Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:860/10.7BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:11/14/2019
Relator:MÁRIO REBELO
Descritores:ISENÇÃO DE IMT;
CADUCIDADE.
Sumário:A isenção a que alude o n.º 1 do art. 7º do CIMT ficará sem efeito logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda (art.º 11º/5 CIMT).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


RECORRENTE: P…….. – S……. S.A e Exmo. Representante da Fazenda Pública.
RECORRIDOS: Os mesmos.
OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pelo MMº juiz do TAF de Sintra que julgou parcialmente procede te a impugnação deduzida contra a liquidação de IMT no montante de € 74.546,29 e juros compensatórios.
CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:
I)
Conclusões do Recurso de P………
I- Salvo o devido respeito, não podia a sentença a quo considerar provada caducidade da lsenção tributária à impugnante, por existência de revenda para efeitos do CIMT, quando inexiste no processo qualquer elemento que demonstre ter sido essa a vontade real das partes.
Retira-se claramente da escritura e da declaração do Banco ….., que a intenção de construção de uma moradia no imóvel que foi o objecto de negócio.
11 -A construção dessa moradia impede que a posterior venda do imóvel seja considerada revenda para efeitos do CIMT.
111 - A Referência à compra para revenda é resultado de um erro de interpretação do conceito de revenda.
IV- O Tribunal a quo não procedeu à devida interpretação do conceito de revenda, essencial para a decisão da causa.
V - Com o devido respeito o Tribunal a quo não procedeu à correcta interpretação do art.º 11 n°5 do CIMT cuja ratio pretende evitar que a uma isenção para revenda se suceda outra isenção para revenda.
VI - O Tribunal a quo não procedeu à inquirição de testemunhas situação que se mostrou prejudicial para a descoberta da verdade .
VIl - A ora Recorrente nunca foi notificada para se pronunciar sobre a dispensa de inquirição de testemunhas que arrolou.

VIII - Tivesse havido inquirição de Testemunhas e o Tribunal a quo teria percebido que a referência à revenda consubstancia um lapso e que as partes não tinham naquele momento presente o conceito de revenda para efeitos do CIMT.

IX Pelo que, a sentença a quo, ao não respeitar o principio de contraditório e a furtar a impugnante de produzir prova testemunhal, e ao cingir a prova aos elementos documentais, não conheceu de meios de prova relevantes.

X Sendo que também por esta razão deve ser revogada a sentença, na parte em que tacitamente, indeferiu a inquirição de testemunhas arroladas na petição inicial, se na petição inicial são alegados factos com relevo para a apreciação desses outros vícios e a prova testemunhal é adequada à sua aferição.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Ex.a doutamente suprirá, deve o presente recurso ser considerado procedente por provado, e em consequência ser revogada a sentença recorrida

Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!


II
Conclusões do recuso do Exmo. Representante da Fazenda Pública
II) No caso dos autos, entendeu a douta sentença que não obstante a indicação ao ora Impugnante do montante sobre o qual os juros incidiram e bem assim do período no qual se compreendem, a liquidação de juros compensatórios não se encontra devidamente fundamentada porque não foi notificada ao contribuinte a taxa aplicada para obter o valor dos juros compensatórios devidos.
III) Verifica-se, todavia, que os elementos que foram dados a conhecer ao contribuinte permitem o conhecimento da taxa de juros aplicada.
IV) Ao Impugnante (além das razões para a liquidação corporizadas no Relatório e Inspecção) foi dado conhecer o montante sobre o qual os juros incidiram, o período no qual se compreendem, e também o efectivo resultado da operação de liquidação dos juros compensatórios, a qual consubstancia uma mera operação aritmética
V) E pela operação aritmética inversa da que levou ao apuramento do montante de juros compensatórios comunicado ao contribuinte, i.e., dividindo o valor de € 9452.04 pelo valor sobre o qual incidiu a taxa, € 65.094,25, e pelo n.º de dias correspondente ao período a que os juros respeitam, 1325, obtemos o valor da taxa diária de juro aplicada, isto é 0,00011.
VI) Valor correspondente a uma taxa anual 4% (valor da taxa de juros legal e de juros compensatórios à data dos factos)
VII) Verifica-se, deste modo, que a liquidação de juros compensatórios notificada ao Impugnante se encontra fundamentada nos termos do art. 35º n.º 9 da LGT, pois, não obstante não se encontrar indicado expressamente o valor da taxa diária de juros ou da taxa anual, a mesma resulta necessariamente dos valores comunicados ao Impugnante.
VIII) Assim, perante os valores comunicados ao Impugnante, dos quais decorre também a possibilidade de confirmar qual o valor da taxa efectivamente aplicada, resulta evidente que ao contribuinte foram dados todos os meios necessários para a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo percorrido pela autoridade que praticou o acto, de forma a poder saber-se claramente as razões por que decidiu da forma que decidiu e não de forma diferente, encontrando-se, nessa medida, cumpridas as exigências legais de fundamentação, nomeadamente previstas no art. 35º n.º 9 da LGT, que visam, afinal, que o contribuinte possa optar conscientemente entre o conformar-se com o acto, aceitando a sua legalidade, ou contra ele reagir administrativa ou contenciosamente
IX) A sentença recorrida, ao assim não entender, apresenta-se ilegal por desconformidade com os preceitos acima assinalados, não devendo por isso ser confirmada.
Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá ser considerado procedente o recurso e revogada a douta sentença recorrida, como é de Direito e Justiça.

CONTRA ALEGAÇÕES.

Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência dos recursos e confirmação da sentença recorrida.

II QUESTÕES A APRECIAR.

O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou ao julgar improcedente a impugnação quanto à liquidação do IMT e procedente a liquidação relativa a juros compensatórios, por falta de fundamentação.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:

A) Em 26.01.2005 a Impugnante celebrou escritura pública de compra e venda junto do sexto cartório notarial de Lisboa, através da qual declarou comprar para revenda o lote de terreno para construção, designado por lote …-14, sito na Q…….., freguesia e concelho de C……, descrito na Primeira Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o nº 81…, e inscrito na matriz sob o nº 119… (cfr. fls. 94 a 97 da Reclamação Graciosa apensa, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido).

B) Na aquisição mencionada na alínea antecedente, a Impugnante beneficiou da isenção de IMT, nos termos do artigo 7º do CIMT (cfr. fls. 96 da Reclamação Graciosa apensa).

C) Em 11.05.2006 foi celebrada, no Cartório Notarial de R……, escritura de compra e venda do imóvel referidos em A), pela qual a Impugnante declarou alienar tal imóvel a “M…. – C……… Públicas, Lda”, tendo a sociedade adquirente declarado que o imóvel se destinava a revenda (cfr. fls. 14 a 20 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).

D) Na aquisição mencionada na alínea antecedente, a sociedade adquirente “M........, Lda” beneficiou da isenção de IMT, nos termos do artigo 7º do CIMT (cfr. fls. 19 dos autos).

E) Na mesma escritura mencionada em C) foi também declarado por representante do “B….. – B……, S.A.” que concedia à “M........, Lda” um empréstimo no montante de 1.400.000,00€, destinado à aquisição do lote de terreno e à construção de uma moradia no mesmo lote.

F) Em 10.11.2006 a sociedade “M........, Lda” apresentou requerimento junto do Serviço de Finanças de Cascais 1 com o seguinte teor:

“Venho por este meio requerer a liquidação do IMT, do Lote …14, situado no Distrito de Lisboa, Concelho de cascais, Freguesia de C……, Rua dos L……., Q….. 2750-…. Cascais, adquirido pelo valor de um milhão cento e sessenta e sete mil cento e oitenta e sete euros e oito cêntimos (1.167.187,08€), por motivos de alteração do destino pelo qual este foi adquirido.

(…)”

(cfr. fls. 25 dos autos).

G) Em 10.11.2006 a sociedade mencionada na alínea antecedente efectuou o pagamento do IMT no montante de 75.867,16€, constando do documento de pagamento/liquidação como descrição o seguinte:

“Nesta data compareceu o acima identificado contribuinte que declarou pretender pagar o IMT devido, por ir dar destino diferente ao imóvel, adquirido com isenção de IMT para revenda cuja escritura foi efectuada em 11/5/2006 no Cartório Notarial de Lisboa, em que pelo valor de 1.167.187,08€ adquiriu a P........ S……, S.A.(…)” (cfr. fls. 26 dos autos).

H) Em 16.11.2009 representante da Impugnante e da sociedade “M........, Lda”, assinaram perante o Notário L……., o escrito denominado de “Rectificação”, no qual declararam em nome das sociedades suas representadas, o seguinte:

“(…)

Declararam:

Que por escritura outorgada em 11/05/2006, perante a notária de Lisboa R……., lavrada a folhas trinta e nove e seguintes do livro de notas para escrituras diversas número vinte - A, no contrato de compra e venda aí titulado, a sociedade M........ C…. Públicas, S.A., comprou à sociedade P........ – S……., S. A., pelo preço de um milhão cento e sessenta e sete mil cento e oitenta e sete euros e oito cêntimos, o imóvel inscrito na matriz sob o artigo 119… da freguesia de C….., concelho de cascais, e nessa escritura devidamente identificado;

Que, ficou consignado que o mencionado imóvel seria destinado a revenda;

Que, em virtude de terem ocorrido alterações supervenientes já durante o ano de 2006, rectificam a identificada escritura, no sentido de que a sociedade compradora não destina o imóvel adquirido a revenda, atribuindo-lhe por isso destino diferente.

Que inclusivé, a sociedade compradora em 11/10/2006 procedeu ao pagamento do correspondente IMT.

E que em tudo o mais mantêm a escritura rectificanda”.

(cfr. fls. 22 a 24 dos autos).

I) Através do ofício nº 017… de 02.02.2010 foi comunicado à Impugnante para efeitos de audição prévia o projecto de liquidação de IMT, sendo junta a demonstração da liquidação de IMT com os seguintes elementos:

“IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE AS TRANSMISSÕES ONEROSAS DE BENS DEMONSTRAÇÃO DA LIQUIDAÇÃO

Sujeito passivo - P........ S………. - SA

NIPC -506.001….

Data da transmissão 26 de Janeiro de 2005

Valor sujeito a imposto 1.001.400,00 euros 1.001.400,00 x 6,5% =65.094,25 Imposto devido €65.094,25

JUROS COMPENSATÓRIOS.

Juros desde 11 de Junho de 2006 a 26 de Janeiro de 2010, no montante de €9.452,04. Montante total devido € 74.546,29.

Serviço de Finanças de Cascais 1 - 2010-01-26-“ (cf. fls. 41 do PA”

J) Através de ofício de 19.02.2010 do Serviço de Finanças de Cascais 1 foi notificada a Impugnante da liquidação ora impugnada, contendo o referido ofício o seguinte teor:

“Fica V. Exa. por este meio notificada que por despacho de hoje, de 19/02/2010, cuja cópia se junta, foi convertido em definitivo o projecto de liquidação de IMT que lhe foi comunicado pelo ofício nº 17…, de 02/02/2010. Pelo que nestes termos deverá solicitar no prazo de 10 (dez) dias a contar da assinatura do aviso de recepção, neste Serviço de Finanças, o pagamento do IMT que se mostra devido no valor total de 74.546,29 euros (setenta e quatro mil quinhentos e quarenta e seis euros e vinte e nove cêntimos), correspondendo 65.094,25 euros a IMT e 9.452,04 euros a Juros compensatórios, pela compra que fez para revenda em 26/01/2005, por escritura lavrada no 6° Cartório Notarial de Lisboa, do prédio urbano constituído por lote de terreno para construção sito na Q…….., lote …. 14, Freguesia e Concelho de C….., inscrito sob o artigo nº119…, da qual ficou isento de IMT nos termos do nº1 do art°7° do CIMT, benefício que caducou ao abrigo do nº5 do art° 11 ° do mesmo Diploma legal, por ter revendido novamente para revenda em 11/05/2006, e não solicitou o pagamento do IMT conforme o estabelecido no art°34° do CIMT, de acordo com o relatório da Inspecção Tributária.

Caso não efectue o pagamento voluntário dentro do prazo acima indicado, será extraída certidão de dívida, para efeitos de cobrança coerciva.

Mais fica notificado que esta liquidação é susceptível de reclamação graciosa ou de impugnação judicial, sem carácter suspensivo, a interpor no prazo de 120 dias ou 90 dias, respectivamente, a partir da data acima referida, nos termos dos artigos 70º e 102º do Código do procedimento e do Processo Tributário (CPPT), e com base nos fundamentos referidos no art°99° do referido Diploma.” (cfr. fls. 37 dos autos).

K) A presente impugnação judicial foi apresentada em 26.05.2010 (cfr. fls. 5 dos autos).

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.

****

Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na posição factual expressa pelas partes na p.i., contestação, na prova documental junta aos autos e no processo administrativo em apenso.

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

A Impugnante deduziu impugnação judicial dizendo em síntese, ter alienado o lote para construção sito na Q..........., lote ... 14, em 11/5/2006, à sociedade M........, contudo tal venda destinou-se não a revenda mas à compra para construção de uma moradia por parte da adquirente, e apenas por lapso manifesto foi referido na escritura que a compra se destinava a revenda.

Lapso que foi corrigido pela retificação da escritura por via da qual se eliminou a referência a compra para revenda. Mas do próprio texto original resulta que nunca houve qualquer intenção de revenda por parte da compradora, que destinava o imóvel à construção.

A sociedade adquirente, no mesmo exercício de 2006, procedeu à liquidação e entrega do IMT respetivo.

A AT apesar de ter recebido da compradora o valor do IMT pago, continua a pugnar pela caducidade da isenção de IMT relativamente à alienante, ignorando a vontade real das partes.

Ou seja, a isenção de que beneficiava a Impugnante não caducou. E além disso, a liquidação dos juros compensatórios não está fundamentada.

Com remissão para informação prestada pela Divisão de Justiça Contenciosa, o Exmo. Representante da Fazenda Pública contestou por exceção e por impugnação. Por exceção, alegou que a petição inicial não identifica o acto impugnado, e que notificação a que o contribuinte se refere na douta petição inicial é apenas um ofício a notificar o contribuinte para exercer o direito de audição, o que torna petição inicial inepta.

E quanto à não caducidade do direito à isenção do IMT, a venda efetuada pela Impugnante segundo a qual o imóvel teria como fim a revenda, conduz de imediato à cessação da isenção anteriormente beneficiada, conforme n.º 5 do artigo 11º do CIMT.

Os factos praticados posteriormente à transação pelo novo adquirente, são independentes da transação em análise, razão pela qual deveria a empresa em cumprimento do art. 34º do CIMT, solicitar nos 30 dias seguintes a respetiva liquidação de IMT.

E quanto aos juros compensatórios, quando foi remetido à impugnante o projecto de liquidação de IMT ficou demonstrada não só os dias mas também o valor base sobre o qual incide a taxa. Além disso, o contribuinte foi notificado para exercício do direito de audição e nada disse sobre os juros compensatórios e tão pouco usou da faculdade prevista no n.º 1 do art.º 37º do CPPT.

Proferida sentença, o MMº juiz julgou improcedente a exceção de ineptidão da petição inicial e quanto ao mérito da questão julgou improcedente a impugnação.

Mas julgou procedente a falta de fundamentação dos juros compensatórios anulando a liquidação nesta parte.

A Impugnante/Recorrente não se conforma e defende que não existe no processo qualquer elemento que demonstre ser a vontade real das partes a venda para revenda.

Até porque se retira da escritura e da declaração do BPN que a intenção de construção de uma moradia que foi objecto de negócio, o que impede que a posterior venda do imóvel seja considerada revenda para efeitos de IMT.

O tribunal não interpretou corretamente o n.º 5 do art.º 11 do CIMT.

Por outro lado, o tribunal não procedeu à inquirição das testemunhas o que se mostrou prejudicial para a descoberta da verdade.

A Recorrente também nunca foi notificada para se pronunciar sobre a dispensa de inquirição das testemunhas, assim violando o princípio do contraditório.

Enunciadas as questões submetidas pela Recorrente, avancemos para sua apreciação, antecipando desde já que as conclusões de recurso não podem proceder.

Resulta do disposto no art. 7º/1 do CIMT, a isenção de IMT nas aquisições de prédios para revenda, desde que se verifique ter sido apresentada antes da aquisição a declaração prevista no art.º 112º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) ou na alínea a) do n.º 1 do artigo 109º Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), consoante o caso, relativa ao exercício da atividade de comprador de prédios para revenda.

Mas esta isenção ficará sem efeito, diz o n.º 5 do art. 11º do CIMT, logo que se verifique que aos prédios adquiridos para revenda foi dado destino diferente ou que os mesmos não foram revendidos dentro do prazo de três anos ou o foram novamente para revenda.

Assim, no caso dos autos sabendo que o prédio constituído pelo lote de terreno para construção sito na Q..........., lote ... 14, artigo 119…, isento de IMT na aquisição por força do n.º 1 do art. 7º CIMT, interessa saber se a venda a “M........ – Lda.” realizada por escritura de 11/5/2006 fez, ou não, caducar a isenção.

Para isso, de entre os pressupostos previstos para a caducidade da isenção de IMT, interessa indagar se a venda se destinou a revenda, ou não.

Não há quaisquer dúvidas que a venda referida se destinou a revenda e foi isso que os outorgantes declaram na respetiva escritura, com consta da alínea C) dos factos provados. E foi também por isso que a adquirente “M........, Lda” beneficiou da isenção de IMT, nos termos do art.º 7º do CIMT.

A Recorrente sustenta que a referência à compra para revenda é “resultado de um erro de interpretação do conceito de revenda”.

Porém, não vemos que outra interpretação possa haver quando na escritura se declarou que “...o identificado imóvel se destina a REVENDA” (sic).

É certo que na mesma escritura a adquirente “M........ Lda.” mutuou a quantia de € 1.400.000,00 destinado à aquisição do referido lote e à construção de uma moradia no mesmo lote, mas daí não se retira que não destinasse o prédio a revenda.

Se não, porque o declarou na escritura?

E porque razão não procedeu logo à liquidação de IMT, devido pela aquisição?

E porque razão na escritura de retificação outorgada em 16/11/2009 declaram os mesmos outorgantes que “...em virtude de terem ocorrido alterações supervenientes já durante o ano de 2006 (...) a sociedade compradora não destina o imóvel adquirido a revenda, atribuindo-lhe por isso destino diferente”.

Ou seja, não foi invocado qualquer lapso na declaração, mas sim a ocorrência de alterações supervenientes

De tudo o exposto, apenas podemos concluir como o MMº juiz "a quo":

“...não deixa qualquer margem para dúvidas que, não obstante o teor declarativo do representante do “B……, S.A.” na escritura celebrada em 11.05.2006, a sociedade adquirente do lote de terreno para construção, quando o fez pretendia, de facto, destiná-lo a revenda, só tendo alterado o destino que inicialmente ia dar ao imóvel, por circunstâncias supervenientes, razão pela qual efectuou o pagamento do IMT devido ao abrigo da 1ª parte do nº 5 do artigo 11º do CIMT.

Ora, tendo a sociedade “M........, Lda” adquirido o imóvel em questão à Impugnante, aquisição essa destinada a revenda, caducou a isenção de que esta havia beneficiado na aquisição por si realizada em 2005, nos termos do artigo 11º, nº 5, parte final do CIMT.

E não tem qualquer relevância o argumento da Impugnante de que a Fazenda Pública já arrecadou o montante de IMT pago pela “M........, Lda”, já que estamos perante factos tributários diferentes, sendo um deles a aquisição efectuada em 2005 e o outro a aquisição efectuada em 2006”.

E quanto à não inquirição das testemunhas arroladas pela Impugnante/Recorrente, que segundo a mesma se mostrou prejudicial para a descoberta da verdade também não tem razão a Recorrente. Desde logo e pela singela razão de que a Impugnante não arrolou quaisquer testemunhas na petição inicial (cfr. 108º/3 CPPT).

Depois, mesmo que arrolasse, tem-se entendido que nem a lei (cfr. art.º 98º CPPT), exige despacho do juiz a dispensar a inquirição das testemunhas, nem que ele seja notificado às partes quando é proferido.
Por conseguinte, de nenhuma destas situações resulta qualquer nulidade, violação do princípio do contraditório ou influencia na decisão e apreciação da causa (cfr. art.º 195º/1 CPC).[1]

O que não obsta a que a omissão de diligências de prova possa afectar o julgamento da matéria de facto e acarretar, nessa medida, a anulação da sentença por défice instrutório[2], se for o caso. Mas não é.

Quanto ao recurso interposto pelo Exmo. Representante da Fazenda Pública.

O Exmo. Representante da Fazenda Pública discorda da sentença na parte em que julgou procedente a impugnação por falta de fundamentação da taxa aplicada aos juros compensatórios.

A discordância reside na circunstância de o Exmo. Representante da Fazenda Pública considerar que a taxa de juros compensatórios encontra-se evidenciado nos autos. Pois não obstante não se encontrar indicado expressamente o valor da taxa diária de juros, ou da taxa anual, a mesma resulta necessariamente dos valores comunicados ao impugnante (Conclusão VI).

Foi dado a conhecer ao contribuinte o montante sobre o qual os juros incidiram, o período no qual se compreendem e também o efetivo resultado da operação de liquidação, a qual consubstancia uma mera operação aritmética.

E pela operação aritmética inversa da que levou ao apuramento do montante de juros compensatórios comunicado ao contribuinte i.e., dividindo o valor de € 9452,04 pelo valor sobre o qual incidiu a taxa, € 65.094,25 e pelo n.º de dias correspondente ao período a que os juros respeitam, 1325, obtemos o valor da taxa diária de juro aplicada, isto é 0,00011, correspondente à taxa anula de 4% (Conclusões III a V)

É inquestionável que a liquidação de juros compensatórios, como acto tributário que é, está também sujeita a fundamentação (cfr. art. 77.º da LGT e art. 268.º/3, da CRP).

Segundo dispõe o art. 35.º da LGT dispõe, nos números que ora nos interessa considerar, o seguinte:

«1- São devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido ou a entrega de imposto a pagar antecipadamente, ou retido ou a reter no âmbito da substituição tributária.

[…]
9- A liquidação deve sempre evidenciar claramente o montante principal da prestação e os juros compensatórios, explicando com clareza o respectivo cálculo e distinguindo-os de outras prestações devidas.

10- A taxa dos juros compensatórios é equivalente à taxa dos juros legais fixados nos termos do n.º 1 do artigo 559.º do Código Civil.».

As exigências de fundamentação variam conforme as circunstâncias concretas, designadamente o tipo de acto, a não participação do interessado no procedimento anterior ao acto ou, no caso da participação, a extensão desta.

No que respeita aos juros compensatórios, admite-se que as exigências de fundamentação sejam reduzidas ao mínimo. Eventualmente, ainda que com algumas reservas, admitimos que nem sequer se exija a referência à norma legal ao abrigo do qual os juros foram liquidados, pois é do conhecimento geral que se o atraso na liquidação do imposto devido for imputável ao contribuinte há lugar à liquidação de juros compensatórios.

Admitimos ainda que se considere que a fundamentação do “atraso na liquidação por motivo imputável ao contribuinte” se baste com a mera referência à liquidação adicional que o originou.

Também no que se refere à culpa, aceitamos que a fundamentação se baste com a descrição da conduta quando, como no caso, esta assuma a natureza de ilícito. Na verdade, a doutrina e a jurisprudência têm vindo a defender a tese de que quando uma determinada conduta constitui um facto qualificado por lei como ilícito se deve fazer decorrer dessa conduta – por ilação lógica – a existência de culpa (não porque a culpa se presuma, mas por ser algo que, em regra, se liga ao carácter ilícito-típico do facto praticado) e que, por essa via, se deve partir do pressuposto de que existe culpa sempre que a actuação do contribuinte integra a hipótese de qualquer infracção tributária

No entanto, há ainda uma declaração mínima indispensável para que se cumpram as exigências legais de fundamentação que visam, afinal, que o contribuinte possa optar conscientemente entre o conformar-se com o acto, aceitando a sua legalidade, ou contra ele reagir administrativa ou contenciosamente. Nesse conteúdo mínimo da declaração fundamentadora deverá conter-se a referência ao montante de imposto sobre o qual foram liquidados os juros compensatórios, à taxa ou taxas aplicáveis, ao período de tempo em que tais juros são exigíveis, com indicação dos termos iniciais e finais da contagem e a indicação das disposições legais que prevêem a responsabilidade por juros compensatórios e as que prevêem as taxas aplicadas (Cfr. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 9 ao art. 35.º, págs. 284/285. ).

Ora, como vemos da alínea I) dos factos provados nada se diz em matéria de taxa aplicada nem das normas legais em que se baseia.

Só perante esses elementos o contribuinte poderá verificar se a liquidação foi ou não efectuada de acordo com a lei e o tribunal, se tal lhe for solicitado, poderá desempenhar a sua tarefa de sindicância dessa legalidade.

Se a Administração não exteriorizou tais elementos, não se pode considerar a liquidação como fundamentada, precisamente porque a liquidação não contem os elementos mínimos para uma objectiva fundamentação e tão pouco está demonstrado que mesmo na ausência desses elementos, o destinatário alcançou inequivocamente a informação necessária para poder optar entre conformar-se com o acto ou reagir contra ele[3].

Como também referiu a Exma. Procuradora-Geral Adjunta “temos pois que no referido documento de liquidação dos juros moratórios, é indicada a quantia sobre os quais incidem, o período de tempo considerado para a liquidação, porém, não é indicada a norma legal em que assenta a liquidação, nem é referida expressamente a taxa aplicada. E muito embora esta taxa seja facilmente cognoscível para uma empresa, que exerce uma actividade económica lucrativa e que, para além disso, dela pode tomar conhecimento através de uma simples leitura da Portaria n.º 291/2003 de 8 de Abril que fixa a taxa de juros compensatórios em 4% a partir de 1.05.2003, a verdade é que a Autoridade Tributária e Aduaneira, não indicou a taxa de juros aplicável, nem mencionou que os juros foram fixados nos ter mos do art. 559, n.º 1 do Código Civil”.

Aliás, cremos que por a fundamentação não estar presente na liquidação de juros compensatórios que o Exmo. Representante da Fazenda Pública, ora RECORRENTE, teve “necessidade” de explanar as operações de cálculo dos juros, numa manifestação de fundamentação “a posteriori”, que é proibida, como sabemos.

Assim, por tudo o exposto, o recurso do Exmo. Representante da Fazenda Pública também não pode proceder.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAS em negar provimento a ambos os recursos e confirmar a sentença recorrida.

Custas pelos Recorrentes, na proporção do seu decaimento.

Lisboa, 14 de novembro de 2019.


(Mário Rebelo)

(Patrícia Manuel Pires)

(José Vital Brito Lopes)

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[1] Ac. do STA n.º 0946/16 de 14-09-2016 Relator: FRANCISCO ROTHES
Sumário: I - A falta de inquirição das testemunhas arroladas no processo judicial tributário, porque não está prevista como nulidade processual nem constitui uma nulidade processual à luz do art. 195.º e segs. do CPC, na medida em que a lei não prescreve que deva ter sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção, não permite que, se o juiz dispensar a produção de prova se possa dizer que foi preterida uma formalidade legal, sem prejuízo de a omissão de diligências de prova, na medida em que possa afectar o julgamento da matéria de facto, poder acarretar a anulação da sentença por défice instrutório.
II - A falta de notificação do despacho que dispensar a inquirição das testemunhas, na medida em que a prolação de tal despacho também não está prescrita na lei (dela não poderá resultar prejuízo algum para a parte) e é insusceptível de influir na decisão, não constitui nulidade processual.
[2] Cfr. ac. do STA n.º 01159/09 de 27/11/2013 Relator: DULCE NETO
Sumário: I - A falta de inquirição das testemunhas arroladas não consta do rol de nulidades insanáveis do art. 98º do CPPT nem constitui uma nulidade processual à luz do art. 201º e segs. do CPC, na medida em que a lei não prescreve que deva ter sempre lugar a produção de prova, antes conferindo ao juiz o poder de ajuizar da necessidade da sua produção; pelo que não havendo essa imposição legal, se o juiz dispensa a produção de prova não se pode dizer que foi preterida uma formalidade legal. O que não obsta a que a omissão de diligências de prova possa afectar o julgamento da matéria de facto e acarretar, nessa medida, a anulação da sentença por défice instrutório.
[3] Seguimos de perto o ac. do STA n.º 0954/16 de 16-11-2016 Relator:FRANCISCO ROTHES