Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 08233/14 |
Secção: | CT- 2º JUÍZO |
Data do Acordão: | 06/04/2015 |
Relator: | ANABELA RUSSO |
Descritores: | CAAD/SISTEMA DE GESTÃO PROCESSUAL/IMPUGNAÇÃO DE DECISÃO ARBITRAL/VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO/NULIDADE PROCESSUAL |
Sumário: | I – Volvidos cerca de 4 anos da introdução no ordenamento jurídico português da regulamentação especial da arbitragem voluntária em matéria tributária, realizada pelo DL n.º Decreto-Lei nº10/2011 de 20 de Janeiro, mantém-se firme o entendimento jurisprudencial de que nessa regulamentação ficou estabelecido um elenco fechado de fundamentos capazes de suportar a impugnação de decisões arbitrais para os Tribunais Centrais Administrativos traduzidos na falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, na oposição dos fundamentos com a decisão, na pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia de questões e na violação dos princípios do contraditório e da igualdade de partes (artigos 16.º, 27.º e 28.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária). II – Tendo ficado definido perante o Tribunal Arbitral, nos termos e ao abrigo do preceituado no artigo 18.º do Regime Jurídico de Arbitragem Tributária, que seriam produzidas alegações finais escritas no prazo de 10 dias contados da pronúncia de uma delas quanto aos documentos juntos pela outra, e tendo-se provado que ambas as partes, dentro do referido prazo, as produziram e remeteram ao Tribunal, tem que concluir-se que nenhuma das partes foi impedida de alegar e, consequentemente, pela inexistência de violação dos princípios do contraditório e da igualdade de armas (nos termos em que os mesmos se mostram conformados nos artigos 3.º e 4.º do Código de Processo Civil), susceptível de suportar a impugnação da decisão arbitral nos termos do artigo 16.º do RJAT. III – Não obstante o que vimos dizendo, se as alegações finais de uma das partes, por lapso assumido pela Secretaria do CAAD, não foram integradas no Sistema de Gestão Processual (sistema interno do CAAD através do qual se processam electronicamente os autos que aí correm termos), delas não teve conhecimento o Tribunal Arbitral (que no relatório da sentença as deu como não existentes) e nessa peça processual foram suscitadas diversas questões quanto à instrução e discussão (de facto e direito) da causa sobre as quais o Tribunal expressamente se não pronunciou, é de julgar verificada irregularidade relevante, isto é, com efeitos invalidantes do processado na medida em que aquela omissão é susceptível de ter tido “influência no exame ou decisão da causa”. IV- Tendo a nulidade secundária, julgada como verificada, sido tempestivamente arguida pela interessada - por dela apenas ter tido conhecimento com a notificação da sentença e a ter imediatamente suscitado nas alegações de recurso que daquela interpôs –, impõe-se anular todo o processado a partir da omissão da prática do acto devido, incluindo a sentença arbitral proferida (tudo, conforme, designadamente, artigos 195.º n.º 1, 196.º e 199.º e 156.º do Código de Processo Civil, aplicáveis “ex vi” artigo 29.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária). |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | Acórdão I - Relatório A Autoridade Tributária e Aduaneira, inconformado com a decisão arbitral proferida no processo nº171/2014-T, intentado por …………………………., S.A veio, ao abrigo do preceituado nos artigos 26.º e 27.º do Decreto-Lei nº10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, doravante apenas designado por RJAT), impugnar tal decisão, formulando, a final, as seguintes conclusões: «1.ª A presente impugnação visa reagir contra a decisão arbitral proferida a 2014-11-07 pelo Tribunal Arbitral Singular; 2.ª Sobre a matéria de exceção propalou a decisão arbitral que no caso vertente se encontravam reunidos os requisitos - fundamento da impugnação for exclusivamente matéria de direito e os atos terem sido praticados de acordo com orientações genéricas emitidas pela Impugnante - da dispensa de prévia Reclamação Graciosa à sindicância dos atos de autoliquidação; 3.ª Todavia, a decisão arbitral, quer nos fundamentos de facto quer na matéria de direito, não específica nem demonstra que in casu os fundamentos do pedido de pronúncia arbitral se subsumiam exclusivamente a questões de direito e, muito menos, identifica qual a orientação genérica emitida pela Impugnante ao abrigo da qual a Impugnada escorou a prática dos atos de autoliquidação; 4.ª Assentando o segmento decisório da decisão no pressuposto de que no caso em apreço a Impugnada se encontrava dispensada de prévia apresentação de Reclamação Graciosa antes do escrutínio por parte do tribunal arbitral dos atos de autoliquidação e atendendo a que o fundamento da impugnação se reconduzia a questões exclusivamente de direito e que a prática de tais atos de autoliquidação tiveram por base orientações genéricas emitidas pela Impugnante, impunha-se que a decisão arbitrai tivesse fundamentado e especificado de que modo no caso vertente se encontravam reunidos tais requisitos; 5.ª Porém, a decisão arbitral não especificou nem fundamentou que as questões em análise nos presentes autos se reconduziam a questões exclusivamente de direito e, muito menos, identifica qual a orientação genérica sob a qual foram emitidos os controvertidos atos de autoliquidação, limitando-se apenas em fazer uma citação doutrinária; 6ª Tanto mais que as questões controvertidas nos autos não se reconduzem a questões exclusivamente de direito, na medida em que, em sede de Resposta ao pedido de pronúncia arbitral, a Impugnante impugnou de per si toda a prova carreada pela Impugnada; 7.ª Logo, nunca a impugnação dos atos de autoliquidação poderia contender exclusivamente com questões de direito; 8.ª Por outro lado, a decisão arbitral não identifica qual a orientação genérica emitida pela Recorrente ao abrigo da qual a Recorrida praticou os atos de autoliquidação; 9.ª A falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, abarca não apenas a falta de discriminação dos factos provados e não provados (artigo 123.°/2 do CPPT aplicável ex vi artigo 22.° do RJAT), mas também a falta de exame crítico das provas (artigo 659.°/3 do CPC); 10.ª A nulidade da decisão por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão arbitral corresponde, a montante, à exigência de fundamentação da sentença, no que respeita à fixação da matéria de facto, tal como prevê o artigo 123.°/2 do CPPT: «O juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões»; 11.ª Tal fundamentação consiste na indicação dos meios de prova que foram considerados para formar a convicção do juiz e na sua apreciação crítica, de forma a serem exteriorizadas as razões pelas quais se decidiu num certo sentido e não noutro qualquer; 12.ª É axiomático que da decisão judicial, como culminar de um processo lógico, decorram inelutavelmente os seus fundamentos de facto e de direito, pelo que a violação desse devir lógico em que desagua a decisão judicial consubstancia uma nulidade, na medida em que os fundamentos da decisão não podem conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta com aqueles mesmos fundamentos; 13.ª Nos termos do disposto no artigo 615.°/1-b) do CPC é nula a sentença que «não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão» sendo que, para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade, é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente; 14.ª No caso vertente a decisão arbitral não fundamenta nem identifica que os requisitos da dispensa de prévia Reclamação Graciosa antes da sindicância dos atos de autoliquidação - (i) fundamento da impugnação for exclusivamente matéria de direito (ii) e os atos terem sido praticados de acordo com orientações genéricas emitidas pela Recorrente -, se encontrem verificados e provados nos autos; 15.ª Logo, a decisão arbitral padece da nulidade consubstanciada na não especificação dos fundamentos de facto da decisão a que alude o disposto no artigo 125.°/1 do CPPT e do artigo 28.°/1-a) do RJAT; 16.ª A decisão arbitral enferma ainda de nulidade, nos termos do artigo 28°/-b) do RJAT, por existir oposição entre os fundamentos e a decisão; 17.ª A oposição entre os fundamentos e a decisão sanciona um vício formal que afeta o respetivo silogismo judiciário, concretizado num vício lógico de construção da decisão em que as premissas de facto ou de direito invocadas pelo julgador deviam conduzir não à conclusão decisória tirada, mas antes a uma diferente, quiçá oposta àquela; 18.ª No caso vertente, é peremptório que as premissas em que a decisão arbitral se escorou nunca conduziriam às conclusões retiradas, mas a outras bem diferentes e claramente opostas; 19.ª A decisão arbitral partiu de premissas erradas e inexistentes para concluir que, in casu, se encontravam reunidos os requisitos para a dispensa de prévia Reclamação Graciosa, entendendo que no caso vertente as questões suscitadas se reconduzem a questões exclusivamente de direito e que a prática dos atos sindicados (autoliquidações de IUC) decorrem de orientações genéricas emanadas pela Impugnante; 20.ª É inequívoco que a matéria dos autos não se reconduz a uma questão exclusivamente de direito, que nunca a Impugnante emitiu orientações genéricas atinente à matéria em causa e, muito menos, que a decisão arbitral identifica tais pretensas orientações; 21.ª Consequentemente, os fundamentos em que a decisão arbitral se escora nunca poderiam conduzir à decisão tomada, mas a outra diametralmente oposta; 22.ª Pois que não sendo a questão suscitada exclusivamente de direito e inexistindo claramente orientações genéricas emitidas pela Impugnante, o resultado, partindo a decisão arbitral de uma construção lógica assente nas premissas de facto e de direito que decorrem dos autos, nunca seria o da decisão arbitral, mas outro completamente oposto; 23.ª Daqui resultando que a decisão arbitral ora colocada em crise é nula [artigo 28.°/-b) do RJAT]; 24.ª A sentença proferida pelo Tribunal Arbitral Singular constituído no CAAD padece ainda de nulidade pelo facto de não ter conhecido de questão essencial sobre a qual se deveria ter pronunciado [artigo 28.°/1-c) do RJAT]; 25.ª Por via do pedido de pronúncia arbitral visou a Impugnada colocar em crise as liquidações referentes aos períodos de 2009 a 2012; 26.ª A Impugnante deduziu Resposta ao pedido de pronúncia arbitral no qual sustentou a legalidade daqueles atos tributários: (i) defendendo que o artigo 3° do Código do IUC não contém qualquer presunção ilidível (artigos 30° a 97° da Resposta); (ii) suscitando a inconstitucionalidade da interpretação feita pela Impugnada relativamente ao artigo 3° do Código do IUC (artigos 98° a 104° da Resposta); (iii) colocando em causa o valor probatório das faturas juntas pela Impugnada, tendo salientado incongruências ao nível do seu conteúdo (artigos 105° a 124° da Resposta); e (iv) pugnando pela sua não condenação ao pagamento de juros indemnizatórios e custas arbitrais face à inércia da Impugnada (artigos 125.° a 143.° da Resposta). 27.ª Cada uma destas questões foi devidamente desenvolvida pela Impugnante ao longo do seu articulado, encontrava-se inequivocamente inserida em capítulos autonomizados e, por conseguinte, era perfeitamente identificável por parte de qualquer leitor; 28.ª O Tribunal Arbitral Singular entendeu que as questões a decidir se limitavam a (cfr. pág. 19 da sentença): «2 - Quanto ao mérito: 2.1 - Interpretação do n°1 do art. 3° C/L/C, cie forma a ser determinado se a norma de incidência subjectiva nela inscrita, consagra, ou não, uma presunção legal de incidência tributária, susceptível de ilição [sic], isto é, admite, ou não, que o contribuinte, em nome do qual se encontre o veículo registado na Conservatória do Registo Automóvel, possa demonstrar, através de meios de prova em Direito permitidos, que não é, no período a que o imposto respeita, o seu proprietário, afastando, assim, a presunção de sujeito subjectivo do imposto que sobre ele recai. 2.2 - Juros indemnizatórios - Existência, ou não, do direito a juros indemnizatórios, ao abrigo do art.43° da LGT, no caso de serem anuladas as liquidações e determinado o reembolso da importância peticionada, que teria sido indevidamente paga. 3 - Responsabilidade pelo pagamento das custas arbitrais.» 29.ª Ao longo das páginas 21 a 31 da sentença o Tribunal Arbitral Singular seguiu aquele elenco de questões que lhe cumpria solucionar; 30.ª Contudo, não só o referido elenco de questões fixado pelo Tribunal Arbitral Singular veio omitir a questão referente à inconstitucionalidade da interpretação feita pela Impugnada relativamente ao artigo 3° do Código do IUC, como também - e mais importante ainda - a própria fundamentação da sentença não dedicou uma palavra sequer àquela questão não despicienda. 31.ª A problemática em torno da inconstitucionalidade da interpretação feita pela Impugnada relativamente ao artigo 3° do Código do IUC constitui uma verdadeira questão e não um mero argumento; 32.ª O Tribunal Arbitral Singular não justificou a razão ou as razões que o levaram a não conhecer das questões em causa; 33.ª A problemática em torno da inconstitucionalidade da interpretação feita pela Impugnada relativamente ao artigo 3° do Código do IUC não é uma questão cuja resolução tivesse ficado prejudicada pela resolução das demais questões; 34.ª A sentença arbitral não padece de uma "mera" fundamentação lacónica ou deficiente, antes configura uma "decisão surpresa"; 35.ª Acresce que, ao não cumprir um dos requisitos essenciais inerentes a uma decisão – i.é., a de convencer os seus destinatários - o Tribunal Arbitral Singular coartou irremediável e incompreensivelmente um dos poucos mecanismos de controlo que assistem â Impugnante: o recurso para o Tribunal Constitucional [artigo 70.°/1-b) da Lei 28/82, de 15 de novembro]; 36.ª Finalmente, a decisão arbitral ora colocada em crise foi o corolário de um processo que não respeitou os basilares princípios do contraditório e da igualdade das partes; 37.ª A apresentação de alegações finais não só concretiza um direito ao contraditório, como também um meio de defesa que deve assistir a ambas as partes, sendo que a possibilidade de as mesmas virem a ser dispensadas mediante acordo (cfr. artigo 18°/2 do RJAT) nem por isso as torna um ato inútil, desnecessário ou sequer uma manobra dilatória destinada a entorpecer o regular andamento processual; 38.ª No seguimento da reunião realizada a 2014-11-14 foi acordado entre o Tribunal Arbitral Singular e as partes em litígio que as alegações seriam produzidas sob a forma escrita e de forma sucessiva, no prazo de 10 dias (cfr. pág. 1 da ata de reunião). 39.ª Por mensagem de correio-eletrónico expedida a 2014-11-03, pelas 15h06m a Impugnante remeteu ao CAAD as suas alegações escritas, ou seja, foram tempestivamente apresentadas e pela forma processual exigida (DOCUMENTO 1); 40.ª A referida mensagem foi efetivamente remetida e entregue ao CAAD, não foi por este recusada ou devolvida por qualquer razão técnica, tendo a Impugnante recebido um recibo de entrega (DOCUMENTO 2); 41.ª A Impugnante confiou que o CAAD tinha recebido as alegações finais por si remetidas e que as tinha feito chegar aos respetivos autos arbitrais. 42.ª Contudo a referida peça processual nunca foi inserida no sistema de gestão processual do CAAD (DOCUMENTO 3), levando o Tribunal Arbitral Singular a concluir que «a Requerida não apresentou alegações escritas» (cfr. pág. 4 da sentença); 43.ª Ora, em caso algum podem as partes ser prejudicadas pelos erros e/ou omissões praticados pelas secretarias [artigo 157.°/6 do CPC, ex vi do artigo 29.°/1-e) do RJAT]; 44.ª Acresce que a não junção aos autos das alegações finais tempestivamente apresentadas pela Impugnante traduziu-se numa violação dos princípios do contraditório e da igualdade entre as partes, porquanto a secretaria do CAAD amputou à Impugnante um basilar meio processual que lhe assistia e com isso retirou-lhe um dos mais básicos direitos que o ordenamento jurídico lhe atribui; 45.ª Por outro lado, as alegações apresentadas pela Impugnante revelavam-se imprescindíveis para a boa resolução da causa, porquanto as mesmas: (i) alertavam para a necessidade do tribunal arbitral se pronunciar para a questão da INCONSTITUCIONALIDADE suscitada pela Impugnante (cfr. artigos 34° e 35° das alegações); (ii) salientavam que relativamente ao veículo automóvel com a matrícula 84-24-ZL a Impugnada não juntou NENHUMA PROVA a ele atinente (cfr. artigo 39.° das alegações); (iii) reafirmavam que, além da questão de direito, nos autos estava TAMBÉM em causa matéria de facto (cfr. artigos 40.° e ss. das alegações - DOCUMENTO 4 ora junto); 46.ª A imprescindibilidade das preteridas alegações da Impugnante resulta bem clara dos fundamentos em que assenta a presente Impugnação de Decisão Arbitral; 47.ª Em primeiro lugar, porque, como supra se demonstrou, o Tribunal Arbitral Singular omitiu pronúncia sobre a questão da inconstitucionalidade suscitada pela Impugnante. 48.ª Em segundo lugar, porque o Tribunal Arbitral Singular deu como provado que «os factos dados como provados estão baseados nos documentos indicados relativamente a cada um deles e nos elementos factuais carreados para o processo pelas Partes (...)» (cfr. pág. 21 da sentença), quando na realidade nenhuma fatura de venda foi junta pela Impugnada relativamente ao veículo com a matrícula ……………., pelo que, quanto a este segmento, o Tribunal Arbitral Singular incorreu em erro de julgamento (sendo certo que a sindicância deste último vício não é suscitada na presente impugnação, por inadmissibilidade legal); 49.ª Por terceiro lugar, porque, como supra se demonstrou, o Tribunal Arbitral Singular não especificou os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão e simultaneamente os seus fundamentos estão em oposição com a decisão 50.ª Em suma, as alegações finais apresentadas pela Impugnante, mas injustificadamente não levadas ao conhecimento do julgador arbitral por parte do CAAD, contribuíram irremediavelmente para a prolação de uma má decisão. 51.ª Motivos também pelos quais não deve ser mantida na ordem jurídica a sentença arbitral ora colocada em crise, devendo antes ser aquela declarada nula. Termos em que, por todo o exposto supra e sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve a presente Impugnação ser julgada procedente e, consequentemente, ser declarada nula a decisão arbitral, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA». Foram apresentadas contra-alegações pela ……………………….., S.A., Impugnada nos presentes autos de impugnação de decisão arbitral, que as encerrou nos seguintes termos conclusivos: «1. Os fundamentos da impugnação da decisão arbitral são apenas aqueles que estão taxativamente contemplados no artigo 28º nº1 do RJAT - neles não cabendo o erro de julgamento ou o reexame da apreciação de mérito. O Exmo. Procurador-Geral Adjunto, junto deste Tribunal, notificado nos termos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (aplicável “ex vi” artigo 27.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro), nada disse. Colhidos os «Vistos» dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir. II – Objecto da Impugnação Atentas as alegações vertidas na petição da presente Impugnação da decisão Arbitral e, em especial, as conclusões aí formuladas, conclui-se que, in casu, são as seguintes as questões que importa responder: - A sentença arbitral proferida no âmbito do processo arbitra n.º 171/2014-T é nula por padecer de falta de especificação dos fundamentos de facto e direito capazes de a suportar? - E por omissão de pronúncia e violação dos princípios do contraditório e de igualdade de armas?
III - Fundamentação de Facto Na decisão impugnada ficou decidida a matéria de facto como se segue: 1- A Requerente ………………………….., S.A., também identificada como “……………………..”, é uma instituição financeira que tem por objecto social a prática das operações permitidas aos bancos, com excepção da recepção de depósitos, dispondo, para o efeito, de todas as autorizações legalmente exigíveis. 2- No âmbito da sua actividade, a Requerente celebra com os seus clientes contratos de aluguer de longa duração e contratos de locação financeira, de veículos automóveis, findos os quais transmite a propriedade dos mesmos aos respectivos locatários ou a terceiros. 3- Entre 10 de Dezembro de 2013 e 10 de Dezembro de 2013, verificou a Requerente, na área de acesso reservada à Requerente do Portal das Finanças, a existência das dívidas de IUC constantes dos autos, relativas às viaturas identificadas no Pedido de Pronúncia Arbitral e aos períodos de tributação de 2009, 2010, 2011 e 2012. 4- A Requerente procedeu ao pagamento voluntário do referido IUC. 5- A Requerente não era proprietária dos veículos sub judice, nas datas da ocorrência dos factos geradores do imposto em apreço, embora a propriedade de todos se encontrasse registada em nome da Requerente, com excepção dos veículos com as matrículas …………. e ………………, em que a propriedade se encontrava registada em nome de outrem. 6- A Requerida, no decorrer deste processo, determinou a revogação da documentação da AT da exigibilidade do IUC, relativamente aos veículos com as matrículas ………….. e ………………. 7- Em 12 de Fevereiro de 2014, o requerente apresentou o Pedido de Pronúncia Arbitral que deu origem aos presentes autos.
Ao abrigo do preceituado no artigo 662.º do Código de processo Civil, porque documentalmente comprovado e com relevo para as questões postas em recurso acorda-se em aditar ao probatório a seguinte factualidade: 8 – Consta da certidão apensa a estes autos (e que constitui, por certidão, o processo arbitral) “ATA” da reunião arbitral realizada a 23 de Junho de 2014, da qual consta, designadamente, o seguinte: «ATA DA REUNIÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL SINGULAR «ATA DA REUNIÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL SINGULAR PROCESSO Nº 171/2014-T No dia 14-07-2014, pelas 11.30h, compareceram no Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD - na Avenida Duque de Loulé, nº 72-A, em Lisboa, o Senhor árbitro designado, a Exma. Dra. Ana……………………, na qualidade de mandatária da Requerente, conforme Procuração junta aos autos, e o Exmo. Dr. António………….. e o Exmo. Dr. João…………., juristas em representação do Diretor-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, dirigente máximo dos serviços. Presidiu ao ato o Senhor Árbitro Presidente antes designado, o Exmo. Dr. José………………., que foi secretariado pelo Dr. Filipe…………….., jurista do Centro de Arbitragem Administrativa. Iniciados os trabalhos, a representante da Requerida requereu a produção de prova adicional. A Requerida opôs-se por entender que a prova deve ser apresentada com o pedido de pronúncia Arbitral conforme a jurisprudência citada na resposta. O Tribunal atento o disposto no artº16º, alínea e) do RJAT admitiu o requerido, facultando um prazo de dez dias para o efeito, dispondo a Requerida de vinte dias para, querendo, se pronunciar sobre o seu teor. Os requerimentos seriam introduzidos directamente na SGP sem necessidade de despacho do Senhor Árbitro. Para produção de alegações escritas o Tribunal fixou um prazo de dez dias a contar da resposta da AT à junção de documentos pela Requerida, findo o qual a AT disporá de igual prazo para contra-alegações. Para efeitos de prolação da decisão Arbitral o Tribunal fixou o dia 17 de Novembro de 2014. (…) E nada mais havendo a tratar, o Senhor Árbitro deu por finda a presente reunião e, para constar, foi lavrada a presente ata que vai ser assinada, e entregue uma cópia a todos os presentes.» (cfr. fls. 243-244 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido sendo nosso o negrito aqui aposto). «Centro de Arbitragem Administrativa Processo n° 171/2014-T 12. Consta do “Relatório” da sentença proferida pelo Tribuna Arbitral e nestes autos Impugnada, designadamente que «A Requerida não apresentou alegações escritas» [cfr. certidão apensa]
IV – Fundamentação de Direito Conforme resulta das conclusões com que rematou a presente Impugnação, e que delimitam a sua causa de pedir e as questões a apreciar, a Impugnante assaca à sentença sob escrutínio a nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e direito em que a decisão se suportou; omissão de pronúncia e a violação do princípio do contraditório e de igualdade de armas. Vejamos, pois, o que se nos oferece dizer realçando que volvidos já cerca de 4 anos sobre a introdução no ordenamento jurídico português da regulamentação relativa à arbitragem em matéria tributária e, consequentemente, da existência de um controlo jurisdicional das decisões proferidas pelos Tribunais Arbitrais neste domínio, é seguríssimo afirmar-se que, a delimitação que desse controlo têm sido feita pelos nossos Tribunais Superiores no âmbito das múltiplas decisões proferidas não se afastou minimamente ao longo deste tempo da orientação que desde logo se firmou como única: foi vontade do legislador, e assim o expressou claramente na Lei, estabelecer um elenco fechado de fundamentos de reacção às decisões dos tribunais arbitrais, de que decorre que essa impugnação só deve ser admitida, no que concerne ao seu mérito, para o Tribunal Constitucional e para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do estatuído nos n.º 1 e 2, do art.º 25.º, do aludido DL n.º 10/2011; para este Tribunal Central, essa admissão está dependente, por força do preceituado nos artigos 27.º e 28.º do mesmo diploma legal citado, da reacção impugnatória vir suportada na falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, na oposição dos fundamentos com a decisão, na pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia e na violação dos princípios do contraditório e da igualdade de partes, tal como delimitado pelo art.º 16.º, do mesmo diploma legal. (1) Do que vimos dizendo resulta inequivocamente que é entendimento até hoje uniforme que o meio e os únicos fundamentos legalmente admissíveis como suporte de reacção da decisão dos Tribunais Arbitrais para este Tribunal são, respectivamente, a impugnação da decisão (consagrada no artigo 27.º) e os vícios de forma expressamente tipificados no art.º 28.º, do mencionado DL n.º 10/2011, e supra elencados - correspondendo os três primeiros aos vícios das sentenças dos tribunais tributários, nos termos do plasmado no art.º 125.º, n.º 1, do CPPT, com correspondência ao estatuído nas alíneas b), c) e d), do art.º 615.º do Código de Processo Civil. E, ainda que alguma jurisprudência se tenha ocupado, em casos contados, sobre uma eventual incongruência desse entendimento com a expressão utilizada pelo legislador arbitral ao afirmar que a «[...] decisão arbitral pode ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo [...]» através do presente expediente processual, o certo é que também nesta parte não mereceu acolhimento uma interpretação mais abrangente dos meios ou fundamentos mencionados, nem, de resto, grandes preocupações doutrinais, refutando-se qualquer hipótese de conceder qualquer relevância à terminologia utilizada pelo legislador no n.º 1, do art.º 27.º do referido DL n.º 10/2011. Aliás, em vários arestos deste Tribunal Central em que a questão é directamente apreciada, afirma-se mesmo que “se algumas dúvidas pudessem subsistir sobre o que se vem de afirmar, elas dissipar-se-iam por força dos elementos sistemático, teleológico e histórico, considerando, por um lado, o regime jurídico dos vícios em causa, tal como disciplinado pelo Código de Procedimento e de Processo Tributário e, por outro, a intenção do legislador expressamente manifestada na parte preambular do Decreto-Lei em causa, quando, e para o que aqui releva, refere que «A decisão arbitral poderá ainda ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo com fundamento na especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, na oposição dos fundamentos com a decisão, na pronúncia indevida ou na omissão de pronúncia ou na violação dos princípios do contraditório e da igualdade de partes», transmitindo, assim e de forma inequívoca, a sua opção por uma enumeração taxativa dos fundamentos de impugnação das decisões arbitrais para os Tribunais Centrais Administrativos». (2) Consequentemente, e sendo certo que no caso que ora nos ocupamos se colocam, além de divergências relativas a vícios próprios da sentença, dissentimentos quanto a, no processo e no percurso de formação da decisão, ter sido violado o princípios do contraditório, com a consequente emissão, por força desta violação, de uma decisão totalmente surpresa para a ora Impugnante, assertivo se torna que o presente recurso poderá vir a ser julgado procedente se e na medida em que os seus fundamentos consubstanciem um dos quaisquer vícios formais da decisão estipulados no seu art.º 28.º e antes elencados ou preenchem a previsão constante do artigo 16.º do DL n.º 10/2001. Densificando do ponto de vista jurisprudencial e doutrinal cada um desses fundamentos, começamos por salientar que, no que concerne à falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, é entendimento firme que a mesma apenas ocorre quando haja uma total e absoluta ausência de ambas e não quando ela possa ser entendida, como medíocre, insuficiente ou inadequada, circunstâncias que apenas são susceptíveis de colidir com o valor doutrinal da decisão. (3) Como ensinava já ALBERTO DOS REIS no seu “Código de Processo Civil Anotado”, «Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade do n.º 2.º do art. 668.º». (4) Em suma, e como se afirma no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14-2-2013 «tal nulidade só ocorre quando falte em absoluto a fundamentação, e não já quando se verifique a sua deficiência ou incongruência e, muito menos, quando haja erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou erro na interpretação desta. Isto é, só se verificará quando a fundamentação não exterioriza minimamente as razões (factuais e jurídicas) que levaram o julgador a decidir naquele sentido e não noutro qualquer, ou quando a fundamentação aduzida é ininteligível ou não tem relação perceptível com o julgado, situação em que se está perante uma mera aparência de fundamentação.». Por outro lado e no que toca à oposição entre os fundamentos e a decisão, dir-se-á que ela se consubstancia na contradição entre os pressupostos atendidos no processo lógico - dedutivo e a decisão em que aqueles deviam culminar, isto é, ela verificar-se-á sempre que a conclusão extraída pelo julgador for totalmente divergente ou oposta daquela a que necessariamente conduziria o raciocínio que imediatamente a antecedeu.(5) Também é igualmente pacífico que os restantes vícios consignados na al. c), do n.º 1, do referido art.º 28.º, do DL n.º 10/2011 (omissão e excesso de pronúncia) caracterizam-se, por seu turno, pela violação do preceituado no art.º 125º “in fine” do CPPT, na medida em que o decisor contrarie o poder-dever estritamente vinculado de conhecer de todas as questões que lhe sejam submetidas pelas partes - com excepção, apenas, daquelas que sejam de conhecimento oficioso ou que vejam a respectiva solução prejudicada pela que haja sido dada a outra ou outras entretanto apreciadas - ou, por outro, conheça de questões dessa mesma natureza que não tenham sido colocadas à sua apreciação.(6) Relembremos, ainda a este propósito, que como vem sendo exteriorizado em múltiplos arestos, confortados em doutrina também insistentemente repetida, não devem confundir-se questões com as razões (de facto e de direito), os argumentos, os pressupostos em que a parte funda a sua posição na questão. Assim, e no entender deste Tribunal, serão questões as que se reconduzam à determinação das premissas fundamentais de que a parte pretende extrair uma conclusão em que fundamente o seu pedido. Recorrendo ao esquema do silogismo judiciário (em que a premissa maior é a lei, a menor são os factos e a conclusão é a decisão), teremos uma questão de facto quando está em causa a verificação do facto pressuposto que deva integrar a premissa menor e teremos uma questão de direito quando está em causa a determinação da norma que deva integrar a premissa maior ou do sentido que essa norma tem enquanto critério de resolução desse caso concreto. Diversamente, são argumentos os raciocínios teoréticos desenvolvidos para a verificação de cada uma das premissas. Assim, para determinar se ocorreu uma determinada situação concreta podemos ser obrigados a reconstituir diversos acontecimentos cruzando-os entre si ou mediando-os com o recurso a regras da experiência ou juízos de probabilidade que, na sua instrumentalidade, ajudam ao reconhecê-la (juízos históricos). Mas a questão de facto permanece a mesma. Também para concluir sobre o alcance ou sentido abstracto da previsão normativa (juízo interpretativo) podemos desenvolver argumentos históricos, gramaticais, sistemáticos ou teleológicos, mas a questão de direito permanece a mesma. Por último, deixamos ainda duas notas essenciais deste regime impugnatório atentos os fundamentos convocados. A primeira prende-se com o princípio do contraditório que constitui, como é sabido, um princípio estruturante do ordenamento jurídico português pelo qual é assegurado às partes a participação efectiva no desenvolvimento de todo o litígio, que lhes seja assegurada a possibilidade de influenciar a decisão quer na parte relativa à matéria de facto, em sede probatória (instrução e conclusões passíveis de serem extraídas dessa produção), quer de direito. «No plano da alegação [introdução dos factos principais da causa], «o princípio do contraditório exige que os factos alegados por uma [das partes] (como causa de pedir ou fundamento de excepção) possam pela outra ser contraditados (por impugnação ou por excepção), sendo assim concedida a ambas, em igualdade, a faculdade de sobre todos eles se pronunciarem». No plano da prova, «o princípio do contraditório exige que às partes seja, em igualdade, facultada a proposição de todos os meios probatórios potencialmente relevantes para o apuramento da realidade dos factos (principais ou instrumentais) da causa, que lhes seja consentido fazê-lo até ao momento em que melhor possam decidir da sua conveniência, tidas em conta, porém, as necessidades de andamento do processo, que a produção ou admissão da prova tenha lugar com audiência contraditória de ambas as partes e que estas possam pronunciar-se sobre a apreciação das provas produzidas por si, pelo adversário ou pelo tribunal». Por fim, no plano de Direito e alegações finais, o exercício do contraditório exige que a parte se possa pronunciar e argumentar juridicamente sobre todas as questões e diligências de prova realizada, desenvolvendo perante o Tribunal o seu próprio juízo final, de facto e direito, sustentador do sentido da decisão que tem por firme que deva ser o alcançado e proferido no processo. (7) A segunda nota que se impõe realçar é relativa à proibição de decisão–surpresa, salientando-se que embora a Recorrente a tenha erigido em fundamento autónomo de impugnação, a sua invocação está correlacionada com a referida violação do princípio do contraditório de que, pelo menos na maior parte dos casos, constitui mera decorrência. Efectivamente, os artigos 3º e 4º do actual Código de Processo Civil (cujo teor, no essencial, havia sido introduzido no ordenamento jurídico português pelo Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, e aperfeiçoado pelo Decreto-Lei nº 180/96, de 25 de Setembro ainda na vigência do Código de Processo Civil revogado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho), consagram o princípio do contraditório em duas vertentes: o primeiro em geral e na vertente proibitiva da decisão - surpresa; o segundo no aspecto da alegação dos factos da causa. «Resultam estes preceitos duma concepção moderna do contraditório, mais ampla do que a do direito anterior». (8) «Não se trata já apenas de, formulado um pedido ou tomada uma posição por uma parte, ser dada à contraparte a oportunidade de se pronunciar antes de qualquer decisão e de, oferecida uma prova por uma parte, ter a parte contrária o direito de se pronunciar sobre a sua admissão ou de controlar a sua produção». (9) «Este direito à fiscalização recíproca das partes ao longo do processo é hoje entendido como corolário duma concepção mais geral da contraditoriedade, como garantia da participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, em termos de, em plena igualdade, poderem influenciar todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação, directa ou indirecta, com o objecto da causa e em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão». (10) «No plano das questões de direito, veio a revisão proibir a decisão-surpresa, isto é, a decisão baseada em fundamento que não tenha sido previamente considerado pelas partes». (11) «Esta vertente do princípio [do contraditório] tem fundamentalmente aplicação às questões de conhecimento oficioso que as partes não tenham suscitado, pois as que estejam na disponibilidade exclusiva das partes, tal como as que sejam oficiosamente cognoscíveis mas na realidade tenham sido levantadas por uma das partes, são naturalmente objecto de discussão antes da decisão, sem que o facto de a parte que as não tenha levantado não ter exercido o direito de resposta (desde que este lhe tenha sido facultado) implique falta de contraditoriedade». (12) «Antes de decidir com base em questão (de direito material ou de direito processual) de conhecimento oficioso que as partes não tenham considerado, o juiz deve convidá-las a sobre ela se pronunciarem, seja qual for a fase do processo em que tal ocorra (despacho saneador, sentença, instância de recurso)». (13) «A omissão do convite às partes para tomarem posição sobre a questão oficiosamente levantada gera nulidade, a apreciar nos termos gerais do art. 201º». (14) Mas, ainda assim, «não deve ter (…) lugar o convite para discutir uma questão de direito quando as partes, embora não a tenham invocado expressamente nem referido o preceito legal aplicável, implicitamente a tiveram em conta sem sombra de dúvida, designadamente por ter sido apresentada uma versão fáctica não contrariada que manifestamente não consentia outra qualificação»(15), já que o citado art. 3º, nº 3, do CPC ressalva expressamente da proibição da decisão-surpresa os casos de manifesta desnecessidade. Revertendo agora ao caso concreto, adiantamos, desde já, que para nós assiste razão à Recorrente na sua pretensão de ver anulada a decisão arbitral, ainda que, o que igualmente desde já expressamos, essa anulação assente numa qualificação jurídica distinta da realizada por aquela no que ao seu fundamento respeita (a que, naturalmente, como é sabido, não estamos vinculados) e se retroaja a factos apurados nos autos e anteriores a essa mesma sentença. Explicitemos. No caso concreto o que os autos evidenciam desde logo é que as partes divergem no que concerne à eventual violação pela decisão sindicada do princípio do contraditório que constitui fundamento da presente impugnação e de anulação da decisão arbitral nos termos do estipulado no art.º 16.º, do DL n.º 10/2001. E, assim sendo, assertivo se torna ser por essa concreta questão que a nossa apreciação deve iniciar-se. Atentemos, então, antes de mais, nos fundamentos em que vem suportada essa arguição pela Impugnante, os quais, embora proficuamente concretizados na petição inicial e nas conclusões desta, se consubstanciam, salvo o devido respeito, neste linear raciocínio: a apresentação de alegações finais concretiza um direito ao contraditório e constitui a manifestação do meio de defesa que assiste a ambas as partes, não devendo a possibilidade legalmente consagrada de ser celebrado acordo no sentido de as dispensar interpretado como constituindo aquelas ou o exercício dos direitos que concretizam um acto inútil ou dilatório. E, sendo assim, continua, tendo sido acordado em Tribunal Arbitral que as mesmas se produziriam sob a forma escrita e sucessiva no prazo de 10 dias contados da notificação da pronúncia que viesse a ser realizada quanto aos documentos apresentados, dever que a ora Impugnante cumpriu, deveriam as mesmas ter sido consideradas pelo Tribunal na prolação da sua sentença. O que, conclui, como se constata do teor da decisão arbitral, não ocorreu, aí tendo ficado consignado, sem que justificação alguma haja, que não foram apresentadas pela ora Impugnante apresentou alegações escritas. Ainda com relevo para a decisão da presente questão importa reter que a Impugnante alega que essa violação do princípio do contraditório e da igualdade de armas assumiu efeitos extremamente negativos no caso concreto porquanto nas alegações (i) se alertava para a necessidade do Tribunal Arbitral se pronunciar para a questão da INCONSTITUCIONALIDADE suscitada pela Impugnante (cfr. artigos 34° e 35° das alegações); (ii) se salientava que relativamente ao veículo automóvel com a matrícula ……………… a Impugnada não tinha junto NENHUMA PROVA a ele atinente (cfr. artigo 39.° das alegações); (iii) se reafirmava que, além da questão de direito, nos autos estava TAMBÉM em causa matéria de facto (cfr. artigos 40.° e ss. das alegações - DOCUMENTO 4 ora junto). Tudo, adianta, questões totalmente desconsideradas na sentença recorrida e que suportam ainda a sua conclusão de que “aquelas alegações eram imprescindíveis para a boa resolução da causa tanto mais que, como é sabido, em matéria de erro de julgamento o recurso ou impugnação deste tipo de decisão se encontra assaz cerceado às partes neste regime e para esse contribui precisamente a violação do seu direito de alegar ou a desconsideração das alegações que oportunamente apresentou.». Toda a factualidade invocada se mostra comprovada, isto é, provou-se que foi acordada a realização de alegações escritas, a apresentar no prazo de 10 dias a contar da pronúncia sobre os documentos; que ambas as partes cumpriram escrupulosamente o determinado pelo Tribunal, ainda que, por lapso, as alegações finais da ora Impugnante não tenha sido disponibilizadas (integradas) no sistema de gestão processual através do qual os intervenientes dos autos, incluindo o próprio Tribunal Arbitral, acede ao processo, determinando que este, julgando que nem sequer haviam sido apresentadas, não tivesse considerado no julgamento que realizou os fundamentos de facto e direito e a pronúncia sobre toda a produção de prova aí sedimentados (cfr. factualidade constante do probatório, designadamente os n.ºs 9., 10., 11. e 12. por nós aditados). Não há, pois, qualquer controvérsia possível quanto a estes factos. Mas, sendo assim, então, pelo menos no nosso modesto entender, a questão no caso concreto não é, como aliás a própria Impugnada bem viu, uma questão de violação do princípio do contraditório ou de igualdade de armas, pelo menos não directamente alicerçada na violação do direito de alegar, já que, tendo sido concedido às partes nas mesmas condições - e em estrita obediência à tramitação legal estabelecida e acordada entre as partes -, o direito de alegar, de produzir o seu particular juízo final sobre todas as questões de facto e direito suscitadas no processo e ao longo da sua instrução, o princípio do contraditório e de igualdade de armas [genericamente consagrado no artigo 3.º do CPC e especialmente contemplado no artº.16, al. a), do RJAT e com manifestação noutros normativos legais deste mesmo regime especial, como sejam os artigos 17.º, nº.1, (no qual se concede à Administração Tributária o exercício do direito de resposta ao requerimento apresentado pelo sujeito passivo), 18.º, nº.1, al. b) (norma em que se impõe a audição das partes quanto a eventuais excepções que seja necessário apreciar e decidir antes de conhecer do pedido] foi observado. Do que verdadeiramente se trata, isto é, o que a presente situação configura é uma nulidade processual. É, pois, a apreciação desta nulidade processual, tendo por referência a factualidade que supra se relevou, que cumpre apreciar, por a apreciação dessa questão se impor nos termos do artigo 29.º do Regime Jurídico de Arbitragem em matéria tributária. Porém, antes de enfrentarmos directamente a questão sub judicie, importa que realizamos um breve enquadramento jurídico do regime especifico das nulidades, sobretudo, na parte em que a sua regulamentação se afasta do regime geral das nulidades de sentença (ou das outras decisões judiciais) uma vez que, só por referência a esse especifico regime se logrará encontrar o bem fundado da decisão a julgar. E, nesse sentido, comecemos por salientar que, como é sabido, as nulidades processuais se distinguem do regime das nulidades das sentenças que se encontram taxativamente enunciadas no art. 615º, n.º 1 do Código de Processo Civil (doravante, simplesmente designado por CPC), as quais, em conformidade com o disposto no n.º 2 a 4 do mesmo preceito e diploma legais, devem ser arguidas umas vezes no Tribunal a quo e outras vezes no Tribunal ad quem (cfr., ainda, designadamente, artigos 613.º, 666.º e 679.º, todos do CPC). Distintamente, as nulidades processuais, enquanto “desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder – embora não de modo expresso – uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais”,(16) assume uma regulamentação própria consoante a sua natureza: as nulidades principais, típicas ou nominadas, obedecem, na sua arguição e apreciação, ao regime dos artigos 186.º a 194.º, 196.º a 198.º do CPC; as nulidades secundárias, atípicas ou inominadas, têm a sua regulamentação genérica no artigo 195.º n.º 1 do mesmo CPC, estando a sua arguição sujeita ao regime previsto nos artigos 196.º e 199.º do mesmo Código. Estabeleceu o legislador no art. 195.º, n.º 1 do CPC que: «Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.» Detecta-se, assim, neste normativo, directamente dirigido às nulidades processuais, uma preocupação do legislador em restringir os efeitos do vício que inquina o acto por forma a que apenas nas situações em que seja patente a existência (ou possibilidade de vir a existir) de prejuízo para a relação jurídica litigiosa se deve reconhecer aquele efeito invalidante. Daí que, como ensina Alberto dos Reis, com doutrina que se mantém absolutamente actual, seja importante ter em especial atenção a distinção que neste normativo é realizada entre infracções relevantes e infracções irrelevantes: «Praticando-se um acto que a lei não admite, omitindo-se um acto ou uma formalidade que a lei prescreve, comete-se uma infracção, mas nem sempre esta infracção é relevante, quer dizer, nem sempre produz nulidade. A nulidade só aparece quando se verifica um destes casos: a) Quando a lei expressamente a decreta; b) Quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa. (…) O 2º caso em que a infracção formal tem relevância deixa ao juiz um largo poder de apreciação. É ao tribunal que compete, no seu prudente arbítrio, decretar ou não a nulidade, conforme entenda que a irregularidade cometida pode ou não exercer influência no exame ou decisão da causa. (…) Os actos de processo têm uma finalidade inegável: assegurar a justa decisão da causa; e como a decisão não pode ser conscienciosa e justa se a causa não estiver convenientemente instruída e discutida, segue-se que o fim geral que se tem em vista com a regulação e organização dos actos de processo está satisfeito se as diligências, actos e formalidades que se praticaram garantem a instrução, a discussão e o julgamento regular do pleito; pelo contrário, o referido fim mostrar-se-á prejudicado se praticaram ou omitiram actos ou deixaram de observar-se formalidades que comprometem o conhecimento regular da causa e portanto a instrução, a discussão ou o julgamento dela. É neste sentido que deve entender-se o passo “quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa. (…) O exame, de que a lei fala, desdobra-se nestas duas operações: instrução e discussão da causa.». (17) Ora, perante o quadro legal descrito, e efectuada uma, ainda que superficial, análise do preceituado nos artigos 186º a 194.º e 196.º a 198.º do CPC (nulidades principais, típicas ou nominadas), isto é, das situações em que o próprio legislador entendeu sancionar com o desvalor invalidante da nulidade, facilmente se conclui que nestas se não integra a omissão que pela Impugnante vem relevada, isto é, a situação de prolação de sentença final em “sentença arbitral” (devidamente adaptado) quando tenha ocorrido omissão de integração em sistema ou plataforma electrónica de peça processual tempestiva e devidamente apresentada pela parte, nos termos em que essa faculdade se encontra reconhecida. Mas, sendo assim, a questão que se coloca é a de saber se, no caso dos autos tal omissão é susceptível de “influir no exame ou na decisão da causa”, situação em que àquela “infracção” deve ser reconhecido o efeito invalidante da nulidade. Adiante-se, desde já, que para nós não existe a mínima dúvida na resposta a dar a esta questão: deve ser reconhecido efeito invalidante nos termos do artigo 195.º n.º 1 do CPC, na medida em que a omissão de integração das alegações na respectiva plataforma electrónica se traduz em irregularidade “com manifesta influência no exame ou decisão da causa”. Senão, vejamos. Dispôs o legislador no Regime Jurídico que ordena a Arbitragem em matéria Tributária, que constituem “Princípios processuais do processo arbitral»: a) O contraditório, assegurado, designadamente, através da faculdade conferida às partes de se pronunciarem sobre quaisquer questões de facto ou de direito suscitadas no processo; b) A igualdade das partes, concretizado pelo reconhecimento do mesmo estatuto substancial às partes, designadamente para efeitos do exercício de faculdades e do uso de meios de defesa; c) A autonomia do tribunal arbitral na condução do processo e na determinação das regras a observar com vista à obtenção, em prazo razoável, de uma pronúncia de mérito sobre as pretensões formuladas; d) A oralidade e a imediação, como princípios operativos da discussão das matérias de facto e de direito; e) A livre apreciação dos factos e a livre determinação das diligências de produção de prova necessárias, de acordo com as regras da experiência e a livre convicção dos árbitros; f) A cooperação e boa fé processual, aplicável aos árbitros, às partes e aos mandatários; g) A publicidade, assegurando-se a divulgação das decisões arbitrais devidamente expurgadas de quaisquer elementos suscetíveis de identificar a pessoa ou pessoas a que dizem respeito.» (artigo 16.º do RJAT) Sem prejuízo do estabelecido no todo do artigo transcrito, e até como meio de concretização do aí estipulado, determinou o legislador que, logo na 1ª reunião do Tribunal Arbitral com as partes (após apresentada a resposta e, naturalmente, na presença de elementos bastantes a aferir de diversas questões pertinentes, designadamente da complexidade da causa) na qual é definida, para o que ora nos importa considerar, a «a tramitação processual a adoptar em função das circunstâncias do caso e da complexidade do processo e «comunicada às partes uma data para as alegações orais, caso sejam necessárias, bem como a data para a decisão arbitral, tendo em conta o disposto no artigo 21.º» e, «Finda a produção da prova, ordenar-se-á a notificação dos interessados para alegarem por escrito no prazo fixado pelo juiz, que não será superior a 30 dias.». Como se constata do probatório, em especial na parte por nós aditada, o que ficou acordado entre as partes foi que a produção das alegações se realizaria por escrito e no prazo de 10 dias após a ocorrência da notificação da pronúncia de uma das partes quanto a um conjunto de documentos (cfr. números 8. e 9. do ponto II supra). Notificação que foi realizada e alegações que foram apresentadas (cfr., o mesmo ponto II, factos assentes sob os números 10. e 11.). O que sucedeu foi que, insista-se, a Secretaria não cumpriu com os deveres que lhe estavam impostos, não integrando no Sistema de Gestão Processual que internamente regula a tramitação dos autos (cfr., entre outros, artigos 10.º n.º 2 e 3, 11.º n.º 6 e 12.º do RJAT, dos quais parece decorrer que a tramitação electrónica através do referido Sistema de Gestão Processual é inquestionável), impedindo que essas alegações, apresentadas ao abrigo e no exercício do direito da parte em alegar e no prazo determinado pelo próprio Tribunal, por este fossem consideradas. Ou seja, não obstante ter sido assegurado, como legalmente se impõe, o contraditório no processo arbitral [art. 16.º do RJAT e 3.º do CPC – este último aplicável “ex vi” artigo 29.º do mesmo diploma legal em primeiro lugar citado], tendo as partes e o Tribunal acordado na produção de alegações e tendo a Impugnante procedido a essa apresentação, aí suscitando todo um conjunto de questões de facto, prova e direito não especificadamente apreciadas pelo Tribunal Arbitral e não havendo dúvidas de que essas alegações constituíam o meio e o tempo próprio para o fazer e não puderam ser consideradas, forçoso é concluir que essa irregularidade processual assumida já pela Secretaria do CAAD teve manifesta influência no exame da causa e pode mesmo ter sido negativamente determinante para a sua decisão ou para os termos em que foi proferida. Do que vimos dizendo resulta, pois, que discordamos inteiramente da posição assumida pela Impugnada no sentido de que, tendo a Impugnante tido a oportunidade de se pronunciar ao longo do processo sobre as excepções e sobre a prova produzida sempre será de julgar absolutamente irrelevante o que quer que a parte tenha vindo a invocar nas eventuais alegações que tenha junto. E discordamos por três ordens de razão. A primeira é a de que, como deixámos claramente expresso aquando do enquadramento de direito realizado, a produção de alegação não é apenas exigível quando as partes não tiveram a oportunidade de anteriormente se pronunciarem sobre a matéria da causa ou sobre a prova produzida. Aliás, se assim fosse, poucas vezes elas se realizariam ou poucas vezes as partes teriam oportunidade de as produzir, já que, queremos crer, só muito excepcionalmente os autos chegam ao seu termo sem as partes se pronunciem quanto às matérias aí em questão e quanto à prova produzida. A produção de alegações finais, enquanto acto através do qual as partes levam ao Tribunal a sua posição, as suas ilações sobre as questões de facto e direito e o sentido da decisão porque pugnam é a regra a observar, sobretudo quando as questões são múltiplas, complexas e os autos envolveram um numero crescente de diligências instrutórias. Ou seja, contrariamente ao que parece depreender-se da posição assumida pela Impugnante nas suas contra-alegações, a exigibilidade, no caso legal e acordada, de produção de alegações é tanto maior quanto maior tiver sido a intervenção das partes ao longo do processo e a complexidade das questões, a demandar uma posição ou leitura final da parte relativamente ao todo que o processo é. Por essa razão, é que o Tribunal Arbitral e as partes acharam devida essa produção de alegações, carecendo de sentido agora, e porque aquelas não foram juntas, afirmar-se que também não fazem falta nenhuma porque nada do que aí foi ou possa ter sido dito terá qualquer influência na apreciação e exame da causa! Por outro lado, e esta é a segunda das razões porque discordamos do defendido pela Impugnante (e sobre a qual entendemos pronunciar-nos directamente face à importância atribuída a este argumento pela Impugnada), não é o facto de a Impugnante se ter pronunciado oportunamente sobre as excepções ou de forma detalhada sobre os múltiplos documentos juntos (cfr. factualidade assente sob o n.º 10 do probatório – ponto III supra) que, sem mais, nos permite concluir pela irrelevância da arguida nulidade. Como ensina Jorge Lopes de Sousa «A circunstância de, eventualmente, cada uma das partes ter tido oportunidade de se pronunciar sobre os documentos apresentados pela parte contrária, não dispensa as alegações» (18), tanto mais que, como é sabido, não pode confundir-se a pronúncia expressa para efeitos de impugnação do teor ou autenticidade do documento com as ilações que do mesmo possam ser extraídas conjugadas com outros elementos de facto que possam constar do processo, ou que posteriormente a este tenham sido juntos, nem com as ilações/argumentos jurídicos que nesse momento final se entendam como podendo ser expendidos. Por último, queremos fazer notar que no especifico contexto processual em que nos movemos não podemos deixar ainda de ser sensíveis a um argumento adiantado pela Impugnante, o qual, pese embora não possa ser visto como directamente relacionado com uma eventual influência no exame e decisão da causa no Tribunal Arbitral, é condicionador de um eventual exame e decisão da causa em outras instâncias. Reportamo-nos, naturalmente, à questão relativa à omissão de pronúncia sobre várias questões, pelo menos no entender da Impugnante, para as quais chama a atenção do Tribunal Arbitral de forma veemente nas suas alegações finais. É certo que para a Impugnada o aí convocado não são questões mas meros “argumentos jurídicos”. Acontece porém que, independentemente do que possa ou deva ser entendido nesta matéria por este Tribunal Central, isto é, independentemente de este Tribunal Central entender que as inconstitucionalidades imputadas a um normativo legal, nos termos em que é interpretado por um Tribunal, constituam verdadeiras questões ou argumentos ou da posição que tenha sobre se mesmos constituindo argumentos, porque essenciais no todo da pretensão, devem ou não ser objecto de apreciação por um Tribunal, insiste-se, independentemente disso, é ao Tribunal Arbitral, na presença de tais alegações, que cumprirá, antes de mais, efectuar esse juízo permitindo, assim, dessa forma, quiçá, outro tipo de recurso ou impugnação dessa mesma decisão, nos termos em que, em conformidade com a nossa Constituição e uma tutela jurisdicional efectiva, ele se mostra especialmente previsto no RJAT. Donde, sendo inequívoco que as partes não podem ser prejudicadas pelos erros ou actos praticados pela Secretaria (artigo 157.º n.º 6 do CPC, aplicável, sempre, “ex vi” artigo 29.º do RJAT), in casu, pela omissão àquela imputável de integração no Sistema de Gestão Processual das referidas alegações finais da parte e que dessa omissão resultou a total desconsideração quer das alegações, quer de todas as questões suscitadas e susceptíveis de influir no exame e decisão da causa pelo Tribunal Arbitral, forçoso é concluir pela verificação da nulidade processual apontada, bem como pelos consequentes efeitos invalidantes (porquanto estamos face a nulidade que é susceptível de afectar os direitos adjectivos e/ou substantivos das partes, mormente da Impugnante) a qual importa declarar com as legais consequências por a tal nada mais obstar, designadamente a eventual intempestividade da sua arguição (dado tratar-se, como já supra deixámos explicitado, de uma nulidade secundária, atípica ou inominada que, salvo casos especiais, só pode conhecer-se mediante “reclamação dos interessados” – artigo 196.º, parte final, do CPC.], que, como vimos, só pode ter sido do conhecimento da Impugnante com a notificação da sentença e foi suscitada no tempo próprio do recurso e nas alegações destes como tem vindo a ser admitido pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores. Em conclusão: cometida nos autos a supra identificada nulidade e arguida a mesma em tempo, importa, fazendo actuar o disposto no artigo 195.º n.º 2 do CPC, anular os termos processuais subsequentes ao momento em que se omitiu a aludida integração no Sistema de Gestão Processual das alegações finais da Impugnante, no que se inclui a sentença de mérito proferida. Face ao ora decidido fica prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas no presente recurso. IV – Decisão Pelo exposto, acordam os Juízes que integram a Secção de Contencioso do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar e declarar verificada nos autos a nulidade processual arguida, com as legais consequências, mormente, anulando-se os termos subsequentes, incluindo a sentença; - Ordenar a remessa dos autos ao Tribunal Tributário para supressão da irregularidade de harmonia com o supra aludido; - Julgar prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas no presente recurso. Sem custas. Notifique e registe. ***** Lisboa, 4 de Junho de 2015
---------------------------------------------------------------------- [Anabela Russo]
------------------------------------------------------------------- [Lurdes Toscano) _____________________________________________________ [Ana Pinhol]
(2) Cfr. Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 19-2-2013 (proferido no processo n.º 5203/11) e de 21-5-2013 (proferido no processo n.º 5922/12). Veja-se, ainda, na doutrina, em igual sentido, Jorge Lopes de Sousa, “Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, Guia da Arbitragem Tributária”, Almedina, 2013, pág.234 e seguintes. (3) Cfr., neste sentido, Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos sobre o Novo Processo Civil “, pág., 219-220. (4) Ob. cit., vol. V, pág. 140. (5) Cfr. neste sentido, e mantendo posição reiterada do nosso Supremo Tribunal, os recentes Acórdãos de 29-5-2013 e de 5-6-2013 (respectivamente, processos n.ºs 842/13 e 1315/12), ambos disponíveis para consulta in www.dgsi.pt. (6) Cfr., neste sentido, o também actualíssimo Ac. do STA de 20-2-2014, lavrado no processo n.º 742/12, mantendo doutrina há muito firmada. (7) Neste sentido segue a doutrina, conforme se pode ver na obra de Mariana França Gouveia, “Curso de Resolução Alternativa de Litígios”, Almedina, 2011, p. 154 e José Lebre de Freitas em “Introdução ao Processo Civil”, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 2009,p. 109. A nível da jurisprudência, e de forma mais recente, o já citado Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 22-1-2015, proferido no processo n.º6208/12. (8) LEBRE DE FREITAS-JOÃO REDINHA-RUI PINTO in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. 1º, 1999, p. (9) LEBRE DE FREITAS-JOÃO REDINHA-RUI PINTO in ob. e vol. citt., pp. 7-8. (10) LEBRE DE FREITAS-JOÃO REDINHA-RUI PINTO in ob. e vol. citt., p. 8. (11) LEBRE DE FREITAS-JOÃO REDINHA-RUI PINTO in ob. e vol. citt., p. 9. (12) LEBRE DE FREITAS-JOÃO REDINHA-RUI PINTO ibidem. (13) LEBRE DE FREITAS-JOÃO REDINHA-RUI PINTO ibidem. (14) LEBRE DE FREITAS-JOÃO REDINHA-RUI PINTO ibidem. (15) LEBRE DE FREITAS-JOÃO REDINHA-RUI PINTO in ob. e vol. citt., p. 10. (16) Manuel de Andrade in “Noções Elementares de Processo Civil”, 1976, pág. 175., (17) Vide, autor citado, in: “Comentário ao Código de Processo Civil”, vol. II, págs. 484 a 487. (18) Autor citado em “Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado”, volume II, nota 3 ao artigo 113.º e nota 8 ao artigo 120.º. |