento da legislação em vigor aplicável à implantação e construção dos empreendimentos, neste caso, de animação e desportivos, de interesse para o turismo. Os terrenos abrangidos por este projecto encontram-se integrados no Parque Florestal de Monsanto, sendo que, para efeitos de emissão do citado parecer, era competente, à data, a Direcção Municipal de Ambiente e Espaços Verdes - DMAEV - a qual deu parecer favorável conforme decorre da Informação n°529/DEV/DPEV/1997 a fls. 73 a 74 do Processo 1318/PGU/97. Tal parecer foi comunicado à DGT a 06/05/1998 - ofício n° OF.166/98/DMAEV - a fls. 76 do referido Processo.
5) Com efeito, a empresa veio em 11/09/1998 apresentar o pedido de licenciamento de obras de alteração para o dito parque temático, salientando no seu requerimento "(...) cujo projecto de arquitectura já deu entrada nessa Autarquia através da Direcção Geral do Turismo, o qual formou o processo 1318/PGU/97" - Processo n°3404/PGU/98. A fls. 29 do processo urbanístico, verifica-se que o mesmo foi remetido pela Zona Ocidental à DMAEV por ali se encontrar o processo antecedente n°1318/PGU/97. Da mesma folha decorre que "(...) l-o Projecto de arquitectura do parque temático de diversões que processualmente antecede o presente pedido de licenciamento foi aprovado por despachos da CML através da DMAEV e da DGT em 24 Março 98 e 22 Maio 98, nos termos previstos na legislação à data aplicável: D.L. n°328/86 e D.R. n°8/89; 2- a licença a emitir tem como norma habilitante o disposto no n°5 do artigo 73° do D.L. n°167/97; 3-julga-se de deferir (...)".
6) Pelo que, o presente pedido de licenciamento mereceu despacho de deferimento do Exmo Sr. Director Municipal da Direcção Municipal de Ambiente e Espaços Verdes de 19/02/99 - a fls. 30 a 32.
7) No âmbito do mesmo processo, veio a sociedade requerente em 29/03/1999, ainda que não houvesse sido notificada do deferimento, proceder à entrega da restante documentação necessária à emissão do alvará de obras - a fls. 33 a 37. Acontece que, da análise dos documentos constantes do Processo 3404/PGU/98 é possível concluir que o alvará nunca chegou a ser emitido por parte dos serviços camarários.
8) Pelo ofício n°OF/139/99/DMAEV, datado de 17/06/99, foi comunicado à sociedade requerente que, para efeitos de emissão de alvará de licença de construção do parque temático, deveria apresentar "(..) um estudo sobre o impacte sonoro esperado do funcionamento do parque, incluindo os equipamentos, a executar por entidade idónea e de reconhecida capacidade técnica na área do ruído (..) e ainda data a "(..) desactualização de algumas peças constantes do processo (..) proceder à entrega da nova memória descritiva e peças desenhadas, que contemplem já, as alterações e os esclarecimentos relativos aos equipamentos que se pretendem colocar em funcionamento no parque".
9) a sociedade requerente apresentou os referidos elementos, tendo sido posteriormente notificada através do ofício n° OF/388/99/DMAEV, de 25/011/99, de que "(...) o estudo apresentado não garante que da nova instalação não decorram impactes sonoros negativos para a zona. Assim, notificamos V/Exas a apresentar elementos complementares que habilitem esta Câmara Municipal a cumprir o anteriormente determinado".
10) Em 03/02/2000, a requerente respondeu à solicitação da CML, contudo, através do ofício n°53/00/DIA de 03/02/2000 foi notificada para apresentar "(..) elementos complementares que habilitem esta Câmara Municipal a cumprir o anteriormente determinado (...)", por se entenderem os serviços que os elementos entregues não cumpriam ainda o solicitado. A Requerente não procedeu à entrega de qualquer documentação desde essa data, tendo decorrido um longo período de tempo sem que tenha dado qualquer impulso ao processo de licenciamento em causa.
11) A Câmara Municipal de Lisboa tentou aceder ao local, a fim de verificar a sua utilização e o decurso das obras, tendo-se frustrado as diversas tentativas. Na verdade, atenta a localização do identificado empreendimento a licenciar, no Parque Florestal de Monsanto, foi considerado pelo Senhor Vereador José Sá Fernandes, titular do pelouro do Ambiente e Espaços Verdes, face ao teor do Processo n°3404/PGU/98, por se desconhecer se a requerente teria ou não levado já a cabo alguma obra no local, mesmo sem o competente licenciamento, e, também, por ser essencial ao estudo, recuperação e reabilitação deste espaço verde, apurar qual o estado das instalações e equipamentos existentes naquela área. Para o efeito, considerou-se ser absolutamente necessário proceder a uma inspecção ao local, objecto do procedimento de licenciamento, nos termos e para os efeitos do disposto no n°l do art. 95° do D.L. n°555/99, de 16 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo D.L. n°177/2001, de 4 de Junho (RJUE).
12) Assim, foi a requerente notificada da deslocação de uma equipa técnica da Câmara Municipal de Lisboa e da Policia Municipal ao local, no dia 11/02/2008, pelas 11,00 horas, acompanhado do Exmo Senhor Vereador José Sá Fernandes. A entrada nas instalações foi recusada aos funcionários da Câmara Municipal de Lisboa pelos legais representantes da Requerente do processo de licenciamento, devidamente identificado no auto n°15157.8.11.19, fundamentando tal recusa no facto de, no seu entender, a competência para a fiscalização, nos termos em que foram notificados, pertencia ao Exmo Senhor Vereador Manuel Salgado. Na altura, a requerente terá sido advertida pelo senhor Vereador José Sá Fernandes, de que o processo de licenciamento de obras de alteração para aquele local corre termos na Direcção Municipal de Ambiente e Espaços Verdes (DMAEV), sem prejuízo das actuais competências do senhor Vereador Manuel Salgado em matéria de licenciamento urbanístico. Não obstante, a Requerente ignorou o esclarecimento. Assim, perante a recusa da requerente em permitir, voluntariamente, a entrada dos funcionários da Câmara Municipal de Lisboa nas suas instalações, mantendo-se a necessidade de fiscalização, dado o interesse público subjacente na verificação da legalidade das construções existentes e do estado das instalações e equipamentos daquela área verde do Parque Florestal de Monsanto, considerou-se indispensável a obtenção de prévio mandado judicial, nos termos e par os efeitos do disposto no n° 2 do art°. 95° do RJUE, de acordo com os despachos dos Senhores Vereadores José Sá Fernandes e Manuel Salgado exarados na informação n°131/DJ/2008. Pelo que, e a fim de permitir a entrada dos serviços competentes da Câmara Municipal de Lisboa no local, foi solicitada judicialmente, em 14/02/2008, mediante uma operação conjunta e articulada entre os dois pelouros, o do Ambiente e Espaços Verdes e o do Licenciamento Urbanístico - cfr. Despacho n°474/P/2007, publicado no Boletim Municipal n°705, de 23/08/2007 - a emissão de mandado que permita aos serviços competentes do Município de Lisboa a entrada nas instalações da requerente, correndo termos sob o n°213/08.7TJLSB, na 3a Secção do 4° Juízo Cível de Lisboa.
13) Para além dos fundamentos supra, reitera-se como já acima se referiu, que o Processo n°3404/PGU/1998, referente ao pedido de licenciamento de obras de alteração que corre termos na Direcção Municipal de Ambiente e Espaços Verdes não mereceu, até à presente data, despacho final, para efeitos de emissão de alvará, face à falta de entrega de elementos por parte da requerida.
APRECIAÇÃO
Desde já se diga que, conforme exposto supra, a Câmara Municipal de Lisboa aparece na presente situação, e relativamente ao local destinado a Parque Temático, em duas posições jurídicas distintas, ou seja, enquanto proprietária do terreno e enquanto entidade administrativa com atribuições e competências na área da segurança e prevenção de situações que ponham em risco pessoas e bens, pelo que a sua intervenção sobre os espaços em apreço não pode deixar de se situar também ao nível dos interesses públicos acima referidos. Desde logo, no âmbito da relação jurídica subjacente ao direito de superfície de que a "Aventura em Lisboa" é titular, e como referido anteriormente, ficou convencionado no parágrafo quinto da escritura de constituição do direito de superfície que - "Em qualquer dos casos as obras de instalação do Parque deverão ficar concluídas dezoito meses após a entrega do projecto." Não obstante as várias tentativas por parte dos serviços competentes para fiscalizar o local -tendo a última dado lugar a um pedido de emissão de mandado judicial -, não podemos deixar de presumir que o requerente do processo n°3404/PGU/98, e titular do direito de superfície, não terá dado início a qualquer obra, encontrando-se o local fechado. De facto, das fiscalizações efectuadas ao local, embora sem entrar dentro da parcela de terreno onerada com o direito de superfície, verificou-se que o local se encontra em estado de semi-abandono, "potenciando o eventual clima de insegurança na população residente na zona, além de incrementar a degradação do espaço público", impossibilitando o "policiamento eficaz às forças de segurança, tal como constatado in citu", conforme decorre da informação da Policia Municipal n° l19127.8.8.4, enviada a este Departamento Jurídico pelo Exmo Sr. Vereador José Sá Fernandes em 15/10/2008. Através da mesma informação em aditamento à informação de 13/10/2008, esclarece aquela força policial que existem registos de episódios criminais na zona, designadamente a prática de crimes de furto no interior de viaturas e nas imediações do local. Mais acresce que, segundo o Regimento de Sapadores Bombeiros Oficio n° 962/SP-Proc. 397/26/2", de 13/10/2008, o espaço em causa encontra-se limitado por gradeamento e rede, "apresentando no lado oposto à porta principal, a rede deteriorada, permitindo o acesso ao interior .- Exteriormente existe uma rede de marcos de água, encontrando-se alguns deles vandalizados. - No interior, são visíveis michos com boca de incêndio tipo teatro, desconhecendo-se a sua operacionalidade. - O espaço apresenta-se, junto da entrada principal, desprovido de arbustos, mas com a acumulação de grande quantidade de caruma de pinho, situação inversa constata-se no lado oposto, onde além da caruma, existem arbustos, denotando-se sinais de abandono." Concluindo o Regimento de Sapadores Bombeiros que "o facto do local estar vedado, potência o risco de incêndio a toda a zona envolvente, dado que este é um espaço privado, e o mau estado da vedação periférica permitir o acesso a pessoas estranhas." Tendo em consideração as informações supra referenciadas, da Policia Municipal e do Regimento de Sapadores Bombeiros é evidente que estamos face a uma situação de necessidade de salvaguarda do interesse público de pessoas e bens e risco contra incêndio, sendo certo que sobre a Câmara Municipal de Lisboa recaem as atribuições previstas nos artigos 20°, 22°, 25 e 26 da Lei n° 159/99, de 14 de Setembro, no âmbito destas áreas de intervenção. Existe por isso por parte da Câmara Municipal de Lisboa uma obrigação de intervir imediatamente no local perante o estado de degradação existente e o perigo eminente, não só de incêndio, como de violação da segurança da população - recorde-se que junto ao local existe não só uma zona residencial (Bairro de Caselas) como um estabelecimento de ensino e ainda um hospital a fim de prevenir os riscos acima referidos. Por outro lado, importa ter ainda presente que sendo a Câmara Municipal de Lisboa, como se referiu, o proprietário do terreno, cumpre apreciar se nesta qualidade também lhe assistem alguns direitos na salvaguarda dos interesses acima referidos. Conforme previsto no art.° 1532° do Código Civil, "Enquanto não se iniciar a construção da obra ou não se fizer a plantação das árvores, o uso e a fruição da superfície pertencem ao proprietário do solo, o qual, todavia, não pode impedir nem tomar mais onerosa a construção ou a plantação." Significa esta disposição legal que, enquanto não se iniciam as obras - e presumimos que não se iniciaram face à inexistência do competente alvará de licenciamento -, ele continua a pode fruir e usar o solo, embora não possa fazer modificações tais que venha a tornar mais onerosa a construção a realizar Ou seja, pode fruir, pode usar, mas não pode tornar mais onerosa ou impedir a construção. Quer isto dizer que, no caso concreto, para além de se justificar por demais a intervenção da Câmara Municipal de Lisboa no local, agindo na qualidade de garante da segurança pública, também se justifica a sua intervenção enquanto proprietário do terreno, sendo-lhe permitido continuar a usar e a fruir da superfície, desde que não torne mais onerosa ou impossibilite a construção que o superficiário aí pretende erigir.
Do exposto supra retiram-se as seguintes conclusões: a) a superficiária, "Aventura em Lisboa" não cumpriu a cláusula 5a constante da escritura pública de constituição do direito de superfície, o que significa que, nem deu início, nem concluiu a obra para o local; b) a manutenção daquele espaço encerrado, tal como está, propencia um eventual clima de segurança na população da zona, assim como a degradação do espaço público; c) das informações enviadas a este Departamento Jurídico foi possível retirar: - que o local se encontra em estado de semi-abandono, "potenciando o eventual clima de insegurança na população residente na zona, além de incrementar a degradação do espaço público", impossibilitando o "policiamento eficaz às forças de segurança, tal como constatado in citu" - informação da Polícia Municipal n° l19127.8.8.4 - e que existem registos de episódios criminais na zona, designadamente a prática de crimes de furto no interior de viaturas e nas imediações do local; - que, o espaço em causa se encontra limitado por gradeamento e rede "apresentando no lado oposto à porta principal, a rede deteriorada, permitindo o acesso ao interior. - Exteriormente existe uma rede de marcos de água, encontrando-se alguns deles vandalizados. - No interior, são visíveis michos com boca de incêndio tipo teatro, desconhecendo-se a sua operacionalidade. - O espaço apresenta-se, junto da entrada principal, desprovido de arbustos, mas com a acumulação de grande quantidade de caruma de pinho, situação inversa constata-se no lado oposto, onde além da caruma, existem arbustos, denotando-se sinais de abandono." Concluindo o Regimento de Sapadores Bombeiros que "o facto do local estar vedado, potência o risco de incêndio a toda a zona envolvente, dado que este é um espaço privado, e o mau estado da vedação periférica permitir o acesso a pessoas estranhas" - Oficio n° 962/SP-Proc.397/26/2a, de 13/10/2008. d) tendo em consideração as informações supra referenciadas, da Polícia Municipal e do Regimento de Sapadores Bombeiros é evidente que estamos face a uma situação de necessidade de salvaguarda do interesse público de pessoas e bens e risco contra incêndio, sendo certo que sobre a Câmara Municipal de Lisboa recaem as atribuições previstas nos artigos 20° 22°, 25° e 26° da Lei n°159/99, de 14 de Setembro, no âmbito destas áreas de intervenção, nomeadamente a de salvaguarda dos interesses públicos subjacentes; e) ao abrigo do disposto no art.° 1532° do Código Civil, o proprietário do terreno, in casu a Câmara Municipal de Lisboa, pode usar e fruir o dito terreno até o superficiário dar início à obra, ou seja, enquanto o superficiário não der início à obra, o proprietário poderá entrar e providenciar as medidas que entender necessárias à defesa dos seus interesses, que na presente situação se concretizam, também, em verdadeiros interesses públicos de segurança de pessoas e bens. Face aos factos e argumentos expostos, e em prejuízo do esclarecimento a prestar ao solicitado pelo Exmo Sr. Vereador José Sá Fernandes constante do ofício n°1058/GVSF/2008, julgamos conveniente a ponderação da intervenção imediata no local por parte da Câmara Municipal de Lisboa, o que no caso de ser necessário e face à anterior conduta da "Aventura em Lisboa" deverá ser levada a efeito em conjunto com a Polícia Municipal, no âmbito das suas atribuições e do seu "ius imperi", que lhe confere prerrogativas de autoridade e legitimam a actuação ou intervenção (da CML) no local." Cfr. doc. de folhas 350 a 361 dos autos.
Q) Com data de 18 de Novembro de 2008, o Vereador da Câmara Municipal de Lisboa proferiu despacho com o seguinte teor: "Face aos fundamentos e conclusões vertido na Informação n°759/DJ/DAJU/2008 e despacho nela exarado pela directora do Departamento Jurídico, alicerçados nas Informações prestados, quer pela Polícia Municipal, quer pelo Regimento de Sapadores Bombeiros, no sentido de que a manutenção do espaço encerrado, tal como se encontra, para além de potenciadora de um clima de insegurança da população residente na zona e da degradação do espaço público, impossibilita o policiamento eficaz das forças de segurança, e é ainda potenciadora do risco de incêndio a toda a zona envolvente, uma vez que, para além de vedado, o espaço revela sinais de abandono, como seja a deterioração da rede que o delimita e que permite o acesso de pessoas estranhas ao interior, a vandalização de marcos de água e a acumulação de grande quantidade de caruma de pinho. Ao exposto acresce que a Informação n°191/DMAU-GD/2008, de 2008/09/22, sequência da Informação n°44/08/ DMAU/DAEV/ DM conclui que "o Parque urbano do Alto do Duque se encontra classificado no PDM como Área Verde de Recreio e, caso não estivesse vedado e, por isso, completamente inacessível, poderia servir uma população potencial de cerca de 100 000 habitantes" e que a carência de espaços verdes pertencentes à Estrutura Ecológica Secundária e as deficientes condições de acessibilidade pedonal e ciclável, por um lado, e a existência de toda uma série de infra-estruturas e edifícios de apoio ao recreio, por outro, constituem argumentos que sustentam a devolução daquele espaço à utilização pública. Nestes termos, determino que a DMAU, em conjunto com a Polícia Municipal, a Polícia Florestal e o Regimento de Sapadores Bombeiros, se desloque ao local e promova as seguintes diligências:
a) Entrada no local e garantia de acesso permanente dos Serviços ao mesmo, bem como da respectiva vigilância;
b) Reparação da vedação, limpeza do terreno e verificação da rede de marcos de água e das bocas de incêndio;
c) Elaboraçãode relatório global das condições em que o local se encontra, destinado a preparar um plano de intervenção que permita salvaguardar os interesses públicos subjacentes e em risco." Cfr. despacho n°177/P/2008 publicado no boletim Municipal de Lisboa de 17 de Novembro de 2008, a folhas 362 dos autos.
R) Em 28 de Novembro de 2008 o Vereador da Câmara Municipal de Lisboa José Sá Fernandes fazendo-se acompanhar de funcionários da Direcção Municipal de Ambiente Urbano, de membros da Polícia Municipal, da Polícia Florestal e do Regime de Sapadores Bombeiros dirigiu-se ao terreno sito no Parque de Monsanto de que a requerente é superfíciária designadas por "instalações do antigo Aquaparque".
S) Cerca das 10 horas de dia 28 de Novembro de 2008 foram naquelas instalações entregues a Egino Acácio Benedito Peneda, António Figueiredo Amaral e Arminda Silva as notificações de folhas 231 a 242 dos autos, que se dão por reproduzidas.
T) Após os serralheiros da CML procederam ao corte da corrente que fechava um portão lateral, sendo depois substituída por outra, com vista à entrada futura dos meios de limpeza e vigilância da DHURS, Polícia Florestal e RSB.
U) Entraram no terreno viaturas e funcionários da Câmara Municipal de Lisboa que iniciaram trabalhos de limpeza de caruma de pinheiros, arbustos e ramos de árvores.
V) Desde 28 de Novembro de 2008 que, e com uma pequena interrupção, os funcionários dos serviços de limpeza da CML têm entrado nas instalações e prosseguido os trabalhos de limpeza de caruma, ervas crescidas e secas, arbustos, ramos de árvores, e arvores secas, que removem e retiram do local.
W) Os funcionários da "Aventura em Lisboa" continuam a ter acesso às instalações, embora por portões distintos daquele por onde acedem os funcionários municipais.
X) O recinto das "instalações do antigo Aquaparque" é vedado em parte por uma rede, frágil, que foi já, em alguns locais, objecto de remendos.
Y) O Vereador da Câmara Municipal de Lisboa proferiu com data de 17 de Dezembro de 2008, despacho com o seguinte teor: "l. Por meu despacho datado de 18 de Novembro de 2008, praticado ao abrigo da competência que me é conferida pelo Despacho n°474/P/207, publicado no boletim Municipal n°705, de 23/08/2007, em matéria de Ambiente, Espaços Verdes e Plano Verde, determinei: a) a entrada nas antigas instalações do "AQUAPARQUE" sitas no Alto do Duque à Avenida das Descobertas, Restelo, e garantia de acesso permanente dos Serviços ao mesmo, bem como da respectiva vigilância; b) a reparação da vedação, limpeza do terreno e verificação da rede de marcos de água e das bocas-de-incêndio; e c) a elaboração de relatório global das condições em que o local se encontra, destinado a preparar um plano de intervenção que permita salvaguardar os interesses públicos subjacentes e em risco. 2. A localização no Parque Florestal de Monsanto do empreendimento pretendido licenciar pelo processo n°3404/PGU/98, determina o apuramento do estado das instalações e equipamentos existentes na parcela, uma vez que se desconhece se a superfície teria ou não levado a cabo alguma obra no local; 3. Mostra-se ainda fundamental ao estudo, recuperação e reabilitação daquele espaço verde, a fiscalização do local por técnicos dos serviços do Município de Lisboa; 4. Os serviços competentes d Câmara Municipal de Lisboa deslocaram-se ao local por diversas vezes, a fim de verificar da legalidade das construções existentes e do estado das instalações e equipamentos daquela área verde do Parque Florestal de Monsanto; 5. O acesso ao interior da parcela nunca foi facultado pela sociedade superficiária; 6. Posteriormente, tendo em conta os antecedentes/episódios policiais registados na área, foi possível fazer uma análise ao local (do exterior), tendo a Polícia Municipal informado que o actual estado de encerramento e semi-abandono em que se encontra aquele espaço é potenciador de insegurança na população residente na zona, para além de contribuir para a degradação do espaço público, impossibilitando um policiamento eficaz, tal como constatado no local, constituindo o furto no interior de viaturas nos estacionamentos periféricos, perpetrados nos períodos diurnos, o crime mais frequente; 7. Por seu lado, constatou o Regimento de Bombeiros Sapadores que, muito embora o local se encontre vedado, a verdade é que as circunstâncias ali existentes - tais como, a rede existente no local encontrar-se deteriorada, permitindo o acesso de estranhos ao local, marcos de águas vandalizados, bocas de incêndio que se desconhece se estão ou não operacionais, grande acumulação de caruma de pinho e arbustos - potenciam o risco de incêndio em toda a zona envolvente; 8. Junto ao mesmo local existe uma zona residencial (Bairro de Caseias), um estabelecimento de ensino e ainda um hospital; 9. Face às informações dos serviços acima referidos, acentuou-se a necessidade de verificar no local qual a real situação de perigo para pessoas e bens, designadamente atendendo ao risco de incêndio, insegurança e insalubridade existentes no local, mediante a entrada na parcela propriedade do Município de Lisboa e objecto do direito de superfície. 10. A salvaguarda dos interesses públicos aqui em causa constituem atribuições deste Município, nos termos dos artigos 20°, 22°, 25° e 26° da Lei n°l59/99, de 14 de Setembro; 11. Em face dos factos acima relatados, existe, por parte da Câmara Municipal, a obrigação de intervir imediatamente no local, perante o estado de degradação existente e o perigo eminente; 12. Sem prejuízo do pedido de licenciamento que a sociedade superficiária "Aventura em Lisboa" apresentou junto da Câmara Municipal de Lisboa, não mereceu o mesmo até à data despacho final, por inércia da requerente do mesmo, presumindo-se, por isso, e consequentemente, que a superficiária não tenha dado início a qualquer construção na parcela do direito de superfície; 13. De acordo com o previsto no artigo 1532° do Código Civil, e sem prejuízo das competências e obrigações que recaem sobre a autarquia de protecção activa dos interesses públicos subjacentes no caso em apreço, como seja a salvaguarda de pessoas e bens, certo é que "Enquanto não se iniciar a construção da obra ou não se fizer a plantação das árvores, o uso e a fruição da superfície pertencem ao proprietário do solo (...)"; 14. Está o município de Lisboa, também por esta via, habilitado a entrar na parcela objecto do direito de superfície e instalações na mesma existentes; 15. Face aos fundamentos invocados, justifica-se uma intervenção imediata no local por parte da Câmara Municipal de Lisboa, nos termos e para os efeitos que determinei no meu despacho de 18 de Novembro de 2008; 16. A urgência da intervenção no local determinada no meu despacho supra, foi, aliás, confirmada no dia 28 de Novembro de 2008, quando se constatou no próprio local que a mata apresenta um elevado número de árvores secas e tombadas, grandes acumulações de caruma, constituindo material combustível, propiciando uma situação de risco de incêndio iminente; 17. Ainda se constatou na mesma data que, à excepção dos edifícios principais da entrada, as construções encontram-se de uma forma geral degradadas, e os caminhos, antigas piscinas e estruturas de apoio dos escorregas, em estado de ruína, o que se mostra de extrema perigosidade e factor de insegurança, uma vez que o acesso de estranhos ao local é propiciado pela degradação das redes que limitam a parcela em causa; 18. em 05 de Dezembro de 2008, AVENTURA EM LISBOA, PARQUE TEMÁTICO DE DIVERSÕES, LDA, requereu junto do TACL (Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa), providência cautelar de suspensão de eficácia do referido despacho (4a Unidade Orgânica, processo n°2629/08.0BELSB); 19. A autoridade administrativa que receba o duplicado do requerimento de suspensão de eficácia deve impedir, com urgência, que os serviços competentes ou os interessados procedam ou continuem a proceder à execução do acto; 20. Conforme decorre dos n°s l e 2 do artigo 128° d CPTA (Código de Processo nos Tribunais Administrativos, recebido o duplicado do requerimento de suspensão de eficácia de um acto administrativo, só pode iniciar ou prosseguir a execução desse acto quando, mediante resolução fundamentada, reconheça, no prazo de 15 dias, que o diferimento da execução seria gravemente prejudicial para o interesse público; 21. O acto praticado fundamenta-se em pressupostos e condições relativos à defesa da integridade e segurança de pessoas e bens, assim como do direito ao ambiente e à vida urbana sadia e ecologicamente equilibrada, em obediência ao principio da legalidade a que estão vinculados os órgãos da administração pública, nos termos do artigo 3° do CPA; 22. Da não execução do despacho cuja suspensão de eficácia vem requerida e, bem assim, do diferimento dessa execução resultaria uma séria e grave lesão para os interesses públicos acima enunciados, os quais cabe à Entidade Requerida acautelar e prosseguir, conforme dispõem os artigos 4° do CPA (Código do Procedimento Administrativo) e 66° e 266° da CRP (Constituição da República Portuguesa); 23. A manutenção de situações que comprometem tais valores e interesses, é de molde a lesar gravemente o próprio interesse público que subjaz às normas acima identificadas; 24. Deste modo, reconheço, nos termos e para os efeitos do disposto no n° l do artigo 128° do CPTA, que a suspensão e diferimento da execução do acto administrativo cuja suspensão vem requerida, é gravemente prejudicial para o interesse público, pelo que deverá manter-se na ordem jurídica o despacho proferido em 18 de Novembro de 2008, que ordena a entrada nas antigas instalações do "AQUAPARQUE" sitas no Alto do Duque à Avenida das Descobertas, Restelo, e garantia de acesso permanente dos Serviços ao mesmo, bem como da respectiva vigilância, ordenando ainda a reparação da vedação, limpeza do terreno e verificação da rede de marcos de água e das bocas-de-incêndio, assim como a elaboração de relatório global das condições em que o local se encontra, destinado a preparar um plano de intervenção que permita salvaguardar os interesses públicos subjacentes e em risco, com fundamento na salvaguarda do direito à protecção e defesa da integridade e segurança de pessoas e bens, assim como do direito ao ambiente e à vida urbana sadia e ecologicamente equilibrada, em obediência ao princípio da legalidade a que estão vinculados os órgãos e agentes da Administração Pública, conforme determina o artigo 266° da CRP (Constituição da República Portuguesa).Cfr. doc. de folhas 284 a 290 dos autos.
Z) A presente providência cautelar deu entrada no Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa em 5 de Dezembro de 2008 e o município de Lisboa foi citada em 12 de Dezembro de 2008. Cfr. folhas 3 e 385 dos autos.
*
Os factos assentes de R) a X) resultam da prova testemunhal produzida Cfr. respectivas actas juntas aos autos.




DO DIREITO


Para decidir o presente recurso torna-se necessário proceder à análise de diversas questões consequenciais entre si em razão do regime jurídico aplicável, totalmente omitidas na sentença proferida pelo Tribunal a quo, de modo a determinar o regime legal que vincula o despacho de 18.11.2008 emitido por Vereador do pelouro do Ambiente e Espaços Verdes da Câmara Municipal de Lisboa, Município ora Recorrido, despacho esse que tem por objecto mediato a parcela de terreno detida em direito de superfície pela ora Recorrente, vd. itens B) e Q), cuja suspensão de eficácia foi recusada pelo Tribunal a quo e constitui o objecto central do elenco conclusivo que cumpre conhecer.


a) desafectação do domínio público; gestão do domínio privado disponível;

Decorre do item B) do elenco probatório que por escritura pública de 16.06.1998 foi constituído pela Câmara Municipal de Lisboa a favor da ora Recorrente o direito de superfície sobre uma parcela de terreno com a área de 81 200 m2, sita no chamado Parque Florestal de Monsanto, em Lisboa.
Conforme declarado na citada escritura pública, a parcela em causa de 81 200 m2 foi desanexada de um lote de terreno para construção de 180 000 m2 que, por sua vez, na veste fundiária de “parcela de terreno municipal com cerca de 18 “ha (hectares) integrada no Parque Florestal de Monsanto” foi desafectada do domínio público para o domínio privado da Câmara Municipal de Lisboa mediante acto formal expresso deste órgão autárquico configurado na deliberação de 07.10.1987.
Nessa mesma deliberação de 07.10.1987 foi constituído a favor de outra sociedade, a Aquaparque, Atracções Turísticas, Lda., “o direito de superfície sobre a parcela de terreno sita no Parque Florestal de Monsanto” por um prazo de 25 anos, entretanto “revogado” por acto da mesma Câmara, datado de 27.08.1997, conforme se refere na Informação nº 0759/DJ/DAJU/2008, matéria levada ao probatório nos itens A) e P), deliberação de 01.10.1987 a fls. 43/44 e escritura pública de 16.06.1998 a fls. 143/l51 dos autos.
Para este efeito cabe esclarecer que a constituição do direito de superfície por escritura pública de 16.06.1998 não traduz por parte da Câmara Municipal de Lisboa a constituição de um direito real parciário de uso público em ordem à outorga a favor da ora Recorrente de uma situação jurídica de vantagem configurada no uso privativo de bem público, desde logo porque a parcela de terreno de 81 200 m2 a que se reportam os autos foi desanexada em 16.06.1998 da parcela de 18 hectares, sendo que à data de 16.06.1998 o prédio base da desanexação, os tais 18 hectares, já tinham sido objecto de acto formal expresso de desafectação do domínio público autárquico com passagem imediata ao domínio privado do Município ora Recorrido conforme deliberação de 07.10.1987 da Câmara Municipal de Lisboa.
O que significa que, em face da cessação da dominialidade por desafectação singular resultante de nova delimitação fundiária, o imóvel constituído por desanexação predial dos 81 200 m2 em 16.06.1998 é, desde a origem, parte integrante do domínio privado da Câmara Municipal de Lisboa, ou seja, enquanto unidade predial não esteve afecto a nenhum fim de utilidade pública específica na medida em que não se constituiu como suporte material de exercício de função ou serviço público, não sendo, por isso, recondutível à categoria de bem público, expressa no estatuto privilegiado consequente da inalienabilidade, imprescritibilidade e autotutela executiva. (1)
Ao caso interessa atender ao conteúdo deste último requisito, a autotutela executiva.
Entende-se por autotutela executiva “(..) A faculdade das autoridades administrativas procederem, em via administrativa, à tutela da integridade jurídica e do gozo material dos bens públicos tem sido identificada como mais uma das notas típicas da propriedade pública. A propriedade pública definir-se-ia, justamente, pela possibilidade de, “relativamente a terceiros, o proprietário exercer o ius excludendi alios, por meio de actos administrativos definitivos e executórios, isto é, usando a sua própria autoridade e independentemente de recurso aos tribunais.” (Marcello Caetano). (..)
A execução material compulsória das decisões administrativas no caso de bens públicos obedece, por norma, a procedimentos administrativos típicos de estrutura binária. Assim, e numa primeira fase, o administrado é instado a devolver, num prazo determinado, a dependência dominial abusivamente ocupada à sua situação antecedente (status quo ante), e apenas na hipótese de não o fazer dentro do termo fixado se achará a autoridade administrativa competente para o efeito habilitada a proceder ex officio aos trabalhos de remoção, sendo as despesas a suportar pelo particular (segunda fase).
Com os procedimentos de autotutela executiva – que, não é demais relembrá-lo, têm que se achar expressamente contemplados na lei – apenas é dado alcançar uma “protecção provisória” dos bens públicos, ou seja, salvaguardado é, tão só, o jus possessionis e nunca o jus possidendi. Bem se pode dizer, então, “que estes procedimentos não são substitutivos, sem mais, dos meios ordinários de defesa: porque apenas podem operar sobre um estado de facto para torná-lo adequado à situação de direito e à destinação funcional da coisa; numa palavra, podem substituir tão só os remédios possessórios e não também os petitórios” (V. Cerulli Irelli). (..)” (2)
De acordo com o probatório, na hipótese dos autos, pelo contrário, desde a conformação jurídica por desanexação fundiária de parcela de terreno com a área de 81 200 m2, que o imóvel em causa integra o domínio privado do Município de Lisboa, submetido, portanto, a um regime de direito comum tal como todos os bens pertença de entidades públicas não qualificados como bens públicos.
Por não se achar afectado a uma função de interesse público, o imóvel em causa integra a categoria doutrinária - com assento normativo no DL 477/80 de 15.10 no que toca ao domínio público do Estado (vd. artº 7º) - de domínio privado disponível, em que a “(..) disponibilidade, por seu lado, não significa necessáriamente uma sujeição total ao Direito privado, sem quaisquer condicionalismos impostos pelas leis administrativas: significa, sim, que não havendo afectação a nenhum fim de utilidade pública os bens podem ser alienados ou onerados pela Administração, ainda que tão somente pelas formas prescritas na lei administrativa, e bem assim penhorados em execução judicial, sem que a possibilidade da sua aplicação a fins diferentes pelos novos titulares possa repercutir-se na validade dos actos de transmissão ou oneração. (..)”, por contraponto aos bens do domínio privado indisponível assim classificados em ordem a “(..) evitar que sejam desviados da afectação ao fim de utilidade pública, exterior aos bens, que eles são chamados a servir. (..) [o que] não altera, em substância, o princípio de que o regime jurídico global desses bens não é o do domínio público, mas o do domínio privado (..)” (3)


b) constituição de direito de superfície em domínio privado do município;

Assente que compete ao caso o regime de domínio privado disponível a que se aplica o direito objectivo comum, no caso, o disposto no artº 1304º C. Civil, cabe ainda saber, no seguimento da 2ª parte do citado artigo conjugado com o artº 1527º, se são aplicáveis os artºs. 1524º a 1526º do C. Civil ou o regime da Lei dos Solos, DL 794/76, de 05.11, alterado pelo DL 313/80 de 19.08, sendo que seguimos o entendimento doutrinário “(..) no sentido de o regime a que a constituição do direito de superfície está sujeito ser obrigatóriamente o da Lei dos Solos para os casos previstos e o do Código para quaisquer outros casos, sem prejuízo de nestes ficar estabelecido o regime da mesma lei. Se o Código Civil permite que a Administração aliene a propriedade de um imóvel, por maioria de razão permite a constituição do direito de superfície, ou seja, a alienação de sómente parte das faculdades compreendidas no direito de propriedade.
Há, pois, dois regimes do direito de superfície, com regras diferentes, o que é justificado pelo facto de os interesses não serem os mesmos num caso e no outro (..) O direito de superfície segundo o regime da Lei dos Solos, pode ser constituído nos seguintes casos: - criação de aglomerados urbanos com mais de 25 000 habitantes; - expansão ou desenvolvimento de aglomerados urbanos até 25 000 habitantes, quando assim for deliberado pelos órgãos locais competentes ou quando o Governo o considere conveniente, nomeadamente para a execução de empreendimentos integrados em planos de âmbito nacional ou regional, - operações de renovação urbana; - recuperação de áreas degradadas, quer resultantes do depósito de desperdícios quer de exploração de inertes; - edifícios ou instalações de interesse público, - empreendimentos relativos à habitação social; - edifícios para habitação própria ainda que em regime de propriedade horizontal; - em casos de legalização de construções clandestinas (..); - criação e ampliação de parques industriais. (..)” , sendo que o regime superficiário instituído pelo DL 280/2007, 07.08, não vem ao caso. (4)

*
A escritura pública de 16.06.1998, levada ao probatório no item B), nada diz para além de estipular o prazo de 50 anos (prazo regra da Lei dos Solos) prorrogável por períodos de 5 anos, mediante o pagamento de prestação anual que quantifica, a liquidar mensalmente, e que o mesmo é “(..) destinado à instalação de um Parque de Diversões nas condições que vierem a ser definidas pelos Serviços da Câmara Municipal de Lisboa e outras entidades, em sede de licenciamento (..)”seguindo o demais clausulado, conforme documento por fotocópia simples junto aos autos a fls. 143/151.
Pelo que vem de ser dito, na exacta medida em que as circunstâncias de facto extravasam da tipologia fechada de casos enunciados na Lei dos Solos, ao direito de superfície constituído em terreno do domínio privado disponível do Município de Lisboa referido nos autos, compete o regime do Código Civil.
O que significa que, em consonância com o regime civilista, o superficiário tem o direito de construir sobre o prédio alheio a partir do momento em que o dono do solo faz a concessão “ad aedificandum”, artº 1525º nº 1, ao que acresce à luz do disposto no artº 1532º, que na esfera jurídica do superficiário coexistem, na circunstância da previsão legal, dois direitos distintos, o direito de construirin re aliena” e o direito de propriedade sobre a obra separada do solo; na esfera jurídica do proprietário do solo, o direito, rectius, o poder de “uso e fruição da superfícieantes de nela começar a obra “(..) portanto, enquanto não se iniciam as obras ele continua a fruir o solo, “… todavia, não pode impedir nem tornar mais onerosa a construção ou a plantação”, quer dizer, continua a poder fruir e usar, mas não pode fazer modificações tais que depois torne mais onerosa a construção. Quanto a esse aspecto é obrigado a uma abstenção: pode fruir, pode usar, mas não pode tornar mais onerosa nem impedir a construção, isto é, se vendeu um terreno que exige despesas de terraplanagens, nivelamento, etc. não é ele quem tem de as fazer, nas sim o superficiário, quando iniciar a construção. É-lhe apenas imposto um “pati”, uma abstenção, um ter de suportar a construção que o outro faz. (..)” (5)


c) real ocorrência de pressupostos; requisito de validade;

Tendo presente o enquadramento jurídico devido ao caso importa atender à matéria de facto levada ao probatório relativa à fundamentação do despacho de 18.11.2008 consubstanciada na Informação nº 0759/DJ/DAJU/2008 da mesma data, levada ao probatório no item P), bem como aos antecedentes ofícios do Vereador da Câmara Municipal para a ora Recorrente de 13.12.2007, 15.01.2008, 16.01.2008, 19.01.2008, 22.01.2008, 07.02.2008 e 08.02.2008, a que a ora Recorrente respondeu por ofícios datados de 18.01.2008, 21.01.2008, 23.01.2008 e 08.02.2008, todos levados ao probatório nos itens E) a O).
A fundamentação do despacho de 18.11.2008 e os ofícios referidos demonstram que:
1. a existência material de execução de trabalhos de começo de obra é matéria de facto controvertida entre o Vereador e a ora Recorrente;
2. quer a informação que fundamenta o despacho quer os mencionados ofícios emitidos pelo Vereador da Câmara Municipal de Lisboa misturam duas situações jurídicamente distintas,
(i) a extinção do direito de superfície por caducidade nos termos do artº 1536º nº 1 a) CC dado o interesse da Administração na “devolução daquele espaço à utilização pública” conforme expresso no despacho de 18.11.2008,
(ii) a concretização do direito de superfície materializada na operação urbanística sujeita a controlo preventivo mediante licenciamento nos termos do DL 555/99, de 16.12 e diplomas de alteração subsequentes (RJUE), procedimento pendente nos serviços do Município ora Recorrido.
Pelo que vem dito, os poderes de uso e fruição por parte do proprietário do solo mostram-se controvertidos quanto à materialização do respectivo conteúdo no próprio teor da correspondência trocada e levada ao probatório, pelo que não permitem respaldar juridicamente a ordem de entrada no espaço delimitado pelo direito de superfície da ora Recorrente, sendo que é este o efeito jurídico que o despacho de 18.11.2008 contém.
Acresce que a menção ao artº 1532º do C. Civil é a única referência jurídica expressa que a Informação dos serviços jurídicos do Município apresenta, sendo certo que o teor declarado é que “(..) não podemos deixar de presumir que o requerente do processo n°3404/PGU/98, e titular do direito de superfície, não terá dado início a qualquer obra, encontrando-se o local fechado. (..)”.
Salvo o devido respeito, a informação incorre em erro técnico e, consequentemente, o despacho de 18.11.2008 também, na medida em que o normativo em causa não permite, a título nenhum, o uso e fruição do solo pelo proprietário com base em presunções sobre se a obra começou ou não começou a ser executada; pelo contrário, o artº 1532º CC é muito claro – e a Doutrina também, como se vê pelo segmento citado – quanto à obrigação de pati que impende sobre o proprietário do solo enquanto a obra não se inicia, mas, uma vez começados os trabalhos, há um dever jurídico de abstenção de uso e fruição sobre o solo – o mesmo é dizer, dever de abstenção de exercício da posse, de se apropriar das virtualidades, económicas ou não, da coisa concreta que é o solo, na medida em que esta posse é exclusiva do superficiário em ordem à materialização dos trabalhos de construção.
Aliás nem se entende o propósito de referência aos artºs 20º, 22º, 25º e 26º da Lei 159/99 de 14.09, que estabelece o quadro de transferência de atribuições e competências para as autarquias locais no domínio do património, cultura e ciência, saúde, protecção civil, ambiente e saneamento básico, sem que se constate a real ocorrência do quadro de pressupostos de facto e de direito que permita o exercício das competências que naqueles dispositivos são elencadas.
De facto, é sabido que “(..) toda a norma que confere um poder a um órgão administrativo leva implícito o comando de que tal poder só deve ser exercido quando o reclamem necessidades reais, concretas, sentidas; e sabemos também que uma necessidade colectiva só se torna real quando ocorrem factos que geram o seu aparecimento ou subsistência. (..)
Para que o acto administrativo seja válido quanto aos seus pressupostos não basta, porém, que o órgão tenha actuado com base em pressupostos legalmente indicados ou escolhidos. É preciso também que os pressupostos tenham ocorrido na realidade, exigindo a lei que o órgão só actue com base em pressupostos legais, mas que se verificaram em concreto. (..)
E bem se compreende que a real ocorrência dos pressupostos seja um requisito de validade do acto administrativo, que a jurisprudência nunca deixa de verificar: é que, como já dissemos, a actividade administrativa visa a satisfação de necessidades concretas, reais e estas não existem se os pressupostos são materialmente inexistentes. Ora, este requisito do acto administrativo é sempre vinculado quer quando os pressupostos são vinculadamente individualizados na lei, quer quando eles são de livre escolha do órgão administrativo.(..)”(6)

d) pressupostos do agir administrativo em estado de necessidade;

Por outro lado, o teor do próprio despacho de 18.11.2008, levado ao probatório nos itens P) Q) com a informação que o fundamenta, declara que se evidencia uma situação “(..) potenciadora de um clima de insegurança da população residente na zona e da degradação do espaço público, impossibilita o policiamento eficaz das forças de segurança, e é ainda potenciadora do risco de incêndio a toda a zona envolvente (..)”.
Ou seja, faz referência implícita a uma situação de estado de necessidade subjacente ao segmento que consubstancia o efeito jurídico declarado, a saber “(..) determino que a DMAU, em conjunto com a Polícia Municipal, a Polícia Florestal e o Regimento de Sapadores Bombeiros, se desloque ao local e promova as seguintes diligências: a) Entrada no local e garantia de acesso permanente dos Serviços ao mesmo, bem como da respectiva vigilância; b) Reparação da vedação, limpeza do terreno e verificação da rede de marcos de água e das bocas de incêndio; c) Elaboração de relatório global das condições em que o local se encontra, destinado a preparar um plano de intervenção que permita salvaguardar os interesses públicos subjacentes e em risco (..)”.
É evidente que em casos de estado de necessidade, consagrado como princípio geral de direito em todos os ramos da ordem jurídica no artº 339º do C. Civil, a vinculação do agir administrativo à lei se coloca em termos totalmente distintos.
Como nos diz o Autor que vem sendo citado, “(..) Há, na verdade, ocasiões em que a actividade administrativa se fosse levada a cabo com sujeição à lei, poria em perigo a satisfação de necessidades ou interesses colectivos fundamentais. (..) Circunstâncias excepcionais podem, porém, fazer com que apareçam em conflito não os dois (ou mais) interesses ponderados pelo legislador, mas outros que a sua capacidade de previsão não abarcou.
Entre esses interesses não ponderados, alguns podem ter uma tal relevância que à consciência jurídica – e à própria consciência social – repugnaria a sua subordinação ao interesse que o legislador considerou prevalecente nos caos normais. (..) Em estado de necessidade, a Administração Pública está autorizada por princípio geral de direito a tomar através de órgãos normalmente incompetentes medidas com conteúdo, forma e em condições “ilegais” (do ponto de vista do direito escrito) (..)”
Razão pela qual em primeiro lugar há que saber “(..) da existência das circunstâncias excepcionais que levaram ao aparecimento do conflito de interesse público fundamental não previsto pelo legislador (..) a invocação do estado de necessidade só é possível naqueles casos em que existe uma manifesta desproporcionalidade [vd. artº 339º C. Civil] entre o interesse protegido pelo legislador e aqueloutro cujo aparecimento ou empolamento ele não previu; é que não existindo essa desproporcionalidade que desperta a reacção da própria consciência social, não se justificaria, sob perspectiva alguma, a substituição da valoração legal na qual se considerou prevalecente um certo interesse público (ou privado) pela valoração do órgão administrativo privilegiando um outro interesse público (..)
(..) [além de que] preciso se torna que o interesse público fundamental esteja ameaçado de uma forma iminente e actual, não bastando um perigo longínquo ou potencial para legitimar o acto (..)” (7)

*
Aplicando o enquadramento doutrinário descrito ao caso dos autos, é visível a impossibilidade de proceder à apreciação das circunstâncias de facto que, em critério de excepcionalidade e proporcionalidade, permitem substituir a valoração legal de proibição de entrada do proprietário no terreno objecto de direito de superfície pela valoração administrativa do Vereador da Câmara Municipal de Lisboa constante do despacho e fundamentação de 18.11.2008.
Efectivamente, no despacho em causa diz-se que “(..)a manutenção do espaço encerrado, tal como se encontra, para além de potenciadora de um clima de insegurança da população residente na zona e da degradação do espaço público, impossibilita o policiamento eficaz das forças de segurança, e é ainda potenciadora do risco de incêndio a toda a zona envolvente, uma vez que, para além de vedado, o espaço revela sinais de abandono, como seja a deterioração da rede que o delimita e que permite o acesso de pessoas estranhas ao interior, a vandalização de marcos de água e a acumulação de grande quantidade de caruma de pinho. (..)”, todavia, todas as referências contidas no despacho e respectiva fundamentação no sentido de conformar uma situação de risco iminente para o “interesse público de pessoas e bens e risco de incêndio” por reporte ao direito objectivo, assentam em presunções sucedendo que a base dessas mesmas presunções, isto é, a factualidade conhecida para dela se poder firmar a factualidade desconhecida e presumida, não se mostra minimamente comprovada por não assentar em nenhum meio de prova, pelo que são recondutíveis a meras conjecturas de natureza conclusiva a que o direito é indiferente.
De modo que relativamente ao suporte fáctico do agir administrativo em estado de necessidade militam as mesmas razões acima referidas a propósito da inexistência de factos subsumíveis na hipótese normativa que permite ao proprietário do solo o uso e fruição do mesmo (artº 1532º CC); ou seja, também neste enquadramento jurídico, que o despacho invoca, se configura a falta dos pressupostos de facto que suportem o efeito jurídico declarado, o que indicia a invalidade do mesmo por violação de lei derivada de erro de facto sobre os pressupostos.


e) direito de audiência - item 3/e), f), g) h) das conclusões;

Cumpre salientar que o conceito de procedimento administrativo plasmado no art° 1° n° l do CPA, definido como “sucessão ordenada de actos e formalidades tendentes à formação e manifestação da vontade da Administração pública ou à sua execução”, indica, desde logo, uma de duas situações: (i) ou existe tramitação consagrada na legislação específica que trata do tipo de acto administrativo que traduz o exercício da competência pública – a competência do órgão administrativo não se presume, sendo um elemento vinculado do acto que tem por conteúdo o elenco de poderes que, em abstracto, a lei consagra por reporte ao interesse público concreto posto a cargo da pessoa jurídica pública em que o órgão se integra – (ii) ou, não existindo processado específico, rege o disposto no CPA quanto aos procedimentos públicos (artºs. 54º e ss.) e quanto aos procedimentos particulares (artºs. 74º e ss.).
O que significa na circunstância dos autos que o despacho de 18.11.2008 do Vereados da Câmara Municipal de Lisboa, Município ora Recorrido configura a prática de acto administrativo cujos efeitos jurídicos o integram na categoria dos actos lesivos de direitos ou interesses legalmente protegidos e, na medida em que houve instrução procedimental relevante - constituída pela Informação nº 0759/DJ/DAJU/ 2008 da mesma data do despacho em causa, levada ao probatório no item P), bem como pelos antecedentes ofícios do Vereador da Câmara Municipal para a ora Recorrente de 13.12.2007, 15.01.2008, 16.01.2008, 19.01.2008, 22.01.2008, 07.02.2008 e 08.02.2008 e os da ora Recorrente, datados de 18.01.2008, 21.01.2008, 23.01.2008 e 08.02.2008, todos levados ao probatório nos itens E) a O) -, necessariamente que o despacho de 18.11.2008 teria que ser antecedido pela audiência prévia do interessado, o ora Recorrente.
Efectivamente, atento o disposto no artº 100º nº 1 CPA “(..) o princípio da audiência dos interessados consagrado neste diploma não implica para aqueles o direito de se pronunciarem sobre a apreciação do objecto do procedimento feita pelo órgão competente para a decisão final; mas apenas sobre o objecto do procedimento tal como o mesmo se configura imediatamente antes da decisão final. Os interessados pronunciam-se sobre as questões a resolver pelo exercício da competência e a matéria de facto averiguada em função das mesmas; não têm que se pronunciar sobre o juízo de mérito feito pelo órgão competente relativamente às mesmas questões. (..)”.
É por isso que a instrução é “(..) o próprio pressuposto da audiência dos interessados: a actividade procedimental desenvolvida pela Administração no sentido de captar os interesses que devem nortear o exercício da sua competência material em ordem à determinação e fixação de um interesse público concreto. Não havendo lugar à fixação de um interesse público concreto, também não há que ponderar a representação que os interessados fariam desse mesmo interesse em conjugação com os seus interesses particulares. (..)”. (8)
De modo que seja qual for o procedimento, previsto em legislação especial ou organizado por recurso às disposições gerais do CPA, verificado o pressuposto instrutório há lugar a audiência dos interessados sendo-lhes comunicado o sentido provável da decisão.
Logra, assim, ganho de causa a questão trazida a recurso no item 3/e), f), g) h) das conclusões.


f) suspensão de eficácia - intimação; fumus boni iuris; periculum in mora – artº 120º nº 1 b) CPTA;

Cabe passar à análise dos pressupostos cautelares no tocante às providências requeridas, domínio adjectivo da summario cognitio, em que a apreciação da factualidade carreada para os autos e para efeitos decisórios sobre os requisitos da aparência da existência de um direito e provável ilegalidade da actuação administrativa (fumus boni iuris) faz-se por recurso a um juízo de verosimilhança ou mera previsibilidade e razoabilidade dos indícios, sendo que a apreciação dos perigos de retardamento ou infrutuosidade (periculum in mora) se faz em moldes mais exigentes de “fundado receio” diz a lei, isto é, de probabilidade mais forte e convincente da gravidade ou difícil reparabilidade dos danos, salvo se já se tiverem verificado na prática e se pretenda sustar a continuidade de superveniência de novos dados, tal como no tocante à ponderação de interesses contrapostos em presença.
Tudo quanto vem de ser dito significa que a matéria que extravase o quadro da summario cognitio cabe no domínio da causa principal, logo, tudo quanto extravase os critérios de decisão cautelar, traduzidos nos requisitos do fumus boni iuris, periculum in mora e ponderação de interesses do artº 120º nº 1 b) e 2 CPTA, compete à causa principal na qual o juízo de pronúncia do Tribunal tem por objecto o litígio, em contrário do que sucede no domínio cautelar que, como é consabido, não tem por escopo antecipar o juízo definitivo sobre o mérito da causa.
E também significa que, na circunstância dos autos, está arredada a hipótese consignada na alínea a) do nº 1 do artº 120º CPTA quanto à evidência da pretensão formulada ou a formular nos autos principais, quanto mais não seja porque no quadro de uma apreciação prima facie não surge como manifestamente ilegal o agir administrativo sendo, pelo contrário, necessário proceder ao enquadramento da situação de facto por apelo a diversos contextos de direito objectivo, necessários à compreensão e subsunção jurídica da mesma.
Cabe, pois, analisar as questões trazidas a recurso sob os itens 3 a 7 das conclusões, todas no enquadramento dado pela alínea b) do nº 1 do artº 120º CPTA tanto no que respeita à peticionada suspensão de eficácia do despacho de 18.11.2008, despacho cujos efeitos jurídicos são duradouros pelo que mantém relevância jurídica o enquadramento cautelar – trata-se de um acto de execução continuada no tempo, susceptível de múltiplas aplicações sem que o respectivo conteúdo se esgote -, como no tocante à peticionada intimação do Município de Lisboa a retirar os objectos de sua pertença e abster-se de, sem autorização do superficiário, entrar novamente no local ou praticar actos que perturbem os direitos deste e , ainda, a repor o status quo ante.

*
Relembrando que em sede cautelar administrativa “(..) a apreciação do fumus boni iuris requer não apenas a emissão de um juízo sobre a aparência da existência de um direito ou interesse do particular a merecer tutela, como também da probabilidade da ilegalidade da actuação lesiva do mesmo (..)” isto é a apreciação do fumus boni iuris estende-se sobre a aparente ilegalidade da actuação administrativa assacada pelo particular como lesiva de um direito que lhe assiste. (9), conclui-se, das considerações de direito supra expostas, em favor da verificação deste requisito cautelar em sede de providência conservatória de conteúdo assegurador do status quo ante no que respeita à peticionada suspensão de eficácia do despacho de 18.11.2008.
Uma vez suspensa a susceptibilidade jurídica de o despacho de 18.11.2008 continuar a produzir os efeitos de direito estruturalmente inerentes ao objecto imediato, pese embora permaneça no domínio jurídico como acto administrativo existente e válido até eventual decisão jurisdicional definitiva em contrário na acção principal, é evidente que deixa de ser passível de execução material múltipla no tocante às diligências nele ordenadas, a saber,
“(..) a) Entrada no local e garantia de acesso permanente dos Serviços ao mesmo, bem como da respectiva vigilância;
b) Reparação da vedação, limpeza do terreno e verificação da rede de marcos de água e das bocas de incêndio;
c) Elaboraçãode relatório global das condições em que o local se encontra, destinado a preparar um plano de intervenção que permita salvaguardar os interesses públicos subjacentes e em risco. (..)”.
Portanto, no âmbito do presente processo cautelar, temos que em razão da suspensão de eficácia do despacho em causa o ora Recorrido fica inibido de materializar os efeitos jurídicos nele declarados e consubstanciados nas diligências ordenadas.
Idêntica conclusão se retira quanto ao preenchimento do requisito do periculum in mora na vertente do perigo de infrutuosidade e ineficácia do julgado final, vd. artº 120º nº 1 b) CPTA, por força da continuação de prática de actos no uso e fruição da parcela de terreno do superficiário ora Recorrente por parte do Município ora Recorrido.
*
No que concerne ao pedido de intimação do Município de Lisboa para (i) retirar do terreno os objectos de sua propriedade e (ii) se abster de entrar novamente sem prévia autorização do superficiário e de praticar qualquer acto que “limite ou restrinja os direitos” da superficiária ora Recorrente, cabe referir que a análise da providência se desenvolve por conjugação de dois níveis distintos de apreciação, que têm de se verificar, simultaneamente e pela positiva.
Por um lado, estando assente em juízo de verosimilhança a aparente ilegalidade da actuação administrativa mostra-se preenchido o nível de apreciação do lado da Administração, no sentido da violação da legalidade pelo concreto agir administrativo consubstanciado no despacho de 18.11.2008, item Q) do probatório, emitido pelo Vereador do ora Recorrido Município de Lisboa.
Por outro lado, atento o nível de apreciação respeitante à relação jurídico-administrativa decorrente da constituição do direito de superfície por escritura de 16.06.1998, item B) do probatório, a ora Recorrente encontra-se em posição de exigir do Município ora Recorrido a adopção do comportamento devido, de se abster de continuar a agir em contrário do que, em juízo cautelar de verosimilhança, se configura como ilícito por violar o dever jurídico de abstenção de uso e fruição sobre o solo nos termos do artº 1532º CC o que, em juízo perfunctório nos termos da fundamentação de direito supra, constitui um direito que assiste à ora Recorrente com fundamento na posição jurídica de superficiário contratualmente adquirida.
Ou seja, na circunstância dos autos e atento o probatório assiste à ora Recorrente o direito de: (i) fazer cessar a perturbação do âmbito material de direitos inerentes à sua esfera jurídica de usar e fruir com exclusividade, o terreno objecto do direito de superfície constituído a seu favor por escritura pública de 16.06.1998, item B) do probatório, e de (ii) ver retirados desse terreno todos os objectos pertença do dono do solo em domínio privado disponível, ou seja, do Município de Lisboa, naturalmente a expensas deste e mediante autorização prévia do superficiário para a entrada no terreno com a finalidade de levantar todos os objectos para ali transportados de acordo com a matéria constante dos itens T), U), V) do probatório.

*
Já no tocante à providência de intimação a repor o status quo ante à materialização do efeito jurídico ordenado no despacho de 18.11.2008 do Vereador do Município ora Recorrido entendemos que a mesma extravasa o âmbito da summario cognitio cautelar, antes competindo ao conhecimento pleno próprio da acção principal na medida em que o sentido jurídico do peticionado se expressa no campo próprio da obrigação de indemnização, natural ou por equivalente, em consequência dos actos materiais praticados ao abrigo do despacho de 18.11.2008.
Efectivamente, como já referido supra, tudo quanto extravase os critérios de decisão cautelar, traduzidos nos requisitos do fumus boni iuris, periculum in mora e ponderação de interesses do artº 120º nº 1 b) e 2 CPTA, compete à causa principal na qual o juízo de pronúncia do Tribunal tem por objecto o litígio, em contrário do que sucede no domínio cautelar que, como é consabido, não tem por escopo antecipar o juízo definitivo sobre o mérito da causa.
Pelo que vem dito e com a ressalva da peticionada intimação à reposição do status quo ante, logram procedência as questões suscitadas nos itens 3/a) a d), i) a o), 4 a 7 das conclusões, com enquadramento no artº 120º nº 1 b) CPTA.

g) ponderação de interesses – artº 120º nº 2 CPTA;

No que respeita à ponderação dos interesses conflituantes em presença nos autos, requisito negativo estatuído no artº 120º nº 2 CPTA, tem esta por escopo estabelecer “(..) uma cláusula de salvaguarda neste domínio, permitindo que, no interesse dos demais envolvidos, a providência ainda seja recusada quando, pese embora o preenchimento, em favor do requerente, dos requisitos previstos na alínea b) ou na alínea c) do nº 1, seja de entender que a concessão da providência provocaria danos (ao interesse público e de eventuais terceiros) desproporcionados em relação àqueles que se pretenderia evitar que fossem causados (à esfera jurídica do requerente) (..)” (10)
O interesse público relevante no juízo de ponderação de interesses há-de ser “(..) um interesse público qualificado, de especial significado, que exige, no caso concreto, a não concessão da providência cautelar. Assim se justifica que recaia sobre a Administração o ónus de alegar a demonstração do perigo de produção de prejuízos específicos e concretos face às circunstâncias do caso sobre um interesse público singular. (..) O que se pretende não é privilegiar os interesses particulares face ao interesse público, mas apenas evitar o sacrifício sistemático e desproporcionado dos direitos e interesses particulares.
O Tribunal deve proceder a uma tarefa de concordância prática dos direitos e bens em conflito, sem privilegiar ou prejudicar qualquer deles. (..)” (11)
Na circunstância dos autos, a falta dos pressupostos de facto que suportem o efeito jurídico declarado no despacho suspendendo que ordena as diligências que traduzem, por parte do Município ora Recorrido, a violação do direito do superficiário ora Recorrente a não ser perturbado no exercício dos direitos conferidos contratualmente, conforme disposto no artº 1532º C. Civil, não permite configurar quaisquer prejuízos para o Município com a decretação das providências.
Ou seja, dos autos não emergem factos que permitam um juízo fiável de que as medidas cautelares peticionadas, se decretadas, expõem quer o Município ora Recorrente quer terceiros a uma situação “potenciadora de um clima de insegurança da população residente na zona e da degradação do espaço público”, “potenciadora do risco de incêndio a toda a zona envolvente” na medida em que nem tais pressupostos de facto contidos na fundamentação do despacho resultam provados, pelas razões acima expostas.
De modo que não cabe recusar no âmbito do artº 120º nº 2 CPTA, as providências requeridas.


h) resolução fundamentada – itens 8 a 15 das conclusões;

Socorrendo-nos da doutrina, “(..) a apreciação da declaração de ineficácia dos actos praticados ao abrigo da parte final do nº 1 do artº 128º do CPTA é coisa diferente da apreciação da providência cautelar de suspensão do acto administrativo. (..) ao contrário do que por vezes se pensa (e do que por vezes decidem ao tribunais)os efeitos da decisão relativamente à providência cautelar valem dessa data em diante, enquanto ao efeitos da declaração de ineficácia dos actos de execução do acto suspendendo valem dessa data para trás, pelo que além dos critérios legais de apreciação não serem os mesmos, o próprio campo de aplicação é diverso, a ponto de ser inaceitável, em abstracto, uma “decisão siamesa” que ligue, para o bem e para o mal, uma decisão à outra, de acordo com o critério the winner takes it all.
Na verdade, o Tribunal, no momento em que decide sobre a eficácia ou ineficácia dos actos de execução praticados ao abrigo de resolução fundamentada, ao contrário do que se passa quando aprecia o pedido de suspensão de eficácia do acto, não tem de tomar em consideração o periculum in mora, o fumus boni iuris, nem sequer tem de proceder a uma ponderação dos interesses públicos e privados em questão.
Com efeito, para decidir se os actos de execução devem, ou não, ser considerados ineficazes, o Tribunal apenas deve verificar (i) se a resolução fundamentada existe, (ii) se foi emitida dentro do prazo legal e (iii) se está fundamentada, no sentido de demonstrar e provar que o diferimento da execução (que é a regra geral) seria gravemente prejudicial (e não apenas maçador, inconveniente ou até simplesmente prejudicial) para o interesse público (e não para o interesse dos contra-interessados). (..) apenas os casos em que o diferimento dessa execução seja gravemente prejudicial justificam, rectius, permitem o afastamento da regra geral (standstill clause) que determina a proibição de executar o acto administrativo suspendendo. (..)
(..) o que a lei impõe é que a Administração procure, por todos os meios, minorar os inconvenientes que [a regra geral da suspensão provisória do acto] essa suspensão possa provocar, precisamente nos casos em que, manifestamente, inexistem meios de atenuação do prejuízo do interesse público, sendo a prossecução da suspensão do acto suspendendo o único modo de evitar um grave prejuízos (..)
(..) devendo indicar expressamente os actos que se propõe praticar, só assim se permitindo que o particular saiba quais os actos que estão em causa e cuja declaração de ineficácia pode solicitar. (..) (12)
No caso dos autos foi emitida tempestivamente (artº 128º nº 1 CPTA) em 17.12.2008 resolução fundamentada pelo Vereador da Câmara Municipal de Lisboa, cujo teor integral foi levado ao probatório no item Y).
As razões ali expressas reconduzem-se in totum ao teor constante da Informação nº 0759/DJ/ DAJU/2008 que, por sua vez, consubstancia a fundamentação do despacho de 18.11.2008, pelo que regem aqui as mesmas razões de direito expostas supra quanto à constituição de direito de superfície em domínio privado do Município ora Recorrido e da não verificação da real ocorrência dos pressupostos do despacho, factor de invalidade do acto por violação de lei traduzida em erro de facto sobre os pressupostos.
O que tem por consequência a ineficácia dos actos praticados em razão da resolução emitida em 17.12.2008 pelo Vereador da Câmara Municipal de Lisboa.
Logra, assim, ganho de causa a questão trazida a recurso nos itens 8 a 15 das conclusões.

*
Chegados aqui e em síntese conclusiva, logra procedência o peticionado cautelar nos seguintes termos:
a) ineficácia dos actos de execução praticados ao abrigo da resolução fundamentada de 17.12.2008 emitida pelo Vereador do Pelouro do Ambiente e Espaços Verdes da Câmara Municipal de Lisboa;
b) suspensão de eficácia do despacho de 18.11.2008 emitido pelo Vereador do Pelouro do Ambiente e Espaços Verdes da Câmara Municipal de Lisboa e consequente cessação de prosseguir com a execução das diligências nele ordenadas nas alíneas a), b) e c) com reflexo material no terreno abrangido pelo direito de superfície em favor da sociedade A...– Parque Temático de Diversões, Lda. constituído por escritura pública de 16.06.1998;
c) intimação do Município de Lisboa para se abster de, sem prévia autorização do superficiário, sociedade A...– Parque Temático de Diversões, Lda., entrar novamente no terreno abrangido pelo direito de superfície constituído por escritura pública de 16.06.1998 e consequente abstenção da prática de actos, com expressão material na área do citado terreno, limitadores ou restritivos dos direitos desta na qualidade de superficiário.

Consequentemente, julga-se prejudicado o conhecimento do recurso do despacho intercalar de 09.02.2009, no tocante à substituição de testemunhas a apresentar pela parte, questão suscitada no item 1 das conclusões.


***


Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em revogar a sentença proferida e, na procedência do recurso,
a) Declarar a ineficácia dos actos de execução praticados ao abrigo da resolução fundamentada de 17.12.2008 emitida pelo Vereador do Pelouro do Ambiente e Espaços Verdes da Câmara Municipal de Lisboa;
b) Decretar a suspensão de eficácia do despacho de 18.11.2008 emitido pelo Vereador do Pelouro do Ambiente e Espaços Verdes da Câmara Municipal de Lisboa e consequente cessação de prosseguir com a execução das diligências nele ordenadas nas alíneas a), b) e c) com reflexo material no terreno abrangido pelo direito de superfície em favor da sociedade A...– Parque Temático de Diversões, Lda. constituído por escritura pública de 16.06.1998;
c) Intimar o Município de Lisboa para se abster de, sem prévia autorização do superficiário, sociedade A...– Parque Temático de Diversões, Lda., entrar novamente no terreno abrangido pelo direito de superfície constituído por escritura pública de 16.06.1998 e consequente abstenção da prática de actos, com expressão material na área do citado terreno, limitadores ou restritivos dos direitos do superficiário.

Custas a cargo do Recorrido.


Lisboa, 23.SET.2010,


(Cristina dos Santos)


(Teresa de Sousa)


(Coelho da Cunha)



1- Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, Vol. II, Almedina, 9ª ed. págs. 881/887 e 956; Bernardo Azevedo, Servidão de direito público, Coimbra Editora/2005 págs. 243/253.
2- Bernardo Azevedo, O domínio privado da Administração, Autor ed alii, Tratado de Direito Administrativo Especial, Vol III, Almedina/2010, págs. 30 e 38/45.
3- Marcello Caetano, Manual… Vol. II, Almedina, 9ª ed. págs. 962, 969 e 970.
4- António Pereira da Costa, Direito dos solos e da construção, Lições ao Curso de Direito do Urbanismo, 2007/08, CEDOUA - Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, págs.3/6.
5- Mota Pinto, Direitos Reais – prelecções ao 4º ano jurídico de 1970/1971, Almedina/1976, págs.290/294.
6- Mário Esteves de Oliveira, Lições de Direito Administrativo, Faculdade de Direito de Lisboa/1980, págs. 616/617 e 620/621.
7- Mário Esteves de Oliveira, Lições … págs. 446/451.
8- Pedro Machete, Conceito de instrução procedimental e relevância invalidante da preterição da audiência dos interessados CJA nº 12, pág. 17.
9- Ana Gouveia Martins, A tutela cautelar no contencioso administrativo – em especial nos procedimentos de formação dos contratos, Coimbra Editora/2005, pág.43 nota (40).
10- Mário Aroso de Almeida, Carlos Fernandes Cadilha, Comentário ao CPTA, Almedina, 2005, pág. 611.
11- Ana Gouveia Martins, A tutela cautelar no contencioso administrativo, Coimbra Editora/2005, págs. 516/518.
12 - Tiago Duarte, Providência cautelar e resolução fundamentada: The winner takes it all ?CJA nº 55 págs. 43/45.