Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03041/09
Secção:Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/29/2009
Relator:Eugénio Sequeira
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL. IRS. NOTIFICAÇÃO. CARTA REGISTADA COM A/R.
Sumário:1. O IRS de liquidação oficiosa pela AT, devia ser notificado ao contribuinte por carta registada com A/R ou por outra forma mais solene, por alterar a situação tributária do mesmo;
2. Tendo sido remetida carta registada com A/R para tal notificação para o domicílio fiscal do contribuinte, que não veio devolvida, antes veio o respectivo A/R, assinado pelo seu destinatário, considera-se a notificação efectuada na data da sua assinatura;
3. O acto de notificação não se confunde com o acto de liquidação notificado, contendo a norma do art.º 36.º, n.º2, do CPPT, as menções obrigatórias quanto ao acto notificado, cujas faltas ou insuficiências são, em regra, sanáveis nos termos do n.º1 do art.º 37.º do mesmo Código;
4. E a norma do art.º 39.º, n.º9 (numeração actual), do mesmo Código, as menções obrigatórias quanto ao acto de notificação em si, cuja falta ou insuficiência, conduz, em regra, à respectiva nulidade.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. Manuel ..., identificado nos autos, dizendo-se inconformado com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a oposição à execução fiscal deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


1- Na douta sentença decidiu-se mal ao considerar o oponente validamente notificado, da nota de liquidação de IRS de 1999, através de carta registada com aviso de recepção, ignorando-se que a notificação foi NULA por violação dos disposto nos artigos 36° e 39° n° 9 do CPPT;
2- Uma vez que a notificação foi leva a efeito através de uma carta registada, com aviso de recepção (Ofício 6771), assinada por um chefe de Finanças, com um print informático em anexo, ou seja, sem assinatura nem identificação do autor do acto (Director Geral dos Impostos) com competência para a sua prática;
3- Estes factos resultam provados documentalmente e por confissão das partes (Artigos 10° e 11 e Dcs. 3, 4 e 5 da petição inicial; artºs 5° e 6° e docs 1, 2 e 3 da contestação da Fazenda Pública).
4- Em face destes factos, errou-se na douta sentença, ao concluir-se que o recorrente não provou gue não havia recebido a notificação da liquidação de IRS de 1999 no prazo de caducidade (quando é à administração fiscal que incumbe provar a notificação levada a cabo) e, mais, errou-se ao se considerar tal notificação válida apenas por ter sido enviada por carta registada com aviso de recepção - Art° 38 do CPPT - desprezando-se todos os requisitos legais omitidos (nomeadamente, a falta de identificação e assinatura do autor do acto - O Sr. Director Geral dos Impostos) previstos nos artigos 36° e 39º nº 9 do CPPT.
5- A douta sentença não se pronuncia sobre a questão de fundo, a invocada e alegada nulidade da notificação, efectuada através de PRINT INFORMÁTICO com omissão de requisitos legais (nulidade que é de CONHECIMENTO OFICIOSO), que origina a sua ineficácia.
6- Sendo a notificação nula ou ineficaz (apesar de notificada em 16.12.2003) e não tendo havido outra, efectuada de forma legal e com perfeição (facto cuja a prova sempre caberia à Fazenda), a mesma é INEFICAZ, tendo, assim, em 31/12/2003, operou a caducidade do direito à liquidação;
7- Devendo, face ao exposto, de proceder a oposição à execução e arquivar-se a execução fiscal
8- Ao decidir-se em sentido contrário, a douta sentença recorrida violou a lei, nomeadamente, o disposto nos artigos 36°, 39° n° 9, ambos do CPPT.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V/Ex.s, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, como consequência, REVOGAR-SE a douta sentença recorrida, substituindo-se a mesma por DOUTO ACÓRDÃO que, julgando nula e ineficaz a notificação do tributo, defira a oposição e ordene o arquivamento da execução fiscal.
Assim se fará justiça!


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por ter ocorrido uma válida notificação que, em todo o caso, ainda que o não fosse, nunca poderia inquinar de invalidade o acto notificado.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Juízes Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. A única questão a decidir consiste em saber se o ora recorrente não foi notificado dentro do prazo de caducidade do direito à liquidação, por a remetida em 10.12.2003, ser nula.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
1. O processo executivo a que se opõem os autos detém o n.º 1970200401013963, foi instaurado em nome do oponente (Manuel ...), com o NIF ... e de Maria ... com o NIF …., no Serviço de Finanças de Benavente respeita a dívida de IRS e Juros compensatórios do ano de 1999, no montante de € 30.347,63 - cfr. fls. 8 e 35 dos autos.
2. Da certidão de dívida emitida em 18/07/2004 com o n.º 2004/39773, consta que o prazo de cobrança voluntária do imposto terminou em 15/01/2004 - cfr. fls. 8 e 35 dos autos
3. Do sistema de Cobrança de IR - Consultas Gerais - Liquidação de IRS - Detalhe de nota de cobrança foi extraído documento que constitui doc. 5, junto à petição inicial donde conta que a liquidação de IRS do ano de 1999 no montante de € 30.347,63 relativamente aos sujeitos passivos NIF …. e …. tem o n.º …. emitida em, 09/12/2003, foi remetida ao com o registo privativo n.º RY197233737PT - cfr. fls. 11 e 35 dos autos.
4. Em 10/12/2003 o Serviço de Finanças de Benavente remete ao aqui Oponente e Maria ... carta registada com aviso de recepção (ofício n.º 6771), dando-lhe conta de que "deve proceder ao pagamento da liquidação n.º 5344120366 do ano de 1999, até à data de 2004.01.14" - cfr. fls. 9 dos autos
5. A fls. 55 dos autos foi junto cópia de aviso de recepção n.º RS 3611 28635 PT, assinado por Manuel ......, em 16/12/2003, remetido pelo Serviço de Finanças de Benavente, que faz referência ao of. 6771.
6. A presente oposição foi deduzida em 10/12/2004.
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No tocante aos factos provados, a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos, em concreto, no teor dos documentos indicados em cada um dos pontos supra.

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.


4. Para julgar improcedente a oposição à execução fiscal deduzida considerou a M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que a liquidação exequenda lhe foi notificada por carta registada com A/R dentro do prazo da caducidade do respectivo direito à liquidação, pelo que a mesma se tem por efectuada na data em que foi assinado o A/R.

Para o recorrente de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, contra esta fundamentação se vem insurgir, por a notificação ter sido remetida sem assinatura nem identificação do autor do acto, sendo por isso a mesma nula ou ineficaz, pelo que se operou a caducidade do direito à liquidação.

Vejamos então.
Tendo a AT procedido à liquidação oficiosa de IRS ao ora recorrente e mulher relativa a 1999, cabia-lhe, notificá-los dessa liquidação, por carta registada com A/R, por força do disposto no art.º 38.º n.º1 do CPPT, então já vigente em 2003, por tal liquidação alterar a situação tributária dos contribuintes, como não se encontra em causa, que a AT cumpriu ao lhe enviar a carta registada com A/R, constante de fls 9 e 55 dos autos (cópias), neste se indicando, expressamente, «Of. 6771», que foi o ofício cuja cópia consta de fls 9 dos autos, em que se informaram os contribuintes da remessa da nota de liquidação e de cobrança e que da mesma podia reclamar ou impugnar.

Neste caso, a notificação teve lugar na data em que foi assinado o A/R, conforme determina o n.º3 do art.º 39.º do mesmo CPPT, ou seja, em 16.12.2003, como a sentença recorrida bem fundamenta.

Na sua petição inicial de oposição articulava o ora recorrente que nunca fora notificado de tal liquidação – cfr. seus art.ºs 4.º e segs – argumento ou raciocínio que ora já não invocou nas suas conclusões do recurso, antes tendo continuado a esgrimir que tal notificação é nula – como já o havia invocado na mesma petição, no seu art.º 12.º - por em tal notificação se ter omitido a falta de identificação e assinatura do autor do acto – o Sr. Director Geral dos Impostos.

Tendo sido remetidos ao ora recorrente conjuntamente com o ofício cuja cópia consta de fls 9 dos autos, os prints da nota de liquidação e cópia da nota de cobrança, contendo estas todos os requisitos tendentes a comunicar aos notificados o porquê desta liquidação, por que a mesma teve lugar e não qualquer uma outra, não exigindo a lei, designadamente nas normas dos art.ºs 36.º e 39.º, n.º9 do CPPT, chamadas à colação pelo ora recorrente, que a própria notificação tenha de conter a indicação do autor do acto comunicado, quando lhe são remetidos documentos que o atestam, como no caso, pelo menos em parte foi, mostrando-se por outro lado, este próprio acto de notificação (que não se deve confundir com o acto notificado) assinado, como dele se pode ver (fls 9), pelo seu autor – A chefe de Finanças – pelo que a situação dos autos nunca poderia ser subsumível à nulidade da notificação constante no então n.º8 do art.º 39.º do CPTT (redacção de então de data anterior à da Lei do Orçamento do Estado para 2007), já que a autora de tal notificação se encontra mencionada, bem como o sentido da decisão e a respectiva data, nem o ora recorrente veio jamais invocar que não exista norma legal que atribua ao chefe de finanças determinar o envio de uma notificação de uma liquidação e que tal competência antes se radique, apenas, no Sr. Director Geral dos Impostos.

A falta de indicação de o acto de notificação ser praticado no uso de poderes próprios ou delegados apenas teve ser mencionada no caso positivo de isso acontecer (1), que não nos casos de tal situação não existir, assim se devendo entender, no caso, que foi no uso de poderes próprios.

Diz-se notificação o acto pelo qual se leva um facto ao conhecimento de uma pessoa ou se chama alguém a juízo – n.º1 do art.º 35.º do CPPT – pelo que no caso tal notificação operada nos termos em que o foi, não pode ter deixado de cumprir este seu papel essencial, sabido que o cumprimento das formalidades não são fins em si mesmos mas sim caminhos a percorrer para que tais fins sejam alcançados, pelo que se alguma irregularidade tiver existido em tal notificação não afectou o seu núcleo essencial, sendo sanável, apenas autorizava o ora recorrente a requerer a notificação dos requisitos omitidos ou a passagem de certidão que os contivesse nos temos do disposto no art.º 37.º n.º1 do mesmo CPPT.


Improcedem assim todas as conclusões do recurso, sendo de lhe negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida.


Custas pelo recorrente.


Lisboa, 29 de Setembro de 2009

(1) Cfr. neste sentido Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 2.ª Edição revista e aumentada, 2000, Vislis, pág. 222, nota 7.