Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 00875/05 |
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Secção: | CT - 2.º Juízo |
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Data do Acordão: | 01/24/2006 |
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Relator: | José Correia |
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Descritores: | EMBARGOS DE TERCEIRO SUA IMPROPRIEDADE PARA REAGIR CONTRA A PENHORA DE QUINHÃO HEREDITÁRIO |
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Sumário: | I)- O nosso sistema jurídico acolhe a teoria sobre a natureza da comunhão hereditária que vê nesta instituição uma mera comunhão ordinária ou por quotas, uma compropriedade de caracteres especiais, submetida a regras especiais. II)- Nesse âmbito, há que operar com o conceito de comunhão de mão comum para enquadrar o regime a que a lei subordina o património comum dos cônjuges, o das sociedades não personalizadas e o da herança indivisa, regime este que se caracteriza pelo "facto de o direito dos contitulares não incidir directamente sobre cada um dos elementos (coisa ou crédito) que constituem o património, mas sobre tudo ele concebido como um todo unitário, o que equivale a dizer que "aos membros da comunhão, individualmente considerados, não pertencem direitos específicos sobre cada um dos bens que integram o património global, não lhes sendo lícito, por conseguinte, dispor desses bens, ou onerá-los, no seu todo ou em parte. III)- Assim, havendo sido efectivada penhora sobre o direito e acção a herança indivisa, aberta por óbito do marido da Recorrente (art. 232°, alínea c) do C.P.P.T.), sobre a herança como tal, dado que é uma universalidade de coisas, direitos e obrigações, não pode ser exercida posse. IV)- É que a herança é uma universalidade jurídica insusceptível de ser possuída, sendo as coisas integrantes, isoladamente, que constituem o objecto das relações jurídicas pelo que o quinhão hereditário sobre a referida herança é, pois insusceptível de posse, pelo que não pode ser ofendida pela penhora. V)- A essa luz não é configurável a colisão da penhora com a posse ou direitos de gozo da agora Recorrente, porquanto não foi sobre seus direitos que a penhora incidiu visto que o que foi penhorado não foi qualquer dos bens do acervo hereditário, nem mesmo uma fracção deles, mas apenas a parte que nestes cabe ao executado, o direito do executado a tal herança, de acordo com o artigo 232° do C.P.P.T. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACORDA-SE, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO TRIBUTÁRIA DO TCAS:1.- Não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco que julgou improcedentes os embargos de terceiro por si deduzidos contra a penhora realizada nos autos de execução fiscal em que é executado João Joaquim Silva César veio a embargante M...dela interpor recurso para o TCAS concluindo assim as suas alegações: 1. ESTÁ EM CAUSA NOS PRESENTES AUTOS UMA EXECUÇÃO POR DÍVIDAS DA RESPONSABILIDADE DO FILHO DA RECORRENTE. TENDO SIDO, NO DECURSO DA MESMA, PENHORADO 1/6 DO DIREITO E ACÇÃO DA HERANÇA DO EXECUTADO ABERTA POR ÓBITO DO PAI DESTE E MARIDO DA RECORRENTE, PESSOA DE IDADE AVANÇADA QUE COMO SE NÃO BASTASSE ESTAR LANÇADA À SORTE DOS IDOSOS DESTE PAÍS, AINDA ESTÁ NA EMINÊNCIA DE IR VIVER PARA DEBAIXO DA PONTE POR FACTOS QUE NÃO SÃO DA SUA RESPONSABILIDADE. 2. ATENDENDO AO MONTANTE DAS DÍVIDAS DO EXECUTADO E À ESCASSEZ DE BENS QUE CONSTITUEM A HERANÇA, A PENHORA, OBVIA E NECESSARIAMENTE, ATINGE O PRÉDIO URBANO E O RESPECTIVO RECHEIO, PONDO EM CAUSA A PERMANÊNCIA DA RECORRENTE NA SUA RESIDÊNCIA. 3. É QUE O REFERIDO PRÉDIO URBANO É, NADA MAIS NADA MENOS, DO QUE A CASA DE MORADA DE FAMÍLIA DA RECORRENTE, USANDO ESTA O RESPECTIVO RECHEIO PELO QUE INVOCOU A MESMA OS RESPECTIVOS DIREITOS DE HABITAÇÃO E USO, VENDO INDEFERIDA A SUA PRETENSÃO-IMPROCEDIMENTO DOS EMBARGOS - EM SUMA PORQUE ".......SEMPRE QUE A PENHORA, OU QUALQUER OUTRA DILIGÊNCIA ORDENADA JUDICIALMENTE, DIGA RESPEITO APENAS A UMA MERA QUOTA DE HERDEIRO EXECUTADO E NÃO AOS CONCRETOS BENS QUE CONSTITUEM A HERANÇA INDIVISA, JAMAIS SE OFENDERÁ A POSSE EFECTIVA QUE ESTEJA A SER EXERCIDA SOBRE OS MESMOS BENS....." TUDO COMO MELHOR CONSTA DA SENTENÇA RECORRIDA. 4. DISCORDA A RECORRENTE PORQUE NOS TERMOS DO ARTº 1251° DO C.C. "POSSE É O PODER QUE SE MANIFESTA QUANDO ALGUÉM ACTUA POR FORMA CORRESPONDENTE AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE PROPRIEDADE OU ....... DE OUTRO DIREITO REAL" ........ 5. NO CASO CONCRETO TRATA-SE, JUSTAMENTE, "DE OUTRO DIREITO REAL" - O DIREITO DE HABITAÇÃO E USO AMBOS CONSAGRADOS NO ARTº 1484° DO C.P.C. E QUE SÃO ATINGIDOS PELA PENHORA, SOBRETUDO SE TIVERMOS EM CONTA QUE A RECORRENTE VIVE DUMA MAGRA REFORMA E NÃO TEM POSSIBILIDADES DE, NO ACTO DA VENDA EXERCER O SEU DIREITO DE PREFERÊNCIA, TAL COMO NÃO AS TEM PARA QUAISQUER TORNAS PELO QUE O RESULTADO SERÁ IR VIVER PARA DEBAIXO DA PONTE. 6. ORA, TAIS DIREITOS REAIS DE GOZO SÃO SUSCEPTÍVEIS DE POSSE E JÁ SE ENCONTRAVAM NA ESFERA JURÍDICA DA RECORRENTE NA DATA DA DILIGÊNCIA, MESMO ANTES DE O EXECUTADO TER QUAISQUER DIREITOS NA HERANÇA JÁ JAZIAM NA ESFERA JURÍDICA DA RECORRENTE. 7. COMO É SABIDO ESTES DIREITOS SÃO DIREITOS INTUITOS PERSONAE , ABSOLUTAMENTE INTRANSMISSÍVEIS E ESTANDO COMO ESTÁ EXCLUÍDA A SUA INTRANSMISSIBILIDADE, SÃO DESDE LOGO, IMPENHORÁVEIS – ARTºS 1488º DO C.C. E 822º DO C.P.C /AC. RL. DE 22.06.89 JUR. 1989, 3º-150 / PROF. MOTA PINTO, DIREITOS REAIS, 1970/71, 106 E 149 E PROF. ORLANDO DE CARVALHO.. 8. PELO QUE A PENHORA DO DIREITO QUE O EXECUTADO, TEM NA HERANÇA DO SEU PAI, OFENDEU A POSSE DA RECORRENTE SOBRE OS SEUS DIREITOS REAIS DE GOZO - USO E HABITAÇÃO. 9. ASSIM NÃO TENDO SIDO DECIDIDO E ESTANDO COMO ESTAMOS, PERANTE UMA PENHORA ILEGAL, UMA ILEGALIDADE OBJECTIVA POR VIOLAÇÃO DUMA IMPENHORABILIDADE RESULTANTE DUMA INALIENABILIDADE, O TRIBUNAL RECORRIDO VIOLOU, FRONTALMENTE, OS AR'PS 1488° DO C.C. E 822° DO C.P.C. Termos em que entende que deve proceder o Recurso, declarando-se ilegal a Penhora, revogando-se, assim, a Douta Sentença Recorrida, como é de Justiça. Contra-alegou a FªPª formulando as seguintes conclusões: I- O recurso em apreciação incide sobre sentença, produzida nos autos de Embargos de Terceiro que correm termos, sob o n.° 1/2002 P-ET, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco; julgando os mesmos totalmente improcedentes, por não provados. II- Os Embargos de Terceiro foram deduzidos pela agora Recorrente, contra a penhora efectuada sobre o direito e acção a um sexto da herança indivisa aberta por óbito de João Augusto César - marido da recorrente -, que constitui o quinhão hereditário de João Joaquim da Silva César, filho da Recorrente. III- A herança indivisa era constituída por bens móveis, um veículo automóvel e um prédio urbano, melhor descritos no parágrafo 2) dos factos considerados provados na douta sentença recorrida . IV- A Recorrente alega que a supra mencionada penhora atinge, "óbvia e necessariamente", o prédio urbano onde a Recorrente tem a sua casa de morada de família e o respectivo recheio, colocando em causa a permanência da Recorrente na sua residência; alegando, ainda, que a penhora ofende a posse da Recorrente sobre os seus direitos reais de gozo - direitos de uso e habitação - pelo que, esta se encontra ferida de ilegalidade objectiva por violação duma impenhorabilidade resultante duma inalienabilidade, com a decorrente violação, pelo Tribunal recorrido, dos artigos 1488° do Código Civil e 822° do Código de Processo Civil. V- Salvo o devido respeito, não subscrevemos a tese adoptada pela Recorrente nos articulados apresentados, quer nos Autos de Embargos de Terceiros, quer nas alegações produzidas em sede de recurso. VI- Com efeito, o n.° l do artigo 827° do Código de Processo Civil, cuja epígrafe é, "Bens a penhorar na execução contra o herdeiro"; dispõe que, "na execução movida contra o herdeiro só podem penhorar-se os bens que ele tenha recebido do autor da herança". VII- Foi o que, no caso vertente, sucedeu - na forma de penhora efectuada sobre o direito e acção a herança indivisa, aberta por óbito do marido da Recorrente (art. 232°, alínea c) do C.P.P.T.). VIII- Segundo Pires de Lima e Antunes Varela, "Sobre a herança como tal, dado que é uma universalidade de coisas, direitos e obrigações, não pode ser exercida posse (ver o acórdão do S.TJ., de 24 de Fevereiro de 1976, BMJ, n.° 254, págs. 171 e segs.)(in "Código Civil Anotado, Vol. III, 2a Edição, Coimbra Editora, pág. 3; sublinhado nosso). IX- No mesmo sentido decidiu, de forma lapidar, o Acórdão do S.T.A. de 20/11/1996 - Processo 019831, segundo o qual, "Para que os embargos de terceiro possam ter êxito torna-se necessário - para além de outros requisitos (...) que a penhora ofenda a posse. A herança é uma universalidade jurídica insusceptível de ser possuída, sendo as coisas integrantes, isoladamente, que constituem o objecto das relações jurídicas e que portanto constituem o objecto da posse. O quinhão hereditário sobre a referida herança é, pois insusceptível de posse, pelo que não pode ser ofendida pela penhora. Não se verificando ofensa da posse os embargos de terceiro têm de improceder" (negrito nosso). X- Nessa medida, não se considera que tenha ocorrido colisão da penhora com a posse ou direitos de gozo da agora Recorrente, pela razão de que os seus direitos não foram objecto de penhora - o que foi penhorado não foi qualquer dos bens do acervo hereditário, nem mesmo uma fracção deles, mas apenas a parte que nestes cabe ao executado, o direito do executado a tal herança, de acordo com o artigo 232° do C.P.P.T. XI- Conforme referem Pires de Lima e Antunes Varela (op. Cit, pág. 347), a doutrina costuma recorrer ao conceito de comunhão de mão comum para enquadrar o regime a que a lei subordina o património comum dos cônjuges, o das sociedades não personalizadas e o da herança indivisa, regime este que se caracteriza pelo "facto de o direito dos contitulares não incidir directamente sobre cada um dos elementos (coisa ou crédito) que constituem o património, mas sobre tudo ele concebido como um todo unitário, o que equivale a dizer que "aos membros da comunhão, individualmente considerados, não pertencem direitos específicos sobre cada um dos bens que integram o património global, não lhes sendo lícito, por conseguinte, dispor desses bens, ou onerá-los, no seu todo ou em parte"(cfr. fls. 41 dos autos). XII- Assim sendo, e mesmo que a embargante venha referir que o prédio é a única coisa de valor da herança - que não é - não deverá obter provimento o seu pedido, pois que o seu direito não se mostra, por qualquer forma ofendido (cfr. fls. 42 dos autos); não se considerando que a penhora efectuada sobre o direito e acção a um sexto da herança indivisa aberta por óbito do marido da agora Recorrente, que coube ao filho da mesma; padeça de qualquer ilegalidade. XIII- A penhora em questão não se encontra, pois, inquinada de ilegalidade; não se vislumbrando, por outro lado, existir qualquer infracção, pela douta sentença recorrida de qualquer das normas invocadas pela Recorrente. XIV- Pelo até aqui exposto, a douta sentença recorrida parece ter abordado a questão controvertida, de facto e de direito, na observância da legislação aplicável e de acordo com jurisprudência produzida sobre a matéria, decidindo de forma correcta, à qual se adere inteiramente. XV- Com efeito, o meritíssimo juiz a quo atinge o fulcro da questão de direito controvertida, ao referir que - citamos, com a devida vénia: "(...) Sempre que a penhora, ou qualquer outra diligência ordenada judicialmente, diga respeito apenas a uma mera quota de direito executado e não aos concretos bens que constituem a herança indivisa, jamais se ofenderá a posse efectiva que esteja a ser exercida sobre os mesmos bens. Na verdade, sendo o direito à quota parte de uma coisa indivisa insusceptível de posse, não pode haver posse que deva considerar-se ofendida nem, consequentemente, posse para defender". Termos nos quais, deverá o presente recurso ser considerado completamente improcedente, e a douta sentença recorrida ser mantida na íntegra. A EMMP pronunciou-se no sentido de que os embargos devem improceder pelos fundamentos aduzidos pelo MP na 1ª instância (fls. 41/42,114). Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos aos Juizes adjuntos (cfr. art. 707.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT). * 2.- Na sentença recorrida considerou-se que resulta provada a seguinte factualidade: MATÉRIA DE FACTO Com interesse para a decisão a proferir, fixo a seguinte matéria de facto: 1.- Foi instaurada execução fiscal contra João Joaquim Silva César, por dívidas ao Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), provenientes do incumprimento de obrigações de reembolso assumidas no âmbito de acções de apoios financeiros concedidos por aquele instituto e referentes ao ano de 1990, no valor de Euros 16.430,40 (3.294.000$00) - certidão de dívidas a fls. 6 e ss. do apenso de execução; 2. Na execução, foi penhorado o seguinte bem: "Direito e acção a um sexto da herança indivisa aberta por óbito de João Augusto César, residente que foi em Sousel, ocorrido em 22/05/2001 (...) constituída por: -Uma mobília de quarto; uma mobília de sala de estar; uma mobília de sala de jantar; um frigorífico; um fogão; um telefone; um automóvel marca Fora Escort, matrícula PG -48-46 e, prédio urbano inscrito sob o artigo 997, da freguesia de Sousel, sito na Rua da Fraternidade, n° 8. Tem valor presumível de 19.952,00 euros" - Auto de penhora de 10/01/2002, que constitui fls. 95 do apenso de execução. 3. A embargante habita com permanência, há pelo menos 13 anos, no prédio urbano que integra aquela herança, primeiro com o marido João Augusto César e, após o falecimento deste em 22/05/2001, sozinha (depoimentos de fls. 19 a 21); 4. Os embargos foram deduzidos em 13/02/2002 (fls. 2). * Factos não provados: Com interesse para a decisão, não há. * Motivação: Assenta a convicção do tribunal no conjunto da prova documental e testemunhal dos autos, com destaque para a assinalada. * 3.- Perante esta factualidade e aquelas conclusões recursivas, resulta que a questão capital que se coloca neste recurso, é a de saber se a penhora levada a efeito na execução ofende a posse da embargante.O Mº Juiz julgou improcedente os presentes embargos de terceiro com base na seguinte fundamentação: “A execução tem por objecto apreender bens do património do devedor a fim de, através deles, dar satisfação ao interesse do exequente. Essa apreensão efectua-se, na execução, mediante a penhora. Ora, através da penhora pode ofender-se a posse de terceiro, de uma pessoa diversa do executado. O ofendido pode reagir judicialmente à ofensa, mediante o meio processual dos embargos, previsto nos artigos 97°, n° 1, alínea o) e 167°, do CPPT. A procedência dos embargos depende, para além da tempestividade, da alegação e prova da qualidade de terceiro e da posse do bem reportada a momento anterior ao da penhora1. ( Vd. Acórdão do STA, de 22/02/1996, proc. 019765). Nos autos, não é controvertida a oportunidade dos embargos. Por outro lado, ressalta dos autos a qualidade de terceiro da embargante, que não é parte no processo executivo em que se efectuou a penhora. E quanto à demonstração da posse? Posse é o poder real e efectivo que se manifesta quando se actua por forma correspondente ao exercício de um direito juridicamente provido de tutela possessória, como o direito de uso e habitação - artigos 1251° e 1484° do Código Civil. Nos autos vem alegada a posse efectiva da embargante, correspondente ao direito de habitação sobre o prédio urbano que integra a herança, bem como do de uso sobre o respectivo recheio, que também integra a herança. A embargante considera ambos os direitos ofendidos pela penhora do "direito e acção a 1/6 da herança indivisa aberta por óbito de João Augusto César". Mas não é assim. Sempre que a penhora, ou qualquer outra diligência ordenada judicialmente, diga respeito apenas a uma mera quota de herdeiro executado e não aos concretos bens que constituem a herança indivisa, jamais se ofenderá a posse efectiva que esteja a ser exercida sobre os mesmos bens. Na verdade, sendo o direito à quota parte de uma coisa indivisa insusceptível de posse, não pode haver posse que deva considerar-se ofendida nem, consequentemente, posse para defender. Os embargos estão, pois, necessariamente, votados ao insucesso. No sentido do aqui decidido pode ver-se o Acórdão do STA, de 20/11/1996, proc. 019831, onde se sumariou o que se transcreve: «I - Para que os embargos de terceiro possam ter êxito torna-se necessário (...) que a penhora ofenda a posse. II - A herança é uma universalidade jurídica insusceptível de ser possuída, sendo as coisas integrantes, isoladamente, que constituem o objecto das relações jurídicas e portanto constituem o objecto de posse. III - O quinhão hereditário sobre a referida herança é pois insusceptível de posse pelo que não pode esta ser ofendida pela penhora. IV - Não se verificando ofensa da posse os embargos têm de improceder». A esta lógica argumentativa opõe a embargante, no essencial, que atendendo ao montante das dívidas e à escassez de bens que constituem a herança, a penhora, obvia e necessariamente, atinge o prédio urbano e o respectivo recheio, pondo em causa a permanência da recorrente na sua residência, quando é certo que lhe assiste “outro direito real” – o direito de habitação e uso, ambos consagrados no artº 1484º do CPC e que foram atingidos pela penhora tanto mais que a recorrente vive de uma magra reforma que lhe não permite exercer o seu direito de preferência. Mais aduz a recorrente que os invocados direitos reais de gozo são susceptíveis de posse já se encontravam na esfera jurídica da recorrente ao tempo da diligência e até antes de o executado ter quaisquer direitos à herança e, como direitos “intuitos personae” eram absolutamente intransmissíveis e impenhoráveis. Enfim, para a recorrente as penhora do direito que o executado tem na herança do seu pais, ofendeu a posse da recorrente sobre os seus direitos reais de gozo de uso e de habitação. De que lado está a razão? Impõe-se-nos verificar se há nos embargos um «fumum juris», o que o mesmo é dizer, aquilatar se a pretensão da embargante contém um mínimo de condições de seriedade aparente ligadas ainda aos outros fundamentos dos embargos que possam justificar a não execução imediata da diligência. À semelhança das outras acções possessórias, os embargos de terceiro têm uma dupla fundamentação: 1.- um fundamento de direito:-a posse. 2.- e um fundamento de facto:-no caso presente, a lesão da posse, a que deve juntar-se um 3.-especialíssimo consistente em o acto ameaçador da lesão ou lesivo ser uma diligência judicial. Quanto a este último, já vimos que se verifica. Em termos gerais a tutela possessória compete ao possuidor da coisa, retirando-se do artº 1281º do CCivil que a acção de manutenção da posse pode ser intentada pelo perturbado mas apenas contra o perturbador. Nos termos do artº 1278º, nº 2 do CCivil, se a posse não tiver durado mais de um ano, o possuidor só pode ser mantido contra quem não tiver melhor posse, considerando a lei melhor posse a que for titulada. Esclarece, por sua vez, o artº 1259º do mesmo Código, que é titulada a posse fundada em qualquer modo legítimo de adquirir. De tudo isto decorre que como base da acção possessória está o possuidor, que deve provar a sua posse nos seus vários elementos - momento inicial ou facto de aquisição; qualidade que caracteriza a sua origem; continuação dela por todo o tempo pré - fixado na lei e qualidade que ela reveste durante o seu curso ( ver Guerra da Mota, Manual da Acção Possessória, Vol. I, 235-36 ). A prova, pela embargante, destes elementos está-lhe facilitada por um conjunto de presunções legais derivadas duma longa prática que, dada a sua natureza «juris tantum» implicam a inversão do ónus da prova, cumprindo à embargada a prova dos factos em contrário. Antes de mais, presume-se que o possuidor possui em nome próprio, não precariamente. Depois, presume-se que a posse continua em nome de quem a começou- "olim possessor, hodie possessor praesumitur"-, presunção que está estabelecida no artº 1257º, nº 2, do CCivil e completada pelo artº 1254º, nº 1, do mesmo Código ao dispor que se o possuidor actual possui em tempos mais remotos, presume-se que possui também no tempo intermédio- " probatis extremis, media praesumitur". Significa isto que há uma presunção legal de continuidade na posse que se traduz em que o possuidor actual que prove uma posse em data anterior beneficia da presunção de ter possuído no período intermédio. Em suma:- a embargante teria de alegar e provar a posse sobre a coisa que a diligência judicial mandou entregar a outrém- artº 1037º, nº 1, do CPCivil. A este propósito salienta o Prof. J.A.Reis, Processos Especiais, I,404 que aparentemente há falta de coincidência entre a posse jurídica e a posse efectiva quando o possuidor cede a detenção ou fruição real e efectiva a alguém que fica possuindo em seu nome, como é o caso do arrendamento-cfr. artº 1037º, nº 2 do CCivil. Será que a embargante detém alguma posse a que a lei estenda a tutela possessória nos termos especiais regulados nos artºs 97º nº 1 al. o) e 167º do CPPT ? Conforme decidido no Ac. do S.T.J. de 30/10/51, B.M.J. 27º-285, «a posse alegada pelo embargante de terceiro não deve ser apreciada apenas no seu aspecto material. Tem também de o ser no seu aspecto jurídico, quer quanto à origem da posse, ao título em que se baseia, quer quanto à sua eficácia contra o embargado ». Donde se conclui que os embargos de terceiro se destinam a defender a posse real e efectiva. Fundamentando, o fulcro da questão está em saber se a posse do executado ( e, no reverso, a da embargante) foi exercida em nome próprio ou alheio, no fundo, se se trata ou não de uma posse real e efectiva. Ensina Manuel Rodrigues, " A Posse ", pág. 114, que « A posse precária só existe quando o detentor for investido na detenção por um título que não criou em seu favor um interesse próprio. » Apoiando-se nos Acs. do S.T.J. de 2)73/66, BMJ 275º-272 e de 15/1/74, BMJ 233º-173, afirma que os embargos se destinam a defender a posse real ou efectiva, portanto, a posse em nome próprio. No nosso direito- artºs. 1254º e 1259º do CCivil- a tomada de posse pode fazer-se sem qualquer título- é uma posse não titulada. Existirá, neste caso, uma posse natural derivada de simples actuação de facto ("aprehensio") do possuidor. Ou seja, há um título não invocável, no qual coexiste um convénio de utilização antecipada da coisa. Contudo, tal convénio não reveste as características da lei, não é oponível a terceiros que tenham uma melhor posse. E isso torna-se mais evidente ante a natureza do acervo dos bens que constituem o património conjugal. "Quid Juris", sobre a situação configurada pois se provou que foi instaurada execução fiscal contra João Joaquim Silva César, por dívidas ao Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), provenientes do incumprimento de obrigações de reembolso assumidas no âmbito de acções de apoios financeiros concedidos por aquele instituto e referentes ao ano de 1990, no valor de Euros 16.430,40 (3.294.000$00); na execução, foi penhorado em 10/01/2002 o seguinte bem: "Direito e acção a um sexto da herança indivisa aberta por óbito de João Augusto César, residente que foi em Sousel, ocorrido em 22/05/2001 (...) constituída por: -Uma mobília de quarto; uma mobília de sala de estar; uma mobília de sala de jantar; um frigorífico; um fogão; um telefone; um automóvel marca Fora Escort, matrícula PG -48-46 e, prédio urbano inscrito sob o artigo 997, da freguesia de Sousel, sito na Rua da Fraternidade, n° 8. Tem valor presumível de 19.952,00 euros" e que a embargante habita com permanência, há pelo menos 13 anos, no prédio urbano que integra aquela herança, primeiro com o marido João Augusto César e, após o falecimento deste em 22/05/2001, sozinha . Na herança indivisa, no aspecto activo, existe um caso de titularidade de direitos em que todos os herdeiros têm sobre os bens que a constituem, um direito indivisível. Antes da partilha é uma universalidade de direito, um património autónomo, de afectação especial, pelo que a ela não são aplicáveis os princípios da propriedade comum. Mas do art. 2 127º do Código Civil resulta que o regime das compropriedades - art. 1408.º, n.º 2 - é aplicável ao caso de o herdeiro, não obstante a indivisão, dispor de direito determinado pertencente à herança. Ora, segundo este normativo a disposição ou oneração de parte especificada sem consentimento dos consortes é havida como disposição ou oneração de coisa alheia . Na verdade, ao dispor da coisa comum ou de parte determinada desta, o herdeiro dispõe, não apenas do seu direito sobre a coisa, mas também dos direitos dos outros sobre ela. Há aí, portanto, no que respeita ao direito destes uma venda ou disposição de coisa alheia. Assim o declara, expressamente o art. 1408º, nº 2, do Código Civil. Consequentemente, essa venda é ineficaz em relação aos consortes que nela não consentiram, tal como é ineficaz em relação ao verus dominus a venda de coisa totalmente sua em que ele não consinta. Resulta daí que esses consortes não carecem de fazer anular o contrato podendo comportar-se como se ele não tivesse sido celebrado, e que o contrato só poderá será eficaz, quanto a eles, se prestarem o seu consentimento. Mas já não será assim, no caso da penhora que consiste na apreensão, pelo tribunal, dos bens considerados necessários para cobrir, através do seu valor, a indemnização devida, retirando esses bens da disponibilidade do devedor e afectando-os aos fins próprios da execução – cfr. A . Varela, Das Obrigações em Geral, 6º ed. 1º-115). Assim, a penhora efectivada nos autos, traduziu-se no desapossamento de bens do devedor, que ficam na posse do tribunal («in casu» da AT atentos os fins da execução fiscal e a competência que à mesma está legalmente atribuída) a fim de este os usar para realização dos fins da acção executiva )entrega, adjudicação, pagamento); ou seja, com a penhora opera-se uma transmissão forçada da posse, destinando-se a apreensão, ao devedor ou eventualmente a terceiro, para os fins da execução, bens previamente designados – cfr. Castro Mendes, Acção Executiva, 1980-73 e M. Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1970-108). Do que vem dito, é forçoso concluir que é assertiva a afirmação da sentença no sentido de que, incidindo a penhora sobre a quota de herdeiro executado e não aos concretos bens que constituem a herança indivisa, jamais se ofenderá a posse efectiva que esteja a ser exercida sobre os mesmos bens pois, sendo o direito à quota parte de uma coisa indivisa insusceptível de posse, não pode haver posse que deva considerar-se ofendida nem, consequentemente, posse para defender. Nesse sentido, pontifica o Acórdão do STA, de 20/11/1996, proc. 019831, citado na sentença do qual dimana a doutrina segundo a qual para que os embargos de terceiro possam ter êxito torna-se necessário que a penhora ofenda a posse e, como a herança é uma universalidade jurídica insusceptível de ser possuída, sendo as coisas integrantes, isoladamente, que constituem o objecto das relações jurídicas e portanto constituem o objecto de posse, deve entender-se que o quinhão hereditário sobre a referida herança não é susceptível de posse que, assim, não pode esta ser ofendida pela penhora. Aprofundando, como se disse já, são aqui invocáveis as regras da compropriedade e existe compropriedade ou propriedade em comum,«... quando duas ou mais pessoas são simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa»,consoante o disposto no artº 1403º do Cód. Civil. Esclarece o artº 1404º do mesmo diploma legal que as regras de compropriedade são aplicáveis, com as necessárias adaptações, à comunhão de quaisquer outros direitos. Este ponto de vista está, aliás, de acordo com a teoria sobre a natureza da comunhão hereditária que vê nesta instituição uma mera comunhão ordinária ou por quotas, uma compropriedade de caracteres especiais, submetida a regras especiais. Costuma opor-se a esta teoria, seguida por Brugi, Camponi ou Laurent que, enquanto vigora a indivisão, não corresponde aos consortes nenhuma fracção ou quota determinada dos bens comuns, nem podem eles dispor da sua fracção. Ao que Planiol, citado pelo Dr. Eduardo dos Santos, Direito da Família, Tomo II, 134, riposta afirmando que « a indivisão se funda na ideia de associação e na afectação precisa do património comum». É, sem dúvida, esta a teoria acolhida pelo nosso sistema jurídico. Essa comunhão cessa com a partilha que é justamente o acto destinado a fazer cessar a indivisão de um património- cfr. G. Telles, Direito das Sucessões, ed. 1971-206). Conclui-se, pois, que o bem em causa é possuído em comum até a eventual partilha que a ele respeite, se os herdeiros a quiserem. E a partilha opera-se quando os herdeiros não quiserem manter-se na indivisão. Neste caso, ou estão de acordo quanto ao modo de proceder extrajudicialmente à partilha, ou não se entendem e terão de recorrer ao processo de inventário. Existem várias soluções no que tange à natureza jurídica da compropriedade, cuja destrinça reputamos de fulcral para a solução do problema em análise. Defende a doutrina tradicionalista, seguida, nomeadamente, por Manuel Rodrigues, que a compropriedade deriva da coexistência dos direitos de cada um dos consortes sobre uma quota ideal ou intelectual do objecto sobre que ela incide- cada um dos comproprietários tem direito a uma quota ideal não especificada do objecto, ao contrário do que sucede na propriedade singular, que é exercida directamente sobre a coisa. Diversamente se entende noutra corrente, perfilhada por Luís Pinto Coelho, para a qual a compropriedade se trataria da coexistência de vários direitos de propriedade sobre todo o objecto, limitando-se, reciprocamente. Em suma:- existiriam várias propriedades sobre o mesmo objecto, limitadas por outras propriedades com igual objecto. Numa terceira posição sustenta-se ( V. Henrique Mesquita, Direitos Reais, 246 ) que a compropriedade se trata de um único direito com vários titulares. A segunda das posições referidas parece esquecer que a propriedade é um direito absoluto que opõe o seu titular a todos os outros, pelo que é ilógica, como salienta Mota Pinto, Direitos Reais, 257, «a ideia da possibilidade de vários direitos de propriedade plena sobre o mesmo objecto na sua totalidade ». A última posição , por seu turno, confunde em boa medida e no plano de regimes a compropriedade e a comunhão de mão comum ou património colectivo em que existe um só direito com vários titulares, visto que não é possível pedir a divisão pois há uma afectação especial do património a um fim especifico; na compropriedade, cada um dos consócios tem uma boa liberdade para agir isoladamente no que respeita à SUA FRACÇÃO OBJECTO JÁ QUE ESTAMOS EM PRESENÇA DE VÁRIOS DIREITOS INCIDENTES SOBRE TODA A COISA E NÃO SOBRE PARTE ESPECIFICADA DELA, SOBRE UMA QUOTA IDEAL. Resta-nos, assim, aderir à doutrina tradicional segundo a qual cada um dos comproprietários tem direito a uma quota ideal ou intelectual do objecto da compropriedade, que é a única capaz de se harmonizar com a possibilidade que tem cada consorte de requerer a divisão da coisa comum ou de alienar a sua quota ideal quando muito bem entenda. Semelhante doutrina não é prejudicada pelo facto de os consócios terem determinados poderes de uso e de administração sobre toda a coisa pois, voltamos a dizê-lo, o que existe é um direito de propriedade que não versa sobre parte especificada mas sobre uma quota ideal, salvaguardando-se assim um razoável grau de determinação e eliminando o risco da existência de um hipotético direito de propriedade sobre coisas genéricas, que seriam incompatíveis com as exigências de determinação do objecto dos direitos reais. Entendida assim a figura da compropriedade, importa agora saber a que regime jurídico ela fica sujeita, especialmente no que diz respeito às possibilidades de ser praticado um acto(ou actos ) sobre a coisa isoladamente, por um consorte. Nos termos do disposto no artº 1405º, nº 1, do Cód. Civil, todos os consortes exercem, em conjunto, os poderes que correspondem aos do proprietário singular; separadamente, participam nas vantagens e encargos da coisa, em proporção das suas quotas e nos termos dos artigos seguintes. Logo no artº 1406º se dispõe, quanto aos actos que podem ser praticados isoladamente por um dos consortes, que cada consorte pode usar a coisa comum na falta de acordo sobre o seu uso «...Contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prove os outros consortes do uso a que igualmente têm direito». Da conjugação destas disposições legais pode retirar-se que: a)- Se não há acordo entre os consortes quanto ao uso da coisa, cada um deles a poderá usar dentro dos limites legais; b)- Se, porém, houver acordo, cede o disposto na lei perante a convenção das partes. Como escrevem Pires de Lima e Antunes Varela em anotação ao artº 1406º do Cód. Civil, «relativamente ao uso esse preceito admite o principio da solidariedade- a cada um dos comproprietários, seja qual for a sua quota, é lícito servir-se dela, utilizá-la na totalidade e não apenas em parte. A possibilidade de uso integral da coisa, continuam mais adiante os ilustres autores, como se o contitular da propriedade fosse titular único da coisa, vale apenas como princípio supletivo da coisa. Daí que a maioria não poderá privar qualquer dos consortes sem o seu consentimento; daí que a qualquer dos comproprietários seja licito opor que o uso pretendido ou exercido pelos outros o priva do direito que ele tem a usar igualmente da coisa. Quando falte o acordo, o único recurso a adoptar será o do gozo indirecto que consistirá na maior parte dos casos na locação da coisa com a consequente repartição dos proventos dela entre os consortes». Estamos de acordo, pois, com Pires de Lima e A. Varela, ob. e lugar citados, quando relevam que quanto à fruição, no que concretamente se refere à possibilidade de utilização da coisa como fonte de vantagens, o artº 1405º, nº 1, do Cód. Civil consagra a regra da proporcionalidade (em relação à quota de cada comproprietários ). Mas o nº 1 do artº 1405º também é expresso ao sujeitar esse principio ao regime estatuído nos artigos seguintes, na sua parte final. Portanto, esse principio pode ser afastado por acordo. Neste contexto, dir-se-á muito simplesmente que a solução encontrada se ajusta aqui por completo, uma vez que continuam em causa o uso e as vantagens dos bens que a embargante diz pertencerem-lhe e sobre os quais haverá acordo com próprio executado, o que cremos que cai no domínio da liberdade contratual, sendo para tanto necessário o mútuo consentimento dos contraentes nos termos do artº 406º, nº 1, do Cód. Civil. A ser assim, é pertinente a afirmação de que a embargante não detém em exclusivo o "corpus" e o "animus" sobre os bens em causa, que lhe falta uma posse real e efectiva oponível à Fazenda. Na verdade, existirá composse de ambos e não posse exclusiva da embargante sobre o bem penhorado em causa, já que a utilidade do mesmo é usufruída por ambos no regime de contitularidade atenta a relação jurídica constituída. Daí que não tenha a embargante a posse real e efectiva dos mesmos bens. Na verdade e por tudo quanto longamente se expendeu, existirá uma composse dos bens entre embargante e executado insusceptível de fundamentar os presentes embargos. Por outro lado, o efeito que decorre da procedência dos embargos é o levantamento da penhora e quando não está em causa a ofensa da posse pela penhora mas sim, como agora se alega, a invalidade da penhora, a sua ineficácia e/ou a impenhorabilidade dos bens, nenhuma indagação há a fazer acerca dela. Assim, o que releva é que no âmbito de execução fiscal na dependência da qual podem ser deduzidos embargos, haja sido praticado acto ofensivo da posse do embargante que não pode discutir nos embargos os vícios de que possa padecer aquele acto. Como explana Jacinto Rodrigues Bastos no seu CPC Anotado, 1978, pág. 507, o embargante só tem de provar a sua qualidade de terceiro e uma posse digna de tutela jurídica, sendo erro crasso pretender discutir nos embargos de terceiro a legalidade da ordem. Em embargos de terceiro, ainda segundo aquele autor, são inadmissíveis o pedido de anulação da execução, por falta de citação ou notificação e o pedido de suspensão da execução, por representarem oposição à execução e não defesa da posse, sendo idóneos para esta os embargos de terceiro. No mesmo sentido se pronunciou o Acórdão do STJ de 24/6/80, in BMJ 298º-272 ao doutrinar que « Os embargos de terceiro não se destinam a inutilizar, quanto ao embargante, a prova que serviu de fundamento à decisão que ordenou a diligência requerida contra ele, ou seja, a reagir contra a diligência ordenada». Porque assim, tais questões terão o seu lugar próprio na execução sendo os embargos inadmissíveis para reagir contra a ineficácia da penhora em relação à recorrente. Assim, visto que, só depois de ultimada a partilha é que se determinará se os bens penhorados vieram a caber à ora recorrente, terá esta de requerer no processo executivo, fazendo aquela demonstração, o levantamento da penhora por se ter tornado ineficaz em relação a ela, e que se penhorem, de seguida, os bens que foram adjudicados ao executado. Termos em que é manifesta a improcedência dos presentes embargos e, ainda que por fundamentação algo distinta, é de manter o despacho recorrido. * 3.- Nestes termos, acordam os juizes desta 2ª Secção do TCAS em, negando provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida. Custas pela embargante, fixando-se no mínimo a taxa de justiça. * Lisboa, 24/01/2006 Gomes Correia Casimiro Gonçalves Ascensão Lopes |