Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:464/20.6BELLE
Secção:CT
Data do Acordão:10/27/2021
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:MÉTODOS INDIRETOS - ARTIGO 87º, N.º 1, ALÍNEA F) E 89-A, DA LGT
ÓNUS DA PROVA
Sumário:I - De acordo com o artigo 87º, nº 1, alínea f) da LGT, haverá recurso a métodos indiretos quando haja acréscimo de património ou despesa efetuada, incluindo liberalidades, de valor superior a (euro) 100 000, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados.

II - Concluindo-se que os SIT estavam legitimados a lançar mão deste procedimento, cabia ao Recorrente cumprir o ónus que sobre si recaía, isto é, comprovar que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efetuada.

III – No caso, face à prova produzida, conclui-se que não ficou demonstrado pelo Recorrente que correspondem à verdade os rendimentos declarados e que é outra a fonte dos acréscimos patrimoniais/despesas, não se evidenciando uma relação entre os depósitos nas suas contas bancárias e a atividade de venda de pescado por parte da sociedade A….., no sentido de aqueles montantes pertencerem à sociedade e não ao sujeito passivo que, assim, não tinha que os declarar e sujeitar a IRS.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

M …………………….., com os demais sinais dos autos, apresentou no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Loulé, ao abrigo do disposto nos artigos 89°-A, n° s 7 e 8 da Lei Geral Tributária (LGT) e 146°-B, n°5 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), recurso judicial contra a decisão do Diretor de Finanças de Faro que, para efeitos de IRS e em conformidade com o disposto na alínea f) do art.º 87º, conjugado com o nº 5 do art.º 89º-A, ambos da LGT, lhe fixou, por avaliação indireta, o rendimento tributável do ano de 2016.

Por sentença do TAF de Loulé o recurso judicial foi julgado improcedente e a Fazenda Pública absolvida do pedido.

Inconformado com o assim decidido, apelou o recorrente para este Tribunal Central Administrativo Sul (TCA) Sul, tendo na sua alegação formulado as seguintes conclusões (que vão por nós numeradas):

«1ª - AS PRESENTES ALEGAÇÕES DE RECURSO DIZEM RESPEITO À SENTENÇA PROFERIDA PELO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE LOULÉ NO PROCESSO N.º ……………..6BELLE, COM A QUAL O ORA RECORRENTE NÃO PODE CONFORMAR-SE EM FACE DA MANIFESTA FALTA RAZÃO QUE LHE SUBJAZ.

2ª- EM SEDE DE PROCEDIMENTO DE INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA, A AT PROMOVEU CORREÇÕES À MATÉRIA COLETÁVEL DO ORA RECORRENTE, COM RECURSO À AVALIAÇÃO INDIRETA DA MATÉRIA COLETÁVEL (“IMPOSTO EM FALTA”) DO IRS DO RECORRENTE, NO MONTANTE DE EUR 227.600,17, PARA O ANO DE 2016, COM BASE EM ACRÉSCIMOS PATRIMONAIS QUE A AT ENTENDIA NÃO ESTAREM DEVIDAMENTE JUSTIFICADOS.

3ª- NESSA ANO, VERIFICOU-SE (1) O DEPÓSITO DE NUMERÁRIO (EUR 438.480,00) EM CONTA BANCÁRIA TITULADA PELO RECORRENTE, E A (2) EMISSÃO DE CHEQUES (EUR 436.500,00), SACADOS SOBRE A MESMA CONTA, A FAVOR DA SOCIEDADE COMERCIAL DE QUE A RECORRENTE É ACIONISTA E ADMINISTRADOR.

4ª- CHAMADO PELA INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA PARA JUSTIFICAR ESTES DEPÓSITOS E O SEU POSTERIOR REENVIO PARA A SOCIEDADE COMERCIAL, VEIO O RECORRENTE EXPOR E, DOCUMENTALMENTE COMPROVAR, COMO OS FUNDOS PERTENCIAM À SOCIEDADE COMERCIAL E CORRESPONDIAM AO RECEBIMENO DO PREÇO POR ESTA ACORDADO EM VENDAS QUE REALIZOU.

5ª- OS MONTANTES EM CAUSA NÃO REPRESENTARAM, ASSIM, NEM ACRÉSCIMO DO PATRIMÓNIO DO RECORRENTE, NEM O SEU REENVIO PARA A SOCIEDADE COMERCIAL (REAL BENEFICIÁRIA DO VALOR) REPRESENTOU UMA DESPESA.

6ª- NÃO SE VERIFICA TAMBÉM, PELA MESMA RAZÃO, QUALQUER DIVERGÊNCIA NÃO JUSTIFICADA ENTRE OS MONTANTES DEPOSITADOS PELO RECORRENTE E REMETIDOS À SOCIEDADE, E OS RENDIMENTOS POR SI DECLARADOS NA SUA DECLARAÇÃO DE IRS.

7ª- MESMO COM OS ELEMENTOS JUNTOS PELO REQUERENTE, A AT EMITIU O RELATÓRIO DEFINITIVO DE INPEÇÃO TRIBUTÁRIA MANTENDO A DECISÃO DE AVALIAÇÃO INDIRETA DA MATÉRIA COLETÁVEL, COM APLICAÇÃO DO REGIME PREVISTO NO ART. 89.º-A DA LGT.

8ª- ENTENDIMENTO ESSE CONFIRMADO PELA SENTENÇA DE QUE ORA SE RECORRE E COM O QUAL NÃO SE PODE CONCORDAR, POR FERIDO DE ILEGALIDADE.

9ª - NÃO SE ENCONTRANDO PREENCHIDOS OS PRESSUPOSTOS DA APLICAÇÃO DA AVALIAÇÃO POR MÉTODOS INDIRETOS (ART. 87.º, N.º 1, AL. F) DA LGT), DEVE A DECISÃO RECORRIDA SER REVOGADA.

EM FACE DO QUE SE ALEGA, NESTES TERMOS E NOS DEMAIS DE DIREITO,

QUE VOSSAS EXCELÊNCIAS DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVERÁ REVOGAR-SE

A DECISÃO RECORRIDA, DETERMINANDO-SE A SUA SUBSTITUIÇÃO POR OUTRA, QUE DECIDA PELA ILEGALIDADE DA DECISÃO DE AVALIAÇÃO DA MATÉRIA COLETÁVEL POR MÉTODOS INDIRETOS POR NÃO ESTAREM VERIFICADOS OS PRESSUPOSTOS DE APLICAÇÃO DO ART. 89.º-A, CONJUGADO COM O ART. 87.º, N.º 1, F) DA LGT.»


*


O Recorrido, Diretor de Finanças de Faro, apresentou contra-alegações em defesa do não provimento do recurso e da manutenção do julgado sem, no entanto, formular conclusões.

*


Neste TCA, o Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

*


Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente dos autos, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.



*




II – FUNDAMENTAÇÃO


- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«1. O Recorrente foi sujeito a procedimento inspectivo aos exercícios dos anos 2016, 2017 e 2018, realizado pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Faro, ao abrigo das ordens de serviço n.º ……………, ……………. e n.º ……………….. – cfr. fls. 399 do processo administrativo apenso aos autos;

2. No procedimento inspectivo assinalado, foi elaborado Relatório de Inspecção Tributária (RIT), no qual consta, nomeadamente, o seguinte:

«Texto no original»


(…)

«Texto no original»

(…)

«Texto no original»

– cfr. fls. 399 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos;

3. Em 30 de Setembro de 2020, o Director de Finanças de Faro proferiu “mandado” para notificação ao Recorrente do Relatório de Inspecção Tributária referido no ponto anterior e da aplicação do regime previsto no artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária - manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados relativamente ao ano 2016 – cfr. fls. 433 do processo administrativo apenso aos autos;

4. M……………………, ora Recorrente, é accionista e administrador da sociedade A.................. - Sociedade ……………….. [doravante igualmente apenas referida como A.................., S.A.] - facto não controvertido;

5. A sociedade A.................., S.A., dedica-se maioritariamente à transformação e comércio de pescado - facto não controvertido;

6. M ……………….., ora Recorrente, obteve rendimentos enquadráveis na Categoria A de IRS - trabalho dependente -, provenientes da sociedade A.................., S.A. - facto não controvertido;

7. Com data de 14 de Outubro de 2020 consta escrito intitulado “declaração sob compromisso de honra”, em que J ………………………., referiu o seguinte: “(…) o contrato celebrado com a A.................. se consubstanciou em compras de peixe, crustáceos e moluscos a esta. Que a A.................. emitiu facturas-recibo, decorrentes da celebração do contrato, sem que tivesse recebido, no total ou em parte, o pagamento acordado. Que as quantias em dívida foram entregues posteriormente ao Exmo. Sr. M ………………………, sob compromisso de esses mesmos pagamentos chegarem à A................... S.A” - cfr. documento n.º 5 junto com o requerimento inicial;

8. Com data de 14 de Outubro de 2020 consta escrito intitulado “declaração sob compromisso de honra”, em que J ……….. , referiu o seguinte: “(…) o contrato celebrado com a A.................. se consubstanciou em compras de peixe, crustáceos e moluscos a esta. Que a A.................. emitiu facturas-recibo, decorrentes da celebração do contrato, sem que tivesse recebido, no total ou em parte, o pagamento acordado. Que as quantias em dívida foram entregues posteriormente ao Exmo. Sr. M …………….., sob compromisso de esses mesmos pagamentos chegarem à A................... S.A” - cfr. documento n.º 6 junto com o requerimento inicial;

9. Com data de 14 de Outubro de 2020 consta escrito intitulado “declaração sob compromisso de honra”, em que J ………………….., referiu o seguinte: “(…) o contrato celebrado com a A.................. se consubstanciou em compras de peixe, crustáceos e moluscos a esta. Que a A.................. emitiu facturas-recibo, decorrentes da celebração do contrato, sem que tivesse recebido, no total ou em parte, o pagamento acordado. Que as quantias em dívida foram entregues posteriormente ao Exmo. Sr. M ………………, sob compromisso de esses mesmos pagamentos chegarem à A................... S.A” - cfr. documento n.º 7 junto com o requerimento inicial.


III- B - DOS FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provou que:

A) Os valores depositados na conta bancária do Recorrente, correspondessem a receitas da sociedade A.................., S. A.

Compulsados os autos, analisados os articulados e atenta a prova documental e testemunhal constante dos mesmos, não existem quaisquer outros factos com relevância para a decisão, atento o objecto do litígio, que devam julgar-se como não provados.


III- C – FUNDAMENTAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

Os factos acima enunciados encontram-se, todos eles, comprovados pelos documentos acima discriminados, que não foram impugnados pelas partes nem há indícios que ponham em causa a sua genuinidade, e foram tidos em consideração por haverem sido articulados pelas partes ou por deles serem instrumentais [cfr. artigo 5.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil].

O facto dado como não provado resulta da ausência de qualquer elemento documental ou testemunhal, carreado pelo Recorrente, que permitissem ao Tribunal formar convicção diferente.

Na verdade, pelas regras de experiência comum, a mera alegação de tal facto, desacompanhado de qualquer elemento de prova que a sustentasse, mostra-se puramente conclusivo, e como tal, conducente à sua consideração como não provada.

Refira-se ainda que a prova testemunhal produzida pela Fazenda Pública mostrou-se apenas conformadora da prova documental produzida, nomeadamente o relatório de inspecção tributária motivo, por que não foi valorado sobre aquela.»


*

- De Direito

Antes de entrarmos no recurso interposto pelo M ……………………, importa deixar esclarecidos dois aspetos prévios suscitados pelo Recorrido, em sede de contra-alegações.

O primeiro respeita ao entendimento ali sustentado segundo o qual o recurso deveria ser rejeitado “por não se imputado à sentença qualquer vício”, limitando-se o recurso a “uma cópia da petição inicial”.

Sem delongas, diremos que este ataque aos termos em que o recurso jurisdicional se mostra formulado não procede, já que, lidas as conclusões e respetivas alegações, e ainda que de modo pouco desenvolvido, se extrai sem dificuldade que o Recorrente entende que a sentença errou ao concluir que se mostram verificados os pressupostos para o recurso aos métodos indiretos, mais defendendo que os elementos de prova juntos aos autos são suficientes para justificar a origem dos depósitos na sua conta bancária e as posteriores transferências de dinheiro para a sociedade A.................. SA, afastando assim a conclusão relativa a acréscimos patrimoniais não justificados.

Refere, ainda, o Recorrido que “parece” que o recurso versa apenas matéria de direito, o que, a verificar-se, determinaria a incompetência, em razão da hierarquia, deste TCA e a competência do STA para o conhecimento do recurso.

Também quanto a este especto é manifesto que o Recorrido não tem razão. Com efeito, a leitura integral do recurso permite concluir que o Recorrente discorda da matéria de facto não provada, manifestando o seu desacordo com o decidido no que respeita aos juízos de apreciação da prova efetuados pelo Tribunal recorrido, assumindo uma clara divergência nas ilações de facto retiradas do probatório. Assim sendo, o recurso versa matéria de facto, pelo que dúvidas não restam sobre a competência deste Tribunal para o qual o recurso veio dirigido.

Isto dito, avancemos para as conclusões recursivas formuladas pelo Recorrente, M.........................., sabido que são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respetiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objeto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Vejamos, então, lembrando que, no caso, está em causa a sentença do TAF de Loulé que julgou improcedente o recurso judicial interposto pelo Recorrente e que manteve o despacho proferido pelo Diretor de Finanças de Faro, de 30/09/20, que, com recurso a métodos indiretos, fixou IRS em falta, para o ano de 2016, no valor de € 227.600,17 (€379.333,61*60%), em virtude da falta de justificação para o acréscimo de património (superior a € 100.000,00) e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no período temporal em causa.

Embora em termos algo incipientes, a leitura da conclusão 4), devidamente concatenada com a parte correspondente do corpo das alegações, permite-nos concluir, ainda assim, que o Recorrente se insurge contra a matéria de facto considerada não provada, pretendendo que o Tribunal de recurso conclua, ao invés da 1ª instância, que a origem dos depósitos na sua conta bancária corresponde a vendas realizadas pela sociedade A.................., o que encontra respaldo nos elementos de prova que carreou para os autos.

Vejamos em detalhe, lembrando o que o Tribunal a quo fez constar dos factos não provados. Assim:

“Não se provou que:

A) Os valores depositados na conta bancária do Recorrente, correspondessem a receitas da sociedade A.................., S. A”, adiantando o Tribunal, como justificação para tal, que “o facto dado como não provado resulta da ausência de qualquer elemento documental ou testemunhal, carreado pelo Recorrente, que permitissem ao Tribunal formar convicção diferente. Na verdade, pelas regras de experiência comum, a mera alegação de tal facto, desacompanhado de qualquer elemento de prova que a sustentasse, mostra-se puramente conclusivo, e como tal, conducente à sua consideração como não provada. Refira-se ainda que a prova testemunhal produzida pela Fazenda Pública mostrou-se apenas conformadora da prova documental produzida, nomeadamente o relatório de inspecção tributária motivo, por que não foi valorado sobre aquela.»

Diferentemente, considera o Recorrente, M……………………, para quem se deve ter como provado que os valores depositados em numerário na sua conta bancária, concretamente € 438.480,00, provêm de vendas da sociedade A.................., da qual o Recorrente é administrador.

Na tese por si defendida, os depósitos em numerário (e posterior reenvio dos fundos para a sociedade) deveu-se ao pagamento dos produtos de pescado, em numerário (muito comum no mercado do peixe na lota), pelos clientes do mercado do peixe de Olhão. Explica o Recorrente que essa prática de depositar se devia, essencialmente, à sua rotina empresarial, desenvolvida durante anos sob a forma de empresário em nome individual. Segundo o Recorrente, posteriormente, através da emissão de cheques, transferia os valores em causa para uma conta da sociedade.

Para que este Tribunal assim possa concluir, pretende o Recorrente que se considerem critica e corretamente os seguintes elementos de prova: extratos bancários, registos contabilísticos da sociedade e as declarações sobre compromisso de honra de clientes da A.................., SA, a que se reportam os pontos 7, 8 e 9 dos factos provados.

Vejamos, então, se se justifica a pretendida alteração.

Em primeiro lugar, e relativamente aos extratos bancários a que o Recorrente se refere (anexo 7 do relatório de inspeção) nada se extrai de relevante para o propósito pretendido, já que os mesmos evidenciam depósitos em numerário e, por outro lado, a emissão de cheques sacados sobre a mesma conta, cheques esses destinados à A...................

Ora, estes estes fluxos financeiros, de depósitos na conta do Recorrente e de transferências de valores para a sociedade A.................., não são controvertidos, mostrando-se justamente o ponto de partida da verificação dos acréscimos patrimoniais/ despesas e das divergências não justificadas. Lembre-se – importa realçar – que está em causa demonstrar que os depósitos em numerário e posterior reenvio de fundos para a sociedade deveu-se ao pagamento dos produtos de pescado, em numerário, pelos clientes do mercado do peixe de Olhão, o que manifestamente não encontra qualquer respaldo nos apontados documentos.

Já quanto aos registos contabilísticos da sociedade, são elementos aos quais o Recorrente se refere genericamente sem qualquer autonomização útil para efeitos da impugnação da matéria de facto, nos termos legalmente exigidos pela lei (cfr. artigo 640º, nº1, alínea b) do CPC). Nessa medida, nada de profícuo se retira para a pretensão do M ………………..

Diga-se, aliás, a propósito dos registos contabilísticos da A.................., e sem que tal alguma vez fosse contrariado pelo Recorrente, que, como os SIT fizeram notar no RIT, deles não resulta evidência da existência de clientes em dívida, para além de que as faturas-recibo emitidas mostram o imediato recebimento dos valores faturados aos clientes. Este circunstancialismo, revelado pela contabilidade, é oposto ao alegado pelo Recorrente, o qual, porém – repete-se – não vem demonstrado, mormente em registos contabilísticos da sociedade A...................

Pretende, ainda, o Recorrente que da consideração dos documentos a que se reportam os pontos 7, 8, e 9 dos factos provados, se extraia a origem dos depósitos na sua conta bancária, como respeitando ao pagamento dos produtos de pescado, em numerário, pelos clientes do mercado do peixe de Olhão, os quais posteriormente eram transferidos (pelo M……………) para a sociedade.

Lembremos que tais documentos correspondem a três declarações sob compromisso de honra, datadas de 14/10/20, assinadas por J …………., J……………. e J…………………, que apresentam o seguinte teor: “(…) o contrato celebrado com a A.................. se consubstanciou em compras de peixe, crustáceos e moluscos a esta. Que a A.................. emitiu facturas-recibo, decorrentes da celebração do contrato, sem que tivesse recebido, no total ou em parte, o pagamento acordado. Que as quantias em dívida foram entregues posteriormente ao Exmo. Sr. M…………………., sob compromisso de esses mesmos pagamentos chegarem à A................... S.A”.

Também estes documentos são, contrariamente ao pretendido, absolutamente imprestáveis para os fins visados.

Lembremos que as declarações não indicam o período temporal a que se reportam, nem identificam as faturas em causa ou montantes envolvidos, sendo, por isso, absolutamente genéricas. Por outro lado, delas não se retira qualquer correspondência com os depósitos em numerário na conta do Recorrente, nem tal podia suceder, por isso estar absolutamente afastado da esfera de conhecimento de um cliente da empresa.

Em suma, não há como alterar o facto não provado, tal como ele resultou fixado na sentença. Com efeito, a propósito da origem dos depósitos em numerário na conta bancária do Recorrente, a sua alegação não é mais que isso, uma alegação desacompanhada de elementos probatórios seguros que permitam concluir que tais depósitos correspondem a pagamentos das vendas feitas a clientes da A...................

Assim, e sendo esta conclusão de falta de prova incontornável, conclui-se pela improcedência desta primeira questão e, consequentemente, pela manutenção da matéria de facto constante da sentença.


*

Estabilizada a matéria de facto, importa avançar para o demais que nos vem colocado.

Como dissemos já, aprecia-se a sentença do TAF de Loulé que negou provimento ao recurso judicial interposto pelo M…………….., mantendo o despacho do Diretor de Finanças de Faro que, com recurso a métodos indiretos, fixou IRS em falta, para o ano de 2016, no valor de € 227.600,17 (€379.333,61*60%), em virtude da falta de justificação para o acréscimo de património (superior a € 100.000,00) e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no período temporal em causa, com fundamento na alínea f) do nº1 do artigo 87º e nº 5 do artigo 89º-A, da LGT.

O Recorrente não se conforma com esta decisão, sustentando, além do supra referido erro de julgamento sobre a matéria de facto, que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito por violação do disposto na alínea f), do nº 1, do artigo 87º da LGT, concretamente por não se mostrarem preenchidos os pressupostos da avaliação por métodos indiretos. Insiste o Recorrente que os valores depositados na conta da sociedade A.................., no montante de € 436.500,00, provenientes da sua conta bancária pessoal, mais não são que a transferência do produto das vendas de pescado pagas em numerário pelos clientes (depositado inicialmente na conta do Recorrente).

Vejamos, então.

Sobre os procedimentos de avaliação, dispõe o artigo 81º da LGT, preceitunado o respetivo nº 1 que “A matéria tributável é avaliada ou calculada diretamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indireta nos casos e condições expressamente previstos na lei.”

Já quanto à avaliação indireta, estabelece o artigo 87º da LGT os casos em que a mesma pode ter lugar, sabido que a avaliação indireta é subsidiária da avaliação direta.

Ora, naquilo que para aqui importa, dispõe a alínea f) do nº1 do artigo 87º da LGT que a avaliação indireta pode efetuar-se em caso de acréscimo de património ou despesa efetuada, incluindo liberalidades, de valor superior a € 100 000,00, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados.

Ainda com relevância para o que estamos a apreciar, importa ter em consideração o disposto no artigo 89.º-A da LGT que, sob a epígrafe “Manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados”, dispõe o seguinte:

«1 - Há lugar a avaliação indireta da matéria coletável quando falte a declaração de rendimentos e o contribuinte evidencie as manifestações de fortuna constantes da tabela prevista no n.º 4 ou quando o rendimento líquido declarado mostre uma desproporção superior a 30%, para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela.

(…)

3 - Verificadas as situações previstas no n.º 1 deste artigo, bem como na alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º, cabe ao sujeito passivo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efetuada.

(…)

5 - Para efeitos da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º:

a) Considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, quando não existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90.º, que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, a diferença entre o acréscimo de património ou a despesa efetuada, e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação;

(…)

11 - A avaliação indireta no caso da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º deve ser feita no âmbito de um procedimento que inclua a investigação das contas bancárias, podendo no seu decurso o contribuinte regularizar a situação tributária, identificando e justificando a natureza dos rendimentos omitidos e corrigindo as declarações dos respetivos períodos.»

Como bem se refere no acórdão deste TCA, de 29/04/21, proferido no processo nº 169/20.8BEFUN, “É pressuposto para a realização da avaliação indirecta, além do valor superior a € 100.000,00 que não tenha sido entregue a declaração no período do imposto, ou, tendo sido entregue, esta não contenha rendimentos suficientes para justificar o acréscimo patrimonial.

Em suma, o recurso a este método de avaliação da matéria colectável constitui um dever da Administração Tributária, e não uma mera faculdade, assim se assegurando os fins de interesse público que lhe estão cometidos e que não haja fraude fiscal, perdendo o sujeito passivo, nestes casos, o benefício de presunção da veracidade de que gozam as suas declarações de rendimento.

Nas manifestações de fortuna, cabe à Administração Tributária o ónus da prova de demonstrar, por um lado, que a declaração não espelha a verdadeira situação tributária do contribuinte, e, por outro lado, que não é possível aceder à verdade fiscal do contribuinte pelo método de avaliação directa, considerando-se cumprindo esse ónus probatório, nos casos referidos na alínea f), do n.º 1, do artigo 87.º da LGT com a mera demonstração da existência do facto que a lei qualifica como “manifestação de fortuna”.

Isto é, qualquer diferença para menos entre os rendimentos declarados pelo contribuinte e o valor do acréscimo patrimonial ou despesa efectuada naquele período de imposto, desde que o acréscimo patrimonial ou esta despesa efectuada ultrapassem o valor de € 100.00,00.

Mostrado esse facto pela Administração Tributária há, em termos práticos, uma inversão do ónus da prova estabelecido no n.º 3, do artigo 74.º da LGT, imputando-se ao contribuinte a necessidade de provar a inexistência dos pressupostos de aplicação da avaliação indirecta.

Assim, cumprido o ónus probatório da Administração Tributária, por força do preceituado no n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT é sobre o sujeito passivo que recai o ónus de demonstrar a falta de aderência à realidade dos pressupostos de facto invocados como fundamento da fixação do rendimento tributável de que foi alvo, por aplicação da avaliação indirecta”.

Ao cabo desta avaliação indireta, o rendimento que venha a ser apurado será enquadrável na categoria G do IRS (incrementos patrimoniais), como decorre do artigo 9º, n.º 1, alínea d), do Código do IRS.

Foquemos, então, a nossa atenção no caso concreto, lembrando que o TAF de Loulé considerou verificados os pressupostos de recurso à avaliação indireta, afirmando que “face ao apurado, tem fundamento legal a realização da avaliação indirecta da matéria colectável em IRS do ano de 2016, nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º da Lei Geral Tributária”.

Como dissemos, o Recorrente considera que não se verificam os condicionalismos legais do artigo 87º, n.º 1, alínea f), da LGT.

Não tem razão, como veremos.

Como dissemos, de acordo com a referida alínea f), haverá recurso a métodos indiretos quando haja “acréscimo de património ou despesa efetuada, incluindo liberalidades, de valor superior a (euro) 100 000, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados”.

Ora, no caso concreto, e como resulta do probatório, temos que, no ano de 2016, o Recorrente declarou, para efeitos de IRS, um rendimento coletável de € 59.146.39; nesse mesmo ano, apresenta depósitos na sua conta bancária, feitos em numerário, no montante de € 438.400,00, tendo emitido cheques, no valor de € 434,480,00, a favor da A...................

Temos, pois, que entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património/despesa existe uma discrepância superior a € 100.000,00, subsumindo-se a situação na alínea f) do n.º 1 do artigo 87º da LGT, o que equivale a dizer que, como a sentença concluiu, verificam-se os pressupostos previstos para o recurso a este método de avaliação.

Improcede, portanto, esta questão que nos vinha colocada e em que assentava uma das discordâncias com a sentença recorrida.

Concluindo-se que os SIT estavam legitimados a lançar mão deste procedimento, sufragando-se o decido, importa ver seguidamente se o Recorrente, cumpriu o ónus que sobre si recaía, isto é, se comprovou que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efetuada.

O Recorrente, como resulta das conclusões, defende que a sentença errou ao não reconhecer que ficou demonstrada, pelo sujeito passivo, a origem dos valores em causa e que, nessa medida, não há omissão na declaração de rendimentos.

Recuperemos a sentença na parte em que aborda este aspeto.

“(…)

O Recorrente alega que os valores depositados não são seus, mas sim da sociedade A.................., S.A., em nome de quem os recebia, no giro comercial desta, depositando na sua conta e transferindo, posteriormente, para a conta bancária da empresa.

Note-se que a titularidade da conta bancária não predetermina a propriedade dos fundos nelas contidos, a qual (a propriedade dos fundos ou valores) pode pertencer apenas a algum ou alguns dos seus titulares ou co-titulares ou mesmo até porventura a um terceiro, considerando-se, a esse propósito, que a solidariedade releva tão-somente nas relações externas entre os titulares da conta e o banco, não tendo a faculdade de movimentação a ver com a propriedade das quantias depositadas. (…)

Mas, para tanto, importa que os recorrentes demonstrem que, afinal, as contas por si tituladas possuem fundos cuja propriedade não lhes pertence, mas sim à sobredita sociedade.

Prova que não foi feita, como resulta dos factos não provados, não sendo, em suporte do alegado, junto qualquer elemento de prova.

(…)

Ora, e quanto às justificações apresentadas pelo Recorrente, como se afirmou no relatório, «no âmbito da consulta, recolha e cruzamento de elementos da sociedade “A.................., S.A.”, realizada a coberto do despacho n° DI………….., verificou-se que as facturas emitidas para o designado 2.º mercado (facturas com as séries FR, FR1 e FRO) conferem quitação, pois nelas consta a expressão “Recebemos relativamente ao pagamento da Factura XXXX, a quantia de XXXX” - Exemplo em anexo 9. O registo contabilístico destas facturas consiste em creditar a respectiva conta da classe 7 (geralmente 71111 - Venda Mercadorias MN - Tr) e por contrapartida debitar a conta SNC ……………… - Clientes diversos. No balancete não existem contas correntes de clientes do 2° mercado, sendo todos tratados nesta conta global de clientes diversos. A conta SNC ……………..- Clientes diversos é saldada todos os meses por contrapartida da conta SNC 11.1- Caixa, ou seja, na contabilidade da sociedade “A.................., S.A.” não constam dívidas de clientes do designado 2º mercado e os registos contabilísticos indicam que as facturas emitidas se encontram pagas por caixa. Após notificação ao SP para o efeito, já anteriormente referida, este apresentou cópia de todos os cheques creditados na conta bancária e de diversos cheques debitados (seleccionados por amostragem). Portanto, no âmbito do procedimento inspectivo, foi realizada uma análise profunda da conta bancária n° …………………. do B….., tendo sido verificados os movimentos do extracto bancários e os documentos de suporte, nomeadamente todos os cheques depositados e diversos cheques emitidos pelo SP. Procedeu-se ainda à verificação de transferências bancárias e a movimentos efectuados entre contas do SP, tendo o mesmo disponibilizado extractos bancários de mais duas contas bancárias. Na primeira notificação de 28 de Novembro, o SP foi notificado para “fazer a prova a que alude o n.º 3 do artigo 89.º- A da LGT. de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte do rendimento que possibilitou a despesa efectuada/acréscimo de património, nomeadamente herança ou doação, rendimentos que não esteia obrigado a declarar, utilização do seu capital ou recurso a crédito.”. E na resposta de 19 de Dezembro justificou: “tiveram origem nos rendimentos por si obtidos desde que começou a trabalhar há mais de 50 anos, como empresário em nome individual, na actividade do comércio de pescado. Actividade que lhe permitiu acumular rendimentos e poupanças ao longo de mais de cinco décadas, conforme demonstra com a junção dos documentos oficiais do património detido em 31/12/2015, ano que antecede o período a que respeitam as despesas ora em análise.”. E posteriormente, em 20 de Janeiro de 2020, veio apresentar uma resposta de sentido contrário à supra transcrita, arguindo, em suma, que os montantes creditados na sua conta bancária teriam origem na sociedade A.................., S.A.: “Com a constituição da sociedade comercial, por força do hábito, o administrador, apoiado na boa fé de que não estaria a agir incorrectamente, continuou a seguir aquela prática, efectuando depósitos de receitas da sociedade provenientes das vendas em segundo mercado, essencialmente recebidas em numerário, em contas bancárias tituladas em seu nome pessoal, emitindo periodicamente cheques a favor a sociedade, canalizando os montantes para a empresa, na medida em que a contabilidade o ia solicitando.”. E quando foi solicitado para “demonstrar quais as facturas emitidas pela sociedade A.................., S.A., que correspondem a cada depósito (em numerário e em chegue) creditado na sua conta bancária n° …………..do B………, veio responder que: “7. A principal origem dos valores depositados diz respeito a reembolsos da A.................. S.A., de montantes adiantados por M................................, os quais eram desembolsados por si para honrar os compromissos da A.................., S.A., com funcionários e terceiros, posteriormente regularizados na medida das disponibilidades de tesouraria da empresa. Não é possível relacionar as facturas emitidas que correspondem a cada depósito devido às especificidades do negócio, em que as práticas decorrentes dos hábitos dos empresários do sector, ditam procedimentos nos recebimentos dos saldos em divida pelos clientes em apreço que são, por via de regra, efectuados em numerário, recomendo ao chegue como complemento dos pagamentos dos saldos em conta corrente, apenas e quando as disponibilidades em numerário eram insuficientes para liquidar os referidos saldos.”.»

Com efeito, o Recorrente não apresentou um único documento (ou testemunha, note-se), seja documento bancário ou documento comercial, sejam facturas, recibos ou qualquer outro idóneo que comprove que os valores monetários são da sociedade A.................., S.A”

(…)

Efectivamente, como resulta do enquadramento acima efectuado deste regime de tributação e face aos elementos de prova carreados pela Autoridade Tributária para o procedimento inspectivo e que constituem a base da presunção, impunha-se que o Recorrente apresentasse em Tribunal prova suficiente para contrariar a factualidade apurada, por forma a demonstrar que, afinal, fora outra a fonte das manifestações de fortuna e que o Recorrente não se encontrava obrigados a declará-las.

Tendo em consideração a razão de ser deste regime, destinado a evitar a fraude e evasão fiscal, resulta claro que só a demonstração de quais os concretos meios financeiros não sujeitos a declaração que foram afectados à manifestação de fortuna evidenciada é que permitirá considerar satisfeita a exigência de justificação prevista no n.º 3 daquele artigo.

(…)

Como se disse, a prova efectuada não é suficiente para afastar a tributação por avaliação indirecta, pois da mesma não resulta se estamos perante rendimentos que deveriam ter sido sujeitos a tributação e não o foram ou se são rendimentos que estão excluídos de tributação. Ora, sendo a ratio legis do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária o combate à evasão fiscal, sem a prova da relação causal entre os meios financeiros a que demonstrou ter acesso e as concretas manifestações de fortuna evidenciadas, esse propósito não é de todo cumprido”.

Vejamos o que dizer sobre esta questão.

Desde logo, e como parece óbvio, em grande medida o desfecho da análise da demostração da proveniência dos valores em causa e, nessa medida, da verificação de qualquer omissão declarativa, ficou já feita aquando da apreciação do julgamento da matéria de facto não provada. É incontornável que aquela apreciação é decisivamente condicionante daquilo que aqui apreciamos agora.

Deve deixar-se claro que, do exame que fazemos de toda a prova, em momento algum resulta que os valores depositados na conta do Recorrente e os transferidos para a sociedade A.................. são os mesmos e que provêm, na sua origem, da atividade de venda de pescado feita pela sociedade mas cujo produto era, pelo hábito, depositado em contas particulares do administrador M…………………..

Para além daquilo que foi salientado na sentença, com origem no RIT, deve evidenciar-se que:

- as explicações avançadas para a origem do dinheiro foram sendo diferentes ao longo do procedimento inspetivo, começando por ser avançada a tese da acumulação de rendimentos ao longo de 50 anos de trabalho, passando depois a afirmar-se que seriam valores correspondentes a montantes adiantados pelo Recorrente para fazer face a despesas da sociedade (internas ou com terceiros), para, por último, se defender a tese da restituição de valores provenientes da atividade da A.................., concretamente da venda de pescado;

- não há uma explicação plausível para a opção do Recorrente em depositar o produto das vendas da A……………….. em contas particulares (para posteriormente os transferir para a beneficiária), sabido que a sociedade era ela mesma titular de contas bancárias;

- a contabilidade da A.................. não revela valores em dívida dos apontados clientes do mencionado 2º mercado, sendo que os registos contabilísticos mostram que as faturas foram pagas por caixa, para além de que os documentos emitidos pela A.................., aquando da venda, referem a quitação dos valores faturados;

Para demonstrar o que alega o Recorrente, era essencial que se percebesse que os montantes depositados (na sua conta particular) correspondiam aos valores que era faturados e, na verdade, não se faz essa correspondência entre as concretas faturas e os depósitos.

Tudo visto e ponderado, também este Tribunal, acompanhando a sentença, conclui que não ficou demonstrado por parte do Recorrente que correspondem à verdade os rendimentos declarados e que é outra a fonte dos acréscimos patrimoniais/despesas, não se evidenciando uma relação entre os depósitos nas suas contas bancárias e a atividade de venda de pescado por parte da A.................., no sentido de aqueles montantes pertencerem à sociedade e não ao sujeito passivo que, assim, não tinha que os declarar e sujeitar a IRS.

Em suma, conclui-se que não assiste razão ao Recorrente, devendo a sentença recorrida ser mantida.

Nega-se, pois, provimento ao recurso.


*




III - Decisão

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso.


Custas pelo Recorrente

Registe e Notifique.

Lisboa, 27/10/21


Catarina Almeida e Sousa

Isabel Fernandes

Jorge Cortês