Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05631/12
Secção:CT
Data do Acordão:04/14/2016
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:I.R.C.
NOÇÃO DE CUSTOS.
REGIME DE DETERMINAÇÃO DO LUCRO TRIBUTÁVEL CONSOLIDADO (ARTºS.69 E SEG. DO C.I.R.C. ACTUAL).
CONCEITO DE PREJUÍZO FISCAL.
MENOS-VALIAS. CONCEITO.
LIQUIDAÇÃO E PARTILHA DE SOCIEDADE (ARTº.65 E SEG. DO C.I.R.C.).
MENOS-VALIAS RESULTANTES DA LIQUIDAÇÃO E PARTILHA DA SOCIEDADE (ARTº.67, Nº.2, AL.B), DO C.I.R.C., NA REDACÇÃO EM VIGOR EM 1995).
GOODWILL. NOÇÃO.
MENOS-VALIAS APURADAS. DESCONSIDERAÇÃO EM SEDE DE ARTº.23, DO C.I.R.C.
PROVA DA DISPENSABILIDADE DO CUSTO. PROCESSO DIALÓGICO.
Sumário:1. Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito. Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico.
2. Adoptada por diversos sistemas jurídicos da União Europeia e, especialmente, por Portugal, o regime jurídico-fiscal do grupo de sociedades funda-se na denominada teoria da unidade, na qual se pugna pela consideração, para efeitos fiscais, do grupo de sociedades como uma unidade jurídica fictícia, deixando as sociedades integradas de ser sujeitos jurídicos diferentes, fruto da unidade económica que as congrega. Nesse sentido, a matéria colectável deve ser calculada de forma conjunta, dando lugar a uma única liquidação e eliminando a dupla tributação, sendo a respectiva base tributável apurada com recurso a dois tipos de operações, a saber:
a) a eliminação das operações internas realizadas no seio do grupo, só relevando as praticadas com terceiras entidades;
b) a compensação de perdas das várias sociedades componentes do grupo.
3. O legislador não assumiu, em concreto, uma definição específica de grupo de sociedades, embora preveja (cfr.artº.59, nºs.2 e 3, do C.I.R.C.) a concretização do perímetro de consolidação ao critério da sociedade-dominante deter o domínio total do capital social das demais sociedades integradas no grupo, na previsão do denominado grupo de domínio total, igualmente consagrado nos artºs.488 a 491, do C. S. Comerciais. Assim, o nível de integração entre as sociedades do grupo tem de ser especialmente intenso, para que o mesmo seja fiscalmente elegível, devendo apresentar-se como um grupo fortemente integrado, centralizado, estruturado e hierarquizado, no qual existam elevados níveis de participação no capital das várias sociedades-dominadas por parte da sociedade-dominante.
4. Constitui prejuízo fiscal o saldo negativo entre os proveitos ou ganhos e demais variações patrimoniais positivas e os custos ou perdas e demais variações patrimoniais negativas susceptíveis de concorrer para o lucro tributável de um sujeito passivo de I.R.C. num dado período de tributação. O prejuízo fiscal é, em princípio, um corolário da periodização do lucro tributável, isto é, constitui, tendencialmente, uma mera consequência da particular extensão temporal do período por referência ao qual se determina a obrigação de imposto (cfr.cfr.artº.47, do C.I.R.C.).
5. Prevê o artº.23, nº.1, al.i), do C.I.R.C., que são considerados custos ou perdas, nomeadamente as menos-valias realizadas. Deve entender-se que a mera menção a “menos-valias realizadas” na al.i), do nº.1, do referido artº.23, do C.I.R.C., não confere, só por si, a aquisição de todos os requisitos para os valores assim considerados serem aceites como componentes negativas do rédito, pois que não podem deixar de ficar, como acontece com todos os demais custos ou perdas na mesma norma enumerados, sujeitos ao escrutínio do corpo do nº.1, do referido preceito, portanto que se afigurem como comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
6. Segundo a doutrina a menos-valia pode definir-se como uma perda de valor económico de um activo empresarial devido a causas físicas (deterioração), técnicas (obsolência) ou económicas, sendo estas derivadas de uma baixa de preço no mercado. Em sede de I.R.C., o legislador dispõe que são consideradas menos-valias realizadas (por contraposição às menos-valias latentes) as perdas sofridas relativamente a elementos do activo imobilizado mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere (cfr.artº.43, nº.1, do C.I.R.C.). As menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das reintegrações ou amortizações praticadas (cfr.artº.43, nº.2, do C.I.R.C.). O valor de realização é definido nas diversas alíneas do nº.3, do artº.43, do C.I.R.C.
7. Com a dissolução de uma sociedade, termina a prossecução do seu objecto social e dá-se início imediato à fase da sua liquidação e partilha. A liquidação consiste no conjunto de actos realizados com vista à satisfação dos direitos de terceiros e a realização de activos com vista à repartição pelos sócios do conjunto de valores a partilhar (cfr.artº.65 e seg. do C.I.R.C.; artºs.141 e 146, do Código das Sociedades Comerciais).
8. Especificamente, o artº.67, do C.I.R.C., define a natureza dos rendimentos gerados numa operação de partilha, estabelecendo que é englobado para efeitos de tributação dos sócios, no exercício em que for posto à sua disposição, o valor que for atribuído a cada um deles em resultado da partilha, abatido do preço de aquisição das correspondentes partes sociais. Nestes termos, deve comparar-se o valor recebido com o valor pelo qual foram adquiridas as partes sociais sendo a diferença (cfr.artº.67, nº.2, al.b), do C.I.R.C., na versão em vigor em 1995), quando negativa, considerada como menos-valia.
9. O valor do goodwill de uma empresa estará sempre relacionado com a capacidade de criação de lucros dessa empresa, a qual pode derivar de diversos vectores (v.g.superior capacidade de gestão; marketing e publicidade eficaz; localização estratégica). Em termos contabilísticos o goodwill é caracterizado como um activo intangível que somente é reconhecido quando se verifica uma transacção de compra de uma empresa, através da diferença verificável entre o preço pago e o justo valor dos respectivos activos líquidos. O reconhecimento do goodwill pela adquirente radica na exploração de vantagens que esta pode retirar do negócio da empresa adquirida, reconduzindo-se a um valor de difícil mensuração contabilística.
10. Em sede do artº.23, do C.I.R.C., as menos-valias apuradas apenas poderiam ser desconsideradas enquanto custo fiscal dedutível se se verificasse que não tinham sido realizadas no interesse da empresa em ordem (directa ou indirectamente) à obtenção de lucros. Estando em causa custos correspondentes às menos-valias decorrentes da extinção de sociedades tendo em conta o preço de aquisição das suas participações sociais, não se descortina como é que é possível não considerar que esse diferencial entre o custo de aquisição e o de realização se não repercute nas sociedades adquirentes. Com efeito, tais elementos integravam o activo das empresas, na medida em que as mesmas suportaram um custo na respectiva aquisição que tiveram de contabilizar. Ora, este custo da aquisição é que poderia ser posto em causa nos termos do artº.23, do C.I.R.C., alegadamente, por não ter qualquer interesse para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora. Tal significa que a partir do momento que se aceita este custo, a menos-valia resultante da dissolução e liquidação da sociedade adquirida não poderá ser desconsiderada com fundamento no mesmo artº.23, do C.I.R.C. A indispensabilidade do custo há-de resultar simplesmente da sua ligação à actividade empresarial. Se o custo não é estranho à actividade da empresa, isto é, se se relaciona com a actividade normal da empresa, reveste a natureza de indispensável.
11. A questão da prova da dispensabilidade do custo depende do caso concreto, consubstanciando um processo dialógico. Num primeiro momento, o contribuinte afirma a indispensabilidade do custo através da sua contabilidade (cfr.artº.75, nº.1, da L.G.T.; artº.76, nº.2, do C.P.T.), sendo que a A. Fiscal o coloca em causa. A partir daqui, a intensidade dos deveres de prova do sujeito passivo varia com as circunstâncias do caso e o grau de normalidade da situação. Se estivermos perante um custo que indicie confusão de esferas patrimoniais ou outro tipo de fraudes, a intensidade de prova é maior para o contribuinte do que para a Fazenda Pública. Caso contrário, não se verifica qualquer acréscimo de intensidade dos deveres probatórios do sujeito passivo.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal visando sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.145 a 167 do presente processo, através da qual julgou procedente a impugnação intentada pela sociedade recorrida, “R., S.A.”, tendo por objecto acto de liquidação adicional de I.R.C., relativo ao ano de 1995 e no montante total de € 5.287.338,87.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.191 a 196 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Estando em causa, tal como resulta do teor do n°10 dos factos considerados provados, a legalidade da correcção efectuada pela Administração fiscal, no exercício em questão, no valor de PTE 1.906.369.390, relativamente a menos-valias fiscais, por "infracção" do disposto no art.23° do CIRC e alínea b) do n°2 do art.67° do mesmo código, tendo tais menos-valias sido deduzidas em resultado da liquidação da empresa J., Lda., considerou a sentença em apreço que, tendo sido respeitado o disposto no art.67° do CIRC na redacção vigente à data no que diz respeito ao cálculo da menos valia decorrente da liquidação da sua participada "J., Lda.", e sendo certo que a aquisição das referidas participações (…) não se afasta do âmbito da actividade normal da impugnante, sendo por isso de considerar que em causa está um custo dedutível nos termos e para os efeitos do disposto no art.23° do CIRC, é de concluir como no acórdão supradito, no sentido de que a Administração fiscal interpretou erradamente as citadas disposições do CIRC na aplicação que das mesmas fez no caso em apreço;
2-Por sua vez, relativamente à efectivação de tal correcção, conclui-se no relatório de inspecção tributária que "(...) a menos valia fiscal deduzida para efeitos de apuramento do lucro tributável consolidado do exercício de 1995 do grupo R., Lda., no montante de 1.906.369.390$00, apurada pela sociedade dominante R., Lda. (1.423.403. 267$00) e pela sociedade dependente I., SA (482.966.123$00), não consubstancia um perda efectiva, não sendo como tal o correspondente custo enquadrável quer no art.23° do CIRC, quer na alínea b) do n°2 do art.67° do mesmo código, pelo que se procedeu à respectiva tributação.";
3-É, assim, patente que a aludida correcção assenta no não reconhecimento, por parte da Administração fiscal, da existência de uma perda efectiva, facto que determina a insusceptibilidade do pretenso custo ser enquadrável no art.23° do CIRC, precisamente por não corresponder, na sua essência, às menos-valias realizadas mencionadas na alínea i) do n°1 do referido art. 23° do CIRC, sendo que, tal como a este respeito foi entendido no acórdão do STA de 25-10-2000, proferido no processo n° 024565, "Só as menos-valias realizadas, e não também as menos-valias potenciais ou latentes, constituem custos ou perdas de exercício para efeitos de IRC (arts. 23°, n°1, al. i) e 24°, n°1,al. b), do CIRC).";
4-É que, no caso vertente, foi constatado que o apuramento das questionadas menos-valias, por parte da ora impugnante, em consequência da dissolução e liquidação da aludida participada, decorre de uma deficiente contabilização do valor da aludida participação social, tal como resulta do teor de pp. 4 a 9 do relatório de inspecção, não tendo sido considerado o goodwill incluído naquele valor, sendo certo que, consabidamente, o referido goodwill é, por natureza, indissociável da empresa objecto de aquisição, razão pela qual só poderá concluir-se que o mesmo terá necessariamente sido objecto de transmissão com a empresa em causa, assim tendo influenciado, necessariamente, o valor pago pela mesma, facto que permite, ainda, concluir que a não consideração do aludido valor relativo ao goodwill determinou o apuramento de uma menos-valia fiscal não efectiva;
5-Acresce que as menos-valias apuradas nos termos do art. 67°, n°2, al. b) do CIRC, na redacção então aplicável, para serem dedutíveis como perdas de exercício deverão observar o regime estabelecido no art.23° do CIRC, no respeitante ao requisito da indispensabilidade para a realização dos proveitos sujeitos a imposto, revelando-se adequado, nesta perspectiva, questionar a diferença substancial existente entre o preço pago pela impugnante aquando da aquisição da empresa em causa e o valor apurado na partilha, sendo certo que tais operações ocorreram no curto espaço de oito meses do ano em causa;
6-Ora, neste aspecto, resulta evidente que a referida diferença substancial entre os sobreditos valores há-de justificar-se, unicamente, se for considerado que o valor pago na aquisição da questionada sociedade decorreu não só do valor dos bens tangíveis mas também do valor da parte intangível do negócio, vulgarmente designada por goodwill, sendo assim patente que a menos-valia apurada só tem efectiva existência na contabilidade da impugnante, carecendo manifestamente de correspondência económica e fiscal, dado ter sido motivada por uma deficiente contabilização do valor relativo à aquisição da participação social em questão, tudo razões pelas quais se deverá considerar que tal menos-valia, não realizada, por não corresponder a uma perda efectiva, não é susceptível de, nos termos do art.23° do CIRC, constituir um custo para efeitos de IRC, não sendo, também, enquadrável no art.67°, n°2, al. b) do mesmo código, preceitos legais que resultam violados em consequência do entendimento que fundamenta a decisão recorrida, a qual deverá ser revogada, com as legais consequências.
X
A sociedade recorrida produziu contra-alegações (cfr.fls.198 a 231 dos autos), nas quais pugna pela confirmação do julgado, sustentando, nas Conclusões, o seguinte:
1-A Administração Fiscal dirigiu à R. uma liquidação de IRC respeitante ao exercício de 1995, em resultado da não aceitação como custo fiscal das menos-valias que se reflectiram naquela sociedade e na sociedade I., S.A. (doravante I.) em consequência da dissolução e liquidação da sociedade J., LDA. (doravante J.);
2-As referidas menos-valias correspondem integralmente à diferença entre, por um lado, o custo de aquisição das participações que a R. e I. deti­nham, respectivamente, na dita J. - sendo que a I. consolidava fis­calmente com a R. - e, por outro lado, o valor que a cada uma foi atribu­ído em resultado da partilha dos activos pertencentes a tal sociedade;
3-Segundo o relatório de fiscalização dos serviços - e usando inclusivamente as formulações que nele foram empregues - a fundamentação do acto em referência as­senta, no essencial, no seguinte;
4-A Administração fiscal não aceita o custo de PTE 1.906.369.390,00 relativo às menos-valias apuradas pela R. e pela I. com a dissolução e liquidação da sociedade J., pois não teria havido "a realização de menos valias nos termos da alínea i) do n°1 do art.23° do Código do IRC";
5-Sem pôr em causa "os contratos de compra e venda das quotas e trespasse da J., [ou] o valor porque foram efectuadas estas operações", a Administração fiscal questiona os procedimentos contabilísticos empregues pela R. e pela I.: ao não evidenciarem "qualquer valor de trespasse intrínseco à[quela] aquisição", teriam sobreavaliado o valor da mesma, o que teria originado o "apuramento de uma menos-valia contabilístico/fiscal não efectiva" aquando da posterior venda;
6-Com base neste raciocínio, a Administração fiscal invocou o art.23 do CIRC para questionar a dedutibilidade fiscal da perda em questão, a qual - muito embora realizada a partir de negócios cujos termos ou condições não são questio­nados - não seria indispensável para a obtenção dos proveitos ou para a manu­tenção da fonte produtora;
7-O presente recurso vem interposto da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou totalmente procedente a impugnação deduzida pela R.;
8-O Tribunal recorrido entendeu que resulta provado nos autos "que a menos-valia foi calculada e obtida pé Ia impugnante com recurso à operação prevista no art.67° do CIRC, a saber, através do cálculo da diferença entre o preço que pagou pelas participações sociais e o valor atribuído em resultado da partilha". Além disso, o Tribunal a quo constatou que ''a Administração fiscal não põe em causa o preço efectivamente pago pela impugnante e pela I. pelas parti­cipações sociais da "J., Lda";
9-Ora, tendo em conta estas circunstâncias e a prova documental produzida nos autos, concluiu o Tribunal a quo, seguindo de perto o decidido no acórdão do TCA, profe­rido em 31/01/2012, no âmbito do processo n°05097/11, disponível para consulta em www.dgsi.pt/tcas, que "tendo sido respeitado pela impugnante o disposto no art.67º do CIRC na redacção vigente à data no que diz respeito ao cálculo da menos valia decorrente da liquidação da sua participada "J., Lda.", e sendo certo que a aquisição das re­feridas participações (preço que, repita-se, não foi posto em causa) não se afasta do âmbito da acti­vidade normal da impugnante, sendo por isso de considerar que em causa está um custo dedutível nos termos e para os efeitos do disposto no art.23º do CIRC, é de concluir como no acórdão sobre­dito, no sentido de que a Administração fiscal interpretou erradamente as citadas disposições do CIRC na aplicação que das mesmas fez no caso em apreço";
10-A Fazenda Pública recorreu da decisão em referência, alegando para o efeito que "mais do que propriamente a questão relativa à indispensabilidade dos custos correspondentes às menos-valias realizadas em consequência da extinção da sociedade em causa (…), constata-se que a aludida correcção assenta no não reconhecimento da existência de uma perda efectiva, ou seja, na insusceptibilidade do pretenso custo ser enquadrável no art.23° do CIRC, precisamente por não cor­responder, na sua essência, às menos-valias realizadas a que alude a alínea i) do n° 1 do referido artigo 23º do CIRC”;
11-Em concreto, a recorrida defendeu que "no caso em apreço, o apuramento das questionadas menos-valias, por parte da ora impugnante, em consequência da dissolução e liquidação da aludida participada, decorre de uma deficiente contabilização, efectuada pela mesma adquirente, do valor da questionada participação social, tal como resulta, de forma circunstanciada, do teor de pp. 4 a 9 do relatório de inspecção, uma vez que não foi tido em consideração o goodwill incluído naquele valor, facto que permitiu o apuramento de uma menos-valia fiscal não efectiva";
12-Além disso, e retomando uma ideia que parecia secundarizada no parágrafo que começámos por citar das alegações apresentadas pela recorrente no âmbito do presen­te recurso para dizer em parte o seu contrário, "as menos-valias apuradas nos termos do art.67º, nº2, al. b) do CIRC, na redacção então aplicável, para serem dedutíveis como perdas de exercício deverão observar o regime estabelecido no art.23º do CIRC, particularmente no respeitan­te ao requisito da indispensabilidade para a realização dos proveitos sujeitos a imposto, facto que permite questionar a manifesta diferença entre o preço pago pela impugnante aquando da aquisição da empresa em causa e o valor apurado na partilha, sendo certo que tais operações ocorreram no curto espaço de oito meses do ano em causa";
13-Ora, entende a recorrida que a decisão de que vem interposto o presente recurso não merece na apreciação que faz dos factos provados por via documental e no di­reito mobilizável, não lhe sendo imputável qualquer erro de julgamento de facto ou de di­reito, por a mesma se encontrar em conformidade com as exigências de fundamenta­ção impostas pelo artigo 123° do CPPT e pelos n°2 e 3 do artigo 659° do CPC, ou, bem assim, qualquer nulidade das previstas no artigo 125° do CPPT e no artigo 668° do CPC;
14-Na verdade, não pode deixar de reconhecer-se que, não só que a sentença é eximia no modo como identifica o objecto de litígio, sintetiza a pretensão da impugnante e a posição do representante da Fazenda Pública e os respectivos fundamentos, como o é no modo como fixa a questão que ao Tribunal cumpre solucionar e no modo como fundamenta - de facto e de direito - as suas decisões;
15-Percebe-se que o Tribunal procede a um exame detido da prova documental apresentada, apreciando-a, censurando-a e valorando-a ao ponto de a estabilizar e de com ela consubstanciar as suas opções de direito;
16-Pelo contrário, a recorrente limitou-se a uma vez mais reiterar aquele que é o seu posicionamento originário - impugnado - face às questões jurídicas suscitadas. A Fazenda Pública limitou-se, enfim, a repetir as mesmas razões que já tinha tornado públicas no relatório que fundamenta o acto tributário impugnado, basicamente as­sentes em falsos pressupostos de sujeição, num incompreensível desconhecimento da matéria de facto e numa profunda ignorância em matéria de fontes de direito;
17-Com efeito, ao longo do processo, designadamente na petição inicial, a recorrida efectuou uma descrição minuciosa de todas as operações realizadas desde a aquisi­ção, por parte da R. e da I., de 100% do capital da J., de­monstrou de modo inequívoco e não contraditado que: em primeiro lugar, é indesmentível a ocorrência fáctica das menos-valias que foram desconsideradas pela Ad­ministração fiscal, sendo que todos os argumentos usados contra a admissibilidade de tais perdas dizem respeito a momentos distintos do momento da liquidação da sociedade J.; em segundo lugar, não existem no processo quaisquer elementos probatórios que sustentem a conclusão de que o preço pago pelas participações so­ciais da J. não se "conectava essencialmente" com a actividade desenvolvida pelas sociedades R. e I.; por último, o fundamento jurídico usado pela Administração fiscal para sustentar a desconsideração das perdas decorrentes da li­quidação da citada sociedade (o apelo ao art.23° do CIRC) é totalmente inidóneo para o efeito, e nenhum outro pode agora ser invocado para obstar à procedência deste recurso;
18-Em qualquer caso, não pode a ora recorrida deixar de, por mera cautela do patrocínio, assinalar, em relação à decisão de que vem interposto o presente recurso: tendo, na petição inicial apresentada, exposto as razões de facto e de direito que demons­tram a correcção dos seus procedimentos jurídico-tributários e, em consequência, a ilegalidade da pretensão da Administração Tributária, e, com vista à sua demonstra­ção, arrolado as testemunhas cujo depoimento considerou fundamental para a boa decisão da presente lide, nunca a ausência de produção da referida prova poderá ser valorada em sentido que prejudique nos termos legais, o que se invoca;
19-Retomando, a primeira das proposições enunciadas na conclusão 17ª é incontroversa e incontrovertível: a sociedade R. adquiriu uma participação na J. por 1.853.146.716 PTE e, em resultado da dissolução da mesma J., apenas lhe couberam activos no valor de 430.343.449,00 PTE; por sua vez, a I. ad­quiriu uma participação na J. por 628.949.778,00 PTE e na dissolução desta so­ciedade apenas obteve bens no montante de 145.983.655,00 PTE;
20-Relembre-se, ainda, que a Administração fiscal tão-pouco põe em causa que tenha sido praticado o justo valor na alienação dos activos implicados nas várias transacções que se encontram em causa, e que terminaram com a liquidação da sociedade adqui­rida pela R. e pela I.. O primeiro argumento usado para recusar a admissibilidade das perdas indesmentíveis associadas à liquidação da participada des­tas últimas sociedades prende-se antes com a alegação de que o valor de aquisição daquela sociedade não considerou, devendo tê-lo efeito, o dito goodwill que se lhe en­contrava associado;
21-Sucede que este argumento é, no mínimo, surpreendente, uma vez que não lhe corresponde qualquer fundamento legal conhecido. Com efeito, não vemos como possa encontrar-se na lei apoio para a tese de que, face à liquidação de uma sociedade cujo activo é reconhecidamente inferior ao preço de aquisição das correspondentes parti­cipações, é possível rejeitar a admissibilidade fiscal da perda subjacente por se divisar na esfera de outras sociedades um valor que actua como uma espécie de compensação. As perdas experimentadas pelos sócios da sociedade liquidada não podem, de modo algum, ver o seu reconhecimento dependente de circunstâncias ou acontecimentos que dizem respeito a um momento distinto do da liquidação e a sociedades diversas;
22-Ora a alegação do recorrente jamais resolve ou sequer enfrenta esta dupla incongruência: por um lado, não contesta - nem o poderia fazer, em boa verdade - a ocor­rência de perdas efectivas resultantes da liquidação da sociedade em referência; por outro lado, não explica em que preceito se baseia para recusar a admissibilidade - e a sua efectividade - dessas perdas em nome de valores ou factos que, no seu juízo ex­presso, respeitam a operações e a sociedades distintas. O art.23° do CIRC não per­mite, obviamente, um tão arrevesado exercício, salvo o devido respeito;
23-Em todo o caso, não faz qualquer sentido a alegação relativa à deficiente contabilização, efectuada pela mesma adquirente, do valor da questionada participação social, tal como resulta, de forma circunstanciada, do teor de pp. 4 a 9 do relatório de inspecção, uma vez que não foi tido em consideração o goodwill incluído naquele valor. Ela radica, aliás, no entender da recorrida, numa série de equívocos relativamente ao tratamento contabilístico e fiscal do go­odwill;
24-Desde logo, não há lugar à manifestação contabilística de um goodwill se a aquisição de uma empresa ocorrer por via da tomada das participações sociais da sociedade e se o adquirente as inscrever no seu activo pelo respectivo custo de aquisição, atento que neste está já compreendida a contrapartida respeitante a um qualquer eventual goodwill. Foi precisamente o que sucedeu no caso em análise: a R. e a I., no estrito cumprimento das regras contabilísticas, ins­creveram as participações sociais adquiridas pelo respectivo custo de aquisição;
25-Na verdade, no caso de tomada de participações, o goodwill só é autonomamente manifestado (e nem sequer isso é inteiramente pacífico) se se tratar de partes de capital em empresas filiais e associadas e a adquirente optar pelo méto­do de equivalência patrimonial - trata-se, na verdade, de uma escolha livre, como resulta do ponto 5.4.3.1. do Plano Oficial de Contabilidade;
26-Por outro lado, importa ainda referir que o goodwill integra ou faz parte da empresa adquirida, de tal forma que, em caso de superveniente alienação da mesma empresa, o "trespasse" deixa de competir ao alienante, não podendo, portanto, continuar a figurar no seu património;
27-Nessa altura, sem margem para dúvidas, a diferença para menos entre o preço de venda da empresa (ou das partes de capital da sociedade a que pertence) e o res­pectivo custo de aquisição constitui urna perda fiscalmente relevante, ainda que, por hipótese, essa diferença seja integralmente imputável a uma desvalorização do goodwill (cfr. ADLER/DDRING/SCHNIALTZ, op. cit., comentários n.°s 268 e ss.);
28-O mesmo sucede em caso de extinção da empresa, por via da sua dissolução e liquidação, porque era a essa empresa que o goodwill seria imputável - esse valor desaparece do património dos sócios da sociedade extinta;
29-Sendo assim, é incontroverso que constituirá menos-valia fiscalmente relevante, por força do disposto na al. i) do art. 23° do CIRC, toda a diferença para menos entre o preço da venda da empresa ou das partes de capital e o respectivo custo de aquisição, ainda que pretensamente imputável a uma desvalorização do go­odwill;
30-As conclusões que acabámos de apresentar revelam, claramente, que todo o discurso da Administração fiscal em torno do conceito de goodwill e do que como tal deva entender-se nas circunstâncias concretas do caso em apreço afigura-se como dispensável ou inútil;
31-O que importa, na verdade, é verificar se o resultado da liquidação da J. era ou não inferior - na exacta medida do que foi declarado - ao correspondente cus­to de aquisição manifestado nas contas dos respectivos sócios;
32-Ora se aquele resultado de liquidação equivalia ao valor que já se referiu - facto que não é sequer disputado pela Administração fiscal - não se vê como, tendo presente o disposto no art.67° do CIRC, se pode recusar relevo fiscal às menos-valias experimentadas pelos referidos sócios;
33-A única possibilidade legal que restava à Administração fiscal teria sido a contestação do processo que conduziu a que o património da J. se visse re­duzido àquele valor, nomeadamente argumentando que o preço praticado nos mencionados trespasses teria pecado por defeito, por força da existência de "rela­ções especiais" entre vendedor e comprador. Era mister, então - já que a lei não estabelecia outro meio - que tivesse procedido às correcções necessárias, nos termos do art.57° do CIRC, considerando como valores de realização não os efectivamente ajustados entre as partes, mas os que, no critério da Administra­ção fiscal, teriam sido acordados "entre pessoas independentes";
34-Sucede que a Administração Fiscal não recorreu ao art.57° do CIRC para corrigir a matéria colectável da J. respeitante ao exercício de 1995 e o património desta era indiscutivelmente, à data da liquidação, também para efeitos fiscais, aquele mesmo que gerou para o conjunto dos sócios um resultado de partilha de 576.327.104,00 PTE, não podendo a Administração fiscal ficcionar um qualquer outro resultado, desprovido de correspondência (real ou sequer fictícia) no dito pa­trimónio;
35-A Administração fiscal, além disso, pretende utilizar o art.23° com um propósito que extravasa por completo as respectivas letra e ratio;
36-Na verdade, sempre que ocorra a alienação de um bem ou de um conjunto de activos pertencentes a uma empresa - nomeadamente por efeito da sua liquidação - a conexão empresarial das correspondentes perdas, quando se verifiquem, estará garantida, por isso que o mesmo bem ou conjunto de activos pertencia a essa empresa, e esta não dispõe de um património privado, por oposição a um património em­presarial;
37-Tal é o que decorre, aliás, da própria letra do art.23° do CIRC em termos absolutamente claros e inequívocos. Na verdade, o art.23°, n°1, do CIRC, depois de dizer que se consideram "gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte pro­dutora", procede ele próprio à qualificação como "gastos" de diversas categorias de custos, entre as quais figuram, sem dependência de quaisquer requisitos, as "menos-valias realizadas";
38-Ou seja: as menos-valias são sempre havidas como gastos por expressa classificação legal;
39-As coisas apresentar-se-iam de modo diferente se a redacção do proémio do art.23° fosse algo de parecido como o seguinte: "os gastos, nomeadamente os previstos nas alíneas seguintes, são dedutíveis no apuramento do lucro tributável se forem comprovada­mente indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora";
40-Mas não foi assim que o legislador desenhou tal preceito legal - os custos integrantes do catálogo fornecido pelas várias alíneas do n°1 do art.23° do CIRC não têm de sujeitar-se com êxito a qualquer teste para poderem ser havidos como gastos: a noção de gasto pressupõe a nota da "indispensabilidade para a realização dos rendi­mentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora"; logo, essa no­ta está presente quanto a todos custos referidos nas diversas alíneas do art. 23°, n°1, do CIRC, na medida em que é a própria lei que os configura como "gastos";
41-É certo que o regime fiscal das menos-valias veio a ser alterado pela entrada em vigor da Lei n°32-B/2002, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2003), passando a prever-se na redacção do art.23° do CIRC excepções à dedutibilidade fiscal das menos-valias suportadas com a transmissão onerosa das partes de capital. Porém, à data dos factos, tais excepções não se encontravam ainda previstas, o que, só por si, serve para afastar urna fundamentação como aquela que é utilizada pela Administração fiscal para sustentar a liquidação de IRC impugnada e como aquela que é corroborada pelo Tribunal a quo na decisão de que se recorre;
42-É por tudo isso que o relevo fiscal das perdas suportadas pela impugnante com a liquidação da sua participada, de acordo com a lei vigente ao tempo dos factos, só poderia ser questionado se houvesse indícios de que tivessem uma origem ou natu­reza alheias aos fins da empresa, o que já se demonstrou não acontecer no caso ver­tente;
43-Um entendimento diverso deste põe em causa o princípio constitucional vigente no nosso ordenamento jurídico segundo o qual as empresas devem ser fundadamente tributadas de acordo com o seu lucro real, no respeito pela sua liberdade de iniciati­va económica e direito de propriedade privada;
44-A alegação, implícita na fundamentação da recorrente, de que as ora recorrentes teriam montado uma operação com uma determinada finalidade fiscal é igualmente surpreendente: a repressão do abuso de planeamento fiscal - no qual se parece basear esta alegação - só em 1998, com a entrada em vigor do art.32°-A do CPT, é assumidamente acolhida por uma cláusula geral. Até então, com efeito, o ordenamen­to jurídico-fiscal português sempre renunciou à adopção de fórmulas como aquelas que figuram hoje no n°2 do art.38° da LGT;
45-A opção nacional, neste domínio, até aquela data, foi sempre a de alargar os tipos fiscais de modo a que estes pudessem abranger, relativamente a cada imposto, os "negócios indirectos" mais relevantes, de acordo com as regras da experiência;
46-Do excurso expendido extrai-se que a Administração Fiscal, até à entrada em vigor do citado art.32°-A o CPT, apenas podia obviar ao "resultado global" negativo da operação se interviesse ao nível das operações parcelares que para o mesmo contri­buíram, designadamente, conforme se referiu, através de uma correcta aplicação do art.57° do CIRC, que não chegou e nem poderia ser esboçada;
47-TERMOS EM QUE O PRESENTE RECURSO DEVE SER JULGADO IMPROCEDENTE, POR NÃO PROVADO, E A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA INTEGRALMENTE MANTIDA.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de se conceder provimento ao presente recurso (cfr.fls.288 e 289 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.291 e 295 do processo), vêm os autos à conferência para deliberação.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.147 a 161 dos autos):
1-A sociedade impugnante, "R., S.A.", com o n.i.p.c. 5…, anteriormente designada "R., L.da.", tem por objecto a gestão de participações sociais em sociedades na distribuição a retalho e é a entidade dominante de um grupo de empresas que em 1995 se encontrava abrangido pelo regime da tributação pelo lucro consolidado, constituído pela "I., S.A.", "N. S.A.", "A., Lda.", "J., S.A." e "L. Lda." (cfr.relatório de inspecção tributária junto a fls.126 a 138 do processo administrativo apenso);
2-Em 3 de Abril de 1995, através de escritura pública celebrada no …° Cartório Notarial de Lisboa, a ora impugnante, então com a designação "R., Lda.", e a "I., S.A." adquiriram a totalidade do capital social da sociedade "J., Lda." pelo preço global de PTE 2.400.000.000 (EUR 11.971.149,53), preço correspondente à aquisição de três quotas cada uma com valor nominal de PTE 15.200.000 (EUR 75.817,28), pelo preço de PTE 608.000.000 (EUR 3.032.691,21) cada, e de três quotas com o valor nominal de PTE 4.800.000 (EUR 23.942.03) respectivamente, pelo preço de PTE 192.000.000 (EUR 957.691,96) cada (cfr. cópia da escritura de "cessão de quotas" junta a fls.68 a 74 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
3-Na sequência da aquisição referida no ponto anterior, a impugnante ficou com uma participação de 74,67% e a "I., S.A." com uma participação de 25,33% da "J., Lda." (cfr.cópia da escritura de "cessão de quotas" junta a fls.68 a 74 dos presentes autos);
4-Por escritura pública celebrada no …° Cartório Notarial de Lisboa, em 17 de Novembro de 1995, o preço de PTE 2.400.000.000 (EUR 11.971.149,53) de compra das quotas da "J., Lda.", referido no ponto 2, foi rectificado para PTE 2.482.696.494 (EUR 12.383.637,09), correspondendo à rectificação do preço de compra das três quotas com o valor nominal de PTE 15.200.000 (EUR 75.817,28) cada, de PTE 608.000.000 (EUR 3.032.691,21), para PTE 628.049.778 (EUR 3.132.699,09), e à rectificação do preço de compra das três quotas com o valor nominal de PTE 4.800.000 (EUR 23.942.03) respectivamente, de PTE 192.000.000 (EUR 957.691,96), para PTE 198.6615.720 - EUR 9.909.197,43 (cfr.cópia da escritura de "rectificação" junta a fls.75 a 82 dos presentes autos);
5-Em 3 de Abril de 1995, por escritura pública celebrada no …° Cartório Notarial de Lisboa, a "J., Lda." trespassou para a ora impugnante seis armazéns arrendados de comércio grossista ou retalhista de bens alimentares e não alimentares e de "mercearias e outros", pelo preço total de PTE 450.039.485 - EUR 2.244.787,49 (cfr.cópia de escritura de "trespasse" junta a fls.83 a 89 dos presentes autos);
6-Em 20 de Dezembro de 1995, procedeu-se à dissolução da sociedade "J., Lda." e à atribuição de todo o património, activo e passivo, à impugnante e à "I., S.A." (cfr.cópia de "instrumento de acta" junto a fls.90 a 94 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
7-No exercício de 1995, a ora impugnante apurou uma menos-valia de PTE 1.423.403.267 (EUR 7.099.905,56), resultante da subtracção ao valor de aquisição das participações da "J., Lda." de PTE 1.853.146.716 (EUR 9.243.456,85) do respectivo valor de realização de PTE 430.343.449 - EUR 2.146.544,07 (cfr.mapa das mais-valias e menos-valias fiscais do exercício junto a fls.95 a 104 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
8-Por sua vez, a "I., S.A." apurou uma menos-valia de PTE 482.966.123 (EUR 2.409.024,87) resultante da subtracção ao valor de aquisição das participações da "J., Lda." de PTE 628.949.778 (EUR 3.137.188,27) do respectivo valor de realização de PTE 145.983.655 - EUR 728.163,04 (cfr.mapa das mais-valias e menos-valias fiscais do exercício junto a fls.105 a 107 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);
9-Em cumprimento da Ordem de Serviço n.° … de 20/08/99 realizou-se uma inspecção fiscal às contas consolidadas do exercício de 1995 do grupo "R., Lda.", tendo por objectivo "verificar, relativamente ao exercício de 1995, a conformidade do imposto inerente à aplicação do Regime de Tributação pelo Lucro Consolidado do grupo R., Lda." (cfr.relatório de inspecção tributária junto a fls.126 a 138 do processo administrativo apenso);
10-Na sequência da inspecção melhor identificada no ponto anterior foram propostas correcções ao lucro tributável consolidado do grupo para o exercício de 1995 no montante total de PTE 1.933.882.256 (EUR 9.646.164,02) a favor do Estado, sendo PTE 27.512.866 (EUR 137.233,06) relativos a "provisões além dos limites legais" e PTE 1.906.369.390 (EUR 9.508.930,43) relativos a "menos valias fiscais" por "infracção" do disposto no "art. 23° do CIRC e alínea b) do n°2 do art.67° do mesmo código" e efectuados "ajustamentos de prejuízos fiscais a favor do grupo" no montante de PTE 49.558.001 (EUR 247.194,27) em "consequência das correcções positivas de 1.933.882.256$00, efectuadas ao nível do lucro tributável consolidado" (cfr.relatório de inspecção tributária junto a fls.126 a 138 do processo administrativo apenso);
11-Em 13 de Outubro de 1999 foi estruturado o relatório resultante da inspecção fiscal ao exercício de 1995 da impugnante, melhor identificado nos pontos anteriores, do qual consta o seguinte (cfr.relatório de inspecção tributária junto a fls.126 a 138 do processo administrativo apenso):
"(...)
Relatório
(...)
3. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
Verificaram-se os seguintes factos:
(...)
3.1.2 - Menos Valias Fiscais
3.1.2.1 - Em conformidade com a escritura pública de 03/04/95, as sociedades R., Lda. e I., Sa, adquiriram nesta data a pessoas singulares, a totalidade do capital da empresa J., Lda. (60.000.000$00), pelo preço global de 2.400.000.000$00, ascendendo as respectivas participações a 74,67% e 25,33%:
………………………………………………………………………….………….Unidade: Escudos
Entidade Alienante
Entidade Adquirente
Participação
%
Valor Nominal Da Quota
Valor Venda Da Quota
Pessoa Singular
I., Sa
25,33
15.200.000
608.000.000
Sub -Total (1)
25,33
15.200.000
608.000.000
Pessoa Singular
R., Lda.
15.200.000
608.000.000
Pessoa Singular
R., Lda.
15.200.000
608.000.000
Pessoa Singular
R., Lda.
4.800.000
192.000.000
Pessoa Singular
R., Lda.
4.800.000
192.000.000
Pessoa Sinqular
R., Lda.
4.800.000
192.000,000
Sub-Total (2)
74,67
44.800.000
1.792.000.000
Total (1) + (2)
100,00
60.000.000
2.400.000.000

Saliente-se que, em 31/12/94 a R., Lda.. era a única accionista da I., Lda., com uma participação directa de 86,95%, dado o restante capital (13,05%) encontrar-se titulado por acções próprias. Após a venda das referidas acções próprias em 31/12/95, a R., Lda. passou a deter directamente 95% do capital da "I.", ficando o restante capital (5%) repartido de forma igual por cinco empresas participadas de forma directa ou indirecta por aquela sociedade.
3.1.2.2 - No entanto, refira-se que o valor de 2.400.000.000$00, foi posteriormente rectificado por escritura pública de 17/11/95 para 2.482.696.494$00, assim discriminado:
.....................................................................................................................Unidade: Escudos
Entidade Alienante
Entidade Adquirente
Participação
%
Valor Nominal
Da Quota
Valor Venda
Da Quota
Pessoa Singular
I., Sa
25,33
15.200.000
628.949.778
Sub -Total (1)
25,33
15.200.000
528.949.778
Pessoa Singular R., Lda.
15.200.000
528.949.778
Pessoa Singular R., Lda.
15.200.000
528.949.778
Pessoa Singular R., Lda.
4.800.000
198.615.720
Pessoa Singular R., Lda.
4.800.000
198.615.720
Pessoa Singular R., Lda.
4.800.000
198.615.720
Sub-Total (2)
74,67
44.800.000
1.853.746.716
Total (1)+ (2)
100,00
30.000.000
2.482.696.494

3.1.2.3 - Importa mencionar o facto de as participações financeiras em questão, terem sido reflectidas contabilisticamente na conta 411 "Investimentos Financeiros - Partes de capital", pelos respectivos montante globais de 1.853.746.716$00 e 628.949.778$00.
Contudo, destaque-se que à data de 31/03/95, o Balanço da sociedade J., Lda., especificamente elaborado para efeitos desta operação, apenas reflectia um património de 498.888.458$00, equivalente ao valor da situação líquida, o qual para além de disponibilidades e de créditos sobre e de terceiros encontrava-se influenciado positivamente por existências (431.816.716$00), imobilizado incorpóreo (391.268$00), imobilizado corpóreo (146.085.860$00) e investimentos financeiros - títulos e outras aplicações financeiras (300.000$00).
Para a justificação da diferença paga, verificada entre o preço de aquisição da J., Lda. e o valor contabilístico dos elementos patrimoniais desta sociedade, poderão ser invocadas razões de interesse estratégico no âmbito do grupo adquirente, facto que nesta situação, pressupõe a aceitação de que a operação envolveu uma componente de "goodwill"/trespasse.
Contudo, na contabilização da operação de compra, não foram relevados quaisquer elementos incorpóreos inerentes à diferença de aquisição.
3.1.2.4 - Refira-se ainda que a totalidade das existências de 431.816.716$00 e parte do valor do imobilizado corpóreo, relativo a equipamento, no montante de 18.222.769$00 (descritos no ponto anterior), foram em 03/04/95, objecto de trespasse a favor da R., Lda., pela sociedade J., Lda.
Efectivamente, na mesma data de 03/04/95, mediante escritura pública, a sociedade J., Lda., trespassa à R., Lda., seis estabelecimentos comerciais arrendados (quatro armazéns de comércio grossista ou retalhista de bens alimentares e não alimentares de forma especializada e dois armazéns de mercearias e outros), pelo preço global de 450.039.485$00, o qual inclui todo o pessoal e todo o recheio, mobiliário e mercadorias existentes nos referidos imóveis e que fazem parte dos mencionados estabelecimentos comerciais, bem como o direito aos respectivos arrendamentos.
Na sequência do alegado trespasse, a sociedade R., Lda., efectuou o seguinte lançamento contabilístico:

Conta Debitada
Valor
312045 "Compras - Mercadorias"
431.584.491
42341 "Imobilizado Corpóreo - Equiptº Básico"
18.222.769
622128 "Subcontratos - Combustíveis"
232.225
Conta Creditada
26840 " Outros Credores"
450.039.485

Constata-se assim, que não foram reflectidos contabilisticamente quaisquer direitos inerentes a um trespasse efectivo, uma vez que a operação designada pelo sujeito passivo como tal, na realidade, consistiu apenas na mera transmissão de existências e imobilizado corpóreo a preços de balanço, assegurando-se deste modo a manutenção do negócio da sociedade adquirida no seio da R., Lda. e criando-se condições para a futura liquidação daquela, em consequência do seu esvaziamento operacional.
3.1.2.5 - Verifica-se assim que o negócio envolvendo a J., Lda., ascende ao total de 2.932.735.979$00, sendo 2.482.696.494$00, inerentes à aquisição da totalidade do seu capital em 03/04/95 por parte da R., Lda. (1.853.746.716$00) e da I., Sa (628.949.778$00), e 450.039.485$00, respeitantes ao valor do trespasse efectuado na mesma data por aquela sociedade à R., Lda.
3.1.2.6 - Através de deliberação tomada em Assembleia Geral de 20/12/95 da sociedade J., Lda., foi aprovada a dissolução e liquidação da empresa em questão, por transmissão global do seu activo e passivo às únicas sócias "R., Lda." (74,67%) e "I., Sa" (25,33%), na proporção das respectivas quotas.
Neste âmbito, constata-se que o resultado da partilha atribuído à R., Lda. e à I., Sa, foi, respectivamente, de 430.343.449$00 (74,67% x 576.327.104$00) 145.983.655$00 (25,33% x 576.327.104$00), dado o Balanço especial da sociedade J., Lda., reportado a 20/12/95, evidenciar apenas um activo de 576.327.104$00, representado em Depósitos Bancários, correspondente ao valor da situação líquida.
3.1.2.7 - Decorrente da dissolução e liquidação da empresa J., Lda. e do consequente "abate" das participações nela detidas, foram apuradas menos valias fiscais pelas sociedades R., Lda. e I., Lda., respectivamente nos montantes de 1.423.403.267$00 (1.853.746.716$00 - 430.343.440$00) e de 482.966.123$00 (628.949.778$00 - 145.983.655$00), correspondentes à diferença entre o valor por que se encontravam registadas na conta 41 as suas participações naquela sociedade e o resultado da partilha, as quais foram, invocando a alínea b) do n.°2 do art°67° do CIRC, deduzidas quer para efeitos de determinação do resultado fiscal individual das mesmas, quer para efeitos do resultado fiscal consolidado do grupo R., Lda.
Note-se ainda que as menos valias fiscais de 1.423.403.267$00 e 482.966.123$00, são coincidentes com as respectivas menos valias contabilísticas apuradas e acrescidas para efeitos de determinação do resultado fiscal individual/consolidado, dado ter sido aplicado o coeficiente de desvalorização da moeda 1 (um), por via das participações no capital da J., Lda., terem sido adquiridas e "abatidas" no mesmo ano de 1995.
3.1.2.8 - Em observância ao disposto no ponto 3.2.2 da Directriz Contabilística n°1/91 "Tratamento contabilístico de concentrações de actividades empresariais", a aquisição da totalidade do capital da empresa J., Lda., em 03/04/95, por parte da R., Lda. (1.853.746.716$00) e da I., Sa (628.949.778$00), pelo preço global de 2.482.696.494$00, deveria ter sido registada contabilisticamente atendendo ao justo valor dos activos e passivos adquiridos, encontrando-se o conceito de justo valor definido no ponto 3.2.3 da mesma directriz, facto que não se verificou, tendo estas sociedades reflectido contabilisticamente o valor de 2.482.696.494$00 somente nas contas 41 "Investimentos Financeiros - partes de capital".
Neste contexto, importa salientar que o património da empresa J., Lda., em 03/04/95, ascendia apenas a 498.888.458$00, resultante da diferença entre um activo líquido de 919.892.831$00 e de um passivo de 421.004.373$00, conjugado ainda com o facto de paralelamente à referida aquisição de partes de capital, se ter verificado o trespasse de existências (431.816.716$00) e de equipamento (18.222.769$00), a favor da R., Lda. pelos respectivos valores contabilísticos, os quais se encontravam incluídos no total do activo em questão, situação que implicou que o total do negócio passasse a ascender a 2.932.735.979$00 (2.482.696.494$00 + 450.039.485$00) em vez de 2.482.696.494$00.
É ainda de referir que após consideração da operação de 450.039.485$00, o património da sociedade J., Lda., à data de realização da mesma, ou seja à data em que ocorreu igualmente a compra da totalidade do seu capital social (03/04/95), no montante de 498.888.458$00, integrava bens do imobilizado, cujo valor ascendia apenas a 128.554.359$00, assim discriminado:

Designação

Imobilizado incorpóreo - Despesas Instalação
Valor Líquido
391.268
Imobilizado corpóreo:
Terreno e recursos naturais
127.863.091
5.000.000
Edifícios e outras construções (a)
86.000.000
Restante imobilizado corpóreo (b)
36.863.091
Investimento financeiros (Títulos e Outras Aplicações Financeiras)

Total (c)
300.000

128.554.359

(a) As reintegrações acumuladas relativas a edifícios e outras construções, constantes do balanço à data de 31/03/95, ascendiam a 14.000.000$00 e o respectivo valor de aquisição era de 100.000.000$00

(b) 36.863.091 $00 = 55.085.860$00 (valor líquido constante do balanço à data de 31/03/95) - 18.222.769$00 (valor objecto de trespasse para R., Lda.)

(c) 128.554.359$00 = 147.777.128$00 (391.268$00 + 146.085.860$00 + 300.000$00) (valor líquido constante do balanço à data de 31/03/95) - 18.222.769$00 (valor objecto de trespasse para R., Lda.)

O restante valor do património encontrava-se representado por disponibilidades e créditos sobre e de terceiros.

3.1.2.9 - Do exposto no ponto anterior e atendendo às regras para determinação do justo valor estabelecidas no ponto 6 da Directriz Contabilística n°13/93 "Conceito de Justo Valor", afigura-se-nos que o justo valor dos activos e passivos da J., Lda., é necessariamente inferior ao custo de aquisição das partes de capital da sociedade a que respeitam, devendo nos termos do ponto 3.2.5. da Directriz Contabilística n°1/91, "a diferença ser reconhecida e amortizada numa base sistemática, num período que não exceda 5 anos, a menos que vida útil mais extensa possa ser justificada nas demonstrações financeiras, não excedendo porém 20 anos".
De acordo com o estabelecido no n.°1 da Directriz Contabilística n°12/92 "Conceito Contabilístico de Trespasse", "A rubrica "Trespasses" constante do Plano Oficial de Contabilidade destina-se a registar, exclusivamente, a diferença referida no ponto 3,2.5 da Directriz Contabilística n.°1 - "Tratamento Contabilístico de Concentrações e Actividades Empresariais".

Conclui-se assim, que as sociedades R., Lda. e I., Sa, não evidenciaram nas respectivas contabilidades, qualquer valor do trespasse intrínseco à aquisição da totalidade do capital da empresa J., Lda., sobreavaliando deste modo o valor de aquisição registado na conta 41 "Investimentos Financeiros", facto que se traduziu no apuramento de uma menos valia contabilístico/fiscal não efectiva, quando do "abate" das participações em questão, por via da dissolução e liquidação da J., no próprio ano em que foi adquirida.
Acresce ainda que, atendendo ao estabelecido no n°3 do art°17° do Decreto Regulamentar 2/90 de 12 de Janeiro, o deperecimento/amortização do trespasse não é aceite como custo fiscal, exceptuando-se os casos de deperecimento efectivo devidamente comprovado e com reconhecimento prévio da Direcção Geral dos Impostos.
A este propósito, reafirma-se a ideia expressa no ponto 3.1.2.4, ou seja, que a operação de trespasse invocada pelo sujeito passivo, no montante de 450.039.485$00, assegurou a continuidade do negócio da sociedade posteriormente liquidada, não se justificando portanto qualquer deperecimento.
3.1.2.10 - Face ao exposto, entende-se que a menos valia fiscal deduzida para efeitos de apuramento do lucro tributável consolidado do exercício de 1995 do grupo R., Lda., no montante de 1.906.369.390$00, apurada pela sociedade dominante R., Lda. (1.423.403.267$00) e pela sociedade dependente I., Sa (482.966.123$00), não consubstancia uma perda efectiva, não sendo como tal o correspondente custo enquadrável quer no art.23° do CIRC, quer na alínea b) do n°2 do art.67° do mesmo código, pelo que se procedeu à respectiva tributação.

3.2 - AO NÍVEL DAS DEDUÇÕES AO LUCRO TRIBUTÁVEL CONSOLIDADO
3.2.1 - Prejuízos Fiscais
Face às correcções positivas efectuadas ao nível do lucro tributável consolidado de 1995, no montante de 1.933.882.256$00, as quais implicaram que o mesmo passasse a ascender a 2.999.647.854$00 em vez de 1.065.765.598$00, tornou-se necessário proceder ao ajustamento de prejuízos fiscais a favor do grupo, na importância de 49.558,001 $00, correspondente à diferença entre o reporte de prejuízos fiscais de anos anteriores, susceptível de ser deduzido nos termos da alínea a) do artº 60° do CIRC (448.958.153$00) e o valor considerado pelo sujeito passivo neste contexto (399.400.152$00) (anexo n.°2, fls 2 a 4).
(…)
5 - DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO
Em 23/09/99, foi remetida à sociedade dominante do grupo R., Lda., a notificação sobre o projecto de conclusões do relatório de inspecção e respectiva fundamentação, nos termos do art.60° da Lei Geral Tributária e art.60° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, aprovado pelo Decreto - Lei n°413/98, para efeitos do exercício do direito de audição no prazo de 12 dias.
Neste âmbito deu entrada nesta Direcção de Serviços em 11/10/99 (dentro do prazo supramencionado), uma carta elaborada pela sociedade dominante, através da qual foi relativamente ao projecto de correcções referido em síntese o seguinte:
(...)
Pontos 1.1.3 e 2.1 - O sujeito passivo manifestou a sua discordância total quanto à correcção proposta ao nível das menos valias fiscais que foram declaradas em resultado da liquidação da empresa J., Lda. e do consequente "abate" das participações nela detidas, na importância 1.906.369.390$00, tendo alegado igualmente o facto de o ajustamento de prejuízos fiscais efectuado a favor do grupo, no montante de 49.558.001$00, se encontrar influenciado negativamente pela verba de 44.442.049$00, correspondente às correcções efectuadas à sociedade dominante no exercício de 1992, entendendo não haver lugar à correcção dos seus prejuízos fiscais declarados em 1992, enquanto a Administração Fiscal não emitir uma nota oficiosa das referidas correcções de 44.442.049$00.
Contudo, não foram apresentados pelo sujeito passivo elementos adicionais que permitam alterar o sentido das correcções inicialmente propostas, pelo que as mesmas foram mantidas na sua totalidade, respectivamente nos montantes de 1.906.369.390$00 e - 49.558.001$00.

12-Em 18 de Outubro de 1999 foi exarado despacho pelo Director de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária sobre o relatório da inspecção fiscal melhor identificado no ponto anterior concordando com as conclusões do mesmo e ordenado a remessa dos autos à repartição de finanças do …° Bairro Fiscal de Lisboa e a notificação do contribuinte (cfr.despacho constante de fls.126 do processo administrativo apenso);
13-Em 25 de Outubro de 1999 foi emitida a liquidação adicional de IRC n°… referente ao exercício de 1995 da impugnante, da qual resulta um montante total a pagar de PTE 1.060.016.271 (EUR 5.287.338,87) com data limite de pagamento em 20/12/1999 (cfr.documento junto a fls.36 do processo de reclamação graciosa apenso; informação exarada a fls.98 a 107 do processo de reclamação graciosa apenso);
14-A ora impugnante procedeu ao pagamento faseado da quantia resultante da liquidação identificada no ponto anterior, ao abrigo do regime de regularização de dívidas aprovado pelo Decreto-Lei 248-A/2002, de 14 de Novembro (cfr.documentos juntos a fls. 108 a 113, 136 e 137 dos presentes autos; documentos juntos a fls.38, 39, 41 a 45, 47 a 50, 52, 54, 56, 57, 59, 60 e 85 a 91 do processo de reclamação graciosa apenso; informação exarada a fls.98 a 107 do processo de reclamação graciosa apenso);
15-Em 20 de Dezembro de 1999 a ora impugnante interpôs reclamação graciosa dirigida ao Director Distrital de Finanças de Lisboa da liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 1995 melhor identificada no nº.13, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na qual pediu a anulação da liquidação na parte contestada, alegando para o efeito não serem devidas as correcções efectuadas à sua matéria colectável consolidada do exercício de 1995 no montante de PTE 1.906.369.390 (EUR 9.508.930,43) por entender que a sua conduta atendeu às exigências da legislação em vigor (cfr.articulado de reclamação junto a fls.3 a 12 do processo de reclamação graciosa apenso);
16-Em 20 de Dezembro de 1999 o processo de reclamação graciosa foi autuado pelos serviços do …° Bairro Fiscal de Lisboa com o n°… (cfr.autuação de fls.2 do processo de reclamação graciosa apenso);
17-Em 19 de Fevereiro de 2002 e em 23 de Janeiro de 2003 a ora impugnante requereu aditamentos à reclamação graciosa melhor identificada no ponto 15, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cfr.articulados juntos a fls.17 a 22 e 82 a 84 do processo de reclamação graciosa apenso);
18-Em 15 de Janeiro de 2004 foi emitida informação pelos serviços da Direcção de Finanças de Lisboa, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, propondo o indeferimento da reclamação graciosa melhor identificada no ponto 15, da qual consta o seguinte (cfr.informação exarada a fls.98 a 107 do processo de reclamação graciosa apenso):
(...)
Menos-Valia Fiscal Decorrente da Liquidação da J.
16°
A ora reclamante relevou na declaração de consolidação, uma menos valia fiscal e 1.906.369.390$00 (€ 9.508.930,43) referente ao resultado da liquidação da empresa J. Lda. de que eram detentoras do capital as sociedades R. Lda. (74,67% e I. SA (25,33%).
17°
A totalidade das quotas foram adquiridas em 03/04/1995 por escritura pública pelo valor de 2.400.000.000$00, montante que foi posteriormente rectificado para 2 482.696.494$00 (escritura pública de 17/11/1995).
18°
Ocorreu também em 03/04/1995 a efectivação de um trespasse de seis estabelecimentos comerciais arrendados a favor da R., Lda pelo valor de 450.039.485$00 mas na prática tratou-se apenas de uma transposição de valores contabilísticos, constantes em balanço (existências e mobilizado corpóreo) da J. para a R..
19°
Ainda no exercício de 1995, ocorreu a dissolução e liquidação da sociedade J., aprovada em Assembleia Geral de 20/12/1995, tendo-lhe sido atribuído um valor de global 576.327.104$00, correspondente à sua situação líquida à data de 19/12/95 constituída, unicamente por um activo de disponibilidades - depósitos bancários.
20°
Quer a R., Lda quer a I., SA, contabilizaram a totalidade das partes sociais adquiridas na conta 41.1- Investimentos Financeiros sem atenderem ao seu justo valor.
21°
Define a directriz contabilística n°1/91 que quando uma ou mais pessoas adquirem o controlo directo da totalidade de uma empresa, devem ser seguidos os princípios de compra normal dos activos, isto é deve atender-se ao seu justo valor.
22°
Sabendo que a J. apresentava em 03/04/95 uma situação líquida no valor 498.988,458$00 encontrado pela diferença entre um activo líquido de 919.892.831$00 e um passivo de 421.004.373$00 fica claro que o valor de aquisição das quotas daquela empresa acrescido da transferência de activos a que a ora reclamante designou de trespasse (2.932.735.979$00) excedeu mais que 5 vezes o seu valor patrimonial.
23°
Na avaliação de empresas é comum o recurso ao critério de avaliação designado de goodwill ou trespasse.
24°
O valor global das partes que constituem uma empresa encontra-se evidenciado no balanço, o qual é representativo da demonstração do património apresentando uma imagem apropriada e verdadeira da sua posição financeira (justo valor).
25°
O goodwill corresponde à importância que excede o justo valor e representa a valorização dos elementos intangíveis da empresa, não evidenciados no balanço, como por exemplo a quota de mercado que se adquiriu, a carteira de clientes e de encomendas, a qualidade dos recursos humanos, as relações com o ambiente externo, etc.
26°
E uma vez que as sociedades R. Lda e I., SA passaram a ser detentoras da totalidade da actividade empresarial da J. Lda por força do preceituado no n° 6 da Directriz Contabilística n° 12/92 o valor de aquisição de 2.932.735.979$00 em termos contabilísticos obrigatoriamente abrangerá:
a) A quantia referente ao justo valor dos activos adquiridos (e passivos assumidos).
b) A quantia relativa ao trespasse tal como está considerado no n°1 da presente Directriz.
27°
A ora reclamante na sua petição ao referir que "o goodwill de uma empresa consiste num valor que excede a situação líquida ou valor patrimonial de uma empresa e que é determinado pela diferença entre aquela e o valor presente dos seus resultados futuros", está a concordar com a sua existência no caso em apreço, assumindo implicitamente que está incorporado no valor de aquisição das partes de capital da J., contabilizado nas contas de investimentos financeiros da R., Lda e I., SA.
28°
Assim é porque, o valor por que foram adquiridas as quotas da J., existências e imobilizado corpóreo, afasta-se grandemente dos activos e dos passivos assumidos, existindo nessa transacção uma forte componente de goodwill que não foi espelhado na contabilidade conforme estipula o n°6 da Directriz Contabilística n°12/92.
29°
Não restam dúvidas que, não foram respeitadas as normas contabilísticas emitidas pela CNC (Comissão de Normalização Contabilística e que o valor registado na conta 41 imobilizações Financeiras das sociedades representadas pela ora reclamante está sobreavaliado tendo em conta o valor contabilístico dos elementos patrimoniais da J..
30°
Estes factos foram apurados em elementos objectivos constantes na contabilidade, e não se funda em qualquer presunção de um goodwill ficcionado como pretende fazer crer a reclamante.
31°
A Administração Fiscal não põe em causa nem os contratos de compra e venda das quotas e trespasse da J. nem o valor por que foram efectuadas estas operações (2.932.735.979$00) não utilizou o artigo 32°-A do CPT (actual 38.° da LGT), o que significa que está desprovido de fundamento o entendimento da ora reclamante de que houve uma utilização do método avaliação indirecta do lucro tributável.
32°
Na situação em apreço é possível comprovar através da contabilidade que a menos valia fiscal calculada, não corresponde a uma perda efectiva pois tem incorporada no preço de aquisição componente de goodwill que não desapareceu com a dissolução e liquidação da J..
33°
Esse goodwill, valor intrínseco consubstanciado num ganho em quota de mercado, segmento de mercado carteira de clientes, etc, foi acrescentado em 03/04/1995 às empresas R. e I. permaneceu nestas sociedades após a liquidação patrimonial da J., permitindo a obtenção de um incremento nos resultados presentes e futuros do grupo R..
34º
A ora reclamante com a aquisição das quotas da J. e trespasse pretendia tão-só adquirir os seus activos, para de seguida liquidar aquela empresa, mantendo-os com o uso existente mas agora na esfera da actividade económica da R. e da I..
35°
Afigura-se que o justo valor correspondente aos activos e passivos assumidos com a aquisição da empresa J., não sofreram qualquer diminuição até à data da sua dissolução.
36°
Não podendo o goodwill ser considerado corno parte integrante do valor da partilha porque ele não se extinguiu, permaneceu no interior do grupo R. e só terá repercussões fiscais quando o grupo for totalmente extinto.
37°
Ou seja a empresa adquirida (J.) não era igual à empresa objecto de liquidação pois, estava esvaziada de um valor, o goodwill correspondente ao valor intrínseco que comporta a adição de mais seis estabelecimentos comerciais à rede do grupo R., abarcando certamente localizações e quotas de mercado importantes para a estratégia do grupo.
38°
Concluímos portanto que a menos valia que a ora reclamante pretende ver deduzida como custo é ilusória, por não ser efectiva, na medida em que não houve uma perda no valor dos activos adquiridos.
39°
Em suma não houve a realização de menos valias nos termos da alínea i) do n°1 do artigo 23° do CIRC.
40°
Nestes termos consideramos improcedente a pretensão da ora reclamante.
(...);

19-Em 28 de Janeiro de 2004 foi exarado despacho pelo Director de Finanças Adjunto de Lisboa sobre a informação melhor identificada no ponto anterior, concordando com o teor da mesma e ordenando a notificação da ora impugnante "para o exercício do direito de audição nos termos da al. b) do n°1 do art.60° da LGT" (cfr.despacho constante de fls. 98 do processo de reclamação graciosa apenso);
20-Em 11 de Março de 2004 foi emitida "informação sucinta" pelos serviços da Direcção de Finanças de Lisboa, propondo a convolação em definitivo da proposta de decisão constante na informação de 15/01/2004 referida no ponto 18, uma vez que a reclamante não exerceu o direito de audiência prévia (cfr.informação exarada a fls.110 do processo de reclamação graciosa apenso);
21-Em 17 de Março de 2004 foi exarado despacho pelo Director de Finanças Adjunto de Lisboa sobre a informação melhor identificada no ponto anterior, concordando com o teor da mesma, convolando em definitivo o projecto de decisão e indeferindo o pedido da reclamante com os fundamentos constantes na informação referida no ponto 18 e no ponto anterior (cfr.despacho constante de fls.109 do processo de reclamação graciosa apenso);
22-Em 16 de Março de 2004 foi assinado o a/r que acompanhou o ofício da Direcção de Finanças de Lisboa n.° … datado de 12/03/2004 dirigido à ora impugnante, destinado a informá-la do indeferimento da reclamação graciosa e do teor do despacho melhor identificado no ponto anterior assim como da respectiva fundamentação (cfr. documentos juntos a fls.111, 112 e 113 do processo de reclamação graciosa apenso);
23-A p.i. da presente impugnação deu entrada no 2° juízo do TAF de Lisboa em 30 de Março de 2004, para onde foi remetida através de correio postal registado em 20 de Março do mesmo ano (cfr.carimbo aposto a fls. 3 dos presentes autos e registo postal aposto sobre o sobrescrito de envio junto a fls.125 dos presentes autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “...Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir...”.
X
A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, e especificados nos vários pontos da matéria de facto provada…”.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar procedente a impugnação pela sociedade recorrida intentada, assim anulando o acto de liquidação de I.R.C., na parte objecto dos presentes autos, mais ordenando a devolução de imposto liquidado e pago em montante superior ao devido, acrescido de juros indemnizatórios (cfr.nº.13 do probatório).
X
Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em síntese e como supra se menciona, que as menos-valias apuradas nos termos do artº.67, nº.2, al.b), do C.I.R.C., na redacção então aplicável, para serem dedutíveis como perdas de exercício deverão observar o regime estabelecido no artº.23, do mesmo diploma, no respeitante ao requisito da indispensabilidade para a realização dos proveitos sujeitos a imposto, revelando-se adequado, nesta perspectiva, questionar a diferença substancial existente entre o preço pago pela sociedade impugnante/recorrida, aquando da aquisição da empresa em causa, e o valor apurado na partilha, sendo certo que tais operações ocorreram no curto espaço de oito meses do ano em causa. Que a referida diferença substancial entre os sobreditos valores há-de justificar-se, unicamente, se for considerado que o valor pago na aquisição da sociedade "J., L.da." decorreu, não só do valor dos bens tangíveis mas também do valor da parte intangível do negócio, vulgarmente designada por goodwill, sendo assim patente que a menos-valia apurada só tem efectiva existência na contabilidade da impugnante/recorrida e carecendo, manifestamente, de correspondência económica e fiscal, dado ter sido motivada por uma deficiente contabilização do valor relativo à aquisição da participação social em questão, tudo razões pelas quais se deverá considerar que tal menos-valia, não realizada, por não corresponder a uma perda efectiva, não é susceptível de, nos termos do artº.23, do C.I.R.C., constituir um custo para efeitos de I.R.C., não sendo, também, enquadrável no artº.67, nº.2, al.b), do mesmo diploma, preceitos legais que resultam violados em consequência do entendimento que fundamenta a decisão recorrida (cfr.conclusões 1 a 6 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal pecha.
A base de incidência do I.R.C. encontra-se consagrada no artº.3, do C.I.R.C., sendo, nos termos do seu nº.2, definido o lucro tributável como o resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.
Por outro lado, é no artº.17 e seg. do mesmo diploma que se consagram as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no artº.23 quais os custos que, como tal, devem ser considerados pela lei.
Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/2/2012, proc.4690/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/5/2014, proc.7524/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Lex Lisboa 2000, 2ª. Edição, pág.237 e seg.; António Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pág.101 e seg.).
Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/2/2012, proc.4690/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc. 5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/5/2014, proc.7524/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.206 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, desde logo se dirá que a sociedade impugnante/recorrida era a entidade dominante de um grupo de empresas que, no ano de 1995, se encontrava abrangido pelo regime da tributação pelo lucro consolidado, nos termos do artº.59 e seg. do C.I.R.C., em vigor em 1995 (cfr.artºs.63 e seg., do C.I.R.C., na redacção da Lei 30-G/2000, de 29/12; artºs.69 e seg. do C.I.R.C., actualmente em vigor).
A figura jurídica do grupo de sociedades, prevista na legislação tributária em sede do C.I.R.C. (cfr.artº.59, do C.I.R.C.), é passível de ser doutrinariamente definida como um conjunto, mais ou menos vasto, de sociedades que, embora conservando as personalidades jurídicas próprias e distintas, se encontram em subordinação a uma direcção económica unitária e comum, conceptualização esta que possui por elementos fundamentais a independência jurídica das várias sociedades agrupadas, a falta de personalidade autónoma do grupo e a articulação do grupo através da direcção unitária. Assim, ainda que cada uma das sociedades englobadas possua, formalmente, os seus órgãos sociais próprios, enquanto centros de definição e execução das respectivas vontades sociais individuais, será o órgão de gestão da sociedade que dirige o grupo o responsável pela orientação dos sectores essenciais da vida do mesmo, mormente nos domínios financeiro e fiscal. Nesse sentido, a característica da direcção unitária permite distinguir a figura do grupo de sociedades de outras realidades, designadamente das coligações entre sociedades ou da participação de sociedades noutros entes societários (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/4/2012, proc.5315/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/9/2012, proc.5073/11; Gonçalo Avelãs Nunes, Tributação dos Grupos de Sociedades pelo Lucro Consolidado em Sede de I.R.C., Almedina, 2001, pág.15 e seg.; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª. edição, Coimbra Editora, 2007, pág.360 e seg.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao I.R.C., Almedina, Novembro de 2009, pág.148 e seg.).
O grupo de sociedades resulta de uma evolução natural e necessária das empresas, em face de condições de mercado cada vez mais complexas e competitivas, com vista a melhor exercerem a sua actividade, justificando-se que uma determinada sociedade opte por criar ou adquirir outra ou outras sociedades em detrimento de sistemas clássicos de crescimento, caracterizados pela criação de departamentos ou sucursais. Em face desta emergente realidade, torna-se legítimo para o legislador fiscal optar por um regime próprio de tributação, aplicável a grupos que assumam certas características e particularidades legalmente definidas, abstraindo-se da individualidade jurídica de cada uma das entidades que constituem o grupo e promovendo a sua tributação apenas como uma unidade. Assim, a opção pela tributação conjunta do grupo de sociedades em sede de imposto sobre o rendimento encontra-se fundamentada, num primeiro momento, no princípio da neutralidade na tributação dos rendimentos da actividade empresarial, na medida em que se defende que o sistema fiscal deve tributar o rendimento da mesma forma, independentemente da estrutura organizativa e da forma assumida pelas empresas no exercício da sua actividade. Visa-se, por este meio, que as soluções assumidas em matéria fiscal não condicionem as formas jurídicas adoptadas pelas empresas, aproximando a optimização dos lucros e as vantagens do investimento empresarial com os desvirtuamentos introduzidos por razões de natureza fiscal. Nesse sentido, justifica-se que, ao nível do grupo empresarial, seja dado o mesmo tratamento fiscal, em matérias de operações internas do grupo e de compensação de resultados negativos das sociedades integrantes, o qual se encontra reservado para as operações realizadas entre os vários sectores da mesma entidade jurídica. Em certos casos, o respeito pelo princípio da neutralidade do imposto só se consegue através de um regime de consolidação dos resultados, o qual derroga o princípio da personalidade do imposto e assim elimina as desvantagens da não neutralidade da tributação separada das sociedades pertencentes ao grupo (cfr.Gonçalo Avelãs Nunes, ob.cit., pág.45 e seg.).
A justificação desta figura jurídica e seu regime legal assenta, ainda, na defesa do princípio da capacidade contributiva como concretização do princípio da igualdade, na medida em que estes se apresentam como os limites das opções do legislador na estruturação do regime jurídico-fiscal aplicável ao grupo de sociedades, designadamente, em matéria de definição dos deveres inerentes à relação jurídica fiscal e de identificação e distribuição da responsabilidade fiscal no seio do grupo. A eliminação da dupla tributação económica dos dividendos surge, igualmente, como fundamento legitimador, cuja total concretização advém do apuramento de um único resultado tributável e de uma só liquidação, bem como da admissibilidade de compensação de perdas entre as sociedades integradas no grupo. A introdução do regime do grupo de sociedades deve desincentivar, igualmente, o recurso a meios fraudulentos de evasão fiscal no seio do mesmo, neutralizando as eventuais vantagens decorrentes do recurso às técnicas dos preços de transferência ou da sub-capitalização, bem como potencia a actividade económica das empresas sem que esteja em causa o combate à concorrência fiscal prejudicial. Em igual medida, tal regime jurídico preserva o princípio da liberdade de empresa (cfr.art.80, al.c), da Constituição da República Portuguesa), na vertente da liberdade de organização empresarial, devendo o legislador abster-se de introduzir obstáculos ou restrições injustificadas de natureza fiscal que contendam com o direito de livre organização empresarial, na opção por um grupo de sociedades. Atento o exposto, este regime jurídico apresenta, como vantagens fundamentais:
a) a possibilidade de adopção da forma societária mais adequada ao mercado, eliminando as desvantagens da não neutralidade da tributação separada de sociedades;
b) uma maior transparência e visibilidade dos fluxos entre as sociedades do grupo, os quais serão fiscalmente irrelevantes, afastando as vantagens de métodos evasivos;
c) a tributação conjunta faculta à A. Fiscal e à própria sociedade-dominante uma visão conjunta e mais aproximada da verdadeira situação financeira e patrimonial e da capacidade contributiva da unidade empresarial que constitui o grupo de sociedades;
d) por último, este regime de tributação constitui um instrumento útil, válido e adequado de apoio à reestruturação empresarial e de promoção da competitividade, mesmo a nível internacional (cfr.Gonçalo Avelãs Nunes, ob.cit., pág.50 e seg.).
Na teorização que desenvolve, a doutrina releva que os regimes de tributação dos grupos de sociedades se caracterizam, regra geral, por instituírem um procedimento que, em maior ou menor grau, abstrai da autonomia jurídica das entidades que integram os grupos e permite que, de alguma forma, a unidade formada pelas sociedades que constituem o grupo se reflicta nas operações de quantificação e liquidação, instituindo mecanismos de apuramento conjunto da matéria tributária ou, simplesmente, permitindo a compensação de resultados entre as várias sociedades. Adoptada por diversos sistemas jurídicos da União Europeia e, especialmente, por Portugal, o regime jurídico-fiscal do grupo de sociedades funda-se na denominada teoria da unidade, na qual se pugna pela consideração, para efeitos fiscais, do grupo de sociedades como uma unidade jurídica fictícia, deixando as sociedades integradas de ser sujeitos jurídicos diferentes, fruto da unidade económica que as congrega. Nesse sentido, a matéria colectável deve ser calculada de forma conjunta, dando lugar a uma única liquidação e eliminando a dupla tributação, sendo a respectiva base tributável apurada com recurso a dois tipos de operações, a saber:
a) a eliminação das operações internas realizadas no seio do grupo, só relevando as praticadas com terceiras entidades;
b) a compensação de perdas das várias sociedades componentes do grupo.
Em resultado da liquidação única, a tributação do grupo de sociedades gera apenas uma dívida tributária, cabendo à sociedade-dominante o dever de apresentação da declaração conjunta de rendimentos, na qual apura o resultado unitário a partir da matéria tributável apurada em conjunto, de acordo com as regras específicas aplicáveis aos grupos de sociedades. Importa, ainda, referir que este regime jurídico-fiscal é de aplicação voluntária, assumindo a sociedade-dominante o poder decisório de optar pela aplicabilidade do mesmo (cfr.Gonçalo Avelãs Nunes, ob.cit., pág.61 e seg.).
O legislador não assumiu, em concreto, uma definição específica de grupo de sociedades, embora preveja (cfr.artº.59, nºs.2 e 3, do C.I.R.C.) a concretização do perímetro de consolidação ao critério da sociedade-dominante deter o domínio total do capital social das demais sociedades integradas no grupo, na previsão do denominado grupo de domínio total, igualmente consagrado nos artºs.488 a 491, do C. S. Comerciais. Assim, o nível de integração entre as sociedades do grupo tem de ser especialmente intenso, para que o mesmo seja fiscalmente elegível, devendo apresentar-se como um grupo fortemente integrado, centralizado, estruturado e hierarquizado, no qual existam elevados níveis de participação no capital das várias sociedades-dominadas por parte da sociedade-dominante (cfr.Gonçalo Avelãs Nunes, ob.cit., pág.74 e seg.).
A realidade unitária fiscal que caracteriza o grupo de sociedades não coloca em crise a estrutura da relação jurídico-fiscal que se encontra subjacente às personalidades jurídicas de cada uma das sociedades componentes do grupo, as quais permanecem na posição jurídica de contribuintes (enquanto entidades que realizam o pressuposto de facto e que vão ver o seu rendimento tributado), não obstante a tributação dos seus rendimentos ser realizada conjuntamente e em observação dos encargos globalmente suportados, nos termos dos princípios que fundamentam este regime específico. Atenta a previsão do citado artº.59, do C.I.R.C., e a sua sistematização no diploma em apreço, as respectivas normas apenas têm eficácia em sede de regras de apuramento da matéria tributável, não alterando nem definindo nenhuma nova situação ou posição subjectiva passiva por parte do grupo, pelo que a doutrina defende não poder este assumir o cariz de contribuinte ou de sujeito passivo “strictu sensu”. Neste sentido, o regime de tributação do lucro consolidado pode definir-se como consistindo num mero método de quantificação da matéria tributável das várias sociedades que integram o grupo, método segundo o qual, partindo-se do resultado individual de cada uma das sociedades, determinado de acordo com a regras gerais, se procede às devidas correcções, em resultado, designadamente, da eliminação das operações internas do grupo conforme mencionado supra, e se efectua a soma algébrica desses resultados corrigidos, quantificando-se a matéria tributável do grupo de sociedades, e procedendo-se, por fim, à liquidação e às deduções à colecta que tiverem lugar (cfr.Gonçalo Avelãs Nunes, ob.cit., pág.89 e seg.).
Evidencia-se, ainda que, em consequência da previsão normativa inserta no artº.92, do C.I.R.C., na definição da responsabilidade fiscal dos entes integrados no grupo de sociedades, o legislador fiscal consagrou que a sociedade-dominante se assume como devedora principal e originária da prestação tributária devida pelo grupo, sendo as sociedades-dominadas subsidiariamente responsáveis em relação ao devedor principal e solidariamente entre si. Como consequência do acabado de mencionar, cabe exclusivamente à sociedade-dominante, nos termos do artº.96, nº.6, do C.I.R.C., o dever de entregar a declaração periódica referente aos rendimentos do grupo, cuja quantificação e apuramento vai obedecer às regras específicas do regime de tributação do lucro consolidado, bem como as declarações periódicas individuais de cada sociedade pertencente ao grupo, elaboradas de acordo com as regras gerais de apuramento da matéria tributável em sede de I.R.C. No entanto, as declarações individuais de rendimentos das sociedades constituintes dos grupos tributados sob o regime de consolidação não dão origem a liquidações directas de I.R.C., antes tendo fins meramente estatísticos e de análise sectorial dos respectivos elementos, sendo que todas as correcções que sobre as mesmas recaiam produzem efeitos na declaração de rendimentos do grupo (cfr.Gonçalo Avelãs Nunes, ob.cit., pág.114 e seg.).
Voltando ao caso concreto, na correcção de natureza meramente aritmética em exame nos presentes autos, a A. Fiscal entendeu que a menos-valia deduzida pela sociedade impugnante/recorrida para efeitos de apuramento do lucro tributável consolidado do exercício de 1995, no montante de 1.906.369.390$00 (€ 9.508.930,43) só tem efectiva existência na contabilidade da mesma e carecendo, manifestamente, de correspondência económica e fiscal, dado ter sido motivada por uma deficiente contabilização do valor relativo à aquisição da participação social em questão, tudo razões pelas quais se deverá considerar que tal menos-valia, não realizada, por não corresponder a uma perda efectiva, não é susceptível de, nos termos do artº.23, do C.I.R.C., constituir um custo para efeitos de I.R.C., não sendo, também, enquadrável no artº.67, nº.2, al.b), do mesmo diploma, em consequência do que procedeu à respectiva tributação (cfr.nº.11 do probatório).
O Tribunal "a quo" decidiu que tal correcção ao lucro tributável consolidado da sociedade impugnante/recorrida era ilegal, visto padecer do vício de violação de lei, mais exactamente dos artºs.23, nº.1, al.i), e 67, nº.2, al.b), do C.I.R.C.
Vejamos quem tem razão.
Constitui prejuízo fiscal o saldo negativo entre os proveitos ou ganhos e demais variações patrimoniais positivas e os custos ou perdas e demais variações patrimoniais negativas susceptíveis de concorrer para o lucro tributável de um sujeito passivo de I.R.C. num dado período de tributação. O prejuízo fiscal é, em princípio, um corolário da periodização do lucro tributável, isto é, constitui, tendencialmente, uma mera consequência da particular extensão temporal do período por referência ao qual se determina a obrigação de imposto (cfr.artº.46 e seg., do C.I.R.C., em vigor em 1995; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/4/2012, proc.5315/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/9/2012, proc.5073/11; J. L. Saldanha Sanches e Outros, Reestruturação de Empresas e Limites do Planeamento Fiscal, Coimbra Editora, 2009, pág.111 e seg.; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.405 e seg.).
Prevê o artº.23, nº.1, al.i), do C.I.R.C., que são considerados custos ou perdas, nomeadamente as menos-valias realizadas.
Deve entender-se que a mera menção a “menos-valias realizadas” na al.i), do nº.1, do referido artº.23, do C.I.R.C., não confere, só por si, a aquisição de todos os requisitos para os valores assim considerados serem aceites como componentes negativas do rédito, pois que não podem deixar de ficar, como acontece com todos os demais custos ou perdas na mesma norma enumerados, sujeitos ao escrutínio do corpo do nº.1, do referido preceito, portanto que se afigurem como comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 17/4/2012, proc.5315/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/9/2012, proc.5073/11).
Segundo a doutrina a menos-valia pode definir-se como uma perda de valor económico de um activo empresarial devido a causas físicas (deterioração), técnicas (obsolência) ou económicas, sendo estas derivadas de uma baixa de preço no mercado (cfr.José María Lozano Irueste, Dicionário abreviado de Economia, Campo das Letras, 1999, pág.170 e seg.).
Em sede de I.R.C., o legislador dispõe que são consideradas menos-valias realizadas (por contraposição às menos-valias latentes) as perdas sofridas relativamente a elementos do activo imobilizado mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere (cfr.artº.42, nº.1, do C.I.R.C.). As menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das reintegrações ou amortizações praticadas (cfr.artº.42, nº.2, do C.I.R.C.). O valor de realização é definido nas diversas alíneas do nº.3, do artº.42, do C.I.R.C. (cfr.Rui Duarte Morais, Apontamentos ao I.R.C., Almedina, Novembro de 2009, pág.144 e seg.; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.369 e seg.).
Examinando, agora, o regime de liquidação de sociedades, dir-se-á que, com a dissolução de uma sociedade, termina a prossecução do seu objecto social e dá-se início imediato à fase da sua liquidação e partilha. A liquidação consiste no conjunto de actos realizados com vista à satisfação dos direitos de terceiros e a realização de activos com vista à repartição pelos sócios do conjunto de valores a partilhar (cfr.artº.65 e seg. do C.I.R.C.; artºs.141 e 146, do Código das Sociedades Comerciais; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 17/4/2012, proc.5315/12; Raúl Ventura, Dissolução e Liquidação de Sociedades, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Almedina, 1987, pág.212 e seg.).
Especificamente, o artº.67, do C.I.R.C., define a natureza dos rendimentos gerados numa operação de partilha, estabelecendo que é englobado para efeitos de tributação dos sócios, no exercício em que for posto à sua disposição, o valor que for atribuído a cada um deles em resultado da partilha, abatido do preço de aquisição das correspondentes partes sociais.
Nestes termos, deve comparar-se o valor recebido com o valor pelo qual foram adquiridas as partes sociais sendo a diferença (cfr.artº.67, nº.2, al.b), do C.I.R.C., na versão em vigor em 1995), quando negativa, considerada como menos-valia (cfr.J. L. Saldanha Sanches, Os limites do planeamento fiscal, Coimbra Editora, 2006, pág.219 e seg.; J. L. Saldanha Sanches e Outros, Reestruturação de Empresas e Limites do Planeamento Fiscal, Coimbra Editora, 2009, pág.202 e seg.).
Chama, ainda, o recorrente à colação o conceito de goodwill, enquanto parte intangível da sociedade "J., L.da." adquirida pela impugnante/recorrida e que não terá sido levada em consideração na contabilização das menos-valias desconsideradas pela A. Fiscal, visto não corresponderem a uma perda efectiva.
O valor do goodwill de uma empresa estará sempre relacionado com a capacidade de criação de lucros dessa empresa, a qual pode derivar de diversos vectores (v.g.superior capacidade de gestão; marketing e publicidade eficaz; localização estratégica). Em termos contabilísticos o goodwill é caracterizado como um activo intangível que somente é reconhecido quando se verifica uma transacção de compra de uma empresa, através da diferença verificável entre o preço pago e o justo valor dos respectivos activos líquidos. O reconhecimento do goodwill pela adquirente radica na exploração de vantagens que esta pode retirar do negócio da empresa adquirida, reconduzindo-se a um valor de difícil mensuração contabilística (cfr.António Martins, Justo valor e Imparidade em Activos Fixos Tangíveis e Intangíveis, Aspectos Financeiros, Contabilísticos e Fiscais, Almedina, 2010, pág.147 e seg.; Tomás Cantista Tavares, IRC e Contabilidade, Da Realização ao Justo Valor, Almedina, 2011, pág.131).
Revertendo ao caso dos autos, resulta do probatório (cfr.nº.11 da matéria de facto supra exarada) que a menos valia foi contabilizada pela impugnante/recorrida com recurso à operação prevista no citado artº.67, do C.I.R.C., a saber, através do cálculo da diferença entre o preço que pagou pelas participações sociais e o valor atribuído em resultado da partilha, tendo este sido, respectivamente, de PTE 430.343.449$00 (74,67% x PTE 576.327.104$00) e de PTE 145.983.655$00 (25,33% x PTE 576.327.104$00), dado o balanço da sociedade liquidada "J., L.da.", reportado a 20/12/95, evidenciar um activo de PTE 576.327.104$00 (cfr.ponto 3.1.2.6. do relatório de inspecção constante do nº.11 do probatório).
Aliás, a A. Fiscal não põe em causa o preço efectivamente pago pela sociedade impugnante/recorrida e pela I. pelas participações sociais da "J., Lda." (cfr.nºs.2 e 4 do probatório).
Por outro lado, em sede do artº.23, do C.I.R.C., conforme mencionado supra, as menos-valias apuradas apenas poderiam ser desconsideradas enquanto custo fiscal dedutível se se verificasse que não tinham sido realizadas no interesse da empresa em ordem (directa ou indirectamente) à obtenção de lucros. Estando em causa custos correspondentes às menos-valias decorrentes da extinção de sociedades tendo em conta o preço de aquisição das suas participações sociais, não se descortina como é que é possível não considerar que esse diferencial entre o custo de aquisição e o de realização se não repercute nas sociedades adquirentes. Com efeito, tais elementos integravam o activo das empresas, na medida em que as mesmas suportaram um custo na respectiva aquisição que tiveram de contabilizar. Ora, este custo da aquisição é que poderia ser posto em causa nos termos do artº.23, do C.I.R.C., alegadamente, por não ter qualquer interesse para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora. Tal significa que a partir do momento que se aceita este custo, a menos-valia resultante da dissolução e liquidação da sociedade adquirida não poderá ser desconsiderada com fundamento no mesmo artº.23, do C.I.R.C. A indispensabilidade do custo há-de resultar simplesmente da sua ligação à actividade empresarial. Se o custo não é estranho à actividade da empresa, isto é, se se relaciona com a actividade normal da empresa, reveste a natureza de indispensável.
Quanto ao enquadramento no aludido artº.23, do C.I.R.C., deve apelar-se a três subsídios jurisprudenciais relativos à aplicação de tal normativo:
1-É entendimento da jurisprudência que a A. Fiscal não pode avaliar a indispensabilidade dos custos à luz de critérios incidentes sobre a oportunidade e mérito da despesa de cariz subjectivista. Um custo é indispensável quando se relacione com a actividade da empresa, sendo que os custos estranhos à actividade da empresa serão apenas aqueles em que não seja possível descortinar qualquer nexo causal com os proveitos ou ganhos (ou com o rendimento, na expressão actual do código - cfr.artº.23, nº.1, do C.I.R.C.), explicado em termos de normalidade, necessidade, congruência e racionalidade económica (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 21/04/2010, rec.774/09; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/02/2008, rec.798/07; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/11/2009, proc.3253/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2015, proc.5327/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15);
2-Um custo indispensável não tem de ser um custo que directamente implique a obtenção de proveitos. Há vários custos que só mediatamente cumprem essa função e que, nem por isso, deixam de ser considerados indispensáveis, nos termos do artº.23, do C.I.R.C. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/6/2011, proc.4589/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2015, proc.5327/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/2/2015, proc. 8137/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15);
3-A questão do ónus da prova da indispensabilidade do custo passa ao lado da presunção de veracidade da escrita correctamente organizada (cfr.artº.75, nº.1, da L.G.T.) pois não se questiona a veracidade (existência e montante) da despesa contabilizada mas a sua relevância, face à lei, para efeitos fiscais, no caso, da sua qualificação como custo dedutível, em sede do citado artº.23, do C.I.R.C. (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/2/2010, proc.3669/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2015, proc.5327/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/2/2015, proc. 8137/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8473/15).
Naturalmente que a questão da prova da dispensabilidade do custo depende do caso concreto, consubstanciando um processo dialógico. Num primeiro momento, o contribuinte afirma a indispensabilidade do custo através da sua contabilidade (cfr.artº.75, nº.1, da L.G.T.; artº.76, nº.2, do C.P.T.), sendo que a A. Fiscal o coloca em causa. A partir daqui, a intensidade dos deveres de prova do sujeito passivo varia com as circunstâncias do caso e o grau de normalidade da situação. Se estivermos perante um custo que indicie confusão de esferas patrimoniais ou outro tipo de fraudes, a intensidade de prova é maior para o contribuinte do que para a Fazenda Pública. Caso contrário, não se verifica qualquer acréscimo de intensidade dos deveres probatórios do sujeito passivo.
"In casu", a A. Fiscal não conseguiu fazer prova da alegada falta de contabilização do goodwill, enquanto parte intangível da sociedade "J., L.da." adquirida pela impugnante/recorrida e que não terá sido levada em consideração na contabilização das menos-valias em causa nos autos, sabendo-se das dificuldades de mensuração contabilística do mesmo, pelo falecem os pressupostos da liquidação adicional realizada, por dificuldades de enquadramento nas normas chamadas à colação.
Em conclusão, a liquidação objecto dos presentes autos, na parte impugnada, padece do vício de violação de lei, concretamente dos artºs.23, nº.1, al.i), e 67, nº.2, al.b), do C.I.R.C., na versão em vigor em 1995, nesta medida se confirmando a decisão do Tribunal "a quo".
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 14 de Abril de 2016



(Joaquim Condesso - Relator)


(Jorge Cortês - 1º. Adjunto)



(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)