Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02009/07
Secção:CT-2ª JUÍZO
Data do Acordão:09/20/2011
Relator:ANÍBAL FERRAZ
Descritores:IRC.
PREJUÍZOS.
DEFERIMENTO TÁCITO.
Sumário:1.Por força do disposto no art. 69.º n.º 7 CIRC (redacção da L. 32 -B/2002 de 30.12.), o requerimento aludido no seu n.º 1, desde que acolitado dos elementos previstos no n.º 2, era de considerar tacitamente deferido se a decisão não fosse proferida “no prazo de seis meses a contar da sua apresentação, sem prejuízo das disposições legais antiabuso eventualmente aplicáveis”.

2. Presente o teor do n.º 2 do mesmo art. 69.º (versão do DL. 221/2001 de 7.8.), os elementos em causa são todos que se mostrem “necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos”, em ordem a ser demonstrado que “a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”.

3. O deferimento tácito traduz uma ficção legal, destinada a ultrapassar situações de inacção ou silêncio, por parte da Administração, atributiva do direito de o administrado reputar deferido o pedido feito à entidade administrativa competente, no pressuposto de que somente estão preenchidos os condicionalismos legais da respectiva formação e não que seja legal o seu conteúdo.

4. A mais recente e maioritária jurisprudência do STA, expressa, sobretudo, no Ac. STA (Pleno/CT) de 20.1.2010, rec. 0548/08, sintetizável, pela nossa óptica, na defesa do entendimento de que “os elementos”, referidos no art. 69.º n.º 2 CIRC, não incluem outros além dos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, exclusão esta abrangente, em particular, de elementos destinados a demonstrar verificadas as condições para reconhecimento do direito a benefícios fiscais, inscritas no art. 11.º -A EBF (Estatuto dos Benefícios Fiscais, na redacção do DL. 229/2002, de 31.10.), maxime, a inexistência de dívidas ao sistema da segurança social.

5. Assim, exigir, à impetrante, comprovativos da inexistência de dívidas suas (e outras) à Segurança Social, bem como, o fornecimento de informação sobre o estado de eventuais processos de execução fiscal, em que seriam executadas sociedades abrangidas pela fusão, traduz a prática de actos inócuos, irrelevantes, dirigidos à recolha e disponibilização de dados não susceptíveis de integrarem a previsão do art. 69.º n.º 2 CIRC.

6. Ao invés, no âmbito de procedimentos deste tipo, a cópia do pedido de registo definitivo da operação de fusão configura um elemento documental insubstituível, em função da necessidade de, pelo/a requerente, ser feita a comprovação da publicidade exigida, por lei, para a conclusão de uma operação de fusão societária, capaz de ser oponível a terceiros.

7. A circunstância de um talão de registo comercial ostentar, na qualidade de apresentante, a identidade de um indivíduo e não, destacadamente, a firma da sociedade, requerente, não se apresenta capaz de legitimar que, mais de um ano após a entrega do requerimento e do versado documento, se torne adequado e relevante, para impedir o decurso do prazo legal de deferimento tácito, solicitar, àquela, cópia da certidão do teor da descrição da inscrição da fusão na competente Conservatória, quando, é certo, se comprova que tal talão respeita ao registo do acto de concentração societária em causa nos autos.

8. Demonstrada a produção de deferimento tácito do requerimento identificado em 1. dos factos provados, temos de afirmar a ocorrência de um acto constitutivo de direitos, para a requerente/A., só passível de revogação nos moldes positivados pelo art. 141.º n.º 1 CPA, isto é, “com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida”.

9. Assim, o despacho impugnado nesta acção, porque proferido em 11.5.2007, não respeitou o prazo de um ano, até 11.7.2006, para, legitima e legalmente, efectivar a aludida revogação (implícita, por substituição), sendo, pois, sem mais, consequentemente, ilegal.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: I
P…………… – COMPANHIA …………….., L.DA, contribuinte n.º ……………., com sede na Avenida ……………, n.º……………, Lisboa, propôs a presente acção administrativa especial contra o Exmo. SECRETÁRIO DE ESTADO DOS ASSUNTOS FISCAIS (SEAF) (Ministério das Finanças), para impugnação do seu Despacho n.º 542/2007-XVII, de 11.5.2007, que indeferiu pedido de autorização de transmissão de prejuízos fiscais, no âmbito de fusão societária, apresentado em 11.1.2005.
Aduziu, em síntese, a formação da presunção de deferimento tácito do seu pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais, bem como, que a fusão, por incorporação, que concretizou, é passível de ser enquadrada no regime do art. 67.º CIRC.
Conclui com o pedido de que seja ordenado “O deferimento do pedido de transmissão dos prejuízos fiscais, tal como formulado pela Autora a 11 de Janeiro de 2005, em virtude da verificação dos requisitos previstos nos artigos 67.º e seguintes do CIRC, (…), bem como em função da formação da presunção de deferimento tácito, ao abrigo do disposto no número 7 do artigo 69.º do CIRC, sendo, ainda, declarada a ilegalidade da decisão ora sindicada; (…)”.
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Promovida, nos termos do art. 81.º n.º 1 CPTA, a citação da entidade pública demandada, apresentou-se o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Ministério das Finanças) a contestar, defendendo, no final, que seja absolvido do pedido, com as legais consequências.
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Foi remetido e mostra-se apensado o original do processo administrativo/PA.
Cumprido o disposto no art. 85.º n.ºs 1 e 5 CPTA, o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto defendeu que a acção deve ser julgada improcedente, por não provada - fls. 384.
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Pelo relator, foi proferido o despacho saneador de fls. 301, onde, aferida a validade e regularidade da instância, se entendeu não haver lugar à produção de mais prova.
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Notificadas, autora/A. e entidade demandada, nos termos e para os efeitos do art. 91.º n.º 4 CPTA, alegaram, por escrito, concluindo a A. nos seguintes moldes: «
I) A Autora entende que uma operação de fusão invertida tem expresso acolhimento na alínea a) do n.° 1 do artigo 67.° do CIRC;
II) A operação de fusão efectuada pelo Autora caracteriza-se para efeitos legais como uma fusão por incorporação, de acordo com o artigo 97.° do CSC e mais concretamente como uma fusão invertida, pelo facto de a sociedade incorporante ser integralmente detida pela sociedade incorporada;
III) Na fusão invertida concretiza-se uma sucessão universal de direitos e obrigações para a esfera da sociedade incorporante;
IV) A entrega de acções próprias não desvirtua ou afasta a qualificação da operação como de reestruturação empresarial e como fusão por incorporação;
V) A particularidade da presente operação consiste na detenção da incorporante por parte de uma das incorporadas e do facto de não ter existido aumento de capital da sociedade incorporante, mas sim entrega de acções próprias;
VI) Da análise do conceito fiscal de fusão constante do artigo 67.° do CIRC resulta que o legislador fiscal adoptou o conceito legal, tal como previsto no artigo 97.° do CSC;
VII) A fusão invertida não constitui mais que uma modalidade de fusão por incorporação, pelo que se enquadra inequivocamente na previsão da alínea a) do número 1 do artigo 67.° do CIRC;
VIII) Carece igualmente de fundamento o argumento em como a fusão se caracteriza pelo aumento do capital social da sociedade incorporante, uma vez que a Entidade Demandada faz depender a aplicação do regime previsto no artigo 67.° do CIRC da verificação de requisitos que não têm qualquer previsão legal;
IX) Inexiste qualquer norma que exclua do âmbito de incidência do regime de neutralidade fiscal, as operações de fusão invertida;
X) Uma interpretação sistemática do quadro legal em vigor à data dos factos tributários, que mantenha um mínimo de correspondência verbal com a letra da lei, permite retirar a seguinte conclusão: o legislador pretendeu instituir um quadro de neutralidade fiscal para as operações de fusão, cisão, entradas de activos e permuta de partes sociais;
XI) Todos os requisitos legais para a aplicação do regime de neutralidade fiscal previsto no CIRC foram cumpridos pela Autora, não tendo a Entidade Demandada questionado a relevância e materialidade das vantagens económicas resultantes da fusão;
XII) A posição da Administração Tributária implica assim uma clara e directa violação dos artigos 103.° da CRP e 8.° da LGT, assumindo uma natureza restritiva do âmbito de aplicação do regime da neutralidade fiscal, afastando no presente caso uma operação de fusão ditada por razões válidas de mercado e com substância económica;
XIII) De igual modo, importa referir que as informações vinculativas não possuem eficácia externa, apenas vinculando a própria Administração Tributária, na medida em que não constituem fonte de direito interno, em estrita decorrência do preceito constitucional supra citado, não podendo, por conseguinte criar restrições à aplicação de preceitos legais;
XIV) Atenta a materialidade da operação em causa, deve ainda considerar-se que a recusa de dedução dos prejuízos fiscais na esfera da Autora consubstancia uma clara violação dos princípios da capacidade contributiva e da tributação pelo lucro real;
XV) Deve assim ser revogada a decisão de indeferimento do pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais formulado pela Autora, por integral verificação dos pressupostos de aplicação do artigo 67.° do CIRC e por expressa violação dos princípios da legalidade tributária, da capacidade contributiva, da tributação segundo o lucro real e dos artigos 103.° e 112.° da CRP, 67.° e seguintes do CIRC, 8.° e 55.° da LGT, tudo com as demais consequências legais;
XVI) De igual modo, encontram-se reunidos todos os pressupostos legais para que seja reconhecido o deferimento tácito do pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais efectuado pela Autora a 11 de Janeiro de 2005;
XVII) Com efeito, na ausência de decisão expressa até 11 de Julho de 2005 ou mesmo de pedido adicional de documentação, nenhuma dúvida restará que se consolidou na ordem jurídica o deferimento do pedido formulado pela Autora, não se mostrando relevante o pedido de documentação adicional formulado a 23 de Janeiro de 2006;
XVIII) Sobre esta matéria importa referir que a Autora fez acompanhar o seu pedido com toda a documentação constante da Circular n.° 6/2002, que dispunha à data dos factos tributários sobre a documentação necessária a instrução dos pedidos efectuados ao abrigo do artigo 69.° do CIRC;
XIX) A Autora cumpriu integralmente as disposições legais e orientações administrativas em vigor à data dos factos, não podendo dar cumprimento a requisitos, mormente a junção de certidão comprovativa de inexistência de dívidas à Segurança Social, que só foram introduzidos após a apresentação do pedido com a publicação da Circular n.° 7/2005, de 16 de Maio;
XX) A notificação para apresentação de elementos formulado pela Entidade Demandada decorrido mais de 1 ano sobre a data do pedido de transmissão de prejuízos, fundado ainda para mais numa orientação administrativa posterior, não passa de uma tentativa despudorada e no limite da boa-fé para afastar a presunção de deferimento tácito do pedido da Autora;
XXI) O que acima ficou dito é tanto mais evidente - bem como o carácter manifestamente dilatório do pedido de documentos formulado - quanto é a própria Direcção de Serviços do IRC a reconhecer a inutilidade dos documentos solicitados à Autora uma vez que, na sua óptica, a operação não tem cabimento no artigo 67.° do CIRC;
XXII) Parece, assim, claro que as autoridades fiscais estavam vinculadas a recusarem o pedido da ora Autora, pelo que mesmo esta tivesse apresentado os documentos da Circular n.° 7/2005 o seu pedido seria sempre recusado, assim se evidenciando o carácter manifestamente dilatório do pedido de documentação adicional;
XXIII) A Autora cumpriu todos os requisitos previstos no artigo 69.° do CIRC e na Circular n.° 6/2002, em vigor à data dos factos tributários, pelo que começando o prazo de decisão a contar da data de apresentação do pedido, nos termos do número 1 do artigo 69.° do CIRC e na ausência de decisão expressa até 11 de Julho de 2005, o mesmo deve considerar-se como tacitamente deferido;
XXIV) Ainda que se entenda que a Circular n.° 7/2005 se aplicaria a todos os procedimentos pendentes, sempre se terá de concluir que se imporia à Administração Tributária notificar os sujeitos passivos para apresentarem os documentos adicionais previstos na referida Circular antes de decorrido o prazo de seis meses previsto no n.° 7 do artigo 69° do CIRC;
XXV) Assim, deve considerar-se que o procedimento esteve parado por motivo imputável à própria Administração Tributária;
XXVI) Acresce que, não possuindo as orientações administrativas eficácia externa não podem ser invocadas como estabelecendo obrigações para os contribuintes, na medida em que não constituem direito interno, sob pena de violação do artigo 112.° da CRP;
XXVII) Por último deverá improceder a alegada inadequação do presente meio processual e pedido formulado pela Autora, uma vez que a Entidade Demandada não goza de qualquer discricionariedade técnica na subsunção e qualificação de uma operação de concentração no conceito legal e fiscal de fusão, nem tão pouco goza de discricionariedade na apreciação do prazo de consumação do deferimento tácito do pedido de transmissão de prejuízos fiscais.

Nestes termos, e nos melhores de Direito que os Venerandos DESEMBARGADORES deste VENERANDO Tribunal assim o julgarem no seu MUI douto juízo, deve a presente acção administrativa especial ser julgada totalmente procedente, por provada, revogando-se a decisão consubstanciada no despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e deferindo-se o pedido de transmissibilidade dos prejuízos fiscais tal como formulado pela Autora.
Assim fazendo, VOSSAS EXCELÊNCIAS,
a costumada Justiça! »
*
Colhidos os vistos legais, compete conhecer.
*******
II
Com interesse para a apreciação e decisão das questões de mérito a identificar infra, julgam-se provados os seguintes factos:
1. Mediante requerimento, apresentado em 11.1.2005, dirigido ao Sr. Ministro das Finanças, a A., na sequência do processo de fusão, “na modalidade prevista na alínea a) do n.º 4 do artigo 97.º do Código das Sociedades Comerciais”, das sociedades Prosegur S.G.P.S., L.da, P……….. V – V……….., S.A. e P……….. T – T ………., S.A., invocando o disposto no art. 69.º CIRC, solicitou que lhe fosse concedida autorização para deduzir, aos lucros tributáveis da sociedade incorporante, os prejuízos fiscais das sociedades fundidas – cfr. PA.
2. A DGCI - Direcção de Serviços do IRC endereçou, à A., o ofício n.º 001494, de 23.1.2006, do seguinte teor: «
ASSUNTO: DEDUÇÃO DE PREJUÍZOS - Art° 69° do Código do IRC
De acordo com a alínea h) da Circular 7/2005 de 16/5 da DSIRC, solicita-se documentos comprovativos da inexistência de dívidas à Segurança Social das sociedades fundidas e da incorporante.
Queiram enviar cópia da certidão do teor da descrição da inscrição da fusão na competente Conservatória (uma vez que o talão de pedido de registo não identifica a sociedade).
Consultada a base de dados da DGCI, verifica-se que constam em nome das sociedades intervenientes na fusão os seguinte processos em execução fiscal (cujos print se anexam):
(…)
Solicita-se a V. Exªs, se dignem confirmar a estes Serviços, se essa dívida foi já paga ou, se foi objecto de reclamação, impugnação ou oposição e prestada garantia idónea.
Informa-se que a existência de dívidas Fiscais em qualquer das sociedades envolvidas na operação, é um factor impeditivo da concessão do benefício fiscal requerido (transmissão de prejuízos). » – cfr. PA.
3. A A. foi notificada, pela DGCI - Direcção de Serviços do IRC, mediante o ofício n.º 32475, datado de 29.12.2006, do projecto de decisão de indeferimento do pedido de transmissão de prejuízos fiscais das sociedades P…………………. S.G.P.S., L.da, P……….. V – Vigilância, S.A. e P……….. T – Transporte de Valores, S.A., não tendo feito uso do concedido direito de audição prévia. – idem.
4. Em 11.5.2007, pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, no rosto de “NOTA INFORMATIVA” do seu Gabinete, contendo pronuncia no sentido de que fosse indeferido o pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais formulado pela sociedade P…………… – ………….., L.da, foi proferido o Despacho n.º 542/2007-XVII, com o seguinte teor: “Concordo.” – idem.
5. No seguimento do despacho identificado em 4., por carta registada, à A. foi remetido o ofício n.º 11598, de 22.5.2007, da DGCI - Direcção de Serviços do IRC, cujo conteúdo se transcreve, em seguida: «
Assunto: TRANSMISSÃO DE PREJUÍZOS
Exmos Senhores:
Relativamente ao assunto em epígrafe, informo que de acordo com o Despacho n° 542/2007 - XVII, de 07/05/11, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais por delegação de competências (Despacho 17829/2005 (2ª Série), publicado no D.R. n° 159, II Série, de 2005.08.19), foi indeferido o V/ pedido de transmissibilidade de prejuízos fiscais, com base nos seguintes fundamentos:
1. A fusão por incorporação das sociedades P………..SGPS, PROSEGUR V, ……….. T e ………. P na sociedade P…………. Companhia de Segurança, Lda, devia enquadrar-se na definição de fusão presente no n° 1 do art° 67 ° do CIRC, segundo a qual: “Considera-se fusão a operação pela qual se realiza a transferência global de património de uma ou mais sociedades (sociedades fundidas) para outra sociedade já existente (sociedade beneficiária) e a atribuição aos sócios daquelas de partes representativas do capital social da beneficiária e, eventualmente, de quantias em dinheiro que não excedam 10% do valor nominal ou, na falta de valor nominal, do valor contabilístico equivalente ao valor nominal, das participações que lhes forem atribuídas”.
O último elemento constante do conceito de fusão é a contraprestação em participações sociais. A sociedade absorvente recebe entradas de património, que lhe são efectuadas pelas sociedades fundidas; mas a contraprestação dessas entradas reside em títulos de participação social que são atribuídos aos sócios dessas sociedades.
Só não se exige este elemento no caso da alínea c) do n° 1 do art° 67° do CIRC: “A operação pela qual uma sociedade (sociedade fundida) transfere o conjunto do activo e de passivo que integra o seu património para a sociedade (sociedade beneficiária) detentora da totalidade das partes representativas do seu capital social”. Este é o caso em que a sociedade mãe incorpora a filha detida a 100% por aquela, e não há necessidade de aumentar o capital social; a sociedade mãe limita-se a anular o valor da participação da detida.
Contudo, a operação apresentada não se enquadra na alínea a) nem na alínea c) daquele preceito, uma vez que sendo o detentor das participações, quer da sociedade incorporante quer de duas das sociedades incorporadas, a mesma entidade, (a incorporada P…………..SGPS), que é incorporada na filha, não se procede a qualquer aumento do capital da sociedade incorporante, não havendo, em consequência, atribuição ao sócio de partes representativas do capital desta sociedade. E também quanto à integração da P………….. P se verifica que a mesma não origina qualquer aumento de capital da sociedade incorporante, para atribuição de partes sociais ao respectivo sócio.
No caso em apreço, as acções próprias que a sociedade incorporante recebe e que eram detidas pela incorporada são as que a empresa utiliza para entregar aos sócios da sociedade mãe que se dissolve. A operação em causa não é neutral. Em vez de originar um diferimento da tributação da mais-valia potencial da incorporada para a incorporante, ocorre simplesmente, a não consideração fiscal desses elementos (a mais-valia potencial aqui em causa perde-se, porque se elimina um estádio intermédio para o seu apuramento). Assim, a operação em causa não reúne os pressupostos legais pelo que é indeferido o pedido de transmissão de prejuízos por falta de enquadramento no artigo 67° do Código do IRC e consequentemente fica afastada do regime de neutralidade fiscal de que tratam os artigos 67° a 69° do mesmo diploma.
2. No que respeita ao prazo de deferimento tácito, refira-se que, embora o pedido tenha entrado nos serviços a 11.01.05, faltavam os seguintes elementos indispensáveis à sua apreciação: cópia da certidão do teor da descrição da inscrição da fusão na Conservatória (o talão enviado não identifica a sociedade), documentos comprovativos da inexistência de dívidas à Segurança Social das sociedades intervenientes na operação e como existiam diversos processos de execução fiscal foram solicitados os comprovativos do pagamento da dívida ou indicação se esses processos tinham sido objecto de reclamação, impugnação ou oposição e prestada garantia idónea.
O pedido dos referidos elementos ocorreu em 23.01.06. Contudo, o prazo não estava a decorrer porque o processo não estava acompanhado de todos os elementos necessários à apreciação do pedido. Os elementos solicitados não foram enviados. Apesar disso, como a operação não tem enquadramento no art° 67° do CIRC, não se insistiu no pedido.
Quanto à formação do acto tácito, está o mesmo dependente do preenchimento dos requisitos de deferimento tácito da pretensão: se estes não estiverem reunidos, não pode haver formação do acto tácito. E, para que seja deferido tacitamente o requerimento para a concessão da autorização para a transmissibilidade dos prejuízos fiscais das sociedades incorporadas, é necessário que o mesmo venha acompanhado de todos os elementos previstos no n° 2 do artigo 69° do Código do IRC e explicitados na Circular n° 7/2005 da DSIRC.
Ora, faltando alguns dos elementos exigidos, o prazo para a formação do deferimento tácito não começa a correr. De facto, não se poderia formar um acto tácito de deferimento quando não poderia ser proferido acto expresso de igual natureza, (Vd. Neste sentido Acórdão do STA, P° 142/06, de 05.07.06).
3. Decorrido o respectivo prazo, a requerente não exerceu o direito de audição por quaisquer das formas prescritas na lei.
4. Esta decisão poderá ser atacada nos termos do artigo 66° e seguintes do Código do Processo dos Tribunais Administrativos, através da interposição de acção administrativa especial, no prazo de três meses a contar da presente notificação.
(…). »
6. Relativamente à matrícula n.º …………/820402, da Conservatória do Registo Comercial de …………, respeitante à sociedade ……… – Companhia ……….., L.da, pela Ap. 35/…………., foi inscrita fusão, por transferência global do património das sociedades P……….. S.G.P.S., L.da, P……… V – Vigilância, S.A. e P……….. T – Transporte de Valores, S.A. – cfr. certidão do registo de fls. 210 segs..
7. Pela Ap. 18/040802 havia sido registado o projecto da fusão identificada em 6., que o Av. 01 - Ap. 31/041021 aponta como aprovado em 15.10.2004 – idem.
8. O talão da requisição de registo, na Conservatória do Registo Comercial de ………., que acompanhou o requerimento identificado em 1., corresponde à Apresentação n.º 35 de 28.12.2004 – cfr. PA.
9. A presente acção foi remetida ao TCAS, via fax, em 3.9.2007 – cfr. inscrição a fls. 3.
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Presente o conteúdo da p.i. e contestação, formuladas nestes autos, não resultou provada qualquer outra factualidade relevante.
Quanto aos elementos probatórios que o tribunal versou para formar a sua convicção, foram, exclusivamente, dado nenhuma prova de outra natureza haver sido oferecida e produzida, os documentos disponibilizados no processo e respectivo PA.
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Versando os fundamentos jurídicos da causa, curemos, em primeiro lugar, da eventual ocorrência de uma situação de deferimento tácito, que terá acontecido com relação ao requerimento pedinte de autorização ministerial para, a A., transmitir prejuízos fiscais das sociedades fundidas, consigo (1). Resumidamente, esta sustenta que o identificado requerimento, apresentado a 11.1.2005, foi tacitamente deferido em 11 de Julho do mesmo ano, pelo que, se tem de reputar ilegal, por erro nos seus pressupostos e inerente violação de lei, o posterior acto expresso de indeferimento, enquanto a entidade demandada defende que o pretendido deferimento tácito não ocorreu, por a A. haver deixado de instruir o requerimento inicial com os documentos comprovativos de inexistência de dívidas à Segurança Social, do cumprimento das respectivas obrigações tributárias e cópia do teor da descrição da inscrição da fusão na Conservatória.
Por força do disposto no art. 69.º n.º 7 CIRC (2), o requerimento aludido no seu n.º 1, desde que acolitado dos elementos previstos no n.º 2, era de considerar tacitamente deferido se a decisão não fosse proferida “no prazo de seis meses a contar da sua apresentação, sem prejuízo das disposições legais antiabuso eventualmente aplicáveis”. Ora, presente o teor do n.º 2 do mesmo art. 69.º (3), os elementos em causa são todos que se mostrem “necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, tanto dos seus aspectos jurídicos como económicos”, em ordem a ser demonstrado que “a fusão é realizada por razões económicas válidas, tais como a reestruturação ou racionalização das actividades das sociedades intervenientes, e se insere numa estratégia de redimensionamento e desenvolvimento empresarial de médio ou longo prazo, com efeitos positivos na estrutura produtiva”.
Apresentado o enquadramento legal do tema em apreço, antes de a ele subsumir os dados factuais enformadores da situação julganda, importa registar que o deferimento tácito traduz uma ficção legal, destinada a ultrapassar situações de inacção ou silêncio, por parte da Administração, atributiva do direito de o administrado reputar deferido o pedido feito à entidade administrativa competente, no pressuposto de que somente estão preenchidos os condicionalismos legais da respectiva formação e não que seja legal o seu conteúdo, bem como, a mais recente e maioritária jurisprudência do STA, expressa, sobretudo, no Ac. STA (Pleno/CT) de 20.1.2010, rec. 0548/08 (4), sintetizável, pela nossa óptica, na defesa do entendimento de que “os elementos”, referidos no art. 69.º n.º 2 CIRC, não incluem outros além dos necessários ou convenientes para o perfeito conhecimento da operação visada, exclusão esta abrangente, em particular, de elementos destinados a demonstrar verificadas as condições para reconhecimento do direito a benefícios fiscais, inscritas no art. 11.º -A EBF (5), maxime, a inexistência de dívidas ao sistema da segurança social.
Fixadas estas linhas orientadoras, na situação que nos ocupa, acaso o requerimento inicial, solicitando a transmissibilidade de prejuízos fiscais, apresentado aos serviços da administração tributária/AT, pela A., em 11.1.2005, se tivesse feito acompanhar de todos os elementos exigidos pelo art. 69.º n.º 2 CIRC, o respectivo deferimento tácito, nos termos do n.º 7 do mesmo normativo, teria tido, efectivamente, lugar a 11.7.2005 (6).
A reserva colocada nesta conclusão justifica-se pelo imperativo de valorar os argumentos da entidade demandada, coligidos no sentido de que nunca, in casu, houve deferimento tácito, da pretensão formulada pela A., em virtude de esta jamais ter enviado, à AT, os elementos pedidos, através do ofício n.º 001494, de 23.1.2006 – cfr. ponto 2. dos factos provados.
Respeitosamente, entendemos que não colhe esta pronúncia, porquanto elementos solicitados à requerente se nos apresentam como desnecessários, supérfluos, para o completo e seguro conhecimento dos contornos da operação em análise, no que concerne à existência de razões económicas válidas para a acontecida fusão das sociedades. Por outras palavras, exigir, à impetrante, comprovativos da inexistência de dívidas suas (e outras) à Segurança Social, bem como, o fornecimento de informação sobre o estado de eventuais processos de execução fiscal, em que seriam executadas sociedades abrangidas pela fusão, traduz a prática de actos inócuos, irrelevantes, dirigidos à recolha e disponibilização de dados não susceptíveis de integrarem a previsão do art. 69.º n.º 2 CIRC. Como, já, vimos, “os elementos”, previstos neste dispositivo legal, excluem, especialmente, os destinados a demonstrar verificadas as condições, do art. 11.º -A EBF, para reconhecimento do direito a benefícios fiscais, dando-se, ainda, nota da constatação de que a ocorrência deste tipo de diligências foi, no Ac. STA de 3.2.2010, rec. 844/09-30, julgada desprovida de relevo para suspender o decurso do período de seis meses, referente ao deferimento tácito do mesmo tipo de pretensão.
Debruce especial merece a solicitação do envio de “cópia da certidão do teor da descrição da inscrição da fusão na competente Conservatória (uma vez que o talão de pedido de registo não identifica a sociedade)”. Antes de mais, devemos consignar que, no âmbito de procedimentos deste tipo, a cópia do pedido de registo (7) definitivo da operação de fusão configura um elemento documental insubstituível, em função da necessidade de, pelo/a requerente, ser feita a comprovação da publicidade exigida, por lei, para a conclusão de uma operação de fusão societária, capaz de ser oponível a terceiros, pelo que, julgamos legítima e legal a exigência da sua apresentação, por parte da AT, na qualidade de elemento necessário ao conhecimento e preenchimento dos aspectos jurídicos da operação invocada para pedir a dedução de prejuízos das sociedades fundidas.
Dito isto, como decorre do ponto 8. dos factos provados, a A., enquanto impetrante, fez acompanhar o requerimento, a solicitar autorização ministerial para deduzir prejuízos fiscais, do talão da requisição de registo, na Conservatória do Registo Comercial de …………, ou seja, deu, objectivo e total, cumprimento, neste particular, ao que lhe era imposto, mesmo pelas circulares internas da própria AT, em termos de instrução documental do tipo de pretensão formalizada. É certo que, vistoriado o apontado talão, se detecta, na qualidade de apresentante, a identidade de um indivíduo e não, destacadamente, a firma da sociedade, aqui, A. Porém, ao invés do que pretende a entidade demandada, esta circunstância não se nos apresenta capaz de legitimar que, mais de um ano após a entrega do requerimento e do versado documento, se torne adequado e relevante, para impedir o decurso do prazo legal de deferimento tácito, solicitar, à requerente, cópia da certidão do teor da descrição da inscrição da fusão na competente Conservatória. No limite, a exigência e disponibilização deste elemento documental poderia ter-se por justificado para mero esclarecimento da dúvida, controle, sobre a ligação do talão junto ao acto registal em causa. Ora, como decorre do mesmo item dos factos provados, este corresponde à Apresentação n.º 35 de 28.12.2004 que, face ao teor certificado a fls. 229, se reporta a «FUSÃO, por transferência global do património das sociedades (…), para a sociedade incorporante “P………. – COMPANHIA ……………, LDA”».
Em suma, não se podendo subscrever a argumentação da entidade demandada, somos compelidos a, definitivamente, afirmar, como supra concluímos, ter-se o prazo legal para formação do deferimento tácito completado no dia 11.7.2005.
Demonstrada, portanto, a produção, na situação julganda, de deferimento tácito do requerimento identificado em 1. dos factos provados, temos de afirmar a ocorrência de um acto constitutivo de direitos, para a requerente/A., só passível de revogação nos moldes positivados pelo art. 141.º n.º 1 CPA, isto é, “com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo do respectivo recurso contencioso ou até à resposta da entidade recorrida”; sendo este, para a generalidade da doutrina, o prazo de um ano seguinte à data em que se formou o deferimento tácito, face à previsão do art. 58.º n.º 2 al. a) CPTA (8). Assim, o despacho impugnado nesta acção, porque proferido em 11.5.2007, não respeitou o prazo de um ano, até 11.7.2006, para, legitima e legalmente, efectivar a aludida revogação (9), sendo, pois, sem mais, consequentemente, ilegal.
Destarte, procede uma das causas de pedir eleitas, pela A., para peticionar, em primeira linha, a anulação do despacho objectado, incidência que prejudica o conhecimento de outros fundamentos aduzidos, potencialmente, capazes de conduzirem ao mesmo resultado, a igual tutela jurídica dos seus interesses.
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III
Pelo expendido, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, acorda-se:
- julgar procedente a presente acção;
- declarar que se considera tacitamente deferido o requerimento apresentado, pela A., em 11.1.2005, dirigido ao Sr. Ministro das Finanças, na sequência do processo de fusão das sociedades P……….. S.G.P.S., L.da, P…………. V – Vigilância, S.A. e ………….T – Transporte de Valores, S.A., solicitando que lhe fosse concedida autorização para deduzir, aos seus lucros tributáveis, os prejuízos fiscais das sociedades fundidas;
- anular, por ilegalidade, o Despacho n.º 542/2007-XVII, de 11.5.2007, do Exmo. SECRETÁRIO DE ESTADO DOS ASSUNTOS FISCAIS.
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Custas a cargo da entidade demandada/Ministério das Finanças.
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(Elaborado em computador e revisto, com versos em branco)
Lisboa, 20 de Setembro de 2011
Aníbal Ferraz
José Correia
Eugénio Sequeira

(1) Cfr. arts. 92.º segs. da p.i.; e item 1. dos factos provados.
(2) Na redacção da L. 32 -B/2002 de 30.12.
(3) Redacção do DL. 221/2001 de 7.8.
(4) Repetida de seguida, por exemplo, no Ac. STA de 16.6.2010, rec. 103/10.
(5) Estatuto dos Benefícios Fiscais, na redacção do DL. 229/2002, de 31.10.
(6) O prazo de seis meses, para se reputar tacitamente deferido o requerimento, tem de contar-se nos termos do art. 279.º Cód. Civil, ex vi do art. 20.º n.º 1 CPPT.
(7) Exigida pelas Circulares, da Direcção de Serviços do IRC/DSIRC, 6 de 2.4.2002 e 7/2005 de 16.5.
(8) Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
(9) A circunstância de haver sido emitido depois do deferimento tácito, confere-lhe uma dimensão revogatória implícita, por substituição.