Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1167/18.7BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:03/28/2019
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:NULIDADE EXCESSO PRONÚNCIA
ERRO NA FORMA DO PROCESSO
SUSPENSÃO EXECUÇÃO FISCAL
DISPENSA DE GARANTIA
ILEGALIDADE DA PENHORA
Sumário:I- Inexiste nulidade por omissão de pronúncia, quando em função da solução preconizada pelo Juiz do Tribunal a quo resulta prejudicada a análise do mérito da pretensão do Recorrente. A incorreta valoração de direito quanto à concreta possibilidade de convolação processual, a proceder, não determina nulidade da sentença por omissão de pronúncia, quando muito erro de julgamento.

II- O erro na forma do processo afere-se pela adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado. Se a sentença decidiu no sentido da verificação do erro na forma do processo socorrendo-se da causa de pedir e não do pedido, não fez uso do método adequado para efeitos da aferição do erro na forma do processo, não procedendo, assim, a impropriedade do meio processual.

III- A falta de fundamentação do despacho de reversão, porque concatenada com a legalidade do ato de reversão não é fundamento válido da reclamação, logo não pode determinar qualquer ilegalidade no ato reclamado, conduzindo, por isso, à sua improcedência;

IV- A nulidade da citação não pode ser sindicada no Tribunal sem antes ter sido previamente arguida junto do órgão da execução fiscal, e tem de ser arguida dentro do prazo para a dedução da oposição à execução fiscal, ou seja, trinta dias a contar da citação, em conformidade com o que dispõem os artigos 191.º, n.º 2, do CPC e 203.º, n.º 1, do CPPT;

V- Da interpretação conjugada dos normativos 169.º e 170.º do CPPT resulta que para efeitos de efetivação da suspensão da execução fiscal importa que o sujeito passivo interponha o competente meio de discussão da legalidade/inexigibilidade da dívida exequenda e esteja associada uma garantia idónea (199.º do CPPT) ou tenha o contribuinte sido dispensado da sua prestação (170.º do CPPT e 52.º da LGT);

VI- Embora seja possível apresentar um pedido de dispensa de prestação de garantia em momento temporal anterior à interposição do meio administrativo ou judicial de discussão da legalidade/exigibilidade da dívida exequenda, para ser passível de efetivação a suspensão da execução fiscal esse momento temporal anterior tem de ter sempre como norteador basilar o cumprimento do prazo legal da garantia contenciosa respetiva, in casu, de oposição.

VII- Para se poder equacionar uma, eventual, suspensão provisória da execução fiscal até à prolação de decisão do pedido de dispensa de prestação de garantia, com a virtualidade de poder invalidar uma subsequente penhora, é condição sine qua non a associação de contencioso para o efeito ou a possibilidade de ainda o poder interpor de acordo com os prazos legais consignados na lei.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACÓRDÃO

I-RELATÓRIO

BRUNO .............., com os demais sinais dos autos, veio interpor recurso dirigido a este Tribunal tendo por objeto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 08 de janeiro de 2019 através da qual julgou improcedente a reclamação de atos do órgão da execução deduzida em 12 de abril de 2018, relativamente ao ato de penhora de imóvel efetuada no âmbito do processo de execução fiscal nº .............................


O Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem:


“1. Ao abrigo da Reclamação Judicial cfr. art. 276.º e seguintes CPPT que foi oferecida aos autos em sede de primeira instância, veio o reclamante alegar a falta de fundamentação do despacho de reversão.


2. Não obstante, vem ora a ser vertido na douta sentença em crise, o entendimento de que, o meio processual adequado para invocar a falta de fundamentação do despacho de reversão era, não a reclamação judicial cfr. art. 276.º e seguintes CPPT, mas ao invés, a Oposição Judicial, cfr. art. 204.º e seguintes CPPT, verdade é que não assiste razão ao douto Tribunal a quo, quando utiliza tal fundamento, para não se pronunciar de mérito.


3. “(…) não deve esquecer-se que o erro na forma de processo (art. 193º do NCPC) há-de aferir-se pela adequação do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer e a ocorrência de tal erro [nulidade processual de conhecimento oficioso, que implica a anulação dos actos que não possam ser aproveitados, necessariamente dos que resulte uma diminuição das garantias do interessado, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime da forma processual adequada - cfr. o citado art. 193° do NCPC e os arts. 97°, nº 3 da LGT e 98°, nº 4 do CPPT)] determinará, em princípio, a convolação para a forma processual adequada, caso não seja manifesta a improcedência da pretensão formulada ou a intempestividade à face do meio processual idóneo. E o STA tem usado um «critério de grande flexibilidade na interpretação do pedido quando, em face das concretas causas de pedir invocadas, se possa intuir – ainda que com recurso à figura do pedido implícito – qual a verdadeira pretensão de tutela jurídica» (cfr. ac. de 5/2/2014, proc. 01803/13).”


4. Tal entendimento aposto no acervo jurisprudencial supra melhor identificado, demonstra claramente que mal andou o douto Tribunal a quo ao não ter procedido e determinado, ainda que oficiosamente, a que operasse a referida convolação.


5. Concluindo o mesmo com expressa aplicação ao caso concreto e para que dúvidas não existam que: “uma vez que o pedido dirigido ao órgão da execução fiscal, sendo alegadamente consequente da citação dos revertidos, é um pedido formulado num processo judicial, assim, carecendo de relevância, também, a invocação, neste concreto caso, da jurisprudência afirmada no acórdão do Pleno desta secção do STA, de 10/4/2013, no proc. nº 01159/12], sendo que a eventual preterição dos demais formalismos enumerados pela recorrente Fazenda Pública (as circunstâncias de o requerimento não ter sido articulado, não ter sido correctamente dirigido ao magistrado judicial, não se indicar o valor, não ter sido apresentado o comprovativo de pagamento de taxa de justiça) não obstaculiza tal convolação, já que o cumprimento desses formalismos sempre poderia ser apreciado, consoante o caso, pelo Tribunal Tributário da 1ª instância, nos termos do art. 208° nº 1 do CPPT, ou pela secretaria do mesmo TT, nos termos dos arts. 80° do CPTA e 558º a 560° do CPC, aplicáveis subsidiariamente.”.


6. Tal adequação – ainda que errónea – por parte do douto Tribunal, conduz a duas conclusões inevitáveis: Em primeiro lugar, consta-se que a mesma se encontra ferida de nulidade, porquanto deveria ter operado à convolação oficiosa, para o meio processual adequado e não o fez e, consequentemente, em segundo lugar, ao não ter promovido a convolação oficiosa, deixou de se pronunciar de mérito sobre a mesma, existindo nulidade da sentença em crise por omissão de pronúncia, que, também assim, deve este douto Tribunal superior determinar a revogação da sentença ora em crise, tudo em estrita conformidade com a tão douta e costumada JUSTIÇA!


7. Não logra o recorrente entender o alcance da expressão “tendo a presente reclamação, contendo a arguição da nulidade da citação, sido apresentada apenas em 12.04.2018, sanou-se tal nulidade”, porquanto, é entendimento do douto Tribunal a quo de que o recorrente tendo oferecido peça processual em que procura obter tutela de mérito sobre a sua pretensão dá por sanado o vício invocado ou, por considerar extemporânea a peça processual, a questão invocada não carece sequer douta decisão de mérito sobre a mesma.


8. Independentemente de qual o entendimento sufragado pelo douto Tribunal ou bem assim, mesmo que o entendimento sufragado pelo douto Tribunal a quo fosse ambos, não deixa o mesmo de estar a laborar em erro.


9. É que na verdade, a matéria que se encontra alegada na peça processual diz respeito a invocada nulidade de citação, por vício de violação de lei, encerra em si o desvalor de nulidade total, invocável a todo o tempo, de carácter e conhecimento oficioso.


10. Assim e na verdade, não assiste qualquer razão ao douto Tribunal a quo, para não se pronunciar sobre a questão que lhe é trazida para decisão de mérito, pelo que sempre a peça processual deverá ser considerada oportuna e tempestiva, na estrita medida em que versa a mesma sobre nulidades invocáveis a todo o tempo e de conhecimento oficioso.


11. Cumpre também ainda esclarecer, em bom abono da douta aplicação da JUSTIÇA que o reclamante não tinha de apresentar nenhum requerimento prévio ao douto Serviço de Finanças a invocar a nulidade, porquanto sendo a mesma invocada em sede de Reclamação Judicial cfr. art. 276.º CPPT, determina a Lei que o douto Serviço de Finanças se inteire do teor da mesma e, reconhecendo-lhe mérito, que actue em conformidade.


12. Decidindo fazê-lo, deverão então o douto Serviço de Finanças notificar o contribuinte reclamante das alterações assumidas e, se ainda assim, o mesmo pretende ou não a ulterior tramitação processual da reclamação judicial, aqui cabendo então ao reclamante o ónus de dar ou não impulso à reclamação judicial ou, aceitar as alterações efectuadas pelo Serviço de Finanças.


13. Na esteira deste entendimento, mal andou o douto Tribunal a quo e que, por esta mesma razão, deve a sentença em crise ser revogada e substituída por outra que a julgue em conformidade e sobre a mesma se pronuncie de mérito, pois que na verdade, mais acresce que,


14. Sendo a douta decisão em crise, uma vez mais, omissa de Direito quanto à questão que o reclamante pretendia ver judicialmente acautelada – nulidade de citação – e, uma vez mais, não tendo existido pronúncia de mérito alguma sobre a questão que de Direito é colocada perante o douto Tribunal a quo, não podemos deixar de estar perante uma nulidade da sentença ora em crise, por flagrante omissão do dever de pronúncia, tudo que desde já se requer em estrita conformidade com a tão douta e costumada JUSTIÇA!


15. In fine, não se pode olvidar que, tanto quanto é do conhecimento do recorrente, nem o douto Tribunal a quo nem o douto Serviço de Finanças detém de poderes de adivinhação ou beneficia de juízos de prognose póstuma pelo que, apenas na data da sentença ora em crise, veio o douto Tribunal a quo, determinar a extemporaneidade da reclamação, sem prescindir de que a mesma não transitou sequer em julgado, pois que é objecto do presente recurso.


16. Assim sendo, a conclusão é por demais nefasta e desproporcionada de qualquer razão, na estrita medida, nunca o fundamento de uma alegada extemporaneidade pode legitimar que em momento EM MUITO ANTERIOR a tal conhecimento de mérito, se indeferia uma isenção de prestação de garantia no fundamento de um facto que só se verifica em MUITO TEMPO depois.


17. Termos em que mal andou a douta sentença proferida, ao abrigo do supra exposto e, por esta mesma razão, mais impõe a douta aplicação da JUSTIÇA, que este douto Tribunal superior determine a procedência por provada do presente recurso, culminando a mesma, com a determinação de revogação da sentença ora em crise, o que se requer, pois que qualquer outro entendimento não pode deixar de representar uma violação do direito de acesso à JUSTIÇA melhor consagrado na Lei Fundamental, ao abrigo do previsto nos artigos 12º, 13º, 18º, 20º, 202º e 203º todos da Lei Fundamental.


18. Termos em que com os mais de Direito doutamente supridos por V.ª Ex.ª, perante a fundamentação supra exposta, mais se requer a procedência por provado do presente recurso, assim dignificando a tão douta e costumada JUSTIÇA!”



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Não foram produzidas contra-alegações.



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O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao presente recurso.



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Com dispensa de vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, vêm os autos à conferência para decisão.



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II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

A) A sociedade “G............................ – Sucursal em Portugal” foi inscrita na Conservatória do Registo Comercial R.N.P.C. pela ap. .../.........., constando como sua representada a sociedade “G............................”, com sede em Gibraltar, sociedade constituída de acordo com a Lei de Gibraltar pelo Dr. J..............., na qualidade de procurador, que presidiu à Assembleia Geral que originou a Acta nº 24 de 28.10.2015 que deliberou a constituição de uma sucursal em Portugal (cfr. fls. 79 a 89 do documento registado no SITAF sob o nº 006434280).

B) Em 25.06.2016 foi instaurado no Serviço de Finanças de Lisboa …, contra “G............................ – Sucursal em Portugal”, o processo de execução fiscal nº ............................, por dívidas de IRS do ano de 2016 no montante de 12.667,00€ (cfr. fls. 1 a 3 do documento registado no SITAF sob o nº 006434277).

C) Posteriormente à data referida na alínea antecedente, foram apensados ao PEF também ali referido outros doze processo de execução, instaurados em 2016 e 2017, passando a dívida exequenda a perfazer o montante de 381.541,51€ (cfr. fls. 4 do documento registado no SITAF sob o nº 006434277).

D) Em 28.11.2017 foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa … a determinar a preparação do processo de execução nº ............................ e apensos para efeitos de reversão contra o Reclamante (cfr. fls. 104 e 105 do documento registado no SITAF sob o nº 006434283).

E) Por requerimento apresentado em 14.12.2017 o ora Reclamante apresentou o seu direito de audição prévia à reversão (cfr. fls. 1 a 17 do documento registado no SITAF sob o nº 006434285).

F) Em 22.01.2018 foi proferido despacho definitivo de reversão contra o ora Reclamante (cfr. fls. 1 a 6 do documento registado no SITAF sob o nº 006434288).

G) Através do ofício remetido por carta registada com aviso de receção, foi enviada ao Oponente a citação com o seguinte teor:


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H) O ofício de citação referido na alínea antecedente foi rececionado em 25.01.2018 por terceira pessoa (cfr. fls. 29 do documento registado no SITAF sob o nº 006434288).

I) Em 01.03.2018, pelas 21:29h, o Reclamante apresentou via email, junto do Serviço de Finanças de Lisboa …, requerimento com o seguinte teor:


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(cfr. fls. 2511 a 2513 dos autos – numeração do SITAF).

J) Em 08.03.2018 foi proferido despacho para efetivação da penhora da fração designada pela letra “B”, do prédio inscrito sob o artigo ..........º da freguesia ............................, concelho de Almada, propriedade do Reclamante, com o VPT de 194.720,00€ (acordo quanto ao VPT e cfr. fls. 2 do documento registado no SITAF sob o nº 006504316).

K) Em 15.03.2018 deu entrada no SF de Lisboa …, via email, requerimento apresentado pelo mandatário do Reclamante, Dr. J ..............., com o seguinte teor:


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“e que se fazia acompanhar da declaração de IRS do ano de 2016 do Reclamante (cfr. fls. 1 a 3 do documento registado no SITAF sob o nº 06434303).

L) Através do ofício nº 3524 de 27.03.2018, foi o mandatário do Reclamante notificado para aperfeiçoar o requerimento referido na alínea antecedente, tendo aquele ofício o seguinte teor:


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(cfr. fls. 8 do documento registado no SITAF sob o nº 006434303).


M) O Reclamante foi notificado da penhora referida em J), e da sua nomeação como fiel depositário, em 02.04.2018 (cfr. fls. 3 e 4 do documento registado no SITAF sob o nº 006504316).

N) Em 12.04.2018 o Reclamante apresentou junto do SF de Lisboa … a presente reclamação e petição de oposição à execução fiscal identificada em B) (cfr. fls. 4 e 2527 e ss. dos autos – numeração do SITAF).

O) A oposição referida na alínea antecedente foi recusada pela Secretaria do Tribunal Tributário de Lisboa e notificada a recusa ao mandatário do Reclamante por ofício de 18.06.2018 (cfr. fls. 9 do documento registado no SITAF sob o nº 006504316).



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III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO


In casu, o Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a reclamação deduzida contra o ato de penhora de imóvel concretizada no âmbito do processo de execução fiscal nº .............................


Cumpre, desde já, relevar em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, que as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.


Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre começar por analisar se a sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia, em caso negativo cumpre aferir se padece de erro de julgamento de direito quanto à apreciação das questões relacionadas com a falta de fundamentação do despacho de reversão, com a nulidade da citação e com a inexistência de causa suspensiva da execução fiscal.


Comecemos pela nulidade por omissão de pronúncia.


O Recorrente no ponto 6 das conclusões das alegações de recurso argui a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, sustentando para o efeito que “[a]o não ter promovido a convolação oficiosa, deixou de se pronunciar de mérito sobre a mesma, existindo nulidade da sentença em crise por omissão de pronúncia” mais arguindo no ponto 14 que “sendo a douta decisão em crise, uma vez mais, omissa de Direito quanto à questão que o reclamante pretendia ver judicialmente acautelada-nulidade da citação- e uma vez mais, não tendo existido pronúncia de mérito sobre a questão que de Direito é colocada perante o douto Tribunal a quo, não podemos deixar de estar perante uma nulidade da sentença ora em crise, por flagrante omissão do dever de pronúncia”.


Vejamos, então, se lhe assiste razão.


De harmonia com o disposto na primeira parte da alínea d), do nº 1, do artigo 615.º do CPC, a sentença é nula, quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.


Na verdade, a nulidade da decisão por omissão de pronúncia apenas acontece quando a sentença deixe de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra questão submetida à apreciação do Tribunal(1).


Dir-se-á, neste particular e em abono da verdade que, as questões submetidas à apreciação do tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio. De notar para o efeito que, as questões não são passíveis de qualquer confusão conceptual com as razões jurídicas invocadas pelas partes em defesa do seu juízo de valoração, porquanto as mesmas correspondem a simples argumentos e não constituem questões na dimensão valorativa preceituada no citado normativo 615.º, nº 1, alínea d), do CPC.


Conforme doutrinado por Alberto dos Reis(2) “[s]ão, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão”.


No caso vertente, não se verifica qualquer nulidade por omissão de pronúncia uma vez que o Juiz do Tribunal a quo analisou todas as questões que lhe foram colocadas pelo Reclamante, é certo que não se pronunciou, entenda-se de mérito, quanto à falta de fundamentação do despacho de reversão e bem assim quanto à concreta verificação da nulidade da citação, mas a verdade é que não o fez, e bem, porque a decisão de tais questões ficou prejudicada pela solução encontrada para dirimir as mesmas.


Expliquemos, com pormenor, porque assim o entendemos.


No concernente à falta de fundamentação do despacho de reversão foi entendido na decisão recorrida que a questão não podia ser objeto de discussão na presente reclamação sendo o meio processual idóneo para analisar a questão o processo de oposição à execução fiscal. No respeitante à nulidade da citação, o Juiz do Tribunal a quo entendeu que a mesma carecia de ser previamente arguida pelo interessado junto do órgão da execução fiscal só podendo, ulteriormente e após decisão do órgão competente, ser apreciada jurisdicionalmente no âmbito de uma reclamação nos termos do artigo 276.º. Mais evidenciando que, de todo o modo, sempre a mesma já se encontraria sanada.


Ora, como é bom de ver, o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo não incorreu em qualquer nulidade por omissão de pronúncia, uma vez que de acordo com a solução por si preconizada resulta prejudicada a análise do mérito da pretensão do Recorrente. É certo que, na esteira de razão do Recorrente, poderá o entendimento do Tribunal a quo padecer de alguma incorreta valoração de direito, mormente quanto à concreta possibilidade de convolação processual mas a verdade é que mesmo procedendo tal entendimento tal não determina nulidade da sentença por omissão de pronúncia, quando muito erro de julgamento.


Em face do exposto, e sem necessidade de mais considerações improcede a arguida nulidade por omissão de pronúncia.


Aqui chegados, cumpre aferir se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito, competindo, assim, aquilatar se o Tribunal a quo, interpretou erradamente os pressupostos de direito, aferindo, desde logo, se existe impropriedade do meio processual quanto à falta de fundamentação do despacho de reversão. Mais importando analisar se o Juiz do Tribunal a quo estava legalmente vinculado a determinar a competente convolação processual, conforme argui o Recorrente.


No concernente à nulidade da citação importa analisar se a mesma pode ser objeto de conhecimento no processo de reclamação ao abrigo do artigo 276.º sem ser previamente arguida junto do órgão da execução fiscal, conforme decidido pelo Tribunal a quo. Aquilatando, outrossim, da questão da sanação da nulidade da citação.


In fine, ter-se-á de aferir se o Tribunal a quo analisou corretamente a ilegalidade da penhora por não se verificar uma causa suspensiva da execução fiscal.


Vejamos, então, se assiste razão ao Recorrente.


Atentemos, primeiramente, na questão relacionada com a falta de fundamentação do despacho de reversão.


O Recorrente alega, neste particular, convocando jurisprudência que reputa aplicável para o caso sub judice, que o erro na forma de processo ter-se-á de aferir pela adequação do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer e a ocorrência de tal erro determinará, em princípio, a convolação para a forma processual adequada, caso não seja manifesta a improcedência da pretensão formulada ou a intempestividade à face do meio processual idóneo.


Densifica, para o efeito, que a assunção da impropriedade da reclamação para o conhecimento do vício da falta de fundamentação do despacho de reversão se encontra ferida de nulidade, porquanto deveria ter decretado a competente convolação processual.


Para analisar da justeza da pretensão do Recorrente, atentemos qual o discurso fundamentador da decisão do Tribunal a quo.


Sustenta o mesmo que: “No que concerne à invocada falta de fundamentação do despacho de reversão, encontra-se hoje assente na jurisprudência do STA, que é a oposição o meio processual adequado para reagir contra o ato de reversão proferido em processo de execução fiscal com fundamento na falta de pressupostos, de legitimidade, da fundamentação ou outros vícios que o afetem”.


Amparando-se em entendimentos doutrinais e jurisprudenciais que reputou aplicáveis ao caso vertente, julgou que “[s]endo este o entendimento da mais recente jurisprudência e da doutrina citadas, é de concluir será apenas possível conhecer em sede de oposição do vício de falta de fundamentação do despacho de reversão invocado pelo Reclamante na sua p.i., pelo que, procede a invocada exceção de impropriedade da Reclamação para conhecimento deste vício”.


Apreciando.


O erro na forma do processo afere-se pela adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado(3). Porquanto, se o pedido formulado pelo autor não se ajusta à finalidade abstratamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre o erro na forma do processo(4). Logo, para se aferir da existência ou não de erro na forma de processo, cumpre atentar no pedido que foi formulado e na concreta pretensão de tutela jurisdicional servindo de elemento coadjuvante a causa de pedir invocada(5).


Vejamos, então, qual o pedido constante na petição inicial de reclamação de atos do órgão da execução fiscal sob recurso. Para o efeito transcreva-se o seu teor: “Termos em que, com os mais de direito doutamente supridos seja a presente reclamação dada por provada e procedente, em estrito cumprimento da tão acostumada e douta JUSTIÇA!”

Pese embora o pedido final não se coadune, expressamente, com a anulação do ato reclamado -o qual seria o pedido consentâneo e adequado com a reclamação de atos do órgão da execução fiscal, pois do teor do artigo 276.º do CPPT resulta que, por um lado, o objeto da reclamação é a decisão proferida pelo órgão da execução fiscal e por outro lado, que se destina a obter a anulação dessa mesma decisão praticada pelo órgão da execução fiscal- por a mesma padecer de ilegalidades(6), a verdade é que do contexto de toda a petição inicial se deduz, de forma inequívoca, que o Reclamante sindica o ato de penhora visando a sua eliminação da ordem jurídica. Infere-se, assim, que pretende que o mesmo seja cominado com a anulabilidade.

É certo que, na senda do aliás defendido pelo Recorrente, a jurisprudência tem vindo a adotar uma posição de grande flexibilidade na interpretação do pedido quando, em face das concretas causas de pedir invocadas, se possa intuir – ainda que com recurso à figura do pedido implícito – qual a verdadeira pretensão de tutela jurídica, mas a verdade é que tal não autoriza que para se aferir da verificação da exceção do erro na forma do processo, se substitua o pedido, enquanto elemento determinante para apurar a propriedade processual, pela causa de pedir.

Feito este enquadramento, ainda que, como veremos, nada afete no sentido da decisão final, o certo é que não existe uma verdadeira impropriedade do meio processual, visto que o pedido realizado na p.i. é adequado para a presente forma processual. Com efeito, a sentença decidiu no sentido da verificação do erro na forma do processo, porém, fê-lo socorrendo-se da causa de pedir e não do pedido, razão pela qual não fez uso do método adequado para efeitos da aferição do erro na forma do processo.

Ora, aquiescendo pela inexistência da impropriedade processual linear se torna a resposta à outra questão sindicada pelo Recorrente, a saber da concreta vinculação à convolação processual e isto porque inexistindo uma verdadeira impropriedade do meio processual, não estava o julgador adstrito a aquilatar e ordenar qualquer convolação processual.

De todo o modo, sempre se dirá que mesmo que se entendesse que a questão entroncava com a impropriedade do meio processual, a verdade é que sempre existiria uma questão de erro na forma processual parcial que nunca poderia determinar a convolação para a forma processual idónea.

Clarifiquemos este entendimento.

Com efeito, “[o]correndo erro na forma do processo, constitui um poder/dever vinculado do juiz a convolação do processo na forma processual adequada (artigos 98.º n.º 4 do CPPT e 97.º nº 3 da LGT), que somente pode ser afastado quando a convolação se mostre inviável perante a inidoneidade da petição inicial, a manifesta improcedência da pretensão ou a extemporaneidade da petição em função do meio processual adequado”(7), mas a verdade é que em situações de erro na forma do processo parcial essa vinculação não existe, nem pode existir.


Conforme doutrina Jorge Lopes de Sousa(8) “Nos casos em que tenha sido efectuada cumulação de pedidos e a forma do processo seja adequada à apreciação apenas de um deles, não poderá haver correcção da forma de processo quanto aos processos para os quais a forma de processo é inadequada, pois o processo tem de seguir a forma escolhida pelo interessado relativamente à apreciação do pedido para que essa forma de processo é adequada.


Nestes casos, a solução que se extrai do tratamento dado a uma questão paralela no n.º 4 do art. 193.º do CPC, é a de considerar sem efeito o pedido ou pedidos para o qual o processo não é adequada, seguindo o processo apenas para apreciação do pedido que deva ser apreciado em processo do tipo escolhido pelo interessado.


Essa consequência é uma aplicação da regra do art. 199.º do CPC, segunda a qual, no caso de erro na forma de processo, é nulo todo o processado que não puder aproveitar-se para a tramitação de acordo com a forma estabelecida na lei. Nesses casos de erro parcial da forma de processo, como este tem de prosseguir para apreciação do pedido para que é adequado, a consequência relativamente ao outro pedido será a de nulidade parcial do processo, na parte a ele respeitante, o que se reconduz a que o processo prossiga como se esse pedido não tivesse sido efectuado”.

É, então, por demais evidente que não estava o Juiz do Tribunal a quo, obrigado a aferir/ordenar qualquer convolação processual, inexistindo, assim, qualquer erro de julgamento nesse âmbito.

Aqui chegados, subsiste uma questão, a saber, inexistindo erro na forma do processo, como aquilatar da correspondente cominação. Para responder à questão socorramo-nos do teor do Aresto do STA, proferido no âmbito do processo nº 01086/13, com data de 28 de maio de 2014, segundo o qual “as causas de pedir aduzidas podem ou não suportar esse pedido é matéria que se situa no âmbito da procedência. Por isso, com o fundamento de que as causas de pedir invocadas não são adequadas ao pedido formulado poderá decidir-se no sentido da improcedência da acção (eventualmente, até do indeferimento liminar da petição inicial), mas não no sentido da verificação do erro na forma do processo.”

Assim, não obstante se ter concluído que inexiste erro na forma do processo, a verdade é que a causa de pedir da alegada falta de fundamentação do despacho de reversão, porque concatenada com a legalidade do ato de reversão não é fundamento válido da presente reclamação, por não poder determinar qualquer ilegalidade no ato reclamado, conduzindo, por isso, à sua improcedência.

Dito de outro modo, a falta de fundamentação do despacho de reversão visa apenas, em caso de procedência da aludida ilegalidade, anular o ato de reversão, não podendo, como é bom de ver, acarretar a anulabilidade de um ato de penhora.

Em face do exposto, e sem necessidade de mais considerandos, improcede a alegada falta de fundamentação do despacho de reversão enquanto fundamento válido capaz de determinar a anulabilidade do ato reclamado.


Vejamos, ora, a questão da nulidade da citação.


O Recorrente começa por evidenciar que não perceciona o alcance da expressão “tendo a presente reclamação, contendo a arguição da nulidade da citação, sido apresentada apenas em 12.04.2018, sanou-se tal nulidade”.


Mais sustenta, neste particular, que a matéria da nulidade de citação, por vício de violação de lei, encerra em si o desvalor de nulidade total, sendo, por isso, invocável a todo o tempo, de caráter e conhecimento oficioso, pelo que sempre a peça processual deverá ser considerada oportuna e tempestiva, na estrita medida em que versa a mesma sobre nulidades invocáveis a todo o tempo e de conhecimento oficioso.


Sufragando, ainda, que o Reclamante não tinha de apresentar nenhum requerimento prévio ao serviço de finanças a invocar a nulidade, porquanto sendo a mesma invocada em sede de Reclamação judicial do 276.º do CPPT tal determina que o douto Serviço de Finanças se inteire do teor da mesma e, reconhecendo-lhe mérito, que atue em conformidade.


Comecemos por aferir da prévia necessidade de interpelação da nulidade da citação junto do órgão da execução fiscal.


O Tribunal a quo, neste âmbito, decidiu que “ A nulidade da citação carece de ser arguida pelo interessado no próprio processo executivo, através de requerimento dirigido ao órgão da execução fiscal, no prazo da oposição, conforme determina o artigo 198º, nº 2, do Código do Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT, cabendo, então, posterior reclamação do ato do chefe, nos termos do artigo 276º do CPPT (cfr. acórdãos do STA de 10.03.2011, Proc. nº 042/11, e do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do mesmo STA de 19.09.2012, proferido no processo nº 1075/11)”, e a verdade é que tal entendimento não merece qualquer censura, por corresponder à letra e ao espírito do legislador estando, de resto, de harmonia com a Jurisprudência dos Tribunais Superiores, aliás na senda do invocado, e bem, pelo Juiz do Tribunal a quo.


De facto, a nulidade da citação não pode ser sindicada no Tribunal sem antes ter sido previamente arguida junto do órgão da execução fiscal, sendo que só após existir decisão expressa é que poderá existir controlo jurisdicional do ato mediante interposição de reclamação ao abrigo do artigo 276.º do CPPT.


“A nulidade da citação consubstancia uma nulidade do processo executivo, e as nulidades devem ser invocadas e apreciadas no processo em que ocorreram, tendo em vista a sua sanação e o prosseguimento do processo.(9)”


E não assiste, igualmente, razão ao Recorrente quando invoca que a nulidade da citação encerra em si o desvalor de nulidade total, sendo, por isso, invocável a todo o tempo, desde logo, porque a nulidade da citação ao contrário da falta de citação está sujeita a um prazo perentório de arguição.


Com efeito, a falta de citação em processo de execução fiscal só ocorre se se verificar uma situação enquadrável nas alíneas a) a e) do n.º 1 do artigo 188.º do CPC e desde que o respetivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do ato, por motivo que lhe não foi imputável, conforme dimana da letra do artigo 190.º, n.º 6, do CPPT.


Por seu turno, a nulidade de citação em processo de execução fiscal ocorre quando a citação tenha sido efetuada, mas não tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr. artigo 191.º, nº1, do CPC). Sendo certo que só a falta de citação, e não também a nulidade de citação, é subsumível na alínea a) do n.º 1 do artigo 165.º do CPPT e, por isso, só aquela pode constituir nulidade insanável do processo de execução fiscal, invocável a todo o tempo até ao trânsito em julgado da decisão final, se a falta prejudicar a defesa do citado.


Dir-se-á, portanto, que a nulidade da citação deve ser arguida dentro do prazo para a dedução da oposição à execução fiscal, ou seja, trinta dias a contar da citação, em conformidade com o que dispõem os artigos 191.º, n.º 2, do CPC e 203.º, n.º 1, do CPPT(10).


Quanto ao concreto cômputo do prazo, tendo o processo de execução fiscal natureza judicial, conforme decorre do artigo 103.º, n.º 1, da LGT, o prazo para a prática de qualquer ato no seu âmbito, neles se incluindo, necessariamente, a arguição da nulidade da citação conta-se no termos do CPC, conforme consigna o artigo 20.º, n.º 2, do CPPT. Ou seja, nos termos do disposto no artigo 138.º, n.ºs 1, 2 e 3, do CPC, o prazo corre continuamente, mas suspende-se em férias judiciais, transferindo-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia que os tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto(11).


O Tribunal a quo após, inequivocamente, ter evidenciado a necessidade prévia de arguição da nulidade da citação junto do órgão da execução fiscal e relevar que no caso vertente o Recorrente não apresentou qualquer requerimento nesse e para esse efeito, numa ótica de sustentação adicional do seu íter volitivo e inclusive para cotejar do dies ad quem da oposição, relevante para a presente lide, refere que, “mesmo que o tivesse feito, sempre se concluiria que tal arguição se mostraria intempestiva à face do que dispõe o supra referido artigo 198º, nº 2 do CPC. “


Concretizando, depois, com apelo à factualidade assente, sublinhe-se não impugnada, que: “Constata-se, assim, que, tendo a citação ocorrido em 25.01.2018, a dilação de cinco dias terminou em 30.01.2018, terminando o prazo de oposição no dia 01.03.2018, dia útil, sendo que o Oponente podia ainda praticar o ato nos três dias úteis seguintes, mediante o pagamento de uma multa, de acordo com o artigo 139º, nº 5, do CPC, terminando o referido terceiro dia útil em 06.03.2018.”


Concluindo, a final, que “consequentemente, tendo a presente reclamação, contendo a arguição da nulidade da citação, sido apresentada apenas em 12.04.2018, sanou-se tal nulidade, deixando a mesma de poder ser apreciada, sendo, consequentemente, de improceder a reclamação também nesta parte.”


Ora, examinado o raciocínio seguido pelo Tribunal a quo, não se vislumbra que o mesmo esteja inquinado de qualquer erro, por o mesmo ter computado corretamente o dies ad quem da oposição, e acertadamente equacionado da competente sanação da nulidade da citação.


Mais importa sublinhar, in fine, que, contrariamente ao sustentado pelo Recorrente, é perfeitamente percetível e inteligível a afirmação de que “tendo a presente reclamação, contendo a arguição da nulidade da citação, sido apresentada apenas em 12.04.2018, sanou-se tal nulidade”. Aliás, tanto assim o é que o Recorrente a contraditou nas presentes alegações de recurso.


Improcede, assim, o arguido erro de julgamento de direito.


Resta, então, apreciar se a penhora reclamada se mostra ilegal por se verificar uma causa suspensiva da execução fiscal, in casu, a existência de um pedido de dispensa de prestação de garantia.


O Recorrente alega que “nem o douto Tribunal a quo nem o douto Serviço de Finanças detém de poderes de adivinhação ou beneficia de juízos de prognose póstuma pelo que, apenas na data da sentença ora em crise, veio o douto Tribunal a quo, determinar a extemporaneidade da reclamação, sem prescindir de que a mesma não transitou sequer em julgado, pois que é objecto do presente recurso.”


Concluindo, assim, que “é por demais nefasta e desproporcionada de qualquer razão, na estrita medida, nunca o fundamento de uma alegada extemporaneidade pode legitimar que em momento EM MUITO ANTERIOR a tal conhecimento de mérito, se indeferia uma isenção de prestação de garantia no fundamento de um facto que só se verifica em MUITO TEMPO depois.”


Importa, desde já, referir que não se aquiesce o alcance da alegação da extemporaneidade da reclamação, visto que o Tribunal a quo não julgou verificada qualquer exceção da caducidade do direito de ação nada mencionando no sentido da sua extemporaneidade.


Na verdade, o Tribunal a quo convocando o artigo 169.º do CPPT e bem assim o normativo 170.º do CPPT ajuíza que “[c]omo resulta da matéria dada como assente, o Reclamante apresentou o pedido de dispensa de prestação de garantia sem que tivesse ainda apresentado oposição na qual colocasse em causa a exigibilidade da dívida em execução, tendo apresentado tal oposição apenas em 12.04.2018, muito depois de ter terminado o prazo legal para a sua apresentação, pelo que a penhora efetuada quando já não era possível a apresentação de oposição (ou seja, em 08.03.2018) e notificada em 02.04.2018 é perfeitamente legal.”


Sublinhando, adicionalmente, de forma a reforçar a improcedência da posição sustentada pelo Recorrente que “Por outro lado, como resulta dos autos e da consulta ao SITAF, a oposição apresentada foi recusada pelo Tribunal Tributário de Lisboa, pelo que não existe qualquer contencioso associado à execução fiscal (ou seja, oposição à execução) que possa sustentar a suspensão da execução por via da apresentação de garantia ou da sua dispensa, sendo que, como já referimos supra, a oposição foi apresentada muito para além do prazo legal, nunca podendo, por isso, justificar a suspensão da execução.”


Vejamos, então, se existe o alegado erro de julgamento quanto à falta de suspensão da execução fiscal.


Conforme preceitua o artigo 88.º, nºs 1 e 5 do CPPT, decorrido o prazo de pagamento voluntário sem que a dívida tributária liquidada seja paga, é extraída certidão da dívida, que tem a função de título executivo para efeitos de execução fiscal.


A regra em direito tributário é da execução imediata dos atos tributários, ou seja, logo que recebido o título executivo, o órgão periférico local deverá instaurar a execução no prazo de 24 horas, efetuando o competente registo e ordenando a citação do executado (art. 188.º, n.º 1, do CPPT).


Porquanto, instaurada a execução a sua suspensão apenas pode ser efetuada nos casos previstos na lei (art. 85.º, n.º 3, do CPPT).


De harmonia com o disposto no artigo 169.º do CPPT, sob a epígrafe de “Suspensão da execução. Garantias.”

“1 - A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objeto a legalidade da dívida exequenda, bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem 90/436/CEE, de 23 de julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados-Membros, ou de convenção para evitar a dupla tributação, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que deve ser informado no processo pelo funcionário competente.
2 - A execução fica igualmente suspensa, desde que, após o termo do prazo de pagamento voluntário, seja prestada garantia antes da apresentação do meio gracioso ou judicial correspondente, acompanhada de requerimento em que conste a natureza da dívida, o período a que respeita e a entidade que praticou o ato, bem como a indicação da intenção de apresentar meio gracioso ou judicial para discussão da legalidade ou da exigibilidade da dívida exequenda.
3 - O requerimento a que se refere o número anterior dá início a um procedimento, que é extinto se, no prazo legal, não for apresentado o correspondente meio processual e comunicado esse facto ao órgão competente para a execução.
4 - Extinto o procedimento referido no número anterior, aplica-se o disposto no n.º 2 do artigo 200.º
(…)
7 - Caso no prazo de 15 dias, a contar da apresentação de qualquer dos meios de reação previstos neste artigo, não tenha sido apresentada garantia idónea ou requerida a sua dispensa, procede-se de imediato à penhora.
(…)
10 - Se for apresentada oposição à execução, aplica-se o disposto nos n.os 1 a 7.”

Por seu turno, o artigo 170.º do CPPT, nº 1, do CPPT, relativamente ao procedimento de dispensa de prestação de garantia estatui que:

“1 - Quando a garantia possa ser dispensada nos termos previstos na lei, deve o executado requerer a dispensa ao órgão da execução fiscal no prazo de 15 dias a contar da apresentação de meio de reação previsto no artigo anterior.
2 - Caso o fundamento da dispensa da garantia seja superveniente ao termo daquele prazo, deve a dispensa ser requerida no prazo de 30 dias após a sua ocorrência.
3 - O pedido a dirigir ao órgão da execução fiscal deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária.
4 - O pedido de dispensa de garantia será resolvido no prazo de 10 dias após a sua apresentação.”

Da interpretação conjugada dos aludidos normativos resulta que para efeitos de efetivação da suspensão da execução fiscal importa que, por um lado, o sujeito passivo interponha o competente meio de discussão da legalidade/inexigibilidade da dívida exequenda e esteja associada uma garantia idónea (199.º do CPPT) ou tenha o contribuinte sido dispensado da sua prestação (170.º do CPPT e 52.º da LGT).


No caso vertente, o Recorrente entende que como apresentou um pedido de dispensa de prestação de garantia a execução fiscal deveria ter sido suspensa, sendo, por isso, ilegal a competente penhora.


Mas para se aquilatar da bondade da sua pretensão importa ter presente os respetivos prazos legais para se requerer a aludida dispensa de prestação concatenado com o da interposição da competente oposição judicial.


Do teor do citado normativo 170.º, nº1, do CPPT, resulta inequívoco que o pedido de dispensa de prestação de garantia deve ser apresentado no prazo de quinze dias, tendo como termo inicial a data da apresentação de meio gracioso ou judicial tendente à discussão da legalidade ou da exigibilidade da dívida exequenda.


No caso vertente, como visto, o Recorrente apresentou o pedido de dispensa de prestação de garantia, em 01 de março de 2018, ou seja, no último do prazo para interposição da oposição à execução fiscal(12) sendo que a oposição à execução fiscal só foi deduzida em 12 de abril de 2018, pelo que, desde logo, falhava um dos pressupostos objetivos para a suspensão da execução fiscal.


Note-se que com tal afirmação não se está a dizer que não é possível apresentar um pedido de dispensa de prestação de garantia em momento temporal anterior à interposição do meio administrativo ou judicial de discussão da legalidade/exigibilidade da dívida exequenda, desde logo, pelo princípio geral de que os prazos, em regra, não podendo ser excedidos podem ser antecipados. O que, em rigor, se está a dizer é que para ser passível de efetivação a suspensão da execução fiscal esse momento temporal anterior tem de ter sempre como norteador basilar o cumprimento do prazo legal da garantia contenciosa respetiva, in casu, de oposição.


De sublinhar, neste particular, que para se poder equacionar uma, eventual, suspensão provisória da execução fiscal até à prolação de decisão do mesmo, com a virtualidade de poder invalidar uma subsequente penhora, sempre seria condição sine qua non a associação de contencioso para o efeito ou a possibilidade de ainda o poder interpor de acordo com os prazos legais consignados na lei. O que, como visto, não sucede, in casu.


Adicionalmente, não pode o Tribunal perder de vista o que resulta do acervo probatório dos autos, concretamente, das alíneas I), J), L), M) e N).


Concretizando.


Da alínea I) da factualidade assente, consta, como já devidamente evidenciado, que o Recorrente apresentou pedido de dispensa de prestação de garantia, no qual expressamente indica no seu artigo 1.º que: “O ora requerente, veio já oferecer aos autos a competente, oportuna e tempestiva oposição judicial, cfr. art. 204.º CPPT, cfr. certamente melhor consta e é do conhecimento deste douto Serviço de Finanças”.


O que, da conjugação da alínea N) da factualidade assente, permite inferir que não traduz a realidade conforme ela se passou, pois contrariamente ao evidenciado no aludido requerimento a dedução da oposição só ocorreu em 12 de abril de 2018 (alínea N). Daí que o órgão da execução fiscal tenha notificado o ora Recorrente para suprir deficiências, mormente, “aclarar a intenção/apresentação de contencioso/pagamento em prestações, nos termos do nº2 do artº 169.º do CPPT” (alínea L).


Ora, em face do supra aludido a penhora notificada ao Recorrente em 02 de abril de 2018, não padece da arguida ilegalidade pois aquando da sua concretização (08 de março de 2018-alínea J) ainda que estivesse pendente pedido de isenção de prestação de garantia, já tinha decorrido o prazo para dedução da oposição judicial a que o Recorrente aludiu e que, inversamente, ao por si alegado ainda não tinha sido interposta.


Daí que, o Juiz do Tribunal a quo, quando fez expressa alusão à recusa da oposição pelo Tribunal Tributário de Lisboa fê-lo apenas com o intuito de reforçar a sua esteira de entendimento, concretamente da inexistência de qualquer contencioso associado à execução fiscal, inexistindo qualquer juízo de prognose póstuma, nem qualquer poder de adivinhação subjacente à realidade relacionada com a rejeição da oposição.


Quanto ao alegado no ponto 17 das conclusões das alegações de recurso, na qual o Recorrente argui que o entendimento sufragado pela primeira instância representa uma violação do direito de acesso à Justiça, melhor consagrado na CRP nos artigos 12.º, 13.º, 18.º, 20.º, 202.º e 203.º todos da Lei Fundamental, importa apenas relevar que para além da aludida afirmação não se encontrar devidamente substanciada, como legalmente se impõe, ainda assim não se vislumbra qualquer denegação de acesso à justiça, em nada se afigurando qualquer coartar da tutela jurisdicional efetiva, mais sendo exemplo notório da aludida não denegação a estruturação e exame do presente recurso.


Ora, em face de todo o exposto improcedem na íntegra todos os vícios invocados pelo Recorrente, devendo manter-se, com a presente fundamentação, a decisão recorrida.



***


IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em :

-NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E manter A DECISÃO RECORRIDA.

Custas pelo Recorrente.


LISBOA, 28 DE MARÇO DE 2019


(Patrícia Manuel Pires)


(JOAQUIM CONDESSO)


(CATARINA ALMEIDA E SOUSA)

















_____________________________________
(1) Vide, designadamente, Acórdão do STJ, proferido no processo nº 02S1599, de 16 de outubro de 2002 e STA 01109/12, de 07 de novembro de 2012.
(2) Código de Processo Civil anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), pág. 143
(3) vide Acórdão do STA, proferido no processo nº 01549/13, com data de 18 de junho de 2014.
(4) Cf. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume II, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, págs. 288/289. No mesmo sentido, RODRIGUES BASTOS, Notas ao Código de Processo Civil, volume I, 3.ª edição, 1999, pág. 262, e ANTUNES VARELA, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 100.º, pág. 378
(5) Neste sentido vide Acórdão do STA, proferido no processo n.º 01223/16, de 18 de janeiro de 2017.
(6) Neste particular, designadamente, o teor do Aresto proferido pelo STA no âmbito do recurso nº 0258/11, com data de 6 de abril de 2011.
(7) In Ac. STA, proferido no recurso nº 0409/12, de 16 de maio de 2012.
(8) Jorge Lopes de Sousa, CPPT anotado e comentado- 6.ª edição 2011, volume II, anotação 10 e) ao art. 98.º, págs. 92/93. As referências aos artigos 193.º e 199.º do CPC devem, em função da aprovação do novo CPC, pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, devem considera-se feitas para os atuais arts. 186.º e 193.º, respetivamente.
(9) Vide, designadamente, Acórdão do Pleno do STA, proferido no processo nº 0803/04, de 28 de fevereiro de 2007.
(10) Vide, designadamente, Acórdão do TCA Norte, proferido no processo nº 712/10.0 BEPRT, de 7/7/2011.
(11) Neste sentido vide, designadamente, o Acórdão do STA proferido no processo nº 0828/13, de 29 de maio de 2013.
(12) Podendo mediante pagamento de multa interpor até ao dia 06 de março de 2018.