Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:147/12.0 BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:02/29/2024
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:SOCIEDADE IRREGULAR
IVA
Sumário:I - A sociedade irregular carateriza-se pela existência de uma atividade comum exercida pelos sócios, que têm em vista a criação de uma utilidade nova, norteada para a obtenção de lucro.
II - O elemento essencial e específico de uma sociedade, ainda que irregular, é a chamada affectio societatis, ou seja, a intenção de cada um se associar com outro ou outros, para formação de uma pessoa coletiva distinta da de cada um deles.
III - A affectio societatis carateriza-se por dois requisitos: um, subjetivo, consubstanciado na intenção de constituir uma certa realidade económico-jurídica; outro, objetivo, expressado na constituição de um fundo social sem a existência do qual aquela intenção seria meramente programática.
IV - Tendo ficado provado o exercício de modo independente e com caráter de habitualidade de prestações de serviços por parte da sociedade irregular, padecem de vício as liquidações de IVA emitidas apenas em nome de um dos sócios da sociedade irregular.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção tributária comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I. RELATÓRIO

A… (doravante Recorrente ou Impugnante) veio recorrer da sentença proferida a 15.12.2021, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Castelo Branco, na qual foi julgada improcedente a impugnação por si apresentada, que teve por objeto as liquidações adicionais de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e a dos respetivos juros compensatórios, relativas a 2006, 2007, 2008 e 2009.

Nas suas alegações, concluiu nos seguintes termos:

“1ª) – Constitui objeto do presente Recurso a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco no processo de Impugnação nº 147/12.0BECTB que julgou improcedente a ação.

2ª) – Como fundamentos da ação invocou o agora Recorrente erro sobre os pressupostos de facto e de direito em liquidações adicionais de IVA dos anos de 2006,2007, 2008 e 2009 no valor de 48 116,90 € e erro na quantificação e falta de fundamentação no cálculo, por métodos indiretos, da matéria coletável em que essas liquidações se fundaram.

3ª) - Mas, o Recorrente apenas pretende a apreciação neste Recurso da matéria relativa ao erro sobre os pressupostos de facto e de direito de que, em seu entender, sofrem as liquidações impugnadas. Assim,

4ª) – Tanto na sua Petição Inicial como nas alegações escritas nos termos do artigo 120º do CCPT alegou o Recorrente que a AT lhe imputou a título individual volumes de negócios que deveriam ter sido atribuídos a uma entidade coletiva, relativamente aos anos de 2006, 2007, 2008 e 2009.

5ª) – Entende o Recorrente que, com esse procedimento, fez a AT uma interpretação errada das normas jurídicas de incidência previstas no Código de IRC e no Código do IVA.

6ª) – O Recorrente não pode aceitar a decisão que, não acolhendo o seu entendimento e dando razão à AT, viola, em primeiro lugar, as normas de incidência objetiva e subjetiva previstas nos artigos 1º e 2ºdo CIRC e nos artigos 1º, 1, a) e 2º, 1, a) do CIVA,

7ª) – Violando, também, o princípio “ in dúbio contra fisco”, previsto no artigo 100º, 1, do CPPT, uma vez que, entende o Recorrente, existem nos autos factos dados como provados suficientes para fundada dúvida sobre a existência dos factos tributários e para a consequente anulação das liquidações impugnadas.

8ª) – De facto, não podia o Tribunal “a quo”, por um lado, dar como provado que existe um conjunto musical denominado J... formado por 5 pessoas; que os instrumentos musicais e demais equipamentos eram propriedade pessoal de cada um dos músicos; que as contratações dos espetáculos eram feitas habitualmente por telefone, para qualquer dos músicos; que os contratos podiam ser assinados por qualquer um deles ou mesmo pela mulher do impugnante; que habitualmente o preço era recebido imediatamente após o final da atuação ou, em alguns casos imediatamente antes do início e que podia ser recebido por qualquer dos elementos do grupo; que após algum tempo de atuações em conjunto, a banda comprou alguns equipamentos, como cabos, luzes ou colunas de som para uso comum; e que de uma informação do Gabinete do Diretor de Finanças da Guarda elaborada em 26.11.2010, consta que por parte dos cinco músicos do grupo musical J... houve manifesta e notória omissão e ocultação dos rendimentos obtidos pela atividade musical desenvolvida com caráter continuado há vários anos e que se eximiram à constituição de uma sociedade nas formas reguladas no código das sociedades, pese embora toda a estrutura, atividade e atuação sejam próprias de uma entidade comercial. E, depois, por outro lado, concluir que os rendimentos obtidos por este grupo de pessoas devem ser atribuídos apenas ao Recorrente.

9ª) – Existe, por isso, no entendimento do Recorrente, uma séria e grave contradição entre estes factos dados como provados e a decisão tomada.

10ª) – Mas o Recorrente não pode aceitar, também, que o Tribunal tenha desvalorizado os depoimentos de três testemunhas (primeira, terceira e quarta) e sobrevalorizado o depoimento da quinta testemunha, o inspetor tributário que elaborou o relatório da ação de inspeção tributária em que as liquidações impugnadas se basearam.

11ª) – É que, relativamente ao ponto nº 1 da matéria de facto dada como não provada, enquanto as três testemunhas referiram que a banda “J...” não tinha um “dono”, o Tribunal considerou como dono da banda o aqui Recorrente com base no depoimento do Sr. Inspetor.

12ª) – O mesmo sucedeu, aliás, relativamente ao ponto nº 2 da matéria de facto dada como não provada, em que as três testemunhas referiram que o preço das atuações da banda era dividido por todos os músicos em partes iguais.

13ª) – E esta sobrevalorização do depoimento do Sr. Inspetor é muito incompreensível para o Recorrente, atento o facto de, em sede de alegações escritas, o Recorrente ter alegado a desconformidade desse depoimento com o conteúdo do seu próprio relatório e da informação do Gabinete do Diretor de Finanças da Guarda que consta dos autos como DOC.2 na Petição Inicial e que na Sentença está parcialmente transcrita no nº 116 dos factos dados como provados.

14ª) – O Digno Magistrado do Ministério emitiu parecer concordante com a posição defendida e alegada pelo Recorrente na sua Petição Inicial e nas alegações escritas nos termos do artigo 120º do CPPT, que vai no sentido da existência de uma sociedade irregular constituída por cinco pessoas devidamente identificadas nos autos.

15ª) – E o Recorrente continua a defender a sua tese com base no nº 2 do artigo 36º do CSC que refere: “ Se for acordada a constituição de uma sociedade comercial, mas, antes da celebração do contrato de sociedade, os sócios iniciarem a sua atividade, são aplicáveis às relações estabelecidas entre eles e com terceiros as disposições sobre as sociedades civis”.

16ª) – Desmontando a tese do Recorrente a Sentença diz que, no caso em apreciação, não existia a intenção por parte dos 5 elementos da banda “J...” de constituir uma sociedade.

17ª) – Ora, o Recorrente entende que essa intenção concretizou-se com o início efetivo da atividade empresarial exercida ao longo de vários anos pelos elementos da banda.

18ª) – E dando cobertura a esta visão da situação veja-se o que diz MIGUEL J. A. PUPO CORREIA: “A hipótese configurada no nº 2 do art. 36º do CSC compreende os casos em que, existindo o exercício em comum de uma atividade social, todavia os sócios não cuidam de celebrar a escritura que, como sabemos, constitui formalidade “ad substrantiam”- Direito Comercial, 4ª Edição, revista e atualizada.

19ª) – Aliás, entendimento diferente levaria a que situações semelhantes não pudessem ser objeto de perseguição fiscal e de controlo tributário por parte do Estado.

20ª) – Os restantes pressupostos previstos no artigo 980º do CC para a existência de uma sociedade irregular estão perfeitamente identificados nos factos dados como provados, extraindo-se dos mesmos que todos os elementos da banda contribuíram com bens e serviços para o exercício em comum de uma atividade económica que não era de mera fruição de bens e com o objetivo de obterem lucro para repartirem entre si.

21ª) – O Tribunal penalizou injustificadamente O Recorrente pelo facto de ter sido ele quem assinou a maior parte dos contratos feitos pela banda “J...” com os seus clientes, quando esses atos se inserem nos mais vulgares atos de gestão de uma pessoa singular em prol de um ente coletivo como é uma sociedade irregular.

22ª) – Ao sufragar em plenitude a posição da AT, o Tribunal seguiu na apreciação da prova produzida, critérios voluntaristas próprios da Administração Pública.

23ª) – É que, existiam nos autos factos provados suficientes para que fosse levantada fundada dúvida sobre a existência dos factos tributários que levaram às liquidações impugnadas, dúvida essa que deveria ter levado à sua anulação.

24ª) – Ao decidir como decidiu violou a Sentença, além as normas de incidência objetiva e subjetiva previstas nos artigos 1º e 2 º do CIRC e nos artigos 1º, 1,a) e 2º, 1,a) do CIVA, também o artigo 100º, 1 do CPPT decisão.

Nestes termos e nos melhores de Direito que Vossas Excelências não deixarão de suprir, deve o presente Recurso ser julgado procedente, por provado, e, em consequência, revogada a Sentença recorrida e anuladas as liquidações impugnadas com as legais e necessárias consequências”.

A Fazenda Pública (doravante Recorrida ou FP) apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:

“1. Os recorrentes defendem a tese segundo a qual, a decisão recorrida enferma de séria e grave contradição, uma vez que por um lado julgou provados os factos constantes dos pontos 3, 7, 9, 11, 12, 15 e 116 do probatório e por outro lado, concluiu que os rendimentos obtidos pelo grupo musical “J...” deveriam ser atribuídos apenas aos recorrentes. Mais entendem os recorrentes, que no âmbito dos factos que foram julgados não provados, não é compreensível que o Tribunal “ a quo” tenha desvalorizado os depoimentos de 3 testemunhas ( primeira, terceira e quarta) e sobrevalorizado o depoimento da quinta testemunha, relativo ao inspetor Tributário que elaborou o relatório da ação de inspeção em que se fundamentaram as liquidações impugnadas.

2. Mais alegam os recorrentes - ao longo dos artigos 21º a 23º do seu discurso recursivo – que as testemunhas terão alegadamente feito referência a determinados factos que alegadamente o Tribunal “a quo” não terá tido em consideração na formação da sua convicção quanto à matéria de facto que julgou como não provada.

3. Sucede que os recorrentes - como claramente evidência o seu discurso recursivo - embora indiquem a matéria de facto que no seu entendimento consideram ter sido incorretamente julgada como não provada e os concretos meios probatórios onde fundam a sua impugnação – depoimentos prestados pela primeira, terceira, quarta e quinta testemunhas –são absolutamente omissos quanto às passagens da gravação em que se baseia a sua discordância com a decisão recorrida.

4. Com efeito, em termos simples, os recorrentes limitaram-se a dizer que o Tribunal “ a quo” fez um incorreto julgamento da matéria de facto que deu como não provada, porquanto, no seu entendimento foram desvalorizados os depoimentos da primeira, terceira e quarta testemunhas e sobrevalorizado o depoimento da quinta testemunha, sem, no entanto, fazerem qualquer indicação das passagens concretas da gravação que permitam a este Venerando Tribunal formular um juízo de reapreciação da decisão recorrida, à luz da alegada prova que resultou dos depoimentos prestados pelas referidas testemunhas.

5. E perante este cenário, impõe-se concluir que os recorrentes não cumpriram o ónus de “indicar com exatidão as passagens da gravação” que permitiriam a este Venerando Tribunal ficar a conhecer substancialmente da razão do desacordo e reapreciar a alegada relevância dos depoimentos para a decisão da matéria de facto que o Tribunal “ a quo” julgou como não provada.

6. Em resumo, porque os recorrentes não cumpriram o ónus da impugnação, no segmento em que o art. 640 nº2 al. a) do CPC os obrigava sob pena de rejeição, a indicar nos depoimentos das testemunhas as passagens por eles declaradas que impunham outra decisão, deve improceder o presente recurso.

7. Idêntico raciocínio se impõe efetuar no que se reporta à alegada contradição entre os factos dados como provados e o sentido da decisão recorrida, porquanto, os factos que os recorrentes apontam como tendo sido dados como provados e que no seu entendimento seriam suscetíveis de conduzir a uma conclusão distinta daquela que foi perfilhada pelo Tribunal “ a quo” , resultaram da prova testemunhal que foi produzida no âmbito dos presentes autos3 , conforme decorre dos pontos 3, 7, 9, 11, 12 e 15 do probatório.

8. Salvo o devido respeito, os recorrentes não cumprem os exatos termos do ónus a que se reportam as alíneas b) do nº 1 e alínea a) do nº 2 do artigo 640º do CPC, ficando este Venerando Tribunal de recurso com o ónus de ouvir a integralidade daqueles depoimentos e de selecionar, por referência aos pontos de discórdia invocados pelos recorrentes, quais os excertos da gravação daqueles depoimentos que devem ser ponderados na reapreciação da prova a que se reporta a recorrente. Ora, entende a Fazenda Pública que tal ónus não pode recair sobre este Venerando Tribunal, porquanto, tal culminaria num inequívoco vicio de violação de lei. Termos em que, também quanto a este fundamento do recurso - consubstanciado na alegada existência de contradição entre os factos dados como provados e o sentido da decisão - deve improceder o presente recurso.

9. Sem conceder, no que se reporta à matéria de facto dada como provada no ponto 116 do probatório, referem os recorrentes que não corresponde à realidade que o impugnante marido, aqui recorrente, fosse à data dos factos, professor de música ou sequer o seja hoje, o que só por lapso pode constar da sentença uma vez que nenhuma testemunha o podia ter dito. Desde logo, cumpre referir que mais uma vez os recorrentes não cumpriram o ónus a que se reportam as alíneas b) do nº 1 e alínea a) do nº 2 do artigo 640º do CPC, pelo que não é possível a este Venerando Tribunal aferir da bondade de tal alegação.

10. Por outro lado, ainda que tal alegação correspondesse à verdade – o que não se sabe, porque os recorrentes não identificam os meios probatórios de onde a realidade de tal alegação pode ser demonstrada- tal facto pela sua irrelevância probatória, não tem qualquer impacto no sentido da decisão recorrida,

11. Sem conceder, pese embora a procedência da questão prévia que é suscitada pela Fazenda Pública prejudique o conhecimento do mérito do presente recurso, uma vez que a reapreciação da decisão recorrida, impunha uma reanálise conjugada da prova documental e da prova testemunhal que foi produzida nos presentes autos, que ficou irremediavelmente comprometida pelo incumprimento do ónus que é imposto aos recorrentes pelas alíneas b) do nº 1 e alínea a) do nº 2 do artigo 640º do CPC, ainda assim, à cautela e por dever de representação dos legítimos direitos e interesses da Fazenda Pública iremos pronunciar-nos sobre os restantes fundamentos invocados pelos recorrentes.

12. Num cenário de suposta existência de uma aparente sociedade irregular, os recorrentes defendem a tese segundo a qual a Administração Fiscal ao invés de tributar a alegada sociedade em sede de IRC e, consequentemente, em IVA, como a lei impunha, optou por erradamente e ilegalmente, imputar rendimentos daquela sociedade irregular a um dos sócios, ou seja, ao recorrente marido.

13. Sucede, que no caso em apreço, nos anos que foram abrangidos pelo procedimento de inspeção – 2006, 2007, 2008 e 2009 – não foram detetados quaisquer indícios da existência de uma alegada sociedade irregular, aliás, em abono da verdade a tese da sociedade irregular surge quando os recorrentes foram confrontados com o RIT, sendo nesse exato momento, que o recorrente marido decide mudar a sua caracterização enquanto sujeito passivo da relação jurídica tributária, deixando de ser um empresário em nome individual e passando a pertencer a uma alegada sociedade irregular.

14. Ora, salvo o devido respeito, conforme foi referido pela Fazenda Pública em sede de alegações, a atuação do recorrente levanta sérias e fortes suspeitas quanto à veracidade da tese da existência da alegada sociedade irregular, desde logo, porque pelo menos desde 2006 a 2009 –anos a que se reporta o procedimento inspetivo - não se encontram as mais ténues evidencias probatórias da existência de tal sociedade, como sejam, por exemplo, o cumprimento por parte da mesma das obrigações declarativas mencionadas no CIRC, como seja a obrigação de entregar uma declaração de inscrição (início de atividade) as obrigações contabilísticas previstas no artigo 123.º, nem tampouco a existência de um número de identificação fiscal ou sequer um pedido dirigido ao Registo Nacional de Pessoas Coletivas com vista à sua obtenção. Nunca a alegada sociedade irregular, procedeu à entrega das declarações modelo 22 e liquidou a respetiva tributação pelos proveitos auferidos em sede de IRC, nem nunca apresentou qualquer declaração periódica de IVA.

15. Em suma, no período de tempo compreendido entre 2006 e 2009, a alegada sociedade irregular nunca praticou qualquer ato que revelasse a sua alegada existência, ou seja, numa se comportou como sendo um sujeito passivo que embora não estivesse regulamente constituída, se assumia em termos fiscais, como um sujeito passivo de IRC.

16. Tal como fizeram em sede de PI e em sede de alegações, os recorrentes tentam lançar a confusão nos presentes autos fazendo referencia a uma informação datada de 26 de novembro de 2010, pelo gabinete do Diretor de Finanças da Guarda, no âmbito do inquérito nº 25/10.8 IDGRD, tentando daqui retirar consequências jurídicas, designadamente, que a AT alegadamente terá naqueles autos de inquérito criminal feito referencia à existência da alegada sociedade irregular.

17. Sucede que, contrariamente à tese defendida pelos recorrentes, no contexto daquele inquérito crime, o entendimento que foi perfilhado pelo Ministério Público não reflete qualquer tipo de concordância com a tese defendida pelos mesmos, pelo contrário o despacho proferido pelo Magistrado do Ministério Público é inequivocamente claro quando refere, além do mais, que “as operações tributáveis, resultantes dos espetáculos realizados através da banda “J...”, constituem rendimentos empresariais e profissionais obtidos pelo sujeito passivo em análise (o sujeito passivo A…), uma vez que, desde 2006, que este vem declarando operações tributáveis provenientes de espetáculos realizados pela referida banda.”

18. Neste contexto, contrariamente à tese da alegada existência da sociedade irregular, a realidade factual que efetivamente existia naquele lapso temporal compreendido entre 2006 e 2009, era uma atividade exercida pelos recorrentes, em nome individual e cujas repercussões fiscais ocorriam necessariamente na sua esfera jurídica.

19. Com efeito, o recorrente marido declarou perante a AT que em 02.01.2006, iniciou a sua atividade como “Músico” - vide fls. 86 do processo administrativo - e ao dar inicio da referida atividade, o recorrente marido apresentou-se perante a AT como sendo um empresário em nome individual cuja atividade se traduzia na realização de espetáculos musicais para as mais diversas entidades, através do grupo musical conhecido como “J...”.

20. No exercício de tal atividade, os recorrentes celebravam e assinavam com o seu próprio punho, os respetivos contratos, designadamente, com as comissões organizadoras de festas e bailes populares, emitindo até 2009, os recibos referentes aos proveitos declarados, tudo conforme as evidencias documentais juntas ao PA e constantes dos pontos 21 a 29, 31 a 33, 35 a 41, 43 a 48, 51 a 53, 56, 58 a 72, 74, 76, 79 a 94, 96 a 104, 107 a 110 e 112 do probatório.

21. Se no caso em apreço, o recorrente marido se apresentou perante a AT como sendo um empresário em nome individual que desenvolvia a atividade de músico e no âmbito da qual auferia os rendimentos que declarava, ao abrigo do nº 1 do artigo 75º da LGT, não podia, nem devia a AT colocar em causa a verdade fiscal que o próprio recorrente declarou perante a AT. Note-se que a presunção de verdade e boa fé das declarações apresentadas pelos sujeitos passivos só termina no caso de se verificarem as circunstancias a que se reportam as várias alíneas do o nº 2 do artigo 75º da LGT, facto que não se verificou no caso em apreço.

22. Acresce referir, que durante todo o procedimento inspetivo e até à notificação do RIT, nunca os recorrentes alegaram e/ou demonstraram perante a AT que os rendimentos decorrentes da atividade que desenvolvia não eram apenas por si auferidos, mas antes pelo conjunto das várias pessoas que constituíam o grupo musical J.... Note-se que o recorrente marido na sequência da notificação do inicio do procedimento inspetivo, deslocou-se sozinho à DF da Guarda para proceder à entrega dos elementos que a inspeção lhe solicitou, assim como foi ele próprio e mais nenhum outro elemento do grupo musical J... que prestou todos os esclarecimentos que a inspeção solicitou, facto que resultou provado do depoimento da testemunha G…, autor do RIT, que realizou o procedimento inspetivo e contactou diretamente com o recorrente marido durante a realização de tal procedimento – vide depoimento constante da gravação do minuto 1:27:08 ao minuto 1:27:34.

23. Conforme referiu a testemunha G…, em momento algum da realização do procedimento inspetivo o recorrente marido se apresentou como gerente, como sócio-gerente ou apenas como sócio de uma alegada sociedade irregular, atuando sempre em conformidade com o perfil de sujeito passivo que ele próprio definiu e declarou ser à AT - vide depoimento constante da gravação do minuto 1:25:04 ao minuto 1:26:00. 24. E perante o perfil de sujeito passivo que o próprio recorrente declarou ser à AT, a tributação efetuada no caso concreto dos autos, foi na exata medida do reflexo projetado pelo recorrente, ou seja, respeitou a forma como o próprio recorrente se apresentou perante a Administração Fiscal, corolário do princípio da colaboração e da verdade fiscal.

25. Tendo presente as regras da experiencia da vida, se a vontade das pessoas que faziam parte do grupo musical J... fosse a de constituir uma sociedade comercial, não se afere a razão de não o terem feito ab initio e apenas, tão somente, em setembro de 2010. Por outro lado, é manifestamente incompreensível, que a existir uma sociedade irregular, na data em que se inicia o procedimento inspetivo e ao longo de todo o tempo da sua realização até à notificação do RIT, os recorrentes e/ou os restantes elementos que constituíam o grupo musical não revelassem à AT que queriam ser tributados enquanto tal, ou seja, enquanto sociedade irregular. Note-se que pelo menos durante o período de tempo compreendido entre 2006 a 2009, os rendimentos auferidos pelo grupo musical J... ( ou pelo menos parte desses rendimentos) foram declarados apenas pelos recorrentes.

26. A propósito da existência da alegada sociedade irregular, chamamos mais uma vez à colação, o entendimento sufragado pela douta decisão recorrida, que na sequência da apreciação da globalidade da prova produzida entendeu que «não ficou provada a existência do aludido elemento volitivo nem o exercício deliberado de atividade com escopo lucrativo. Por tudo isso, o Tribunal conclui que não se verificam os pressupostos legais para a tributação dos factos tributários em causa na esfera jurídica de qualquer pretensa sociedade irregular, que não foi constituída até ao ano 2010 por falta de acordo societário e subjacente intencionalidade ou “affectio societatis”. Além disso, a afirmação de que o a banda J... “não tinha dono”, não pode ser entendida no sentido de que existia por si só, sem necessidade de qualquer pessoa individual, pois, como é uma evidência não carecida de prova, o conceito de “banda”, “orquestra” ou “conjunto de baile” não equivale ao de pessoa física, apenas implica uma associação de pessoas físicas. No entanto, essa natureza “coletiva” resultante da referida associação de pessoas físicas, que não se reporta necessariamente ao conceito de “pessoa coletiva” nem implica a existência de qualquer contrato de sociedade, como se viu, pode convolar-se no exercício conjunto de atividades (no caso, a execução de espetáculos de música) em nome e para proveito individual, como conhecidamente sucede com inúmeras empresas individuais que tenham vários colaboradores ao seu serviço. Ora, se a banda J... não era uma sociedade, dado que não era entendida como tal por todos os seus alegados “sócios”, então só pode ser entendida como um empreendimento profissional integrado na esfera jurídica do impugnante, que assim declarou perante a AT e que publicamente a abraça como “projeto familiar” seu. Em conformidade, este Tribunal julga não verificado o invocado erro sobre os pressupostos de facto e ou de direito cometido na decisão de enquadramento dos factos em causa nos autos.

27. Termos em que, face à globalidade da prova que foi produzida nos presentes autos – prova documental e testemunhal- impõe-se concluir que a douta decisão sob recurso não padece dos vícios que os recorrentes lhe tentam imputar, porquanto a mesma efetuou uma correta valoração da prova produzida, uma correta interpretação da matéria controvertida e uma correta aplicação do direito aos factos controvertidos, devendo, em consequência, manter-se no ordenamento jurídico.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências deve ser negado provimento ao presente recurso e em consequência manter-se a decisão recorrida”.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 288.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT), vem o processo à conferência.

São as seguintes as questões a decidir:

a) Há erro na decisão proferida sobre a matéria de facto?

b) Verifica-se erro de julgamento, em virtude de se estar perante uma sociedade irregular, motivo pelo qual as liquidações não poderiam ser emitidas em nome do Recorrente?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“1. O impugnante é músico e transmitiu o gosto e conhecimentos aos filhos, P… e D… – depoimentos da primeira e da terceira testemunhas, P…, filho dos impugnante, e M…, amigo do impugnante e dos filhos e elemento integrante da banda musical em causa nos autos;

2. Depois de algumas experiências musicais dos filhos do impugnante e de outros amigos, um pequeno grupo de músicos amadores começou a reunir-se na garagem da casa da terceira testemunha, M…, na G…, apenas para tocarem juntos e praticarem esse passatempo – depoimentos da terceira e quarta testemunhas, M…e L…, que referiram que de inicio se tratou de mero “hobby” |óbi| ou uma “brincadeira”, artigo publicado no jornal “N…” de 25/8/2010, e informação de fls. 3,4 e 30 do PA;

3. Os instrumentos musicais e demais equipamentos eram propriedade pessoal de cada um dos músicos – primeira testemunha, P…, filho do impugnante;

4. A certa altura, em momento não especificado por volta do ano 2005, começaram a produzir atuações com público e gradualmente foram sendo convidados para espetáculos cuja atuação onerosa era sujeita a contratualização - depoimentos da terceira e quarta testemunhas, M… e L…, que referiram que de inicio se tratou de passatempo, mas depois evoluiu para espetáculos com público e foi-se tornando uma atividade onerosa;

5. No período de 2/1/2006 até 23/12/2009 o impugnante esteve fiscalmente registado para o exercício da atividade de “Músicos”, Código CIRS 2013 - pág. 3 do Relatório, fls. 41 e 50 do PA;

6. O referido grupo de músicos atuava sob a designação de “J…” na zona em redor da G…, em festas de aldeia e outros eventos, especialmente durante o período de verão – primeira testemunha, P…, filho do impugnante, que acrescentou que nunca aturam no estrangeiro, e terceira testemunha, M…, que disse que a maior parte da atividade decorria durante o verão;

7. Na altura dos factos, o conjunto de baile “J…” era composto pelos seguintes músicos:

- M… – viola baixo;

- P… – órgão;

- D… – voz principal;

- A… – guitarra;

- L… – bateria; - depoimento da quarta testemunha, L…, sendo certo que no anexo I do Relatório de inspeção, a fls. 68 do PA, a imprensa local dá conta de que na altura do artigo, publicado em 25/8/2010, “Sobem ao palco seis músicos e duas bailarinas, mas a equipa é mais vasta, entre técnicos de som e luzes”; porém, uma vez que esse artigo não reporta tal constituição ao período agora sob análise, o Tribunal aceita como boa a descrição efetuada pela indicada testemunha;

8. Além dos músicos, a banda era habitualmente acompanhada, nas suas deslocações, por outras pessoas, designadamente a mulher do impugnante - primeira testemunha, P…, filho do impugnante, corroborado pelo artigo da imprensa local acima aludido;

9. Os contactos para contratação dos espetáculos eram feitos habitualmente por telefone, para qualquer dos músicos, que comunicava aos restantes, podendo o respetivo contrato ser assinado por qualquer deles ou mesmo pela mulher do impugnante – depoimentos da primeira, segunda, terceira e quarta testemunhas, que afirmaram que não havia distribuição dessa competência a qualquer dos elementos em exclusividade, embora, como referiu a quarta testemunha, grande parte das vezes isso fosse efetivamente feito pelo impugnante, pela mulher ou pelos seus filhos;

10. A contratação não obedecia a uma “tabela de preços”, podendo o valor contratado depender das relações de amizade e de circunstâncias diversas, como a duração do espetáculo e o horário da atuação, e poderia até não haver qualquer recebimento, como sucedeu, por exemplo na animação do casamento da vocalista do grupo, D… – primeira e quarta testemunhas, respetivamente P…, filho do impugnante, e L…, ambos músicos da banda;

11. Habitualmente o preço era recebido imediatamente após o final da atuação ou, em alguns casos, imediatamente antes do inicio – terceira testemunha, M…;

12. O recebimento do preço podia ser feito por qualquer dos elementos do grupo, que de imediato comunicava aos restantes – primeira testemunha e terceira testemunha, que disse que qualquer um podia receber e comunicava aos restantes;

13. Os preços recebidos eram de valor modesto e por vezes mal cobriam as despesas de deslocação – primeira testemunha, que disse que não dava para enriquecer à custa disso, terceira testemunham que disse que ganhavam pouco dinheiro e por isso nunca se lembrou de declarar o rendimento ao fisco, e quarta testemunha, que disse que havia atuações em que não recebiam nada porque não dava para as despesas;

14. Todos os elementos da banda exerciam essa atividade musical na qualidade de “amadores”, uma vez que exerciam outras profissões a título principal, sendo o impugnante professor de música, o filho P… era instrutor de condução automóvel, a filha D… era empregada bancária, M… era funcionário público e L… era caixeiro – depoimentos das primeiras quatro testemunhas inquiridas;

15. Após algum tempo de atuações em conjunto, mas em data indeterminada, a banda comparou alguns equipamentos, como cabos, luzes ou colunas de som, para uso comum – primeira testemunha, P…, filho do impugnante;

16. De todos os elementos da banda, apenas o impugnante se encontrava fiscalmente registado para o exercício da atividade de músico por conta própria, razão pela qual os recibos dos valores contratuais pagos à banda eram emitidos apenas por si – primeira testemunha, P…, filho do impugnante; a terceira testemunha, M…, afirmou que era pouco dinheiro e já era funcionário público, pelo que nunca pensou em coletar-se nas finanças; a quarta testemunha disse que nunca se lembraram de constituir sociedade;

17. A banda J… atuou em festas de fim-de-ano de 2006 e 2007 no Hotel L… P…, da G…, a convite dos donos desse estabelecimento – primeira e segunda testemunhas, P… e D…, filhos do impugnante, quarta testemunha, L…, e sexta testemunha, E…, amiga dos impugnante e dona do referido Hotel e auto de declarações de fls. 27 do PA;

18. Essas festas de réveillon tinham ambiente familiar e os músicos da banda J… iam acompanhados pelas respetivas famílias, que jantavam e não pagavam bilhete como os outros clientes – primeira e segunda testemunhas, filhos do impugnante e músicos da banda, quarta testemunha, L…, músico da banda, e sexta testemunha, E…, dona do Hotel;

19. As atuações nos referidos réveillons foram objeto de contrato (verbal) e o Hotel pagou o respetivo preço – sexta testemunha, E…, e dona do Hotel e amiga da mulher do impugnante, que disse já não se lembrar do preço nem das circunstâncias do contrato, mas admitiu que pode ter rondado € 1.700,00 por cada uma; auto de declarações assinado pela mesma pessoa, a fls. 27 do PA, a quarta testemunha, L…, disse não se lembrar se receberam preço pelas atuações, mas admite que poderão ter recebido “gorjeta” em dinheiro; a segunda testemunha, D…, filha do impugnante, disse não se lembrar se receberam dinheiro e admitiu que terá havido contacto prévio dos donos do Hotel, talvez com o seu pai ou outro elemento do grupo; a primeira testemunha, P…, filho do impugnante, também admitiu que esses contactos poderão ter sido feitos com os seus pais ou com a irmã;

20. Não foi passado qualquer recibo referente aos pagamentos aluídos no ponto anterior – auto de declarações de fls. 27 do PA;

21. Em 4/11/2005 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de V… uma atuação em V…, C…, no dia 2/9/2006, pelo preço de € 850,00 – fls. 171 do PA;

22. Em 19/11/2005 a banda J…, representada por M…, contratualizou com a comissão de festas de S. M… uma atuação em R… no dia 25/4/2006, pelo preço de € 500,00 – fls. 156 do PA;

23. Em 26/11/2005 a banda J…, representada por M…, contratualizou com a comissão de festas de F… uma atuação em F… no dia 21/1/2006, pelo preço de € 600,00 – fls. 159 do PA;

24. Em 26/11/2005 a banda J…, representada por M…, contratualizou com a comissão de festas de S… uma atuação em S… no dia 4/2/2006, pelo preço de € 500,00 – fls. 160 do PA;

25. Em 3/12/2005 a banda J…, representada por M…, contratualizou com a comissão de F… de P… uma atuação em P… no dia 11/3/2006, pelo preço de € 600,00 – fls. 159 do PA;

26. Em 24/12/2005 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A… uma atuação em A… no dia 7/1/2006, pelo preço de € 500,00 – fls. 158 do PA;

27. Em 24/12/2005 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A… uma atuação em A… no dia 25/3/2006, pelo preço de € 500,00 – fls. 164 do PA;

28. Em 24/12/2005 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A… uma atuação em A…no dia 12/8/2006, pelo preço de € 1.500,00 – fls. 170 do PA;

29. Em 25/12/2005 a banda J…, representada por M…, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 25/2/2006, pelo preço de € 500,00 – fls. 162 do PA;

30. Em 22/1/2006 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas do r… uma atuação em R… no dia 5/8/2006, pelo preço de € 600,00 – fls. 157 do PA;

31. Em 23/1/2006 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com C… uma atuação em F… no dia 17/6/2006, pelo preço de € 600,00 – fls. 168 do PA;

32. Em 10/2/2006 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas dos T… uma atuação em T… no dia 18/7/2009, pelo preço de € 600,00 – fls. 155 do PA;

33. Em 4/3/2006 a banda J…, representada por M…, contratualizou com a comissão de festas de S… uma atuação em S… no dia 29/4/2006, pelo preço de € 500,00 – fls. 166 do PA;

34. Em 12/4/2006 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de V… uma atuação em V… no dia 18/7/29/9/2006, pelo preço de € 550,00 – fls. 154 do PA;

35. Em 22/5/2006 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 15/7/2006, pelo preço de € 650,00 – fls. 169 do PA;

36. Em 22/5/2006 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 25/11/2006, pelo preço de € 500,00 – fls. 175 do PA;

37. Em 22/5/2006 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 9/12/2006, pelo preço de € 500,00 – fls. 176 do PA;

38. Em 22/5/2006 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 3/2/2007, pelo preço de € 500,00 – fls. 181 do PA;

39. Em 22/5/2006 a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 21/4/2007, pelo preço de € 500,00 – fls. 187 do PA;

40. Sem data, a banda J…, representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de S…, P… uma atuação em P…no dia 10/6/2006, pelo preço de € 600,00 – fls. 167 do PA;

41. Em 13/6/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de E.../P... uma atuação em E... no dia 27/1/2007, pelo preço de € 600,00 – fls. 180 do PA;

42. Em 8/8/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 2/12/2006, pelo preço de € 500,00 – fls. 153 do PA;

43. Em 28/8/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A… uma atuação em A… no dia 18/10/2006, pelo preço de € 550,00 – fls. 174 do PA;

44. Em 28/8/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A… uma atuação em A… no dia 21/10/2006, pelo preço de € 550,00 – fls. 172 do PA;

45. Em 28/8/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A… uma atuação em A… no dia 16/12/2006, pelo preço de € 550,00 – fls. 177 do PA;

46. Em 17/9/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de S… uma atuação em S… no dia 6/7/2006, pelo preço de € 550,00 – fls. 178 do PA;

47. Em 17/9/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de S… uma atuação em S… no dia 4/11/2006, pelo preço de € 550,00 – fls. 173 do PA;

48. Em 17/9/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 7/4/2007, pelo preço de € 550,00 – fls. 186 do PA;

49. Em 17/9/2006 a banda J..., representada por pessoa que não está identificada, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 4/8/2007, pelo preço de € 850,00 – fls. 152 do PA;

50. Em 30/9/2006 a banda J..., representada por P…, contratualizou com a comissão de festas de F.. uma atuação em F… no dia 26/8/2007, pelo preço de € 950,00 – fls. 151 do PA;

51. Em 22/10/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 15/4//2006, pelo preço de € 600,00 – fls. 165 do PA;

52. Em 29/10/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 7/7/2007, pelo preço de € 700,00 – fls. 191 do PA;

53. Em 5/11/2006 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 7/7/2007, pelo preço de € 700,00 – fls. 191 do PA;

54. Em 9/11/2006 a banda J..., representada P…, contratualizou com a comissão de festas de Nª S… uma atuação em S… no dia 1/9/2007, pelo preço de € 900,00 – fls. 194 do PA;

55. Em 18/11/2006 a banda J..., representada por pessoa não identificada, contratualizou com a comissão de festas de A… uma atuação em A… no dia 31/3/2007, pelo preço de € 550,00 – fls. 185 do PA;

56. Em 8/12/2006 a banda J..., representada por M…, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 10/2/2007, pelo preço de € 550,00 – fls. 182 do PA;”.

57. Em 8/12/2006 a banda J..., representada P..., contratualizou com a comissão de festas da Escola Sec. T… uma atuação em T… no dia 17/2/2007, pelo preço de € 650,00 – fls. 183 do PA;

58. Em 7/4/2007 a banda J..., representada por M..., contratualizou com P… uma atuação em M… no dia 7/11/2007, pelo preço de € 600,00 – fls. 196 do PA;

59. Em 25/4/2007 a banda J..., representada por M..., contratualizou com a comissão de festas de C… uma atuação em C… no dia 28/7/2007, pelo preço de € 850,00 – fls. 192 do PA;

60. Em 30/4/2007 a banda J..., representada por M..., contratualizou com a comissão de festas de Q… uma atuação em Q… no dia 12/5/2007, pelo preço de € 550,00 – fls. 188 do PA;

61. Em 5/5/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de M… uma atuação em M… no dia 29/3/2008, pelo preço de € 800,00 – fls. 199 do PA;

62. Em 16/5/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de S… /S… uma atuação em S… no dia 30/6/2007, pelo preço de € 750,00 – fls. 190 do PA;

63. Em 24/5/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de C… uma atuação em C… no dia 9/6/2007, pelo preço de € 750,00 – fls. 189 do PA;

64. Em 8/6/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 26/4/2008, pelo preço de € 850,00 – fls. 202 do PA;

65. Em 11/8/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de V… uma atuação em V… no dia 11/8/2007, pelo preço de € 1.800,00 – fls. 193 do PA;

66. Em 17/8/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 17/8/2008, pelo preço de € 2.000,00 – fls. 211 do PA;

67. Em 21/8/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A… uma atuação em A… no dia 27/10/2007, pelo preço de € 650,00 – fls. 195 do PA;

68. Em 21/8/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A... uma atuação em A... no dia 5/4/2008, pelo preço de € 650,00 – fls. 200 do PA;

69. Em 21/8/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A... uma atuação em A... no dia 17/5/2008, pelo preço de € 650,00 – fls. 204 do PA;

70. Em 21/8/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A...uma atuação em A...no dia 15/8/2008, pelo preço de € 2.000,00 – fls. 210 do PA;

71. Em 26/8/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de S… três atuações em S… nos dias 15/12/2007, 19/4/2008 e 31/5/2008, pelo preço de € 650,00 cada uma – fls. 197 do PA;

72. Em 26/8/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de M… uma atuação em M… no dia 3/5/2008, pelo preço de € 850,00 – fls. 203 do PA;

73. Em 28/8/2007 a banda J..., representada por P…, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 28/6/2008, pelo preço de € 750,00 – fls. 205 do PA;

74. Em 28/8/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 19/7/2008, pelo preço de € 650,00 – fls. 207 do PA;

75. Em 30/9/2007 a banda J..., representada por P..., contratualizou com a comissão de festas de F… uma atuação em F… no dia 10/3/2007, pelo preço de € 550,00 – fls. 184 do PA;

76. Em 13/10/2007 a banda J..., representada por M..., contratualizou com a comissão de festas de finalistas –T… uma atuação em T… no dia 9/2/2008, pelo preço de € 500,00 – fls. 150 do PA;

77. Em 15/10/2007 a banda J..., representada por pessoa que não está identificada, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 12/4/2008, pelo preço de € 500,00 – fls. 149 do PA;

78. Em 28/10/2007 a banda J..., representada por pessoa que não está identificada, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 26/7/2008, pelo preço de € 1.200,00 – fls. 148 do PA;

79. Em 23/12/2007 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de C… uma atuação em C… no dia 12/1/2008, pelo preço de € 800,00 – fls. 198 do PA;

80. Em 1/1/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de T… uma atuação em T… no dia 9/8/2008, pelo preço de € 2.000,00 – fls. 209 do PA;

81. Em 5/1/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A… uma atuação em A… no dia 24/8/2008, pelo preço de € 2.000,00 – fls. 212 do PA;

82. Em 4/2/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de L… uma atuação em L… no dia 8/11/2008, pelo preço de € 900,00 – fls. 215 do PA;

83. Em 18/2/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de R… uma atuação em R… no dia 25/4/2008, pelo preço de € 850,00 – fls. 201 do PA;

84. Em 28/3/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 11/4/2009, pelo preço de € 800,00 – fls. 221 do PA;

85. Em 30/3/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas da F… uma atuação em P… no dia 25/10/2008, pelo preço de € 850,00 – fls. 214 do PA;

86. Em 19/4/2008 a banda J..., representada por M..., contratualizou com a comissão de festas de C… uma atuação em C… no dia 5/7/2008, pelo preço de € 850,00 – fls. 206 do PA;

87. Em 19/4/2008 a banda J..., representada por M..., contratualizou com a comissão de festas de C… uma atuação em C… no dia 3/8/2008, pelo preço de € 1.900,00 – fls. 208 do PA;

88. Em 6/8/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A… uma atuação em A… no dia 25/8/2008, pelo preço de € 2.000,00 – fls. 213 do PA;

89. Em 26/8/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 7/8/2009, pelo preço de € 2.500,00 – fls. 226 do PA;

90. Em 18/9/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de M… uma atuação em M… no dia 15/8/2009, pelo preço de € 2.250,00 – fls. 229 do PA;

91. Em 3/10/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de V… uma atuação em V… no dia 9/5/2009, pelo preço de € 1.100,00 – fls. 224 do PA;

92. Em 12/10/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G…no dia 20/12/2008, pelo preço de € 750,00 – fls. 216 do PA;

93. Em 12/10/2008 a banda J..., representada por M…, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 24/4/2009, pelo preço de € 1.000,00 – fls. 222 do PA;

94. Em 13/10/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de V… a uma atuação em V… no dia 1/5/2009, pelo preço de € 1.000,00 – fls. 223 do PA;

95. Em 25/10/2008 a banda J..., representada por pessoa não identificada, contratualizou com a comissão de festas de finalistas de C… uma atuação em C… no dia 21/3/2009, pelo preço de € 1.100,00 – fls. 220 do PA;

96. Em 29/10/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de S. P… uma atuação em S. P… no dia 23/8/2009, pelo preço de € 2.500,00 – fls. 228 do PA;

97. Em 15/11/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de F… uma atuação em F… no dia 17/1/2009, pelo preço de € 800,00 – fls. 218 do PA;

98. Em 18/12/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 3/1/2009, pelo preço de € 800,00 – fls. 217 do PA;

99. Em 20/12/2008 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de A... uma atuação em A... no dia 17/8/2009, pelo preço de € 2.500,00 – fls. 227 do PA;

100. Em 3/1/2009 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 7/2/2009, pelo preço de € 800,00 – fls. 219 do PA;

101. Em 2/4/2009 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de S. M… uma atuação em S. M… no dia 19/9/2009, pelo preço de € 1.400,00 – fls. 230 do PA;

102. Em 8/4/2009 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 4/7/2009, pelo preço de € 1.100,00 – fls. 225 do PA;

103. Em 11/4/2009 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 24/10/2009, pelo preço de € 1.000,00 – fls. 233 do PA;

104. Em 16/5/2009 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de G… uma atuação em G… no dia 26/9/2009, pelo preço de € 800,00 – fls. 231 do PA;

105. Em 7/6/2009 a banda J..., representada por P..., contratualizou uma atuação com a comissão de festas de S. M… para o dia 18/9/2010, pelo preço de € 550,00 – fls. 22 e 23 do PA;

106. Em 27/6/2009 a banda J..., representada por pessoa que não está identificada, contratualizou com a Associação Cultural e Desportiva F… uma atuação em F… no dia 18/7/2009, pelo preço de € 1.500,00 – fls. 21 do PA;

107. Com data de 18/7/2009 o agora impugnante emitiu o recibo (verde) modelo 6 do IRS a favor da Associação Cultural e Desportiva F… pela importância total de € 1.500,00 – fls. 20 do PA;

108. Em 31/7/2009 a banda J..., representada pela mesma pessoa aludida em 22 supra, contratualizou com o Câmara Municipal de Celorico da Beira uma atuação no dia 10/8/2009 em Celorico da Beira, pelo preço de €2.500,00 – fls. 147 do PA;

109. Em 9/9/2009 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de P… uma atuação em P… no dia 3/10/2009, pelo preço de € 800,00 – fls. 232 do PA;

110. Em 24/9/2009 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de L… uma atuação em L… no dia 14/11/2009, pelo preço de € 1.000,00 – fls. 234 do PA;

111. Em 9/11/2009 a banda J..., representada por P..., contratualizou uma atuação com a comissão de festas de V… para o dia 6/8/2010, pelo preço de € 1250,00 – fls. 14 do PA;

112. Em 14/11/2009 a banda J..., representada pelo impugnante, contratualizou com a comissão de festas de Finalistas de C… uma atuação em L… no dia 12/12/2009, pelo preço de € 800,00 – fls. 235 do PA;

113. Em 1/12/2009 a banda J..., representada por P..., contratualizou com A… Unipessoal, Lda. uma atuação em M… no dia 31/12/2009, pelo preço de € 500,00 – fls. 16 e 17 do PA;

114. Em 25/8/2010, com o título “Jovens seguem grupo J... para todo o lado”, foi publicado no jornal “N… ” um artigo sobre a banda em causa nos autos no qual consta, além do mais, que “Espetáculos são reservados de ano para ano. Até ao final do ano o grupo J... tem já os fins-de-semana todos ocupados. Durante os meses de verão chegam a ter três a quatro atuações por semana; no resto do ano a banda atua ao sábado” – anexo I do Relatório de inspeção, a fls. 68 do PA;

115. Em 2010 foi constituída a sociedade comercial “J… Lda.”, nipc 5…, registada para o exercício da atividade de Artes do espetáculo, CAE 090010, que passou a enquadrar a referida banda J..., e iniciou a atividade a partir de 23/9/2010 – fls. 3 do Relatório de inspeção, a fls. 50 do PA e depoimento da primeira testemunha, P..., filho dos impugnantes que os sócios são os músicos da banda e que esta manteve a mesma designação, e artigo 8º da contestação da Fazenda Pública;

116. Em 26/11/2010, pelo Gabinete do Diretor de Finanças da Guarda foi elaborada a informação, prestada no âmbito do processo de inquérito NUIPC 25/10.8IDGRD cujos indiciados eram os cinco músicos do grupo musical J..., na qual consta ser “manifesta e notória a omissão e ocultação dos rendimentos obtidos pela actividade musical desenvolvidas com carácter continuado há vários anos e a consequente fuga ao imposto (IRS) devido por parte desses músicos e colaboradores”, configurando o crime de fraude fiscal, e “por outro lado, também se eximiram à constituição de uma sociedade, nas formas regulamentadas no Código das Sociedade, pese embora toda a estrutura, actividade e actuação seja própria de uma entidade comercial, para obviar ao cumprimento de um acervo de obrigações que a estas compete” – fls. 27 a 31 do processo físico;

117. Ao abrigo das Ordens de Serviço nº OI201000205 e OI201000206, entre 11/12/2011 e 19/5/2011 a AT levou a cabo uma ação inspetiva externa à situação tributária dos agora impugnantes, que incidiu sobre a atividade liberal (categoria B) do agora impugnante reportada aos anos 2006 a 2009 (incl.), que culminou com o Relatório final de 28/6/2011, homologado por despacho de 6/7/2011, no qual se apuraram correções por métodos indiretos, em sede de IRS e de IVA em cada um dos referidos exercícios – Relatório de fls. 43 e seguintes do PA;

118. Notificado para exibir os documentos de suporte referentes aos elementos declarados nos períodos em causa, o impugnante apenas exibiu cópia de um contrato de 2006 e um de 2007, dois de 2008 e dois de 2009, todos com câmaras municipais ou com a agência de espetáculos “R…, Unipessoal, Lda.” – pág. 8 do Relatório, a fls. 12 do PA;

119. Na referida ação inspetiva, a AT concluiu que só foram exibidos 6 contratos, para os quais foram emitidos recibos, mas verificou que foram emitidos recibos relativamente aos quais não foram exibidos contratos, havendo indícios de que foram realizados espetáculos para os quais não existe qualquer recibo nem foi exibido contrato – pág. 8 do Relatório e anexo I, a fls. 55 e 68 do PA;

120. Através dos elementos que conseguiu recolher por diversos meios, a AT concluiu que foram os seguintes dos espetáculos, os recibos emitidos e diferenças:

- pág. 13 e anexos II a IV do Relatório, de fls. 17 e 69 a 80 do PA;

121. Com base nos valores declarados pelo contribuinte, a AT apurou o valor médio de cada atuação e, por simples operação aritmética, concluiu que o rendimento omitido e o correspondente IVA em falta eram os seguintes:

- pág. 17 e 18 do Relatório, de fls. 64 e 65 do PA;

122. Por oficio nº 31344, de 7/7/2011, enviado sob registo postal de 8/7/2011, a AT notificou os agora impugnantes do teor do Relatório final da ação inspetiva acima aludida – fls. 255 a 258 do PA

123. Na sequência, em 8/8/2011 os agora impugnantes requereram abertura do respetivo procedimento de revisão previsto nos artigos 91º e 92º da LGT – fls. 21 a 26 do processo físico e artigo 7º da p.i.;

124. Em 8/9/2011 o DM Ministério Público responsável pelo processo de Inquérito nº 25/10.8IDGRD, proferiu despacho de arquivamento por considerar que “as operações tributáveis, resultantes dos espetáculos realizados através da banda “J...”, constituem rendimentos empresariais e profissionais obtidos pelo sujeito passivo em análise (o sujeito passivo A…), uma vez que , desde 2006, que este vem declarando operações tributáveis provenientes de espectáculos realizados pela referida banda.

Assim, conjugados todos os elementos recolhidos no decurso do inquérito realizado, resulta que existem fortes indícios de que o arguido A…, enquanto responsável pela emissão dos respectivos recibos, relativos ás prestações de sei-viços realizadas pela banda "J..." omitiu operações tributáveis e valores, já que foram realizados espectáculos, sem que tenha sido emitido qualquer recibo e existem espectáculos, para os quais foi emitido recibo, mas de valor inferior ao montante cobrado a outros clientes no mesmo mês e ano.

Dos elementos probatórios coligidos em sede de inquérito, nomeadamente dos elementos que serviram de base ao apuramento das prestações de serviços estimadas, constantes do anexo II, III, IV e IV, obteve-se o imposto em falta por período/trimestre, melhor descriminado no quadro constante de fls. 2010.

Da análise do presente quadro infere-se que as vantagens patrimoniais ilegítimas obtidas pelo arguido A…, no que toca aos anos de 2006 a 2009, são, cada uma delas individualmente consideradas, inferiores a € 15.000.

Acontece, porém que, o artigo 103.º, n.º 2, do RGIT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro determina que "Os factos previstos no número anterior não são puníveis se a vantagem patrimonial ilegítima for inferior a € 15.000,00”, redacção que se aplica, no caso sub judice, por força do disposto no n.º 2 do artigo 2º do Código Penal:

Em face do que se deixou exposto, somos a concluir pela não punibilidade dos factos em apreço como crime de fraude fiscal, sem prejuízo da responsabilidade contra-ordenacional pelos mesmos.” – fls. 80 a 83 do processo físico;

125. Os peritos das partes reuniram-se várias vezes no âmbito do procedimento nº 12/2011, tendo concluído na última reunião, ocorrida em 23/9/2011, que não era possível chegar a acordo, apesar de o Perito dos contribuinte ter proposto a retificação do relatório de modo à tributação englobar apenas os contratos agora conhecidos, mas o perito da AT não aceitou e propôs a retificação do Relatório tendo em conta o preço médio dos espetáculos apurados com base nos contratos agora conhecido e a fixação dos seguintes valores:

- fls.. 99 a 135 do PA;

126. Em 13/10/2011 o Diretor de Finanças da Guarda proferiu despacho previsto no artigo 92º, nº 6, da LGT, no qual decidiu fixar os rendimentos coletáveis e o IVA em falta conforme quadro seguinte:

– fls. 91 a 98 do PA;

127. Em 15/11/2011 o Diretor de Finanças da Guarda proferiu despacho retificando o despacho aludido no ponto anterior, no qual fixou os seguintes valores:

- fls. 89 e 90 do PA e artigo 9º da p.i.;

128. Com base nos valores indicados no ponto anterior, em 19/11/2011 a AT efetuou as seguintes liquidações em nome dos agora impugnantes, que lhes notificou validamente para pagamento voluntário até 31/1/2012:

- introdução da p.i. e fls. 27 a 32 do processo físico e artigo 1º da contestação;

129. Em 22/3/2012 foi apresentada no Serviço de Finanças da Guarda a petição inicial da presente impugnação – fls. 2 e seguintes do processo físico”.

II.B. Refere-se ainda na sentença recorrida:

“Com relevância para a boa decisão das questões a apreciar apuraram-se os seguintes factos julgados não provados:

1- Apesar de três (A…, P… e D…) dos cinco músicos que a integram serem da mesma família, a banda J... não tinha um “dono” e todos os músicos da banda J... participavam igualmente nos contratos e outras decisões, nos encargos suportados e na distribuição das receitas recebidas, bem como nas restantes tarefas inerentes à atividade da banda – depoimentos da primeira, terceira e quarta testemunhas; em sentido contrário, a quinta testemunha, inspetor tributário disse que o impugnante assinou a grande maioria dos contratos e que se lhe apresentou como líder da banda e nunca se referiu à existência de contrato de sociedade;

2- Logo após o recebimento do preço das atuações, o respetivo valor era dividido por todos os músicos em partes iguais, após o pagamento das despesas inerentes, designadamente as resultantes da deslocação – primeira testemunha, que disse que as receitas eram sempre repartidas em partes iguais por todos os elementos, por acordo de todos, tendo em conta os acertos relativos às despesas de transporte, e terceira testemunha, que disse que qualquer um podia receber, comunicava aos restantes e dividiam entre si em partes iguais, tendo em conta o pagamento das despesas, facto que a quarta testemunha também confirmou; em sentido contrário, a quinta testemunha, inspetor tributário disse que o impugnante assinou a grande maioria dos contratos e que se lhe apresentou como líder da banda e nunca se referiu à existência de contrato de era o líder do grupo e apresentou-se como responsável pelos rendimentos e tributos”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao PA, que não foram impugnados, e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados – art.º 74º da LGT - também são corroborados pelos documentos juntos aos autos art.º 76º nº 1 da LGT e artigos 362º e ss do Código Civil (CC) – identificados em cada um os factos descritos no probatório.

Relevou-se, ainda, o depoimento das testemunhas inquiridas:

1º - P…, de 41 anos, filho dos impugnantes e um dos músicos (organista) do grupo “J...”;

2º - D…, de 38 anos, filha dos impugnantes e um dos elementos (vocalista) do grupo “J...”;

3º - M…, de 52 anos, amigo dos impugnantes e um dos músicos (viola baixo) do grupo “J...”;

4º - L…, de 63 anos, amigo dos impugnantes e um dos músicos (baterista) do grupo “J...”;

5º - G…, Inspetor Tributário e autor do Relatório de inspeção;

6º - E…, amiga dos impugnantes e dona do “Hotel L… P…”, sito na G…

Os depoimentos das duas últimas testemunhas foram prestados genericamente de forma que se afigurou ser séria, consistente e convincente, merecedor de plena credibilidade, tendo as suas explicações, conjugadas com as demais provas documentais carreadas para os autos, contribuído fortemente para a formação da convicção acerca dos factos acima descritos, tal como se indica em cada um dos pontos do probatório.

Os depoimentos das quatro primeiras testemunhas, arroladas pelo impugnante, duas delas seus filhos e os outras seus amigos e membros da banda, mostraram-se genericamente úteis para a compreensão da banda, nomeadamente do contexto da sua formação, mas com incoerências reveladoras da sua intencionalidade de favorecer a tese do impugnante.

As afirmações das referidas testemunhas, sintetizadas em 1 e 2 de 3.2 supra foram julgadas não provadas porque se afigura que são desconformes à realidade, na parte em que pretendem contrariar a notória liderança do empreendimento musical a cargo do impugnante e da sua esposa, com colaboração especial do filho P....

Essa liderança evidencia-se no domínio absoluto dessa família na fase da contratação, não tendo sido detetados quaisquer contratos assinados pelos músicos D…, M… e L…, respetivamente segunda, terceira e quarta testemunhas.

Todo esse domínio já provinha do seu estatuto de músico, mais antigo e mais experiente e do estatuto de pai e mentor dos outros músicos P… e D….

Tão manifesta preponderância, em particular do agora impugnante, não é facilmente compatível com a alegada igualdade nos direitos decisórios quanto ao destino da banda, sendo certa que esta é vista como um “projeto familiar” dos referidos três músicos e da esposa e mãe, M…; enquanto os outros dois músicos, M… e L… apenas entendem essa atividade musical como um passatempo, um hobby, uma atividade lúdica e não lucrativa ou muito pouco compensadora no aspeto financeiro.

Também foi reconhecido pelas testemunhas que a banda era quase sempre acompanhada pela M…, esposa do músico A… e mãe dos músicos P… e D…, e que era ela que costumava receber o preço da atuação.

O Tribunal não vê razão para desconsiderar a alegação de que o recebimento poderia ser feito por qualquer outro membro do grupo e que de imediato esse facto era comunicado aos restantes. Todavia, o Tribunal não ficou convencido de que a totalidade das receitas obtidas em resultado das atuações da banda J... eram imediatamente repartidas igualmente entre todos os músicos da banda, “por cabeça”, já descontando os valores dos encargos inerentes à respetiva atuação.

De facto, a tese de que as receitas e as despesas das atuações eram repartidas igualmente entre todos os cinco músicos, facto não devidamente provado, designadamente através da demonstração dessa igualdade no pagamento das despesas de aluguer das viaturas de transporte do pessoal e dos equipamentos necessários em cada atuação, é incoerente com o facto de existirem outros elementos em serviço na banda, que eram geralmente em número de sete (conforme número de refeições a assegurar pelo promotor das festas nos termos da cláusula 5 dos contratos exibidos), sabendo-se que seriam duas bailarinas e ou técnicos de luzes e de som, que certamente não prestariam os seus serviços gratuitamente.

Aliás, os autos não identificam essas pessoas, não juntam os respetivos contratos e, portanto, impedem o Tribunal de perceber quem as contratou e quanto lhes pagou e com que meios, ficando sem se saber se estavam ao serviço da banda J... ou da família de A… ou dos elementos da banda individualmente considerados. Do mesmo modo, os autos não juntam quaisquer documentos de despesa alegadamente suportados pela banda, designadamente as referentes ao aluguer dos meios de transporte dos equipamentos, ficando sem se saber a identidade da pessoa que contratou e da qualidade em que o fez, impossibilitando o Tribunal de formular qualquer juízo acerca da natureza social ou individual desses encargos. Uma vez que esse era um ónus a cargo da parte que invoca o facto em seu favor, o respetivo incumprimento do ónus determina a resolução da questão em desfavor do impugnante”.

II.D. Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto

Entende, desde logo, o Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto, uma vez que:

a) Desvalorizou o depoimento de três testemunhas, valorizando o depoimento do inspetor tributário;

b) Os factos não provados encontram-se incorretamente julgados.

Considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão (1-Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, p. 169..

Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC];

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC].

Especificamente quanto à prova testemunhal, dispõe o n.º 2 do art.º 640.º do CPC:

“2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”.

Como tal, não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo­-se-lhe os ónus já mencionados (2-V., a título exemplificativo, o Acórdão deste TCAS, de 27.04.2017 (Processo: 638/09.0BESNT) e ampla doutrina e jurisprudência no mesmo mencionada..

Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que tais ónus não foram cumpridos, porquanto é apenas invocada uma discordância com o decidido, mas sem que tenha sido dado cabal cumprimento às exigências referidas supra, designadamente no tocante à concreta identificação das passagens dos depoimentos suscetíveis de justificar distinta decisão.

Como tal, rejeita-se o recurso nesta parte.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Do erro de julgamento

Considera o Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, porquanto era sujeito passivo de imposto não o Recorrente, mas a sociedade irregular que o mesmo, juntamente com os demais elementos da banda J..., constituíam.

Apreciando.

A situação sub judice já foi objeto de apreciação por este TCAS, em Acórdão de 30.06.2022 (Processo: 73/12.3BECTB), atinente a IRC, no qual a ora Relatora interveio na qualidade de 2.ª Adjunta e em termos com os quais se concorda integralmente. Escreveu-se, assim, no mencionado aresto:

“[N]ão se conformam os recorrentes com a imputação ao recorrente marido da totalidade dos rendimentos relacionados com a actividade da banda musical “J...”, apurados por via indirecta.

(…) [E]ntendem os recorrentes que os rendimentos apurados da actividade da banda musical “J...” deveriam ser imputados a um ente colectivo, a uma sociedade irregular formada pelos cinco elementos da banda, que o impugnante marido também integra, e não única e exclusivamente na titularidade deles, impugnantes.

Não sendo discutível que as sociedades irregulares são também elas entidades sujeitas a tributação em IRC (cf. art.º 2.º, n.º 1 alínea b) e n.º 2 do CIRC), a verdade é que, como a sentença deixa bem vincado, com apoio de jurisprudência pertinente deste tribunal (cf. ac. de 02/25/2021, tirado no proc.º 441/08.5BEALM), para uma realidade de facto poder ser juridicamente caracterizada como sociedade irregular é fulcral que exista uma actividade comum exercida pelos sócios e que estes tenham em vista a criação de uma utilidade nova, norteada para a obtenção de lucro.

Como se colhe do sumário ac. citado, «o elemento essencial e específico de uma sociedade [“Contrato de sociedade é aquele em que duas ou mais pessoas se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício em comum de certa actividade económica, que não seja de mera fruição, a fim de repartirem os lucros resultantes dessa actividade” – art.º 980.º do C.C.], ainda que irregular, é a chamada affectio societatis, ou seja, a intenção de cada um se associar com outro ou outros, para formação de uma pessoa coletiva distinta da de cada um deles. A aludida affectio societatis caracteriza-se por dois requisitos: um, subjectivo, consubstanciado na intenção de constituir uma certa realidade económico-jurídica; outro, objectivo, expressado na constituição de um fundo social sem a existência do qual aquela intenção seria meramente programática».

Em reforço, acompanhando agora Higina Castelo, “Sociedade irregular. Contrato de sociedade. O acordo a que se reporta o artigo 36.º, 2, do Código das Sociedades Comerciais – Natureza e validade”, verbo jurídico, págs. 9/10, disponível in www.verbojuridico.net., no seu estudo sobre o tema das sociedades irregulares, refere a autora que «…a jurisprudência tem decidido, de forma constante, que a sociedade prevista no artigo 36.º, n.º 2 do CSC [“Se for acordada a constituição de uma sociedade comercial mas, antes da celebração do contrato de sociedade, os sócios iniciarem a sua actividade, são aplicáveis às relações entre eles e com terceiros as disposições sobre sociedades civis.”] só existe se se verificarem, entre outros, os elementos do contrato de sociedade civil, que, resumidamente, passamos a citar:

-Pessoas-duas ou mais pessoas (que se obrigam);

-Objecto-bens ou serviços (com que contribuem),

-Função eficiente-obrigação (de contribuição);

-Função económico-social-cooperação-contribuição para o exercício em comum de certa actividade;

-Circunstância (no caso, a finalidade da função económico-social) – finalidade de repartição de lucros».

Acrescenta a referida autora que, não obstante estes elementos não se encontrarem previstos na mencionada norma legal, tem sido entendido como sendo os necessários para que se aplique a sujeição do contrato ao regime das sociedades civis.

Finalmente, para que seja aplicado esse regime, Higina Castelo concorda com o entendimento expressado no Acórdão a Relação de Guimarães de 06/05/2008, proc.º 1091/08-1, no sentido de que é necessário que o negócio jurídico de constituição de sociedade comercial, sem escritura pública, tenha efectiva actividade.

Como se consigna neste último aresto, «No artigo 36º, nº 2, do C.S.C., não se reconhece a existência de uma sociedade comercial, mas equipara-se a situação à de uma sociedade civil, cujo contrato se caracteriza pela não sujeição a forma especial, nos termos do artigo 981º, nº 1, do C.C. Apenas se poderá reclamar a aplicação da disciplina jurídica das sociedades irregulares, em primeiro lugar, se for celebrado um negócio jurídico de constituição de uma sociedade comercial, sem escritura pública e, em segundo lugar, que esse negócio jurídico sofra começo de execução ou, como se diz no nº 2, do citado artigo 36º, do C.S.C., se “os sócios iniciarem a sua actividade”. Antes deste momento, isto é, do início da actividade social, não se porá qualquer problema de aplicação da disciplina jurídica das sociedades irregulares».

Ora, no caso sub judice e contrariamente ao que foi entendido na sentença recorrida, todos os elementos descritos pela jurisprudência e doutrina para a caracterização de uma realidade de facto como sociedade irregular, estão presentes nos factos dados como provados, como advogam os recorrentes.

Na verdade, colhe-se do probatório designadamente e, entre o mais, que: “o grupo de músicos actuava sob a designação de “J...” na zona em redor da Guarda, em festas de aldeia e outros eventos, especialmente durante o período de Verão”; “na altura dos factos, o conjunto era composto pelos músicos M… (viola baixo), P… (órgão); D… (vocalista principal); A.. (guitarra); L… (bateria)”; “os contactos para a contratação dos espectáculos eram feitos habitualmente por telefone, para qualquer dos músicos, que comunicava aos restantes, podendo o respectivo contrato ser assinado por qualquer deles ou mesmo pela impugnante mulher”; “habitualmente o preço era recebido imediatamente após o final da actuação ou, em alguns casos, imediatamente antes do início”; “o recebimento do preço podia ser feito por qualquer dos elementos do grupo, que de imediato comunicava aos restantes”; “todos os elementos da banda exerciam essa actividade na qualidade de “amadores” uma vez que exerciam outras profissões a título principal, sendo o impugnante marido professor de música, o filho P… era instrutor de condução automóvel, a filha D… era empregada bancária, M… era funcionário público e L… era caixeiro”; “após algum tempo de actuações em conjunto, mas em data indeterminada, os elementos da banda compraram alguns equipamentos, como cabos, luzes ou colunas de som, para uso comum”; “de todos os elementos da banda, apenas o impugnante marido se encontra fiscalmente registado para o exercício da actividade de músico por conta própria, razão pela qual os recibos dos valores contratuais pagos à banda eram emitidos apenas por si” (cf. pontos 6, 7, 9, 11, 12, 14, 15 e 16 dos factos provados).

Ou seja, a nosso ver o que se colhe dos factos provados é que cinco pessoas (os músicos da banda) obrigaram-se a contribuir com bens e/ou serviços (voz e instrumentos de som que tocavam), com recurso a equipamento que todos adquiriram em conjunto (cabos, luzes ou colunas de som…), destinados à actividade de actuação musical da banda em público (festas de aldeia e outros eventos), animados pelo lucro (preço da actuação da banda cobrado de acordo com uma tabela).

A circunstância de a sentença ter dado como «não provado» que os elementos do grupo participavam igualmente das despesas, tarefas e receitas da banda, não inquina a caracterização da realidade em causa como sociedade irregular, porque o que a lei exige é, só, o ânimo da repartição dos lucros da actividade (art.º 980.º do C.C.).

Também não nos deve impressionar, para afastar o elemento volitivo, o facto de os elementos da banda “J...” que prestaram depoimento nos autos terem declarado que “nunca pensaram na constituição de uma sociedade”, porque o sentido mais provável dessa (interessada) afirmação é que nunca pensaram formalizar como sociedade a realidade factual que voluntariamente constituíram e cujos elementos presentes nos factos provados a permitem caracterizar como uma sociedade irregular.

Igualmente não pode ser sobre valorada, como pretende a Recorrida para justificar a tributação dos rendimentos da banda unicamente na esfera jurídica dos impugnantes, a circunstância de ter sido o impugnante marido a assinar contratos e passar recibos com relação à actividade declarada da banda, pois como consta do ponto 16. da matéria assente, “de todos os elementos da banda, apenas o impugnante marido se encontra fiscalmente registado para o exercício da actividade de músico por conta própria, razão pela qual os recibos dos valores contratuais pagos à banda eram apenas por si emitidos”.

Ou seja, e aproximando-nos já das conclusões, as liquidações de IRS impugnadas estão inquinadas do vício de violação de lei por erro nos pressupostos conducente à sua anulação, uma vez que os proveitos gerados pela actividade da banda, ao invés de serem tributados unicamente na titularidade dos recorrentes como rendimentos da categoria B (rendimentos empresariais e profissionais, cf. art.º 3.º do CIRS), deveriam sê-lo em sede de IRC (cf. art.º 2.º, n.º1 alínea b) do CIRC) e recair sobre a sociedade irregular formada pelos cinco músicos, incluindo o aqui recorrente, que integravam o grupo musical “J...”.

Tudo visto, e salvo o devido respeito, entendemos que a sentença incorreu em erro de julgamento ao validar a posição da AT de imputar unicamente na esfera jurídica do impugnante marido os rendimentos que, por via indirecta, apurou serem os resultantes da actividade da banda musical “J...” nos anos de 2006, 2007, 2008 e 2009.

É, pois, de conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação procedente”.

Sendo certo que no presente caso estamos perante IVA, também as sociedades irregulares se podem configurar como sujeitos passivos de tal imposto, dado tratar-se de pessoas coletivas (irregulares) abrangidas pelo art.º 2.º, n.º 1, do Código do IVA (CIVA). Tal sucede, in casu, dado ter ficado provado o exercício de modo independente e com caráter de habitualidade de prestações de serviços, preenchendo, aliás e como vimos, os pressupostos de incidência de IRC.

Pelo que toda a fundamentação do aresto citado é aqui transponível.

Assim, as liquidações em causa não poderiam ser emitidas em nome do Recorrente, mas sim imputadas à mencionada sociedade irregular.

Logo, assiste razão ao Recorrente.

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

a) Conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação procedente, com a consequente anulação dos atos impugnados;

b) Custas pela Recorrida em ambas as instâncias;

c) Registe e notifique.


Lisboa, 29 de fevereiro de 2024

(Tânia Meireles da Cunha)

(Jorge Cortês)

(Patrícia Manuel Pires)