Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12722/15
Secção:CA-2ºJUÍZO
Data do Acordão:11/26/2015
Relator:NUNO COUTINHO
Descritores:INELEGIBILIDADE
PERDA DE MANDATO
Sumário:
I - A consagração de inelegibilidades para membro de órgão autárquico constitui corolário dos princípios da imparcialidade e da transparência.
II – Verificada a existência de uma situação de inelegibilidade, tardiamente detectada, a consequência é a perda de mandato do eleito, independentemente das causas que justifiquem o facto ou que excluam a culpa do agente.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – Relatório

Ministério Público intentou acção de perda de mandato contra Filipe …………………….

Por decisão proferida em 23 de Setembro de 2015, o T.A.C. de Lisboa julgou a acção procedente.

Inconformado com o decidido, recorreu o R. para este TCA Sul, tendo formulado as seguintes conclusões:

“A. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa que julgou procedente a acção apresentada pelo Ministério Público de perda de mandato do Réu estribado na redacção da alínea b) do n.º 1 do artigo 8.º da Lei n.º 27/96, de 1 de Agosto e, em consequência, decretou a perda de mandato do Réu como presidente da Junta de Freguesia de Sacavém e Prior Velho e membro da Assembleia Municipal de Loures, para o qual foi eleito por inerência, por entender que era inelegível nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 7.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto.

B. Salvo o devido respeito, que é muito, o Réu não pode deixar de manifestar a sua discordância com os argumentos que sustentam a decisão proferida pelo Tribunal a quo. Vejamos:

C. A Constituição da República Portuguesa (CRP) consagra, no seu artigo 50.º, sob a epígrafe «Direito de acesso a cargos públicos», que menciona que todos os cidadãos têm o direito de acesso, em condições de igualdade e liberdade, aos cargos públicos e que no acesso a cargos electivos a lei só pode estabelecer as inelegibilidades necessárias para garantir a liberdade de escolha dos eleitores e a isenção e independência do exercício dos respectivos cargos – sendo esta a norma que rege o caso dos autos.

D. Esta norma aplica-se directamente, por força do artigo 18.º, n.º 1 da CRP.

E. A jurisprudência tem vindo a entender que o estabelecimento de inelegibilidades, gerais e especiais, bem como o sancionamento de determinados comportamentos tidos por ilícitos e ilegais visam, respectivamente, assegurar garantias de dignidade e genuinidade ao acto eleitoral e, simultaneamente, evitar a eleição de quem, pelas funções que exerce (ou outras razões que o tornem indigno), se entende que não deve ou não pode representar um órgão autárquico ou ainda que não pode permanecer no exercício daquelas funções quem se tornou indigno das representar e efectivar.

F. O artigo 50.º da CRP, que diz respeito ao direito de acesso aos cargos públicos e que constitui expressão do direito à participação na vida pública (cfr. artigo 48.º da CRP), é um direito de natureza política que integra o catálogo dos direitos, liberdades e garantias, beneficiando, consequentemente, do regime próprio e da força jurídica que o texto constitucional concede aos direitos, liberdades e garantias.

G. Assim, resulta do facto de estarmos perante um direito de natureza política que integra o catálogo dos direitos, liberdades e garantias, que estes (i) não podem ser restringidos senão nos casos expressamente admitidos pela Constituição, restrição essa que está sujeita a reserva de lei (cfr. n.º 2 art. 18.º da CRP); (ii) que a restrição, mesmo que constitucionalmente autorizada, só é legítima se for justificada pela salvaguarda de outro direito fundamental ou de outro interesse constitucionalmente protegido (cfr. art. 18.º, n.º 2 da CRP); e (iii) que a medida restritiva estabelecida por lei tem de respeitar o princípio da proporcionalidade nas suas três dimensões - adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito - (cfr. art. 18.º, n.º 2 da CRP).

H. A sentença recorrida, ao decidir como decidiu, fez incorrecta aplicação das disposições legais supra, tornando a mesma desproporcional aos factos, inadequada, desnecessária, como de seguida se demonstrará.


I. As inelegibilidades funcionam como uma restrição à capacidade eleitoral passiva dos visados e, em consequência, equivalem a uma restrição a um direito, liberdade e garantia constitucionalmente consagrado, pelo que apenas podem ser consagradas para assegurar a isenção e independência no exercício das funções autárquicas, sendo que a restrição ao direito fundamental de sufrágio passivo só é admissível na exacta medida do necessário para salvaguardar aqueles outros interesses também eles constitucionalmente protegidos.

J. Também aqui andou mal o Tribunal recorrido, na medida em que, por um lado, o comportamento do Réu em nada beliscou a sua isenção e independência, nem o Tribunal recorrido sobre isso aventa qualquer facto ou circunstância, nem, por outro lado, existe qualquer interesse constitucionalmente consagrado que urgisse proteger com a perda do mandato do Réu.

K. A alínea d) do artigo 7.º da Lei Orgânica n.º 1/2001 não estabelece uma inelegibilidade absoluta, na medida em que permite aos sujeitos visados por esta norma poderem, por via da suspensão de funções, puderem ser elegíveis.

L. O Tribunal a quo não levou em devida conta os fundamentos apresentados pelo Réu no sentido de não lhe ser aplicado a sanção de perda de mandato, desde logo porque, não olvidando o princípio que “ignorantia legis non excusat”, a verdade é que o Réu não tinha efectiva consciência da existência desta disposição e, por maioria de razão, que se encontrava numa situação de inelegibilidade.

M. Mesmo que o Tribunal recorrido defenda que a ignorância das obrigações legais não afaste a culpa do Réu – ainda que com tal não se concorde – deveria servir esse facto para graduar a culpa do agente, de modo a que, em tese, a existir culpa do agente, assente numa putativa negligência, não se estivesse perante uma culpa grave, mas perante (quanto muito) uma actuação culposa levíssima.

N. O Tribunal recorrido sobre isso não se pronunciou, limitando-se a uma análise rígida e formal da disposição legal em apreço, desligada do grau de culpa do agente e de uma verificação material do conflito de interesses em causa, em manifesto prejuízo da justiça material, aplicando uma sanção desproporcional e injusta ao Réu.

O. O Réu não agiu dolosamente na infracção da disposição em causa, pois o Réu não tinha intenção de desrespeitar este preceito legal, que aliás era do seu desconhecimento e cuja aplicação ao seu caso ignorava.

P. O Réu nem sequer agiu negligentemente perante esta situação, na medida em após a sua eleição e antes da tomada de posse como Presidente da Junta de Freguesia de Sacavém e Prior Velho e, por inerência, como membro da Assembleia Municipal de Loures, o Réu solicitou a emissão de um parecer jurídico externo que se debruçasse sobre a legalidade da cumulação das funções de Chefe de Divisão Financeiras nos SMAS de Loures, que exercia em comissão de serviço, com o cargo de membro da Assembleia Municipal de Loures, tendo-se aí concluído que não existia qualquer ilegalidade na acumulação das funções em causa, o que contribuiu para a decisão de tomar posse nos cargos em causa.

Q. O Réu, por um lado, agiu desconhecendo a ilegalidade da sua omissão e, por outro, actuou de forma diligente, não lhe sendo exigido outro tipo de conduta.

R. Dispõe o n.º 1 do artigo 10.º.º da Lei n.º 27/96, de 1 de Agosto, com a epígrafe “Causas de não aplicação da sanção” que não haverá lugar à perda de mandato se verifiquem causas que justifiquem o facto ou que excluam a culpa dos agentes.

S. Como tem vindo a ser posição da jurisprudência, a perda do mandato só pode e deve ser decretada quando o fundamento legal que a justifica for imputável a título de culpa grave e não mera culpa ou simples negligência no cumprimento de um dever ou duma obrigação legal, porquanto a perda de mandato de alguém que foi democraticamente eleito só deve ser decretada quando houver uma relação de adequação e proporcionalidade entre a falta cometida e a sanção, que abaixo trataremos.

T. O regime das inelegibilidades visa, sem qualquer propósito sancionatório, cuidar dos princípios da independência e da isenção no exercício dos cargos autárquicos e da imagem pública dos eleitos locais, prevenindo o perigo de lesão desses valores.

U. O Parecer n.º 112/02, do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, publicado no Diário da República n.º 261, II Série, de 11.11.2003, que veio afirmar que «... na óptica do legislador, para efeito das inelegibilidades em causa, o que releva é sobretudo a materialidade das funções laborais desempenhadas e o seu efectivo desempenho, de que pode decorrer a possibilidade de os interesses específicos inerentes a essa situação funcional se projectarem sobre o exercício do mandato electivo em termos de comportarem o seu desvirtuamento quanto à isenção e imparcialidade exigíveis à dignificação do poder local».

V. A conduta do Réu não colocou em causa a isenção e imparcialidade exigida aos cargos que ocupa.

W. Não se vislumbra como as duas funções para as quais foi eleito possam por em causa a isenção e imparcialidade do Réu, na medida em que não existe qualquer ligação, directa ou indirecta, entre os dois cargos.

X. A Câmara Municipal de Loures, em que se insere o SMAS de Loures onde o Réu exercia funções, é actualmente e desde as últimas eleições autárquicas dirigida pela coligação CDU, que elegeu o Presidente da Câmara Municipal e detém a maioria dos membros da Assembleia Municipal, pelo que o Réu não possui qualquer poder de decisão ou de influência que, em concreto, pudesse ser invocado para questionar a sua imparcialidade ou isenção em potência.

Y. O Réu é apenas Chefe de Divisão Financeira no SMAS, tendo acima de si, um Director de departamento, um Director Delegado e um Conselho de Administração, cuja presidência e demais composição pertencem a partidos políticos diferentes (CDU e PSD) daquele pelo qual se candidatou e foi eleito (PS).

Z. O Réu não tem qualquer poder de decisão ou de influência no SMAS de Loures que pudesse por em causa, ainda que potencialmente, a sua isenção ou imparcialidade.

AA. A ratio legis da norma que sustentou a decisão de perda de mandato do Réu foi, em concreto e em abstracto, assegurada, não se tendo verificado a colocação em perigo da isenção ou da imparcialidade do Réu nos cargos que desempenha.

BB. As inelegibilidades funcionam como uma restrição à capacidade eleitoral passiva dos visados e, em consequência, equivalem a uma restrição a um direito, liberdade e garantia constitucionalmente consagrado, designadamente o direito de livre acesso, em condições de igualdade e liberdade, aos cargos públicos, previsto no artigo 50.º da CRP, pelo que estamos perante um direito de natureza política que integra o catálogo dos direitos, liberdades e garantias, as medidas restritivas deste direito, como é o caso das inelegibilidade, têm de respeitar o princípio da proporcionalidade nas suas três dimensões - adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito (cfr. art. 18.º, n.º 2 da CRP).

CC. A «perda de mandato de alguém que foi democraticamente eleito só deve ser decretada quando houver uma relação de adequação e proporcionalidade entre a falta cometida e a sanção visto que, se assim não for, será de questionar a constitucionalidade das normas que permitam declarações de perda de mandato fundadas em lapsos mínimos e, portanto, destituídas de razoabilidade» (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 20/12/2007, proferido no processo n.º 0908/07, disponível em www.dgsi.pt).

DD. Concluindo este Alto Tribunal por referir que «tudo isto inclina imediatamente a crer que uma culpa levíssima não será, por via de regra, causa bastante do drástico efeito sancionatório previsto na norma».

EE. Mesmo que em tese se entenda que o Réu agiu com culpa – no que não se concede -, sempre seria de concluir que estaríamos perante uma culpa levíssima que não seria suficiente para fundamentar a perda do mandato.

FF. O Tribunal a quo não valorou devidamente na sentença recorrida o Princípio da Proporcionalidade, pelo que essa sentença mostra-se incompatível com o Princípio da Proporcionalidade contido no artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, por desrespeitar os seus três sub-princípios: o Princípio da Necessidade, o Princípio da Adequação e o Princípio da Proporcionalidade stricto sensu.

GG. A decisão do Tribunal recorrido ao sustentar a perda de mandato do Réu mostra-se desnecessária pois, para além de não existir culpa do Réu, ou a existir ser levíssima, dada a posição que o Réu ocupa na orgânica da entidade pública empregadora não coloca em causa a sua isenção e independência, nem o coloca em posição de indignidade.

HH. A decisão do Tribunal recorrido ao sustentar a perda de mandato do Réu mostra-se inadequada, em face dos factos, circunstâncias e comportamento daquele, na medida

II. foi sempre diligente, pese embora o desconhecimento da legislação em vigor, estando, no máximo, perante uma culpa levíssima ou perante uma ausência completa de culpa que não justificaria a perda do mandato.

JJ. A decisão do Tribunal recorrido ao sustentar a perda de mandato do Réu mostra-se desproporcional, na medida em que o sacrifício imposto ao Réu com a perda do mandato não encontra justificação na ratio legis da alínea d) do artigo 7.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, consubstanciando uma decisão desproporcional e, por isso, contrária aos princípios constitucionais em causa.

KK. Atendendo (i) à natureza sancionatória da medida da perda de mandato, (ii) à intrínseca gravidade desta medida, equivalente às penas disciplinares expulsivas, com potencialidade destrutiva de uma carreira politica, iii) a que a conduta dos titulares de cargos políticos electivos é periodicamente apreciada pelo universo dos respectivos eleitores, há que concluir que a aplicação de tal medida só se justifica a quem tendo sido eleito membro de um órgão de uma autarquia local, no exercício das respectivas funções «violou os deveres do cargo em termos tais que o seu afastamento se tornou imperioso» (cfr. Acórdão STA de 21/03/96).

LL. A perda do mandato apenas deve ser aplicada quando o visado fica impedido de actuar de forma rigorosa, isenta e imparcial na defesa do interesse público posto a seu cargo, o que manifestamente não sucede no presente caso.

MM. No presente caso, não obstante a falha do Réu vários são os factores concorrem a favor do mesmo e que legitimam que não lhe seja decretada a sanção de perda do mandato.

NN. Acresce que a norma da alínea d) do artigo 7.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, aplicada ao caso dos autos é inconstitucional.

OO. O tribunal a quo interpretou a norma da alínea d) do artigo 7.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, no sentido de estar verificada a previsão desta norma e, como tal, procedeu à respectiva aplicação.

PP. Porém, nessa interpretação, a dita aplicação da norma da alínea d) do artigo 7.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto, viola o disposto no já referido artigo 50.º, n.º 3, da CRP.

QQ. Com efeito, a circunstância de a entidade patronal do recorrente ser um município em nada colide com a circunstância de o recorrente poder ser candidato a uma freguesia da área desse município, pois o município é uma pessoa colectiva e a freguesia é outra pessoa colectiva (artigos 235.º, n.º 2, e 236.º, n.º 1), não existindo nenhuma hierarquia entre essas duas pessoas ou entre os seus órgãos.

RR. Consequentemente, é jurídico-constitucionalmente impossível que esteja em causa uma situação de liberdade de escolha dos eleitores ou a isenção e independência do exercício do cargo a que o recorrente se candidatou, a saber, o de membro da Assembleia de freguesia da União de Freguesias de Sacavém e Prior Velho, para o mandato de 2013 a 2017.

Por seu turno, o M.P., em sede de contra-alegações, concluiu da seguinte forma:

1. A acção tem como fundamento a alínea b), do n.° 1, do artigo 8.° da Lei n.° 27/96, na parte em que estabelece que incorrem em perda de mandato os membros dos órgãos autárquicos que, antes da eleição, estavam situação que os tornava inelegíveis

2. O regime de inelegibilidades previstas nos artigos 6.° e 7.° da lei orgânica n.° 1/2001, de 14 de Agosto visa assegurar garantias de dignidade e genuinidade ao acto eleitoral e, simultaneamente, evitar a eleição de quem, pelas funções que exerce (ou outras razões que retiram a imparcialidade), se entende que não deve representar um órgão autárquico.

3. As inelegibilidades como corolário do princípio constitucional da imparcialidade - artigo 266°, nº 2 da CRP - determinam a impossibilidade de candidatura ás eleições locais e a própria perda de mandato, se ocorrerem após a eleição, e constituem um obstáculo dirimente da regular eleição do atingido.

4. O legislador ao prever no ad. 7.°, n.° 1, alínea d) Lei orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto. as situações de inelegibilidade ab initio em que a pessoa não pode ser eleita, fê-lo para salvaguarda da transparência, isenção e imparcialidade no exercício de cargo público nos órgãos do poder local.

5. Verificada a inelegibilidade após a eleição, e considerando os valores de isenção e transparência que aquela norma visa tutelar, independentemente do modo como o autarca exerce, em concreto, os seus poderes, há lugar à perda de mandato, em ordem a preservar esses valores e a confiança que o exercício dos cargos autárquicos deve merecer dos cidadãos.

6. Daí que a apreciação da situação de inelegibilidade após a eleiçâo, tal como na situação de inelegibilidade antes da eleição é feita independentemente de “causas que justifiquem o facto ou que excluam a culpa dos agentes”, previstas no n.° 1 do artigo 10.° da Lei n.° 27/96.

7. Resulta da alínea d), do n.° 1, do artigo 7.°, da Lei Orgânica n.° 1/2001, de 14 de Agosto de forma imediata e directa que a suspensão de funções é obrigatória e tem de verificar-se ou há-de produzir efeitos desde a data de entrega da lista de candidatura e configura um caso de inelegibilidade ab initio.

8. O Recorrente na data em que apresentou da sua candidatura às eleições autárquicas de 29 de Setembro de 2013, no primeiro lugar da lista do P5, à assembleia de freguesia de Sacavém e do Prior Velho, era um funcionário, que exercia (exerce) funções de direcção nos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento da Câmara Municipal de Loures como Chefe de Divisão Financeira, tendo um cargo dirigente nos termos do artigo 3°, n.° 1 alinea c), do Decreto-Lei nº 514/99, de 24 de Novembro.

9. Por força do disposto no art. 42º, nº 1 da Lei nº 169/99 de 18.09, com as alterações introduzidas pela Lei nº 5-A/2002 de 11.01, apesar de estarem em causa dois órgãos autárquicos distintos, ao candidatar-se, no primeiro lugar da lista do P5, à assembleia de freguesia de Sacavém e do Prior Velho, candidatou-se simultaneamente à assembleia municipal do Município de Loures.

10. O Recorrente não solicitou ao Conselho de Administração do SMAS de Loures a suspensão de funções a que estava obrigado, de modo a afastar a inelegibilidade especial, previsto na alínea d), do n.º 1, do artigo 7°, Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto e consequentemente nunca podia ter sido candidato e subsequentemente eleito.

11. Estava pois, numa situação de inelegibilidade existente e ainda subsistente, mas não detectada previamente à eleição, uma vez que tal situação apenas foi levada ao conhecimento da Assembleia Municipal de Loures na sessão realizada a 20 de Março de 2014.

12. Estipula na alínea b), do nº 1, do artigo 8º, da Lei nº 27/96, de 1 de Agosto, que incorrem na perda de mandato os membros dos órgãos autárquicos que após a eleição sejam colocados em situação que os torne inelegíveis ou relativamente aos quais se tornem conhecidos elementos reveladores de situação de inelegibilidade existente e ainda subsistente, mas não detectada previamente à eleição.

13. Daqui resulta, que as situações de inelegibilidade ab initio - antes da eleição - como é a dos autos, o Recorrente nunca poderia ter sido eleito e tendo o sido nunca poderia continuar a exercer os cargos para que foi eleito, exactamente porque se mantem numa situação de inelegibilidade, que é determinante da perda de mandato.

14. Não ocorrem as apontadas inconstitucionalidades, pois, como já atrás se concluiu a apreciação da situação de inelegibilidade após a eleição, tal como na situação de inelegibilidade antes da eleição é feita independentemente de “causas que justifiquem o facto ou que excluam a culpa dos agentes”, previstas no n.° 1 do artigo 10.0 da Lei n.° 27/96.

15. As normas em causa constituem um afloramento dos princípios da transparência, da confiança e da prossecução do interesse público, visando, pois, acautelar os deveres de isenção e de desinteresse pessoal no exercício daquelas funções.

16. Sendo certo que, atentos os factos e fundamentação constantes da sentença recorrida e que se dá aqui inteiramente por reproduzida a interpretação feita daquelas disposições e consequente aplicação ao Réu, não viola qualquer dos princípios constitucionais.

17. Dai que a sentença ora em recurso ao determinar a perda de mandato do Recorrente com fundamento no art. 8º, nº 1, alinea b) da Lei nº 27/96, de 1 de Agosto e o do disposto na alínea d) do artigo 7º da Lei Orgânica nº 1/2001, não só se mostra proporcional como está em consonância com os princípios constitucionais da necessidade, adequação e proporcionalidade contido no artigo 18º da Constituição da República Portuguesa.

18. Pelo que, os alegados vícios apontados pelo Recorrente á sentença ora em recurso, não têm qualquer fundamento e como tal a sentença recorrida não merece nenhum reparo ou censura, já que a mesma não violou as disposições legais, a que alude o recorrente nos pontos A. a RR das conclusões do seu recurso.

II) Na sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos:

A) O Réu candidatou-se à Assembleia de Freguesia da União de Freguesias de Sacavém e Prior Velho, como cabeça da lista do Partido Socialista, para o mandato de 2013 a 2017 (documentos juntos com a Petição Inicial sob os n.ºs 1 e 2).

B) Quando apresentou a sua candidatura exercia as funções de chefe da Divisão Financeira dos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento do Município de Loures, em regime de comissão de serviço (documentos juntos com a Petição Inicial sob o n.º 3).

C) Não apresentou qualquer pedido de suspensão das funções de chefe da Divisão Financeira dos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento do Município de Loures (documento junto com a Petição Inicial sob o n.º 4).

D) A lista para a Assembleia de Freguesia da União de Freguesias de Sacavém e Prior Velho Exercia encabeçada pelo Réu foi a lista mais votada (documentos juntos com a Petição Inicial sob os n.ºs 1 e 2).

E) O Réu exerce o cargo de Presidente da Junta de Freguesia de Sacavém e Prior Velho e o de membro da Assembleia Municipal de Loures, tendo sido investido nessas funções, nos dias 21 e 22 de Outubro de 2013, respectivamente (documentos juntos com a Petição Inicial sob os n.º 1 e 2).

F) Exerce as funções de chefe da Divisão Financeira dos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento do Município de Loures, em regime de comissão de serviço (documento junto com a Petição Inicial sob o n.º 3).

G) Em 2 de Outubro de 2013, solicitou o Parecer junto com a Contestação sob o nº 1, que aqui se dá por integralmente reproduzido.

III) Fundamentação jurídica

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, importa entrar no conhecimento do mesmo, tendo presente que a acção para declaração de perda de mandato se estribou na inelegibilidade prevista na alínea d), do nº 1, do artigo 7º da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto, nos termos da qual “não são elegíveis para os órgãos das autarquias locais dos círculos eleitorais onde exercem funções ou jurisdição os funcionários dos órgãos das autarquias locais ou dos entes por estas constituídos ou que detenham posição maioritária, que exerçam funções de direcção, salvo no caso de suspensão obrigatória de funções desde a data de entrega da lista de candidatura em que se integrem”.

Tendo presente a matéria de facto assente – que não foi objecto de qualquer contestação por parte do recorrente – o Tribunal a quo julgou procedente a acção, declarando a perda de mandato do R..

Resulta da matéria de facto provada que o ora recorrente, na altura da apresentação da candidatura da lista que integrava à Assembleia de Freguesia da União de Freguesias de Sacavém e Prior Velho, exercia as funções de Chefe de Divisão Financeira dos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento do Município de Loures, em regime de comissão de serviço, não tendo requerido a suspensão das referidas funções – cfr. alíneas B), C) e F) dos factos assentes –, lista que era encabeçada pelo recorrente e que foi a mais votada nas eleições autárquicas para os mandatos de 2013 a 2017, o que conduziu à investidura no cargo de presidente da Junta de Freguesia de Sacavém e Prior o Velho, e, por inerência, no de membro da Assembleia Municipal de Loures, que acumula com o exercício daquele cargo de chefe de divisão – cfr. alíneas E) e F) dos factos assentes.

Como bem se refere na decisão recorrida: “Os serviços municipalizados integram a estrutura organizacional dos respectivos municípios, embora possuam organização autónoma no âmbito da Administração Municipal, sendo geridos sob a forma empresarial, cabendo a gestão nos termos da lei aos respectivos conselhos de administração, cujos membros são nomeados pelas câmaras municipais de entre os seus membros (cfr. artigos 8.º, 12.º, e 15.º, da Lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto).
Ao pessoal dirigente dos serviços municipalizados aplica-se o Estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da Administração Central, Regional e Local do Estado, aprovado pela Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, com as adaptações previstas na Lei n.º 49/2012, de 29 de Agosto.
O cargo de chefe de divisão que o Réu exerce nos SMAS de Loures é um cargo dirigente (cfr. artigo 5º, nº 1, alínea c), da Lei nº 49/2012, de Agosto), integrado na estrutura organizativa do Município de Loures (cfr. artigo 8.º, da Lei n.º 50/2012, de 31 de Agosto).
Cabendo a presidência da junta de freguesia ao cidadão que encabeçar a lista mais votada na eleição para a assembleia de freguesia, sendo a assembleia municipal constituída, desde logo, pelos presidentes das juntas de freguesia da área do município, (cf. artigos 24.º, n.º 1, 42.º, n.º 1, da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro), tem de considerar-se que a candidatura no primeiro lugar da lista à assembleia de freguesia é simultaneamente uma candidatura à assembleia municipal e por consequência o cidadão que é inelegível para a assembleia municipal não pode candidatar-se nesse lugar à eleição de uma assembleia de freguesia do mesmo município por estar ferido daquela inelegibilidade – vd. O douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 23 de Abril de 2003 (Processo n.º 0671/03), disponível em www.dgsi.pt
Face ao exposto, temos de concluir que o Réu só podia ser candidato à Assembleia de Freguesia da União de Freguesias de Sacavém e Prior Velho se tivesse suspendido as funções de chefe da Divisão Financeira dos Serviços Municipalizados de Água e Saneamento do Município de Loures, desde a data da entrega da sua candidatura, o que não fez, conforme o próprio reconheceu, na sua Contestação, verificando-se, assim, a alegada inelegibilidade, prevista na alínea d), do n.º 1, do artigo 7.º, da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de Agosto”, juízo que, atendendo à matéria de facto assente este Tribunal acolhe, importando, partindo destas premissas, determinar se a inelegibilidade em apreço é determinante, conforme foi entendido na decisão recorrida, da perda de mandato do recorrente, perda de mandato prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 8º da Lei 27/96, de 1 de Agosto, de acordo com a qual “incorrem em perda de mandato os membros dos órgãos autárquicos ou das entidades equiparadas que “após a eleição, sejam colocados em situação que os torne inelegíveis ou relativamente aos quais se tornem conhecidos elementos reveladores de uma situação de inelegibilidade já existente, e ainda subsistente, mas não detectada previamente à eleição.”

O recorrente estribou a quase totalidade na respectiva pretensão recursiva – com excepção da inconstitucionalidade apontada à alínea d) do artigo 7º da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto -, na interpretação que o Tribunal a quo teve da referida norma nas concretas situações do caso, tendo referido, em suma, não ter efectiva consciência da existência da disposição em apreço, não sabendo que se encontrava numa situação de inelegibilidade e na existência de causas que justifiquem o facto ou excludentes da culpa do agente, estribado no artigo 10º da Lei nº 27/96, de 1 de Agosto.

Vejamos:

De acordo com o artigo 50º nº 1 da Lei Fundamental “todos os cidadãos têm o direito de acesso, em condições de igualdade e liberdade, a cargos públicos”, prevendo o nº 3 que “no acesso a cargos electivos a lei só pode estabelecer as inelegibilidades necessárias para garantir a liberdade de escolha dos eleitores e a isenção e independência do exercício dos respectivos cargos.”

Conforme referem os Profs. Gomes Canotilho e Vital Moreira (1): “O direito de acesso a cargos públicos, sendo um dos direitos, liberdades e garantias, só pode sofrer restrições nos casos expressamente previstos na Constituição (cfr. art. 18º-2). No caso de cargos públicos providos por via eleitoral, as restrições consistem em incapacidades eleitorais e em inelegibilidades.
O nº 3, aditado pela LC nº 1/89, vem expressamente reconhecer a possibilidade de a lei estabelecer inelegibilidades, mas impõe uma clara vinculação teleológica do legislador – garantia da liberdade de escolha dos eleitores e isenção e independência no exercício de cargos electivos -, além de realçar o princípio da proibição do excesso («inelegibilidades necessárias»). A regra é a de que todo o eleitor pode ser eleito, pelo que as excepções tem de ser justificadas. Neste sentido, o princípio é o da elegibilidade, ou seja, (1) a capacidade de um cidadão se candidatar a um cargo electivo, ser eleito e aceitar a eleição (elegibilidade em sentido restrito) e, além disso, (2) a possibilidade de manter e exercer o cargo (mandato) durante o período de tempo constitucional ou legalmente estabelecido (elegibilidade em sentido amplo). As restrições à elegibilidade tanto podem localizar-se em sede de incapacidade justificativa de inelegibilidade consequente (incapacidade eleitoral segundo a lei civil, privação de direitos políticos na sequência judicial condenatória) como em sede de inelegibilidade (idade, nacionalidade)”

No caso em apreço, entendeu o legislador constituir fundamento de inelegibilidade a circunstância de os funcionários dos órgãos das autarquias locais exercerem, nas autarquias locais dos círculos eleitorais para que se pretendem candidatar, funções de direcção, tendo estabelecido uma condição de garantia do exercício do mandato com isenção e imparcialidade, estabelecendo, assim, em nome do supra referido princípio da proibição do excesso ou da proporcionalidade que não se verificará a inelegibilidade em apreço se o candidato suspender – obrigatoriamente – as suas funções desde a data da entrega da lista de candidatura em que se integrem.

Não faz sentido, assim, olhar ao modo de cumprimento das funções do candidato – no caso do recorrente, do eleito local – indagar se o mesmo está ou não sujeito a uma hierarquia, se tal hierarquia, no que diz respeito ao Conselho de Administração, é composta por membros que pertencem a partidos diferentes daquele pelo qual o recorrente se candidatou e foi eleito; ou se “…não tinha efectiva consciência da inexistência desta disposição, e por maioria de razão, que se encontrava numa situação de inelegibilidade” – cfr. conclusão M) -, ou se, o que não deixa de constituir argumentação contraditória – dado que se desconhecia o fundamento de inelegibilidade, como é que pediu o parecer? - pediu um parecer jurídico para saber se se encontrava em situação de inelegibilidade, tendo o autor do mesmo emitido opinião no sentido de não se verificar qualquer inelegibilidade.

Com efeito, se se verifica uma situação de inelegibilidade que não é atempadamente detectada e que persistirá na medida em que o ora recorrente, no item 65º refere que “…o Tribunal pode optar por fazer cessar a comissão de serviço deixando o Réu o cargo de Cgefe de Divisão Financeira dos SMAS de Loures…”, a sanção só pode ser, nos termos do artigo 8º nº 1 alínea d) da Lei nº 27/96, de Agosto, a perda de mandato, dado que, se assim não fosse, a consequência seria a de que um cidadão eleitor inelegível para determinado cargo electivo poderia exercer o mesmo, se a situação de inelegibilidade fosse posteriormente detectada, desde que as concretas circunstâncias do caso o permitissem, possibilidade que o legislador quis afastar expressando a vontade segundo a qual se determinado cidadão era inelegível deve perder o mandato se tal inelegibilidade apenas foi detectada posteriormente.

O supra expendido entendimento foi o adoptado pelo Tribunal Constitucional no Acórdão nº 382/2001, proferido em 26 de Setembro – referido nas contra alegações de recurso –, no qual estava em causa a inelegibilidade consagrada no artigo 4º, nº 1 alínea c) do Decreto Lei nº 701-B/76, de 29 de Setembro, com a redacção conferida pelo Decreto Lei nº 757/76, de 21 de Outubro, já vigência da Lei nº 27/96 do qual se transcreve o seguinte passo:
(…)
“Importa agora analisar se a perda de mandato aplicável com fundamento em inelegibilidade se afigura como solução legislativa inconstitucional por violação da proibição de excesso e do princípio da proporcionalidade, como defende o recorrente.

A Lei nº. 27/96, de 1 de Agosto, estipula na alínea b) do nº. 1 do artigo 8º que incorrem na perda de mandato os membros dos órgãos autárquicos que após a eleição sejam colocados em situação que os torne inelegíveis ou relativamente aos quais se tornem conhecidos elementos reveladores de situação de inelegibilidade existente e ainda subsistente, mas não detectada previamente à eleição.


Trata-se de solução legal há muito enraizada no nosso ordenamento jurídico, já que no Código Administrativo aprovado pelo Decreto-Lei nº. 31 095, de 31 de Dezembro de 1940, a situação de inelegibilidade ocorrida após a eleição para cargos electivos figurava como fundamento da perda de mandato (cfr., v.g., artigos 20º e 41º).

A inelegibilidade como fundamento da perda de mandato de quem exerce funções de membro de órgão autárquico justifica-se pela necessidade de garantir a isenção e a independência no exercício do cargo autárquico. Pretende-se assegurar que quem foi eleito membro de órgão autárquico garanta no exercício do cargo essas isenção e independência, competindo ao legislador ordinário criar, por um lado, condições para que os cargos autárquicos sejam exercidos com isenção e independência e, por outro, condições para que os titulares dos cargos autárquicos se apresentem aos olhos dos cidadãos como pessoas acima de qualquer suspeita.

Não se vê qualquer razão para distinguir entre as situações de inelegibilidade ab initio – em que a pessoa não pode ser eleita para salvaguarda da transparência, isenção e imparcialidade no exercício de cargo público nos órgãos do poder local – e a inelegibilidade após a eleição de pessoa que, pela qualidade de funcionário dos órgãos representativos das freguesias e dos municípios, não garante essas mesmas características no desempenho das suas funções, independentemente de um juízo de culpa sobre a sua actuação concreta.

Se o funcionário dos órgãos representativos das freguesias e dos municípios não pode ser eleito para os órgãos de poder local – considerando-se inelegível – também não pode continuar a exercer os cargos autárquicos para que foi eleito o funcionário que, após a eleição, reúne/confunde na sua pessoa as qualidades de funcionário e membro de um órgão local (in casu, membro da Assembleia Municipal de Braga), por se encontrar em situação de inelegibilidade. Verificada a inelegibilidade após a eleição, e considerando os valores de isenção e transparência que aquela visa tutelar, independentemente do modo como o autarca exerce, em concreto, os seus poderes, a perda de mandato é uma solução adequada e mesmo irrecusável, em ordem a preservar esses valores e a confiança que o exercício dos cargos autárquicos deve merecer dos cidadãos”

Importa referir que, quer a alínea b) do nº 1 do artigo 8º, quer o artigo 10º da Lei nº 27/96, não foram objecto de qualquer alteração, mantendo a sua redacção originária, contendo a alínea d) do nº 1 do artigo 7º da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto a consagração de uma situação de inelegibilidade menos abrangente da que constava do artigo 4º, nº. 1, alínea c) do Decreto-Lei nº. 701-B/76, de 29 de Setembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº. 757/76, de 21 de Outubro, menor abrangência essa ditada por razões de proporcionalidade e adequação das situações de inelegibilidade, considerando-se assim a que a decisão de perda de mandato do recorrente é proporcional, face aos interesses presentes: a isenção e independência do exercício do mandato para que foi eleito.

Suscitou, por último, o recorrente, a inconstitucionalidade da alínea d) do nº 1 do artigo 7º da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto, por a mesma contrariar o nº 3 do artigo 50º da C.R.P. – supra transcrito – alegando que “…a circunstância de a entidade patronal do recorrente ser um município em nada colide com a circunstância de o recorrente poder ser candidato a uma freguesia da área desse município”, dado o município e a freguesia serem pessoas colectivas distintas, não existindo qualquer entre as mesmas qualquer hierarquia, sendo “…jurídico-constitucionalmente impossível que esteja em causa uma situação de liberdade de escolha dos eleitores ou a isenção e independência do exercício do cargo…” a que se candidatou – cfr. conclusões QQ e RR.

Conforme se referiu supra a criação, pelo legislador, de situações de inelegibilidades deve limitar-se ao estritamente necessário, devendo os contornos das mesmas mostrarem-se delimitados pelo princípio da proporcionalidade, o que se verifica no caso em apreço, dado a inelegibilidade prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 7º da Lei Orgânica nº 1/2001, de 14 de Agosto, de acordo com a qual os funcionários dos órgãos das autarquias locais se exercerem funções de direcção, nas autarquias locais dos círculos eleitorais onde se pretendem candidatar, devem suspender tais funções se revelar adequada e proporcional como condição de garantia do exercício do mandato com isenção e imparcialidade, estabelecendo, assim, em nome do supra referido princípio da proibição do excesso, a possibilidade de tais cidadãos integrarem listas de candidatura aos órgãos das autarquias locais, desde que suspendam as funções de direcção que exerçam, assim conciliando as referidas necessidades de exercício do mandato com isenção e imparcialidade com a capacidade eleitoral passiva de cada cidadão, pelo que a norma em apreço não padece da inconstitucionalidade que lhe é assacada pelo recorrente.

IV) Decisão

Assim, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul, em negar provimento ao recurso.
Sem custas, face à isenção prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 4º do R.C.P..
Cumpra-se o disposto no artº 15º nº 7 da Lei nº 27/96, de 01 de Agosto, após trânsito.
Lisboa, 26 de Novembro de 2015


Nuno Coutinho


Carlos Araújo


Rui Belfo Pereira

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(1) “Constituição da República Portuguesa Anotada”, pag. 677/678, 4ª edição revista